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A Rede Social

Se você ainda não assistiu, assista! Se você já assistiu, posso te garantir: nos dias de hoje, nossa percepção sobre a história da criação do Facebook é completamente diferente daquela que tínhamos em 2010 quando o filme foi lançado. Indicado em 8 categorias no Oscar de 2011, "A Rede Social" foi uma das produções mais premiadas daquela temporada em festivais importantes ao redor do planeta, com cerca de 175 vitórias e mais de 180 indicações - um verdadeiro fenômeno! A questão é que "o filme do Facebook" foi construído em cima do livro, "Bilionários por Acaso" do Bem Mezrich, em uma época que ainda não estávamos familiarizados com termos como Startup, Equity, Venture Capital e até, podemos dizer, com o enorme potencial que uma rede social viria a ter para gerar lucros. Te garanto que todos esses detalhes ganham uma outra dimensão no segundo "play", por isso mereceu uma análise mais atual!

Em uma noite de outono em 2003, Mark Zuckerberg (Jesse Eisenberg), um jovem desenvolvedor de Harvard, senta na frente de seu computador e irritado com o término de um relacionamento, começa a trabalhar em uma nova ideia. Apenas seis anos e 500 milhões de amigos mais tarde, Zuckerberg se torna o mais jovem bilionário da história graças ao sucesso de sua nova rede social: o Facebook. Esse sucesso, no entanto, acaba gerando muita dor de cabeça para ele, já que muitas pessoas envolvidas na criação do Facebook passam a cobrar de Zuckerberg os créditos e, talvez o mais impressionante, valores astronômicos referente a uma porcentagem dos investimentos feitos até ali na plataforma. Confira o trailer:

Dirigido pelo genial David Fincher e com um roteiro primoroso (vencedor do Oscar) do Aaron Sorkin, "A Rede Social" é extremamente competente ao retratar os bastidores do surgimento da Rede Social que mudou a maneira como nós nos relacionamos com a internet, pelos olhos de seu criador. Obviamente que atribuir esse status ao Mark Zuckerberg (brilhantemente interpretado pelo Eisenberg) e esquecer do brasileiro Eduardo Saverin (com um show do Andrew Garfield) e talvez (um pouco menos) dos irmãos Winklevoss (Armie Hammer), pode soar um pouco injusto, mas é inegável que a construção narrativa do filme deixa claro que o embate psicológico dessa jornada, de fato, merecia ser contada - e aqui cabe uma observação: o plot principal não tem nada a ver com tecnologia, mas sim com as relações estabelecidas durante a criação e o desenvolvimento do projeto.

Muito bem editado pelo Kirk Baxter e pelo Angus Wall (ambos vencedores do Oscar também por "The Girl with the Dragon Tattoo"), o filme é tão dinâmico quanto a forma como Mark Zuckerberg vai conectando suas ideias - para aqueles que se apoiam na legenda para entender os diálogos, se preparem, pois a leitura exige rapidez. Com a quebra da linha temporal, Fincher retratar pontos-chaves de uma complexa e turbulenta história real sem nos dar a sensação de que faltou algo. Talvez, com o streaming e se "A Rede Social" fosse uma minissérie, seu sucesso seria ainda mais estrondoso -  basta reparar em tantas produções com a mesma temática que vieram depois:  de Google Earth até Spotify, passando pelo Uber, pela Theranos e pelo WeWork.

A beleza de assistir filmes como "A Rede Social", aqui por muito mérito de Fincher e Sorkin, está justamente na possibilidade de olhar para o novo pela perspectiva de quem esteve lá desde o princípio, sem necessariamente ter que mergulhar em um documentário denso ou mais cadenciado. Quando Fincher se propôs a contar essa história, ele tinha em mente nos permitir olhar para um fato e, dadas as informações, julgar algumas atitudes - ou pelo menos a de entender a razão delas. Quando ouvimos que o sucesso de uma startup está na forma como seu fundador constrói uma solução de um problema em um mercado enorme, nem nos damos conta que muita coisa acontece por acaso, dentro de um contexto nem tão brilhante assim, onde é necessário ligar alguns pontos e que para isso crescer, alguém precisa acreditar (e investir). Talvez hoje, isso fique mais claro para a audiência e, para mim, esse filme foi como abrir uma janela de possibilidades onde perceber que a disrupção tem um custo e quem nem todos estão dispostos a pagar, faz parte do jogo!

Vale muito seu play!  

Up-date: "A Rede Social" ganhou em três das oito indicações no Oscar 2011: Melhor Edição, e Melhor Música e Melhor Roteiro Adaptado!

Assista Agora

Se você ainda não assistiu, assista! Se você já assistiu, posso te garantir: nos dias de hoje, nossa percepção sobre a história da criação do Facebook é completamente diferente daquela que tínhamos em 2010 quando o filme foi lançado. Indicado em 8 categorias no Oscar de 2011, "A Rede Social" foi uma das produções mais premiadas daquela temporada em festivais importantes ao redor do planeta, com cerca de 175 vitórias e mais de 180 indicações - um verdadeiro fenômeno! A questão é que "o filme do Facebook" foi construído em cima do livro, "Bilionários por Acaso" do Bem Mezrich, em uma época que ainda não estávamos familiarizados com termos como Startup, Equity, Venture Capital e até, podemos dizer, com o enorme potencial que uma rede social viria a ter para gerar lucros. Te garanto que todos esses detalhes ganham uma outra dimensão no segundo "play", por isso mereceu uma análise mais atual!

Em uma noite de outono em 2003, Mark Zuckerberg (Jesse Eisenberg), um jovem desenvolvedor de Harvard, senta na frente de seu computador e irritado com o término de um relacionamento, começa a trabalhar em uma nova ideia. Apenas seis anos e 500 milhões de amigos mais tarde, Zuckerberg se torna o mais jovem bilionário da história graças ao sucesso de sua nova rede social: o Facebook. Esse sucesso, no entanto, acaba gerando muita dor de cabeça para ele, já que muitas pessoas envolvidas na criação do Facebook passam a cobrar de Zuckerberg os créditos e, talvez o mais impressionante, valores astronômicos referente a uma porcentagem dos investimentos feitos até ali na plataforma. Confira o trailer:

Dirigido pelo genial David Fincher e com um roteiro primoroso (vencedor do Oscar) do Aaron Sorkin, "A Rede Social" é extremamente competente ao retratar os bastidores do surgimento da Rede Social que mudou a maneira como nós nos relacionamos com a internet, pelos olhos de seu criador. Obviamente que atribuir esse status ao Mark Zuckerberg (brilhantemente interpretado pelo Eisenberg) e esquecer do brasileiro Eduardo Saverin (com um show do Andrew Garfield) e talvez (um pouco menos) dos irmãos Winklevoss (Armie Hammer), pode soar um pouco injusto, mas é inegável que a construção narrativa do filme deixa claro que o embate psicológico dessa jornada, de fato, merecia ser contada - e aqui cabe uma observação: o plot principal não tem nada a ver com tecnologia, mas sim com as relações estabelecidas durante a criação e o desenvolvimento do projeto.

Muito bem editado pelo Kirk Baxter e pelo Angus Wall (ambos vencedores do Oscar também por "The Girl with the Dragon Tattoo"), o filme é tão dinâmico quanto a forma como Mark Zuckerberg vai conectando suas ideias - para aqueles que se apoiam na legenda para entender os diálogos, se preparem, pois a leitura exige rapidez. Com a quebra da linha temporal, Fincher retratar pontos-chaves de uma complexa e turbulenta história real sem nos dar a sensação de que faltou algo. Talvez, com o streaming e se "A Rede Social" fosse uma minissérie, seu sucesso seria ainda mais estrondoso -  basta reparar em tantas produções com a mesma temática que vieram depois:  de Google Earth até Spotify, passando pelo Uber, pela Theranos e pelo WeWork.

A beleza de assistir filmes como "A Rede Social", aqui por muito mérito de Fincher e Sorkin, está justamente na possibilidade de olhar para o novo pela perspectiva de quem esteve lá desde o princípio, sem necessariamente ter que mergulhar em um documentário denso ou mais cadenciado. Quando Fincher se propôs a contar essa história, ele tinha em mente nos permitir olhar para um fato e, dadas as informações, julgar algumas atitudes - ou pelo menos a de entender a razão delas. Quando ouvimos que o sucesso de uma startup está na forma como seu fundador constrói uma solução de um problema em um mercado enorme, nem nos damos conta que muita coisa acontece por acaso, dentro de um contexto nem tão brilhante assim, onde é necessário ligar alguns pontos e que para isso crescer, alguém precisa acreditar (e investir). Talvez hoje, isso fique mais claro para a audiência e, para mim, esse filme foi como abrir uma janela de possibilidades onde perceber que a disrupção tem um custo e quem nem todos estão dispostos a pagar, faz parte do jogo!

Vale muito seu play!  

Up-date: "A Rede Social" ganhou em três das oito indicações no Oscar 2011: Melhor Edição, e Melhor Música e Melhor Roteiro Adaptado!

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A Sala dos Professores

"A Sala dos Professores" foi o representante da Alemanha no Oscar 2024 e só por essa chancela certamente já entraria na prateleira de "imperdíveis" do streaming. No entanto, é preciso ir mais longe: o filme dirigido pelo alemão Ilker Çatak (de "I Was, I Am, I Will Be") brinca com nossa expectativa da forma mais angustiante possível, transformando uma pseudo-crítica social em um verdadeiro drama psicológico que vai te remeter ao genial "A Caça" graças a diversos gatilhos narrativos. Premiadíssimo, "Das Lehrerzimmer" (no original) mergulha profundamente nas complexidades morais e éticas do ambiente escolar. O filme explora temas como justiça e responsabilidade, a partir do impacto das ações individuais dentro de uma atmosfera de inveja e egoísmo. Com uma narrativa realmente cativante, "A Sala dos Professores" oferece uma reflexão poderosa sobre a natureza humana e as dificuldades de manter a integridade perante a pressão social e pessoal - é como se o problema fosse ganhando cada vez mais força, como uma bola de neve, até que uma atitude que parecia ser correta ganha uma proporção tão negativa que o problema mesmo passa a ser secundário! 

Cheia de simbolismos, a trama gira em torno de Carla Nowak (Leonie Benesch), uma jovem professora de matemática em uma escola secundária na Alemanha. Quando uma série de pequenos furtos começa a ocorrer na escola, Carla se envolve na investigação para descobrir o verdadeiro culpado. Sua busca pela verdade a coloca em conflito com colegas, alunos e pais, assim que resolve gravar um potencial suspeito. Revelando as tensões latentes e os dilemas éticos presentes na comunidade escolar, o filme mais do que se aprofundar no mistério, retrata os desafios de Carla que testam seus princípios e sua capacidade de navegar pelas complexas dinâmicas do poder e da moralidade. Confira o trailer:

Alguns pontos desse grande filme merecem ser discutidos. O roteiro, co-escrito por Çatak e Johannes Duncker, é um deles - eu diria que o texto é um verdadeiro estudo, cuidadoso e multifacetado, de personagens tão palpáveis que as situações que eles enfrentam parecem tão próximas que chegar a incomodar quem assiste. Ciente dessa conexão, a narrativa equilibra habilmente o suspense de um mistério central, de certa forma irrelevante, com uma exploração profunda das motivações e dos conflitos internos dos personagens. A escrita é afiada, com diálogos realistas que refletem a obscuridade das relações interpessoais e os dilemas éticos enfrentados por Carla durante a jornada - sério, é uma montanha-russa de emoções! Ilker Çatak, em sua direção, demonstra uma habilidade notável para criar essa atmosfera de tensão crescente ao mesmo tempo que nunca deixa de lado a introspecção - ele captura a claustrofobia e a intensidade emocional do ambiente escolar, priorizando enquadramentos mais fechados enquanto a fotografia usa e abusa de uma paleta de cores frias para refletir o estado mental da protagonista. Çatak ainda se apropria de longos planos, alguns deles com a câmera na mão e muitas vezes "nervosa", o que nos permite uma imersão nas interações e nos conflitos como se estivéssemos lá - tudo funcionando de uma tão maneira orgânica que nem nos damos conta do quanto estamos envolvido com aquele caos psicológico.

Leonie Benesch entrega uma performance extraordinária, capturando a mistura de idealismo quase imaturo, com uma determinação e uma vulnerabilidade difícil de equilibrar. Benesch traz uma autenticidade crua para a sua personagem, tornando Carla uma figura profundamente humana - difícil não se empatizar ou sofrer por ela. O elenco de apoio, incluindo atores como Michael Klammer e Oskar Zickur, oferece performances sólidas que enriquecem a narrativa, cada um contribuindo para a tensão e a complexidade do enredo com o único intuito de refletir as emoções em ebulição dos personagens na tensão crescente da audiência. 

"A Sala dos Professores" tem um ritmo mais cadenciado e uma abordagem introspectiva que podem tornar o filme desafiador para aqueles que preferem narrativas impactantes visualmente - especialmente no terceiro ato quando achamos que a coisa vai ficar realmente feia. Justamente por essa quebra de expectativa que a "resolução do mistério" pode parecer um anti-clímax para alguns - mas veja, o foco está muito mais nas implicações morais do que em uma conclusão mais tradicional. Antes do play saiba que aqui temos uma exploração corajosa e intelectualmente estimulante de questões éticas dentro de um microcosmo tão particular - uma visão incisiva sobre os desafios de manter a integridade e a justiça em um mundo repleto de ambiguidades e pressões, onde ninguém pode ser subestimado (nem as crianças)!

Vale muito o seu play! 

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"A Sala dos Professores" foi o representante da Alemanha no Oscar 2024 e só por essa chancela certamente já entraria na prateleira de "imperdíveis" do streaming. No entanto, é preciso ir mais longe: o filme dirigido pelo alemão Ilker Çatak (de "I Was, I Am, I Will Be") brinca com nossa expectativa da forma mais angustiante possível, transformando uma pseudo-crítica social em um verdadeiro drama psicológico que vai te remeter ao genial "A Caça" graças a diversos gatilhos narrativos. Premiadíssimo, "Das Lehrerzimmer" (no original) mergulha profundamente nas complexidades morais e éticas do ambiente escolar. O filme explora temas como justiça e responsabilidade, a partir do impacto das ações individuais dentro de uma atmosfera de inveja e egoísmo. Com uma narrativa realmente cativante, "A Sala dos Professores" oferece uma reflexão poderosa sobre a natureza humana e as dificuldades de manter a integridade perante a pressão social e pessoal - é como se o problema fosse ganhando cada vez mais força, como uma bola de neve, até que uma atitude que parecia ser correta ganha uma proporção tão negativa que o problema mesmo passa a ser secundário! 

Cheia de simbolismos, a trama gira em torno de Carla Nowak (Leonie Benesch), uma jovem professora de matemática em uma escola secundária na Alemanha. Quando uma série de pequenos furtos começa a ocorrer na escola, Carla se envolve na investigação para descobrir o verdadeiro culpado. Sua busca pela verdade a coloca em conflito com colegas, alunos e pais, assim que resolve gravar um potencial suspeito. Revelando as tensões latentes e os dilemas éticos presentes na comunidade escolar, o filme mais do que se aprofundar no mistério, retrata os desafios de Carla que testam seus princípios e sua capacidade de navegar pelas complexas dinâmicas do poder e da moralidade. Confira o trailer:

Alguns pontos desse grande filme merecem ser discutidos. O roteiro, co-escrito por Çatak e Johannes Duncker, é um deles - eu diria que o texto é um verdadeiro estudo, cuidadoso e multifacetado, de personagens tão palpáveis que as situações que eles enfrentam parecem tão próximas que chegar a incomodar quem assiste. Ciente dessa conexão, a narrativa equilibra habilmente o suspense de um mistério central, de certa forma irrelevante, com uma exploração profunda das motivações e dos conflitos internos dos personagens. A escrita é afiada, com diálogos realistas que refletem a obscuridade das relações interpessoais e os dilemas éticos enfrentados por Carla durante a jornada - sério, é uma montanha-russa de emoções! Ilker Çatak, em sua direção, demonstra uma habilidade notável para criar essa atmosfera de tensão crescente ao mesmo tempo que nunca deixa de lado a introspecção - ele captura a claustrofobia e a intensidade emocional do ambiente escolar, priorizando enquadramentos mais fechados enquanto a fotografia usa e abusa de uma paleta de cores frias para refletir o estado mental da protagonista. Çatak ainda se apropria de longos planos, alguns deles com a câmera na mão e muitas vezes "nervosa", o que nos permite uma imersão nas interações e nos conflitos como se estivéssemos lá - tudo funcionando de uma tão maneira orgânica que nem nos damos conta do quanto estamos envolvido com aquele caos psicológico.

Leonie Benesch entrega uma performance extraordinária, capturando a mistura de idealismo quase imaturo, com uma determinação e uma vulnerabilidade difícil de equilibrar. Benesch traz uma autenticidade crua para a sua personagem, tornando Carla uma figura profundamente humana - difícil não se empatizar ou sofrer por ela. O elenco de apoio, incluindo atores como Michael Klammer e Oskar Zickur, oferece performances sólidas que enriquecem a narrativa, cada um contribuindo para a tensão e a complexidade do enredo com o único intuito de refletir as emoções em ebulição dos personagens na tensão crescente da audiência. 

"A Sala dos Professores" tem um ritmo mais cadenciado e uma abordagem introspectiva que podem tornar o filme desafiador para aqueles que preferem narrativas impactantes visualmente - especialmente no terceiro ato quando achamos que a coisa vai ficar realmente feia. Justamente por essa quebra de expectativa que a "resolução do mistério" pode parecer um anti-clímax para alguns - mas veja, o foco está muito mais nas implicações morais do que em uma conclusão mais tradicional. Antes do play saiba que aqui temos uma exploração corajosa e intelectualmente estimulante de questões éticas dentro de um microcosmo tão particular - uma visão incisiva sobre os desafios de manter a integridade e a justiça em um mundo repleto de ambiguidades e pressões, onde ninguém pode ser subestimado (nem as crianças)!

Vale muito o seu play! 

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A Sociedade da Neve

Simplesmente sensacional!

O representante espanhol no Oscar 2024, "A Sociedade da Neve", é incrível em todos os sentidos: visceral, angustiante, emocionante e muito impactante, além de inegavelmente um dos melhores filmes de 2023! Embora a trama foque na busca incansável pela sobrevivência em condições devastadoras, obviamente potencializada por se tratar de uma história real, o filme dirigido pelo Juan Antonio Bayona (de "O Impossível")  é muito feliz em trazer para discussão a importância das relações e a força do espírito humano. Eu sei que pode até parecer piegas, mas é impressionante como, mesmo diante das adversidades mais extremas, o ser humano é capaz de encontrar a esperança e a vontade de viver. Para você ter uma ideia, não será preciso mais do que 45 minutos para você ter a exata noção do inferno que aquelas pessoas viveram e quando você achar que já chegou no seu limite, você ainda terá pelo menos mais 90 minutos de história pela frente. Uma verdadeira pancada!

Para quem não sabe, "A Sociedade da Neve" nos apresenta em detalhes a história do voo 571 da Força Aérea Uruguaia, fretado para levar uma equipe de rugby ao Chile, que caiu em uma geleira no coração dos Andes em 1972. Apenas 29 de seus 45 passageiros sobrevivem ao acidente. Presos em um dos ambientes mais inacessíveis e hostis no planeta, esses sobreviventes são obrigados a recorrer a medidas das mais extremas para se manterem vivos enquanto esperam o resgate. Confira o trailer:

Baseada no livro homônimo de Pablo Vierci, o filme chama muito nossa atenção pela riqueza de detalhes na recriação daquele contexto tão desesperador. Bayona consegue construir uma dinâmica narrativa que é ao mesmo tempo emocionante e perturbadora, tensa e comovente. Visualmente deslumbrante, tanto a sequência  do acidente aéreo quando as cenas que se seguiram nos Andes, tudo é de tirar o fôlego. O trabalho do fotógrafo uruguaio Pedro Luque (de "O Homem nas Trevas 2") é fundamental para a desconfortável sensação de imersão que somos "obrigados" a lidar ao assistir o filme - realmente impecável, Luque captura a beleza e a brutalidade da natureza como poucos.

Outro ponto que merece muito destaque, sem dúvida, é o elenco. Agustín Pardella é particularmente impressionante como Nando Parrado, um dos líderes dos sobreviventes e responsável por um dos momentos mais emocionantes do filme. Reparem como Pardella transmite com perfeição toda a determinação e a força de vontade de Parrado - uma das figuras mais inspiradoras da história e talvez o maior elo de conexão entre a audiência e todo aquele drama. Enzo Vogrincic como Numa Turcatti também merece muitos elogios - sua performance como narrador é sensível, profunda, comovente e filosófica. A trilha sonora composta pelo Michael Giacchino (vencedor do Oscar por "Up: Altas Aventuras") e o desenho de som do Marc Bech (de "O Home Duplicado") são dois outros elementos dignos de muitos prêmios e que ajudam a compor esse clima de suspense e tensão que Bayona se propôs a reproduzir.

Sem cair na glamourização hollywoodiana, "A Sociedade da Neve" tem um requinte (para não dizer "perfeição") técnico e artístico que justifica as 13 indicações ao prêmio Goya de 2024, mas é na sua escolha conceitual que o filme muda mesmo de patamar. Bayona é inteligente ao evitar a exploração gratuita do aspecto mais gráfico ou visual quando temas como o canibalismo, por exemplo, vem à tona. Ao seguir por um caminho mais inteligente, focando no estado psicológico daqueles que são forçados a tomar uma drástica decisão em troca da sobrevivência, o diretor usa do dilema moral para nos provocar uma reflexão dura sobre os limites intransponíveis que perdem o sentido de acordo com a situação que estamos passando - e machuca!

Olha, um golaço da Netflix com cheirinho de Oscar!

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Simplesmente sensacional!

O representante espanhol no Oscar 2024, "A Sociedade da Neve", é incrível em todos os sentidos: visceral, angustiante, emocionante e muito impactante, além de inegavelmente um dos melhores filmes de 2023! Embora a trama foque na busca incansável pela sobrevivência em condições devastadoras, obviamente potencializada por se tratar de uma história real, o filme dirigido pelo Juan Antonio Bayona (de "O Impossível")  é muito feliz em trazer para discussão a importância das relações e a força do espírito humano. Eu sei que pode até parecer piegas, mas é impressionante como, mesmo diante das adversidades mais extremas, o ser humano é capaz de encontrar a esperança e a vontade de viver. Para você ter uma ideia, não será preciso mais do que 45 minutos para você ter a exata noção do inferno que aquelas pessoas viveram e quando você achar que já chegou no seu limite, você ainda terá pelo menos mais 90 minutos de história pela frente. Uma verdadeira pancada!

Para quem não sabe, "A Sociedade da Neve" nos apresenta em detalhes a história do voo 571 da Força Aérea Uruguaia, fretado para levar uma equipe de rugby ao Chile, que caiu em uma geleira no coração dos Andes em 1972. Apenas 29 de seus 45 passageiros sobrevivem ao acidente. Presos em um dos ambientes mais inacessíveis e hostis no planeta, esses sobreviventes são obrigados a recorrer a medidas das mais extremas para se manterem vivos enquanto esperam o resgate. Confira o trailer:

Baseada no livro homônimo de Pablo Vierci, o filme chama muito nossa atenção pela riqueza de detalhes na recriação daquele contexto tão desesperador. Bayona consegue construir uma dinâmica narrativa que é ao mesmo tempo emocionante e perturbadora, tensa e comovente. Visualmente deslumbrante, tanto a sequência  do acidente aéreo quando as cenas que se seguiram nos Andes, tudo é de tirar o fôlego. O trabalho do fotógrafo uruguaio Pedro Luque (de "O Homem nas Trevas 2") é fundamental para a desconfortável sensação de imersão que somos "obrigados" a lidar ao assistir o filme - realmente impecável, Luque captura a beleza e a brutalidade da natureza como poucos.

Outro ponto que merece muito destaque, sem dúvida, é o elenco. Agustín Pardella é particularmente impressionante como Nando Parrado, um dos líderes dos sobreviventes e responsável por um dos momentos mais emocionantes do filme. Reparem como Pardella transmite com perfeição toda a determinação e a força de vontade de Parrado - uma das figuras mais inspiradoras da história e talvez o maior elo de conexão entre a audiência e todo aquele drama. Enzo Vogrincic como Numa Turcatti também merece muitos elogios - sua performance como narrador é sensível, profunda, comovente e filosófica. A trilha sonora composta pelo Michael Giacchino (vencedor do Oscar por "Up: Altas Aventuras") e o desenho de som do Marc Bech (de "O Home Duplicado") são dois outros elementos dignos de muitos prêmios e que ajudam a compor esse clima de suspense e tensão que Bayona se propôs a reproduzir.

Sem cair na glamourização hollywoodiana, "A Sociedade da Neve" tem um requinte (para não dizer "perfeição") técnico e artístico que justifica as 13 indicações ao prêmio Goya de 2024, mas é na sua escolha conceitual que o filme muda mesmo de patamar. Bayona é inteligente ao evitar a exploração gratuita do aspecto mais gráfico ou visual quando temas como o canibalismo, por exemplo, vem à tona. Ao seguir por um caminho mais inteligente, focando no estado psicológico daqueles que são forçados a tomar uma drástica decisão em troca da sobrevivência, o diretor usa do dilema moral para nos provocar uma reflexão dura sobre os limites intransponíveis que perdem o sentido de acordo com a situação que estamos passando - e machuca!

Olha, um golaço da Netflix com cheirinho de Oscar!

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A Super Fantástica História do Balão

O documentário do Star+ foi até vendido com ares de drama e lavação de roupa suja, mas a grande verdade é que "A Super Fantástica História do Balão" é muito mais uma celebração, um recorte de uma época que praticamente marcou uma geração, e, principalmente, é uma análise sobre o sucesso pela perspectiva de cada um dos seus quatro integrantes. Se em "Sandy & Junior: A História" somos transportados para uma jornada de 30 anos de carreira da maior referência na música jovem que o Brasil já teve, aqui a minissérie de três episódios mergulha nos, inacreditáveis 3 anos de sucesso fenomenal do maior grupo infantil da nossa história. E já adianto, se você passou dos 40, você vai se emocionar!

Em "A Super Fantástica História do Balão", o quarteto Simony, Jairzinho, Tob e Mike se reunem pela primeira vez para dar suas versões sobre o começo, o auge e o fim do fenômeno infantil dos anos 80, o Balão Mágico. Ilustrados por depoimentos de pessoas que fizeram parte do projeto e por inéditas imagens de arquivo, os quatro relatam suas experiências pessoais e profissionais a partir do sucesso meteórico do grupo, ainda quando eram crianças. Confira o trailer:

Com direção de Tatiana Issa, que comandou o filme “Pacto Brutal: o assassinato de Daniela Perez” e roteiro de Fernando Ceylão (“Zorra Total”) e de Beatriz Monteiro (“Caso Evandro”), a minissérie sabe equilibrar perfeitamente dois cenários: um com os depoimentos dos quatro integrantes juntos, em uma espécie de reencontro emocional; e outro com uma versão tão honesta quanto, de entrevistas individuais com cada um deles. Obviamente que os assuntos mais espinhosos são discutidos individualmente e mesmo assim fica longe do que a plataforma insistiu em vender como polêmica desde o anúncio do projeto. Outro ponto a ser observado, diz respeito aos depoimentos dos artistas, familiares e executivos do entretenimento que participaram da construção do Balão Mágico - são eles que pontuam os dramas e os pontos mais sensíveis dos bastidores, mas já te adianto: nada que possa nos deixar de cabelo em pé ou nos provocar alguma emoção mais acalorada. O fato é que o tom da narrativa é leve, nostálgica, agradável e até emocionante; nunca tensa.

O grupo era claramente um produto da indústria fonográfica dos anos 80, mais precisamente da CBS (que depois veio ser vendida para a Som Livre). Tudo, absolutamente tudo, foi  moldado para atender aos interesses comerciais de uma fatia do mercado de entretenimento praticamente inexistente na época. O grande ponto, e aí "A Super Fantástica História do Balão" talvez não tenha a força dramática que outros documentários como "Showbiz Kids" (por exemplo), é que, mesmo com esse impacto cultural pioneiro do grupo infantil, a vida dos integrantes pós-sucesso não é muito bem explorada - o plot até existe, claro, mas me pareceu que poderia ter sido melhor desenvolvido. Essa abordagem mais, digamos, controversa, talvez trouxesse um pouco mais de conflito ao roteiro, nos foi vendido isso, mas ela não está ali. No entanto existe uma honestidade tão marcante em cada um dos ex-integrantes que até esse vacilo narrativo, parece não fazer tanta falta. Aliás aqui é impossível não destacar a postura do Mike em expor toda sua história e sua relação com seu pai, o famoso assaltante Ronald Biggs (falecido há 10 anos) ou de Tob nos contando sobre seus medos gerados pela necessidade de acertar sempre.

"A Super Fantástica História do Balão" é daquelas para assistir em uma sentada - muito bem produzida e com uma dinâmica narrativa das mais competentes, a minissérie merece sua atenção., principalmente se você for dessa época! Se sim, é bem possível que você se divirta e se emocione com as histórias e as lembranças nostálgicas que inevitavelmente vão te transportar para a sua infância - nisso o documentário cumpre seu papel. Agora, para ganhar um 10, faltou cutucar algumas feridas com mais vontade - tanto nas questões de bastidores envolvendo a família da Simony quanto na relação da própria Simony com a Mara Maravilha, são exemplos de alguns espinhos que ainda não parecem prontos para serem eliminados. Uma pena!

Para você que também cantou "A Galinha Magricela" o play é quase uma obrigação!

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O documentário do Star+ foi até vendido com ares de drama e lavação de roupa suja, mas a grande verdade é que "A Super Fantástica História do Balão" é muito mais uma celebração, um recorte de uma época que praticamente marcou uma geração, e, principalmente, é uma análise sobre o sucesso pela perspectiva de cada um dos seus quatro integrantes. Se em "Sandy & Junior: A História" somos transportados para uma jornada de 30 anos de carreira da maior referência na música jovem que o Brasil já teve, aqui a minissérie de três episódios mergulha nos, inacreditáveis 3 anos de sucesso fenomenal do maior grupo infantil da nossa história. E já adianto, se você passou dos 40, você vai se emocionar!

Em "A Super Fantástica História do Balão", o quarteto Simony, Jairzinho, Tob e Mike se reunem pela primeira vez para dar suas versões sobre o começo, o auge e o fim do fenômeno infantil dos anos 80, o Balão Mágico. Ilustrados por depoimentos de pessoas que fizeram parte do projeto e por inéditas imagens de arquivo, os quatro relatam suas experiências pessoais e profissionais a partir do sucesso meteórico do grupo, ainda quando eram crianças. Confira o trailer:

Com direção de Tatiana Issa, que comandou o filme “Pacto Brutal: o assassinato de Daniela Perez” e roteiro de Fernando Ceylão (“Zorra Total”) e de Beatriz Monteiro (“Caso Evandro”), a minissérie sabe equilibrar perfeitamente dois cenários: um com os depoimentos dos quatro integrantes juntos, em uma espécie de reencontro emocional; e outro com uma versão tão honesta quanto, de entrevistas individuais com cada um deles. Obviamente que os assuntos mais espinhosos são discutidos individualmente e mesmo assim fica longe do que a plataforma insistiu em vender como polêmica desde o anúncio do projeto. Outro ponto a ser observado, diz respeito aos depoimentos dos artistas, familiares e executivos do entretenimento que participaram da construção do Balão Mágico - são eles que pontuam os dramas e os pontos mais sensíveis dos bastidores, mas já te adianto: nada que possa nos deixar de cabelo em pé ou nos provocar alguma emoção mais acalorada. O fato é que o tom da narrativa é leve, nostálgica, agradável e até emocionante; nunca tensa.

O grupo era claramente um produto da indústria fonográfica dos anos 80, mais precisamente da CBS (que depois veio ser vendida para a Som Livre). Tudo, absolutamente tudo, foi  moldado para atender aos interesses comerciais de uma fatia do mercado de entretenimento praticamente inexistente na época. O grande ponto, e aí "A Super Fantástica História do Balão" talvez não tenha a força dramática que outros documentários como "Showbiz Kids" (por exemplo), é que, mesmo com esse impacto cultural pioneiro do grupo infantil, a vida dos integrantes pós-sucesso não é muito bem explorada - o plot até existe, claro, mas me pareceu que poderia ter sido melhor desenvolvido. Essa abordagem mais, digamos, controversa, talvez trouxesse um pouco mais de conflito ao roteiro, nos foi vendido isso, mas ela não está ali. No entanto existe uma honestidade tão marcante em cada um dos ex-integrantes que até esse vacilo narrativo, parece não fazer tanta falta. Aliás aqui é impossível não destacar a postura do Mike em expor toda sua história e sua relação com seu pai, o famoso assaltante Ronald Biggs (falecido há 10 anos) ou de Tob nos contando sobre seus medos gerados pela necessidade de acertar sempre.

"A Super Fantástica História do Balão" é daquelas para assistir em uma sentada - muito bem produzida e com uma dinâmica narrativa das mais competentes, a minissérie merece sua atenção., principalmente se você for dessa época! Se sim, é bem possível que você se divirta e se emocione com as histórias e as lembranças nostálgicas que inevitavelmente vão te transportar para a sua infância - nisso o documentário cumpre seu papel. Agora, para ganhar um 10, faltou cutucar algumas feridas com mais vontade - tanto nas questões de bastidores envolvendo a família da Simony quanto na relação da própria Simony com a Mara Maravilha, são exemplos de alguns espinhos que ainda não parecem prontos para serem eliminados. Uma pena!

Para você que também cantou "A Galinha Magricela" o play é quase uma obrigação!

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A Teacher

A Teacher

Um verdadeiro soco no estômago! Essa minissérie do Hulu (aqui no Brasil no Disney+) é importante pelos temas que aborda, mas genial ao abordar esses temas com muita inteligência - na "forma" e no "conteúdo"! É um fato: "A Teacher" nos prende pela sua intensidade e pela profundidade emocional com que discute uma relação proibida, complexa e sensível. Criada por Hannah Fidell, conhecida por seu trabalho no filme homônimo de 2013, "A Teacher" oferece uma exploração corajosa e inquietante pelas dinâmicas do abuso e do poder em um relacionamento entre uma professora e seu aluno. Para você que gostou de produções como "A Caça" e "Segredos de um Escândalo", saiba que aqui temos uma perspectiva diferente, mas com a mesma qualidade narrativa, provocativa e emocionalmente carregada.

A trama gira em torno de Claire Wilson (Kate Mara), uma jovem professora do ensino médio que começa um relacionamento ilícito com seu aluno, Eric Walker (Nick Robinson). A minissérie explora as consequências deste relacionamento, tanto para Claire quanto para Eric, abordando nuances de consentimento e manipulação, além do impacto duradouro do abuso na vida de cada um deles. Confira o trailer:

Hannah Fidell, ao adaptar seu próprio filme, mostra uma habilidade notável em aprofundar os dramas de seus personagens e assim expandir uma narrativa que já havia funcionado anteriormente - mas a minissérie é melhor! O roteiro é bem estruturado e aborda o relacionamento central com uma complexidade moral rara. A minissérie não cai na armadilha de romantizar ou simplificar o abuso, mas sim, apresenta as consequências devastadoras de maneira realista e direta. Fidell, como roteirista, sabe equilibrar momentos de tensão com cenas de pura reflexão, permitindo que o público entenda a gravidade das ações de Claire e as ramificações para Eric. O golaço aqui é a forma como tudo isso se encaixa, já que a história é contada em episódios de 20/30 minutos, permitindo que a tensão fundamental do drama carregue a trama adiante sem perder a força episódica.

Veja, à medida que os episódios de "A Teacher" se desenrolam, vemos como as ações de Claire afetam profundamente a vida de Eric e como ele lida com as repercussões emocionais e sociais - nesse sentido a direção de Fidell é cirúrgica ao pontuar com sensibilidade e certa introspecção, as nuances das interações dos protagonistas. Ela utiliza uma abordagem visual intimista, com uma interessante escolha por close-ups em contraponto a uma fotografia que destaca o ambiente escolar e doméstico, criando ao mesmo tempo uma sensação de proximidade e tensão constantes. Kate Mara, mais uma vez, entrega uma performance poderosa - ela captura a ambiguidade moral e a vulnerabilidade de sua personagem para brilhar; eu diria: digna de prêmios! Mara consegue transmitir essa dualidade de Claire, tornando-a uma figura trágica e muitas vezes desconfortável de lidar. Já Nick Robinson também brilha - ele oferece uma performance autêntica e comovente de um jovem que lida com a confusão e a dor de ser manipulado por alguém em posição de autoridade. A química entre Mara e Robinson é convincente demais, destacando ainda mais o caráter perturbador de um relacionamento doentio.

"A Teacher" segue uma linha delicada, perturbadora e desconfortável. É justamente por essa atmosfera que a minissérie gera o impacto e a relevância que o tema pede. Essa exploração cuidadosa e, por vezes, incômoda do conceito social de masculinidade e sua reação ao ser confrontado com o abuso, coloca essa produção em uma prateleira que faz por merecer uma atenção especial. As dinâmicas de poder podem provocar gatilhos que valem a sua atenção, ou seja, esteja preparado para uma jornada indigesta que desafia e fomenta a reflexão ao ponto de se tornar memorável. Uma pena que "A Teacher" não recebeu o destaque que merece - de um ótimo entretenimento com um toque relevante de provocação!

Vale seu play!

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Um verdadeiro soco no estômago! Essa minissérie do Hulu (aqui no Brasil no Disney+) é importante pelos temas que aborda, mas genial ao abordar esses temas com muita inteligência - na "forma" e no "conteúdo"! É um fato: "A Teacher" nos prende pela sua intensidade e pela profundidade emocional com que discute uma relação proibida, complexa e sensível. Criada por Hannah Fidell, conhecida por seu trabalho no filme homônimo de 2013, "A Teacher" oferece uma exploração corajosa e inquietante pelas dinâmicas do abuso e do poder em um relacionamento entre uma professora e seu aluno. Para você que gostou de produções como "A Caça" e "Segredos de um Escândalo", saiba que aqui temos uma perspectiva diferente, mas com a mesma qualidade narrativa, provocativa e emocionalmente carregada.

A trama gira em torno de Claire Wilson (Kate Mara), uma jovem professora do ensino médio que começa um relacionamento ilícito com seu aluno, Eric Walker (Nick Robinson). A minissérie explora as consequências deste relacionamento, tanto para Claire quanto para Eric, abordando nuances de consentimento e manipulação, além do impacto duradouro do abuso na vida de cada um deles. Confira o trailer:

Hannah Fidell, ao adaptar seu próprio filme, mostra uma habilidade notável em aprofundar os dramas de seus personagens e assim expandir uma narrativa que já havia funcionado anteriormente - mas a minissérie é melhor! O roteiro é bem estruturado e aborda o relacionamento central com uma complexidade moral rara. A minissérie não cai na armadilha de romantizar ou simplificar o abuso, mas sim, apresenta as consequências devastadoras de maneira realista e direta. Fidell, como roteirista, sabe equilibrar momentos de tensão com cenas de pura reflexão, permitindo que o público entenda a gravidade das ações de Claire e as ramificações para Eric. O golaço aqui é a forma como tudo isso se encaixa, já que a história é contada em episódios de 20/30 minutos, permitindo que a tensão fundamental do drama carregue a trama adiante sem perder a força episódica.

Veja, à medida que os episódios de "A Teacher" se desenrolam, vemos como as ações de Claire afetam profundamente a vida de Eric e como ele lida com as repercussões emocionais e sociais - nesse sentido a direção de Fidell é cirúrgica ao pontuar com sensibilidade e certa introspecção, as nuances das interações dos protagonistas. Ela utiliza uma abordagem visual intimista, com uma interessante escolha por close-ups em contraponto a uma fotografia que destaca o ambiente escolar e doméstico, criando ao mesmo tempo uma sensação de proximidade e tensão constantes. Kate Mara, mais uma vez, entrega uma performance poderosa - ela captura a ambiguidade moral e a vulnerabilidade de sua personagem para brilhar; eu diria: digna de prêmios! Mara consegue transmitir essa dualidade de Claire, tornando-a uma figura trágica e muitas vezes desconfortável de lidar. Já Nick Robinson também brilha - ele oferece uma performance autêntica e comovente de um jovem que lida com a confusão e a dor de ser manipulado por alguém em posição de autoridade. A química entre Mara e Robinson é convincente demais, destacando ainda mais o caráter perturbador de um relacionamento doentio.

"A Teacher" segue uma linha delicada, perturbadora e desconfortável. É justamente por essa atmosfera que a minissérie gera o impacto e a relevância que o tema pede. Essa exploração cuidadosa e, por vezes, incômoda do conceito social de masculinidade e sua reação ao ser confrontado com o abuso, coloca essa produção em uma prateleira que faz por merecer uma atenção especial. As dinâmicas de poder podem provocar gatilhos que valem a sua atenção, ou seja, esteja preparado para uma jornada indigesta que desafia e fomenta a reflexão ao ponto de se tornar memorável. Uma pena que "A Teacher" não recebeu o destaque que merece - de um ótimo entretenimento com um toque relevante de provocação!

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A última coisa que ele queria

"A última coisa que ele queria" chegou no catálogo da Netflix com algumas credenciais importantes: tinha no seu comando uma diretora extremamente competente, Dee Rees (de Mudbound: Lágrimas Sobre o Mississipi); um elenco com nomes de muito peso como: Anne Hathaway, Ben Affleck e Willem Dafoe; e para finalizar, era baseado em um livro que, mesmo sem tanta projeção, parecia servir como uma excelente premissa para um ótimo filme de ação com elementos dramáticos, políticos, históricos e até jornalísticos - um pouco na linha de "Argo"!

Confira o trailer:

Mesmo com tudo isso a favor, o filme tem problemas sérios de roteiro - são muitos detalhes (históricos, inclusive) que não dá tempo de desenvolver, explicar e até organizar dentro de um arco consistente: a história de uma repórter, Elena McMahon (Anne Hathaway), que investiga uma conspiração politica envolvendo contrabando de armas e que, por acaso, acaba se envolvendo nessas negociações em uma América Central marcada pela guerra miliciana; merecia, pelo menos, mais umas duas ou três horas! O filme não é ruim, mas eu tenho que admitir que esperava mais - talvez se fosse mesmo uma minissérie, teríamos um excelente entretenimento disponível, como é um filme, o resultado ficou apenas mediano!

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"A última coisa que ele queria" chegou no catálogo da Netflix com algumas credenciais importantes: tinha no seu comando uma diretora extremamente competente, Dee Rees (de Mudbound: Lágrimas Sobre o Mississipi); um elenco com nomes de muito peso como: Anne Hathaway, Ben Affleck e Willem Dafoe; e para finalizar, era baseado em um livro que, mesmo sem tanta projeção, parecia servir como uma excelente premissa para um ótimo filme de ação com elementos dramáticos, políticos, históricos e até jornalísticos - um pouco na linha de "Argo"!

Confira o trailer:

Mesmo com tudo isso a favor, o filme tem problemas sérios de roteiro - são muitos detalhes (históricos, inclusive) que não dá tempo de desenvolver, explicar e até organizar dentro de um arco consistente: a história de uma repórter, Elena McMahon (Anne Hathaway), que investiga uma conspiração politica envolvendo contrabando de armas e que, por acaso, acaba se envolvendo nessas negociações em uma América Central marcada pela guerra miliciana; merecia, pelo menos, mais umas duas ou três horas! O filme não é ruim, mas eu tenho que admitir que esperava mais - talvez se fosse mesmo uma minissérie, teríamos um excelente entretenimento disponível, como é um filme, o resultado ficou apenas mediano!

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A Última Loja de Consertos

"A Última Loja de Consertos" chega chancelada pelo Oscar de "Melhor Curta de Documentário" de 2024, trazendo com ele uma sinfonia emocionante de esperança e memória que merece ser apreciado em pouco menos de 40 minutos de história. Em meio a uma era descartável, esse sensível documentário dirigido pelo Kris Bowers (responsável por composições de filmes de peso como "Green Book" e "A Cor Púrpura") e pelo Ben Proudfoot (vencedor do Oscar na mesma categoria em 2022 com "The Queen of Basketball" e indicado em 2021 com "A Concerto Is a Conversation") nos transporta para o coração de Los Angeles, onde um oásis de restauração musical desafia a tirania da obsolescência. Mais do que um simples conserto de instrumentos, o filme celebra a paixão, a comunidade e a preservação daquilo que nos conecta ao passado e nutre o futuro através de quatro emocionantes depoimentos. Sim, o filme é sobre pessoas e isso é belíssimo!

Em linhas gerais, "The Last Repair Shop" (no original) narra a história real de um dos últimos ateliês de reparos de instrumentos musicais nos Estados Unidos. Localizado em Los Angeles, o local oferece consertos gratuitos para alunos de escolas públicas desde 1959. O filme acompanha a rotina dedicada dos profissionais que trabalham ali, revelando o impacto transformador que a arte teve em suas vidas e na vida de milhares de jovens e adultos americanos. Confira o trailer (em inglês):

Antes de mais nada é preciso enxergar "A Última Loja de Consertos" como um curta-metragem basicamente realizado para entrar em festivais ao redor do planeta - nesse formato, não existe o menor interesse comercial como obra. Essa característica permite ao seu realizador extrapolar o seu propósito critico, artístico e técnico com muito mais liberdade, ou seja, é perceptível a "alma" em uma história sobre um ateliê e seus funcionários, que nos leva a questionar a cultura descartável, claro, mas que ao mesmo tempo nos convida para celebrar a beleza da tradição e da busca pela perfeição em pró de algo maior.

Os depoimentos dos profissionais e dos jovens músicos que de alguma forma foram impactados pela "Última Loja de Consertos" são, de fato, inspiradores e nos fazem acreditar na força transformadora da música e da arte, pela perspectiva do ser humano. Mais do que um mero registro histórico, o filme é um hino à preservação da memória e da cultura que nos faz repensar nossa relação com os objetos (que por alguma razão descartamos) e a valorizar o trabalho artesanal, que transcende a mera funcionalidade e se torna uma expressão de amor e dedicação, capaz de mudar a vida de alguém.

A fotografia impecável do jovem David Feeney-Mosier (guardem esse nome) captura a beleza singular dos instrumentos e o cuidado meticuloso dos profissionais. Já a trilha sonora, composta pelo próprio co-diretor, Kris Bowers, é uma sinfonia emocionante que acompanha a narrativa com sensibilidade e força. Já a direção de Proudfoot é precisa e envolvente, tecendo uma história rica em emoções e reflexões. Tecnicamente invejável, "A Última Loja de Consertos" é um documentário imperdível para todos que apreciam histórias inspiradoras, música de qualidade e reflexões sobre o sentido da vida. Um filme que nos toca profundamente e nos deixa com a esperança de que a paixão, o amor pela comunidade e a preservação da tradição ainda são valores importantes em nosso mundo. 

Vale muito o seu play!

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"A Última Loja de Consertos" chega chancelada pelo Oscar de "Melhor Curta de Documentário" de 2024, trazendo com ele uma sinfonia emocionante de esperança e memória que merece ser apreciado em pouco menos de 40 minutos de história. Em meio a uma era descartável, esse sensível documentário dirigido pelo Kris Bowers (responsável por composições de filmes de peso como "Green Book" e "A Cor Púrpura") e pelo Ben Proudfoot (vencedor do Oscar na mesma categoria em 2022 com "The Queen of Basketball" e indicado em 2021 com "A Concerto Is a Conversation") nos transporta para o coração de Los Angeles, onde um oásis de restauração musical desafia a tirania da obsolescência. Mais do que um simples conserto de instrumentos, o filme celebra a paixão, a comunidade e a preservação daquilo que nos conecta ao passado e nutre o futuro através de quatro emocionantes depoimentos. Sim, o filme é sobre pessoas e isso é belíssimo!

Em linhas gerais, "The Last Repair Shop" (no original) narra a história real de um dos últimos ateliês de reparos de instrumentos musicais nos Estados Unidos. Localizado em Los Angeles, o local oferece consertos gratuitos para alunos de escolas públicas desde 1959. O filme acompanha a rotina dedicada dos profissionais que trabalham ali, revelando o impacto transformador que a arte teve em suas vidas e na vida de milhares de jovens e adultos americanos. Confira o trailer (em inglês):

Antes de mais nada é preciso enxergar "A Última Loja de Consertos" como um curta-metragem basicamente realizado para entrar em festivais ao redor do planeta - nesse formato, não existe o menor interesse comercial como obra. Essa característica permite ao seu realizador extrapolar o seu propósito critico, artístico e técnico com muito mais liberdade, ou seja, é perceptível a "alma" em uma história sobre um ateliê e seus funcionários, que nos leva a questionar a cultura descartável, claro, mas que ao mesmo tempo nos convida para celebrar a beleza da tradição e da busca pela perfeição em pró de algo maior.

Os depoimentos dos profissionais e dos jovens músicos que de alguma forma foram impactados pela "Última Loja de Consertos" são, de fato, inspiradores e nos fazem acreditar na força transformadora da música e da arte, pela perspectiva do ser humano. Mais do que um mero registro histórico, o filme é um hino à preservação da memória e da cultura que nos faz repensar nossa relação com os objetos (que por alguma razão descartamos) e a valorizar o trabalho artesanal, que transcende a mera funcionalidade e se torna uma expressão de amor e dedicação, capaz de mudar a vida de alguém.

A fotografia impecável do jovem David Feeney-Mosier (guardem esse nome) captura a beleza singular dos instrumentos e o cuidado meticuloso dos profissionais. Já a trilha sonora, composta pelo próprio co-diretor, Kris Bowers, é uma sinfonia emocionante que acompanha a narrativa com sensibilidade e força. Já a direção de Proudfoot é precisa e envolvente, tecendo uma história rica em emoções e reflexões. Tecnicamente invejável, "A Última Loja de Consertos" é um documentário imperdível para todos que apreciam histórias inspiradoras, música de qualidade e reflexões sobre o sentido da vida. Um filme que nos toca profundamente e nos deixa com a esperança de que a paixão, o amor pela comunidade e a preservação da tradição ainda são valores importantes em nosso mundo. 

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A Verdadeira Dor

Que filme bacana - sensível e complexo ao mesmo tempo! Na verdade, "A Verdadeira Dor" é muito interessante por ter na sua essência uma mistura de referências de obras bem estruturadas narrativamente como "Sideways" e "Era uma vez um sonho". Esse segundo longa-metragem dirigido e roteirizado por Jesse Eisenberg (o primeiro foi "Quando Você Terminar de Salvar o Mundo"), é uma experiência cinematográfica que aposta nas nuances emocionais e nas dificuldades das relações familiares, entregando uma história marcada por sutilezas e desconfortos que realmente vai te provocar - tanto pelo lado da empatia quanto pelo da reflexão.

Com uma narrativa estruturada em torno da viagem dos primos David (Eisenberg) e Benji (Kieran Culkin) à Polônia, para homenagear a avó recém-falecida, o filme gradualmente transforma o que deveria ser um momento solene em uma profunda jornada emocional. A trama revela, aos poucos, questões mal resolvidas e ressentimentos acumulados ao longo dos anos entre os protagonistas, usando o peso histórico do Holocausto como pano de fundo para ampliar ainda mais a carga dramática e simbólica das situações vividas por eles. Confira o trailer:

Para começar é preciso elogiar a direção de Eisenberg - ela é madura e muito segura. Eisenberg conduz a história com paciência e atenção aos detalhes, sempre no tom certo e nunca se apegando em atalhos que possam, de alguma forma, nos manipular emocionalmente - e olha que o pano de fundo é bem trágico. Aqui é importante mencionar que o filme, em muitos aspectos, ecoa uma estrutura semelhante a outras obras sobre viagens familiares mais introspectivas, onde personagens buscam autoconhecimento em terras estrangeiras. Ao optar por um realismo cru, quase documental, Eisenberg elimina qualquer elemento cômico fácil ou carismático em favor de uma exploração inteligente do desconforto emocional e embora essa abordagem corajosa possa afastar parte da audiência que busca um entretenimento mais leve, é justamente ela que oferece uma experiência única, sensorial eu diria, além de sincera e desafiadora para quem deseja mergulhar nas entranhas das relações humanas.

Em termos de atuação,"A Verdadeira Dor"apresenta performances fortes, especialmente de Kieran Culkin - vencedor do Oscar pelo personagem. Seu Benji é construído como um indivíduo provocativo, sarcástico e emocionalmente instável - um prato cheio para Culkin brilhar como alguém que desafia as convenções sociais sem medo de soar inconveniente. Repare como ele se torna facilmente memorável ao se destacar em meio a personagens secundários deliberadamente discretos e pouco carismáticos, propositalmente apagados pelo diretor. Eisenberg, que por outro lado, adota uma abordagem mais contida e racional para o seu David, cria um contraponto eficiente e necessário à energia explosiva do primo, permitindo que a audiência observe claramente as diferenças monstruosas entre ambos. Um detalhe visual particularmente eficaz para explicar essa relação é a escolha cromática dos figurinos dos protagonistas, que mudam sutilmente ao longo da narrativa, sugerindo uma troca simbólica de perspectivas ou uma influência mútua entre eles. Esse pequeno, porém relevante detalhe de composição visual, é um exemplo de como Eisenberg, como diretor,  trabalha suas cenas com atenção aos menores elementos, enriquecendo a jornada de quem assiste.

A fotografia de Benjamin Loeb (de "Pieces of a Woman") destaca as raras cenas noturnas exibindo um rico jogo de cores saturadas e composições que simbolizam um verdadeiro labirinto psicológico que transita entre a solidão e a inveja - cada personagem, aliás, com seus respectivos gatilhos. É lindo de ver e de sentir, especialmente quando, quebrando nossas expectativas, a narrativa nos traz para as sequências diurnas bruscamente, apostando em uma abordagem naturalista e lindamente emoldurada com as belíssimas locações na Polônia - que enfatiza o vazio e a banalidade dos conflitos cotidianos durante uma viagem escapista. Outro aspecto interessante do filme é a utilização da música de Chopin como elemento dramático para estabelecer um toque de melancolia que dialoga diretamente com o estado emocional dos personagens - é impressionante como a trilha sonora cumpre seu papel de oferecer uma base lírica que amplifica o impacto das cenas.

A recompensa perante um filme basicamente pautado pelo silêncio entre os diálogos, está na imersão proporcionada pelo conceito narrativo de Eisenberg. Como em "Encontros e Desencontros", por exemplo, sua direção nos oferece espaço suficiente para que possamos absorver e refletir sobre temas como luto e pertencimento, e que, o invés de entregar respostas fáceis ou conclusões claras, ainda possamos buscar nas questões abertas e nas provocações emocionais do roteiro, uma reposta íntima sobre como enxergamos a vida e como algumas prioridades banais precisam ser revistas.

"A Verdadeira Dor" vale muito o seu play!

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Que filme bacana - sensível e complexo ao mesmo tempo! Na verdade, "A Verdadeira Dor" é muito interessante por ter na sua essência uma mistura de referências de obras bem estruturadas narrativamente como "Sideways" e "Era uma vez um sonho". Esse segundo longa-metragem dirigido e roteirizado por Jesse Eisenberg (o primeiro foi "Quando Você Terminar de Salvar o Mundo"), é uma experiência cinematográfica que aposta nas nuances emocionais e nas dificuldades das relações familiares, entregando uma história marcada por sutilezas e desconfortos que realmente vai te provocar - tanto pelo lado da empatia quanto pelo da reflexão.

Com uma narrativa estruturada em torno da viagem dos primos David (Eisenberg) e Benji (Kieran Culkin) à Polônia, para homenagear a avó recém-falecida, o filme gradualmente transforma o que deveria ser um momento solene em uma profunda jornada emocional. A trama revela, aos poucos, questões mal resolvidas e ressentimentos acumulados ao longo dos anos entre os protagonistas, usando o peso histórico do Holocausto como pano de fundo para ampliar ainda mais a carga dramática e simbólica das situações vividas por eles. Confira o trailer:

Para começar é preciso elogiar a direção de Eisenberg - ela é madura e muito segura. Eisenberg conduz a história com paciência e atenção aos detalhes, sempre no tom certo e nunca se apegando em atalhos que possam, de alguma forma, nos manipular emocionalmente - e olha que o pano de fundo é bem trágico. Aqui é importante mencionar que o filme, em muitos aspectos, ecoa uma estrutura semelhante a outras obras sobre viagens familiares mais introspectivas, onde personagens buscam autoconhecimento em terras estrangeiras. Ao optar por um realismo cru, quase documental, Eisenberg elimina qualquer elemento cômico fácil ou carismático em favor de uma exploração inteligente do desconforto emocional e embora essa abordagem corajosa possa afastar parte da audiência que busca um entretenimento mais leve, é justamente ela que oferece uma experiência única, sensorial eu diria, além de sincera e desafiadora para quem deseja mergulhar nas entranhas das relações humanas.

Em termos de atuação,"A Verdadeira Dor"apresenta performances fortes, especialmente de Kieran Culkin - vencedor do Oscar pelo personagem. Seu Benji é construído como um indivíduo provocativo, sarcástico e emocionalmente instável - um prato cheio para Culkin brilhar como alguém que desafia as convenções sociais sem medo de soar inconveniente. Repare como ele se torna facilmente memorável ao se destacar em meio a personagens secundários deliberadamente discretos e pouco carismáticos, propositalmente apagados pelo diretor. Eisenberg, que por outro lado, adota uma abordagem mais contida e racional para o seu David, cria um contraponto eficiente e necessário à energia explosiva do primo, permitindo que a audiência observe claramente as diferenças monstruosas entre ambos. Um detalhe visual particularmente eficaz para explicar essa relação é a escolha cromática dos figurinos dos protagonistas, que mudam sutilmente ao longo da narrativa, sugerindo uma troca simbólica de perspectivas ou uma influência mútua entre eles. Esse pequeno, porém relevante detalhe de composição visual, é um exemplo de como Eisenberg, como diretor,  trabalha suas cenas com atenção aos menores elementos, enriquecendo a jornada de quem assiste.

A fotografia de Benjamin Loeb (de "Pieces of a Woman") destaca as raras cenas noturnas exibindo um rico jogo de cores saturadas e composições que simbolizam um verdadeiro labirinto psicológico que transita entre a solidão e a inveja - cada personagem, aliás, com seus respectivos gatilhos. É lindo de ver e de sentir, especialmente quando, quebrando nossas expectativas, a narrativa nos traz para as sequências diurnas bruscamente, apostando em uma abordagem naturalista e lindamente emoldurada com as belíssimas locações na Polônia - que enfatiza o vazio e a banalidade dos conflitos cotidianos durante uma viagem escapista. Outro aspecto interessante do filme é a utilização da música de Chopin como elemento dramático para estabelecer um toque de melancolia que dialoga diretamente com o estado emocional dos personagens - é impressionante como a trilha sonora cumpre seu papel de oferecer uma base lírica que amplifica o impacto das cenas.

A recompensa perante um filme basicamente pautado pelo silêncio entre os diálogos, está na imersão proporcionada pelo conceito narrativo de Eisenberg. Como em "Encontros e Desencontros", por exemplo, sua direção nos oferece espaço suficiente para que possamos absorver e refletir sobre temas como luto e pertencimento, e que, o invés de entregar respostas fáceis ou conclusões claras, ainda possamos buscar nas questões abertas e nas provocações emocionais do roteiro, uma reposta íntima sobre como enxergamos a vida e como algumas prioridades banais precisam ser revistas.

"A Verdadeira Dor" vale muito o seu play!

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A Verdadeira História do Roubo do Século

Parece ficção, mas é real -  e justamente por isso é simplesmente genial esse documentário da Netflix! "A Verdadeira História do Roubo do Século" é um "La Casa de Papel" da vida real, contado pelos próprios assaltantes anos depois do crime - aliás, a riqueza de detalhes com que o diretor Matías Gueilburt (de "El Che" e "Guillermo Vilas: Esta Vitória é Sua") constrói a narrativa é tão impressionante que até parece mentira!

Em 2006, a Argentina sofreu o maior assalto a banco da sua história. Um plano perfeito colocado em prática foi capaz de enganar 23 reféns, 300 policias e a toda mídia argentina por um bom tempo. "Los Ladrones" (no original) conta com os depoimentos de todos os envolvidos no golpe e expõe em detalhes como toda essa jornada foi arquitetada e realizada. Confira o trailer (em espanhol):

O que mais me chamou a atenção em "A Verdadeira História do Roubo do Século" foi justamente a qualidade dos elementos que transformam qualquer obra em um grande sucesso. O fato de ser um documentário, naturalmente, dificulta essa conjunção, porém aqui temos personagens incríveis (destaque para o "professor" Fernando Araujo), uma história sensacional e uma produção de altíssima qualidade. A forma como Gueilburt aproveita todo esse material, cria uma dinâmica que dificilmente encontramos no gênero - são várias técnicas, elementos gráficos, reconstituições conceituais, além é claro dos já tradicionais depoimentos e cenas de arquivo.

Muito criativo, Gueilburt nos provoca uma reflexão ao melhor estilo Vince Gilligan (de "Breaking Bad"): seriam esses personagens verdadeiros anti-heróis (quem sabe até heróis) com personalidades marcantes, que merecem nossa torcida já que o propósito de suas ações eram justificáveis e talvez até nobres? Essa dualidade narrativa é tão empolgante que chegamos ao ponto de nos irritarmos quando descobrimos que um "pequeno detalhe" impediu que o plano fosse 100% perfeito - até o protagonista Fernando Araujo que no inicio parece uma pessoa estranha, pouco empática, se transforma em um personagem único que nutre uma certa genialidade em seu âmago.

Se você gostou da série "Roubos Inacreditáveis", pode dar um play tranquilamente que esse filme foi feito especialmente para a sua diversão - e não se julgue caso resolva torcer para os bandidos, pois toda história te fará ponderar sobre o que é "certo", o que é "errado" e, principalmente, se "valeria o risco". Essa é a "brincadeira" que sustenta esse entretenimento da melhor qualidade.

Vale muito o seu play!

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Parece ficção, mas é real -  e justamente por isso é simplesmente genial esse documentário da Netflix! "A Verdadeira História do Roubo do Século" é um "La Casa de Papel" da vida real, contado pelos próprios assaltantes anos depois do crime - aliás, a riqueza de detalhes com que o diretor Matías Gueilburt (de "El Che" e "Guillermo Vilas: Esta Vitória é Sua") constrói a narrativa é tão impressionante que até parece mentira!

Em 2006, a Argentina sofreu o maior assalto a banco da sua história. Um plano perfeito colocado em prática foi capaz de enganar 23 reféns, 300 policias e a toda mídia argentina por um bom tempo. "Los Ladrones" (no original) conta com os depoimentos de todos os envolvidos no golpe e expõe em detalhes como toda essa jornada foi arquitetada e realizada. Confira o trailer (em espanhol):

O que mais me chamou a atenção em "A Verdadeira História do Roubo do Século" foi justamente a qualidade dos elementos que transformam qualquer obra em um grande sucesso. O fato de ser um documentário, naturalmente, dificulta essa conjunção, porém aqui temos personagens incríveis (destaque para o "professor" Fernando Araujo), uma história sensacional e uma produção de altíssima qualidade. A forma como Gueilburt aproveita todo esse material, cria uma dinâmica que dificilmente encontramos no gênero - são várias técnicas, elementos gráficos, reconstituições conceituais, além é claro dos já tradicionais depoimentos e cenas de arquivo.

Muito criativo, Gueilburt nos provoca uma reflexão ao melhor estilo Vince Gilligan (de "Breaking Bad"): seriam esses personagens verdadeiros anti-heróis (quem sabe até heróis) com personalidades marcantes, que merecem nossa torcida já que o propósito de suas ações eram justificáveis e talvez até nobres? Essa dualidade narrativa é tão empolgante que chegamos ao ponto de nos irritarmos quando descobrimos que um "pequeno detalhe" impediu que o plano fosse 100% perfeito - até o protagonista Fernando Araujo que no inicio parece uma pessoa estranha, pouco empática, se transforma em um personagem único que nutre uma certa genialidade em seu âmago.

Se você gostou da série "Roubos Inacreditáveis", pode dar um play tranquilamente que esse filme foi feito especialmente para a sua diversão - e não se julgue caso resolva torcer para os bandidos, pois toda história te fará ponderar sobre o que é "certo", o que é "errado" e, principalmente, se "valeria o risco". Essa é a "brincadeira" que sustenta esse entretenimento da melhor qualidade.

Vale muito o seu play!

Assista Agora

A Vida Depois

"A Vida Depois" machuca pela imprevisibilidade e por dar a exata noção de como não temos controle, muito menos certeza do que pode acontecer com quem amamos. A profundidade da discussão deixa claro nos primeiros minutos que não se trata de um filme dinâmico, mas certamente é um mergulho dos mais interessantes no universo de alguns adolescentes que sofreram um enorme trauma e precisam continuar seu caminho como se esse impacto fosse "apenas" passageiro.

"The Fallout" (no original) acompanha a colegial Vada (Jenna Ortega) em sua jornada por uma difícil crise emocional após vivenciar uma tragédia escolar. Seu relacionamento com família e amigos, assim como sua visão do mundo, são alterados para sempre e ela precisa aprender a lidar com isso antes que seja tarde. Confira o trailer:

Vencedor dos dois principais prêmios no SXSW Film Festival de 2021 (Melhor Filme pelo Júri e pela Audiência), "A Vida Depois" é intenso, marcante e extremamente introspectivo - e se você já tiver filhos, a experiência será ainda mais reflexiva. Muito bem conduzido pela atriz canadense e agora diretora Megan Park, o filme tem um cuidado e uma sensibilidade para tocar em assuntos delicados, mas que ao mesmo tempo são necessários para que a trama ganhe força. Se no prólogo, Park sugestiona uma situação de maneira criativa e corajosa, em inúmeras outras cenas ela faz questão de focar apenas no impacto emocional da personagem e, claro, nos reflexos dessas atitudes na relação com sua família e com amigos. Veja, Park não floreia, mas também não perde a mão - tudo é muito mais interiorizado do que exposto, mesmo que o imediatismo esteja ali.

Essas escolhas conceituais da diretora deixam o filme bastante cadenciado. Ao lado da fotógrafa e estreante na função, Kristen Correll, Park faz a câmera praticamente flutuar nos pensamentos de Vada, usando e abusando de planos fechados de extremo bom gosto. Apoiada em uma trilha sonora belíssima, muitas vezes tive a impressão de estar assistido a um dos bons episódios de "Euphoria" - a própria  Jenna Ortega parece seguir os passos de Zendaya, e entrega uma performance segura, madura e muito inspirada. Aliás, todo o elenco funciona muito bem e aqui eu destaco uma linda cena entre Vada e seu pai Carlos Cavell (John Ortiz) onde ambos gritam seus sentimentos em um local reservado como se ali fosse uma espécie de rito, de recomeço, de reconexão, mas, principalmente, de amor - a cena é emocionante e muito sincera.

"A Vida Depois" sofre com a pressa de ter que estabelecer o caos emocional da protagonista, deixando de lado ótimas histórias e muitas possibilidade de identificação com a audiência (a relação com a irmã e com a mãe são só dois exemplos) - o que, certamente, em uma série ou minissérie só engrandeceria a trama. O filme tem o mérito de ser simples ao mesmo tempo em que é eficiente no que se propõe: discutir os efeitos impensáveis de um profundo trauma na cabeça (e na vida) de um adolescente. Embora a abordagem seja, de fato, cuidadosa, a forma como o silêncio é trabalhado dá o exato tom da seriedade e densidade do assunto - talvez tenha faltado um pouco mais de coragem para o arco de Mia Reed (Maddie Ziegler), cúmplice e amiga de Vada, mas com aquele final, tudo passou a fazer muito sentido - principalmente no que diz respeito as marcas e as consequências de uma realidade que não pede licença para acontecer.

Vale muito seu play!

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"A Vida Depois" machuca pela imprevisibilidade e por dar a exata noção de como não temos controle, muito menos certeza do que pode acontecer com quem amamos. A profundidade da discussão deixa claro nos primeiros minutos que não se trata de um filme dinâmico, mas certamente é um mergulho dos mais interessantes no universo de alguns adolescentes que sofreram um enorme trauma e precisam continuar seu caminho como se esse impacto fosse "apenas" passageiro.

"The Fallout" (no original) acompanha a colegial Vada (Jenna Ortega) em sua jornada por uma difícil crise emocional após vivenciar uma tragédia escolar. Seu relacionamento com família e amigos, assim como sua visão do mundo, são alterados para sempre e ela precisa aprender a lidar com isso antes que seja tarde. Confira o trailer:

Vencedor dos dois principais prêmios no SXSW Film Festival de 2021 (Melhor Filme pelo Júri e pela Audiência), "A Vida Depois" é intenso, marcante e extremamente introspectivo - e se você já tiver filhos, a experiência será ainda mais reflexiva. Muito bem conduzido pela atriz canadense e agora diretora Megan Park, o filme tem um cuidado e uma sensibilidade para tocar em assuntos delicados, mas que ao mesmo tempo são necessários para que a trama ganhe força. Se no prólogo, Park sugestiona uma situação de maneira criativa e corajosa, em inúmeras outras cenas ela faz questão de focar apenas no impacto emocional da personagem e, claro, nos reflexos dessas atitudes na relação com sua família e com amigos. Veja, Park não floreia, mas também não perde a mão - tudo é muito mais interiorizado do que exposto, mesmo que o imediatismo esteja ali.

Essas escolhas conceituais da diretora deixam o filme bastante cadenciado. Ao lado da fotógrafa e estreante na função, Kristen Correll, Park faz a câmera praticamente flutuar nos pensamentos de Vada, usando e abusando de planos fechados de extremo bom gosto. Apoiada em uma trilha sonora belíssima, muitas vezes tive a impressão de estar assistido a um dos bons episódios de "Euphoria" - a própria  Jenna Ortega parece seguir os passos de Zendaya, e entrega uma performance segura, madura e muito inspirada. Aliás, todo o elenco funciona muito bem e aqui eu destaco uma linda cena entre Vada e seu pai Carlos Cavell (John Ortiz) onde ambos gritam seus sentimentos em um local reservado como se ali fosse uma espécie de rito, de recomeço, de reconexão, mas, principalmente, de amor - a cena é emocionante e muito sincera.

"A Vida Depois" sofre com a pressa de ter que estabelecer o caos emocional da protagonista, deixando de lado ótimas histórias e muitas possibilidade de identificação com a audiência (a relação com a irmã e com a mãe são só dois exemplos) - o que, certamente, em uma série ou minissérie só engrandeceria a trama. O filme tem o mérito de ser simples ao mesmo tempo em que é eficiente no que se propõe: discutir os efeitos impensáveis de um profundo trauma na cabeça (e na vida) de um adolescente. Embora a abordagem seja, de fato, cuidadosa, a forma como o silêncio é trabalhado dá o exato tom da seriedade e densidade do assunto - talvez tenha faltado um pouco mais de coragem para o arco de Mia Reed (Maddie Ziegler), cúmplice e amiga de Vada, mas com aquele final, tudo passou a fazer muito sentido - principalmente no que diz respeito as marcas e as consequências de uma realidade que não pede licença para acontecer.

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A Voz Suprema do Blues

Se você gostou de "Uma noite em Miami..." certamente você vai gostar de "A Voz Suprema do Blues" já que ambos os filmes possuem elementos narrativos muito similares, embora com abordagens diferentes, um mais politico e o outro mais musical, as tramas giram em torno de diálogos muito bem construídos e de personagens cheios de camadas que interagem entre sim, em poucas locações, para que as discussões não se dissipem e ganhem o valor exato do seu propósito!

Também baseada na peça de teatro, dessa vez do premiado dramaturgo August Wilson, cujos textos são conhecidos por representarem os aspectos cômicos e trágicos da experiência dos africanos-americanos no século XX, "A Voz Suprema do Blues" se passa em Chicago de 1927 e volta sua atenção para dentro de um antigo estúdio de gravação da cidade. Lá, Ma Rainey (Viola Davis) e sua banda estão prontos para gravar mais um disco. Só que no estúdio o clima começa a esquentar quando a tensão aumenta entre a cantora, seu ambicioso trompista Levee (Chadwick Boseman) e a gerência branca determinada a controlar uma incontrolável “Mãe do Blues”. Confira o trailer:

Todo filme que possui bons personagens, a matéria prima para o ator bilhar, cria uma perspectiva de muito reconhecimento e, pode apostar, ele virá! Esse foi o último filme de Chadwick Boseman e sua performance está simplesmente magnífica, perfeita, no tom exato, com um range de interpretação impressionante, digno de Oscar! Visivelmente debilitado, sua postura praticamente transforma um problema em diferencial - tudo se encaixa tão perfeitamente que é triste condicionar esse reconhecimento em respeito por sua carreira: não é e não deveria ser o caso! Viola Davis é outra força da natureza, que nos tira o equilíbrio e explode na tela! Coberta de uma pesada maquiagem, roupas extravagantes e uma postura imponente, carregada de suor e arrogância, a atriz entrega um Ma Rainey digna de sua importância na música!

Com uma direção muito competente do George C. Wolfe (de Noites de Tormenta) e uma belíssima fotografia do Tobias Schliessler (de A Grande Mentira), o filme cria uma atmosfera desconfortável, angustiante, como se estivéssemos assistindo uma bomba prestes a explodir! O texto chega a nos provocar certa aflição e é muito inteligente ao pontuar os problemas sociais da época como racismo estrutural e todo o descaso com o negro de forma mais orgânica que ideológica.

“A Voz Suprema do Blues” é um daqueles filmes surpreendentes que usa de longos monólogos para evidenciar a força do seu texto e que transforma o ator em uma espécie de mensageiro e de ações muito mais internas do que impactantes - e o final é a maior prova disso! Filme para quem gosta do profundo, ao som de uma bela trilha sonora e daquela atmosfera nostálgica e sexy do blues bem tocado e interpretado com alma!

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Se você gostou de "Uma noite em Miami..." certamente você vai gostar de "A Voz Suprema do Blues" já que ambos os filmes possuem elementos narrativos muito similares, embora com abordagens diferentes, um mais politico e o outro mais musical, as tramas giram em torno de diálogos muito bem construídos e de personagens cheios de camadas que interagem entre sim, em poucas locações, para que as discussões não se dissipem e ganhem o valor exato do seu propósito!

Também baseada na peça de teatro, dessa vez do premiado dramaturgo August Wilson, cujos textos são conhecidos por representarem os aspectos cômicos e trágicos da experiência dos africanos-americanos no século XX, "A Voz Suprema do Blues" se passa em Chicago de 1927 e volta sua atenção para dentro de um antigo estúdio de gravação da cidade. Lá, Ma Rainey (Viola Davis) e sua banda estão prontos para gravar mais um disco. Só que no estúdio o clima começa a esquentar quando a tensão aumenta entre a cantora, seu ambicioso trompista Levee (Chadwick Boseman) e a gerência branca determinada a controlar uma incontrolável “Mãe do Blues”. Confira o trailer:

Todo filme que possui bons personagens, a matéria prima para o ator bilhar, cria uma perspectiva de muito reconhecimento e, pode apostar, ele virá! Esse foi o último filme de Chadwick Boseman e sua performance está simplesmente magnífica, perfeita, no tom exato, com um range de interpretação impressionante, digno de Oscar! Visivelmente debilitado, sua postura praticamente transforma um problema em diferencial - tudo se encaixa tão perfeitamente que é triste condicionar esse reconhecimento em respeito por sua carreira: não é e não deveria ser o caso! Viola Davis é outra força da natureza, que nos tira o equilíbrio e explode na tela! Coberta de uma pesada maquiagem, roupas extravagantes e uma postura imponente, carregada de suor e arrogância, a atriz entrega um Ma Rainey digna de sua importância na música!

Com uma direção muito competente do George C. Wolfe (de Noites de Tormenta) e uma belíssima fotografia do Tobias Schliessler (de A Grande Mentira), o filme cria uma atmosfera desconfortável, angustiante, como se estivéssemos assistindo uma bomba prestes a explodir! O texto chega a nos provocar certa aflição e é muito inteligente ao pontuar os problemas sociais da época como racismo estrutural e todo o descaso com o negro de forma mais orgânica que ideológica.

“A Voz Suprema do Blues” é um daqueles filmes surpreendentes que usa de longos monólogos para evidenciar a força do seu texto e que transforma o ator em uma espécie de mensageiro e de ações muito mais internas do que impactantes - e o final é a maior prova disso! Filme para quem gosta do profundo, ao som de uma bela trilha sonora e daquela atmosfera nostálgica e sexy do blues bem tocado e interpretado com alma!

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Abercrombie & Fitch - Ascensão e Queda

Esse documentário da Netflix é mais um estudo de caso dos mais interessantes sobre "cultura corporativa" - e que, pode ter certeza, vai te provocar várias reflexões. A "Abercrombie & Fitch" se tornou um verdadeiro fenômeno de vendas nos anos 90, porém sua jornada foi marcada por inúmeras acusações que vão desde abusos (inclusive sexuais) até atitudes de preconceito e racismo. 

"Abercrombie & Fitch - Ascensão e Queda" faz uma análise sobre o impacto da marca na cultura pop americana na virada do milênio, esmiuçando as estratégias de marketing e as escolhas conceituais para atingir o imaginário popular, além de discutir em detalhes como a marca prosperou e depois entrou em queda livre por defender o principio da exclusão durante três décadas. Confira o trailer (em inglês):

Definida como uma marca que representava o verdadeiro estilo americanos de ser "cool", a "Abercrombie & Fitch" se posicionou entre o sexy da Calvin Klein e o engomadinho da Ralph Lauren. O interessante porém, é que a proposta da empresa não levou em conta o que o público de 18 à 22 anos queria usar, e sim como uma excelente estratégia de marketing faria com que esse mesmo público desejasse usar suas peças - e funcionou!

Dirigido pela premiada Alison Klayman (do excelente "Jagged" da HBO Max), o documentário constrói uma linha do tempo muito competente, criando uma narrativa dinâmica, mas ao mesmo tempo de fácil entendimento. A forma como Klayman aproveita o sucesso da marca para sugerir os problemas que viriam à tona anos depois, é sensacional. Desde a chegada de Lex Wexner da L-Brands (o cara que transformou a Victoria Secret) até a escolha de Michael Jeffries como CEO, passando pelas polêmicas campanhas de Bruce Weber que tem em seu currículo trabalhos para marcas como  Calvin Klein, Ralph Lauren, Pirelli, Revlon e Gianni Versace; o documentário explora como "Abercrombie & Fitch" inovou em muitos sentidos, mas como também parou no tempo, não evoluindo de acordo com as gerações, com a tecnologia e com o entendimento de determinados posicionamentos que já não faziam o menor sentido - essa contextualização é muito importante antes de qualquer julgamento precipitado ou superficial.

Com inúmeros depoimentos de ex-funcionários, ativistas e jornalistas; além de imagens de arquivo e ótimas aplicações gráficas que ajudam a ilustrar tudo o que é contado pelas fontes, "Abercrombie & Fitch - Ascensão e Queda" vai além de uma história curiosa e passa a ser um relevante material de estudos sobre como fazer para moldar a percepção de uma sociedade (e de um mercado) e o que não fazer para se manter evoluindo quando o foco é diferenciação de produto (e de experiência).  

Vale muito o seu play!

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Esse documentário da Netflix é mais um estudo de caso dos mais interessantes sobre "cultura corporativa" - e que, pode ter certeza, vai te provocar várias reflexões. A "Abercrombie & Fitch" se tornou um verdadeiro fenômeno de vendas nos anos 90, porém sua jornada foi marcada por inúmeras acusações que vão desde abusos (inclusive sexuais) até atitudes de preconceito e racismo. 

"Abercrombie & Fitch - Ascensão e Queda" faz uma análise sobre o impacto da marca na cultura pop americana na virada do milênio, esmiuçando as estratégias de marketing e as escolhas conceituais para atingir o imaginário popular, além de discutir em detalhes como a marca prosperou e depois entrou em queda livre por defender o principio da exclusão durante três décadas. Confira o trailer (em inglês):

Definida como uma marca que representava o verdadeiro estilo americanos de ser "cool", a "Abercrombie & Fitch" se posicionou entre o sexy da Calvin Klein e o engomadinho da Ralph Lauren. O interessante porém, é que a proposta da empresa não levou em conta o que o público de 18 à 22 anos queria usar, e sim como uma excelente estratégia de marketing faria com que esse mesmo público desejasse usar suas peças - e funcionou!

Dirigido pela premiada Alison Klayman (do excelente "Jagged" da HBO Max), o documentário constrói uma linha do tempo muito competente, criando uma narrativa dinâmica, mas ao mesmo tempo de fácil entendimento. A forma como Klayman aproveita o sucesso da marca para sugerir os problemas que viriam à tona anos depois, é sensacional. Desde a chegada de Lex Wexner da L-Brands (o cara que transformou a Victoria Secret) até a escolha de Michael Jeffries como CEO, passando pelas polêmicas campanhas de Bruce Weber que tem em seu currículo trabalhos para marcas como  Calvin Klein, Ralph Lauren, Pirelli, Revlon e Gianni Versace; o documentário explora como "Abercrombie & Fitch" inovou em muitos sentidos, mas como também parou no tempo, não evoluindo de acordo com as gerações, com a tecnologia e com o entendimento de determinados posicionamentos que já não faziam o menor sentido - essa contextualização é muito importante antes de qualquer julgamento precipitado ou superficial.

Com inúmeros depoimentos de ex-funcionários, ativistas e jornalistas; além de imagens de arquivo e ótimas aplicações gráficas que ajudam a ilustrar tudo o que é contado pelas fontes, "Abercrombie & Fitch - Ascensão e Queda" vai além de uma história curiosa e passa a ser um relevante material de estudos sobre como fazer para moldar a percepção de uma sociedade (e de um mercado) e o que não fazer para se manter evoluindo quando o foco é diferenciação de produto (e de experiência).  

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Acima de Qualquer Suspeita

Ao melhor estilo "quem matou?", esteja preparado para um entretenimento da melhor qualidade - talvez um dos mais elogiados de 2024. "Acima de Qualquer Suspeita", minissérie criada por David E. Kelley e lançada pela AppleTV+, é um suspense jurídico raiz, daqueles tensos, cheios de reviravoltas e com um final surpreendente. "Presumed Innocent" (no original) se baseia no aclamado romance homônimo de Scott Turow e se destaca pela exploração profunda e envolvente "das verdades e mentiras" a partir da perspectiva de uma acusação de assassinato. Veja, para os fãs de dramas como "Big Little Lies" ou "A Escada" (não por acaso ambos da HBO) "Acima de Qualquer Suspeita" oferece uma mistura semelhante de apreensão, intriga e drama emocional que vai te tirar da zona de conforto!

A trama gira em torno de Rusty Sabich (Jake Gyllenhaal), um promotor público que se vê no centro de uma investigação de assassinato quando sua colega Carolyn Polhemus (Renate Reinsve) é encontrada morta. À medida que as evidências começam a apontar para Rusty como o principal suspeito, ele passa lutar para provar sua inocência enquanto confronta segredos e traições que ameaçam destruir sua carreira e vida pessoal. Confira o trailer:

David E. Kelley, conhecido por seu trabalho em projetos de sucesso como "Big Little Lies" e "The Undoing", traz para Apple aquele "selo HBO" que tanto nos apaixonamos. A partir de sua marca registrada, com diálogos inteligentes e personagens bem desenvolvidos, "Acima de Qualquer Suspeita" surpreende pela qualidade narrativa e visual, entregando um resultado ainda melhor que o filme de 1990 com Harrison Ford,Brian Dennehy e Raúl Julia. Seguindo a premissa da obra literária, essa adaptação explora com muita competência as ramificações de um crime brutal e a busca pela verdade, nos provocando a questionar a confiabilidade da justiça e a natureza da culpa e da inocência.

O roteiro de Kelley é meticulosamente bem estruturado, com reviravoltas bem pontuadas e um ritmo que nos mantém engajados do inicio ao fim - "Acima de Qualquer Suspeita" realmente sabe sustentar seu mistério sem roubar no jogo. Ao se apoiar em temas como a corrupção no sistema judicial, a ambiguidade moral e os limites da lealdade, a minissérie não decepciona - especialmente pelos diálogos afiados e carregados de subtexto, refletindo a complexidade das relações entre os personagens e as tensões subjacentes à investigação. Com uma direção precisa, utilizando a cinematografia de uma Chicago sombria/chuvosa (quase tirada de um filme do Batman) e que captura a tensão e a incerteza do caso, Greg Yaitanes e Anne Sewitsky equilibram habilmente o suspense de um thriller jurídico com os aspectos emocionais e pessoais de um drama de relações, criando uma jornada cativante e profundamente humana. Aliás, reparem na trilha sonora composta por Danny Bensi e Saunder Jurriaans (ambos de "Tulsa King" e de "O Homem Duplicado") - é impressionante como ela complementa a atmosfera de angústia daquele cenário com composições que variam entre a tensão e o melancólico, intensificando o mistério e a carga emocional dos personagens.

Jake Gyllenhaal entrega uma performance poderosa - um misto de vulnerabilidade e de determinação que só um homem que se vê envolto em um pesadelo jurídico é capaz de sentir. Nesse sentido, é impossível não citar o ótimo Peter Sarsgaard como o "intragável" Tommy Molto e o sempre competente Bill Camp como o "carismático" Raymond Horgan. Os três colocam "Acima de Qualquer Suspeita" em uma prateleira que potencializa a exploração corajosa e intelectualmente estimulante dos dilemas morais e éticos dentro do sistema de justiça americano. Mais uma vez David E. Kelley oferece uma visão incisiva e emocionalmente ressonante da busca pela verdade em um mundo repleto de ambiguidades e incertezas. Um golaço da AppleTV+!

Vale muito o seu play!

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Ao melhor estilo "quem matou?", esteja preparado para um entretenimento da melhor qualidade - talvez um dos mais elogiados de 2024. "Acima de Qualquer Suspeita", minissérie criada por David E. Kelley e lançada pela AppleTV+, é um suspense jurídico raiz, daqueles tensos, cheios de reviravoltas e com um final surpreendente. "Presumed Innocent" (no original) se baseia no aclamado romance homônimo de Scott Turow e se destaca pela exploração profunda e envolvente "das verdades e mentiras" a partir da perspectiva de uma acusação de assassinato. Veja, para os fãs de dramas como "Big Little Lies" ou "A Escada" (não por acaso ambos da HBO) "Acima de Qualquer Suspeita" oferece uma mistura semelhante de apreensão, intriga e drama emocional que vai te tirar da zona de conforto!

A trama gira em torno de Rusty Sabich (Jake Gyllenhaal), um promotor público que se vê no centro de uma investigação de assassinato quando sua colega Carolyn Polhemus (Renate Reinsve) é encontrada morta. À medida que as evidências começam a apontar para Rusty como o principal suspeito, ele passa lutar para provar sua inocência enquanto confronta segredos e traições que ameaçam destruir sua carreira e vida pessoal. Confira o trailer:

David E. Kelley, conhecido por seu trabalho em projetos de sucesso como "Big Little Lies" e "The Undoing", traz para Apple aquele "selo HBO" que tanto nos apaixonamos. A partir de sua marca registrada, com diálogos inteligentes e personagens bem desenvolvidos, "Acima de Qualquer Suspeita" surpreende pela qualidade narrativa e visual, entregando um resultado ainda melhor que o filme de 1990 com Harrison Ford,Brian Dennehy e Raúl Julia. Seguindo a premissa da obra literária, essa adaptação explora com muita competência as ramificações de um crime brutal e a busca pela verdade, nos provocando a questionar a confiabilidade da justiça e a natureza da culpa e da inocência.

O roteiro de Kelley é meticulosamente bem estruturado, com reviravoltas bem pontuadas e um ritmo que nos mantém engajados do inicio ao fim - "Acima de Qualquer Suspeita" realmente sabe sustentar seu mistério sem roubar no jogo. Ao se apoiar em temas como a corrupção no sistema judicial, a ambiguidade moral e os limites da lealdade, a minissérie não decepciona - especialmente pelos diálogos afiados e carregados de subtexto, refletindo a complexidade das relações entre os personagens e as tensões subjacentes à investigação. Com uma direção precisa, utilizando a cinematografia de uma Chicago sombria/chuvosa (quase tirada de um filme do Batman) e que captura a tensão e a incerteza do caso, Greg Yaitanes e Anne Sewitsky equilibram habilmente o suspense de um thriller jurídico com os aspectos emocionais e pessoais de um drama de relações, criando uma jornada cativante e profundamente humana. Aliás, reparem na trilha sonora composta por Danny Bensi e Saunder Jurriaans (ambos de "Tulsa King" e de "O Homem Duplicado") - é impressionante como ela complementa a atmosfera de angústia daquele cenário com composições que variam entre a tensão e o melancólico, intensificando o mistério e a carga emocional dos personagens.

Jake Gyllenhaal entrega uma performance poderosa - um misto de vulnerabilidade e de determinação que só um homem que se vê envolto em um pesadelo jurídico é capaz de sentir. Nesse sentido, é impossível não citar o ótimo Peter Sarsgaard como o "intragável" Tommy Molto e o sempre competente Bill Camp como o "carismático" Raymond Horgan. Os três colocam "Acima de Qualquer Suspeita" em uma prateleira que potencializa a exploração corajosa e intelectualmente estimulante dos dilemas morais e éticos dentro do sistema de justiça americano. Mais uma vez David E. Kelley oferece uma visão incisiva e emocionalmente ressonante da busca pela verdade em um mundo repleto de ambiguidades e incertezas. Um golaço da AppleTV+!

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Aftersun

Quanto menos você souber sobre "Aftersun", melhor será a sua experiência! No entanto, e isso é preciso que se diga, não será uma jornada das mais tranquilas e nem todos vão se conectar com a proposta intimista, reflexiva e cheia de sensibilidade que a diretora estreante Charlotte Wells propõe. Talvez o primeiro ponto a se levantar seja justamente a forma como Wells retrata sensações e sentimentos bastante particulares quando evocamos algo tão preciso em nossa vida: as memórias de um ente querido ou de um tempo que, infelizmente, não voltará. Aqui, a diretora, com habilidade, pesa na mão ao discutir as relações familiares pela perspectiva de uma garota de 11 anos em uma viagem de férias com seu pai - como em "Um Lugar Qualquer" existe um desconforto entre a nostalgia e a melancolia que, de fato, nos corrói por dentro. Mas atenção, embora "Aftersun" brinque com uma sensação de que algo impactante pode acontecer a qualquer momento, eu alinho sua expectativa: o filme não é sobre um fato e sim sobre o contexto que aqueles personagens viveram (já que o filme é basicamente uma página de um livro de memórias).

Sophie (Celia Rowlson-Hall na versão adulta) reflete sobre a alegria e a melancolia das férias que ela (Frankie Corio, na versão pré-adolescente) passou com seu pai Calum (Paul Mescal) na Turquia, 20 anos antes. Em um jogo de memórias reais ou simplesmente imaginárias, Sophie tenta preencher as lacunas entre o pai amoroso e cuidadoso que conheceu, com o homem cheio de marcas e dores que ela acreditava nem existir. Confira o trailer:

"Aftersun" é o tipo do filme que não deve ser definido assim que os créditos sobem - ele exige um certo tempo para digestão, para alguma reflexão e, quem sabe até, para um olhar mais íntimo sobre nossa própria relação com a "saudade". Com uma linguagem quase experimental, uma identidade marcante e um conceito independente bem latente, o filme é tocante na sua essência e emocionante na sua simplicidade - o que traz certo frescor narrativo e até alguma provocação já que o roteiro tem uma trama direta e clara ao apresentar apenas uma passagem da vida de dois personagens. O segredo, no entanto, está na maneira como a protagonista revisita essa viagem a partir das suas lembranças e de gravações em VHS feitas na época - é como se ela montasse um quebra-cabeça, agora mais madura, com peças que jamais teve contato.

A performance de Paul Mescal (indicado ao Oscar 2023 por esse personagem) é um dos pontos fortes do filme - o ator captura com maestria a complexidade de Calum, um homem que luta contra seus próprios demônios enquanto tenta ser um bom pai para Sophie. Reparem como Mescal mantém, ou pelo menos tenta manter, a filha propositalmente (e com certa dor de quem quer apenas proteger seu grande amor) afastada de certos aspectos de sua vida - as perguntas da filha sobre o relacionamento dele com a mãe, com outras namoradas, com o dinheiro; enfim, tudo toca na alma de quem assiste e te falo: nem é preciso diálogos rebuscados ou cenas de embate, é tudo no olhar, no silêncio, na sensibilidade de Wells em insinuar e não escancarar o óbvio. Frankie Corio, como não poderia deixar de ser, também brilha, transmitindo a inocência e a confusão da juventude com muita propriedade - olho nessa atriz!

"Aftersun" tem na fotografia de Gregory Oke (de "Raf") uma contribuição importante para a construção dessa atmosfera melancólica do filme, com cores desbotadas e imagens granuladas que evocam a nostalgia das férias em família. A montagem impressionista de Blair McClendon (a mesma de "A Assistente") também merece elogios: tudo acontece no seu tempo, independente de onde esteja na cronologia dos fatos - é muito bom! Mesmo que definido pela própria Charlotte Wells como uma história autobiográfica, "Aftersun" sabe exatamente como escapar do egocentrismo com poesia e simbolismo, e assim entregar uma jornada autêntica, generosa e profundamente verdadeira sobre o que há de mais particular, e por isso inquestionável, na experiência humana quando o amor está acima de tudo.

Dói, mas vale seu play!

Assista Agora

Quanto menos você souber sobre "Aftersun", melhor será a sua experiência! No entanto, e isso é preciso que se diga, não será uma jornada das mais tranquilas e nem todos vão se conectar com a proposta intimista, reflexiva e cheia de sensibilidade que a diretora estreante Charlotte Wells propõe. Talvez o primeiro ponto a se levantar seja justamente a forma como Wells retrata sensações e sentimentos bastante particulares quando evocamos algo tão preciso em nossa vida: as memórias de um ente querido ou de um tempo que, infelizmente, não voltará. Aqui, a diretora, com habilidade, pesa na mão ao discutir as relações familiares pela perspectiva de uma garota de 11 anos em uma viagem de férias com seu pai - como em "Um Lugar Qualquer" existe um desconforto entre a nostalgia e a melancolia que, de fato, nos corrói por dentro. Mas atenção, embora "Aftersun" brinque com uma sensação de que algo impactante pode acontecer a qualquer momento, eu alinho sua expectativa: o filme não é sobre um fato e sim sobre o contexto que aqueles personagens viveram (já que o filme é basicamente uma página de um livro de memórias).

Sophie (Celia Rowlson-Hall na versão adulta) reflete sobre a alegria e a melancolia das férias que ela (Frankie Corio, na versão pré-adolescente) passou com seu pai Calum (Paul Mescal) na Turquia, 20 anos antes. Em um jogo de memórias reais ou simplesmente imaginárias, Sophie tenta preencher as lacunas entre o pai amoroso e cuidadoso que conheceu, com o homem cheio de marcas e dores que ela acreditava nem existir. Confira o trailer:

"Aftersun" é o tipo do filme que não deve ser definido assim que os créditos sobem - ele exige um certo tempo para digestão, para alguma reflexão e, quem sabe até, para um olhar mais íntimo sobre nossa própria relação com a "saudade". Com uma linguagem quase experimental, uma identidade marcante e um conceito independente bem latente, o filme é tocante na sua essência e emocionante na sua simplicidade - o que traz certo frescor narrativo e até alguma provocação já que o roteiro tem uma trama direta e clara ao apresentar apenas uma passagem da vida de dois personagens. O segredo, no entanto, está na maneira como a protagonista revisita essa viagem a partir das suas lembranças e de gravações em VHS feitas na época - é como se ela montasse um quebra-cabeça, agora mais madura, com peças que jamais teve contato.

A performance de Paul Mescal (indicado ao Oscar 2023 por esse personagem) é um dos pontos fortes do filme - o ator captura com maestria a complexidade de Calum, um homem que luta contra seus próprios demônios enquanto tenta ser um bom pai para Sophie. Reparem como Mescal mantém, ou pelo menos tenta manter, a filha propositalmente (e com certa dor de quem quer apenas proteger seu grande amor) afastada de certos aspectos de sua vida - as perguntas da filha sobre o relacionamento dele com a mãe, com outras namoradas, com o dinheiro; enfim, tudo toca na alma de quem assiste e te falo: nem é preciso diálogos rebuscados ou cenas de embate, é tudo no olhar, no silêncio, na sensibilidade de Wells em insinuar e não escancarar o óbvio. Frankie Corio, como não poderia deixar de ser, também brilha, transmitindo a inocência e a confusão da juventude com muita propriedade - olho nessa atriz!

"Aftersun" tem na fotografia de Gregory Oke (de "Raf") uma contribuição importante para a construção dessa atmosfera melancólica do filme, com cores desbotadas e imagens granuladas que evocam a nostalgia das férias em família. A montagem impressionista de Blair McClendon (a mesma de "A Assistente") também merece elogios: tudo acontece no seu tempo, independente de onde esteja na cronologia dos fatos - é muito bom! Mesmo que definido pela própria Charlotte Wells como uma história autobiográfica, "Aftersun" sabe exatamente como escapar do egocentrismo com poesia e simbolismo, e assim entregar uma jornada autêntica, generosa e profundamente verdadeira sobre o que há de mais particular, e por isso inquestionável, na experiência humana quando o amor está acima de tudo.

Dói, mas vale seu play!

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Ainda Estou Aqui

Depois de muito do que já se foi falado e escrito sobre "Ainda Estou Aqui" vou tentar ser o mais honesto e direto possível: esse é um filme que retrata a nossa história - uma história que em hipótese alguma pode ser ignorada, normalizada e, principalmente, esquecida! E aqui não tenho a intenção nenhuma de soar politizado - meu intuito é falar sobre cinema (de qualidade)! Dito isso, posso te garantir que "Ainda Estou Aqui" é um daqueles filmes que chegam com um peso histórico inevitável e uma urgência que ressoa muito além de seu contexto original - sua história dói na alma, mas não deixa de aquecer o coração. Dirigido pelo grande Walter Salles, o filme adapta o livro de memórias de Marcelo Rubens Paiva que conta a jornada de sua mãe, Eunice Paiva, e como ela lidou com o desaparecimento do marido durante o período de ditadura no Brasil tendo cinco crianças para cuidar. O filme não se limita a narrar os eventos brutais da ditadura militar, mas sim em mergulhar no impacto silencioso e corrosivo da ausência, da incerteza e da necessidade de seguir em frente mesmo quando o passado se recusa a ser enterrado. "Ainda Estou Aqui" é um tratado sobre a memória e sobre a dor através de uma perspectiva profundamente pessoal.

A trama se desenrola no Rio de Janeiro dos anos 1970, quando Rubens Paiva (Selton Mello), ex-deputado cassado pelo golpe de 1964, é sequestrado pelo regime militar e nunca mais retorna para casa. Eunice (Fernanda Torres), até então uma esposa e mãe dedicada, se vê obrigada a lidar com a situação e, paralelamente, com uma reestruturação completa de sua vida. "Ainda Estou Aqui" acompanha a protagonista em sua busca por respostas, enquanto enfrenta o peso do medo, da repressão e da transformação que se impõe sobre ela e seus filhos. Confira o trailer:

Basta assistir ao trailer para entender que "Ainda Estou Aqui" não será uma jornada muito confortável. É impressionante como o diretor Walter Salles demonstra um controle total sobre o material de Marcelo Rubens Paiva, entregando um filme que transita entre um universo de dor íntima em meio à denúncia política, mas sem nunca recorrer ao discurso panfletário. Sua direção se apoia na observação minuciosa da rotina de Eunice, construindo uma atmosfera de tensão crescente através de detalhes sutis - e é aí que está a genialidade da obra. Repare nos telefonemas interrompidos, nos olhares trocados em silêncio, nos agentes do regime que se movem nas sombras - tudo funciona como um grande quebra-cabeça, onde as peças tendem a se conectar e ao observarmos por uma perspectiva mais ampla, nos vemos imersos em uma experiência marcada pelo terror (psicológico). A fotografia de Adrian Tejido (de "Narcos" e "Dom") alterna entre uma  câmera mais nervosa para capturar a urgência dos momentos de angústia com composições rigorosas que enfatizam o isolamento e o luto da protagonista. Em todo momento temos a sensação nostálgica daquele Rio de Janeiro raiz, cheio de cor e textura de uma Cidade Maravilhosa da câmera Super-8, porém sempre contrastando com uma realidade mais sombria, monocromática, pesada. A trilha sonora de Warren Ellis (de "A Proposta") complementa essa abordagem cheia de dicotomia que vai da alegria ao melancólico, contido é verdade, evitando manipulações emocionais fáceis ou desnecessários.

Fernanda Torres entrega uma das melhores atuações de sua carreira, equilibrando a força e a vulnerabilidade em uma performance que cresce a cada cena. Sua transição de esposa de classe média alta para uma mulher que precisa reconstruir sua identidade e lutar por justiça é sutil, mas avassaladora - aqui não temos cenas impactantes, algo mais gráfico, o esplendor do trabalho de Torres está sempre em impor o tom certo, na hora certa. Selton Mello, apesar de pouco tempo de tela, constrói um Rubens carismático e idealista, cuja ausência se torna um fantasma persistente ao longo do filme - seu trabalho é essencial para criarmos uma conexão emocional com a história. Sem ele, não existiria o Globo de Ouro de Fernanda Torres! E como não citar Fernanda Montenegro? Em uma participação breve e impactante, ela adiciona camadas profundas à narrativa ao interpretar a Eunice mais velha, nos anos 2000, refletindo sobre o passado com a dor que nunca se dissipou - e sem dizer uma única palavra!

"Ainda Estou Aqui" merece sua atenção, especialmente por evitar as armadilhas do melodrama e por escolher o caminho mais complexo dessa história: o de focar no impacto psicológico e social da ditadura e não o de recriar seus eventos mais brutais e desprezíveis. "Ainda Estou Aqui" é um filme que fala não apenas sobre o passado, mas sobre o presente, especialmente em um momento em que discursos revisionistas tentam reescrever essa história. Mais do que um drama histórico, essa é uma obra sobre o valor da memória, da resiliência e da necessidade de encarar a verdade, por mais dolorosa que ela seja, e mudar!

Imperdível!

Up-date:"Ainda Estou Aqui" ganhou como "Melhor Filme Internacional" no Oscar 2025!

O filme está em cartaz nos cinemas.

Depois de muito do que já se foi falado e escrito sobre "Ainda Estou Aqui" vou tentar ser o mais honesto e direto possível: esse é um filme que retrata a nossa história - uma história que em hipótese alguma pode ser ignorada, normalizada e, principalmente, esquecida! E aqui não tenho a intenção nenhuma de soar politizado - meu intuito é falar sobre cinema (de qualidade)! Dito isso, posso te garantir que "Ainda Estou Aqui" é um daqueles filmes que chegam com um peso histórico inevitável e uma urgência que ressoa muito além de seu contexto original - sua história dói na alma, mas não deixa de aquecer o coração. Dirigido pelo grande Walter Salles, o filme adapta o livro de memórias de Marcelo Rubens Paiva que conta a jornada de sua mãe, Eunice Paiva, e como ela lidou com o desaparecimento do marido durante o período de ditadura no Brasil tendo cinco crianças para cuidar. O filme não se limita a narrar os eventos brutais da ditadura militar, mas sim em mergulhar no impacto silencioso e corrosivo da ausência, da incerteza e da necessidade de seguir em frente mesmo quando o passado se recusa a ser enterrado. "Ainda Estou Aqui" é um tratado sobre a memória e sobre a dor através de uma perspectiva profundamente pessoal.

A trama se desenrola no Rio de Janeiro dos anos 1970, quando Rubens Paiva (Selton Mello), ex-deputado cassado pelo golpe de 1964, é sequestrado pelo regime militar e nunca mais retorna para casa. Eunice (Fernanda Torres), até então uma esposa e mãe dedicada, se vê obrigada a lidar com a situação e, paralelamente, com uma reestruturação completa de sua vida. "Ainda Estou Aqui" acompanha a protagonista em sua busca por respostas, enquanto enfrenta o peso do medo, da repressão e da transformação que se impõe sobre ela e seus filhos. Confira o trailer:

Basta assistir ao trailer para entender que "Ainda Estou Aqui" não será uma jornada muito confortável. É impressionante como o diretor Walter Salles demonstra um controle total sobre o material de Marcelo Rubens Paiva, entregando um filme que transita entre um universo de dor íntima em meio à denúncia política, mas sem nunca recorrer ao discurso panfletário. Sua direção se apoia na observação minuciosa da rotina de Eunice, construindo uma atmosfera de tensão crescente através de detalhes sutis - e é aí que está a genialidade da obra. Repare nos telefonemas interrompidos, nos olhares trocados em silêncio, nos agentes do regime que se movem nas sombras - tudo funciona como um grande quebra-cabeça, onde as peças tendem a se conectar e ao observarmos por uma perspectiva mais ampla, nos vemos imersos em uma experiência marcada pelo terror (psicológico). A fotografia de Adrian Tejido (de "Narcos" e "Dom") alterna entre uma  câmera mais nervosa para capturar a urgência dos momentos de angústia com composições rigorosas que enfatizam o isolamento e o luto da protagonista. Em todo momento temos a sensação nostálgica daquele Rio de Janeiro raiz, cheio de cor e textura de uma Cidade Maravilhosa da câmera Super-8, porém sempre contrastando com uma realidade mais sombria, monocromática, pesada. A trilha sonora de Warren Ellis (de "A Proposta") complementa essa abordagem cheia de dicotomia que vai da alegria ao melancólico, contido é verdade, evitando manipulações emocionais fáceis ou desnecessários.

Fernanda Torres entrega uma das melhores atuações de sua carreira, equilibrando a força e a vulnerabilidade em uma performance que cresce a cada cena. Sua transição de esposa de classe média alta para uma mulher que precisa reconstruir sua identidade e lutar por justiça é sutil, mas avassaladora - aqui não temos cenas impactantes, algo mais gráfico, o esplendor do trabalho de Torres está sempre em impor o tom certo, na hora certa. Selton Mello, apesar de pouco tempo de tela, constrói um Rubens carismático e idealista, cuja ausência se torna um fantasma persistente ao longo do filme - seu trabalho é essencial para criarmos uma conexão emocional com a história. Sem ele, não existiria o Globo de Ouro de Fernanda Torres! E como não citar Fernanda Montenegro? Em uma participação breve e impactante, ela adiciona camadas profundas à narrativa ao interpretar a Eunice mais velha, nos anos 2000, refletindo sobre o passado com a dor que nunca se dissipou - e sem dizer uma única palavra!

"Ainda Estou Aqui" merece sua atenção, especialmente por evitar as armadilhas do melodrama e por escolher o caminho mais complexo dessa história: o de focar no impacto psicológico e social da ditadura e não o de recriar seus eventos mais brutais e desprezíveis. "Ainda Estou Aqui" é um filme que fala não apenas sobre o passado, mas sobre o presente, especialmente em um momento em que discursos revisionistas tentam reescrever essa história. Mais do que um drama histórico, essa é uma obra sobre o valor da memória, da resiliência e da necessidade de encarar a verdade, por mais dolorosa que ela seja, e mudar!

Imperdível!

Up-date:"Ainda Estou Aqui" ganhou como "Melhor Filme Internacional" no Oscar 2025!

O filme está em cartaz nos cinemas.

AIR: A história por trás do logo

Se você gosta de uma história bem construída que além de curiosa, é muito divertida, você vai adorar "AIR: A história por trás do logo"! Se você é empreendedor e adora estudos de caso, você também vai amar esse filme e, muito provavelmente, não vai assistir apenas uma vez! Agora, se você precisa vender uma ideia, então eu sugiro que você estude (e muito) o roteiro desse filme, afinal o diretor Ben Affleck, em sua quinta empreitada na função, contextualiza tão bem a jornada de convencimento pela qual o executivo de marketing Sonny Vaccaro (que cuidava da divisão de basquete da Nike) passou, que não vou me surpreender se começar a ver cenas do filme em inúmeras palestras sobre o tema daqui para frente (contém ironia). É sério: Vaccaro (Matt Damon), além inovar em sua proposta, ainda foi capaz de convencer o "todo poderoso" Phil Knight (Ben Affleck) de que era possível investir em apenas um jogador (e não em três como de costume), ter muito lucro e ainda transformar o mercado de calçados esportivos mesmo sendo, na época, a terceira empresa em market share nos EUA - bem longe da primeira que, inclusive, foi adquirida pela Nike anos mais tarde.

O filme tem uma premissa das mais simples, mas nem por isso menos empolgante: revelar a inacreditável história sobre uma parceria improvável (que se tornou revolucionária) entre o então desconhecido Michael Jordan e a incipiente divisão de basquete da Nike, que revolucionou o mundo dos esportes e da cultura contemporânea com a marca "Air Jordan". Confira o trailer:

Como "A Rede Social" foi capaz de nos surpreender em 2010 ao contar a história de criação do Facebook, tenho a impressão que  "AIR" (que definitivamente não precisava desse subtítulo) vai pelo mesmo caminho. De fato a história nem é tão desconhecida assim, mas o interessante do roteiro escrito pelo estreante Alex Convery, está justamente na forma como o recorte histórico é retratado, alternando curiosidades dos bastidores com a dinâmica corporativa (e de inovação) do inicio dos anos 80, e sempre criando paralelos com elementos que fazem parte da cultura da Nike até hoje - como nas várias vezes em que os valores da empresa são citados para justificar uma ação (ou postura) de Vaccaro durante sua cruzada de convencimento. Esse conceito narrativo funciona muito bem, afinal, como sabemos onde essa história vai dar, algumas passagens soam, de fato, muito engraçadas ao analisarmos os fatos em retrospectiva.

Embora a edição do craque William Goldenberg (vencedor do Oscar por "Argo", também de Affleck) pontue muito bem os cirúrgicos enquadramentos de outro craque, o diretor de fotografia Robert Richardson (vencedor de 3 Oscars e indicados para outros 7), criando uma atmosfera quase mística sobre acreditar em uma ideia e ir até as últimas consequências para provar que ela vai realmente funcionar, é muito provável que nada disso funcionasse não fosse o trabalho impecável do elenco: de Matt Damon ao Jason Bateman (como o diretor de marketing da Nike, Rob Strasser); passando pelos impagáveis Chris Tucker (como Howard White - hoje VP da Marca "Air Jordan") e Matthew Maher (como Peter Moore, designer icônico do "Air Jordan 1"); sem falar nas performances de Chris Messina, que interpreta o agente de MJ que trava duelos hilários com Vaccaro; e a sempre competente Viola Davis como a mãe de Jordan.

"AIR: A história por trás do logo" é o tipo do filme que tem cheiro de Oscar - pelo seu equilíbrio perfeito entre o contexto histórico dos mais relevantes e sua narrativa heróica tipicamente americana (no bom sentido), cheia de alívios cômicos inteligentes e lições empreendedoras pertinentes, envolvidas, claro, ao som de uma trilha sonora nostálgica que dá o exato tom de leveza que Affleck impõe à trama. Olha, é incrível como o filme está redondinho e como funciona bem como entretenimento - eu diria que segue a linha de "Lakers: Hora de Vencer" da HBO, mas sem a necessidade de ter que mostrar uma única cena em quadra!

Imperdível!

Assista Agora

Se você gosta de uma história bem construída que além de curiosa, é muito divertida, você vai adorar "AIR: A história por trás do logo"! Se você é empreendedor e adora estudos de caso, você também vai amar esse filme e, muito provavelmente, não vai assistir apenas uma vez! Agora, se você precisa vender uma ideia, então eu sugiro que você estude (e muito) o roteiro desse filme, afinal o diretor Ben Affleck, em sua quinta empreitada na função, contextualiza tão bem a jornada de convencimento pela qual o executivo de marketing Sonny Vaccaro (que cuidava da divisão de basquete da Nike) passou, que não vou me surpreender se começar a ver cenas do filme em inúmeras palestras sobre o tema daqui para frente (contém ironia). É sério: Vaccaro (Matt Damon), além inovar em sua proposta, ainda foi capaz de convencer o "todo poderoso" Phil Knight (Ben Affleck) de que era possível investir em apenas um jogador (e não em três como de costume), ter muito lucro e ainda transformar o mercado de calçados esportivos mesmo sendo, na época, a terceira empresa em market share nos EUA - bem longe da primeira que, inclusive, foi adquirida pela Nike anos mais tarde.

O filme tem uma premissa das mais simples, mas nem por isso menos empolgante: revelar a inacreditável história sobre uma parceria improvável (que se tornou revolucionária) entre o então desconhecido Michael Jordan e a incipiente divisão de basquete da Nike, que revolucionou o mundo dos esportes e da cultura contemporânea com a marca "Air Jordan". Confira o trailer:

Como "A Rede Social" foi capaz de nos surpreender em 2010 ao contar a história de criação do Facebook, tenho a impressão que  "AIR" (que definitivamente não precisava desse subtítulo) vai pelo mesmo caminho. De fato a história nem é tão desconhecida assim, mas o interessante do roteiro escrito pelo estreante Alex Convery, está justamente na forma como o recorte histórico é retratado, alternando curiosidades dos bastidores com a dinâmica corporativa (e de inovação) do inicio dos anos 80, e sempre criando paralelos com elementos que fazem parte da cultura da Nike até hoje - como nas várias vezes em que os valores da empresa são citados para justificar uma ação (ou postura) de Vaccaro durante sua cruzada de convencimento. Esse conceito narrativo funciona muito bem, afinal, como sabemos onde essa história vai dar, algumas passagens soam, de fato, muito engraçadas ao analisarmos os fatos em retrospectiva.

Embora a edição do craque William Goldenberg (vencedor do Oscar por "Argo", também de Affleck) pontue muito bem os cirúrgicos enquadramentos de outro craque, o diretor de fotografia Robert Richardson (vencedor de 3 Oscars e indicados para outros 7), criando uma atmosfera quase mística sobre acreditar em uma ideia e ir até as últimas consequências para provar que ela vai realmente funcionar, é muito provável que nada disso funcionasse não fosse o trabalho impecável do elenco: de Matt Damon ao Jason Bateman (como o diretor de marketing da Nike, Rob Strasser); passando pelos impagáveis Chris Tucker (como Howard White - hoje VP da Marca "Air Jordan") e Matthew Maher (como Peter Moore, designer icônico do "Air Jordan 1"); sem falar nas performances de Chris Messina, que interpreta o agente de MJ que trava duelos hilários com Vaccaro; e a sempre competente Viola Davis como a mãe de Jordan.

"AIR: A história por trás do logo" é o tipo do filme que tem cheiro de Oscar - pelo seu equilíbrio perfeito entre o contexto histórico dos mais relevantes e sua narrativa heróica tipicamente americana (no bom sentido), cheia de alívios cômicos inteligentes e lições empreendedoras pertinentes, envolvidas, claro, ao som de uma trilha sonora nostálgica que dá o exato tom de leveza que Affleck impõe à trama. Olha, é incrível como o filme está redondinho e como funciona bem como entretenimento - eu diria que segue a linha de "Lakers: Hora de Vencer" da HBO, mas sem a necessidade de ter que mostrar uma única cena em quadra!

Imperdível!

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Al Davis vs. The NFL

Esse não é um documentário sobre o "esporte", esse é um documentário  sobre os bastidores do "esporte", sobre o negócio, sobre o futuro, sobre duas formas distintas de escrever a história, só que pelo olhar de figuras marcantes do futebol americano que nunca estiveram em "campo":  o ex-proprietário dos Raiders, Al Davis, e o ex-comissário da NFL, Pete Rozelle.

"Al Davis vs. The NFL" mostra os reflexos de uma relação conflituosa entre duas ligas profissionais de futebol americano, a AFL e a NFL, soberanas na década de 1960, que resultou em uma enorme animosidade quando Al Davis quis sair de Oakland e levar o seu Raders para Los Angeles e que acabou gerando um desgastante processo antitruste que Davis moveu contra a NFL em 1980, justamente por Rozelle acreditar que essa decisão não cabia apenas a uma pessoa e sim aos 28 sócios de uma única liga que havia sido criada para evitar conflitos de interesses e preservar a vontade do todo. Confira o trailer (em inglês):

Mais uma incrível produção do selo "30 for 30" da ESPN Films, "Al Davis vs. The NFL" é um recorte histórico que discute a visão empreendedora tendo como pano de fundo o esporte. Se de um lado entendemos o conceito liberal de Al Davis, do outro somos impactados sobre a visão controladora de Rozelle - e o interessante do documentário dirigido por Ken Rodgers (de "The Four Falls of Buffalo") é que em nenhum momento ele defende um dos lados, deixando para a audiência a posição de júri e, admito, dentro de um determinado contexto, ambas as visões faziam sentido para o negócio.

Veja, já nos começo dos anos 80, Davis queria um estádio maior, de última geração, onde pudesse arrecadar mais receita com venda de ingressos e de camarotes luxuosos, além de poder negociar maiores verbas com os contratos de transmissão que a NFL liderava. Já Rozelle queria que o todo decidisse o destino da liga, não queria que o proprietário de um time tivesse a liberdade de decidir sozinho qual o melhor local para levar sua franquia e assim abrisse um precedente que certamente impactaria na identidade da liga e na tradição dos seus times - é como se ele quisesse impedir que, da noite para o dia, o Flamengo, sozinho, resolvesse mudar para São Paulo, deixando seus torcedores de décadas à 450 km de distância.

O fato é que nenhuma competição, dentro ou fora do campo, ajudou a moldar a NFL moderna tanto quanto esses embates de décadas entre Al Davis e Pete Rozelle e o documentário foi muito feliz em pontuar todos os detalhes e implicações dessa disputa profissional. Um detalhe interessante: a história é contada em primeira pessoa, e o diretor apostou em um conceito narrativo (e visual) que preservou os espíritos de Pete e Davis como protagonistas - como ambos já faleceram, foi usada a técnica de “deepfake” para coloca-los lado a lado mais uma vez. Embora a reinvenção possa não parecer real (e claramente essa não era a intenção), a montagem do próprio Rogers foi muito sensível e inteligente para equilibrar inúmeras imagens de arquivo com a naturalidade de um contador de histórias que olha para o passado e avalia sua importância no presente.

Vale muito a pena!

Assista Agora

Esse não é um documentário sobre o "esporte", esse é um documentário  sobre os bastidores do "esporte", sobre o negócio, sobre o futuro, sobre duas formas distintas de escrever a história, só que pelo olhar de figuras marcantes do futebol americano que nunca estiveram em "campo":  o ex-proprietário dos Raiders, Al Davis, e o ex-comissário da NFL, Pete Rozelle.

"Al Davis vs. The NFL" mostra os reflexos de uma relação conflituosa entre duas ligas profissionais de futebol americano, a AFL e a NFL, soberanas na década de 1960, que resultou em uma enorme animosidade quando Al Davis quis sair de Oakland e levar o seu Raders para Los Angeles e que acabou gerando um desgastante processo antitruste que Davis moveu contra a NFL em 1980, justamente por Rozelle acreditar que essa decisão não cabia apenas a uma pessoa e sim aos 28 sócios de uma única liga que havia sido criada para evitar conflitos de interesses e preservar a vontade do todo. Confira o trailer (em inglês):

Mais uma incrível produção do selo "30 for 30" da ESPN Films, "Al Davis vs. The NFL" é um recorte histórico que discute a visão empreendedora tendo como pano de fundo o esporte. Se de um lado entendemos o conceito liberal de Al Davis, do outro somos impactados sobre a visão controladora de Rozelle - e o interessante do documentário dirigido por Ken Rodgers (de "The Four Falls of Buffalo") é que em nenhum momento ele defende um dos lados, deixando para a audiência a posição de júri e, admito, dentro de um determinado contexto, ambas as visões faziam sentido para o negócio.

Veja, já nos começo dos anos 80, Davis queria um estádio maior, de última geração, onde pudesse arrecadar mais receita com venda de ingressos e de camarotes luxuosos, além de poder negociar maiores verbas com os contratos de transmissão que a NFL liderava. Já Rozelle queria que o todo decidisse o destino da liga, não queria que o proprietário de um time tivesse a liberdade de decidir sozinho qual o melhor local para levar sua franquia e assim abrisse um precedente que certamente impactaria na identidade da liga e na tradição dos seus times - é como se ele quisesse impedir que, da noite para o dia, o Flamengo, sozinho, resolvesse mudar para São Paulo, deixando seus torcedores de décadas à 450 km de distância.

O fato é que nenhuma competição, dentro ou fora do campo, ajudou a moldar a NFL moderna tanto quanto esses embates de décadas entre Al Davis e Pete Rozelle e o documentário foi muito feliz em pontuar todos os detalhes e implicações dessa disputa profissional. Um detalhe interessante: a história é contada em primeira pessoa, e o diretor apostou em um conceito narrativo (e visual) que preservou os espíritos de Pete e Davis como protagonistas - como ambos já faleceram, foi usada a técnica de “deepfake” para coloca-los lado a lado mais uma vez. Embora a reinvenção possa não parecer real (e claramente essa não era a intenção), a montagem do próprio Rogers foi muito sensível e inteligente para equilibrar inúmeras imagens de arquivo com a naturalidade de um contador de histórias que olha para o passado e avalia sua importância no presente.

Vale muito a pena!

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Além da Vida

"Além da Vida" conta a história de três pessoas que são assombradas pela "morte", de diferentes formas. George (Matt Damon) é um trabalhador da construção civil que tem uma ligação especial com a vida além da morte. Marie (Cécile de France), uma jornalista francesa, é uma das vítimas do Tsunami de 2004 que quase a matou. E Marcus (George McLaren e Frankie McLaren), é uma criança londrina, que quando perde o seu irmão gêmeo, procura desesperadamente obter respostas que fogem do seu entendimento. Cada um deles está em busca da sua verdade até que seus caminhos se cruzam e alteram para sempre aquilo em que eles acreditavam existir além da vida. Confira o Trailer:

"Hereafter" (no original) é um filme de 2010 dirigido pelo excelente Clint Eastwood que fala sobre a relação do ser humano com a morte (ou o que não se sabe dela). Por si só o tema já chamaria a atenção, mas somando uma direção precisa e segura de um premiado Eastwood e uma cena simplesmente sensacional do Tsunami (que, inclusive, lhe rendeu uma indicação ao Oscar de Efeitos Visuais em 2011), teríamos um drama dos bons, certo? Certo, mas quando as três histórias dos três personagens distintos se encontram no final (ao melhor estilo Alejandro Gonzalez Inarritu) percebemos que o filme não supera nossas expectativas - seu sentimentalismo, na minha opinião, passou um pouco do ponto. Não chega a atrapalhar a nossa experiência, mas coloca "Além da Vida" em outra prateleira.

Certamente a direção é melhor do filme: as histórias são muito bem construídas, os personagens são intensos com seus dramas particulares e os “eventos” que os fazem pensar sobre a razão de suas próprias existências funcionam muito bem - mas o roteiro oscila, ele acaba alternando momentos grandiosos (e não falo só da cena do Tsunami) com momentos um pouco arrastados, que chega a cansar um pouco.

Claro que o filme vale a pena, existem três momentos específicos que justificam muito as duas horas de duração, mas admito que esperava um pouco mais - talvez até pelo tamanho das minhas expectativas depois de assistir um trailer tão empolgante.

Otimo entretenimento!

Assista Agora

"Além da Vida" conta a história de três pessoas que são assombradas pela "morte", de diferentes formas. George (Matt Damon) é um trabalhador da construção civil que tem uma ligação especial com a vida além da morte. Marie (Cécile de France), uma jornalista francesa, é uma das vítimas do Tsunami de 2004 que quase a matou. E Marcus (George McLaren e Frankie McLaren), é uma criança londrina, que quando perde o seu irmão gêmeo, procura desesperadamente obter respostas que fogem do seu entendimento. Cada um deles está em busca da sua verdade até que seus caminhos se cruzam e alteram para sempre aquilo em que eles acreditavam existir além da vida. Confira o Trailer:

"Hereafter" (no original) é um filme de 2010 dirigido pelo excelente Clint Eastwood que fala sobre a relação do ser humano com a morte (ou o que não se sabe dela). Por si só o tema já chamaria a atenção, mas somando uma direção precisa e segura de um premiado Eastwood e uma cena simplesmente sensacional do Tsunami (que, inclusive, lhe rendeu uma indicação ao Oscar de Efeitos Visuais em 2011), teríamos um drama dos bons, certo? Certo, mas quando as três histórias dos três personagens distintos se encontram no final (ao melhor estilo Alejandro Gonzalez Inarritu) percebemos que o filme não supera nossas expectativas - seu sentimentalismo, na minha opinião, passou um pouco do ponto. Não chega a atrapalhar a nossa experiência, mas coloca "Além da Vida" em outra prateleira.

Certamente a direção é melhor do filme: as histórias são muito bem construídas, os personagens são intensos com seus dramas particulares e os “eventos” que os fazem pensar sobre a razão de suas próprias existências funcionam muito bem - mas o roteiro oscila, ele acaba alternando momentos grandiosos (e não falo só da cena do Tsunami) com momentos um pouco arrastados, que chega a cansar um pouco.

Claro que o filme vale a pena, existem três momentos específicos que justificam muito as duas horas de duração, mas admito que esperava um pouco mais - talvez até pelo tamanho das minhas expectativas depois de assistir um trailer tão empolgante.

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Além do Tempo

Esse filme é simplesmente sensacional, mas vai mexer com você e já te aviso: não vai ser uma jornada emocionalmente tranquila! "Além do Tempo" ou "Zee van tijd", no original, é um filme holandês profundamente tocante que explora com sutileza as complexidades do luto e da reconstrução emocional após uma perda irreparável. Inserido numa tradição cinematográfica europeia que se dedica a mergulhar fundo no íntimo de seus personagens, semelhante a obras como "Manchester à Beira-Mar" e "Amor", de Michael Haneke, esse drama dirigido com muita sensibilidade por Theu Boermans se destaca por sua abordagem mais poética e introspectiva, e pela precisão cirúrgica com que investiga os limites do amor diante de uma tragédia familiar.

A trama, basicamente, gira em torno do jovem casal Lucas (Reinout Scholten van Aschat) e Johanna (Sallie Harmsen), que embarcam em uma viagem marítima com seu filho pequeno, Kai (River Oosterink). O que deveria ser um momento idílico de conexão familiar se transforma em um pesadelo quando, no meio ao Atlântico, a criança misteriosamente some. Esse evento devastador não só quebra a estrutura familiar, como molda e redefine completamente suas vidas pelos próximos 30 e poucos anos. Confira o trailer:

Baseado em uma história real, o roteiro, escrito por Marieke van der Pol, opta por uma narrativa que intercala diferentes linhas do tempo da vida do casal, apresentando não apenas os acontecimentos imediatos após a tragédia, mas também como as consequências ecoam décadas depois, trazendo temas sensíveis para a discussão como as dores inerentes da memória e da culpa, além dos diferentes caminhos de superação que cada um escolhe trilhar após uma situação limite. A direção de Boermans, vale dizer, é particularmente impressionante - a forma como ele lida com a cronologia não linear da história é primorosa. Boermans conduz o filme como um quebra-cabeças emocional, montando com cuidado as peças do passado e presente de maneira fluída e natural, permitindo que a audiência acompanhe o desenvolvimento dos personagens de forma gradual, envolvente e visceral. Boermans usa de uma montagem excelente de Herman P. Koerts e Job ter Burg para criar transições que enfatizam o impacto emocional das lembranças e o peso das decisões tomadas pelos protagonistas, evitando assim que a narrativa caia em um melodrama fácil. Veja, aqui tudo é retratado com muita (mas, muita) sensibilidade.

Tecnicamente, "Além do Tempo" é primoroso. A fotografia do Myrthe Mosterman merece destaque especial pela forma como capta as nuances emocionais da história, variando entre a claridade vibrante das cenas iniciais, representando a plenitude, e os tons mais sóbrios e cinzentos que predominam nos períodos posteriores, refletindo o estado emocional dos personagens. Veja, a escolha visual de retratar o mar tanto como símbolo de liberdade quanto de dor insuperável é especialmente poderosa, ao ponto de transformar o oceano em um personagem próprio dentro da narrativa. Como todo filme de relação, impossível não citar as atuações extraordinárias do elenco. Reinout Scholten van Aschat e Sallie Harmsen entregam performances extremamente convincentes e emocionantes, construindo personagens cheio de camadas e realmente humanos. Aschat consegue, com poucos gestos e olhares, transmitir a profunda angústia e o isolamento emocional de Lucas, enquanto Harmsen impressiona pela forma como Johanna internaliza sua dor, exibindo uma marca silenciosa que se manifesta em pequenas nuances. Já Gijs Scholten van Aschat e Elsie de Brauw, que interpretam o casal 30 anos depois, adicionam elementos de complexidade ao filme, refletindo o desgaste e a resiliência acumulados ao longo dos anos, cada qual com seus fantasmas.

Se há algo que pode incomodar em "Além do Tempo" certamente é o seu ritmo. Até pela própria proposta do diretor, o filme exige uma dose significativa de paciência e entrega emocional, podendo soar contemplativo demais para alguns, mas é justamente esse ritmo mais lento que permite um mergulho mais profundo na psicologia dos personagens e na exploração detalhada das consequências da perda e, claro, do seu luto. Em última análise, "Além do Tempo" é uma experiência intensa, que usa uma linguagem artística sofisticada para investigar questões universais sobre o amor, e os caminhos de cura que o tempo pode ou não proporcionar. Com uma direção precisa, atuações de se aplaudir de pé e uma abordagem visual de estremo bom gosto, Theu Boermans entrega um filme emocionalmente maduro e reflexivo, que certamente irá permanecer na sua mente muito depois que os créditos finais rolarem na tela.

Olha, um filme indispensável para quem aprecia o cinema de qualidade e saber tocar profundamente na alma humana. Vale demais!

Assista Agora

Esse filme é simplesmente sensacional, mas vai mexer com você e já te aviso: não vai ser uma jornada emocionalmente tranquila! "Além do Tempo" ou "Zee van tijd", no original, é um filme holandês profundamente tocante que explora com sutileza as complexidades do luto e da reconstrução emocional após uma perda irreparável. Inserido numa tradição cinematográfica europeia que se dedica a mergulhar fundo no íntimo de seus personagens, semelhante a obras como "Manchester à Beira-Mar" e "Amor", de Michael Haneke, esse drama dirigido com muita sensibilidade por Theu Boermans se destaca por sua abordagem mais poética e introspectiva, e pela precisão cirúrgica com que investiga os limites do amor diante de uma tragédia familiar.

A trama, basicamente, gira em torno do jovem casal Lucas (Reinout Scholten van Aschat) e Johanna (Sallie Harmsen), que embarcam em uma viagem marítima com seu filho pequeno, Kai (River Oosterink). O que deveria ser um momento idílico de conexão familiar se transforma em um pesadelo quando, no meio ao Atlântico, a criança misteriosamente some. Esse evento devastador não só quebra a estrutura familiar, como molda e redefine completamente suas vidas pelos próximos 30 e poucos anos. Confira o trailer:

Baseado em uma história real, o roteiro, escrito por Marieke van der Pol, opta por uma narrativa que intercala diferentes linhas do tempo da vida do casal, apresentando não apenas os acontecimentos imediatos após a tragédia, mas também como as consequências ecoam décadas depois, trazendo temas sensíveis para a discussão como as dores inerentes da memória e da culpa, além dos diferentes caminhos de superação que cada um escolhe trilhar após uma situação limite. A direção de Boermans, vale dizer, é particularmente impressionante - a forma como ele lida com a cronologia não linear da história é primorosa. Boermans conduz o filme como um quebra-cabeças emocional, montando com cuidado as peças do passado e presente de maneira fluída e natural, permitindo que a audiência acompanhe o desenvolvimento dos personagens de forma gradual, envolvente e visceral. Boermans usa de uma montagem excelente de Herman P. Koerts e Job ter Burg para criar transições que enfatizam o impacto emocional das lembranças e o peso das decisões tomadas pelos protagonistas, evitando assim que a narrativa caia em um melodrama fácil. Veja, aqui tudo é retratado com muita (mas, muita) sensibilidade.

Tecnicamente, "Além do Tempo" é primoroso. A fotografia do Myrthe Mosterman merece destaque especial pela forma como capta as nuances emocionais da história, variando entre a claridade vibrante das cenas iniciais, representando a plenitude, e os tons mais sóbrios e cinzentos que predominam nos períodos posteriores, refletindo o estado emocional dos personagens. Veja, a escolha visual de retratar o mar tanto como símbolo de liberdade quanto de dor insuperável é especialmente poderosa, ao ponto de transformar o oceano em um personagem próprio dentro da narrativa. Como todo filme de relação, impossível não citar as atuações extraordinárias do elenco. Reinout Scholten van Aschat e Sallie Harmsen entregam performances extremamente convincentes e emocionantes, construindo personagens cheio de camadas e realmente humanos. Aschat consegue, com poucos gestos e olhares, transmitir a profunda angústia e o isolamento emocional de Lucas, enquanto Harmsen impressiona pela forma como Johanna internaliza sua dor, exibindo uma marca silenciosa que se manifesta em pequenas nuances. Já Gijs Scholten van Aschat e Elsie de Brauw, que interpretam o casal 30 anos depois, adicionam elementos de complexidade ao filme, refletindo o desgaste e a resiliência acumulados ao longo dos anos, cada qual com seus fantasmas.

Se há algo que pode incomodar em "Além do Tempo" certamente é o seu ritmo. Até pela própria proposta do diretor, o filme exige uma dose significativa de paciência e entrega emocional, podendo soar contemplativo demais para alguns, mas é justamente esse ritmo mais lento que permite um mergulho mais profundo na psicologia dos personagens e na exploração detalhada das consequências da perda e, claro, do seu luto. Em última análise, "Além do Tempo" é uma experiência intensa, que usa uma linguagem artística sofisticada para investigar questões universais sobre o amor, e os caminhos de cura que o tempo pode ou não proporcionar. Com uma direção precisa, atuações de se aplaudir de pé e uma abordagem visual de estremo bom gosto, Theu Boermans entrega um filme emocionalmente maduro e reflexivo, que certamente irá permanecer na sua mente muito depois que os créditos finais rolarem na tela.

Olha, um filme indispensável para quem aprecia o cinema de qualidade e saber tocar profundamente na alma humana. Vale demais!

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Alias Grace

"Alias Grace" é uma minissérie do Netflix que conta a história de uma empregada doméstica (Sarah Gadon), imigrante da Irland, ,que foi condenada à prisão perpétua após ser acusada de ter planejado a morte de seu patrão Thomas Kinnear (Paul Gross) e de sua superior na casa em que trabalhava. Grace afirma não ter lembrança do assassinato, mas os fatos são irrefutáveis. Uma década depois, o Dr. Simon Jordan (Edward Holcroft) tenta ajudar Grace a recordar seu passado e finalmente esclarecer o crime. O bacana (e surpreendente) é que a história foi inspirada em um caso real que aconteceu no século XIX. Confira o trailer:

Tecnicamente a série é impecável. A direção de Arte é muito detalhista e junto com uma Fotografia precisa (principalmente nos movimentos de câmera em primeira pessoa) dita um tom muito interessante para série e sem ser piegas.

Já aviso: não é uma série fácil. Ela parece lenta, um pouco arrastada com tantas narrações em Off, mas o roteiro é cheio de detalhes e muito (mas muito) bem construído. São seis episódios de uma história sem muitas reviravoltas, mas que surpreende pela coerência dos fatos sem a pretenção de esconder seu arco principal - que instiga pelas inúmeras possibilidades (ou razões) conforme vai se aproximando do final. Vale muito a pena pela produção, pela atuação da Sarah Gadon (olho nela) e pelo roteiro excelente!!!

Vale muito a pena!

PS: A história é baseada no romance da Margaret Atwood, a mesma da premiada "The Handmaid’s Tale

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"Alias Grace" é uma minissérie do Netflix que conta a história de uma empregada doméstica (Sarah Gadon), imigrante da Irland, ,que foi condenada à prisão perpétua após ser acusada de ter planejado a morte de seu patrão Thomas Kinnear (Paul Gross) e de sua superior na casa em que trabalhava. Grace afirma não ter lembrança do assassinato, mas os fatos são irrefutáveis. Uma década depois, o Dr. Simon Jordan (Edward Holcroft) tenta ajudar Grace a recordar seu passado e finalmente esclarecer o crime. O bacana (e surpreendente) é que a história foi inspirada em um caso real que aconteceu no século XIX. Confira o trailer:

Tecnicamente a série é impecável. A direção de Arte é muito detalhista e junto com uma Fotografia precisa (principalmente nos movimentos de câmera em primeira pessoa) dita um tom muito interessante para série e sem ser piegas.

Já aviso: não é uma série fácil. Ela parece lenta, um pouco arrastada com tantas narrações em Off, mas o roteiro é cheio de detalhes e muito (mas muito) bem construído. São seis episódios de uma história sem muitas reviravoltas, mas que surpreende pela coerência dos fatos sem a pretenção de esconder seu arco principal - que instiga pelas inúmeras possibilidades (ou razões) conforme vai se aproximando do final. Vale muito a pena pela produção, pela atuação da Sarah Gadon (olho nela) e pelo roteiro excelente!!!

Vale muito a pena!

PS: A história é baseada no romance da Margaret Atwood, a mesma da premiada "The Handmaid’s Tale

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