"DOM" é surpreendentemente boa - e digo isso com a tranquilidade de quem sabe as dificuldades que é produzir uma série desse tamanho aqui no Brasil. Embora algumas decisões conceituais sejam impactados diretamente pela limitação do orçamento de sua produção, o resultado final é de extrema qualidade narrativa e visual. "DOM" é um recorte social do Rio de Janeiro dos anos 2000 na sua essência, construído a partir de uma base histórica de 30 anos, justamente quando as drogas começaram a invadir os morros cariocas e se transformar em um cruel negócio dos mais lucrativos.
Na série acompanhamos duas histórias reais que se completam: a de Pedro Dom, um belo rapaz da classe média carioca que foi apresentado à cocaína na adolescência e que acabou colocando ele frente a frente com o crime, onde se transformou no líder de uma gangue criminosa que dominou os tabloides cariocas no início dos anos 2000. E a de seu pai, Victor Dantas, ex-mergulhador, que quando jovem fez uma descoberta no fundo do mar que logo o direcionou para o serviço de inteligência da polícia para combater, justamente, o inicio do tráfico de drogas no país. Confira o trailer:
A série é baseada nas obras "O Beijo da Bruxa", de Luiz Victor Lomba, e "DOM", de Tony Bellotto. Produzido e dirigido pelo sempre impecável Breno Silveira (de "Dois Filhos de Francisco"), o roteiro é bastante competente em cobrir os eventos em duas linhas temporais que a principio parece ter "apenas" a droga como conexão, mas que, posso garantir, vai muito além disso. As marcas do passado de Victor impactam diretamente no seu relacionamento com a família e principalmente com seu filho Pedro - então é preciso que se diga: não se trata da história de mais um criminoso ou da romantização da construção de um mito, muito pelo contrário, "DOM" traz para a discussão um problema social sério, o tráfico de drogas e o impacto dele nas famílias.
Como já é de costume nos projetos de Breno Silveira, tecnicamente, "DOM" é um espetáculo. A fotografa do argentino Adrian Teijido (Capitu) mostra um contraste maravilhoso da cidade do Rio de Janeiro, criando uma dinâmica visual entre o morro, a praia e o asfalto, impressionante! A direção de Silveira, ao lado de Vicente Kubrusly, é precisa na construção do drama e das relações do núcleo central - só peca no trabalho com os atores do elenco de apoio. O trabalho do Claudio Amaral Peixoto na direção de arte também me chamou a atenção - o realismo quase minimalista compõe o cenário de uma forma completamente orgânica nas duas linhas temporais e ajuda demais na construção do mood da série.
Gabriel Leone é um dos melhores atores da sua geração - absolutamente tudo que assisti dele, me convenceu! Eu não gosto da sua versão adolescente na série, mas entendo a demanda. Sua postura como o jovem de classe média carioca, loiro e de olhos azuis, que aproveitava do racismo estrutural para entrar nos condomínios de luxo sem levantar suspeitas, é perfeito - me lembrou muito "The Bling Ring" de Sofia Coppola, mas com uma pegada mais "Cidade de Deus".
"DOM" tem visual de minissérie da Globo e isso é um baita elogio, tudo funciona perfeitamente e nos proporciona um experiência bastante visceral. Não se deixe enganar por qualquer tipo de glamourização ou pelos apelidos de Pedro Dom - essa coisa de "bandido fashion" ou "bandido gato" é marketing para vender jornal de terceira. A série é muito mais profunda, pesada até - ela mostra o uso excessivo de drogas sem se preocupar com os extremos e, por isso, é bem provável que você precise de um tempo para se conectar com a história. Mas vale a pena, mesmo que a jornada exija uma pausa entre um episódio e outro para recuperar o fôlego!
"DOM" é surpreendentemente boa - e digo isso com a tranquilidade de quem sabe as dificuldades que é produzir uma série desse tamanho aqui no Brasil. Embora algumas decisões conceituais sejam impactados diretamente pela limitação do orçamento de sua produção, o resultado final é de extrema qualidade narrativa e visual. "DOM" é um recorte social do Rio de Janeiro dos anos 2000 na sua essência, construído a partir de uma base histórica de 30 anos, justamente quando as drogas começaram a invadir os morros cariocas e se transformar em um cruel negócio dos mais lucrativos.
Na série acompanhamos duas histórias reais que se completam: a de Pedro Dom, um belo rapaz da classe média carioca que foi apresentado à cocaína na adolescência e que acabou colocando ele frente a frente com o crime, onde se transformou no líder de uma gangue criminosa que dominou os tabloides cariocas no início dos anos 2000. E a de seu pai, Victor Dantas, ex-mergulhador, que quando jovem fez uma descoberta no fundo do mar que logo o direcionou para o serviço de inteligência da polícia para combater, justamente, o inicio do tráfico de drogas no país. Confira o trailer:
A série é baseada nas obras "O Beijo da Bruxa", de Luiz Victor Lomba, e "DOM", de Tony Bellotto. Produzido e dirigido pelo sempre impecável Breno Silveira (de "Dois Filhos de Francisco"), o roteiro é bastante competente em cobrir os eventos em duas linhas temporais que a principio parece ter "apenas" a droga como conexão, mas que, posso garantir, vai muito além disso. As marcas do passado de Victor impactam diretamente no seu relacionamento com a família e principalmente com seu filho Pedro - então é preciso que se diga: não se trata da história de mais um criminoso ou da romantização da construção de um mito, muito pelo contrário, "DOM" traz para a discussão um problema social sério, o tráfico de drogas e o impacto dele nas famílias.
Como já é de costume nos projetos de Breno Silveira, tecnicamente, "DOM" é um espetáculo. A fotografa do argentino Adrian Teijido (Capitu) mostra um contraste maravilhoso da cidade do Rio de Janeiro, criando uma dinâmica visual entre o morro, a praia e o asfalto, impressionante! A direção de Silveira, ao lado de Vicente Kubrusly, é precisa na construção do drama e das relações do núcleo central - só peca no trabalho com os atores do elenco de apoio. O trabalho do Claudio Amaral Peixoto na direção de arte também me chamou a atenção - o realismo quase minimalista compõe o cenário de uma forma completamente orgânica nas duas linhas temporais e ajuda demais na construção do mood da série.
Gabriel Leone é um dos melhores atores da sua geração - absolutamente tudo que assisti dele, me convenceu! Eu não gosto da sua versão adolescente na série, mas entendo a demanda. Sua postura como o jovem de classe média carioca, loiro e de olhos azuis, que aproveitava do racismo estrutural para entrar nos condomínios de luxo sem levantar suspeitas, é perfeito - me lembrou muito "The Bling Ring" de Sofia Coppola, mas com uma pegada mais "Cidade de Deus".
"DOM" tem visual de minissérie da Globo e isso é um baita elogio, tudo funciona perfeitamente e nos proporciona um experiência bastante visceral. Não se deixe enganar por qualquer tipo de glamourização ou pelos apelidos de Pedro Dom - essa coisa de "bandido fashion" ou "bandido gato" é marketing para vender jornal de terceira. A série é muito mais profunda, pesada até - ela mostra o uso excessivo de drogas sem se preocupar com os extremos e, por isso, é bem provável que você precise de um tempo para se conectar com a história. Mas vale a pena, mesmo que a jornada exija uma pausa entre um episódio e outro para recuperar o fôlego!
Essa minissérie vai mexer com suas emoções!
"Dopesick" é um termo usado para determinar que uma pessoa está "dopada", impossibilitada de continuar a ser quem ela era se não estiver sob efeito de um determinado "remédio" - que nesse caso foi a origem da maior epidemia de opioides que a sociedade americana já enfrentou. Aliás, antes de assistir essa minissérie de ficção do Star+ que é baseada em fatos reais, eu recomendo veemente que você assista um documentário em quatro partes da Netflix chamado "Prescrição Fatal" - ele vai servir como uma profunda e emocional introdução ao problema criado pela farmacêutica Purdue ao colocar o OxyContin nas farmácias, pelo olhar de um pai que perdeu o seu filho para o vício enquanto a família Sackler enriquecia loucamente.
Voltando à "Dopesick", em oito episódios você vai acompanhar o surgimento do OxyContin e como esse opioide analgésico extremamente potente afetou a vida de milhares de pessoas, em diferentes contextos familiares, profissionais e sociais. Desde os bastidores da Purdue Pharma onde as decisões corporativas e politicas ajudaram a disseminar "legalmente" uma droga com potencial de vício comparado ao da heroína, até uma comunidade da Virgínia que foi praticamente devastada pelo uso (e abuso) do remédio, passando pelos corredores do DEA e do sistema jurídico americano que travavam uma luta desleal para impedir que mais mortes acontecessem. Confira o trailer:
Antes de mais nada é preciso que se diga que "Dopesick" é um misto de ficção e realidade, ou seja, o pano de fundo é sim um recorte real, comovente e absurdo, do que aconteceu nos Estados Unidos, porém a grande maioria dos personagens (mesmo que inspirados em pessoais reais) são, de fato, apenas personagens de ficção. Essa escolha, obviamente, tem uma função dramática que precisa ser digerida com o tempo - inicialmente, a verdadeira dinâmica corporativa que assistimos de dentro da Purdue Pharma e os constrangedores embates entre os Sacklers, soam mais interessantes do que os dramas familiares e pessoais dos moradores da região dos Apalaches, na Virginia, onde vivem o Dr. Samuel Finnix (Michael Keaton) e Betsy Mallum (Kaitlyn Dever). Aliás, alguns plots desenvolvidos pelo criador e roteirista Danny Strong são até descartáveis - a relação homossexual de Betsy, embora faça sentido dentro de um determinado contexto, não empolga.
O roteiro, inclusive, consegue equilibrar muito bem um grande desafio que no livro "Dopesick: Dealers, Doctors, and the Drug Company that Addicted America" da autora Beth Macy, soa mais orgânico: a quebra temporal na construção da trama. Ao entender a dinâmica narrativa, onde a história passeia entre o presente, o passado e o futuro, temos a exata sensação sobre a complexidade dos fatos - o curioso (e genial) é que esse "vai e vem" nos permite experimentar emoções completamente distintas, mas que ao se complementarem, fortalece o convite para uma imersão extremamente profunda e empática pela jornada. Mesmo com um número enorme de personagens, nos importamos com muitos deles da mesma forma que execramos alguns outros.
Aliás, o elenco é um dos pontos mais altos de "Dopesick" - entre as categorias envolvendo atores e atrizes no Emmy 2022, foram 6 indicações, com Keaton saindo vencedor), Isso mostra o valor dos personagens secundários para a evolução da história - ainda que alguns tenham sido “sub aproveitados”, ter Rosario Dawson como agente da DEA, Bridget Meyer; Peter Sarsgaard e John Hoogenakker como os procuradores Rick Mountcastle e Randy Ramseyer, respectivamente; é um luxo. Will Poulter, que interpretou o jovem e sonhador vendedor, Billy Cutler, também merece elogios.
Com um visual belíssimo, uma trilha sonora incrível e um time de diretores muito competente, que contou até com Barry Levinson (de "O Mago das Mentiras"), "Dopesick" já pode ser considerada uma das melhores minisséries dos últimos anos, que não à toa recebeu 14 indicações ao Emmy 2002 e mais 40 em outras premiações importantes como do "Screen Actors Guild", "Globo de Ouro" e "Television Critics Association".
“Dopesick” tem tudo que uma minissérie precisa para ser inesquecível: uma produção irretocável, personagens muito bem construídos, um elenco acima da média e, claro, uma história impactante que nos faz refletir e olhar o ser humano de uma forma diferente (não necessariamente boa para todos).
Vale muito o seu play!
Essa minissérie vai mexer com suas emoções!
"Dopesick" é um termo usado para determinar que uma pessoa está "dopada", impossibilitada de continuar a ser quem ela era se não estiver sob efeito de um determinado "remédio" - que nesse caso foi a origem da maior epidemia de opioides que a sociedade americana já enfrentou. Aliás, antes de assistir essa minissérie de ficção do Star+ que é baseada em fatos reais, eu recomendo veemente que você assista um documentário em quatro partes da Netflix chamado "Prescrição Fatal" - ele vai servir como uma profunda e emocional introdução ao problema criado pela farmacêutica Purdue ao colocar o OxyContin nas farmácias, pelo olhar de um pai que perdeu o seu filho para o vício enquanto a família Sackler enriquecia loucamente.
Voltando à "Dopesick", em oito episódios você vai acompanhar o surgimento do OxyContin e como esse opioide analgésico extremamente potente afetou a vida de milhares de pessoas, em diferentes contextos familiares, profissionais e sociais. Desde os bastidores da Purdue Pharma onde as decisões corporativas e politicas ajudaram a disseminar "legalmente" uma droga com potencial de vício comparado ao da heroína, até uma comunidade da Virgínia que foi praticamente devastada pelo uso (e abuso) do remédio, passando pelos corredores do DEA e do sistema jurídico americano que travavam uma luta desleal para impedir que mais mortes acontecessem. Confira o trailer:
Antes de mais nada é preciso que se diga que "Dopesick" é um misto de ficção e realidade, ou seja, o pano de fundo é sim um recorte real, comovente e absurdo, do que aconteceu nos Estados Unidos, porém a grande maioria dos personagens (mesmo que inspirados em pessoais reais) são, de fato, apenas personagens de ficção. Essa escolha, obviamente, tem uma função dramática que precisa ser digerida com o tempo - inicialmente, a verdadeira dinâmica corporativa que assistimos de dentro da Purdue Pharma e os constrangedores embates entre os Sacklers, soam mais interessantes do que os dramas familiares e pessoais dos moradores da região dos Apalaches, na Virginia, onde vivem o Dr. Samuel Finnix (Michael Keaton) e Betsy Mallum (Kaitlyn Dever). Aliás, alguns plots desenvolvidos pelo criador e roteirista Danny Strong são até descartáveis - a relação homossexual de Betsy, embora faça sentido dentro de um determinado contexto, não empolga.
O roteiro, inclusive, consegue equilibrar muito bem um grande desafio que no livro "Dopesick: Dealers, Doctors, and the Drug Company that Addicted America" da autora Beth Macy, soa mais orgânico: a quebra temporal na construção da trama. Ao entender a dinâmica narrativa, onde a história passeia entre o presente, o passado e o futuro, temos a exata sensação sobre a complexidade dos fatos - o curioso (e genial) é que esse "vai e vem" nos permite experimentar emoções completamente distintas, mas que ao se complementarem, fortalece o convite para uma imersão extremamente profunda e empática pela jornada. Mesmo com um número enorme de personagens, nos importamos com muitos deles da mesma forma que execramos alguns outros.
Aliás, o elenco é um dos pontos mais altos de "Dopesick" - entre as categorias envolvendo atores e atrizes no Emmy 2022, foram 6 indicações, com Keaton saindo vencedor), Isso mostra o valor dos personagens secundários para a evolução da história - ainda que alguns tenham sido “sub aproveitados”, ter Rosario Dawson como agente da DEA, Bridget Meyer; Peter Sarsgaard e John Hoogenakker como os procuradores Rick Mountcastle e Randy Ramseyer, respectivamente; é um luxo. Will Poulter, que interpretou o jovem e sonhador vendedor, Billy Cutler, também merece elogios.
Com um visual belíssimo, uma trilha sonora incrível e um time de diretores muito competente, que contou até com Barry Levinson (de "O Mago das Mentiras"), "Dopesick" já pode ser considerada uma das melhores minisséries dos últimos anos, que não à toa recebeu 14 indicações ao Emmy 2002 e mais 40 em outras premiações importantes como do "Screen Actors Guild", "Globo de Ouro" e "Television Critics Association".
“Dopesick” tem tudo que uma minissérie precisa para ser inesquecível: uma produção irretocável, personagens muito bem construídos, um elenco acima da média e, claro, uma história impactante que nos faz refletir e olhar o ser humano de uma forma diferente (não necessariamente boa para todos).
Vale muito o seu play!
Antes de mais nada é preciso deixar claro que "Dor e Glória" é um filme do Almodóvar na sua forma e no seu conteúdo!
Primeiro vamos falar do conteúdo: o filme conta a história do diretor de cinema Salvador Mallo (Antonio Banderas) que vive mergulhado em uma amarga melancolia graças à fortes dores no seu corpo, principalmente nas costas, impossibilitando-o, inclusive, de amarrar seu tênis. Essa condição acaba impedindo Salvador de trabalhar normalmente, já que ele mesmo defende que a dinâmica de um set de filmagem requer muita energia, dedicação e saúde - elementos que ele não encontra mais em si! Conformado com sua nova condição, o cineasta é provocado a passar por um dolorido processo de auto-análise, se obrigando a revisitar o passado na busca de um único objetivo: encontrar o caminho para continuar sua vida, em paz!
Sim, "Dor e Glória" é um filme de enorme reflexão, saudosista e até egocêntrico (no melhor sentido da palavra), já que Salvador Mallo é o alter-ego do próprio Pedro Almodóvar, mas a forma (e é claro que vamos falar mais dela logo abaixo) como ele conduz sua história mexe com a gente, pois é impossível não pensar na nossa própria vida. Essa dinâmica é tão inteligente que projetamos um filme a cada assunto (ou momento) em que ele precisa enfrentar seus "demônios" e a entrega que ele faz no final é só mais um belíssimo detalhe para um fechamento com chave de ouro!
Olha, vale muito a pena se você estiver disposto a enfrentar um filme mais cadenciado, sem uma dinâmica narrativa que possa empolgar, mas que tem no texto e, principalmente, no subtexto, uma espécie de imersão emocional muito genuína e reflexiva! É preciso gostar de Almodóvar para não se decepcionar!
Quando partimos do princípio que Salvador já teve seus momentos de glória e que agora ele só consegue enxergar (ou sentir) a dor, física e emocional, facilmente nos conectamos com o belíssimo trabalho do Antonio Banderas - indicado ao Oscar por esse trabalho. Ele está impecável como Salvador Mallo e é preciso dar muito mérito ao Almodóvar por isso - ele é um exímio diretor de atores e foi capaz de tirar o melhor de um Banderas completamente mergulhado na psiquê do seu mentor e amigo. É muito interessante o contraste que o ator conseguiu imprimir no seu personagem: se por um lado ele está rodeado de cores vivas, arte e conforto, por outro lado ele está sozinho e é incapaz de se conectar com a forma com que ele via (e vivia) a vida - o fato do apartamento de Salvador ser do próprio Almodóvar, só fortalece essa sensação de conflito interno! Um detalhe interessante do roteiro (e que nos faz pensar em várias passagens do filme) é como a vida não nos permite "jogar a sujeira para baixo do tapete"; em algum momento ela vai trabalhar para que a gente possa, finalmente, resolver essas pendências. É muito inteligente como os "nós" vão sendo desatados sem precisar forçar a barra e quando achamos que existe um certo exagero (o que até seria perdoável pelo estilo do diretor) ele nos explica com um único movimento de câmera, exatamente na última cena - e tudo faz mais sentido! Genial! O roteiro toca em pontos delicados como a percepção sobre o homossexualismo logo na infância, a relação com a religião, com as drogas, com a mãe, com os parceiros de trabalho e de vida; enfim, tudo está lá e muito bem amarrado - eu não teria ficado surpreso se fosse indicado para o Oscar de melhor roteiro original!
A fotografia do seu parceiro de longa data (mais um), Jose Luis Alcaine, segue sua gramática visual: das cores vivas, do contraste, dos planos abertos e da câmera fixa em 90% do filme - enquadramentos que parecem uma pintura estão lá também! Outro elemento que precisa ser destacado é o elenco que, além de Bandeiras, conta com um Asier Etxeandia (Por siempre Jamón e Velvet) como o ator Alberto Crespo que ficou 30 anos brigado com Salvador por desentendimentos criativos (e de comportamento) e pela participação cirúrgica de Penélope Cruz (Volver) eJulieta Serrano (Cuando vuelvas a mi lado) como a mãe de Salvador, Jacinta: a primeira na juventude e a segunda pouco antes de sua morte - aliás o diálogo entre Jacinta e Salvador no final do filme é algo digno de muitos prêmios, de roteiro e de atuação!
"Dor e Glória" é um filme que teria mais chances no Oscar não fosse o fenômeno "Parasita". Sua história é profunda, baseada em um roteiro inteligente e em um personagem muito bem construído pelo Antonio Banderas. A direção do Pedro Almodóvar é tecnicamente perfeita e cheia de detalhes quase imperceptíveis, mas que fazem a diferença. Reparem como ele trabalha o silêncio dos atores e mesmo assim somos capazes de sentir exatamente o drama que eles estão passando - a cena onde Salvador se despede de Frederico na porta do seu apartamento é um ótimo exemplo de como o subtexto do filme é importante: ele diz uma coisa, mas seu olhar diz outra! É demais! Vale muito o seu play e se o estilo Almodóvar te agradar, você vai se divertir muito!
Antes de mais nada é preciso deixar claro que "Dor e Glória" é um filme do Almodóvar na sua forma e no seu conteúdo!
Primeiro vamos falar do conteúdo: o filme conta a história do diretor de cinema Salvador Mallo (Antonio Banderas) que vive mergulhado em uma amarga melancolia graças à fortes dores no seu corpo, principalmente nas costas, impossibilitando-o, inclusive, de amarrar seu tênis. Essa condição acaba impedindo Salvador de trabalhar normalmente, já que ele mesmo defende que a dinâmica de um set de filmagem requer muita energia, dedicação e saúde - elementos que ele não encontra mais em si! Conformado com sua nova condição, o cineasta é provocado a passar por um dolorido processo de auto-análise, se obrigando a revisitar o passado na busca de um único objetivo: encontrar o caminho para continuar sua vida, em paz!
Sim, "Dor e Glória" é um filme de enorme reflexão, saudosista e até egocêntrico (no melhor sentido da palavra), já que Salvador Mallo é o alter-ego do próprio Pedro Almodóvar, mas a forma (e é claro que vamos falar mais dela logo abaixo) como ele conduz sua história mexe com a gente, pois é impossível não pensar na nossa própria vida. Essa dinâmica é tão inteligente que projetamos um filme a cada assunto (ou momento) em que ele precisa enfrentar seus "demônios" e a entrega que ele faz no final é só mais um belíssimo detalhe para um fechamento com chave de ouro!
Olha, vale muito a pena se você estiver disposto a enfrentar um filme mais cadenciado, sem uma dinâmica narrativa que possa empolgar, mas que tem no texto e, principalmente, no subtexto, uma espécie de imersão emocional muito genuína e reflexiva! É preciso gostar de Almodóvar para não se decepcionar!
Quando partimos do princípio que Salvador já teve seus momentos de glória e que agora ele só consegue enxergar (ou sentir) a dor, física e emocional, facilmente nos conectamos com o belíssimo trabalho do Antonio Banderas - indicado ao Oscar por esse trabalho. Ele está impecável como Salvador Mallo e é preciso dar muito mérito ao Almodóvar por isso - ele é um exímio diretor de atores e foi capaz de tirar o melhor de um Banderas completamente mergulhado na psiquê do seu mentor e amigo. É muito interessante o contraste que o ator conseguiu imprimir no seu personagem: se por um lado ele está rodeado de cores vivas, arte e conforto, por outro lado ele está sozinho e é incapaz de se conectar com a forma com que ele via (e vivia) a vida - o fato do apartamento de Salvador ser do próprio Almodóvar, só fortalece essa sensação de conflito interno! Um detalhe interessante do roteiro (e que nos faz pensar em várias passagens do filme) é como a vida não nos permite "jogar a sujeira para baixo do tapete"; em algum momento ela vai trabalhar para que a gente possa, finalmente, resolver essas pendências. É muito inteligente como os "nós" vão sendo desatados sem precisar forçar a barra e quando achamos que existe um certo exagero (o que até seria perdoável pelo estilo do diretor) ele nos explica com um único movimento de câmera, exatamente na última cena - e tudo faz mais sentido! Genial! O roteiro toca em pontos delicados como a percepção sobre o homossexualismo logo na infância, a relação com a religião, com as drogas, com a mãe, com os parceiros de trabalho e de vida; enfim, tudo está lá e muito bem amarrado - eu não teria ficado surpreso se fosse indicado para o Oscar de melhor roteiro original!
A fotografia do seu parceiro de longa data (mais um), Jose Luis Alcaine, segue sua gramática visual: das cores vivas, do contraste, dos planos abertos e da câmera fixa em 90% do filme - enquadramentos que parecem uma pintura estão lá também! Outro elemento que precisa ser destacado é o elenco que, além de Bandeiras, conta com um Asier Etxeandia (Por siempre Jamón e Velvet) como o ator Alberto Crespo que ficou 30 anos brigado com Salvador por desentendimentos criativos (e de comportamento) e pela participação cirúrgica de Penélope Cruz (Volver) eJulieta Serrano (Cuando vuelvas a mi lado) como a mãe de Salvador, Jacinta: a primeira na juventude e a segunda pouco antes de sua morte - aliás o diálogo entre Jacinta e Salvador no final do filme é algo digno de muitos prêmios, de roteiro e de atuação!
"Dor e Glória" é um filme que teria mais chances no Oscar não fosse o fenômeno "Parasita". Sua história é profunda, baseada em um roteiro inteligente e em um personagem muito bem construído pelo Antonio Banderas. A direção do Pedro Almodóvar é tecnicamente perfeita e cheia de detalhes quase imperceptíveis, mas que fazem a diferença. Reparem como ele trabalha o silêncio dos atores e mesmo assim somos capazes de sentir exatamente o drama que eles estão passando - a cena onde Salvador se despede de Frederico na porta do seu apartamento é um ótimo exemplo de como o subtexto do filme é importante: ele diz uma coisa, mas seu olhar diz outra! É demais! Vale muito o seu play e se o estilo Almodóvar te agradar, você vai se divertir muito!
Você vai se surpreender com a qualidade narrativa e visual de "Doze Jurados"! Se em um primeiro momento a série da Één, emissora pública belga (mas que ganhou notoriedade ao ser distribuída mundialmente pela Netflix), soa como mais um drama jurídico, em poucos episódios você vai entender que além de uma crítica contundente sobre o sistema judicial da Bélgica, a história ainda expõe um elemento crucial que vai te provocar muitas reflexões: a parcialidade de um ser humano despreparado para uma determinada função. "De Twaalf" (no original) se diferencia pela forma como apresenta um estudo profundo do impacto emocional e psicológico de um julgamento de grande repercussão, tanto sobre os envolvidos diretamente no caso quanto (e especialmente) sobre os jurados. Criada por Sanne Nuyens, Bert Van Dael e Roel Mondelaers, a série traz uma abordagem até certo ponto inovadora, deixando os aspectos legais do julgamento apenas como complemento da narrativa para priorizar a vida pessoal dos jurados, cujas histórias individuais acabam influenciando suas percepções e decisões. "Doze Jurados" é uma trama complexa que vai além dos estereótipos das séries jurídicas tradicionais, oferecendo uma experiência realmente densa e emocionalmente impactante.
A premissa gira em torno de um julgamento que atrai grande atenção da mídia na Bélgica: Frie Palmers (Maaike Cafmeyer) é uma mulher divorciada acusada de dois assassinatos - da filha pequena e de sua melhor amiga. A série acompanha o desenrolar do processo do ponto de vista dos doze jurados que precisam decidir o destino de Frie. No entanto, enquanto o caso é exposto no tribunal, cada jurado traz para a corte suas próprias bagagens emocionais e questões pessoais, que acabam moldando a forma como cada um interpreta as evidências e os depoimentos das testemunhas, criando assim uma dinâmica capaz de destruir o que mais deveria importar: a busca pela verdade! Confira o trailer (com legendas em inglês):
Produzido pelaEyeworks Film, "Doze Jurados" brilha ao construir uma narrativa realmente envolvente que dá voz aos jurados, provocando um desconforto de fato angustiante ao expor que um julgamento não é apenas sobre a culpa ou a inocência, mas também sobre como a vida de cada um é afetada ao longo do processo. A série destaca o impacto que é ter que decidir o futuro de outra pessoa, mostrando como a vida dos jurados começam a se entrelaçar com o julgamento, trazendo para os holofotes dilemas pessoais, traumas e segredos que, intercaladas com o drama jurídico em si, cria uma jornada verdadeiramente rica em nuances como dificilmente encontramos no gênero. Veja, a roteiro mistura com sabedoria a tensão das cenas de tribunal com o desenvolvimento profundo dos personagens - especialmente nos flashbacks dos personagens. Essa proposta conceitual é eficaz em manter o ritmo da narrativa e entregar um certo tom de mistério em torno de todos os envolvidos no caso.
A direção de Wouter Bouvijn (de "1985") é precisa, com uma estética fria e claustrofóbica ao ponto de refletir o peso do julgamento com a mesma força que as tensões internas dos personagens - a câmera de Bouvijn tem um movimento quase documental, um identidade do cinema independente europeu e um timinig perfeito na construção do drama. Repare também como a fotografia utiliza bem o contraste entre os ambientes do tribunal, austeros e impessoais, com os momentos de intimidade dos jurados fora da corte, onde suas emoções ganham destaque quase sempre com uma lente fechada e um desfoque belíssimo do segundo plano. Essa proposta em criar o contrate visual entre o ambiente controlado do tribunal e a turbulência emocional do cotidiano ajuda demais a potencializar a atmosfera de crescente tensão - é impressionante como sentimos esse mood! As performances do elenco também merecem destaque, especialmente de Maaike Cafmeyer - ela traz uma intensidade contida que alimenta a ambiguidade da narrativa. Frie é retratada como uma mulher que oscila entre a dor e a frieza, o que nos mantém em dúvida sobre sua culpa ou inocência até o fim da temporada. Cafmeyer consegue transmitir essa ambiguidade com uma atuação sutil, sem exageros, o que torna seu personagem ainda mais intrigante. Outro nome que merece destaque é o de Maaike Neuville, a Delphine Spijkers - belíssimo trabalho.
"Doze Jurados" é um retrato realista do sistema de justiça e um recorte dos mais inteligente sobre a falibilidade humana. A série não oferece respostas fáceis; ao contrário, ela nos desafia a confrontar a complexidade de um julgamento pelos olhos da imperfeição humana, mostrando como nossas decisões são moldadas por nossas experiências pessoais e emoções. O roteiro, premiado no Cannes International Series Festival (ou para os mais íntimos, CannesSeries) sabe equilibrar diferentes narrativas de seus personagens, sem perder o foco no julgamento em si. eu diria que o golaço da série está na sua capacidade de escancarar a fragilidade e a subjetividade ao humanizar quem julga sem a propriedade de julgar!
Vale muito o seu play!
Você vai se surpreender com a qualidade narrativa e visual de "Doze Jurados"! Se em um primeiro momento a série da Één, emissora pública belga (mas que ganhou notoriedade ao ser distribuída mundialmente pela Netflix), soa como mais um drama jurídico, em poucos episódios você vai entender que além de uma crítica contundente sobre o sistema judicial da Bélgica, a história ainda expõe um elemento crucial que vai te provocar muitas reflexões: a parcialidade de um ser humano despreparado para uma determinada função. "De Twaalf" (no original) se diferencia pela forma como apresenta um estudo profundo do impacto emocional e psicológico de um julgamento de grande repercussão, tanto sobre os envolvidos diretamente no caso quanto (e especialmente) sobre os jurados. Criada por Sanne Nuyens, Bert Van Dael e Roel Mondelaers, a série traz uma abordagem até certo ponto inovadora, deixando os aspectos legais do julgamento apenas como complemento da narrativa para priorizar a vida pessoal dos jurados, cujas histórias individuais acabam influenciando suas percepções e decisões. "Doze Jurados" é uma trama complexa que vai além dos estereótipos das séries jurídicas tradicionais, oferecendo uma experiência realmente densa e emocionalmente impactante.
A premissa gira em torno de um julgamento que atrai grande atenção da mídia na Bélgica: Frie Palmers (Maaike Cafmeyer) é uma mulher divorciada acusada de dois assassinatos - da filha pequena e de sua melhor amiga. A série acompanha o desenrolar do processo do ponto de vista dos doze jurados que precisam decidir o destino de Frie. No entanto, enquanto o caso é exposto no tribunal, cada jurado traz para a corte suas próprias bagagens emocionais e questões pessoais, que acabam moldando a forma como cada um interpreta as evidências e os depoimentos das testemunhas, criando assim uma dinâmica capaz de destruir o que mais deveria importar: a busca pela verdade! Confira o trailer (com legendas em inglês):
Produzido pelaEyeworks Film, "Doze Jurados" brilha ao construir uma narrativa realmente envolvente que dá voz aos jurados, provocando um desconforto de fato angustiante ao expor que um julgamento não é apenas sobre a culpa ou a inocência, mas também sobre como a vida de cada um é afetada ao longo do processo. A série destaca o impacto que é ter que decidir o futuro de outra pessoa, mostrando como a vida dos jurados começam a se entrelaçar com o julgamento, trazendo para os holofotes dilemas pessoais, traumas e segredos que, intercaladas com o drama jurídico em si, cria uma jornada verdadeiramente rica em nuances como dificilmente encontramos no gênero. Veja, a roteiro mistura com sabedoria a tensão das cenas de tribunal com o desenvolvimento profundo dos personagens - especialmente nos flashbacks dos personagens. Essa proposta conceitual é eficaz em manter o ritmo da narrativa e entregar um certo tom de mistério em torno de todos os envolvidos no caso.
A direção de Wouter Bouvijn (de "1985") é precisa, com uma estética fria e claustrofóbica ao ponto de refletir o peso do julgamento com a mesma força que as tensões internas dos personagens - a câmera de Bouvijn tem um movimento quase documental, um identidade do cinema independente europeu e um timinig perfeito na construção do drama. Repare também como a fotografia utiliza bem o contraste entre os ambientes do tribunal, austeros e impessoais, com os momentos de intimidade dos jurados fora da corte, onde suas emoções ganham destaque quase sempre com uma lente fechada e um desfoque belíssimo do segundo plano. Essa proposta em criar o contrate visual entre o ambiente controlado do tribunal e a turbulência emocional do cotidiano ajuda demais a potencializar a atmosfera de crescente tensão - é impressionante como sentimos esse mood! As performances do elenco também merecem destaque, especialmente de Maaike Cafmeyer - ela traz uma intensidade contida que alimenta a ambiguidade da narrativa. Frie é retratada como uma mulher que oscila entre a dor e a frieza, o que nos mantém em dúvida sobre sua culpa ou inocência até o fim da temporada. Cafmeyer consegue transmitir essa ambiguidade com uma atuação sutil, sem exageros, o que torna seu personagem ainda mais intrigante. Outro nome que merece destaque é o de Maaike Neuville, a Delphine Spijkers - belíssimo trabalho.
"Doze Jurados" é um retrato realista do sistema de justiça e um recorte dos mais inteligente sobre a falibilidade humana. A série não oferece respostas fáceis; ao contrário, ela nos desafia a confrontar a complexidade de um julgamento pelos olhos da imperfeição humana, mostrando como nossas decisões são moldadas por nossas experiências pessoais e emoções. O roteiro, premiado no Cannes International Series Festival (ou para os mais íntimos, CannesSeries) sabe equilibrar diferentes narrativas de seus personagens, sem perder o foco no julgamento em si. eu diria que o golaço da série está na sua capacidade de escancarar a fragilidade e a subjetividade ao humanizar quem julga sem a propriedade de julgar!
Vale muito o seu play!
"Dreamgirls" (que no Brasil ganhou o subtítulo de "Em Busca de um Sonho") é uma verdadeira viagem pela "Black Music" através dos anos 60, 70 e 80, com suas releituras e o seu movimento (politico, social e cultural). Visualmente impecável, o filme é um musical bem construído e potente, que carrega em seus personagens o ritmo e o drama com a mesma importância, e mesmo que falte um aprofundamento maior nas histórias isoladas, o conjunto é praticamente impecável, realista e emocionante - um verdadeiro show!
Baseado no musical homônimo, que estreou na Broadway em 1981, "Dreamgirls" acompanha a jornada de Effie White (Jennifer Hudson), Deena Jones (Beyoncé) e Lorrell Robinson (Anika Noni Rose) que formam um grupo musical e começam a fazer sucesso com a ajuda de um empresário extremamente manipulador, Curtis Taylor Jr. (Jamie Foxx). Não demora para surgir tensões inconciliáveis entre as talentosas jovens quando Curtis resolve mudar a dinâmica do grupo para se ajustar a uma demanda do mercado. Confira o trailer (em inglês):
O roteiro do excelente Bill Condon (de "Deuses e Monstros" e "Chicago") adapta com muita qualidade o espetáculo de Tom Eyen e nos apresenta um trio fictício livremente inspirado na história de Diana Ross e as Supremes. O caminho entre a realidade e a ficção é praticamente o mesmo: três garotas de Detroit são descobertas pela recém-inagurada gravadora Motown ao fazerem muito sucesso com um ingênuo, mas envolvente, doo-wopda época. Logo depois, a líder, daquele estilo "Diva", com a voz mais potente, mas esteticamente menos atraente, é trocada pela integrante mais bonita, tudo isso para que o grupo emplaque nas paradas de sucesso. Daí vem a necessidade de se reinventar, custe o que custar, com o trio se moldando à moda musical de cada época, do soul ao disco music das décadas de 70 e 80.
O interessante porém, é que essa jornada de sucesso, conflitos, decadência e reinvenção é até melhor trabalhado pelo diretor do que pelo roteiro - não que a história seja ruim, mas o recorte temporal é muito extenso e com isso fica impossível se aprofundar nas peculiaridades de cada momento com o a mesma qualidade que vemos no prólogo. Condon que também dirige o filme, aplica um conceito estético muito particular, que equilibra perfeitamente a tradição dos musicais da Broadway com a modernidade das superproduções dos vídeo clipes para criar uma atmosfera cinematográfica bem alinhada com o mood da disrupção do cenário musical - mesmo respeitando as características mais marcantes de cada período.
"Dreamgirls" é belíssimo como musical e muito competente como drama. Se Beyoncé não pode ser considerada uma atriz de primeira linha, certamente ela também não decepciona ao encarnar, com muita propriedade, aquele perfil de cantora que se adapta a um novo momento da música negra. Por outro lado, a novata Jennifer Hudson rouba a cena assim que abre a boca - todos os seus solos são verdadeiros monólogos cantados, de se aplaudir de pé. Eddie Murphy como James 'Thunder' Early, uma mistura de James Brown com Marvin Gaye, alcança o grande papel dramático da sua carreira - ele está sensacional!
Entretenimento de primeira qualidade artística e técnica, com ritmo, cor, drama e muita emoção!
Pode dar o play sem o menor receio!
Up-date: "Dreamgirls" ganhou em duas categorias no Oscar 2007: Melhor Atriz Coadjuvante e Melhor Mixagem, mas esteve indicado em mais 4 categorias, sendo que em "Melhor Música" tinha três composições na disputa.
"Dreamgirls" (que no Brasil ganhou o subtítulo de "Em Busca de um Sonho") é uma verdadeira viagem pela "Black Music" através dos anos 60, 70 e 80, com suas releituras e o seu movimento (politico, social e cultural). Visualmente impecável, o filme é um musical bem construído e potente, que carrega em seus personagens o ritmo e o drama com a mesma importância, e mesmo que falte um aprofundamento maior nas histórias isoladas, o conjunto é praticamente impecável, realista e emocionante - um verdadeiro show!
Baseado no musical homônimo, que estreou na Broadway em 1981, "Dreamgirls" acompanha a jornada de Effie White (Jennifer Hudson), Deena Jones (Beyoncé) e Lorrell Robinson (Anika Noni Rose) que formam um grupo musical e começam a fazer sucesso com a ajuda de um empresário extremamente manipulador, Curtis Taylor Jr. (Jamie Foxx). Não demora para surgir tensões inconciliáveis entre as talentosas jovens quando Curtis resolve mudar a dinâmica do grupo para se ajustar a uma demanda do mercado. Confira o trailer (em inglês):
O roteiro do excelente Bill Condon (de "Deuses e Monstros" e "Chicago") adapta com muita qualidade o espetáculo de Tom Eyen e nos apresenta um trio fictício livremente inspirado na história de Diana Ross e as Supremes. O caminho entre a realidade e a ficção é praticamente o mesmo: três garotas de Detroit são descobertas pela recém-inagurada gravadora Motown ao fazerem muito sucesso com um ingênuo, mas envolvente, doo-wopda época. Logo depois, a líder, daquele estilo "Diva", com a voz mais potente, mas esteticamente menos atraente, é trocada pela integrante mais bonita, tudo isso para que o grupo emplaque nas paradas de sucesso. Daí vem a necessidade de se reinventar, custe o que custar, com o trio se moldando à moda musical de cada época, do soul ao disco music das décadas de 70 e 80.
O interessante porém, é que essa jornada de sucesso, conflitos, decadência e reinvenção é até melhor trabalhado pelo diretor do que pelo roteiro - não que a história seja ruim, mas o recorte temporal é muito extenso e com isso fica impossível se aprofundar nas peculiaridades de cada momento com o a mesma qualidade que vemos no prólogo. Condon que também dirige o filme, aplica um conceito estético muito particular, que equilibra perfeitamente a tradição dos musicais da Broadway com a modernidade das superproduções dos vídeo clipes para criar uma atmosfera cinematográfica bem alinhada com o mood da disrupção do cenário musical - mesmo respeitando as características mais marcantes de cada período.
"Dreamgirls" é belíssimo como musical e muito competente como drama. Se Beyoncé não pode ser considerada uma atriz de primeira linha, certamente ela também não decepciona ao encarnar, com muita propriedade, aquele perfil de cantora que se adapta a um novo momento da música negra. Por outro lado, a novata Jennifer Hudson rouba a cena assim que abre a boca - todos os seus solos são verdadeiros monólogos cantados, de se aplaudir de pé. Eddie Murphy como James 'Thunder' Early, uma mistura de James Brown com Marvin Gaye, alcança o grande papel dramático da sua carreira - ele está sensacional!
Entretenimento de primeira qualidade artística e técnica, com ritmo, cor, drama e muita emoção!
Pode dar o play sem o menor receio!
Up-date: "Dreamgirls" ganhou em duas categorias no Oscar 2007: Melhor Atriz Coadjuvante e Melhor Mixagem, mas esteve indicado em mais 4 categorias, sendo que em "Melhor Música" tinha três composições na disputa.
Se há um filme que merece ser destacado como uma obra imperdível do cinema contemporâneo, esse é "Drive My Car" (2021), dirigido magistralmente por Ryûsuke Hamaguchi (de "Roda do Destino"). Esta produção japonesa, vencedora do Oscar de Melhor Filme Internacional em 2022, não apenas cativa a audiência com uma narrativa emocionante como mas também eleva o cinema a novos patamares de excelência técnica e artística - mais uma vez quebrando as barreiras do idioma em diversas formas (eu diria, inclusive, de uma maneira bem metalinguística)! Vencedor de inúmeros prêmios em festivais ao redor do mundo, "Drive My Car" é uma jornada que transcende as fronteiras culturais, deixando uma marca profunda na alma e na mente de quem o assiste ao discutir temas como a morte, o arrependimento, a perseverança e a redenção, sempre chancelado pelo texto do indiscutível dramaturgo russo Anton Tchekhov e de seu "Tio Vanya" (de 1897). Olha, para os apreciadores de um cinema independente que busca uma experiência tão intensa quanto reflexiva, mas sem perder a sensibilidade, esse filme é um verdadeiro achado!
Na trama, conhecemos Yusuke Kafuku (Hidetoshi Nishijima), um renomado ator e diretor de teatro que se vê confrontado com uma devastadora perda pessoal. Quando ele recebe uma oferta para dirigir uma produção de "Tio Vanya" em Hiroshima, Yusuke mergulha em uma jornada de autoconhecimento e cura. Ao longo do caminho, ele desenvolve uma conexão improvável com a jovem motorista Misaki (Tôko Miura), que, embora inicialmente tensa, se transforma em uma relação de confiança e afeto, permitindo que ambos explorem seus traumas e encontrem uma redenção definitiva. Confira o trailer:
Um fato: "Drive My Car" é impressionante em vários sentidos. A maneira como Hamaguchi cadencia sua narrativa em troca de tecer camadas complexas de emoção e cheias de significado, onde cada cena funciona como uma espécie de quebra-cabeça íntimo, sem dúvida, é o ponto alto do filme. Nada está ali por acaso. A fotografia do Hidetoshi Shinomiya (de "O Grito"), por exemplo, captura a beleza melancólica daquela paisagem marcante de Hiroshima, enquanto a trilha sonora sutilmente evoca uma gama de sentimentos, desde a nostalgia até a esperança - tudo isso 100% alinhado com o conceito do diretor, mas sem precisar aparecer demais.
A direção de Hamaguchi é verdadeiramente inspiradora, permitindo que os momentos silenciosos e introspectivos da narrativa ressoem com um poder emocional como poucas vezes vemos. A cena de "Tio Vanya" e sua mensagem final, faz tudo fazer sentido sem uma única palavra precisar sem dita - é um espetáculo inesquecível! E aqui cabe mais alguns elogios: a montagem meticulosa do Azusa Yamazaki cria um ritmo hipnótico, nos convidando para uma jornada interior de uma forma visceral e envolvente, enquanto Nishijima entrega uma performance monumental, transmitindo a angústia de seu personagem com uma capacidade técnica exemplar - reparem como a dor e a fragilidade estão nos seus olhos a cada interação.
O fato é que "Drive My Car" não é nada fácil - daqueles filmes que apenas contam uma história e tudo bem. Aqui temos uma incrível experiência sensorial e emocional que fica gravada na memória muito depois que os créditos finais rolam. Com sua narrativa profundamente comovente, performances excepcionais e uma direção habilidosa, esse filme é daquelas obras que nos faz refletir sobre o luto, sobre a memória e sobre o poder da arte como ferramenta de cura e transformação!
Imperdível!
Up-date: "Drive My Car" ganhou em uma categoria no Oscar 2022 (como adiantamos), mas foi indicado em mais três: Direção, Roteiro Adaptado e até Melhor Filme do Ano!
Se há um filme que merece ser destacado como uma obra imperdível do cinema contemporâneo, esse é "Drive My Car" (2021), dirigido magistralmente por Ryûsuke Hamaguchi (de "Roda do Destino"). Esta produção japonesa, vencedora do Oscar de Melhor Filme Internacional em 2022, não apenas cativa a audiência com uma narrativa emocionante como mas também eleva o cinema a novos patamares de excelência técnica e artística - mais uma vez quebrando as barreiras do idioma em diversas formas (eu diria, inclusive, de uma maneira bem metalinguística)! Vencedor de inúmeros prêmios em festivais ao redor do mundo, "Drive My Car" é uma jornada que transcende as fronteiras culturais, deixando uma marca profunda na alma e na mente de quem o assiste ao discutir temas como a morte, o arrependimento, a perseverança e a redenção, sempre chancelado pelo texto do indiscutível dramaturgo russo Anton Tchekhov e de seu "Tio Vanya" (de 1897). Olha, para os apreciadores de um cinema independente que busca uma experiência tão intensa quanto reflexiva, mas sem perder a sensibilidade, esse filme é um verdadeiro achado!
Na trama, conhecemos Yusuke Kafuku (Hidetoshi Nishijima), um renomado ator e diretor de teatro que se vê confrontado com uma devastadora perda pessoal. Quando ele recebe uma oferta para dirigir uma produção de "Tio Vanya" em Hiroshima, Yusuke mergulha em uma jornada de autoconhecimento e cura. Ao longo do caminho, ele desenvolve uma conexão improvável com a jovem motorista Misaki (Tôko Miura), que, embora inicialmente tensa, se transforma em uma relação de confiança e afeto, permitindo que ambos explorem seus traumas e encontrem uma redenção definitiva. Confira o trailer:
Um fato: "Drive My Car" é impressionante em vários sentidos. A maneira como Hamaguchi cadencia sua narrativa em troca de tecer camadas complexas de emoção e cheias de significado, onde cada cena funciona como uma espécie de quebra-cabeça íntimo, sem dúvida, é o ponto alto do filme. Nada está ali por acaso. A fotografia do Hidetoshi Shinomiya (de "O Grito"), por exemplo, captura a beleza melancólica daquela paisagem marcante de Hiroshima, enquanto a trilha sonora sutilmente evoca uma gama de sentimentos, desde a nostalgia até a esperança - tudo isso 100% alinhado com o conceito do diretor, mas sem precisar aparecer demais.
A direção de Hamaguchi é verdadeiramente inspiradora, permitindo que os momentos silenciosos e introspectivos da narrativa ressoem com um poder emocional como poucas vezes vemos. A cena de "Tio Vanya" e sua mensagem final, faz tudo fazer sentido sem uma única palavra precisar sem dita - é um espetáculo inesquecível! E aqui cabe mais alguns elogios: a montagem meticulosa do Azusa Yamazaki cria um ritmo hipnótico, nos convidando para uma jornada interior de uma forma visceral e envolvente, enquanto Nishijima entrega uma performance monumental, transmitindo a angústia de seu personagem com uma capacidade técnica exemplar - reparem como a dor e a fragilidade estão nos seus olhos a cada interação.
O fato é que "Drive My Car" não é nada fácil - daqueles filmes que apenas contam uma história e tudo bem. Aqui temos uma incrível experiência sensorial e emocional que fica gravada na memória muito depois que os créditos finais rolam. Com sua narrativa profundamente comovente, performances excepcionais e uma direção habilidosa, esse filme é daquelas obras que nos faz refletir sobre o luto, sobre a memória e sobre o poder da arte como ferramenta de cura e transformação!
Imperdível!
Up-date: "Drive My Car" ganhou em uma categoria no Oscar 2022 (como adiantamos), mas foi indicado em mais três: Direção, Roteiro Adaptado e até Melhor Filme do Ano!
É praticamente impossível iniciar qualquer conversa sobre o excelente "Druk - mais uma rodada", sem pontuar que ele foi o grande vencedor da categoria "Filme Internacional" no Oscar de 2021 - isso sem falar nas mais de 60 vitórias que colecionou ao redor do mundo em festivais e premiações como Goya, César e Bafta, para citar só os "fora dos EUA". Dito isso, fica fácil atestar que o filme dirigido pelo "pra lá de talentoso", Thomas Vinterberg (do imperdível "A Caça"), é uma experiência cinematográfica universal que cativa a audiência desde os primeiros minutos até um emocionante desfecho. Essa obra, que explora a relação entre álcool e a vida cotidiana de maneira única, é uma verdadeira pérola do cinema contemporâneo que merece muito a sua atenção. Aliás, o que torna "Druk" tão especial assim é justamente a profundidade da narrativa e como a impecável performance do elenco, liderado por Mads Mikkelsen, estão tão bem alinhados ao ponto de abordar temas tão complexos com um toque impressionante de humanidade.
Em "Another Round" (no original) acompanhamos a história de quatro amigos, professores de meia-idade, interpretados por Mads Mikkelsen (Martin), Thomas Bo Larsen (Tommy), Magnus Millang (Nikolaj) e Lars Ranthe (Peter), que decidem embarcar em um experimento, no mínimo, ousado: manter um nível constante de álcool no sangue para melhorar suas vidas pessoais e profissionais. No início, essa aventura os leva a redescobrir o prazer da vida, mas, à medida que o experimento avança, eles se veem confrontando as consequências e desafios inesperados. Confira o trailer:
Não é preciso ser um especialista para perceber como Vinterberg (também indicado ao Oscar como "Melhor Diretor") e sua equipe técnica alcançam uma harmonia excepcional entre a direção, o texto, a fotografia e a trilha sonora. A cinematografia de Sturla Brandth Grovlen (de "Victoria") capta brilhantemente a transformação gradual dos personagens e sua crescente euforia à medida que seus níveis de álcool vão subindo e subindo. Essa "dança visual" espelha as oscilações emocionais dos protagonistas - o que deixa claro que tudo aquilo não passa de uma “ideia estúpida” pela óbvia possibilidade de se transformar em alcoolismo, no entanto existe um ponto a ser levado em conta: o olhar sobre as necessidades de cada um em termos de relações interpessoais. Reparem como a montagem de Janus Billeskov Jansen e a trilha sonoracomplementam de maneira sutil e eficaz os momentos de intensidade emocional, ressaltando toda aquela atmosfera envolvente do filme.
Mads Mikkelsen entrega uma das melhores performances de sua carreira - chega a ser impressionante o carisma tão raro para um ator escandinavo capaz de trazer complexidade e autenticidade ao personagem sem soar expositivo demais. Sua jornada de transformação como Martin, do professor desanimado até o homem redescobrindo sua paixão pela vida, é convincente e comovente ao mesmo tempo - o que na minha opinião justificaria sua indicação (já tardia) para o Oscar de Melhor Ator. Aliás, todo o elenco se destaca, cada qual com suas dores e alegrias, proporcionando um equilíbrio perfeito entre humor e drama como poucas vezes encontramos.
"Druk" é de fato uma obra que nos faz refletir sobre a nossa relação com o álcool, sobre a busca pela autenticidade na vida adulta e a importância de viver plenamente - esse contexto de crise de meia idade é bastante linear na sua previsibilidade, no entanto é envolvente e de fácil identificação. Com isso Vinterberg nos entrega uma verdadeira experiência emocional, que desafia expectativas, oferecendo uma certa crítica à hipocrisia social - se existe uma "moral da história" muito simples em favor da alegria de viver, não se deve deixar de discutir como uma sociedade é capaz de reconhecer sua patológica sensação de tédio e de fadiga espiritual tão "facilmente".Ao final, claro, o filme se propõe a deixar uma mensagem emocionalmente impactante sobre a importância de encontrar um equilíbrio na vida, no entanto saiba que aqui o interessante é mesmo a jornada, não o seu fim!
Vale muito o seu play!
É praticamente impossível iniciar qualquer conversa sobre o excelente "Druk - mais uma rodada", sem pontuar que ele foi o grande vencedor da categoria "Filme Internacional" no Oscar de 2021 - isso sem falar nas mais de 60 vitórias que colecionou ao redor do mundo em festivais e premiações como Goya, César e Bafta, para citar só os "fora dos EUA". Dito isso, fica fácil atestar que o filme dirigido pelo "pra lá de talentoso", Thomas Vinterberg (do imperdível "A Caça"), é uma experiência cinematográfica universal que cativa a audiência desde os primeiros minutos até um emocionante desfecho. Essa obra, que explora a relação entre álcool e a vida cotidiana de maneira única, é uma verdadeira pérola do cinema contemporâneo que merece muito a sua atenção. Aliás, o que torna "Druk" tão especial assim é justamente a profundidade da narrativa e como a impecável performance do elenco, liderado por Mads Mikkelsen, estão tão bem alinhados ao ponto de abordar temas tão complexos com um toque impressionante de humanidade.
Em "Another Round" (no original) acompanhamos a história de quatro amigos, professores de meia-idade, interpretados por Mads Mikkelsen (Martin), Thomas Bo Larsen (Tommy), Magnus Millang (Nikolaj) e Lars Ranthe (Peter), que decidem embarcar em um experimento, no mínimo, ousado: manter um nível constante de álcool no sangue para melhorar suas vidas pessoais e profissionais. No início, essa aventura os leva a redescobrir o prazer da vida, mas, à medida que o experimento avança, eles se veem confrontando as consequências e desafios inesperados. Confira o trailer:
Não é preciso ser um especialista para perceber como Vinterberg (também indicado ao Oscar como "Melhor Diretor") e sua equipe técnica alcançam uma harmonia excepcional entre a direção, o texto, a fotografia e a trilha sonora. A cinematografia de Sturla Brandth Grovlen (de "Victoria") capta brilhantemente a transformação gradual dos personagens e sua crescente euforia à medida que seus níveis de álcool vão subindo e subindo. Essa "dança visual" espelha as oscilações emocionais dos protagonistas - o que deixa claro que tudo aquilo não passa de uma “ideia estúpida” pela óbvia possibilidade de se transformar em alcoolismo, no entanto existe um ponto a ser levado em conta: o olhar sobre as necessidades de cada um em termos de relações interpessoais. Reparem como a montagem de Janus Billeskov Jansen e a trilha sonoracomplementam de maneira sutil e eficaz os momentos de intensidade emocional, ressaltando toda aquela atmosfera envolvente do filme.
Mads Mikkelsen entrega uma das melhores performances de sua carreira - chega a ser impressionante o carisma tão raro para um ator escandinavo capaz de trazer complexidade e autenticidade ao personagem sem soar expositivo demais. Sua jornada de transformação como Martin, do professor desanimado até o homem redescobrindo sua paixão pela vida, é convincente e comovente ao mesmo tempo - o que na minha opinião justificaria sua indicação (já tardia) para o Oscar de Melhor Ator. Aliás, todo o elenco se destaca, cada qual com suas dores e alegrias, proporcionando um equilíbrio perfeito entre humor e drama como poucas vezes encontramos.
"Druk" é de fato uma obra que nos faz refletir sobre a nossa relação com o álcool, sobre a busca pela autenticidade na vida adulta e a importância de viver plenamente - esse contexto de crise de meia idade é bastante linear na sua previsibilidade, no entanto é envolvente e de fácil identificação. Com isso Vinterberg nos entrega uma verdadeira experiência emocional, que desafia expectativas, oferecendo uma certa crítica à hipocrisia social - se existe uma "moral da história" muito simples em favor da alegria de viver, não se deve deixar de discutir como uma sociedade é capaz de reconhecer sua patológica sensação de tédio e de fadiga espiritual tão "facilmente".Ao final, claro, o filme se propõe a deixar uma mensagem emocionalmente impactante sobre a importância de encontrar um equilíbrio na vida, no entanto saiba que aqui o interessante é mesmo a jornada, não o seu fim!
Vale muito o seu play!
Definitivamente "Duck Butter" não é um filme fácil, mas dentro da sua proposta é um filme que me atraiu, principalmente por ser muito bem dirigido pelo Porto-riquenho Miguel Arteta - diretor que veio da TV e que fez um belo trabalho de direção de atores nesse filme. "Duck Butter" bebe na fonte do francês "La vie d'Adèle" (Azul é a cor mais quente), mas sem a mesma força, na minha opinião.
O filme trata da relação entre duas jovens completamente diferentes que, por circunstâncias de vida, acabam se aproximando e vivendo uma intensa relação de 24 horas que vai minguando de acordo com a aproximação da realidade que é a vida e que é estar em uma relação! É preciso dizer que o filme é intenso no conteúdo e na maneira de expor essas "imperfeições" do ser humano. É um filme que discute até quanto "mandar tudo a m..." é um caminho a se considerar.
Miguel Arteta tem sensibilidade e aplica isso nas escolhas que faz com sua diretora de fotografia Hillary Spera. O filme foi finalista no Tribeca Film Festival de 2018 e tem como grande nome a Laia Costa uma jovem e talentosa atriz que merece atenção pelo seu trabalho - é o segundo filme que assisto dela (o primeiro foi "Newness") e em ambos ela mandou muito bem!
Filme complicado, mas para quem gosta de filmes independentes com ótima carreira em Festivais, é imperdível!!!
Definitivamente "Duck Butter" não é um filme fácil, mas dentro da sua proposta é um filme que me atraiu, principalmente por ser muito bem dirigido pelo Porto-riquenho Miguel Arteta - diretor que veio da TV e que fez um belo trabalho de direção de atores nesse filme. "Duck Butter" bebe na fonte do francês "La vie d'Adèle" (Azul é a cor mais quente), mas sem a mesma força, na minha opinião.
O filme trata da relação entre duas jovens completamente diferentes que, por circunstâncias de vida, acabam se aproximando e vivendo uma intensa relação de 24 horas que vai minguando de acordo com a aproximação da realidade que é a vida e que é estar em uma relação! É preciso dizer que o filme é intenso no conteúdo e na maneira de expor essas "imperfeições" do ser humano. É um filme que discute até quanto "mandar tudo a m..." é um caminho a se considerar.
Miguel Arteta tem sensibilidade e aplica isso nas escolhas que faz com sua diretora de fotografia Hillary Spera. O filme foi finalista no Tribeca Film Festival de 2018 e tem como grande nome a Laia Costa uma jovem e talentosa atriz que merece atenção pelo seu trabalho - é o segundo filme que assisto dela (o primeiro foi "Newness") e em ambos ela mandou muito bem!
Filme complicado, mas para quem gosta de filmes independentes com ótima carreira em Festivais, é imperdível!!!
Antes de mais nada, obrigado Nolan (mais uma vez)!!! "Dunkirk" é sensacional e importante!!! Sensacional porque, de cara, o Nolan já nos coloca dentro da Guerra, mais ou menos como o Spielberg fez naquela sequência inesquecível da chegada dos soldados na praia de Omaha em "O Resgate do Soldado Ryan", e importante porque ele faz isso usando o melhor da tecnologia que um Diretor pode ter nas mãos nos dias de hoje para contar uma história tão visceral com um equilíbrio cirúrgico!!!
A Operação Dínamo, também conhecida como o Milagre de Dunkirk, foi uma notável operação militar da Segunda Guerra Mundial, onde mais de trezentos mil soldados aliados foram salvos durante um intenso bombardeio durante a invasão da França pelas tropas de Hitler. Milagrosamente e devido a uma inexplicável reviravolta na estratégia alemã, os soldados conseguiram escapar pelo mar até a cidade inglesa de Dover, com ajuda de centenas de de civis que participaram do resgate!
Bom, dito isso, a primeira dica que eu daria é: assista no Imax - o filme foi pensado para esse tipo de tela e com todos os recursos de Imagem e Som que uma sala como essa proporciona (Spielberg não teve essa sorte em 1998, infelizmente). O fato dele ter rodado em 70mm boa parte do filme te coloca dentro daquela situação que os personagens estão vivendo sem pedir licença, pois amplia o tamanho da imagens com muito mais qualidade visual. É tão visceral a direção do Nolan que chega a ser angustiante - era uma experiência realmente intensa assistir no Imax! Já que isso não será mais possível, procure assistir na maior tela que você conseguir e com o melhor sistema de som disponível (e, por favor, alto!). Os enquadramentos, o desenho de som e a trilha (genial por sinal) do Hans Zimmer estão tão alinhados que a imersão é imediata e quando você percebe já está "sofrendo" dentro daquele inferno - e é um inferno, acredite!
Tenho que admitir que esse "soco na ponta do queixo" técnico me afastou um pouco de outra escolha do diretor (e do roteirista) que acabou me confundindo um pouco, então preste atenção que só melhora: ele une períodos de tempo diferentes em uma mesma linha narrativa – a trajetória de um dos personagens acontece em uma semana na praia, onde o jovem soldado Tommy (Fionn Whitehead) busca escapar a qualquer preço, a de um outro é durante um dia em alto mar com o civil britânico Dawson (Mark Rylance) levando seu barco de passeio para ajudar a resgatar o exército de seu país e um terceiro, apenas em uma hora, onde o piloto Farrier (Tom Hardy) precisa destruir um avião inimigo; mas todas essa histórias acontecem em um mesmo evento e simultaneamente, graças a uma edição muito interessante! Minha falta de atenção inicial acabou me causando um estranhamento, pois parecia que os caras haviam errado na continuidade (o que seria um absurdo), mas assim que acaba o filme e você reflete sobre ele, fica fácil lembrar dos letterings que apresentavam essas escolhas narrativas e tudo acaba fazendo muito sentido - e como se o filme não acabasse após os créditos!
"Dunkirk" é daqueles filmes tão essenciais quanto foi "Gravidade". Daqueles filmes que sobem um degrau do gênero pela genialidade do Diretor (e equipe), e que mesmo sem um roteiro fabuloso, visualmente te permite viver uma experiência única e muito pessoal a cada cena, como o cinema deve ser - "1917" que o diga! Edição de Som e Mixagem tem tudo para ser barbada no Oscar 2018, mas tenho a impressão que leva pelo menos mais umas 2 estatuetas já que tudo funciona tão bem! Ah, um detalhe sobre a fotografia que eu achei genial: em determinados momentos do filme, vem um look meio antigo, quase como em um jogo "Medal of Honor" e mais uma vez fica perceptível que nada que está ali é por acaso! É lindo!
Não deixe de assistir, sério!!! Sem dúvida um dos melhores filmes de 2017
Up-date: "Dunkirk" ganhou em três categorias no Oscar 2020, das 8 que foi indicado: Melhor Edição de Som, Melhor Mixagem e Melhor Edição!
Antes de mais nada, obrigado Nolan (mais uma vez)!!! "Dunkirk" é sensacional e importante!!! Sensacional porque, de cara, o Nolan já nos coloca dentro da Guerra, mais ou menos como o Spielberg fez naquela sequência inesquecível da chegada dos soldados na praia de Omaha em "O Resgate do Soldado Ryan", e importante porque ele faz isso usando o melhor da tecnologia que um Diretor pode ter nas mãos nos dias de hoje para contar uma história tão visceral com um equilíbrio cirúrgico!!!
A Operação Dínamo, também conhecida como o Milagre de Dunkirk, foi uma notável operação militar da Segunda Guerra Mundial, onde mais de trezentos mil soldados aliados foram salvos durante um intenso bombardeio durante a invasão da França pelas tropas de Hitler. Milagrosamente e devido a uma inexplicável reviravolta na estratégia alemã, os soldados conseguiram escapar pelo mar até a cidade inglesa de Dover, com ajuda de centenas de de civis que participaram do resgate!
Bom, dito isso, a primeira dica que eu daria é: assista no Imax - o filme foi pensado para esse tipo de tela e com todos os recursos de Imagem e Som que uma sala como essa proporciona (Spielberg não teve essa sorte em 1998, infelizmente). O fato dele ter rodado em 70mm boa parte do filme te coloca dentro daquela situação que os personagens estão vivendo sem pedir licença, pois amplia o tamanho da imagens com muito mais qualidade visual. É tão visceral a direção do Nolan que chega a ser angustiante - era uma experiência realmente intensa assistir no Imax! Já que isso não será mais possível, procure assistir na maior tela que você conseguir e com o melhor sistema de som disponível (e, por favor, alto!). Os enquadramentos, o desenho de som e a trilha (genial por sinal) do Hans Zimmer estão tão alinhados que a imersão é imediata e quando você percebe já está "sofrendo" dentro daquele inferno - e é um inferno, acredite!
Tenho que admitir que esse "soco na ponta do queixo" técnico me afastou um pouco de outra escolha do diretor (e do roteirista) que acabou me confundindo um pouco, então preste atenção que só melhora: ele une períodos de tempo diferentes em uma mesma linha narrativa – a trajetória de um dos personagens acontece em uma semana na praia, onde o jovem soldado Tommy (Fionn Whitehead) busca escapar a qualquer preço, a de um outro é durante um dia em alto mar com o civil britânico Dawson (Mark Rylance) levando seu barco de passeio para ajudar a resgatar o exército de seu país e um terceiro, apenas em uma hora, onde o piloto Farrier (Tom Hardy) precisa destruir um avião inimigo; mas todas essa histórias acontecem em um mesmo evento e simultaneamente, graças a uma edição muito interessante! Minha falta de atenção inicial acabou me causando um estranhamento, pois parecia que os caras haviam errado na continuidade (o que seria um absurdo), mas assim que acaba o filme e você reflete sobre ele, fica fácil lembrar dos letterings que apresentavam essas escolhas narrativas e tudo acaba fazendo muito sentido - e como se o filme não acabasse após os créditos!
"Dunkirk" é daqueles filmes tão essenciais quanto foi "Gravidade". Daqueles filmes que sobem um degrau do gênero pela genialidade do Diretor (e equipe), e que mesmo sem um roteiro fabuloso, visualmente te permite viver uma experiência única e muito pessoal a cada cena, como o cinema deve ser - "1917" que o diga! Edição de Som e Mixagem tem tudo para ser barbada no Oscar 2018, mas tenho a impressão que leva pelo menos mais umas 2 estatuetas já que tudo funciona tão bem! Ah, um detalhe sobre a fotografia que eu achei genial: em determinados momentos do filme, vem um look meio antigo, quase como em um jogo "Medal of Honor" e mais uma vez fica perceptível que nada que está ali é por acaso! É lindo!
Não deixe de assistir, sério!!! Sem dúvida um dos melhores filmes de 2017
Up-date: "Dunkirk" ganhou em três categorias no Oscar 2020, das 8 que foi indicado: Melhor Edição de Som, Melhor Mixagem e Melhor Edição!
"É apenas o Fim do Mundo" é um filme difícil, não por uma narrativa complicada ou por um conceito visual ou estético que nos provoque muito mais do que nos mostre; mas pela forma como o jovem diretor canadense Xavier Dolan constrói um espetáculo onde os personagens são profundos, machucados, amargurados e inconsequentes em seus atos e, pricipalmente, em suas palavras. É perceptível a dor enrustida em cada um deles, com motivos, claro, mas sem nenhum controle ou respiro para reflexão. É um "misancene" tão real, palpável e comum, que chega a ferir quem assiste - pelo simples fato de entender que toda história tem dois lados e mesmo sem a coragem de encarar os fatos, todos preferem em alimentar a dor, do que ter que enfrentá-la.
Baseado na peça homônima de Jean-Luc Lagarce de 1990, "É apenas o Fim do Mundo" acompanha um jovem e renomado dramaturgo, Louis (Gaspard Ulliel), que resolve visitar sua família após 12 anos de ausência. Seu objetivo, no entanto, é revelar sua iminente morte para sua mãe (Nathalie Baye), para sua irmã mais nova (Léa Seydoux) com quem praticamente não se relacionou, para o ressentido irmão mais velho (Vincent Cassel) e sua submissa esposa (Marion Cottilard). Confira o trailer:
Xavier Dolan praticamente dirige o filme com uma lente 85mm, ou seja, com planos extremamente fechado ele parece querer que as almas dos personagens sejam lidas, e vou te dizer: funciona! As relações estabelecidas assim que Louis entra na casa de sua família já nos indica exatamente onde estamos nos enfiando - no caos emocional! Ao acompanhar essa dinâmica, o roteiro nos dá o primeiro gatilho: é compreensível que Louis tenha se mantido afastado de sua família por tanto tempo, limitando-se a enviar cartões em datas comemorativas. Mas com o passar do tempo, vem o segundo e poderoso gatilho: mas e o outro lado? E o sentimento de inferioridade e inadequação do irmão mais velho? E a ansiedade de Suzanne para impressionar o irmão famoso que pouco conhece? E a tentativa da mãe em transformar tantas mágoas e recuperar essas relações completamente fragmentadas? Até Catherine, a cunhada, sofre com os reflexos de tudo isso ao ter que lidar com um marido ignorante que a transformou em uma mulher insegura que mal pode se expressar - e aqui cabe um comentário que merece sua atenção: Marion Cottilard é uma grande atriz e todos sabemos disso, mas a capacidade que ela tem de expressar seus sentimentos apenas com o olhar, é de cair o queixo! Reparem!
O filme brilha ao expor a capacidade de interpretação dos atores. "É apenas o Fim do Mundo" é um filme de diálogos, de confrontos, de atuação! Nenhuma discussão é por acaso e tudo ajuda a construir (ou desvendar) as inúmeras camadas de cada um dos personagens - estamos falando de um obra independente, autoral, de relação, com uma referência teatral enorme, cheio de poesia, metáforas, símbolos, sensibilidade - inclusive na fotografia que pontua a troca de atmosferas e a distância entre o que é dito e o que é pensado - a mudança de luz no terceiro ato, entre a chuva e o sol que surge é incrível! Isso é lindo e muito difícil de equilibrar com o realismo que o cinema pede nesse tipo de filme.
O fato é que se você gostou dos também franceses "Até a Eternidade" (ou Les Petits Mouchoirs) ou "Frankie" é muito provável que você vai se identificar com "É apenas o Fim do Mundo", mas se prepare: vai doer na alma!
"É apenas o Fim do Mundo" é um filme difícil, não por uma narrativa complicada ou por um conceito visual ou estético que nos provoque muito mais do que nos mostre; mas pela forma como o jovem diretor canadense Xavier Dolan constrói um espetáculo onde os personagens são profundos, machucados, amargurados e inconsequentes em seus atos e, pricipalmente, em suas palavras. É perceptível a dor enrustida em cada um deles, com motivos, claro, mas sem nenhum controle ou respiro para reflexão. É um "misancene" tão real, palpável e comum, que chega a ferir quem assiste - pelo simples fato de entender que toda história tem dois lados e mesmo sem a coragem de encarar os fatos, todos preferem em alimentar a dor, do que ter que enfrentá-la.
Baseado na peça homônima de Jean-Luc Lagarce de 1990, "É apenas o Fim do Mundo" acompanha um jovem e renomado dramaturgo, Louis (Gaspard Ulliel), que resolve visitar sua família após 12 anos de ausência. Seu objetivo, no entanto, é revelar sua iminente morte para sua mãe (Nathalie Baye), para sua irmã mais nova (Léa Seydoux) com quem praticamente não se relacionou, para o ressentido irmão mais velho (Vincent Cassel) e sua submissa esposa (Marion Cottilard). Confira o trailer:
Xavier Dolan praticamente dirige o filme com uma lente 85mm, ou seja, com planos extremamente fechado ele parece querer que as almas dos personagens sejam lidas, e vou te dizer: funciona! As relações estabelecidas assim que Louis entra na casa de sua família já nos indica exatamente onde estamos nos enfiando - no caos emocional! Ao acompanhar essa dinâmica, o roteiro nos dá o primeiro gatilho: é compreensível que Louis tenha se mantido afastado de sua família por tanto tempo, limitando-se a enviar cartões em datas comemorativas. Mas com o passar do tempo, vem o segundo e poderoso gatilho: mas e o outro lado? E o sentimento de inferioridade e inadequação do irmão mais velho? E a ansiedade de Suzanne para impressionar o irmão famoso que pouco conhece? E a tentativa da mãe em transformar tantas mágoas e recuperar essas relações completamente fragmentadas? Até Catherine, a cunhada, sofre com os reflexos de tudo isso ao ter que lidar com um marido ignorante que a transformou em uma mulher insegura que mal pode se expressar - e aqui cabe um comentário que merece sua atenção: Marion Cottilard é uma grande atriz e todos sabemos disso, mas a capacidade que ela tem de expressar seus sentimentos apenas com o olhar, é de cair o queixo! Reparem!
O filme brilha ao expor a capacidade de interpretação dos atores. "É apenas o Fim do Mundo" é um filme de diálogos, de confrontos, de atuação! Nenhuma discussão é por acaso e tudo ajuda a construir (ou desvendar) as inúmeras camadas de cada um dos personagens - estamos falando de um obra independente, autoral, de relação, com uma referência teatral enorme, cheio de poesia, metáforas, símbolos, sensibilidade - inclusive na fotografia que pontua a troca de atmosferas e a distância entre o que é dito e o que é pensado - a mudança de luz no terceiro ato, entre a chuva e o sol que surge é incrível! Isso é lindo e muito difícil de equilibrar com o realismo que o cinema pede nesse tipo de filme.
O fato é que se você gostou dos também franceses "Até a Eternidade" (ou Les Petits Mouchoirs) ou "Frankie" é muito provável que você vai se identificar com "É apenas o Fim do Mundo", mas se prepare: vai doer na alma!
"E então nós dançamos" é um belíssimo e sensível filme sobre a aceitação da homossexualidade em diversas esferas da sociedade, bem na linha de "Me chame pelo seu nome" - obviamente que respeitando suas particularidades culturais e talvez esteja aí o grande trunfo do roteiro, já que a história se passa na Geórgia, país extremamente preconceituoso, onde a figura do homem é exaltada e onde até o seu tradicional ballet se baseia em "movimentos masculinizados e de força impositiva".
O jovem Merab (Levan Gelbakhiani) faz parte de uma companhia georgiana de dança folclórica, seguindo os passos do pai. Descontente com a vida de precariedade financeira e o baixo reconhecimento artístico, ele tem sua vida transformada pela chegada de Irakli (Bachi Valishvili), dançarino novato que disputa com ele a mesma vaga em uma importante audição que pode coloca-lo no elenco principal do National Georgian Ensemble. Porém Merab descobre, pela primeira vez, sua paixão por outro rapaz, dentro de um contexto homofóbico e, não surpreendente, violento. Confira o trailer:
Como no já referenciado "Me chame pelo seu nome", esse premiado filme vindo da Geórgia deixa claro, já nos seus primeiros minutos, qual é o seu objetivo: assim que o novato Irakli entra na sala de dança onde se encontra com Merab, sabemos que os dois ficarão juntos em algum momento do filme, mesmo que o diretor sueco Levan Akin (de "O Círculo") sugira que a disputa será pelo protagonismo da companhia de dança. A grande questão, no entanto, ganha mais profundidade quando o comentário sobre um colega gay que foi agredido e expulso da companhia vem à tona - é a partir desse gatilho que Akin começa a construir as angústias e euforias das descobertas de Merab e até de Irakli.
Veja, ao mesmo tempo que Merab descobre uma nova paixão, é o seu amor pela dança que pode afasta-lo da felicidade - e mais uma vez o roteiro se aprofunda em questionar: onde está a felicidade? Essas nuances vão e voltam a cada aproximação entre os personagens em seus diversos ambientes sociais - essa dinâmica faz com que tenhamos a sensação de que, em outro país, o protagonista faria parte um grupo e encontraria seu caminho com mais tranquilidade, mas a barreira está na tradição cultural, na mente fechada da sociedade georgiana. Seja no ambiente familiar, caótico por sinal, no grupo de dança e até nas reuniões com os amigos, a história deixa claro que o homem precisa se relacionar com a mulher. Uma das cenas mais emblemáticas, na minha opinião, é quando Mary (Ana Javakishvili), parceira de dança e amiga intima de Merab, mostra uma camisinha, convidando ele para uma relação sexual casual que, obviamente, ele se esquiva.
"E então nós dançamos" é uma drama de relação onde o pano de fundo é a dança. Dito isso é de se esperar cenas bem coreografadas e culturalmente relevantes para nós que assistimos a produção do outro lado do planeta. Destaco as passagens ao som de ‘Take a Chance on Me’ do ABBA, e ‘Honey’, de Robyn; além da excelente cena final ao melhor estilo "Cisne Negro" / "Flashdance". Muito bem dirigido por Akin (reparem no complexo plano-sequência durante o casamento do irmão do protagonista), o cinema georgiano debuta com classe por aqui e por isso a recomendação - mesmo sabendo que apenas um pequeno nicho dos nosso usuários vão se relacionar bem com a história. Uma pena, já que o filme tem muita qualidade e mereceria maior atenção!
Vale seu play!
"E então nós dançamos" é um belíssimo e sensível filme sobre a aceitação da homossexualidade em diversas esferas da sociedade, bem na linha de "Me chame pelo seu nome" - obviamente que respeitando suas particularidades culturais e talvez esteja aí o grande trunfo do roteiro, já que a história se passa na Geórgia, país extremamente preconceituoso, onde a figura do homem é exaltada e onde até o seu tradicional ballet se baseia em "movimentos masculinizados e de força impositiva".
O jovem Merab (Levan Gelbakhiani) faz parte de uma companhia georgiana de dança folclórica, seguindo os passos do pai. Descontente com a vida de precariedade financeira e o baixo reconhecimento artístico, ele tem sua vida transformada pela chegada de Irakli (Bachi Valishvili), dançarino novato que disputa com ele a mesma vaga em uma importante audição que pode coloca-lo no elenco principal do National Georgian Ensemble. Porém Merab descobre, pela primeira vez, sua paixão por outro rapaz, dentro de um contexto homofóbico e, não surpreendente, violento. Confira o trailer:
Como no já referenciado "Me chame pelo seu nome", esse premiado filme vindo da Geórgia deixa claro, já nos seus primeiros minutos, qual é o seu objetivo: assim que o novato Irakli entra na sala de dança onde se encontra com Merab, sabemos que os dois ficarão juntos em algum momento do filme, mesmo que o diretor sueco Levan Akin (de "O Círculo") sugira que a disputa será pelo protagonismo da companhia de dança. A grande questão, no entanto, ganha mais profundidade quando o comentário sobre um colega gay que foi agredido e expulso da companhia vem à tona - é a partir desse gatilho que Akin começa a construir as angústias e euforias das descobertas de Merab e até de Irakli.
Veja, ao mesmo tempo que Merab descobre uma nova paixão, é o seu amor pela dança que pode afasta-lo da felicidade - e mais uma vez o roteiro se aprofunda em questionar: onde está a felicidade? Essas nuances vão e voltam a cada aproximação entre os personagens em seus diversos ambientes sociais - essa dinâmica faz com que tenhamos a sensação de que, em outro país, o protagonista faria parte um grupo e encontraria seu caminho com mais tranquilidade, mas a barreira está na tradição cultural, na mente fechada da sociedade georgiana. Seja no ambiente familiar, caótico por sinal, no grupo de dança e até nas reuniões com os amigos, a história deixa claro que o homem precisa se relacionar com a mulher. Uma das cenas mais emblemáticas, na minha opinião, é quando Mary (Ana Javakishvili), parceira de dança e amiga intima de Merab, mostra uma camisinha, convidando ele para uma relação sexual casual que, obviamente, ele se esquiva.
"E então nós dançamos" é uma drama de relação onde o pano de fundo é a dança. Dito isso é de se esperar cenas bem coreografadas e culturalmente relevantes para nós que assistimos a produção do outro lado do planeta. Destaco as passagens ao som de ‘Take a Chance on Me’ do ABBA, e ‘Honey’, de Robyn; além da excelente cena final ao melhor estilo "Cisne Negro" / "Flashdance". Muito bem dirigido por Akin (reparem no complexo plano-sequência durante o casamento do irmão do protagonista), o cinema georgiano debuta com classe por aqui e por isso a recomendação - mesmo sabendo que apenas um pequeno nicho dos nosso usuários vão se relacionar bem com a história. Uma pena, já que o filme tem muita qualidade e mereceria maior atenção!
Vale seu play!
Como "Modern Love" da Prime Vídeo, "Easy", produção original da Netflix, é uma série deliciosa de assistir e que usa de um conceito narrativo muito inteligente para falar "basicamente" de relacionamentos - em diferentes pontos, perspectivas, gêneros, etc. O interessante é que o talento do diretor Joe Swanberg (de "Love") traz para o projeto um tom extremamente realista, com personagens tão complexos quanto palpáveis, onde as situações se apoiam muito mais nas consequências das decisões tomadas por eles do que apenas na aparente superficialidade do que causou determinada situação - e é por isso que nos identificamos com esses dramas.
A história é simples, mas nem por isso simplista - em 8 episódios, "Easy" acompanha um grupo de jovens que moram em Chicago e que acabam se atrapalhando com o moderno labirinto do amor. Cada qual da sua maneira, os personagens precisam lidar com as dificuldades de suas relações, seja no sexo, pela tecnologia ou até enfrentando as novas perspectivas de uma cultura que passou a ser tão presente em nossas decisões cotidianas. Confira o trailer:
Saber tratar de forma tão honesta (e original) vários tipos de conflitos pessoais, de casais tão diferentes, mas que se encontram em algum buraco de suas vidas, faz de "Easy" uma das séries mais interessantes desse gênero - o equilíbrio entre o drama e a comédia é cirúrgico. Swanberg, aliás, se apropria do estilo mumblecore para impactar a audiência com uma realidade quase que visceral. Para quem não sabe, esse é um movimento cinematográfico que funciona como uma espécie de sub-gênero do cinema independente, onde a atmosfera da narrativa é a mais natural possível, sendo comum ver improvisos entre os atores em cena, muitos deles amadores ou desconhecidos em um ambiente completamente naturalista que chega a dispensar a iluminação artificial e onde a câmera documental funciona como uma espécie de observador onipresente.
É claro que os próprios roteiros sustentam essa escolha conceitual - eles são excelentes e como os atores são ótimos, até mesmo quando os planos são mais longos (e têm vários) os diálogos não se perdem em futilidades ou esteriótipos de gênero. Aqui cabe um comentário: alguns anos atrás assisti duas séries inglesas com o mesmo conceito e seguindo o mesmo gênero: "Dates" e "True Love". Para quem sabe do que estou falando, "Easy" traz um pouco dessas duas produções, talvez com um pouco menos de sutileza no texto e de uma fotografia mais autoral, mas com um resultado igualmente elogiável.
Uma grande vantagem das séries que possuem o formato de antologia é o de poder contar histórias que não precisem necessariamente se conectar uma nas outras - essa estrutura de fato se repete em sete episódios, porém no oitavo revisitamos alguns personagens e entendemos que tudo que foi visto até ali poderá ter suas consequências - e de fato se provou assim na segunda e terceira temporadas. Embora seja uma série mais de nicho, ou menos ritmada (como preferir), sua trama chega carregada de profundas discussões, com tantas camadas e assuntos que temos a exata sensação de que conhecemos alguém que vive (ou viveu) algo parecido com os dramas dos protagonistas.
"Easy" é mais uma daquelas que indico de olhos fechados para quem gosta desse tipo de série, ainda mais sabendo que a Netflix se planejou e produziu um final já na terceira temporada! Vale muito o seu play!
Como "Modern Love" da Prime Vídeo, "Easy", produção original da Netflix, é uma série deliciosa de assistir e que usa de um conceito narrativo muito inteligente para falar "basicamente" de relacionamentos - em diferentes pontos, perspectivas, gêneros, etc. O interessante é que o talento do diretor Joe Swanberg (de "Love") traz para o projeto um tom extremamente realista, com personagens tão complexos quanto palpáveis, onde as situações se apoiam muito mais nas consequências das decisões tomadas por eles do que apenas na aparente superficialidade do que causou determinada situação - e é por isso que nos identificamos com esses dramas.
A história é simples, mas nem por isso simplista - em 8 episódios, "Easy" acompanha um grupo de jovens que moram em Chicago e que acabam se atrapalhando com o moderno labirinto do amor. Cada qual da sua maneira, os personagens precisam lidar com as dificuldades de suas relações, seja no sexo, pela tecnologia ou até enfrentando as novas perspectivas de uma cultura que passou a ser tão presente em nossas decisões cotidianas. Confira o trailer:
Saber tratar de forma tão honesta (e original) vários tipos de conflitos pessoais, de casais tão diferentes, mas que se encontram em algum buraco de suas vidas, faz de "Easy" uma das séries mais interessantes desse gênero - o equilíbrio entre o drama e a comédia é cirúrgico. Swanberg, aliás, se apropria do estilo mumblecore para impactar a audiência com uma realidade quase que visceral. Para quem não sabe, esse é um movimento cinematográfico que funciona como uma espécie de sub-gênero do cinema independente, onde a atmosfera da narrativa é a mais natural possível, sendo comum ver improvisos entre os atores em cena, muitos deles amadores ou desconhecidos em um ambiente completamente naturalista que chega a dispensar a iluminação artificial e onde a câmera documental funciona como uma espécie de observador onipresente.
É claro que os próprios roteiros sustentam essa escolha conceitual - eles são excelentes e como os atores são ótimos, até mesmo quando os planos são mais longos (e têm vários) os diálogos não se perdem em futilidades ou esteriótipos de gênero. Aqui cabe um comentário: alguns anos atrás assisti duas séries inglesas com o mesmo conceito e seguindo o mesmo gênero: "Dates" e "True Love". Para quem sabe do que estou falando, "Easy" traz um pouco dessas duas produções, talvez com um pouco menos de sutileza no texto e de uma fotografia mais autoral, mas com um resultado igualmente elogiável.
Uma grande vantagem das séries que possuem o formato de antologia é o de poder contar histórias que não precisem necessariamente se conectar uma nas outras - essa estrutura de fato se repete em sete episódios, porém no oitavo revisitamos alguns personagens e entendemos que tudo que foi visto até ali poderá ter suas consequências - e de fato se provou assim na segunda e terceira temporadas. Embora seja uma série mais de nicho, ou menos ritmada (como preferir), sua trama chega carregada de profundas discussões, com tantas camadas e assuntos que temos a exata sensação de que conhecemos alguém que vive (ou viveu) algo parecido com os dramas dos protagonistas.
"Easy" é mais uma daquelas que indico de olhos fechados para quem gosta desse tipo de série, ainda mais sabendo que a Netflix se planejou e produziu um final já na terceira temporada! Vale muito o seu play!
É preciso muito cuidado ao analisar o filme "Eike - Tudo ou Nada" - primeiro como obra cinematográfica e depois pelo valor de seu personagem e do que ele representou para universo empreendedor por muitos anos, mas vamos por partes. Eike, o personagem, tem aura de Bernie Madoff com o mindset de Elizabeth Holmes (da Theranos), ou seja, ele era uma bomba relógio prestes a explodir e por isso é tão fascinante (independente de julgamentos pré-estabelecidos ou opniões pessoais) - e aqui cabe citar uma passagem do próprio roteiro que ilustra isso: "na vida não se pode pensar pequeno demais, mas também não se pode acreditar ser maior do que realmente é". Já como um filme de longa-metragem, muito bem produzido por sinal, a narrativa está repleta de problemas e escolhas criativas (ou conceituais) de qualidade muito duvidosa e passagens tão mal resolvidas que, infelizmente, beiram o constrangimento - se você acha que posso estar exagerando, reparem na forma que o texto explica o que é um IPO e como o passado do personagem com a atriz Luma de Oliveira foi retratado.
Feita essa introdução e colocando as cartas na mesa, admito que dei o play apenas pela curiosidade e, mesmo longe (mas muito longe) de ser um grande filme, saí satisfeito com o que encontrei. Baseado na obra de Malu Gaspar, "Eike - Tudo ou Nada" acompanha o processo de ascensão e queda do Grupo X pelos olhos do empresário e ex-bilionário Eike Batista. A história que começa em 2006, quando a economia brasileira estava borbulhando por conta do pré-sal, Eike decide criar a OGX, petroleira que o transforma no sétimo homem mais rico do mundo mesmo que acompanhado de especulações e mentiras - razões, inclusive, pela qual a empresa vai à falência, levando com ela tanto o seu patrimônio quanto o poder e prestígio que demorou anos para ele construir. Confira o trailer:
Assim como nos acostumamos a encontrar nos catálogos dos streamings obras que expõem os bastidores nada glamourosos do empreendedorismo (e de seus fundadores) como no Facebook, no Spotify, no Uber, na Theranos e até no WeWork, é notável a iniciativa de trazer para o grande público a história do grupo X, uma empresa brasileira, e os conceitos e ideias que fizeram um brasileiro, Eike Batista, convencer inúmeros investidores a entrar no negócio e assim captar mais de 1 bilhão de dólares. Veja, não tem nada de errado em acreditar que sua ideia pode dar certo e lutar por ela, o complicado é fechar os olhos para a realidade que teima em te mostrar que o caminho não é bem esse que o powerpoint aceitou - e pasmem, no caso do Eike, até o governo deu uma forcinha (mesmo que daquele jeito que estamos acostumados) ao mudar a regra do jogo no meio do campeonato quando resolveu retirar 41 blocos (os mais aptos a encontrar petróleo) do leilão do pré-sal para proteger a Petrobras.
O ponto alto do filme, como não poderia deixar de ser, está em abordar essas nuances em um recorte cruel do capitalismo pelos olhos de um empreendedor considerado visionário - e aqui pontuo elementos marcantes dessa trajetória de Eike, desde o risco de uma aposta, a busca por investimentos, os equívocos muitas vezes pautados pelo ego, a montanha-russa de emoções a cada movimento estratégico e, claro, até chegar na corrupção. Dirigido e roteirizado por Dida Andrade e Andradina Azevedo, "Eike - Tudo ou Nada" teria material para ser uma série, mas o recorte escolhido para o filme conecta muito bem a jornada com o personagem, mesmo que soe um pouco ingênuo nos dias de hoje. O que foge disso, é o que na verdade incomoda: embora compreensível, o arco do investidor amador que perde tudo com a queda do grupo X, especificamente da OGX, é tão dispensável quanto a discussão sobre a calvice de Eike!
Não serão poucas as vezes que você vai se perguntar se Eike era um mentiroso compulsivo ou um empreendedor genial, um nacionalista empenhado no progresso do país ou um egocêntrico sem limites e sem moral na busca pelo poder, um homem à frente do seu tempo ou mais um estelionatário que usou de seu passado para ganhar muito dinheiro; o fato é que se "Eike - Tudo ou Nada" não deve ser considerado um grande filme, mas certamente ele é um retrato curioso de um megalomaníaco, egocêntrico e manipulador que se encaixou dentro de um sistema mentiroso para ganhar muito dinheiro - mesmo sabendo que haveria um preço a se pagar!
Pela história, pelo personagem, vale seu play!
É preciso muito cuidado ao analisar o filme "Eike - Tudo ou Nada" - primeiro como obra cinematográfica e depois pelo valor de seu personagem e do que ele representou para universo empreendedor por muitos anos, mas vamos por partes. Eike, o personagem, tem aura de Bernie Madoff com o mindset de Elizabeth Holmes (da Theranos), ou seja, ele era uma bomba relógio prestes a explodir e por isso é tão fascinante (independente de julgamentos pré-estabelecidos ou opniões pessoais) - e aqui cabe citar uma passagem do próprio roteiro que ilustra isso: "na vida não se pode pensar pequeno demais, mas também não se pode acreditar ser maior do que realmente é". Já como um filme de longa-metragem, muito bem produzido por sinal, a narrativa está repleta de problemas e escolhas criativas (ou conceituais) de qualidade muito duvidosa e passagens tão mal resolvidas que, infelizmente, beiram o constrangimento - se você acha que posso estar exagerando, reparem na forma que o texto explica o que é um IPO e como o passado do personagem com a atriz Luma de Oliveira foi retratado.
Feita essa introdução e colocando as cartas na mesa, admito que dei o play apenas pela curiosidade e, mesmo longe (mas muito longe) de ser um grande filme, saí satisfeito com o que encontrei. Baseado na obra de Malu Gaspar, "Eike - Tudo ou Nada" acompanha o processo de ascensão e queda do Grupo X pelos olhos do empresário e ex-bilionário Eike Batista. A história que começa em 2006, quando a economia brasileira estava borbulhando por conta do pré-sal, Eike decide criar a OGX, petroleira que o transforma no sétimo homem mais rico do mundo mesmo que acompanhado de especulações e mentiras - razões, inclusive, pela qual a empresa vai à falência, levando com ela tanto o seu patrimônio quanto o poder e prestígio que demorou anos para ele construir. Confira o trailer:
Assim como nos acostumamos a encontrar nos catálogos dos streamings obras que expõem os bastidores nada glamourosos do empreendedorismo (e de seus fundadores) como no Facebook, no Spotify, no Uber, na Theranos e até no WeWork, é notável a iniciativa de trazer para o grande público a história do grupo X, uma empresa brasileira, e os conceitos e ideias que fizeram um brasileiro, Eike Batista, convencer inúmeros investidores a entrar no negócio e assim captar mais de 1 bilhão de dólares. Veja, não tem nada de errado em acreditar que sua ideia pode dar certo e lutar por ela, o complicado é fechar os olhos para a realidade que teima em te mostrar que o caminho não é bem esse que o powerpoint aceitou - e pasmem, no caso do Eike, até o governo deu uma forcinha (mesmo que daquele jeito que estamos acostumados) ao mudar a regra do jogo no meio do campeonato quando resolveu retirar 41 blocos (os mais aptos a encontrar petróleo) do leilão do pré-sal para proteger a Petrobras.
O ponto alto do filme, como não poderia deixar de ser, está em abordar essas nuances em um recorte cruel do capitalismo pelos olhos de um empreendedor considerado visionário - e aqui pontuo elementos marcantes dessa trajetória de Eike, desde o risco de uma aposta, a busca por investimentos, os equívocos muitas vezes pautados pelo ego, a montanha-russa de emoções a cada movimento estratégico e, claro, até chegar na corrupção. Dirigido e roteirizado por Dida Andrade e Andradina Azevedo, "Eike - Tudo ou Nada" teria material para ser uma série, mas o recorte escolhido para o filme conecta muito bem a jornada com o personagem, mesmo que soe um pouco ingênuo nos dias de hoje. O que foge disso, é o que na verdade incomoda: embora compreensível, o arco do investidor amador que perde tudo com a queda do grupo X, especificamente da OGX, é tão dispensável quanto a discussão sobre a calvice de Eike!
Não serão poucas as vezes que você vai se perguntar se Eike era um mentiroso compulsivo ou um empreendedor genial, um nacionalista empenhado no progresso do país ou um egocêntrico sem limites e sem moral na busca pelo poder, um homem à frente do seu tempo ou mais um estelionatário que usou de seu passado para ganhar muito dinheiro; o fato é que se "Eike - Tudo ou Nada" não deve ser considerado um grande filme, mas certamente ele é um retrato curioso de um megalomaníaco, egocêntrico e manipulador que se encaixou dentro de um sistema mentiroso para ganhar muito dinheiro - mesmo sabendo que haveria um preço a se pagar!
Pela história, pelo personagem, vale seu play!
Para quem gosta de futebol e tem um certo conhecimento sobre as figuras que compõem os bastidores do esporte, "El Presidente" vai surpreender positivamente por expor uma série de fatos que acompanhamos muito superficialmente por aqui, mas que contam com personagens que ficaram bem conhecidos em 2014, quando a Copa foi disputada no Brasil - aliás, essa incrível história só existe porque o nosso país tem uma enorme representatividade (para o bem e para o mal) em todas as camadas que transformam o futebol no esporte mais lucrativo do mundo!
"El Presidente" acompanha a história do escândalo de corrupção da Fifa em 2015, conhecido como "FIFA Gate", pelos olhos deSergio Jadue, responsável por um pequeno time de futebol chileno que saiu do anonimato para se tornar presidente da federação do país e uma peça importante nessa enorme conspiração que envolveu um suborno de150 milhões de dólares coordenado pelo então presidente da federação argentina de futebol, Julio Grondona. Confira o trailer:
Embora a série assuma um tom mais despojado que "Narcos", fica claro uma forte referência do conceito narrativo para contar a história. Um narrador, uma linha temporal completamente fragmentada, cenas que misturam realidade com ficção, uma edição com enorme personalidade (que dá o tom da trama) e uma fotografia criativa (mas não muito original). Tudo isso não é por acaso e vou explicar detalhadamente logo abaixo, porém é preciso dizer que "El Presidente" é, de fato, uma série muito divertida, dinâmica e com curiosidades que muitos de nós, amantes do futebol, nem sonhávamos que poderiam acontecer. Vale muito a pena, entretenimento garantido, mas fica a uma observação importante: provavelmente quem não é familiarizado com as dinâmicas do esporte e não conhece esses personagens reais, pode não aproveitar muito da série!
Produzido pela francesa Gaumont (responsável por "Narcos" da Netflix), pela chilena Fabula (vencedora do Oscar com "Uma Mulher Fantástica"), pela argentina Kapow (da série "Estocolmo") e sob a coordenação da Amazon Studios, "El Presidente" tem o vencedor do Oscar por "Birdman", Armando Bo, no comando do projeto. Fiz questão de citar todos os envolvidos para justificar a enorme qualidade da série. Claro que alguns elementos deixam um pouco a desejar como, por exemplo, a qualidade do elenco de apoio, bem abaixo do núcleo principal, e algumas dublagens completamente toscas dos personagens brasileiros - parece novela mexicana. As cenas de futebol também foram reproduzidas, o que acaba nos afastando um pouco da realidade dos fatos, mas não deixa de ser compreensível pelo enorme custo de direitos que estavam envolvidos em um obra que expõe o pior lado das confederações sul-americanas e da própria FIFA. Tudo isso passa a ser aceitável por se tratar de uma série que assume uma linguagem menos naturalista, mais caricata, ou seja, ela permite um ajuste do tom para diminuir a densidade da narrativa e caçoar de várias situações completamente non-sense que chegam parecer mentira - reparem em toda a sequência que envolve o sorteio dos grupos da Copa América de 2015 no Chile e você vai entender do que eu estou falando!
O roteiro se divide em duas linhas temporais e Armando Bo, na minha opinião, entrega demais essas quebras narrativas: além de legendas para dizer o que é passado e o que é presente, a fotografia usa de uma técnica já batida, mas não menos interessante, para nos localizar no tempo: o passado é gravado em uma janela 4:3 (como nas TVs antigas) e o presente, em 16:9 (como nas TVs de hoje) e não contente com tudo isso, Bo ainda se apoia na narração em OFF e no conceito visual de cada um desses períodos - é muito didatismo! Fora isso, a construção da história está muito clara, entendemos como as peças vão se encaixando e não nos sentimos perdidos em nenhum momento - um mérito enorme do roteiro e da edição, já que a trama não é tão simples, pois existem muitos personagens envolvidos, muitas nuances para se explicar e muita falcatrua pra gente conhecer. Como em "Narcos", ter um narrador ajuda muito e como em "Brás Cubas", essa função cabe ao próprio Julio Grondona, mesmo depois de morto.
Algumas passagens são realmente muito curiosas e como a própria Amazon definiu: "El Presidente" prova que, antes da bola rolar e depois do apito final, o jogo é muito mais sujo do que imaginamos. Andrés Parra como Sergio Jadue e Paulina Gaitan como sua esposa, Nené, estão impagáveis - eles são o contraponto entre a comédia e o drama, entre o escrachado e o sério, entre o over e o introspectivo - é muito bacana de se ver! Karla Souza (a Laurie de "How to Get Away with Murder") também está muito bem como a agente do FBI responsável pela investigação - sua personagem me pareceu o exato ponto de equilíbrio entre o casal de protagonistas.
"El Presidente" mostra o negócio por trás do futebol de uma forma quase caótica e isso é um grande mérito, pois temos a real sensação da superficialidade de como as decisões, que guiavam o futebol no continente, eram tomadas até pouco tempo. As disputas de poder entre os dirigentes sempre esbarravam na enorme quantia que cada um receberia - a história sobre a disputa dos direitos de transmissão dos campeonatos sul-americanos que envolviam o brasileiro J. Hawilla da Traffic é de embrulhar o estômago. Uma das coisas que mais me surpreendeu na série é a forma como essa quantidade de sujeira foi tirada debaixo do tapete e que pelo jeito não deve parar por aqui - uma segunda temporada deve ter um brasileiro como destaque: o ex presidente da FIFA, João Havelange.
Dada a quantidade de falcatruas que conhecemos (e muitas que nem sonhamos), "El Presidente" tem material para muitas temporadas e espero que assim seja feito! Vou aguardar ansiosamente. Não perca tempo, vale muito seu play!
Para quem gosta de futebol e tem um certo conhecimento sobre as figuras que compõem os bastidores do esporte, "El Presidente" vai surpreender positivamente por expor uma série de fatos que acompanhamos muito superficialmente por aqui, mas que contam com personagens que ficaram bem conhecidos em 2014, quando a Copa foi disputada no Brasil - aliás, essa incrível história só existe porque o nosso país tem uma enorme representatividade (para o bem e para o mal) em todas as camadas que transformam o futebol no esporte mais lucrativo do mundo!
"El Presidente" acompanha a história do escândalo de corrupção da Fifa em 2015, conhecido como "FIFA Gate", pelos olhos deSergio Jadue, responsável por um pequeno time de futebol chileno que saiu do anonimato para se tornar presidente da federação do país e uma peça importante nessa enorme conspiração que envolveu um suborno de150 milhões de dólares coordenado pelo então presidente da federação argentina de futebol, Julio Grondona. Confira o trailer:
Embora a série assuma um tom mais despojado que "Narcos", fica claro uma forte referência do conceito narrativo para contar a história. Um narrador, uma linha temporal completamente fragmentada, cenas que misturam realidade com ficção, uma edição com enorme personalidade (que dá o tom da trama) e uma fotografia criativa (mas não muito original). Tudo isso não é por acaso e vou explicar detalhadamente logo abaixo, porém é preciso dizer que "El Presidente" é, de fato, uma série muito divertida, dinâmica e com curiosidades que muitos de nós, amantes do futebol, nem sonhávamos que poderiam acontecer. Vale muito a pena, entretenimento garantido, mas fica a uma observação importante: provavelmente quem não é familiarizado com as dinâmicas do esporte e não conhece esses personagens reais, pode não aproveitar muito da série!
Produzido pela francesa Gaumont (responsável por "Narcos" da Netflix), pela chilena Fabula (vencedora do Oscar com "Uma Mulher Fantástica"), pela argentina Kapow (da série "Estocolmo") e sob a coordenação da Amazon Studios, "El Presidente" tem o vencedor do Oscar por "Birdman", Armando Bo, no comando do projeto. Fiz questão de citar todos os envolvidos para justificar a enorme qualidade da série. Claro que alguns elementos deixam um pouco a desejar como, por exemplo, a qualidade do elenco de apoio, bem abaixo do núcleo principal, e algumas dublagens completamente toscas dos personagens brasileiros - parece novela mexicana. As cenas de futebol também foram reproduzidas, o que acaba nos afastando um pouco da realidade dos fatos, mas não deixa de ser compreensível pelo enorme custo de direitos que estavam envolvidos em um obra que expõe o pior lado das confederações sul-americanas e da própria FIFA. Tudo isso passa a ser aceitável por se tratar de uma série que assume uma linguagem menos naturalista, mais caricata, ou seja, ela permite um ajuste do tom para diminuir a densidade da narrativa e caçoar de várias situações completamente non-sense que chegam parecer mentira - reparem em toda a sequência que envolve o sorteio dos grupos da Copa América de 2015 no Chile e você vai entender do que eu estou falando!
O roteiro se divide em duas linhas temporais e Armando Bo, na minha opinião, entrega demais essas quebras narrativas: além de legendas para dizer o que é passado e o que é presente, a fotografia usa de uma técnica já batida, mas não menos interessante, para nos localizar no tempo: o passado é gravado em uma janela 4:3 (como nas TVs antigas) e o presente, em 16:9 (como nas TVs de hoje) e não contente com tudo isso, Bo ainda se apoia na narração em OFF e no conceito visual de cada um desses períodos - é muito didatismo! Fora isso, a construção da história está muito clara, entendemos como as peças vão se encaixando e não nos sentimos perdidos em nenhum momento - um mérito enorme do roteiro e da edição, já que a trama não é tão simples, pois existem muitos personagens envolvidos, muitas nuances para se explicar e muita falcatrua pra gente conhecer. Como em "Narcos", ter um narrador ajuda muito e como em "Brás Cubas", essa função cabe ao próprio Julio Grondona, mesmo depois de morto.
Algumas passagens são realmente muito curiosas e como a própria Amazon definiu: "El Presidente" prova que, antes da bola rolar e depois do apito final, o jogo é muito mais sujo do que imaginamos. Andrés Parra como Sergio Jadue e Paulina Gaitan como sua esposa, Nené, estão impagáveis - eles são o contraponto entre a comédia e o drama, entre o escrachado e o sério, entre o over e o introspectivo - é muito bacana de se ver! Karla Souza (a Laurie de "How to Get Away with Murder") também está muito bem como a agente do FBI responsável pela investigação - sua personagem me pareceu o exato ponto de equilíbrio entre o casal de protagonistas.
"El Presidente" mostra o negócio por trás do futebol de uma forma quase caótica e isso é um grande mérito, pois temos a real sensação da superficialidade de como as decisões, que guiavam o futebol no continente, eram tomadas até pouco tempo. As disputas de poder entre os dirigentes sempre esbarravam na enorme quantia que cada um receberia - a história sobre a disputa dos direitos de transmissão dos campeonatos sul-americanos que envolviam o brasileiro J. Hawilla da Traffic é de embrulhar o estômago. Uma das coisas que mais me surpreendeu na série é a forma como essa quantidade de sujeira foi tirada debaixo do tapete e que pelo jeito não deve parar por aqui - uma segunda temporada deve ter um brasileiro como destaque: o ex presidente da FIFA, João Havelange.
Dada a quantidade de falcatruas que conhecemos (e muitas que nem sonhamos), "El Presidente" tem material para muitas temporadas e espero que assim seja feito! Vou aguardar ansiosamente. Não perca tempo, vale muito seu play!
Se você gostou de "O Escândalo", "A Assistente" ou "A Voz Mais Forte", saiba que "Ela Disse" pode ser considerada a cereja do bolo de uma discussão tão importante quanto necessária e que, contextualizada dentro do movimento #MeToo e de todos os casos de abuso sexual envolvendo gente muito importante, foi brilhantemente explorada pela diretora Maria Schrader (de "Nada Ortodoxa").
Baseado na investigação vencedora do prêmio Pulitzer pelo The New York Times, "Ela Disse" acompanha Megan Twohey (Carey Mulligan) e Jodi Kantor (Zoe Kazan), duas jornalistas que juntas publicaram uma das histórias mais importantes e relevantes de uma geração: sérias denuncias de abuso sexual (e até estupro) contra o "todo poderoso" do cinema americano, o produtor e CEO da Miramax, Harvey Weinstein. A história que ajudou a lançar o movimento#Metoo, quebrou décadas de silêncio em torno do assunto de agressão sexual em Hollywood e alterou a cultura americana para sempre. Confira o trailer:
Com um time de primeiríssima qualidade, começando pelos produtores (os mesmos de "12 Anos de Escravidão", "Moonlight: Sob a Luz do Luar" e "Minari"), passando pela roteirista Rebecca Lenkiewicz (de "Ida") e culminando nas protagonistas Carey Mulligan e Zoe Kazan, "Ela Disse" pode ser considerado um dos melhores filmes de 2022 sem a menor sombra de dúvida. Mesmo com uma narrativa mais cadenciada, com uma levada mais jornalística do que investigativa e um texto denso (muitas vezes complexo), o filme cria uma atmosfera documental impressionante, expondo em detalhes todo o processo que levou as vitimas de Weinstein enfrentar o medo e denuncia-lo.
Ao lado de Schrader, a diretora de fotografia Natasha Braier (de "Demônio de Neon") nos joga dentro da redação do The New York Times e sem pressa alguma vai nos presenteando com um drama ao melhor estilo "Todos os Homens do Presidente". Mulligan e Kazan estão incríveis - dignas de indicações ao Oscar, eu diria. Mesmo que em alguns momentos o roteiro ceda a tentação do sensacionalismo, o elenco segura com muito realismo toda a jornada entre uma denuncia isolada e a construção de uma matéria bombástica - o interessante é justamente perceber essa montanha russa de emoções nos olhos das protagonistas. A cena em que Jodi Kantor recebe a ligação de Ashley Judd (interpretando ela mesmo), é impagável! Reparem! No papel da editora da dupla, Rebecca Corbett, e do editor executivo do NYT, Dean Baquet, Patricia Clarkson e Andre Braugher, respectivamente, merecem elogios, bem como Mike Houston como Harvey Weinstein que mesmo sem aparecer seu rosto em nenhum momento, consegue passar toda imponência e força de seu personagem.
"Ela Disse" é sim um soco no estômago, mas que sugere muito mais do que mostra e muito por causa disso nos coloca em uma posição de permanente tensão e angustia - o áudio da gravação de uma das vitimas sendo assediada por Harvey, enquanto a câmera enquadra os corredores de um hotel, chega a ser chocante. Os depoimentos também - é um mais visceral que o outro e faz com que tenhamos a exata noção de como essas mulheres foram expostas e desrespeitadas. Na verdade não há muito o que dizer, é preciso mergulhar nessa verdadeira cruzada e se o tema de fato te interessar, não deixe de ler "Ela Disse: Os bastidores da reportagem que impulsionou o #MeToo"- que como o filme, é tão surpreendente quanto doloroso!
Se você gostou de "O Escândalo", "A Assistente" ou "A Voz Mais Forte", saiba que "Ela Disse" pode ser considerada a cereja do bolo de uma discussão tão importante quanto necessária e que, contextualizada dentro do movimento #MeToo e de todos os casos de abuso sexual envolvendo gente muito importante, foi brilhantemente explorada pela diretora Maria Schrader (de "Nada Ortodoxa").
Baseado na investigação vencedora do prêmio Pulitzer pelo The New York Times, "Ela Disse" acompanha Megan Twohey (Carey Mulligan) e Jodi Kantor (Zoe Kazan), duas jornalistas que juntas publicaram uma das histórias mais importantes e relevantes de uma geração: sérias denuncias de abuso sexual (e até estupro) contra o "todo poderoso" do cinema americano, o produtor e CEO da Miramax, Harvey Weinstein. A história que ajudou a lançar o movimento#Metoo, quebrou décadas de silêncio em torno do assunto de agressão sexual em Hollywood e alterou a cultura americana para sempre. Confira o trailer:
Com um time de primeiríssima qualidade, começando pelos produtores (os mesmos de "12 Anos de Escravidão", "Moonlight: Sob a Luz do Luar" e "Minari"), passando pela roteirista Rebecca Lenkiewicz (de "Ida") e culminando nas protagonistas Carey Mulligan e Zoe Kazan, "Ela Disse" pode ser considerado um dos melhores filmes de 2022 sem a menor sombra de dúvida. Mesmo com uma narrativa mais cadenciada, com uma levada mais jornalística do que investigativa e um texto denso (muitas vezes complexo), o filme cria uma atmosfera documental impressionante, expondo em detalhes todo o processo que levou as vitimas de Weinstein enfrentar o medo e denuncia-lo.
Ao lado de Schrader, a diretora de fotografia Natasha Braier (de "Demônio de Neon") nos joga dentro da redação do The New York Times e sem pressa alguma vai nos presenteando com um drama ao melhor estilo "Todos os Homens do Presidente". Mulligan e Kazan estão incríveis - dignas de indicações ao Oscar, eu diria. Mesmo que em alguns momentos o roteiro ceda a tentação do sensacionalismo, o elenco segura com muito realismo toda a jornada entre uma denuncia isolada e a construção de uma matéria bombástica - o interessante é justamente perceber essa montanha russa de emoções nos olhos das protagonistas. A cena em que Jodi Kantor recebe a ligação de Ashley Judd (interpretando ela mesmo), é impagável! Reparem! No papel da editora da dupla, Rebecca Corbett, e do editor executivo do NYT, Dean Baquet, Patricia Clarkson e Andre Braugher, respectivamente, merecem elogios, bem como Mike Houston como Harvey Weinstein que mesmo sem aparecer seu rosto em nenhum momento, consegue passar toda imponência e força de seu personagem.
"Ela Disse" é sim um soco no estômago, mas que sugere muito mais do que mostra e muito por causa disso nos coloca em uma posição de permanente tensão e angustia - o áudio da gravação de uma das vitimas sendo assediada por Harvey, enquanto a câmera enquadra os corredores de um hotel, chega a ser chocante. Os depoimentos também - é um mais visceral que o outro e faz com que tenhamos a exata noção de como essas mulheres foram expostas e desrespeitadas. Na verdade não há muito o que dizer, é preciso mergulhar nessa verdadeira cruzada e se o tema de fato te interessar, não deixe de ler "Ela Disse: Os bastidores da reportagem que impulsionou o #MeToo"- que como o filme, é tão surpreendente quanto doloroso!
Um mosaico das complexidades românticas - talvez seja essa a melhor forma de definir o surpreendente "Ele Não Está Tão a Fim de Você"! Na verdade esse é um filme que transcenda aquele clichê das comédias românticas que estamos acostumados ao defender o difícil propósito de oferecer uma análise perspicaz, e muitas vezes dolorosamente realista, das relações amorosas. Dirigido pelo Ken Kwapis (de "O Grande Milagre") o filme não apenas diverte, mas também nos provoca ótimas reflexões sobre a intricada dinâmica dos relacionamentos modernos. Inspirado no best-seller homônimo de Greg Behrendt e Liz Tuccillo (consultor e roteirista de alguns episódios do seriado "Sex and the City", respectivamente), sua narrativa multifacetada explora uma gama de comportamentos e mal-entendidos que costumam complicar a vida amorosa de homens e mulheres através dos tempos, combinando um humor afiado com momentos de introspecção dos mais interessantes.
Na trama, "Ele Não Está Tão a Fim de Você" segue um grupo de amigos em Baltimore enquanto navegam pelas turbulentas águas dos relacionamentos. Gigi (Ginnifer Goodwin) é uma jovem romântica e idealista que está à procura do amor verdadeiro, mas tem dificuldades em interpretar os sinais dos homens. Ela se apoia em Alex (Justin Long), um barman que se torna seu guru relacional. Enquanto isso, Beth (Jennifer Aniston) está frustrada com o namorado Neil (Ben Affleck), que reluta em propor casamento, e Janine (Jennifer Connelly) enfrenta a infidelidade de seu marido Ben (Bradley Cooper), que está envolvido com a aspirante a cantora Anna (Scarlett Johansson). O filme também explora as histórias de Mary (Drew Barrymore), uma publicitária que luta com a realidade do namoro online, e Connor (Kevin Connolly), um corretor de imóveis obcecado por Anna. Essa teia de histórias entrelaçadas pinta um quadro complexo, porém familiar, dos altos e baixos do amor. Confira o trailer:
Um filme muito gostoso de assistir e o grande mérito, além do elenco, é de Ken Kwapis - sua direção sustenta a narrativa de "Ele Não Está Tão a Fim de Você" e habilmente orquestra as múltiplas histórias que o roteiro propõe sem perder o ritmo ou sua coesão. A habilidade de Kwapis em equilibrar humor e seriedade cria um tom que ressoa com a audiência já que em vez de cair na armadilha das fórmulas previsíveis, ele proporciona uma experiência de fácil identificação e ao mesmo tempo bastante provocante. A montagem de Cara Silverman é outra peça crucial dessa engrenagem, permitindo que as transições entre as narrativas fluam naturalmente, nos mantendo engajados e emocionalmente mergulhadas em como as histórias são entrelaçadas.
Outro ponto que vale ser citado é a fotografia de John Bailey (de "O Verão da Minha Vida")" - ele utiliza uma paleta de cores vibrantes para refletir as emoções e o estado de espírito dos personagens. Bailey, com sua vasta experiência em "filmes de relação" faz uso de enquadramentos inteligentes e uma iluminação sutil para destacar as nuances das interações - sempre com Baltimore servindo como um pano de fundo vivo que adiciona uma camada extra de autenticidade às histórias. Ao ver uma cidade sendo capturada em uma mistura de cenários urbanos e locais mais íntimos, espelhando com muita habilidade as complexidades e contradições da vida amorosa dos personagens, a química entre os atores soa mais palpável e contribui significativamente para o impacto emocional que o filme oferece.
"Ele Não Está Tão a Fim de Você", no final das contas, realmente oferece uma exploração autêntica dos desafios de um relacionamento. Com uma direção competente, uma fotografia bem estruturada e performances divertidas, o filme entrega o que promete: uma análise crítica e muitas vezes comovente sobre como interpretamos (ou falhamos em interpretar) os sinais no jogo do amor. Então, se você aprecia narrativas que combinam humor com reflexão e está interessado em personagens que refletem as dores da vida real, algo como "Modern Love", esse filme é uma escolha certeira.
Vale muito o seu play!
Um mosaico das complexidades românticas - talvez seja essa a melhor forma de definir o surpreendente "Ele Não Está Tão a Fim de Você"! Na verdade esse é um filme que transcenda aquele clichê das comédias românticas que estamos acostumados ao defender o difícil propósito de oferecer uma análise perspicaz, e muitas vezes dolorosamente realista, das relações amorosas. Dirigido pelo Ken Kwapis (de "O Grande Milagre") o filme não apenas diverte, mas também nos provoca ótimas reflexões sobre a intricada dinâmica dos relacionamentos modernos. Inspirado no best-seller homônimo de Greg Behrendt e Liz Tuccillo (consultor e roteirista de alguns episódios do seriado "Sex and the City", respectivamente), sua narrativa multifacetada explora uma gama de comportamentos e mal-entendidos que costumam complicar a vida amorosa de homens e mulheres através dos tempos, combinando um humor afiado com momentos de introspecção dos mais interessantes.
Na trama, "Ele Não Está Tão a Fim de Você" segue um grupo de amigos em Baltimore enquanto navegam pelas turbulentas águas dos relacionamentos. Gigi (Ginnifer Goodwin) é uma jovem romântica e idealista que está à procura do amor verdadeiro, mas tem dificuldades em interpretar os sinais dos homens. Ela se apoia em Alex (Justin Long), um barman que se torna seu guru relacional. Enquanto isso, Beth (Jennifer Aniston) está frustrada com o namorado Neil (Ben Affleck), que reluta em propor casamento, e Janine (Jennifer Connelly) enfrenta a infidelidade de seu marido Ben (Bradley Cooper), que está envolvido com a aspirante a cantora Anna (Scarlett Johansson). O filme também explora as histórias de Mary (Drew Barrymore), uma publicitária que luta com a realidade do namoro online, e Connor (Kevin Connolly), um corretor de imóveis obcecado por Anna. Essa teia de histórias entrelaçadas pinta um quadro complexo, porém familiar, dos altos e baixos do amor. Confira o trailer:
Um filme muito gostoso de assistir e o grande mérito, além do elenco, é de Ken Kwapis - sua direção sustenta a narrativa de "Ele Não Está Tão a Fim de Você" e habilmente orquestra as múltiplas histórias que o roteiro propõe sem perder o ritmo ou sua coesão. A habilidade de Kwapis em equilibrar humor e seriedade cria um tom que ressoa com a audiência já que em vez de cair na armadilha das fórmulas previsíveis, ele proporciona uma experiência de fácil identificação e ao mesmo tempo bastante provocante. A montagem de Cara Silverman é outra peça crucial dessa engrenagem, permitindo que as transições entre as narrativas fluam naturalmente, nos mantendo engajados e emocionalmente mergulhadas em como as histórias são entrelaçadas.
Outro ponto que vale ser citado é a fotografia de John Bailey (de "O Verão da Minha Vida")" - ele utiliza uma paleta de cores vibrantes para refletir as emoções e o estado de espírito dos personagens. Bailey, com sua vasta experiência em "filmes de relação" faz uso de enquadramentos inteligentes e uma iluminação sutil para destacar as nuances das interações - sempre com Baltimore servindo como um pano de fundo vivo que adiciona uma camada extra de autenticidade às histórias. Ao ver uma cidade sendo capturada em uma mistura de cenários urbanos e locais mais íntimos, espelhando com muita habilidade as complexidades e contradições da vida amorosa dos personagens, a química entre os atores soa mais palpável e contribui significativamente para o impacto emocional que o filme oferece.
"Ele Não Está Tão a Fim de Você", no final das contas, realmente oferece uma exploração autêntica dos desafios de um relacionamento. Com uma direção competente, uma fotografia bem estruturada e performances divertidas, o filme entrega o que promete: uma análise crítica e muitas vezes comovente sobre como interpretamos (ou falhamos em interpretar) os sinais no jogo do amor. Então, se você aprecia narrativas que combinam humor com reflexão e está interessado em personagens que refletem as dores da vida real, algo como "Modern Love", esse filme é uma escolha certeira.
Vale muito o seu play!
"Elvis" é tranquilamente um dos melhores filmes de 2022 - independente do que possa conquistar daqui para frente. Mas antes de falar do filme em si, é preciso exaltar a capacidade que o diretor Baz Luhrmann tem de contar uma história com criatividade, inventividade, cor e música! Luhrmann traz com muita maturidade os inúmeros aprendizados de seus filmes anteriores, "Romeu + Julieta", "O Grande Gatsby", e, principalmente, "Moulin Rouge". Para alinhar as expectativas, eu diria até que "Elvis" é uma espécie de "Moulin Rouge", só que em Las Vegas, sem ser um musical, mas com muita música (boa) ditando o ritmo de quase três horas de filme!
Essa cinebiografia de Elvis Presley (Austin Butler) acompanha décadas da vida do "Rei do Rock" e sua ascensão à fama, a partir do seu relacionamento com o empresário "Coronel" Tom Parker (Tom Hanks). A história mergulha na dinâmica entre o cantor e seu empresário controlador por mais de 20 anos de parceria, usando a paisagem dos EUA em constante evolução e a transformação de Elvis como cantor. No meio de sua jornada e carreira, Elvis ainda encontra Priscilla Presley (Olivia DeJonge), fonte de sua inspiração e uma das pessoas mais importantes de sua vida. Confira o trailer:
A partir de agora vamos falar de um filme tecnicamente exemplar. Sim, a história é incrível, Elvis Presley foi um personagem marcante e sua jornada tem tudo que uma cinebiografia de uma celebridade musical precisa, mas meu amigo, a forma como Luhrmann decodificou todos esses elementos narrativos em uma experiência visual, é impressionante! São técnicas e mais técnicas que combinadas estabelecem uma dinâmica tão orgânica, seja nas transições, nos movimentos de câmera ou simplesmente nas texturas, que muitas vezes nem sabemos se o que estamos assistindo são imagens de arquivo ou de fato um filme produzido mais de 50 anos depois dos fatos. O trabalho do diretor de fotografia e parceiro de Luhmann, Mandy Walker (de "Australia" e "Mulan"), é incrível! Junto com um departamento de arte comandado pelo Damien Drew (de "O Grande Gatsby") e a trilha sonora de Elliott Wheeler (de "The Get Down"), o que vemos é um raro alinhamento técnico e artístico que nos coloca em uma atmosfera única - reparem como tudo se encaixa perfeitamente na proposta do diretor, das aplicações gráficas aos belos enquadramentos do atores!
Aliás, o que dizer de Austin Butler e Tom Hanks? Butler se esforça ao máximo para fugir da superficialidade da imitação - da voz marcante ao estilo de dançar, o ator tenta criar um certa identificação com Elvis Presley, humanizando o ícone em cenas mais dramáticas e deixando que as performances musicais falem por si - e funciona. Já Hanks, bem, ele sabe o que faz - e aqui um detalhe faz toda diferença na construção do seu personagem: a maquiagem! Hanks aproveita dessa transformação para se distanciar de outros personagens que interpretou e por incrível que pareça entrega algo completamente novo dentro de sua carreira tão completa. Existe uma certa complexidade na figura de Parker que qualquer outro ator sucumbiria a tentação do estereótipo; Tom Hanks não e Baz Luhrmann sabe tanto disso que teima em enquadrar o rosto do ator em close-ups onde apenas os olhos falam - é lindo de ver!
Sob o olhar de quem reconhece o entretenimento e as referências do pop como conceitos narrativos, é inegável que "Elvis" além de um grande filme, também é um belo espetáculo - mas essa visão, acreditem, foge do convencional. Luhrmann não é e nunca foi convencional! Essa característica marcante do diretor está em cada frame de "Elvis" e aceitar sua proposta será essencial para aproveitar a experiência que é assistir essa história. Inegável a qualidade como obra, mesmo com um recorte tão extenso e nada intimo do personagem que reflete muito bem uma de suas frases mais marcantes: "Se não puder falar, cante!"
Vale muito o seu play!
"Elvis" é tranquilamente um dos melhores filmes de 2022 - independente do que possa conquistar daqui para frente. Mas antes de falar do filme em si, é preciso exaltar a capacidade que o diretor Baz Luhrmann tem de contar uma história com criatividade, inventividade, cor e música! Luhrmann traz com muita maturidade os inúmeros aprendizados de seus filmes anteriores, "Romeu + Julieta", "O Grande Gatsby", e, principalmente, "Moulin Rouge". Para alinhar as expectativas, eu diria até que "Elvis" é uma espécie de "Moulin Rouge", só que em Las Vegas, sem ser um musical, mas com muita música (boa) ditando o ritmo de quase três horas de filme!
Essa cinebiografia de Elvis Presley (Austin Butler) acompanha décadas da vida do "Rei do Rock" e sua ascensão à fama, a partir do seu relacionamento com o empresário "Coronel" Tom Parker (Tom Hanks). A história mergulha na dinâmica entre o cantor e seu empresário controlador por mais de 20 anos de parceria, usando a paisagem dos EUA em constante evolução e a transformação de Elvis como cantor. No meio de sua jornada e carreira, Elvis ainda encontra Priscilla Presley (Olivia DeJonge), fonte de sua inspiração e uma das pessoas mais importantes de sua vida. Confira o trailer:
A partir de agora vamos falar de um filme tecnicamente exemplar. Sim, a história é incrível, Elvis Presley foi um personagem marcante e sua jornada tem tudo que uma cinebiografia de uma celebridade musical precisa, mas meu amigo, a forma como Luhrmann decodificou todos esses elementos narrativos em uma experiência visual, é impressionante! São técnicas e mais técnicas que combinadas estabelecem uma dinâmica tão orgânica, seja nas transições, nos movimentos de câmera ou simplesmente nas texturas, que muitas vezes nem sabemos se o que estamos assistindo são imagens de arquivo ou de fato um filme produzido mais de 50 anos depois dos fatos. O trabalho do diretor de fotografia e parceiro de Luhmann, Mandy Walker (de "Australia" e "Mulan"), é incrível! Junto com um departamento de arte comandado pelo Damien Drew (de "O Grande Gatsby") e a trilha sonora de Elliott Wheeler (de "The Get Down"), o que vemos é um raro alinhamento técnico e artístico que nos coloca em uma atmosfera única - reparem como tudo se encaixa perfeitamente na proposta do diretor, das aplicações gráficas aos belos enquadramentos do atores!
Aliás, o que dizer de Austin Butler e Tom Hanks? Butler se esforça ao máximo para fugir da superficialidade da imitação - da voz marcante ao estilo de dançar, o ator tenta criar um certa identificação com Elvis Presley, humanizando o ícone em cenas mais dramáticas e deixando que as performances musicais falem por si - e funciona. Já Hanks, bem, ele sabe o que faz - e aqui um detalhe faz toda diferença na construção do seu personagem: a maquiagem! Hanks aproveita dessa transformação para se distanciar de outros personagens que interpretou e por incrível que pareça entrega algo completamente novo dentro de sua carreira tão completa. Existe uma certa complexidade na figura de Parker que qualquer outro ator sucumbiria a tentação do estereótipo; Tom Hanks não e Baz Luhrmann sabe tanto disso que teima em enquadrar o rosto do ator em close-ups onde apenas os olhos falam - é lindo de ver!
Sob o olhar de quem reconhece o entretenimento e as referências do pop como conceitos narrativos, é inegável que "Elvis" além de um grande filme, também é um belo espetáculo - mas essa visão, acreditem, foge do convencional. Luhrmann não é e nunca foi convencional! Essa característica marcante do diretor está em cada frame de "Elvis" e aceitar sua proposta será essencial para aproveitar a experiência que é assistir essa história. Inegável a qualidade como obra, mesmo com um recorte tão extenso e nada intimo do personagem que reflete muito bem uma de suas frases mais marcantes: "Se não puder falar, cante!"
Vale muito o seu play!
"Em Defesa de Cristo" me pareceu ser mais um caso de um livro infinitamente melhor que o filme - não que ele seja ruim, mas é que a história é muito (mas, muito) boa.
Lee Strobel (Mike Vogel), é um jornalista conservador e linha dura, vivendo os melhores dias de sua carreira: uma premiada reportagem acaba de lhe render uma promoção como editor jurídico no jornal Chicago Tribune. Mas, seu casamento não vai muito bem. Sua esposa, Leslie (Erika Christensen), se converteu à fé cristã indo contra tudo que Lee pensava, como um ateu convicto, a respeito da religião. Utilizando sua vasta experiência sobre leis e usando o jornalismo como ponto de partida, Lee começa uma jornada para rebater os argumentos do cristianismo e assim salvar seu casamento. Investigando a maior história de sua carreira, Lee se vê cara a cara com fatos inesperados que podem mudar tudo que ele acredita ser verdade. Confira o trailer:
Tecnicamente o roteiro não está à altura que uma história dessas merece: Brian Bird nos apresenta uma resolução um pouco mais superficial e uma trama paralela que poderia ser melhor desenvolvida, se algumas camadas fossem exploradas - existe um embate intimo do protagonista que chama a atenção como gatilho, mas que parece não sair do lugar. Agora, mesmo com algumas inconsistências, eu não deixaria de assistir o filme - na verdade, eu gostei, só que é impossível não imaginar uma história tão potente como essa na mão de alguém com mais força na escrita e até na direção. Aliás, a direção do Jon Gunn ("De Coração Partido") é apenas protocolar - imagine se Denis Villeneuve (de "A Chegada") ou até o DarrenAronofsky (de "Cisne Negro") estivessem no projeto, olha, seria outro patamar!
De fato "The Case for Christ" (título original) é um filme bom, mas que transita pela mediocridade em vários aspectos e momentos - eu diria que é uma boa "Sessão da Tarde" que vai entreter, instigar, provocar, mas que não vai te marcar para sempre! É aquela diversão param sábado chuvoso!
Vale a pena nessas condições!
"Em Defesa de Cristo" me pareceu ser mais um caso de um livro infinitamente melhor que o filme - não que ele seja ruim, mas é que a história é muito (mas, muito) boa.
Lee Strobel (Mike Vogel), é um jornalista conservador e linha dura, vivendo os melhores dias de sua carreira: uma premiada reportagem acaba de lhe render uma promoção como editor jurídico no jornal Chicago Tribune. Mas, seu casamento não vai muito bem. Sua esposa, Leslie (Erika Christensen), se converteu à fé cristã indo contra tudo que Lee pensava, como um ateu convicto, a respeito da religião. Utilizando sua vasta experiência sobre leis e usando o jornalismo como ponto de partida, Lee começa uma jornada para rebater os argumentos do cristianismo e assim salvar seu casamento. Investigando a maior história de sua carreira, Lee se vê cara a cara com fatos inesperados que podem mudar tudo que ele acredita ser verdade. Confira o trailer:
Tecnicamente o roteiro não está à altura que uma história dessas merece: Brian Bird nos apresenta uma resolução um pouco mais superficial e uma trama paralela que poderia ser melhor desenvolvida, se algumas camadas fossem exploradas - existe um embate intimo do protagonista que chama a atenção como gatilho, mas que parece não sair do lugar. Agora, mesmo com algumas inconsistências, eu não deixaria de assistir o filme - na verdade, eu gostei, só que é impossível não imaginar uma história tão potente como essa na mão de alguém com mais força na escrita e até na direção. Aliás, a direção do Jon Gunn ("De Coração Partido") é apenas protocolar - imagine se Denis Villeneuve (de "A Chegada") ou até o DarrenAronofsky (de "Cisne Negro") estivessem no projeto, olha, seria outro patamar!
De fato "The Case for Christ" (título original) é um filme bom, mas que transita pela mediocridade em vários aspectos e momentos - eu diria que é uma boa "Sessão da Tarde" que vai entreter, instigar, provocar, mas que não vai te marcar para sempre! É aquela diversão param sábado chuvoso!
Vale a pena nessas condições!
É preciso entender que a AppleTV+ está apenas no começo da sua jornada e talvez por isso eu fique muito tranquilo em afirmar: de tudo que assisti até agora no serviço de streaming da Apple, "Em defesa de Jacob" é disparado o melhor titulo - não que os outros sejam ruins, mas essa minissérie é impecável, no seu roteiro, na sua produção e no seu elenco!
Baseada no livro de 2012 do americano William Landay, "Em Defesa de Jacob" conta a história do promotor Andy Barber (Chris Evans), um homem que acreditava ter uma vida perfeita ao lado de sua esposa Laurie (Michelle Dockery) e do filho Jacob (Jaeden Martell). Porém quando Barber é escalado para investigar o assassinato de um adolescente de 14 anos que foi encontrado esfaqueado em um parque da pequena cidade de Massachusetts onde moram, ele começa a enfrentar um verdadeiro pesadelo. O garoto estudava com seu filho que, pouco tempo depois, passa a ser apontado como o principal suspeito de ter cometido o crime. A partir daí, a vida da família Barber vira de ponta-cabeça, sua intimidade é completamente exposta, a repercussão da acusação destrói seu convívio social e a dúvida sobre o que realmente aconteceu transforma a relação entre eles em um verdadeiro jogo de verdades e mentiras! Confira o trailer:
Antes de seguir, eu preciso dizer que "Em Defesa de Jacob" já começa genial pelo duplo sentido do seu título - isso só ficará claro no último episódio, porém o que você vai assistir nos outros sete que compõem a minissérie, é uma história dinâmica que, mesmo com algumas escolhas óbvias, nos mantém envolvidos e cheio de dúvidas sobre os fatos que levaram o crime ser cometido e sobre quem cometeu! É um verdadeiro exercício de adivinhação constante, mas que o roteiro insiste em nos afastar da solução a cada nova descoberta! Olha, vale muito a pena mesmo, entretenimento de primeira linha, nível HBO, mas na AppleTV+!
"Em Defesa de Jacob" foi criada por Mark Bomback, roteirista de "Planeta dos Macacos" e "Wolverine - Imortal". Seu roteiro traz muitas referências do excelente "Precisamos falar sobre Kevin" de 2011, mas com o frescor de se tratar de uma minissérie e de poder explorar uma história complexa, com personagens profundos, com muito mais tempo de desenvolvimento que as duas horas do filme. Toda a trama envolvendo o assassinato, a investigação criminal e o julgamento é equilibrada com momentos bastante particulares da relação familiar dos Barber. Aquela família perfeita de fato não existe, personagens impecáveis, acima do bem e do mal, muito menos, com isso, a todo momento, o roteiro nos coloca uma pulga atrás da orelha com diálogos inteligentes e, principalmente, atuações acima da média, principalmente de Jaeden Martell - o ator consegue entregar uma performance incrível, extremamente contido, trabalhando o silêncio de um forma sombria em alguns momentos e frágil em outros - reparem! Michelle Dockery também surpreende como Laurie e o contraponto da dúvida é tão bem trabalhado pela personagem que o ótimo trabalho do Chris Evans acaba ganhando ainda mais força - embora ele tenha um tendência absurda a trabalhar um tom acima, sua certeza sobre a inocência do filho é de emocionar!
A edição também é um ponto que merece ser comentado: ela é a responsável pela dinâmica narrativa que o premiadíssimo diretor Morten Tyldum (Jogo da Imitação) impõe à história. A quebra da linha temporal parece mais confundir do que explicar e , propositalmente, os cortes nos criam a sensação de insegurança que vai progredindo até chegarmos nos episódios 7 e 8, quando nossa angústia já está quase insuportável. O fato do diretor ser norueguês, certamente, contribuiu para a escolha do look gélido que a minissérie tem - se "Garota Exemplar" trazia uma dominância mais esverdeada, "Em Defesa de Jacob" usa do azul para retratar a frieza e a solidão dos momentos de dúvida e de introspecção que acompanham cada um dos personagens, ao seu modo, em toda história!
"Em Defesa de Jacob" vem forte para a temporada de premiações, com aquele empurrãozinho de sucessos como "Big Little Lies" ou "Em Prantos", mas com a coragem de um roteiro que nos tira da zona de conforto e nos provoca ao não responder a questão principal da trama, mas de expor as imperfeições dos relacionamentos familiares em várias camadas e situações até o seu limite!
Vale o seu play!
É preciso entender que a AppleTV+ está apenas no começo da sua jornada e talvez por isso eu fique muito tranquilo em afirmar: de tudo que assisti até agora no serviço de streaming da Apple, "Em defesa de Jacob" é disparado o melhor titulo - não que os outros sejam ruins, mas essa minissérie é impecável, no seu roteiro, na sua produção e no seu elenco!
Baseada no livro de 2012 do americano William Landay, "Em Defesa de Jacob" conta a história do promotor Andy Barber (Chris Evans), um homem que acreditava ter uma vida perfeita ao lado de sua esposa Laurie (Michelle Dockery) e do filho Jacob (Jaeden Martell). Porém quando Barber é escalado para investigar o assassinato de um adolescente de 14 anos que foi encontrado esfaqueado em um parque da pequena cidade de Massachusetts onde moram, ele começa a enfrentar um verdadeiro pesadelo. O garoto estudava com seu filho que, pouco tempo depois, passa a ser apontado como o principal suspeito de ter cometido o crime. A partir daí, a vida da família Barber vira de ponta-cabeça, sua intimidade é completamente exposta, a repercussão da acusação destrói seu convívio social e a dúvida sobre o que realmente aconteceu transforma a relação entre eles em um verdadeiro jogo de verdades e mentiras! Confira o trailer:
Antes de seguir, eu preciso dizer que "Em Defesa de Jacob" já começa genial pelo duplo sentido do seu título - isso só ficará claro no último episódio, porém o que você vai assistir nos outros sete que compõem a minissérie, é uma história dinâmica que, mesmo com algumas escolhas óbvias, nos mantém envolvidos e cheio de dúvidas sobre os fatos que levaram o crime ser cometido e sobre quem cometeu! É um verdadeiro exercício de adivinhação constante, mas que o roteiro insiste em nos afastar da solução a cada nova descoberta! Olha, vale muito a pena mesmo, entretenimento de primeira linha, nível HBO, mas na AppleTV+!
"Em Defesa de Jacob" foi criada por Mark Bomback, roteirista de "Planeta dos Macacos" e "Wolverine - Imortal". Seu roteiro traz muitas referências do excelente "Precisamos falar sobre Kevin" de 2011, mas com o frescor de se tratar de uma minissérie e de poder explorar uma história complexa, com personagens profundos, com muito mais tempo de desenvolvimento que as duas horas do filme. Toda a trama envolvendo o assassinato, a investigação criminal e o julgamento é equilibrada com momentos bastante particulares da relação familiar dos Barber. Aquela família perfeita de fato não existe, personagens impecáveis, acima do bem e do mal, muito menos, com isso, a todo momento, o roteiro nos coloca uma pulga atrás da orelha com diálogos inteligentes e, principalmente, atuações acima da média, principalmente de Jaeden Martell - o ator consegue entregar uma performance incrível, extremamente contido, trabalhando o silêncio de um forma sombria em alguns momentos e frágil em outros - reparem! Michelle Dockery também surpreende como Laurie e o contraponto da dúvida é tão bem trabalhado pela personagem que o ótimo trabalho do Chris Evans acaba ganhando ainda mais força - embora ele tenha um tendência absurda a trabalhar um tom acima, sua certeza sobre a inocência do filho é de emocionar!
A edição também é um ponto que merece ser comentado: ela é a responsável pela dinâmica narrativa que o premiadíssimo diretor Morten Tyldum (Jogo da Imitação) impõe à história. A quebra da linha temporal parece mais confundir do que explicar e , propositalmente, os cortes nos criam a sensação de insegurança que vai progredindo até chegarmos nos episódios 7 e 8, quando nossa angústia já está quase insuportável. O fato do diretor ser norueguês, certamente, contribuiu para a escolha do look gélido que a minissérie tem - se "Garota Exemplar" trazia uma dominância mais esverdeada, "Em Defesa de Jacob" usa do azul para retratar a frieza e a solidão dos momentos de dúvida e de introspecção que acompanham cada um dos personagens, ao seu modo, em toda história!
"Em Defesa de Jacob" vem forte para a temporada de premiações, com aquele empurrãozinho de sucessos como "Big Little Lies" ou "Em Prantos", mas com a coragem de um roteiro que nos tira da zona de conforto e nos provoca ao não responder a questão principal da trama, mas de expor as imperfeições dos relacionamentos familiares em várias camadas e situações até o seu limite!
Vale o seu play!
"Em Nome do Céu" é uma produção do FX que aqui no Brasil está disponível no Star+, porém, para quem gosta e acompanha séries de investigação, é impossível não associar essa minissérie ao grande sucesso que foi "True Detective" - especialmente na sua primeira temporada. A estrutura narrativa é bem similar, cadenciada e cheia de camadas da mesma forma, além, obviamente, de ter dois elementos que conectam diretamente as duas histórias: o fanatismo religioso e o confronto íntimo dos protagonistas.
Baseado no livro homônimo de Jon Krakauer e criado por Dustin Lance Black (vencedor do Oscar por "Milk"), acompanhamos a história verídica de um crime macabro que ocorreu em uma comunidade mórmon em Utah, EUA, em 1984, onde uma mulher e sua filha foram brutalmente assassinadas dentro de casa, com a atrocidade tendo ligação com o fundamentalismo religioso e sua doutrina de “expiação por sangue”. O detetive Jeb Pyre (Andrew Garfield) investiga o caso ao mesmo tempo que precisa lidar com os reflexos de suas descobertas diante dos questionamentos de sua própria fé. Confira o trailer (em inglês):
Contextualizando o universo em que a história está inserida, por mais cruéis que sejam os detalhes do crime, mais assustador para cidadãos daquela comunidade é saber que um de seus membros (e não um forasteiro) foi o autor de tamanha atrocidade. Entre tantos homens e mulheres de fé que ali circulam, devotos de Joseph Smith e da Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias, aceitar que existe um criminoso entre os seus, parece absurdo. Isso ganha ainda mais dramaticidade quando tudo leva a crer que foi uma interpretação extremista dos valores mórmons que motivou o assassinato de duas fiéis - e é aí que surge um gatilho narrativo que nos acompanha por toda a jornada e que nos provoca inúmeras reflexões: qual o verdadeiro poder da hipocrisia?
"Em Nome do Céu" até ensaia um mistério mais forense em seu início, porém não é esse o caminho que o roteiro de Black resolve seguir - aqui não se trata de quem matou, e sim por qual razão! Mas não é só isso, pois seguindo a obra original de Krakauer, a minissérie adiciona uma linha temporal para estabelecer paralelos entre o passado, com a origem da religião Mórmon de Smith e de seus dissidentes, e o presente (de 1984), com a investigação dos assassinatos. Além disso, existe uma supervalorização dos dogmas religiosos em boa parte dos diálogos, o que, para nós, dificulta a compreensão e atravanca a narrativa - muitos vão se incomodar com o conceito, porém depois que acostumados, é inegável que essa camada coloca a trama em outro patamar.
Depois de sete episódios, com performances que merecem elogios, principalmente de Andrew Garfield (indicado ao Emmy pelo personagem) e Wyatt Russell (como Dan Lafferty), a impressão que fica é que não era preciso ter ido tão longe na construção do mindset dos Lafferty para entender a razão do crime e muito menos por que os criminosos foram capazes de tamanha brutalidade - nesse ponto, faltou um pouco de coragem ao roteiro que facilmente poderia ter se tornado muito mais impactante e memorável - eu diria que tinha espaço para algo bem ao estilo de "Seven".
Dito isso, é fácil imaginar que "Em Nome do Céu" não agradará a todos por sua "forma", mas também pelo seu "conteúdo"; por outro lado é impossível não elogiar a qualidade técnica e artística da produção, com uma edição muito criativa que realmente ajuda a trama sair do lugar comum.
Vale o seu play, mas não espere uma jornada simples e muito menos usual.
"Em Nome do Céu" é uma produção do FX que aqui no Brasil está disponível no Star+, porém, para quem gosta e acompanha séries de investigação, é impossível não associar essa minissérie ao grande sucesso que foi "True Detective" - especialmente na sua primeira temporada. A estrutura narrativa é bem similar, cadenciada e cheia de camadas da mesma forma, além, obviamente, de ter dois elementos que conectam diretamente as duas histórias: o fanatismo religioso e o confronto íntimo dos protagonistas.
Baseado no livro homônimo de Jon Krakauer e criado por Dustin Lance Black (vencedor do Oscar por "Milk"), acompanhamos a história verídica de um crime macabro que ocorreu em uma comunidade mórmon em Utah, EUA, em 1984, onde uma mulher e sua filha foram brutalmente assassinadas dentro de casa, com a atrocidade tendo ligação com o fundamentalismo religioso e sua doutrina de “expiação por sangue”. O detetive Jeb Pyre (Andrew Garfield) investiga o caso ao mesmo tempo que precisa lidar com os reflexos de suas descobertas diante dos questionamentos de sua própria fé. Confira o trailer (em inglês):
Contextualizando o universo em que a história está inserida, por mais cruéis que sejam os detalhes do crime, mais assustador para cidadãos daquela comunidade é saber que um de seus membros (e não um forasteiro) foi o autor de tamanha atrocidade. Entre tantos homens e mulheres de fé que ali circulam, devotos de Joseph Smith e da Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias, aceitar que existe um criminoso entre os seus, parece absurdo. Isso ganha ainda mais dramaticidade quando tudo leva a crer que foi uma interpretação extremista dos valores mórmons que motivou o assassinato de duas fiéis - e é aí que surge um gatilho narrativo que nos acompanha por toda a jornada e que nos provoca inúmeras reflexões: qual o verdadeiro poder da hipocrisia?
"Em Nome do Céu" até ensaia um mistério mais forense em seu início, porém não é esse o caminho que o roteiro de Black resolve seguir - aqui não se trata de quem matou, e sim por qual razão! Mas não é só isso, pois seguindo a obra original de Krakauer, a minissérie adiciona uma linha temporal para estabelecer paralelos entre o passado, com a origem da religião Mórmon de Smith e de seus dissidentes, e o presente (de 1984), com a investigação dos assassinatos. Além disso, existe uma supervalorização dos dogmas religiosos em boa parte dos diálogos, o que, para nós, dificulta a compreensão e atravanca a narrativa - muitos vão se incomodar com o conceito, porém depois que acostumados, é inegável que essa camada coloca a trama em outro patamar.
Depois de sete episódios, com performances que merecem elogios, principalmente de Andrew Garfield (indicado ao Emmy pelo personagem) e Wyatt Russell (como Dan Lafferty), a impressão que fica é que não era preciso ter ido tão longe na construção do mindset dos Lafferty para entender a razão do crime e muito menos por que os criminosos foram capazes de tamanha brutalidade - nesse ponto, faltou um pouco de coragem ao roteiro que facilmente poderia ter se tornado muito mais impactante e memorável - eu diria que tinha espaço para algo bem ao estilo de "Seven".
Dito isso, é fácil imaginar que "Em Nome do Céu" não agradará a todos por sua "forma", mas também pelo seu "conteúdo"; por outro lado é impossível não elogiar a qualidade técnica e artística da produção, com uma edição muito criativa que realmente ajuda a trama sair do lugar comum.
Vale o seu play, mas não espere uma jornada simples e muito menos usual.