Uma pancada! "Está tudo certo", filme alemão distribuído pela Netflix, merece sua atenção por tratar de um assunto extremamente delicado sem fazer qualquer pré-julgamento, deixando para quem assiste a total liberdade para refletir e interpretar cada uma das atitudes dos personagens (muito bem construídos, por sinal) em várias situações que nos tiram a direção. "Está tudo certo" fala sobre estupro e suas consequências!
"Alles Ist Gut", título original, conta a história de Janne, uma editora de livros que vive uma conturbada relação com o explosivo Piet. Ao ir a uma festa sem a companhia do namorado, Janne acaba aproveitando para se divertir e beber até altas horas com Martin, cunhado do seu chefe. Ao convidá-lo para dormir em sua casa, Martin acaba fazendo uma interpretação errada das intenções de Janne. Ele continua fazendo suas investidas mesmo com as constantes negativas de Janne, até que acaba forçando uma relação sexual. A partir daí, o que vemos é uma mulher tentando entender o que aconteceu realmente e fazendo de tudo para superar aquele trauma sem grandes dramas (ou marcas). Confira o trailer (em alemão):
O trabalho da atriz que interpreta Janne é sensacional. Aenne Schwarz traz para a personagem uma neutralidade assustadora. A dubiedade perante o acontecido e sua percepção sobre suas relações ganham muita força a partir de seu silêncio, do sorriso forçado, da necessidade de parecer mais forte que sua vulnerabilidade física. A direção da estreante Eva Trobisch é muito provocativa nesse sentido, pois ela faz questão de não entregar o que a audiência gostaria de ver acontecer - ela não cai na tentação de julgar e de promover um confronto, muito pelo contrário, ela só vai nos colocando indagações em cima de indagações que chegam a incomodar pela discussão sobre a (i)moralidade. Com muitos planos fechados, temos a impressão de estar dentro da cabeça da protagonista em vários momentos e de carregar toda a sua dor e insegurança. A câmera solta, os cortes bruscos e o desenho de som muito bem alinhados com a montagem só ajudam a fortalecer essa sensação de descontinuidade e desconforto. É lindo de ver!
Mas é bom deixar bem claro: "Está tudo certo" é um filme autoral, lento e silencioso - é um filme realmente difícil! Não é para qualquer um e muito menos para se entreter numa sexta-feira à noite. "Está tudo certo" é um filme de reflexão e de discussão pós-créditos - difícil de digerir, mas essencial! Vale dizer que o filme foi indicado ao Leopardo de Ouro de Locarno em 2018, e Eva Trobisch ganhou como "O Melhor Primeiro Filme" no festival - um dos mais importantes e prestigiados do mundo.
Com todas essas ressalvas, tem a minha indicação!
Uma pancada! "Está tudo certo", filme alemão distribuído pela Netflix, merece sua atenção por tratar de um assunto extremamente delicado sem fazer qualquer pré-julgamento, deixando para quem assiste a total liberdade para refletir e interpretar cada uma das atitudes dos personagens (muito bem construídos, por sinal) em várias situações que nos tiram a direção. "Está tudo certo" fala sobre estupro e suas consequências!
"Alles Ist Gut", título original, conta a história de Janne, uma editora de livros que vive uma conturbada relação com o explosivo Piet. Ao ir a uma festa sem a companhia do namorado, Janne acaba aproveitando para se divertir e beber até altas horas com Martin, cunhado do seu chefe. Ao convidá-lo para dormir em sua casa, Martin acaba fazendo uma interpretação errada das intenções de Janne. Ele continua fazendo suas investidas mesmo com as constantes negativas de Janne, até que acaba forçando uma relação sexual. A partir daí, o que vemos é uma mulher tentando entender o que aconteceu realmente e fazendo de tudo para superar aquele trauma sem grandes dramas (ou marcas). Confira o trailer (em alemão):
O trabalho da atriz que interpreta Janne é sensacional. Aenne Schwarz traz para a personagem uma neutralidade assustadora. A dubiedade perante o acontecido e sua percepção sobre suas relações ganham muita força a partir de seu silêncio, do sorriso forçado, da necessidade de parecer mais forte que sua vulnerabilidade física. A direção da estreante Eva Trobisch é muito provocativa nesse sentido, pois ela faz questão de não entregar o que a audiência gostaria de ver acontecer - ela não cai na tentação de julgar e de promover um confronto, muito pelo contrário, ela só vai nos colocando indagações em cima de indagações que chegam a incomodar pela discussão sobre a (i)moralidade. Com muitos planos fechados, temos a impressão de estar dentro da cabeça da protagonista em vários momentos e de carregar toda a sua dor e insegurança. A câmera solta, os cortes bruscos e o desenho de som muito bem alinhados com a montagem só ajudam a fortalecer essa sensação de descontinuidade e desconforto. É lindo de ver!
Mas é bom deixar bem claro: "Está tudo certo" é um filme autoral, lento e silencioso - é um filme realmente difícil! Não é para qualquer um e muito menos para se entreter numa sexta-feira à noite. "Está tudo certo" é um filme de reflexão e de discussão pós-créditos - difícil de digerir, mas essencial! Vale dizer que o filme foi indicado ao Leopardo de Ouro de Locarno em 2018, e Eva Trobisch ganhou como "O Melhor Primeiro Filme" no festival - um dos mais importantes e prestigiados do mundo.
Com todas essas ressalvas, tem a minha indicação!
O mais incrível de "Estaremos Sempre Juntos" é que, mais uma vez, o diretor Guillaume Canet consegue capturar a essência do que representa uma longa amizade entre um grupo de pessoas tão diferentes entre si, mas que seguem conectadas pelo que existe de mais bacana nessa vida: o amor verdadeiro. Para quem não sabe, essa produção francesa é uma sequência do também excelente "Até a Eternidade" (Les Petits Mouchoirs" no original), de 2010, que acompanhava um grupo de amigos que se reuniu para um fim de semana na casa de praia de Max após um acidente grave de um deles - é nesse contexto de dor e expectativa que velhos ressentimentos e segredos há muito enterrados vêm à tona. Mas calma, é preciso assistir o primeiro filme? Não, Canet sabe muito bem pontuar as marcas de 9 atrás no seu novo roteiro, no entanto, também é preciso que se diga, a experiência de revisitar todos aqueles personagens tanto tempo depois é muito especial.
Aqui, preocupado com os rumos da vida, Max (François Cluzet) decide tirar um final de semana de folga em sua casa de praia. Mas seus planos são interrompidos com a chegada de Eric (Gilles Lellouche), Marie (Marion Cotillard), Vincent (Benoît Magimel), Isabelle (Pascale Arbillot) e Antoine (Laurent Lafitte), que planejavam uma festa de aniversário surpresa para ele. Depois de 9 anos afastados, será que a amizade entre eles continua a mesma? Confira o trailer:
"Estaremos Sempre Juntos" sabe, como ninguém, se apoiar na leveza quase irônica da famosa comédia do cinema independente francês. A base da narrativa, claro, continua sendo o drama mais íntimos de cada um dos personagens - mesmo que o tempo de tela quase sempre impeça seu diretor de desenvolver a quantidade de camadas que as performances dos atores tendem a pincelar. Ao explorar os altos e baixos da amizade, do amor e da vida adulta, pela perspectiva do individuo, o roteiro do Rodolphe Lauga ao lado do próprio Canet, ainda assim, é inteligente e perspicaz - ele captura como poucos a dinâmica complexa de um grupo de amigos que se conhece há décadas e trazem consigo as marcas dessa relação.
A direção de Canet é sensível e segura o bastante para transformar situações improváveis em algo emocionalmente marcante. Um bom exemplo disso é que você poderá se emocionar em cenas que nem de longe foram criadas para isso - no meu caso, um "simples" salto de paraquedas me tocou. Eu nunca saltei, mas aquilo que representou essa ação em seu subtexto, por algum motivo, se conectou comigo - e isso vai acontecer com você, se não nessa cena, certamente, em algum outra. Como gosto de pontuar: o roteiro de "Estaremos Sempre Juntos" tem suas falhas, não é tecnicamente perfeito, mas tem alma! Com uma fotografia linda (afinal estamos falando da costa francesa) e uma trilha sonora nostálgica, capaz de evocar a melancolia e a felicidade com muita competência, criando uma atmosfera emocional poderosa, eu diria que a performance do elenco é apenas a deliciosa cereja do bolo. Destaque para os impagáveis, François Cluzet, Marion Cotillard e Benoît Magimel.
Um filme com o toque francês, delicado o bastante para nos levar a questionar a natureza da amizade e do amor verdadeiro em pouco mais de 120 minutos. "Estaremos Sempre Juntos" provoca o questionamento como se realmente conhecêssemos as pessoas que amamos ou se é possível perdoar os erros do passado ou ainda se vale a pena deixar o passado para trás em troca de um presente mais confortável. O fato é que "Estaremos Sempre Juntos" não oferece respostas fáceis para essas perguntas, mas nos convida para uma reflexão profunda sobre as relações humanas com autenticidade e algum humor.
Se não genal, pode acreditar que temos aqui um filme tocante que vai valer muito o seu play!
O mais incrível de "Estaremos Sempre Juntos" é que, mais uma vez, o diretor Guillaume Canet consegue capturar a essência do que representa uma longa amizade entre um grupo de pessoas tão diferentes entre si, mas que seguem conectadas pelo que existe de mais bacana nessa vida: o amor verdadeiro. Para quem não sabe, essa produção francesa é uma sequência do também excelente "Até a Eternidade" (Les Petits Mouchoirs" no original), de 2010, que acompanhava um grupo de amigos que se reuniu para um fim de semana na casa de praia de Max após um acidente grave de um deles - é nesse contexto de dor e expectativa que velhos ressentimentos e segredos há muito enterrados vêm à tona. Mas calma, é preciso assistir o primeiro filme? Não, Canet sabe muito bem pontuar as marcas de 9 atrás no seu novo roteiro, no entanto, também é preciso que se diga, a experiência de revisitar todos aqueles personagens tanto tempo depois é muito especial.
Aqui, preocupado com os rumos da vida, Max (François Cluzet) decide tirar um final de semana de folga em sua casa de praia. Mas seus planos são interrompidos com a chegada de Eric (Gilles Lellouche), Marie (Marion Cotillard), Vincent (Benoît Magimel), Isabelle (Pascale Arbillot) e Antoine (Laurent Lafitte), que planejavam uma festa de aniversário surpresa para ele. Depois de 9 anos afastados, será que a amizade entre eles continua a mesma? Confira o trailer:
"Estaremos Sempre Juntos" sabe, como ninguém, se apoiar na leveza quase irônica da famosa comédia do cinema independente francês. A base da narrativa, claro, continua sendo o drama mais íntimos de cada um dos personagens - mesmo que o tempo de tela quase sempre impeça seu diretor de desenvolver a quantidade de camadas que as performances dos atores tendem a pincelar. Ao explorar os altos e baixos da amizade, do amor e da vida adulta, pela perspectiva do individuo, o roteiro do Rodolphe Lauga ao lado do próprio Canet, ainda assim, é inteligente e perspicaz - ele captura como poucos a dinâmica complexa de um grupo de amigos que se conhece há décadas e trazem consigo as marcas dessa relação.
A direção de Canet é sensível e segura o bastante para transformar situações improváveis em algo emocionalmente marcante. Um bom exemplo disso é que você poderá se emocionar em cenas que nem de longe foram criadas para isso - no meu caso, um "simples" salto de paraquedas me tocou. Eu nunca saltei, mas aquilo que representou essa ação em seu subtexto, por algum motivo, se conectou comigo - e isso vai acontecer com você, se não nessa cena, certamente, em algum outra. Como gosto de pontuar: o roteiro de "Estaremos Sempre Juntos" tem suas falhas, não é tecnicamente perfeito, mas tem alma! Com uma fotografia linda (afinal estamos falando da costa francesa) e uma trilha sonora nostálgica, capaz de evocar a melancolia e a felicidade com muita competência, criando uma atmosfera emocional poderosa, eu diria que a performance do elenco é apenas a deliciosa cereja do bolo. Destaque para os impagáveis, François Cluzet, Marion Cotillard e Benoît Magimel.
Um filme com o toque francês, delicado o bastante para nos levar a questionar a natureza da amizade e do amor verdadeiro em pouco mais de 120 minutos. "Estaremos Sempre Juntos" provoca o questionamento como se realmente conhecêssemos as pessoas que amamos ou se é possível perdoar os erros do passado ou ainda se vale a pena deixar o passado para trás em troca de um presente mais confortável. O fato é que "Estaremos Sempre Juntos" não oferece respostas fáceis para essas perguntas, mas nos convida para uma reflexão profunda sobre as relações humanas com autenticidade e algum humor.
Se não genal, pode acreditar que temos aqui um filme tocante que vai valer muito o seu play!
"Estou pensando em acabar com tudo" é um filmaço, daqueles que dão nó na nossa cabeça, com a mesma força que nos provocam a refletir em cada cena, em cada diálogo e, principalmente, em cada construção alegórica que nos faz viajar aos momentos mais íntimos que guardamos nos cantos mais profundos da nossa alma! Sim, pode parecer poético demais, mas, de fato, esse filme é semiótica pura - e aqui cabe uma observação: "Estou pensando em acabar com tudo" é o novo filme do Charlie Kaufman, o cara por trás de roteiros pouco convencionais como "Quero Ser John Malkovich" de 1999, "Adaptação" de 2002 e do inesquecível "Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças" de 2004, ou seja, se você não se apaixonou por nenhum deles, nem dê o play, pois certamente você vai querer me matar depois de duas horas de filme!
O filme adapta o romance de estreia do canadense Iain Reid, e conta a história de uma jovem (cujo personagem nem nome tem, ou melhor, cada hora a chamam por um nome, reparem; e é incrivelmente bem interpretado pela Jessie Buckley) que depois de seis ou sete semanas de relação com Jake (Jesse Plemons) já cogita seriamente terminar o namoro, mas ainda assim aceita viajar no meio de uma tempestade de neve para conhecer a fazenda dos sogros. O curioso é que a todo momento, a jovem frisa que precisa retornar no dia seguinte e isso diz muito sobre o filme como vamos explicar adiante, mas antes confira essa maravilha de trailer:
Já é possível imaginar que "Estou pensando em acabar com tudo" vai dividir opiniões, mais ou menos como aconteceu com "Mother!" do Aronofsky, e que se não for devidamente avisado, a reclamação sobre a perda de tempo será enorme; porém, o que posso adiantar, sem prejudicar a ótima experiência que é assistir o filme, é que essa não linearidade do tempo que vimos no trailer e como Lucy (vamos assumir esse nome para a protagonista) se comporta ao se sentir presa nele, vai ditar o entendimento de um complexo e cuidadoso roteiro! As idiossincrasias da personagem ao se relacionar com o tempo e como ela percebe sua passagem, com as decisões ruins que tomou ou com relacionamentos nocivos que teve na vida, são sensacionais! Olha, a partir do segundo ato, se você estiver imerso na história, tenho certeza que, muitas vezes, você vai se pegar pensando em algumas passagens marcantes da sua vida e se isso acontecer, o filme cumpriu o seu papel! Pode dar o "play" sem medo de errar!
O primeiro elemento que salta aos olhos de quem assiste "Estou pensando em acabar com tudo", sem dúvida, é a direção de arte (e já chega forte para lutar por uma indicação no Oscar 2021) - é um lindo trabalho, tanto da Molly Hughes (no desenho de produção) quando do Gonzalo Cordoba (na arte em si). O interessante, e aqui vale sua atenção, é como o cenário tem papel fundamental na construção do conceito visual imposto pelo Charlie Kaufman. Kaufman é um excelente roteirista, mas trás referências de outros diretores como Michel Gondry e Spike Jonze, para fortalecer sua identidade - os movimentos são, em grande parte, comedidos, tanto horizontalmente, quanto verticalmente, e isso impacta na fotografia do diretor Lukasz Zal (do lindo "Ida"), principalmente na escolha de trabalhar em 4:3 (aquele aspecto quadrado das TVs antigas) onde, mesmo com duas colunas laterais espremendo a cena, vemos muitos planos abertos, com grande angulares que transformam a sensação de vazio e trazem incômodo para o ambiente - nos detalhes da decoração às cores que compõem o cenário.
Quando temos um roteiro tão cheio de camadas, baseado em tantas alegorias, todos os detalhes das cenas ajudam a nos contar a história, então reparem no desenho de som e como os ruídos nos incomodam tanto, mesmo que inconscientemente: o som do limpador de parabrisa ou o cachorro que se balança como se estivesse eternamente molhado (o trailer já usa desse artificio), são bons exemplos. Como várias coisas estranhas acontecem a todo momento, o filme acaba brincando com nossa imaginação e criatividade, por isso vou citar algumas para que você preste mais atenção durante o filme e assim melhore sua percepção sobre o universo que Kaufman criou: quando Lucy e Jake decidem parar em uma sorveteria, ela conversa com uma "versão" mais nova de si mesma, mesmo sendo interpretada por outra atriz - essa ficha, quando cai, nos ajuda a entender muito do que já aconteceu e do que vai acontecer dali em diante. Outro detalhe: a foto e as pinturas que Lucy encontra na casa dos pais de Jake e a cena em que mostra, repetidas vezes, ela descendo a escada, são fundamentais para entendermos algumas teorias que criamos durante o filme! Fica a dica!
"Estou pensando em acabar com tudo" fala sobre o passado, o presente e o futuro, com detalhes muito preciosos. Como algumas decisões impactam na nossa vida e nos transformam em pessoas irreconhecíveis. Como algumas decisões (brilhantemente resumidas em um dos últimos pensamentos de Lucy e que se justificam na última cena, inclusive) funcionam como uma bola de neve, que vai nos cobrindo e nos sufocando e quando nos damos conta, pronto, a vida já passou! Lindo, poético, profundo e difícil, mas que merece ser assistido e interpretado com muita sensibilidade e paciência!
Vale muito o play!
"Estou pensando em acabar com tudo" é um filmaço, daqueles que dão nó na nossa cabeça, com a mesma força que nos provocam a refletir em cada cena, em cada diálogo e, principalmente, em cada construção alegórica que nos faz viajar aos momentos mais íntimos que guardamos nos cantos mais profundos da nossa alma! Sim, pode parecer poético demais, mas, de fato, esse filme é semiótica pura - e aqui cabe uma observação: "Estou pensando em acabar com tudo" é o novo filme do Charlie Kaufman, o cara por trás de roteiros pouco convencionais como "Quero Ser John Malkovich" de 1999, "Adaptação" de 2002 e do inesquecível "Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças" de 2004, ou seja, se você não se apaixonou por nenhum deles, nem dê o play, pois certamente você vai querer me matar depois de duas horas de filme!
O filme adapta o romance de estreia do canadense Iain Reid, e conta a história de uma jovem (cujo personagem nem nome tem, ou melhor, cada hora a chamam por um nome, reparem; e é incrivelmente bem interpretado pela Jessie Buckley) que depois de seis ou sete semanas de relação com Jake (Jesse Plemons) já cogita seriamente terminar o namoro, mas ainda assim aceita viajar no meio de uma tempestade de neve para conhecer a fazenda dos sogros. O curioso é que a todo momento, a jovem frisa que precisa retornar no dia seguinte e isso diz muito sobre o filme como vamos explicar adiante, mas antes confira essa maravilha de trailer:
Já é possível imaginar que "Estou pensando em acabar com tudo" vai dividir opiniões, mais ou menos como aconteceu com "Mother!" do Aronofsky, e que se não for devidamente avisado, a reclamação sobre a perda de tempo será enorme; porém, o que posso adiantar, sem prejudicar a ótima experiência que é assistir o filme, é que essa não linearidade do tempo que vimos no trailer e como Lucy (vamos assumir esse nome para a protagonista) se comporta ao se sentir presa nele, vai ditar o entendimento de um complexo e cuidadoso roteiro! As idiossincrasias da personagem ao se relacionar com o tempo e como ela percebe sua passagem, com as decisões ruins que tomou ou com relacionamentos nocivos que teve na vida, são sensacionais! Olha, a partir do segundo ato, se você estiver imerso na história, tenho certeza que, muitas vezes, você vai se pegar pensando em algumas passagens marcantes da sua vida e se isso acontecer, o filme cumpriu o seu papel! Pode dar o "play" sem medo de errar!
O primeiro elemento que salta aos olhos de quem assiste "Estou pensando em acabar com tudo", sem dúvida, é a direção de arte (e já chega forte para lutar por uma indicação no Oscar 2021) - é um lindo trabalho, tanto da Molly Hughes (no desenho de produção) quando do Gonzalo Cordoba (na arte em si). O interessante, e aqui vale sua atenção, é como o cenário tem papel fundamental na construção do conceito visual imposto pelo Charlie Kaufman. Kaufman é um excelente roteirista, mas trás referências de outros diretores como Michel Gondry e Spike Jonze, para fortalecer sua identidade - os movimentos são, em grande parte, comedidos, tanto horizontalmente, quanto verticalmente, e isso impacta na fotografia do diretor Lukasz Zal (do lindo "Ida"), principalmente na escolha de trabalhar em 4:3 (aquele aspecto quadrado das TVs antigas) onde, mesmo com duas colunas laterais espremendo a cena, vemos muitos planos abertos, com grande angulares que transformam a sensação de vazio e trazem incômodo para o ambiente - nos detalhes da decoração às cores que compõem o cenário.
Quando temos um roteiro tão cheio de camadas, baseado em tantas alegorias, todos os detalhes das cenas ajudam a nos contar a história, então reparem no desenho de som e como os ruídos nos incomodam tanto, mesmo que inconscientemente: o som do limpador de parabrisa ou o cachorro que se balança como se estivesse eternamente molhado (o trailer já usa desse artificio), são bons exemplos. Como várias coisas estranhas acontecem a todo momento, o filme acaba brincando com nossa imaginação e criatividade, por isso vou citar algumas para que você preste mais atenção durante o filme e assim melhore sua percepção sobre o universo que Kaufman criou: quando Lucy e Jake decidem parar em uma sorveteria, ela conversa com uma "versão" mais nova de si mesma, mesmo sendo interpretada por outra atriz - essa ficha, quando cai, nos ajuda a entender muito do que já aconteceu e do que vai acontecer dali em diante. Outro detalhe: a foto e as pinturas que Lucy encontra na casa dos pais de Jake e a cena em que mostra, repetidas vezes, ela descendo a escada, são fundamentais para entendermos algumas teorias que criamos durante o filme! Fica a dica!
"Estou pensando em acabar com tudo" fala sobre o passado, o presente e o futuro, com detalhes muito preciosos. Como algumas decisões impactam na nossa vida e nos transformam em pessoas irreconhecíveis. Como algumas decisões (brilhantemente resumidas em um dos últimos pensamentos de Lucy e que se justificam na última cena, inclusive) funcionam como uma bola de neve, que vai nos cobrindo e nos sufocando e quando nos damos conta, pronto, a vida já passou! Lindo, poético, profundo e difícil, mas que merece ser assistido e interpretado com muita sensibilidade e paciência!
Vale muito o play!
"Euphoria" faz qualquer outra série adolescente parecer um episódio da "Galinha Pintadinha"! Dito isso, sem nenhum exagero, toda aquela discussão que envolveu "13 Reasons Why"depois de seu lançamento pela Netflix, certamente, vai alcançar outro patamar porque essa série da HBO traz um realismo tão chocante que nos faz refletir sobre a própria criação que devemos (ou conseguimos) dar para os nossos filhos!
Depois de assistir alguns episódios da série, a sensação que tive (com um pouco mais de 40 anos) foi a mesma quando assisti "Eu, Christiane F." pela primeira vez, há pelo menos 30 anos atrás. Sem qualquer tipo de comparação entre as duas obras ou o que elas podem representar para uma geração, "Euphoria" tem "cenas que são explícitas, difíceis de assistir e que podem ser gatilhos" - como bem definiu Zendaya, protagonista da série. Zendaya, aliás, nada se faz lembrar dos seus tempos de Disney - ela está impecável no papel da drogada Rue Bennett. É preciso dizer também que em um único episódio você vai encontrar uma adolescente tendo overdose, um pai de família tendo relações sexuais com uma adolescente trans, sexo com estrangulamento, muito bullying e até o drama de ter imagens intimas compartilhadas por WhatsApp! Parece chocante e realmente é, por mais que o criador da série, Sam Levinson, diga que não, que é apenas um retrato do jovem americano dos dias de hoje! Ok, esse retrato é chocante, fica mais um aviso!
"Euphoria" tem uma qualidade técnica e artística muito acima da média. A direção de atores é excelente, mesmo se apoiando em alguns esteriótipos. A fotografia e os movimentos de câmera são bem inventivos, provocadores como o roteiro que mistura loucura com realidade em muitas passagens... o fato é que fica tudo muito alinhado, redondinho! A pegada documental também está presente, o que trás veracidade para aquela ficção - seja por uma camera mais solta, por vários planos mais fechados (intimistas até) e pelos offs da protagonista que servem para costurar toda a história. "13 Reasons Why" trouxe muito desse conceito, mas como comentei anteriormente: "Euphoria" elevou o nível também na sua realização!
É certo que ainda é muito cedo para dizer se "Euphoria" vai funcionar como série. Às vezes a realidade choca demais e o público, normalmente, usa seu momento de lazer para fugir dela, mas não dá para negar que a qualidade narrativa da série, sua produção nível HBO e os assuntos bastante espinhosos criam uma curiosidade que a série vai ter como bancar em todos os episódios até o final da temporada. Na hora de colocar na balança, se muito do que for mostrado tiver um propósito, sua chance de sucesso aumenta, se cair no erro de querer chocar mais do que entreter ou provocar uma discussão, assino o cancelamento já na primeira temporada - pessoalmente eu acho muito difícil que aconteça!
Vale o play? Com certeza, mas esteja preparado para, ao abrir essa janela, enxergar uma realidade nada confortável!
"Euphoria" faz qualquer outra série adolescente parecer um episódio da "Galinha Pintadinha"! Dito isso, sem nenhum exagero, toda aquela discussão que envolveu "13 Reasons Why"depois de seu lançamento pela Netflix, certamente, vai alcançar outro patamar porque essa série da HBO traz um realismo tão chocante que nos faz refletir sobre a própria criação que devemos (ou conseguimos) dar para os nossos filhos!
Depois de assistir alguns episódios da série, a sensação que tive (com um pouco mais de 40 anos) foi a mesma quando assisti "Eu, Christiane F." pela primeira vez, há pelo menos 30 anos atrás. Sem qualquer tipo de comparação entre as duas obras ou o que elas podem representar para uma geração, "Euphoria" tem "cenas que são explícitas, difíceis de assistir e que podem ser gatilhos" - como bem definiu Zendaya, protagonista da série. Zendaya, aliás, nada se faz lembrar dos seus tempos de Disney - ela está impecável no papel da drogada Rue Bennett. É preciso dizer também que em um único episódio você vai encontrar uma adolescente tendo overdose, um pai de família tendo relações sexuais com uma adolescente trans, sexo com estrangulamento, muito bullying e até o drama de ter imagens intimas compartilhadas por WhatsApp! Parece chocante e realmente é, por mais que o criador da série, Sam Levinson, diga que não, que é apenas um retrato do jovem americano dos dias de hoje! Ok, esse retrato é chocante, fica mais um aviso!
"Euphoria" tem uma qualidade técnica e artística muito acima da média. A direção de atores é excelente, mesmo se apoiando em alguns esteriótipos. A fotografia e os movimentos de câmera são bem inventivos, provocadores como o roteiro que mistura loucura com realidade em muitas passagens... o fato é que fica tudo muito alinhado, redondinho! A pegada documental também está presente, o que trás veracidade para aquela ficção - seja por uma camera mais solta, por vários planos mais fechados (intimistas até) e pelos offs da protagonista que servem para costurar toda a história. "13 Reasons Why" trouxe muito desse conceito, mas como comentei anteriormente: "Euphoria" elevou o nível também na sua realização!
É certo que ainda é muito cedo para dizer se "Euphoria" vai funcionar como série. Às vezes a realidade choca demais e o público, normalmente, usa seu momento de lazer para fugir dela, mas não dá para negar que a qualidade narrativa da série, sua produção nível HBO e os assuntos bastante espinhosos criam uma curiosidade que a série vai ter como bancar em todos os episódios até o final da temporada. Na hora de colocar na balança, se muito do que for mostrado tiver um propósito, sua chance de sucesso aumenta, se cair no erro de querer chocar mais do que entreter ou provocar uma discussão, assino o cancelamento já na primeira temporada - pessoalmente eu acho muito difícil que aconteça!
Vale o play? Com certeza, mas esteja preparado para, ao abrir essa janela, enxergar uma realidade nada confortável!
"Força Maior" é sobre um relacionamento que não existe mais e onde um evento marcante funciona apenas como gatilho para expor a fragilidade de uma relação desgastada e que mesmo apoiada em uma estrutura familiar aparentemente segura, já não faz mais nenhum sentido para o casal - por mais dolorido que possa ser assistir a história acontecendo, é o sentimento que o diretor Ruben Östlund (o mesmo de "The Square") consegue nos provocar através dos seus protagonistas que transforma o filme em algo quase insuportável emocionalmente de lidar.
Durante as férias em família em um luxuoso hotel nos Alpes Suíços, uma família é surpreendida por uma avalanche que se aproxima do restaurante onde estão almoçando. Cego pelo desespero, o pai, Tomás (Johannes Kuhnke), reage impulsivamente deixando sua mulher, Ebba (Lisa Loven Kongsli), e seus dois filhos pequenos para trás. Passado o susto, essa sua atitude se transforma em um grande problema para seu casamento e para o relacionamento com todos a sua volta. Confira o trailer:
"Força Maior" não é um filme fácil. Sua narrativa extremamente cadenciada deixa claro uma identidade bastante autoral de Östlund e que nem todos vão se identificar -principalmente com a quantidade de simbolismo que o roteiro vai propondo para sua audiência durante a história. Como em "The Square" (indicado ao Oscar de Melhor Filme Internacional em 2018), nada que assistimos em cena é por acaso e toda relação entre os personagens esconde, na verdade, uma série de camadas que vão se revelando com o passar do tempo - que, inclusive, aqui, é indicado por uma legenda no inicio de cada ato.
A sensação de vazio que o diretor constrói é de uma profundidade única - hora com planos abertos, uma câmera fixa, apenas como observador; hora com takes mais longos que o necessário, aproveitando ou o silêncio da situação ou o cenário gélido lindamente enquadrado pelo diretor de fotografia, o excelente Fredrik Wenzel, mesmo depois que a ação termina. Reparem como essa dinâmica nos causa um certo desconforto e como o silêncio (ensurdecedor) muitas vezes nos incomoda mais do que se os personagens estivessem gritando um com o outro em cena. As cenas onde Ebba expõe sua decepção com o marido em jantares com amigos (e são duas dessas) são um bom exemplo: elas representam um constrangimento quase que insuportável entre a fala dela e as reações dos personagens que escutam a história. Tanto Johannes Kuhnke quanto Lisa Loven Kongsli, aliás, são capazes de decodificar suas emoções de uma forma tão contida que é impossível não nos colocarmos no lugar deles nessas situações - é um aula de atuação e de direção de atores.
Vencedor do prêmio de melhor filme da mostra Un Certain Regard no Festival de Cannes de 2014 e vastamente premiado em festivais importantes ao redor do globo, "Força Maior" vai dialogar com aqueles que se conectaram com filmes ou séries como "História de um Casamento"ou "Cenas de um Casamento". Perceba como Östlund usa de uma certa tortura moral como uma espécie de crítica às relações de uma sociedade extremamente superficial, que muitas vezes vivem na ilusão de uma família perfeita onde a felicidade está ligada ao dinheiro e a adoração dos amigos, mas que esquecem do que realmente importa: o amor que um dia pode até ter existido, mas que o tempo não perdoou em destruir.
Vale muito o seu play e sua reflexão!
"Força Maior" é sobre um relacionamento que não existe mais e onde um evento marcante funciona apenas como gatilho para expor a fragilidade de uma relação desgastada e que mesmo apoiada em uma estrutura familiar aparentemente segura, já não faz mais nenhum sentido para o casal - por mais dolorido que possa ser assistir a história acontecendo, é o sentimento que o diretor Ruben Östlund (o mesmo de "The Square") consegue nos provocar através dos seus protagonistas que transforma o filme em algo quase insuportável emocionalmente de lidar.
Durante as férias em família em um luxuoso hotel nos Alpes Suíços, uma família é surpreendida por uma avalanche que se aproxima do restaurante onde estão almoçando. Cego pelo desespero, o pai, Tomás (Johannes Kuhnke), reage impulsivamente deixando sua mulher, Ebba (Lisa Loven Kongsli), e seus dois filhos pequenos para trás. Passado o susto, essa sua atitude se transforma em um grande problema para seu casamento e para o relacionamento com todos a sua volta. Confira o trailer:
"Força Maior" não é um filme fácil. Sua narrativa extremamente cadenciada deixa claro uma identidade bastante autoral de Östlund e que nem todos vão se identificar -principalmente com a quantidade de simbolismo que o roteiro vai propondo para sua audiência durante a história. Como em "The Square" (indicado ao Oscar de Melhor Filme Internacional em 2018), nada que assistimos em cena é por acaso e toda relação entre os personagens esconde, na verdade, uma série de camadas que vão se revelando com o passar do tempo - que, inclusive, aqui, é indicado por uma legenda no inicio de cada ato.
A sensação de vazio que o diretor constrói é de uma profundidade única - hora com planos abertos, uma câmera fixa, apenas como observador; hora com takes mais longos que o necessário, aproveitando ou o silêncio da situação ou o cenário gélido lindamente enquadrado pelo diretor de fotografia, o excelente Fredrik Wenzel, mesmo depois que a ação termina. Reparem como essa dinâmica nos causa um certo desconforto e como o silêncio (ensurdecedor) muitas vezes nos incomoda mais do que se os personagens estivessem gritando um com o outro em cena. As cenas onde Ebba expõe sua decepção com o marido em jantares com amigos (e são duas dessas) são um bom exemplo: elas representam um constrangimento quase que insuportável entre a fala dela e as reações dos personagens que escutam a história. Tanto Johannes Kuhnke quanto Lisa Loven Kongsli, aliás, são capazes de decodificar suas emoções de uma forma tão contida que é impossível não nos colocarmos no lugar deles nessas situações - é um aula de atuação e de direção de atores.
Vencedor do prêmio de melhor filme da mostra Un Certain Regard no Festival de Cannes de 2014 e vastamente premiado em festivais importantes ao redor do globo, "Força Maior" vai dialogar com aqueles que se conectaram com filmes ou séries como "História de um Casamento"ou "Cenas de um Casamento". Perceba como Östlund usa de uma certa tortura moral como uma espécie de crítica às relações de uma sociedade extremamente superficial, que muitas vezes vivem na ilusão de uma família perfeita onde a felicidade está ligada ao dinheiro e a adoração dos amigos, mas que esquecem do que realmente importa: o amor que um dia pode até ter existido, mas que o tempo não perdoou em destruir.
Vale muito o seu play e sua reflexão!
Essa história vai te surpreender - mas nem por isso será uma jornada das mais tranquilas! "George & Tammy", minissérie criada por Abe Sylvia, repete a fórmula do premiado "Os Olhos de Tammy Faye", ou seja, Sylvia oferece mais uma vez um olhar íntimo e profundo sobre o tumultuado relacionamento entre duas lendas, dessa vez da da música country americana, George Jones e Tammy Wynette. Estrelada por Michael Shannon e Jessica Chastain, a produção explora tanto o lado pessoal quanto o profissional do casal, que não apenas moldou o gênero country, mas também deixou uma marca indiscutível no cenário musical dos Estados Unidos. Com uma combinação pontente de drama e música, ao melhor estilo "Nasce uma Estrela", "George & Tammy" pode sim ser considerada uma imersão intensa na vida de dois ícones que ficaram marcados pelo amor, pelo talento e pela auto-destruição.
A trama basicamente se concentra na relação conflituosa entre Jones, um dos mais celebrados cantores de música country americana, e Wynette, conhecida por seu sucesso "Stand by Your Man". O relacionamento dos dois foi marcado por grande paixão, mas também por muitas turbulências. O abuso de substâncias, as lutas emocionais e as pressões envolvidas nas carreiras intensas das celebridades formam o pano de fundo para uma história que captura tanto os altos e baixos de sua vida pessoal quanto o impacto que eles tiveram na cena musical da época. Confira o trailer (em inglês):
Obviamente que essa uma história que se confunde com o contexto musical de um país e nesse caso, ainda é explorado sem a menor vergonha de assumir um certo "bairrismo". Baseado na obra de Georgette Jones, 'The Three of Us: Growing Up with Tammy and George', a minissérie mergulha não apenas no relacionamento tumultuado dos protagonistas, mas também no impacto que eles tiveram na música country, abordando a criação de suas canções e a influência que suas vidas pessoais tiveram em suas obras. A criação de Abe Sylvia é realmente notável nesse sentido, já que sua habilidade em equilibrar o drama com o contexto musical e cultural da época gera um recorte impactante. O diretor John Hillcoat, que fez carreira com video clipes, sabe o valor da trilha sonora como elemento narrativo/estratégico para esse tipo de projeto, com isso ele é capaz de adicionar uma camada autêntica à trama, permitindo que o público experimente de maneira mais íntima o talento musical que definiu o casal - mesmo que para alguns essas intervenções musicais soem um pouco maçante.
Outro destaque da minissérie são as atuações de seus protagonistas. Jessica Chastain entrega uma performance notável como Tammy Wynette, capturando com precisão a força e a vulnerabilidade da cantora. Ela traz profundidade emocional para o papel, equilibrando a imagem pública de Tammy como uma mulher forte com suas lutas internas, especialmente em seu relacionamento com George. Chastain transmite de forma tocante a pressão que Tammy sentiu tanto em sua vida pessoal quanto na carreira, oferecendo uma interpretação complexa de uma mulher que buscava equilíbrio entre o amor e sua própria identidade. Michael Shannon, como George Jones, também brilha, trazendo para a tela um retrato multifacetado do cantor. Shannon interpreta Jones como um homem talentoso, mas quebrado por seus próprios demônios, especialmente o alcoolismo. Ele consegue capturar tanto o carisma de Jones no palco quanto seus momentos mais sombrios fora dele - e aqui cabe um comentário: a química entre Shannon e Chastain é tão palpável que fundamenta a narrativa, dando peso emocional à montanha-russa que define esse relacionamento.
"George & Tammy" foi indicado em 4 categorias no Emmy de 2023, especialmente por capturar a atmosfera exata de uma época - seja com os dois protagonistas perfeitamente caracterizados, seja com a fotografia, seja com o desenho de produção e arte. Aliás, essa produção da Showtime, de fato, nos transporta para centro da música country dos anos 1960 e 1970, desde os estúdios de gravação até as turnês exaustivas que as celebridades faziam na época. A minissérie é eficaz em mostrar as pressões da fama como pano de fundo e como isso afeta o relacionamento de qualquer casal do showbiz - sua narrativa enfatiza o ciclo vicioso em que eles se encontravam, enquanto o amor alimentava suas carreiras musicais.
"George & Tammy" traz uma abordagem humana sobre duas figuras públicas que, à primeira vista, parecem intocáveis, mas que na verdade lida com os desafios comuns: no amor, no vício, no sucesso e no fracasso. Vale muito o seu play!
Essa história vai te surpreender - mas nem por isso será uma jornada das mais tranquilas! "George & Tammy", minissérie criada por Abe Sylvia, repete a fórmula do premiado "Os Olhos de Tammy Faye", ou seja, Sylvia oferece mais uma vez um olhar íntimo e profundo sobre o tumultuado relacionamento entre duas lendas, dessa vez da da música country americana, George Jones e Tammy Wynette. Estrelada por Michael Shannon e Jessica Chastain, a produção explora tanto o lado pessoal quanto o profissional do casal, que não apenas moldou o gênero country, mas também deixou uma marca indiscutível no cenário musical dos Estados Unidos. Com uma combinação pontente de drama e música, ao melhor estilo "Nasce uma Estrela", "George & Tammy" pode sim ser considerada uma imersão intensa na vida de dois ícones que ficaram marcados pelo amor, pelo talento e pela auto-destruição.
A trama basicamente se concentra na relação conflituosa entre Jones, um dos mais celebrados cantores de música country americana, e Wynette, conhecida por seu sucesso "Stand by Your Man". O relacionamento dos dois foi marcado por grande paixão, mas também por muitas turbulências. O abuso de substâncias, as lutas emocionais e as pressões envolvidas nas carreiras intensas das celebridades formam o pano de fundo para uma história que captura tanto os altos e baixos de sua vida pessoal quanto o impacto que eles tiveram na cena musical da época. Confira o trailer (em inglês):
Obviamente que essa uma história que se confunde com o contexto musical de um país e nesse caso, ainda é explorado sem a menor vergonha de assumir um certo "bairrismo". Baseado na obra de Georgette Jones, 'The Three of Us: Growing Up with Tammy and George', a minissérie mergulha não apenas no relacionamento tumultuado dos protagonistas, mas também no impacto que eles tiveram na música country, abordando a criação de suas canções e a influência que suas vidas pessoais tiveram em suas obras. A criação de Abe Sylvia é realmente notável nesse sentido, já que sua habilidade em equilibrar o drama com o contexto musical e cultural da época gera um recorte impactante. O diretor John Hillcoat, que fez carreira com video clipes, sabe o valor da trilha sonora como elemento narrativo/estratégico para esse tipo de projeto, com isso ele é capaz de adicionar uma camada autêntica à trama, permitindo que o público experimente de maneira mais íntima o talento musical que definiu o casal - mesmo que para alguns essas intervenções musicais soem um pouco maçante.
Outro destaque da minissérie são as atuações de seus protagonistas. Jessica Chastain entrega uma performance notável como Tammy Wynette, capturando com precisão a força e a vulnerabilidade da cantora. Ela traz profundidade emocional para o papel, equilibrando a imagem pública de Tammy como uma mulher forte com suas lutas internas, especialmente em seu relacionamento com George. Chastain transmite de forma tocante a pressão que Tammy sentiu tanto em sua vida pessoal quanto na carreira, oferecendo uma interpretação complexa de uma mulher que buscava equilíbrio entre o amor e sua própria identidade. Michael Shannon, como George Jones, também brilha, trazendo para a tela um retrato multifacetado do cantor. Shannon interpreta Jones como um homem talentoso, mas quebrado por seus próprios demônios, especialmente o alcoolismo. Ele consegue capturar tanto o carisma de Jones no palco quanto seus momentos mais sombrios fora dele - e aqui cabe um comentário: a química entre Shannon e Chastain é tão palpável que fundamenta a narrativa, dando peso emocional à montanha-russa que define esse relacionamento.
"George & Tammy" foi indicado em 4 categorias no Emmy de 2023, especialmente por capturar a atmosfera exata de uma época - seja com os dois protagonistas perfeitamente caracterizados, seja com a fotografia, seja com o desenho de produção e arte. Aliás, essa produção da Showtime, de fato, nos transporta para centro da música country dos anos 1960 e 1970, desde os estúdios de gravação até as turnês exaustivas que as celebridades faziam na época. A minissérie é eficaz em mostrar as pressões da fama como pano de fundo e como isso afeta o relacionamento de qualquer casal do showbiz - sua narrativa enfatiza o ciclo vicioso em que eles se encontravam, enquanto o amor alimentava suas carreiras musicais.
"George & Tammy" traz uma abordagem humana sobre duas figuras públicas que, à primeira vista, parecem intocáveis, mas que na verdade lida com os desafios comuns: no amor, no vício, no sucesso e no fracasso. Vale muito o seu play!
"Her" é um grande filme! O roteiro é tão bom, é tão bem filmado que você nem se dá conta que 90% do filme está apoiado em um ator falando sozinho!
Escrito e dirigido por Spike Jonze (de "Onde Vivem os Monstros"), "Her" se passa em um futuro próximo na cidade de Los Angeles e acompanha Theodore Twombly (Joaquin Phoenix), um homem complexo e emotivo que trabalha escrevendo cartas pessoais e tocantes para outras pessoas. Com o coração partido após o final de um relacionamento, ele começa a ficar intrigado com um novo e avançado sistema operacional que promete ser uma espécie de entidade intuitiva e única - é aí que ele conhece "Samantha", uma voz feminina sensível e surpreendentemente engraçada. A medida em que as necessidades dela aumentam junto com as dele, a amizade dos dois se aprofunda em um eventual amor de um pelo outro.
"Her" é uma história de amor extremamente original que explora a natureza evolutiva - e os riscos - da intimidade no mundo moderno. Spike Jonze, sempre um gênio, mereceu o Oscar de Roteiro Original (2014) por esse filme, mas merecia o de direção também - foi uma injustiça ele nem ter sido indicado. O filme, tecnicamente, beira a perfeição: cada movimento, cada corte, cada close... Jonze nos coloca dentro daquele universo de uma forma brutal, provocando aquela sensação de solidão do Twombly a todo momento - impressionante!
Não tem como não recomendar esse filme de olhos fechados! Spike Jonze é um mestre, tudo que ele faz é muito bom - se você ainda não conhece o trabalho dele, pode ir atrás que você não vai se arrepender! Olha, eu seria capaz de afirmar que "Her" é um dos melhores filmes que eu já assisti na vida! Se você, como eu, foi deixando essa maravilha de lado, corre porque é uma obra prima que merece muito o seu play!!!
PS: "Her" ganhou em apenas uma das quatro categorias na qual foi indicado para Oscar de 2014, inclusive de "Melhor Filme do Ano"!
"Her" é um grande filme! O roteiro é tão bom, é tão bem filmado que você nem se dá conta que 90% do filme está apoiado em um ator falando sozinho!
Escrito e dirigido por Spike Jonze (de "Onde Vivem os Monstros"), "Her" se passa em um futuro próximo na cidade de Los Angeles e acompanha Theodore Twombly (Joaquin Phoenix), um homem complexo e emotivo que trabalha escrevendo cartas pessoais e tocantes para outras pessoas. Com o coração partido após o final de um relacionamento, ele começa a ficar intrigado com um novo e avançado sistema operacional que promete ser uma espécie de entidade intuitiva e única - é aí que ele conhece "Samantha", uma voz feminina sensível e surpreendentemente engraçada. A medida em que as necessidades dela aumentam junto com as dele, a amizade dos dois se aprofunda em um eventual amor de um pelo outro.
"Her" é uma história de amor extremamente original que explora a natureza evolutiva - e os riscos - da intimidade no mundo moderno. Spike Jonze, sempre um gênio, mereceu o Oscar de Roteiro Original (2014) por esse filme, mas merecia o de direção também - foi uma injustiça ele nem ter sido indicado. O filme, tecnicamente, beira a perfeição: cada movimento, cada corte, cada close... Jonze nos coloca dentro daquele universo de uma forma brutal, provocando aquela sensação de solidão do Twombly a todo momento - impressionante!
Não tem como não recomendar esse filme de olhos fechados! Spike Jonze é um mestre, tudo que ele faz é muito bom - se você ainda não conhece o trabalho dele, pode ir atrás que você não vai se arrepender! Olha, eu seria capaz de afirmar que "Her" é um dos melhores filmes que eu já assisti na vida! Se você, como eu, foi deixando essa maravilha de lado, corre porque é uma obra prima que merece muito o seu play!!!
PS: "Her" ganhou em apenas uma das quatro categorias na qual foi indicado para Oscar de 2014, inclusive de "Melhor Filme do Ano"!
Costumo dizer que uma história tem sempre dois lados e por isso acredito que uma das maiores covardias sociais que pode existir é o julgamento ou pior, quando alguém próximo resolve tomar partido de um dos lados durante a separação ou no fim de um casamento, principalmente se o casal já tiver filhos! "História de um Casamento" é um soco no estômago por tudo isso e dependendo da sua história de vida, esse soco pode doer mais! O filme mostra o processo de separação de um Diretor de Teatro residente em NY e de uma atriz nascida em Los Angeles. Os dois foram muito felizes durante anos até que ela resolve se separar e voltar com o filho para sua cidade - o que acontece a partir daí é uma das mais doloridas jornadas de aceitação que um casal precisa passar durante a vida.
O interessante do filme é que o roteiro trás os dois lados da história desde o início (com uma prólogo sensacional que já dá o tom do que virá pela frente, apresentando os personagens e o momento que eles estão passando) e toda a transformação que eles se submetem graças a pressão social e, claro, ao ego ferido de cada um (inclusive dos advogados)! A crueldade do filme está em abordar com muita sensibilidade essa solidão muito particular que Charlie (Adam Driver) e Nicole (Scarlett Johansson) passam ao tentar esconder seus reais sentimentos para impedir que esse divórcio não acabe definitivamente com tudo que eles construíram juntos e com todos os sonhos que compartilharam durante anos - aliás, muito personificado na figura de um lindo garoto, filho do casal! Olha, se prepare para um grande filme, difícil, inteligente e muito visceral - mais um que deve brilhar nas premiações do próximo ano, pode apostar!
Poderia ser um filme dirigido pelo Wood Allen tranquilamente, mas a competência do Noah Baumbach (A Lula e a Baleia e The Meyerowitz Stories) nos proporciona a mesma qualidade na experiência de acompanhar a história dos dois protagonistas filmando em 35mm (e não em Digital) para aproveitar aquela magia do grão e o aspecto mais, digamos, antigo da imagem - propositalmente nostálgico. Noah, que também escreveu o roteiro, se inspirou no seu próprio processo de divórcio, deixando claro que o filme, na verdade, é mais uma provocação sobre o valor do verdadeiro amor, mesmo em um cenário tão conturbado como o divórcio. Pode parecer complexo, mas não é; "História de um Casamento" tem alma e uma direção focada nos detalhes - sem a necessidade de elevar o tom da interpretação, aproveitando o silêncio, os olhares, o sofrimento dos atores - puxa, e que atores!!!! Claro que os diálogos são excelentes, mas Scarlett Johansson e (principalmente) Adam Drive dão um show. Pode escrever: Adam Drive será indicado como melhor ator e não me surpreenderia se ganhasse, mesmo correndo por fora contra Adam Sandler e Joaquin Phoenix. Outra atriz que merece destaque e pode ganhar uma indicação de coadjuvante é Laura Dern (Big Little Lies) - ela está incrível como a advogada de Nicole.
"História de um Casamento" é o que é, um filme que mexe com a gente, que emociona pelo simples fato de nos colocarmos na pele de cada um dos personagens. É um filme de relação difícil, dolorido, injusto, mas muito (muito mesmo) sensível! Embora Noah Baumbach tenha colocado sua história em muitos detalhes dessa jornada, é notável sua capacidade de universalizar os assuntos discutidos no filme. O amor colocado em segundo plano por causa de convenções de uma mesma sociedade que cobra a cada instante e que se sente prazer ao julgar um casal quando não se assume alguma dificuldade ou até quando se toma alguma decisão diferente do óbvio pensando no bem do filho, por exemplo. Olha, "História de um Casamento" é sensacional; com um roteiro, direção e atuação extremamente alinhados. Impecável! O filme foi muito bem nos Festivais que participou até agora e, na minha opinião, vem muito forte para o Oscar de 2020 - dá para esperar umas 3 ou 4 indicações tranquilamente, entre elas, melhor filme (e não é exagero)! Não acredita? Dê o play e se prepare para duas horas com o coração apertado e muito tempo de reflexão quando o filme acabar - e por favor repare como a trilha sonora é a cereja desse bolo delicioso!!!
Up-date: "História de um Casamento" ganhou em uma categoria no Oscar 2020: Melhor Atriz Coadjuvante!
Costumo dizer que uma história tem sempre dois lados e por isso acredito que uma das maiores covardias sociais que pode existir é o julgamento ou pior, quando alguém próximo resolve tomar partido de um dos lados durante a separação ou no fim de um casamento, principalmente se o casal já tiver filhos! "História de um Casamento" é um soco no estômago por tudo isso e dependendo da sua história de vida, esse soco pode doer mais! O filme mostra o processo de separação de um Diretor de Teatro residente em NY e de uma atriz nascida em Los Angeles. Os dois foram muito felizes durante anos até que ela resolve se separar e voltar com o filho para sua cidade - o que acontece a partir daí é uma das mais doloridas jornadas de aceitação que um casal precisa passar durante a vida.
O interessante do filme é que o roteiro trás os dois lados da história desde o início (com uma prólogo sensacional que já dá o tom do que virá pela frente, apresentando os personagens e o momento que eles estão passando) e toda a transformação que eles se submetem graças a pressão social e, claro, ao ego ferido de cada um (inclusive dos advogados)! A crueldade do filme está em abordar com muita sensibilidade essa solidão muito particular que Charlie (Adam Driver) e Nicole (Scarlett Johansson) passam ao tentar esconder seus reais sentimentos para impedir que esse divórcio não acabe definitivamente com tudo que eles construíram juntos e com todos os sonhos que compartilharam durante anos - aliás, muito personificado na figura de um lindo garoto, filho do casal! Olha, se prepare para um grande filme, difícil, inteligente e muito visceral - mais um que deve brilhar nas premiações do próximo ano, pode apostar!
Poderia ser um filme dirigido pelo Wood Allen tranquilamente, mas a competência do Noah Baumbach (A Lula e a Baleia e The Meyerowitz Stories) nos proporciona a mesma qualidade na experiência de acompanhar a história dos dois protagonistas filmando em 35mm (e não em Digital) para aproveitar aquela magia do grão e o aspecto mais, digamos, antigo da imagem - propositalmente nostálgico. Noah, que também escreveu o roteiro, se inspirou no seu próprio processo de divórcio, deixando claro que o filme, na verdade, é mais uma provocação sobre o valor do verdadeiro amor, mesmo em um cenário tão conturbado como o divórcio. Pode parecer complexo, mas não é; "História de um Casamento" tem alma e uma direção focada nos detalhes - sem a necessidade de elevar o tom da interpretação, aproveitando o silêncio, os olhares, o sofrimento dos atores - puxa, e que atores!!!! Claro que os diálogos são excelentes, mas Scarlett Johansson e (principalmente) Adam Drive dão um show. Pode escrever: Adam Drive será indicado como melhor ator e não me surpreenderia se ganhasse, mesmo correndo por fora contra Adam Sandler e Joaquin Phoenix. Outra atriz que merece destaque e pode ganhar uma indicação de coadjuvante é Laura Dern (Big Little Lies) - ela está incrível como a advogada de Nicole.
"História de um Casamento" é o que é, um filme que mexe com a gente, que emociona pelo simples fato de nos colocarmos na pele de cada um dos personagens. É um filme de relação difícil, dolorido, injusto, mas muito (muito mesmo) sensível! Embora Noah Baumbach tenha colocado sua história em muitos detalhes dessa jornada, é notável sua capacidade de universalizar os assuntos discutidos no filme. O amor colocado em segundo plano por causa de convenções de uma mesma sociedade que cobra a cada instante e que se sente prazer ao julgar um casal quando não se assume alguma dificuldade ou até quando se toma alguma decisão diferente do óbvio pensando no bem do filho, por exemplo. Olha, "História de um Casamento" é sensacional; com um roteiro, direção e atuação extremamente alinhados. Impecável! O filme foi muito bem nos Festivais que participou até agora e, na minha opinião, vem muito forte para o Oscar de 2020 - dá para esperar umas 3 ou 4 indicações tranquilamente, entre elas, melhor filme (e não é exagero)! Não acredita? Dê o play e se prepare para duas horas com o coração apertado e muito tempo de reflexão quando o filme acabar - e por favor repare como a trilha sonora é a cereja desse bolo delicioso!!!
Up-date: "História de um Casamento" ganhou em uma categoria no Oscar 2020: Melhor Atriz Coadjuvante!
Desde que assistimos o primeiro episódio de "I Know this Much is True", ficou fácil perceber que se tratava de uma minissérie diferente! Pode até parecer repetitivo, mas encontrar na HBO um projeto comandado por Derek Cianfrance (de “Blue Valentine” e "A Luz entre Oceanos") já foi o suficiente para que embarcássemos nessa jornada sem o menor receio de errar - e olha, que jornada foi essa?! "I Know this Much is True" é um drama denso, profundo, incômodo; é um mergulho na intimidade mais obscura de um personagem tão complexo como Dominick Birdsey (Mark Ruffalo). São 6 episódios de 60 minutos que nos tiram completamente do equilíbrio emocional, que nos provocam ao julgamento, à empatia, compaixão e, principalmente, ao auto-conhecimento - isso mesmo, Cianfrance usa da mesma excelência ao discutir as relações de familiares, que usou para expôr a fragilidade da relação de um casal no ótimo "Blue Valentine").
"I Know this Much is True" não tem uma narrativa tão dinâmica, isso é um fato, mas a forma como o roteiro usa o relacionamento entre Dominick e seu irmão gêmeo para falar sobre a importância (e as influências) da ancestralidade, é genial! A minissérie é uma adaptação do livro de Wally Lamb e acompanha Dominick, um pintor divorciado que se sente responsável pelo irmão Thomas, que após um surto causado por sua esquizofrenia, corta a própria mão em uma biblioteca pública e é encaminhado para um hospital forense cheio de criminosos. Confira o belíssimo trailer e tente não se envolver com esse drama:
A partir das lembranças mais traumáticas do próprio Dominick, a minissérie vai pontuando como as experiências do passado refletem ativamente na sua relação com o irmão e nas atitudes de ambos no presente. Das agressões que sofriam do padrasto, Ray (John Procaccino), em uma infância completamente desestruturada e abusiva, ao dolorido divórcio de Dessa (Kathryn Hahn), até a morte prematura da sua mãe, vamos entendendo (e sofrendo com) o protagonista e nos relacionando com sua dor como poucas vezes fizemos recentemente. "I Know this Much is True" é uma aula de direção, de roteiro e de interpretação; que machuca, mas que também nos faz pensar e acreditar que nada acontece por acaso e que cabe a nós mudar o rumo das histórias onde somos os personagens!
Embora "I Know this Much is True" tenha uma qualidade de produção incontestável, a soma (ou o encontro) de talentos individuais é o ponto forte da minissérie. De cara, o trabalho do Mark Ruffalo salta aos olhos - sua performance como Dominick e como o gêmeo, Thomas, é algo digno de todos os prêmios da próxima temporada e pode acreditar: talvez seja o nome mais forte para levar tudo que se tem direito! Outros três trabalhos merecem nossa atenção: Kathryn Hahn como a ex-mulher de Dominick, Dessa, vai te destruir emocionalmente - quando descobrimos a razão da separação do casal é como se estivessem esmagando nosso coração! John Procaccino como o padrasto abusivo, Ray - ele fica enrolando em 5 episódios, mas quando chega no último, ele dá um verdadeiro show! Rosie O'Donnell como Lisa Sheffer está sensacional - ela tem uma verdade na sua interpretação que é comovente! E para finalizar, Juliette Lewis - mesmo aparecendo com destaque apenas no primeiro episódio, sua Nedra Frank, uma descontrolada acadêmica contratada por Dominick para traduzir a história de seu avô italiano, está simplesmente impagável!
Além do show do elenco, não podemos deixar de citar o trabalho técnico e artístico de Derek Cianfrance. Ele cria uma atmosfera tão particular e, nesse caso, tão depressiva, que praticamente nos obriga a pausar a minissérie algumas vezes para nos recompor, tamanho é o desconforto que sua narrativa nos causa. A direção está muito alinhada ao tipo de história que Wally Lamb quis contar e com isso fica fácil perceber a importância de um grande diretor para equilibrar o enquadramento mais adequado para aquele tipo de texto (invariavelmente com planos mais fechados) com uma ótima direção de atores, sem perder o realismo. Em "I Know this Much is True" as pausas dramáticas fazem tanto sentido que o silêncio é quase ensurdecedor - reparem! A fotografia do Jody Lee Lipes (de "Girls") é linda e a composição emocional que ela faz com a trilha sonora define muito bem a sensação de "vazio" dos personagens em vários momentos da minissérie!
Sinceramente, é a esperança por um final feliz que nos move até o sexto episódio, mas é a reflexão sobre cada uma das situações que acompanhamos que nos dá a força para continuar ao lado de Dominick. "I Know this Much is True" está longe de ser um entretenimento tranquilo, na verdade é uma minissérie cansativa psicologicamente, para assistir aos poucos, mas que vale pela experiência profunda, quase sensorial, de um trabalho único, de uma equipe talentosa e de um texto extremamente profundo!
Desde que assistimos o primeiro episódio de "I Know this Much is True", ficou fácil perceber que se tratava de uma minissérie diferente! Pode até parecer repetitivo, mas encontrar na HBO um projeto comandado por Derek Cianfrance (de “Blue Valentine” e "A Luz entre Oceanos") já foi o suficiente para que embarcássemos nessa jornada sem o menor receio de errar - e olha, que jornada foi essa?! "I Know this Much is True" é um drama denso, profundo, incômodo; é um mergulho na intimidade mais obscura de um personagem tão complexo como Dominick Birdsey (Mark Ruffalo). São 6 episódios de 60 minutos que nos tiram completamente do equilíbrio emocional, que nos provocam ao julgamento, à empatia, compaixão e, principalmente, ao auto-conhecimento - isso mesmo, Cianfrance usa da mesma excelência ao discutir as relações de familiares, que usou para expôr a fragilidade da relação de um casal no ótimo "Blue Valentine").
"I Know this Much is True" não tem uma narrativa tão dinâmica, isso é um fato, mas a forma como o roteiro usa o relacionamento entre Dominick e seu irmão gêmeo para falar sobre a importância (e as influências) da ancestralidade, é genial! A minissérie é uma adaptação do livro de Wally Lamb e acompanha Dominick, um pintor divorciado que se sente responsável pelo irmão Thomas, que após um surto causado por sua esquizofrenia, corta a própria mão em uma biblioteca pública e é encaminhado para um hospital forense cheio de criminosos. Confira o belíssimo trailer e tente não se envolver com esse drama:
A partir das lembranças mais traumáticas do próprio Dominick, a minissérie vai pontuando como as experiências do passado refletem ativamente na sua relação com o irmão e nas atitudes de ambos no presente. Das agressões que sofriam do padrasto, Ray (John Procaccino), em uma infância completamente desestruturada e abusiva, ao dolorido divórcio de Dessa (Kathryn Hahn), até a morte prematura da sua mãe, vamos entendendo (e sofrendo com) o protagonista e nos relacionando com sua dor como poucas vezes fizemos recentemente. "I Know this Much is True" é uma aula de direção, de roteiro e de interpretação; que machuca, mas que também nos faz pensar e acreditar que nada acontece por acaso e que cabe a nós mudar o rumo das histórias onde somos os personagens!
Embora "I Know this Much is True" tenha uma qualidade de produção incontestável, a soma (ou o encontro) de talentos individuais é o ponto forte da minissérie. De cara, o trabalho do Mark Ruffalo salta aos olhos - sua performance como Dominick e como o gêmeo, Thomas, é algo digno de todos os prêmios da próxima temporada e pode acreditar: talvez seja o nome mais forte para levar tudo que se tem direito! Outros três trabalhos merecem nossa atenção: Kathryn Hahn como a ex-mulher de Dominick, Dessa, vai te destruir emocionalmente - quando descobrimos a razão da separação do casal é como se estivessem esmagando nosso coração! John Procaccino como o padrasto abusivo, Ray - ele fica enrolando em 5 episódios, mas quando chega no último, ele dá um verdadeiro show! Rosie O'Donnell como Lisa Sheffer está sensacional - ela tem uma verdade na sua interpretação que é comovente! E para finalizar, Juliette Lewis - mesmo aparecendo com destaque apenas no primeiro episódio, sua Nedra Frank, uma descontrolada acadêmica contratada por Dominick para traduzir a história de seu avô italiano, está simplesmente impagável!
Além do show do elenco, não podemos deixar de citar o trabalho técnico e artístico de Derek Cianfrance. Ele cria uma atmosfera tão particular e, nesse caso, tão depressiva, que praticamente nos obriga a pausar a minissérie algumas vezes para nos recompor, tamanho é o desconforto que sua narrativa nos causa. A direção está muito alinhada ao tipo de história que Wally Lamb quis contar e com isso fica fácil perceber a importância de um grande diretor para equilibrar o enquadramento mais adequado para aquele tipo de texto (invariavelmente com planos mais fechados) com uma ótima direção de atores, sem perder o realismo. Em "I Know this Much is True" as pausas dramáticas fazem tanto sentido que o silêncio é quase ensurdecedor - reparem! A fotografia do Jody Lee Lipes (de "Girls") é linda e a composição emocional que ela faz com a trilha sonora define muito bem a sensação de "vazio" dos personagens em vários momentos da minissérie!
Sinceramente, é a esperança por um final feliz que nos move até o sexto episódio, mas é a reflexão sobre cada uma das situações que acompanhamos que nos dá a força para continuar ao lado de Dominick. "I Know this Much is True" está longe de ser um entretenimento tranquilo, na verdade é uma minissérie cansativa psicologicamente, para assistir aos poucos, mas que vale pela experiência profunda, quase sensorial, de um trabalho único, de uma equipe talentosa e de um texto extremamente profundo!
"I May Destroy You" é aquele típico fenômeno que não conseguimos explicar a razão pela qual ainda não está sendo aplaudida de pé por todo mundo, como rapidamente aconteceu com Chernobyl, por exemplo. A série é desconfortante, pesada, profunda e muito provocadora; mas em nenhum momento precisa agredir para alcançar o seu objetivo - ou melhor, talvez uma ou outra cena, para uma audiência mais conservadora, possa chocar pela naturalidade, mas nunca pela falta de propósito ao trazer inúmeros assuntos tão delicados (e importantes)!
Arabella Essiedu (Michaela Coel) é uma jovem escritora que foi descoberta no Twitter e que acaba de ser contratada por uma editora de vanguarda para escrever seu livro. Após passar uma breve temporada na Itália trabalhando na obra, Anabella retorna para Londres e acaba sofrendo um bloqueio criativo. Pressionada por um cronograma super apertado, ela decide sair para relaxar com os amigos e, uma hora depois, voltar para frente do seu laptop e finalizar o trabalho. Acontece que essa noite marca a vida de Anabella para sempre, já que ela acorda em sua casa e não se lembra exatamente o que aconteceu, apenas alguns flashes deixam a entender que ela foi drogada e abusada sexualmente! Confira o trailer:
De fato, você não vai encontrar uma série leve, mas pode ter a mais absoluta certeza que ela não vai te poupar de várias reflexões e, da maneira mais inteligente que um roteiro pode entregar, te colocar em uma posição de vulnerabilidade intelectual ao expôr o que o ser humano tem de bom e de ruim, sem ao menos ser capaz de definir a linha tênue que justifique essa diferença. A série fala sobre consentimento sexual e racismo, claro, mas ela vai muito além e graças a uma construção de personagem impecável é possível entender que nem tudo é tão racional ou fácil de se explicar. Posso dizer que através das inúmeras camadas que vamos conhecendo, tanto de Anabella quanto dos seus dois melhores amigos, Terry (Weruche Opia) e Kwame (Paapa Essiedu), é possível perceber que antes de tudo somos imperfeitos, mas que nem por isso seremos absolvidos de algumas atitudes ou posturas perante o outro! Olha, vale muito seu play, now!
"I may destroy you" é uma co-produção entre BBC e da HBO criada pela própria Michaela Coel. Coel é uma atriz versátil que fez muito sucesso como comediante, mas que também foi capaz de entregar personagens dramáticos com a mesma competência. Na série, ela traz para discussão várias releituras auto-biográficas o que, naturalmente, causam um incômodo ainda maior. Os episódios de 30 minutos são cirurgicamente precisos, embora a narrativa gire entorno do que realmente aconteceu na noite em que Anabella saiu com os amigos e que, possivelmente, foi abusada, outros elementos ajudam a construir uma história de personagens. Não por acaso existem quebras na linha do tempo, mas todas elas servem para encaixar uma ou outra peça desse enorme quebra-cabeça que forma a personalidade da protagonista. Ao discutir amizade, influência nas redes sociais, relacionamentos, masculinidade, machismo, feminismo, raça, gênero, carreira, arte e muito mais, usando sempre um tom bastante existencialista, "I may destroy you" se coloca em um patamar que poucas vezes encontramos em uma série - talvez seja uma espécie de amadurecimento (se é que é possível) de "Euphoria", também da HBO.
Muito bem dirigida por Sam Miller (Luther), mas com a própria Michaela Coel como co-diretora (em 9 dos 12 episódios da temporada), fica fácil perceber como o conceito visual é de uma elegância estética impressionante, mas que nunca alivia no conteúdo. Eu te convido a reparar no 9º episódio quando a psicóloga de Anabella desenha em um simples pedaço de papel, uma explicação extremamente profunda de como, nos dias de hoje, é difícil abraçar a nossa essência em relação a performance que somos obrigados a ter em um mundo de espetáculos como nas redes sociais. É incrível a delicadeza como essa cena foi dirigida e o impacto que ela nos causa - um excelente exemplo de como direção e roteiro estão 100% alinhados!
Embora a série tenha uma conclusão bastante satisfatória, fica claro que existe assunto para uma segunda temporada, porém nenhuma posição, tanto da HBO quanto da BBC, foi confirmada. Portanto, eu sugiro que você aproveite muito, cada um dos episódios de "I may destroy you", pois a série é de fato imperdível - com uma trilha sonora sensacional e performances incríveis de todo elenco. Eu sou capaz de apostar que ela vem muito forte na temporada de premiações de 2021.
Tudo é bom, mas nada do que vemos ali é fácil! Vale muito a pena! Mesmo!
"I May Destroy You" é aquele típico fenômeno que não conseguimos explicar a razão pela qual ainda não está sendo aplaudida de pé por todo mundo, como rapidamente aconteceu com Chernobyl, por exemplo. A série é desconfortante, pesada, profunda e muito provocadora; mas em nenhum momento precisa agredir para alcançar o seu objetivo - ou melhor, talvez uma ou outra cena, para uma audiência mais conservadora, possa chocar pela naturalidade, mas nunca pela falta de propósito ao trazer inúmeros assuntos tão delicados (e importantes)!
Arabella Essiedu (Michaela Coel) é uma jovem escritora que foi descoberta no Twitter e que acaba de ser contratada por uma editora de vanguarda para escrever seu livro. Após passar uma breve temporada na Itália trabalhando na obra, Anabella retorna para Londres e acaba sofrendo um bloqueio criativo. Pressionada por um cronograma super apertado, ela decide sair para relaxar com os amigos e, uma hora depois, voltar para frente do seu laptop e finalizar o trabalho. Acontece que essa noite marca a vida de Anabella para sempre, já que ela acorda em sua casa e não se lembra exatamente o que aconteceu, apenas alguns flashes deixam a entender que ela foi drogada e abusada sexualmente! Confira o trailer:
De fato, você não vai encontrar uma série leve, mas pode ter a mais absoluta certeza que ela não vai te poupar de várias reflexões e, da maneira mais inteligente que um roteiro pode entregar, te colocar em uma posição de vulnerabilidade intelectual ao expôr o que o ser humano tem de bom e de ruim, sem ao menos ser capaz de definir a linha tênue que justifique essa diferença. A série fala sobre consentimento sexual e racismo, claro, mas ela vai muito além e graças a uma construção de personagem impecável é possível entender que nem tudo é tão racional ou fácil de se explicar. Posso dizer que através das inúmeras camadas que vamos conhecendo, tanto de Anabella quanto dos seus dois melhores amigos, Terry (Weruche Opia) e Kwame (Paapa Essiedu), é possível perceber que antes de tudo somos imperfeitos, mas que nem por isso seremos absolvidos de algumas atitudes ou posturas perante o outro! Olha, vale muito seu play, now!
"I may destroy you" é uma co-produção entre BBC e da HBO criada pela própria Michaela Coel. Coel é uma atriz versátil que fez muito sucesso como comediante, mas que também foi capaz de entregar personagens dramáticos com a mesma competência. Na série, ela traz para discussão várias releituras auto-biográficas o que, naturalmente, causam um incômodo ainda maior. Os episódios de 30 minutos são cirurgicamente precisos, embora a narrativa gire entorno do que realmente aconteceu na noite em que Anabella saiu com os amigos e que, possivelmente, foi abusada, outros elementos ajudam a construir uma história de personagens. Não por acaso existem quebras na linha do tempo, mas todas elas servem para encaixar uma ou outra peça desse enorme quebra-cabeça que forma a personalidade da protagonista. Ao discutir amizade, influência nas redes sociais, relacionamentos, masculinidade, machismo, feminismo, raça, gênero, carreira, arte e muito mais, usando sempre um tom bastante existencialista, "I may destroy you" se coloca em um patamar que poucas vezes encontramos em uma série - talvez seja uma espécie de amadurecimento (se é que é possível) de "Euphoria", também da HBO.
Muito bem dirigida por Sam Miller (Luther), mas com a própria Michaela Coel como co-diretora (em 9 dos 12 episódios da temporada), fica fácil perceber como o conceito visual é de uma elegância estética impressionante, mas que nunca alivia no conteúdo. Eu te convido a reparar no 9º episódio quando a psicóloga de Anabella desenha em um simples pedaço de papel, uma explicação extremamente profunda de como, nos dias de hoje, é difícil abraçar a nossa essência em relação a performance que somos obrigados a ter em um mundo de espetáculos como nas redes sociais. É incrível a delicadeza como essa cena foi dirigida e o impacto que ela nos causa - um excelente exemplo de como direção e roteiro estão 100% alinhados!
Embora a série tenha uma conclusão bastante satisfatória, fica claro que existe assunto para uma segunda temporada, porém nenhuma posição, tanto da HBO quanto da BBC, foi confirmada. Portanto, eu sugiro que você aproveite muito, cada um dos episódios de "I may destroy you", pois a série é de fato imperdível - com uma trilha sonora sensacional e performances incríveis de todo elenco. Eu sou capaz de apostar que ela vem muito forte na temporada de premiações de 2021.
Tudo é bom, mas nada do que vemos ali é fácil! Vale muito a pena! Mesmo!
"Imperdoável" vem dividindo opniões, mas eu posso te adiantar: o filme é realmente bom e vale o seu play! Agora, não é nenhuma surpresa também que essa produção da Netflix seja baseada em uma minissérie de três episódios - no caso a britânica "Unforgiven" (no original), lançada em janeiro de 2009 e que foi muito bem de audiência e de crítica. Digo isso, pois algumas relações entre personagens que estão no filme mereciam um pouco mais de tempo de tela e certos assuntos justificariam mais aprofundamento. Isso prejudica a experiência? Não, mas fica aquele gostinho de "quero mais" (que para alguns vem sendo interpretado como um filme de resoluções atropeladas").
Na história, conhecemos a protagonista Ruth Slater (Sandra Bullock) que passa 20 anos na prisão após ter sido acusada do assassinato de um policial que estava em serviço no dia em que seria despejada de sua casa. Depois de cumprir a longa pena, Slater tenta retomar a vida em sociedade, enquanto busca de todas as formas reencontrar a irmã caçula, com quem perdeu contato após a sua prisão e que foi adotada por uma outra família na época. Confira o trailer:
Alguns pontos chamam muito nossa atenção. Sandra Bullock está sensacional e não fosse um certo preconceito com a atriz (mesmo depois do seu Oscar com "The Blind Side"), eu apostaria, no mínimo, em uma indicação na premiação de 2022 - sua performance é contida, pontuada, minimalista e sempre no tom correto para os diferentes tipos de cenas que ela precisa estar. Uma delas, inclusive, talvez seja o grande ponto alto do filme, quando "Ruth" de Bullock encontra com "Liz" de Viola Davis - além de uma cena muito bem construída para nos surpreender e de um talentoso embate entre duas excelentes atrizes, outro ponto que merece destaque é a montagem. Desde o inicio do filme, a montagem cria um ritmo sensacional para "Imperdoável" - mérito de Joe Walker (indicado ao Oscar por "A Chegada" e que usa do mesmo conceito técnico e narrativo para construir um mistério (e um suspense) em cima de um roteiro bem menos genial).
Dirigido pela ótima cineasta alemã Nora Fingscheidt, estreando em produções com um maior orçamento, o filme flerta com discussões bastante relevantes como o difícil processo de ressocialização de um ex-presidiário e como as vidas desses indivíduos são impactadas pelos crimes cometidos (especialmente contra policiais). O roteiro até pincela algumas críticas sobre os privilégios de ser uma mulher branca perante o preconceito sofrido pelos negros nas mesmas condições, mas não se tem tempo de ir além. A própria relação e as motivações dos irmãos Whelan ficam prejudicadas pela restrição de tempo.
O fato é que "Imperdoável" merece muito mais elogios do que críticas, além de ser um excelente entretenimento com um plot twist bem arquitetado, mesmo que com um final não tão corajoso. Existe um certo ar emotivo no desfecho da história, claro, mas talvez tenha faltado um pouco mais de impacto - algo que uma série da HBO entregaria sem receio, entende?
Se você gosta de um bom drama, pode ir tranquilo que vale a pena!
"Imperdoável" vem dividindo opniões, mas eu posso te adiantar: o filme é realmente bom e vale o seu play! Agora, não é nenhuma surpresa também que essa produção da Netflix seja baseada em uma minissérie de três episódios - no caso a britânica "Unforgiven" (no original), lançada em janeiro de 2009 e que foi muito bem de audiência e de crítica. Digo isso, pois algumas relações entre personagens que estão no filme mereciam um pouco mais de tempo de tela e certos assuntos justificariam mais aprofundamento. Isso prejudica a experiência? Não, mas fica aquele gostinho de "quero mais" (que para alguns vem sendo interpretado como um filme de resoluções atropeladas").
Na história, conhecemos a protagonista Ruth Slater (Sandra Bullock) que passa 20 anos na prisão após ter sido acusada do assassinato de um policial que estava em serviço no dia em que seria despejada de sua casa. Depois de cumprir a longa pena, Slater tenta retomar a vida em sociedade, enquanto busca de todas as formas reencontrar a irmã caçula, com quem perdeu contato após a sua prisão e que foi adotada por uma outra família na época. Confira o trailer:
Alguns pontos chamam muito nossa atenção. Sandra Bullock está sensacional e não fosse um certo preconceito com a atriz (mesmo depois do seu Oscar com "The Blind Side"), eu apostaria, no mínimo, em uma indicação na premiação de 2022 - sua performance é contida, pontuada, minimalista e sempre no tom correto para os diferentes tipos de cenas que ela precisa estar. Uma delas, inclusive, talvez seja o grande ponto alto do filme, quando "Ruth" de Bullock encontra com "Liz" de Viola Davis - além de uma cena muito bem construída para nos surpreender e de um talentoso embate entre duas excelentes atrizes, outro ponto que merece destaque é a montagem. Desde o inicio do filme, a montagem cria um ritmo sensacional para "Imperdoável" - mérito de Joe Walker (indicado ao Oscar por "A Chegada" e que usa do mesmo conceito técnico e narrativo para construir um mistério (e um suspense) em cima de um roteiro bem menos genial).
Dirigido pela ótima cineasta alemã Nora Fingscheidt, estreando em produções com um maior orçamento, o filme flerta com discussões bastante relevantes como o difícil processo de ressocialização de um ex-presidiário e como as vidas desses indivíduos são impactadas pelos crimes cometidos (especialmente contra policiais). O roteiro até pincela algumas críticas sobre os privilégios de ser uma mulher branca perante o preconceito sofrido pelos negros nas mesmas condições, mas não se tem tempo de ir além. A própria relação e as motivações dos irmãos Whelan ficam prejudicadas pela restrição de tempo.
O fato é que "Imperdoável" merece muito mais elogios do que críticas, além de ser um excelente entretenimento com um plot twist bem arquitetado, mesmo que com um final não tão corajoso. Existe um certo ar emotivo no desfecho da história, claro, mas talvez tenha faltado um pouco mais de impacto - algo que uma série da HBO entregaria sem receio, entende?
Se você gosta de um bom drama, pode ir tranquilo que vale a pena!
"Instinto Materno" é um filme sensacional e extremamente profundo se você estiver disposto a mergulhar nas relações familiares dentro de um contexto social que vai te provocar inúmeros julgamentos morais e mais do que isso: que vai te fazer refletir, te fazer repensar e até buscar algumas respostas (ou motivos) que justifiquem tantos sentimentos, tabus e comportamentos, muitas vezes incompreensíveis, que permeiam uma dinâmica entre mãe e filho - e essa jornada não será das mais simples!
Superprotetora, Cornelia Keneres (Luminita Gheorghiu) é uma mãe que possui um relacionamento conturbado com o filho Barbu (Bogdan Dumitrache) de 32 anos. Com uma perspectiva completamente infantil e dependente do filho, Cornelia tenta de todas as formas evitar que o filho seja indiciado por um acidente de carro que culminou na morte de um adolescente de 14 anos. Confira o trailer:
Essa produção romena, vencedora do Urso de Ouro em 2014 no Festival de Berlin, explora de maneira muito sútil o enorme abismo social do mundo moderno, sem a premissa de encontrar um vilão ou um mocinho. Na verdade, quando o roteiro pontua os reflexos do status social em algumas relações, como uma suposta facilidade em conseguir algumas informações com a polícia ou o pedido de favores entre patroa e empregada em troca de um lindo par de sapatos para a filha adolescente, a história ganha uma outra dimensão, não só baseada na obsessão de uma mãe, mas também em como isso esconde a fragilidade do ser humano e se conecta com a perda de valores ou com o abuso de privilégios.
Dirigido pelo talentoso Cãlin Peter Netzer (de "Ana, meu Amor"), com roteiro dele ao lado de Razvan Radulescu, "Instinto Materno" usa e abusa de sua câmera na mão, para imprimir um aspecto documental impressionante - é como se observássemos toda cena de dentro dela e ele faz isso com o único intuito de nos constranger. Veja, as situações são apresentadas de maneira seca, sem nenhum tipo de muleta visual (no bom sentido) e isso cria uma enorme sensação de realidade - é como se a história que vemos na tela pode ser a mesma que vamos escutar no próximo encontro com os amigos. Tudo isso faz ainda mais sentido porque temos uma Luminita Gheorghiu roubando a cena - ela é simplesmente intragável ao mesmo tempo em que é frágil, ressentida, perturbada, mal amada, enfim, são tantas camadas que seria impossível definir sua personagem em uma única palavra. Para quem não sabe, Gheorghiu sempre foi considerada uma das melhores atrizes de seu país e que, infelizmente, nos deixou em 4 de julho de 2021, com 71 anos.
"Instinto Materno" discute em vários níveis o conforto que a sensação de controle pode nos gerar e, obviamente, o inferno que nossa vida pode se tornar se não o tivermos. É um preço muito caro viver assim, além de ser uma parte indissociável de uma classe com privilégios, capaz de moldar (e transformar) a índole de um ser humano de acordo com suas próprias frustrações ou anseios. Não se trata de ser bom ou ruim, mas sim de usar os "meios" para alcançar um "fim" por si só. Não estranhe o fato do filme começar e terminar com reticências - esse é o seu conceito narrativo e propósito: talvez te gere uma percepção de vazio além do que estamos acostumados - e se isso acontecer, ele cumpriu seu papel!
Vale muito a pena!
"Instinto Materno" é um filme sensacional e extremamente profundo se você estiver disposto a mergulhar nas relações familiares dentro de um contexto social que vai te provocar inúmeros julgamentos morais e mais do que isso: que vai te fazer refletir, te fazer repensar e até buscar algumas respostas (ou motivos) que justifiquem tantos sentimentos, tabus e comportamentos, muitas vezes incompreensíveis, que permeiam uma dinâmica entre mãe e filho - e essa jornada não será das mais simples!
Superprotetora, Cornelia Keneres (Luminita Gheorghiu) é uma mãe que possui um relacionamento conturbado com o filho Barbu (Bogdan Dumitrache) de 32 anos. Com uma perspectiva completamente infantil e dependente do filho, Cornelia tenta de todas as formas evitar que o filho seja indiciado por um acidente de carro que culminou na morte de um adolescente de 14 anos. Confira o trailer:
Essa produção romena, vencedora do Urso de Ouro em 2014 no Festival de Berlin, explora de maneira muito sútil o enorme abismo social do mundo moderno, sem a premissa de encontrar um vilão ou um mocinho. Na verdade, quando o roteiro pontua os reflexos do status social em algumas relações, como uma suposta facilidade em conseguir algumas informações com a polícia ou o pedido de favores entre patroa e empregada em troca de um lindo par de sapatos para a filha adolescente, a história ganha uma outra dimensão, não só baseada na obsessão de uma mãe, mas também em como isso esconde a fragilidade do ser humano e se conecta com a perda de valores ou com o abuso de privilégios.
Dirigido pelo talentoso Cãlin Peter Netzer (de "Ana, meu Amor"), com roteiro dele ao lado de Razvan Radulescu, "Instinto Materno" usa e abusa de sua câmera na mão, para imprimir um aspecto documental impressionante - é como se observássemos toda cena de dentro dela e ele faz isso com o único intuito de nos constranger. Veja, as situações são apresentadas de maneira seca, sem nenhum tipo de muleta visual (no bom sentido) e isso cria uma enorme sensação de realidade - é como se a história que vemos na tela pode ser a mesma que vamos escutar no próximo encontro com os amigos. Tudo isso faz ainda mais sentido porque temos uma Luminita Gheorghiu roubando a cena - ela é simplesmente intragável ao mesmo tempo em que é frágil, ressentida, perturbada, mal amada, enfim, são tantas camadas que seria impossível definir sua personagem em uma única palavra. Para quem não sabe, Gheorghiu sempre foi considerada uma das melhores atrizes de seu país e que, infelizmente, nos deixou em 4 de julho de 2021, com 71 anos.
"Instinto Materno" discute em vários níveis o conforto que a sensação de controle pode nos gerar e, obviamente, o inferno que nossa vida pode se tornar se não o tivermos. É um preço muito caro viver assim, além de ser uma parte indissociável de uma classe com privilégios, capaz de moldar (e transformar) a índole de um ser humano de acordo com suas próprias frustrações ou anseios. Não se trata de ser bom ou ruim, mas sim de usar os "meios" para alcançar um "fim" por si só. Não estranhe o fato do filme começar e terminar com reticências - esse é o seu conceito narrativo e propósito: talvez te gere uma percepção de vazio além do que estamos acostumados - e se isso acontecer, ele cumpriu seu papel!
Vale muito a pena!
Apenas um público muito especifico vai se conectar com a minissérie "Irma Vep" - não porquê ela seja ruim, muito pelo contrário, ela é muito boa (com alguns críticos dizendo que ela é uma das melhores do ano, inclusive), mas também é inegável que seu conceito estético e narrativo tende a dificultar o entendimento e impacta diretamente nessa experiência metaliguística que discute os bastidores do cinema e como essa atmosfera interfere nas relações humanas. Eu diria que "Irma Vep" é uma mistura de "Um Lugar Qualquer" da Sofia Coppola com a versão da HBO de "Cenas de um Casamento"de Ingmar Bergman.
Em 8 episódiosacompanhamos Mira (Alicia Vikander), uma atriz norte-americana desiludida com os caminhos que sua vida amorosa e carreira tomaram. Quando surge uma oportunidade de ser a protagonista em uma minissérie para uma plataforma de streaming, ela viaja até a França para participar do remake do clássico "Les Vampires". Conforme vai se aprofundando no trabalho, Mira começa a notar comportamentos estranhos que não tinha antes e teme estar se tornando mais próxima de sua personagem do que gostaria. Confira o trailer:
Essa minissérie da A24 talvez seja a mais autoral e que mais tenha carregado naquele toque conceitual do cinema independente europeu que a HBO já produziu. Se inicialmente a trama parece separar perfeitamente o "real" da "fantasia", com o passar dos episódios essa distinção vai desaparecendo, criando uma linha narrativa cheia de camadas e que explora as diversas nuances de personagens que precisam lidar com seus fantasmas a cada novo desafio - profissional e pessoal.
Sim, "Irma Vep" é uma análise crítica sobre a indústria cinematográfica (e de seus atores, atrás e na frente das câmeras), porém são nas "entrelinhas" mais íntimas e fantasiosas que a história se aproveita da subjetividade para ganhar um certo charme. O diretor francês Oliver Assayas (de "Wasp - Rede de Espiões") repete a fórmula de seu premiado "Acima das Nuvens" para fazer um recorte quase auto-biográfico de quando dirigiu o homônimo clássico cult de 1996. Assayas usa dos personagens René (Vincent Macaigne) e Mira (Alicia Vikander) como porta-vozes de suas ideias e de sua visão de mundo - ambos cutucam o movimento "blockbuster" com a mesma elegância que criticam o mindset muitas vezes egocêntrico do cinema de arte europeu.
Mesmo com uma edição completamente fragmentada, o simbolismo e a busca por referências nunca se desalinham - quando falamos da "forma", visualmente, é muito claro quando ficção invade a realidade e quando o passado impacta o presente, porém é no "conteúdo", com diálogos muito bem desenvolvidos, que até os personagens mais estereotipados (como ao excêntrico ator alemão Gottfried de Lars Eidinger) ganham humanidade. Talvez essa quebra de expectativas perante uma história propositalmente "sem pé nem cabeça" e que pouco respeita a linha temporal, afaste a "audiência HBO", mas é impossível não elogiar a criatividade de Assayas e como ele criou uma dinâmica que sabe exatamente "onde" e "quem" provocar.
Olha, vale muito a pena, mas é preciso estar disposto a mergulhar em uma proposta pouco usual e que vai exigir uma reflexão que vai muito além do que assistimos na tela.
Apenas um público muito especifico vai se conectar com a minissérie "Irma Vep" - não porquê ela seja ruim, muito pelo contrário, ela é muito boa (com alguns críticos dizendo que ela é uma das melhores do ano, inclusive), mas também é inegável que seu conceito estético e narrativo tende a dificultar o entendimento e impacta diretamente nessa experiência metaliguística que discute os bastidores do cinema e como essa atmosfera interfere nas relações humanas. Eu diria que "Irma Vep" é uma mistura de "Um Lugar Qualquer" da Sofia Coppola com a versão da HBO de "Cenas de um Casamento"de Ingmar Bergman.
Em 8 episódiosacompanhamos Mira (Alicia Vikander), uma atriz norte-americana desiludida com os caminhos que sua vida amorosa e carreira tomaram. Quando surge uma oportunidade de ser a protagonista em uma minissérie para uma plataforma de streaming, ela viaja até a França para participar do remake do clássico "Les Vampires". Conforme vai se aprofundando no trabalho, Mira começa a notar comportamentos estranhos que não tinha antes e teme estar se tornando mais próxima de sua personagem do que gostaria. Confira o trailer:
Essa minissérie da A24 talvez seja a mais autoral e que mais tenha carregado naquele toque conceitual do cinema independente europeu que a HBO já produziu. Se inicialmente a trama parece separar perfeitamente o "real" da "fantasia", com o passar dos episódios essa distinção vai desaparecendo, criando uma linha narrativa cheia de camadas e que explora as diversas nuances de personagens que precisam lidar com seus fantasmas a cada novo desafio - profissional e pessoal.
Sim, "Irma Vep" é uma análise crítica sobre a indústria cinematográfica (e de seus atores, atrás e na frente das câmeras), porém são nas "entrelinhas" mais íntimas e fantasiosas que a história se aproveita da subjetividade para ganhar um certo charme. O diretor francês Oliver Assayas (de "Wasp - Rede de Espiões") repete a fórmula de seu premiado "Acima das Nuvens" para fazer um recorte quase auto-biográfico de quando dirigiu o homônimo clássico cult de 1996. Assayas usa dos personagens René (Vincent Macaigne) e Mira (Alicia Vikander) como porta-vozes de suas ideias e de sua visão de mundo - ambos cutucam o movimento "blockbuster" com a mesma elegância que criticam o mindset muitas vezes egocêntrico do cinema de arte europeu.
Mesmo com uma edição completamente fragmentada, o simbolismo e a busca por referências nunca se desalinham - quando falamos da "forma", visualmente, é muito claro quando ficção invade a realidade e quando o passado impacta o presente, porém é no "conteúdo", com diálogos muito bem desenvolvidos, que até os personagens mais estereotipados (como ao excêntrico ator alemão Gottfried de Lars Eidinger) ganham humanidade. Talvez essa quebra de expectativas perante uma história propositalmente "sem pé nem cabeça" e que pouco respeita a linha temporal, afaste a "audiência HBO", mas é impossível não elogiar a criatividade de Assayas e como ele criou uma dinâmica que sabe exatamente "onde" e "quem" provocar.
Olha, vale muito a pena, mas é preciso estar disposto a mergulhar em uma proposta pouco usual e que vai exigir uma reflexão que vai muito além do que assistimos na tela.
Você vai se surpreender com a potência de “Jogo Justo” - principalmente por trazer elementos bastante particulares de obras como “A Assistente” e “Industry”. Embora tenha sido vendido como uma espécie de thriller erótico pela Netflix, o filme vai muito além ao equilibrar aquela atmosfera de excessos dos bancos de investimento de Wall Street (daí a referência de “Industry”) com um drama angustiante pela sua psicologia e pela discussão relevante sobre o machismo e as várias formas de abuso (talvez um pouco mais explícito, mas igualmente competente, como vimos em “A Assistente”). Com um excelente roteiro e uma inspirada direção de Chloe Domon (de “Ballers”), o filme se alimenta de uma tensão crescente, quase insuportável, para expor uma triste realidade que realmente mexe com nossa percepção sobre o ser humano.
Basicamente, o filme acompanha o jovem casal Emily (Phoebe Dynevor) e Luke (Alden Ehrenreich), que trabalha em um banco de investimentos e que acabam embarcando em um romance proibido que vai contra as regras da organização. O segredo parece tornar as coisas ainda mais intensas até que Emily é promovida inesperadamente para uma posição que Luke almejava e aí, já viu. Confira o trailer:
Ë impressionante como acompanhar o colapso de um relacionamento diante da ebulição de egos, poder e pressões sociais e profissionais, mexe com a gente. “Jogo Justo” sabe exatamente como construir uma dinâmica envolvente que, pouca a pouco, é tirada de nós em uma desconstrução narrativa digna de aplausos - tirando algumas leves derrapadas no terceiro ato, eu diria que o roteiro merece mais do que elogios!
Domon é inteligente com explorar a sensibilidade do olhar e do silêncio ao mesmo tempo em que seu texto é mais bruto, direto, provocador. Não por acaso você vai escutar que Emily deve ter tido relações sexuais com o chefe para conseguir a promoção ou até que ela nunca será respeitada porque parece um cupcake indo para o trabalho, no entanto é na forma como Dynevor e Ehrenreich se relacionam com essas situações que somos tocados - é quase como se eles não soubessem decodificar suas falhas, dada a naturalidade desse tipo de posicionamento machista (para quem diz e para quem escuta). E o legal é que o roteiro também expõe a insegurança de Emily ao lidar com essa atmosfera, mesmo quando ela vai contra seus princípios para fazer parte de tudo aquilo e assim se sentir “inserida”.
Um ponto muito interessante e que vale citar é o fato de que “Fair Play” (no original) fez um certo barulho no Festival de Sundance em 2023 - gerando, inclusive, comparações com “Psicopata Americano” destaque no mesmo festival em 2000. Tão diferentes quanto semelhantes, ambos os filmes desafiam nossa compreensão sobre o ser humana ao ser provocado intimamente. O fato é que aqui temos mais uma história densa sobre a colisão caótica entre o poder e o ego, em uma era tão socialmente sensível ao lugar de fala sobre disparidade de gêneros. Com uma direção que sabe da capacidade interpretativa de sua audiência, ela deixa espaço para uma discussão coerente sem precisar levantar bandeiras à toa - é por isso que eu diria que esse filme já pode ser considerado um dos melhores dramas psicológicos recentes. Finalmente temos um excepcional filme de gênero que vale cada centavo dos míseros US$20 milhões pagos em direitos pela Netflix.
Imperdível.
Você vai se surpreender com a potência de “Jogo Justo” - principalmente por trazer elementos bastante particulares de obras como “A Assistente” e “Industry”. Embora tenha sido vendido como uma espécie de thriller erótico pela Netflix, o filme vai muito além ao equilibrar aquela atmosfera de excessos dos bancos de investimento de Wall Street (daí a referência de “Industry”) com um drama angustiante pela sua psicologia e pela discussão relevante sobre o machismo e as várias formas de abuso (talvez um pouco mais explícito, mas igualmente competente, como vimos em “A Assistente”). Com um excelente roteiro e uma inspirada direção de Chloe Domon (de “Ballers”), o filme se alimenta de uma tensão crescente, quase insuportável, para expor uma triste realidade que realmente mexe com nossa percepção sobre o ser humano.
Basicamente, o filme acompanha o jovem casal Emily (Phoebe Dynevor) e Luke (Alden Ehrenreich), que trabalha em um banco de investimentos e que acabam embarcando em um romance proibido que vai contra as regras da organização. O segredo parece tornar as coisas ainda mais intensas até que Emily é promovida inesperadamente para uma posição que Luke almejava e aí, já viu. Confira o trailer:
Ë impressionante como acompanhar o colapso de um relacionamento diante da ebulição de egos, poder e pressões sociais e profissionais, mexe com a gente. “Jogo Justo” sabe exatamente como construir uma dinâmica envolvente que, pouca a pouco, é tirada de nós em uma desconstrução narrativa digna de aplausos - tirando algumas leves derrapadas no terceiro ato, eu diria que o roteiro merece mais do que elogios!
Domon é inteligente com explorar a sensibilidade do olhar e do silêncio ao mesmo tempo em que seu texto é mais bruto, direto, provocador. Não por acaso você vai escutar que Emily deve ter tido relações sexuais com o chefe para conseguir a promoção ou até que ela nunca será respeitada porque parece um cupcake indo para o trabalho, no entanto é na forma como Dynevor e Ehrenreich se relacionam com essas situações que somos tocados - é quase como se eles não soubessem decodificar suas falhas, dada a naturalidade desse tipo de posicionamento machista (para quem diz e para quem escuta). E o legal é que o roteiro também expõe a insegurança de Emily ao lidar com essa atmosfera, mesmo quando ela vai contra seus princípios para fazer parte de tudo aquilo e assim se sentir “inserida”.
Um ponto muito interessante e que vale citar é o fato de que “Fair Play” (no original) fez um certo barulho no Festival de Sundance em 2023 - gerando, inclusive, comparações com “Psicopata Americano” destaque no mesmo festival em 2000. Tão diferentes quanto semelhantes, ambos os filmes desafiam nossa compreensão sobre o ser humana ao ser provocado intimamente. O fato é que aqui temos mais uma história densa sobre a colisão caótica entre o poder e o ego, em uma era tão socialmente sensível ao lugar de fala sobre disparidade de gêneros. Com uma direção que sabe da capacidade interpretativa de sua audiência, ela deixa espaço para uma discussão coerente sem precisar levantar bandeiras à toa - é por isso que eu diria que esse filme já pode ser considerado um dos melhores dramas psicológicos recentes. Finalmente temos um excepcional filme de gênero que vale cada centavo dos míseros US$20 milhões pagos em direitos pela Netflix.
Imperdível.
"Julho Agosto" (que em algumas plataformas de streaming ganhou o título de "Verão em Família") pode até soar como uma história adolescente com aquele tempero quase independente de um filme francês produzido para encantar o grande público - e de fato o filme escrito e dirigido pelo cineasta francês Diastème traz esses elementos, mas basta alguns minutos para perceber que a proposta é muito mais profunda, pois o roteiro se apoia em diversas camadas para expor um delicado retrato sobre a juventude e como essa realidade pode impactar no relacionamento entre pais (separados) e seus filhos.
As irmãs Laura (Luna Lou) e Josephine (Alma Jodorowsky) vão passar as férias de julho na casa de praia do padrasto. Enquanto a primeira se esforça para esconder uma grave travessura, a mais velha vive a dor e a delícia de uma intensa paixão de verão. No mês seguinte, elas vão visitar o pai em outra região da França e os problemas mudam de figura: enquanto Josephine lida com as consequências inimagináveis de seu romance, Luna se afasta a cada dia da infância em busca de respostas para suas próprias convicções. Confira o trailer:
Veja, "Juillet août" (no original) constrói uma narrativa interessante, mesmo que em alguns momentos pareça se perder na proposta - digo isso pelos caminhos que o roteiro escolhe para criar os conflitos e justificar a relação, essa sim muito mais interessante, entre as irmãs Laura e Josephine com seus pais que não estão mais juntos, mas fazem questão de se mostrar amorosos com elas e respeitosos entre si. Aqui, é bacana relatar que em nenhum momento (ou quase nenhum, graças a personalidade forte de Laura) o embate tem um tom dramático, pelo contrário, Diastème provoca a audiência muito mais por priorizar o diálogo do que por criar cenas impactantes - isso humaniza a relação familiar de tal maneira que fica impossível não nos colocarmos (como pais) nas situações vividas pelos personagens. Não existe a dicotomia usual dos filmes americanos do bom e do mal, ou do certo e do errado - como na vida real, são pontos de vista para uma mesma situação, e a partir daí as demonstrações de carinho, mesmo quando a bronca é necessária, são construídas com o intuito de educar e de encontrar as melhores soluções.
"Julho Agosto" tem o mérito de falar sobre o amadurecimento pelo olhar das jovens protagonistas - e como todos sabem, amadurecer não é um jornada das mais fáceis. O filme é realmente muito feliz ao discutir uma dinâmica de comunicação moderna observando uma nova estrutura familiar, com suas dores, mas também com seus pontos positivos: o papel do padrasto das meninas, é um bom exemplo, já que da sua forma mais simples, ele tenta passar ensinamentos e ainda deixa claro que está sempre disposto a ajudar no que elas precisarem; enquanto, ao mesmo tempo, Laura sente um enorme ciúme do pai e de forma honesta com seu sentimento tenta se colocar entre ele e sua pretendente. Entendem a complexidade das relações, mas com que delicadeza que esse filme trata do tema?
O filme é uma graça, muito mérito do seu roteiro. É incrível como a audiência se sente bem ao lado dos personagens e como eles são carismáticos - não é por acaso que nos interessamos por suas jornadas, entendemos suas motivações e principalmente torcemos para que tudo dê certo em nome da paz para aquela família. A mensagem é das melhores, mesmo que a vida teime em desafiar todos eles.
Vale muito a pena!
"Julho Agosto" (que em algumas plataformas de streaming ganhou o título de "Verão em Família") pode até soar como uma história adolescente com aquele tempero quase independente de um filme francês produzido para encantar o grande público - e de fato o filme escrito e dirigido pelo cineasta francês Diastème traz esses elementos, mas basta alguns minutos para perceber que a proposta é muito mais profunda, pois o roteiro se apoia em diversas camadas para expor um delicado retrato sobre a juventude e como essa realidade pode impactar no relacionamento entre pais (separados) e seus filhos.
As irmãs Laura (Luna Lou) e Josephine (Alma Jodorowsky) vão passar as férias de julho na casa de praia do padrasto. Enquanto a primeira se esforça para esconder uma grave travessura, a mais velha vive a dor e a delícia de uma intensa paixão de verão. No mês seguinte, elas vão visitar o pai em outra região da França e os problemas mudam de figura: enquanto Josephine lida com as consequências inimagináveis de seu romance, Luna se afasta a cada dia da infância em busca de respostas para suas próprias convicções. Confira o trailer:
Veja, "Juillet août" (no original) constrói uma narrativa interessante, mesmo que em alguns momentos pareça se perder na proposta - digo isso pelos caminhos que o roteiro escolhe para criar os conflitos e justificar a relação, essa sim muito mais interessante, entre as irmãs Laura e Josephine com seus pais que não estão mais juntos, mas fazem questão de se mostrar amorosos com elas e respeitosos entre si. Aqui, é bacana relatar que em nenhum momento (ou quase nenhum, graças a personalidade forte de Laura) o embate tem um tom dramático, pelo contrário, Diastème provoca a audiência muito mais por priorizar o diálogo do que por criar cenas impactantes - isso humaniza a relação familiar de tal maneira que fica impossível não nos colocarmos (como pais) nas situações vividas pelos personagens. Não existe a dicotomia usual dos filmes americanos do bom e do mal, ou do certo e do errado - como na vida real, são pontos de vista para uma mesma situação, e a partir daí as demonstrações de carinho, mesmo quando a bronca é necessária, são construídas com o intuito de educar e de encontrar as melhores soluções.
"Julho Agosto" tem o mérito de falar sobre o amadurecimento pelo olhar das jovens protagonistas - e como todos sabem, amadurecer não é um jornada das mais fáceis. O filme é realmente muito feliz ao discutir uma dinâmica de comunicação moderna observando uma nova estrutura familiar, com suas dores, mas também com seus pontos positivos: o papel do padrasto das meninas, é um bom exemplo, já que da sua forma mais simples, ele tenta passar ensinamentos e ainda deixa claro que está sempre disposto a ajudar no que elas precisarem; enquanto, ao mesmo tempo, Laura sente um enorme ciúme do pai e de forma honesta com seu sentimento tenta se colocar entre ele e sua pretendente. Entendem a complexidade das relações, mas com que delicadeza que esse filme trata do tema?
O filme é uma graça, muito mérito do seu roteiro. É incrível como a audiência se sente bem ao lado dos personagens e como eles são carismáticos - não é por acaso que nos interessamos por suas jornadas, entendemos suas motivações e principalmente torcemos para que tudo dê certo em nome da paz para aquela família. A mensagem é das melhores, mesmo que a vida teime em desafiar todos eles.
Vale muito a pena!
A vida é feita de escolhas e talvez o maior mérito do premiado "La La Land" seja, justamente, criar uma conexão entre os nossos sonhos e objetivos pessoais (e profissionais), com as renúncias que temos que fazer para alcança-los - mesmo que isso doa no coração, mesmo que não tenhamos a certeza que fizemos a escolha certa!
O filme nos conta a história de Mia (Emma Stone) e Sebastian (Ryan Gosling), uma atriz no início de sua carreira e um pianista que deseja abrir sua própria casa de jazz, para salvar o gênero musical de uma cidade que idolatra tudo, mas não valoriza nada. Se conhecendo sob circunstâncias inusitadas, eles acabam se apaixonando e acompanhamos seu relacionamento e suas escolhas através das mudanças de estação do ano – de Inverno a Inverno. Confira o trailer:
Quem assiste a primeira cena do filme pode até ter um impressão errada do que virá pela frente, mas vale a reflexão: aqui estamos falando de uma impressionante sequência em uma rodovia de Los Angeles. São centenas de carros em um dos engarrafamentos normais da região, com cada pessoa isolada em seu mundo, escutando seu tipo de música. Aos poucos, elas começam a deixar os veículos e cantar - são os aspirantes a artistas que peregrinam do mundo todo em direção ao sonho de fazer sucesso em Hollywood. Tanto a coreografia quanto o movimento de câmera criam uma dinâmica cinematográfica que funciona muito mais como uma homenagem aos clássicos musicais de outros tempos do que como uma cena imprescindível para o entendimento da trama - mas e daí? É lindo, porém o filme não será sobre isso - pelo menos não em sua "forma"!
Durante mais de duas horas, você vai assistir uma ou outra intervenção musical (até mais durante o prólogo para estabelecer o conceito narrativo). O fato é que o drama vai tomando conta do filme, priorizando um "conteúdo" que rapidamente dialoga com a audiência, entregando uma história que todos nós já vivemos, independente da área que escolhemos atuar ou quem não escolhemos amar – o que é até irônico, pois ninguém, de fato, tem essa escolha. Por outro lado, a escolha do talentoso diretor Damien Chazelle (do elogiado e inesquecível "Whiplash") em trazer para o seu elenco Ryan Gosling e Emma Stone, foi essencial. Ela está está encantadora, especialmente porque percebemos seu esforço para cantar e dançar - essa metáfora proposital de Chazelle é genial, pois só vamos conseguir nossas maiores conquistas quando sairmos da zona de conforto e Stone, aliás, provou essa tese ganhando o Oscar de Melhor Atriz pelo papel em 2017! Gosling segue a mesma linha, ele mal canta, é duro dançando, mas convence muito como pianista e como personagem que traz muito da introspecção (mérito dele em todos os sentidos) de Dean de "Namorados para Sempre"(ou "Blue Valentine").
Tecnicamente perfeito e artisticamente impressionante, "La La Land" é um filme que vai exigir certa sensibilidade para entender o seu subtexto. Não que seja um filme complicado ou "cabeça" demais, mas é nítido que ao mesmo tempo que se posiciona como uma homenagem ao cinema e ao jazz, ele também traz uma mensagem otimista sobre perseguir seus sonhos, independente do seu preço. Como em "Tick, Tick... Boom!" estamos expostos aos tropeços, as lágrimas deixadas pelo caminho e as pessoas que o destino nos apresenta na hora errada. Com um astral bacana e até com certa leveza, esse incrível roteiro, também de Chazelle, nos mostra a realidade, mesmo que enquadrada na fantasia e nas cores de um belo musical.
Vale muito o seu play!
Up-date: "La La Land" foi indicado a ganhou em quatorze categorias no Oscar 2017. Levando em seis categorias - inclusive dando a Damien Chazelle a honra de ser o diretor mais jovem da história (até ali) a ganhar o prêmio!
A vida é feita de escolhas e talvez o maior mérito do premiado "La La Land" seja, justamente, criar uma conexão entre os nossos sonhos e objetivos pessoais (e profissionais), com as renúncias que temos que fazer para alcança-los - mesmo que isso doa no coração, mesmo que não tenhamos a certeza que fizemos a escolha certa!
O filme nos conta a história de Mia (Emma Stone) e Sebastian (Ryan Gosling), uma atriz no início de sua carreira e um pianista que deseja abrir sua própria casa de jazz, para salvar o gênero musical de uma cidade que idolatra tudo, mas não valoriza nada. Se conhecendo sob circunstâncias inusitadas, eles acabam se apaixonando e acompanhamos seu relacionamento e suas escolhas através das mudanças de estação do ano – de Inverno a Inverno. Confira o trailer:
Quem assiste a primeira cena do filme pode até ter um impressão errada do que virá pela frente, mas vale a reflexão: aqui estamos falando de uma impressionante sequência em uma rodovia de Los Angeles. São centenas de carros em um dos engarrafamentos normais da região, com cada pessoa isolada em seu mundo, escutando seu tipo de música. Aos poucos, elas começam a deixar os veículos e cantar - são os aspirantes a artistas que peregrinam do mundo todo em direção ao sonho de fazer sucesso em Hollywood. Tanto a coreografia quanto o movimento de câmera criam uma dinâmica cinematográfica que funciona muito mais como uma homenagem aos clássicos musicais de outros tempos do que como uma cena imprescindível para o entendimento da trama - mas e daí? É lindo, porém o filme não será sobre isso - pelo menos não em sua "forma"!
Durante mais de duas horas, você vai assistir uma ou outra intervenção musical (até mais durante o prólogo para estabelecer o conceito narrativo). O fato é que o drama vai tomando conta do filme, priorizando um "conteúdo" que rapidamente dialoga com a audiência, entregando uma história que todos nós já vivemos, independente da área que escolhemos atuar ou quem não escolhemos amar – o que é até irônico, pois ninguém, de fato, tem essa escolha. Por outro lado, a escolha do talentoso diretor Damien Chazelle (do elogiado e inesquecível "Whiplash") em trazer para o seu elenco Ryan Gosling e Emma Stone, foi essencial. Ela está está encantadora, especialmente porque percebemos seu esforço para cantar e dançar - essa metáfora proposital de Chazelle é genial, pois só vamos conseguir nossas maiores conquistas quando sairmos da zona de conforto e Stone, aliás, provou essa tese ganhando o Oscar de Melhor Atriz pelo papel em 2017! Gosling segue a mesma linha, ele mal canta, é duro dançando, mas convence muito como pianista e como personagem que traz muito da introspecção (mérito dele em todos os sentidos) de Dean de "Namorados para Sempre"(ou "Blue Valentine").
Tecnicamente perfeito e artisticamente impressionante, "La La Land" é um filme que vai exigir certa sensibilidade para entender o seu subtexto. Não que seja um filme complicado ou "cabeça" demais, mas é nítido que ao mesmo tempo que se posiciona como uma homenagem ao cinema e ao jazz, ele também traz uma mensagem otimista sobre perseguir seus sonhos, independente do seu preço. Como em "Tick, Tick... Boom!" estamos expostos aos tropeços, as lágrimas deixadas pelo caminho e as pessoas que o destino nos apresenta na hora errada. Com um astral bacana e até com certa leveza, esse incrível roteiro, também de Chazelle, nos mostra a realidade, mesmo que enquadrada na fantasia e nas cores de um belo musical.
Vale muito o seu play!
Up-date: "La La Land" foi indicado a ganhou em quatorze categorias no Oscar 2017. Levando em seis categorias - inclusive dando a Damien Chazelle a honra de ser o diretor mais jovem da história (até ali) a ganhar o prêmio!
Olha, "Maid" é excelente, mas preciso te avisar: não será uma jornada das mais tranquilas! Essa minissérie da Netflix, criada pela Molly Smith Metzler (também responsável por "Shameless") e dirigida pelo incrível John Wells (26 vezes indicado ao Emmy e vencedor por "ER" e "West Wing"), é baseada no livro de memórias "Maid: Hard Work, Low Pay, and a Mother's Will to Survive" de Stephanie Land. Sua trama oferece uma exploração íntima e comovente das dificuldades enfrentadas por uma jovem mãe solteira enquanto luta para construir uma vida digna para ela e para sua filha, em meio a uma realidade dolorosa e a um sistema que muitas vezes parece estar contra quem mais precisa. Com uma narrativa emocionalmente delicada e performances realmente excepcionais, "Maid" merece demais sua atenção - certamente uma das produções mais impactantes de 2021.
A história segue Alex Russel (Margaret Qualley), uma jovem que resolve deixar de lado um relacionamento abusivo com seu namorado Sean (Nick Robinson). Sem nenhum apoio financeiro ou familiar, Alex começa a trabalhar como empregada doméstica para sustentar sua filha Maddy (Rylea Nevaeh Whittet). "Maid" documenta as lutas de Alex para encontrar estabilidade perante todas as complicações de ser mãe solteira, enquanto tenta navegar pelas dificuldades emocionais e psicológicas que surgem ao longo de sua jornada. Confira o trailer (em inglês):
Só pelo trailer é possível ter uma ideia da potência narrativa e visual de "Maid". Molly Smith Metzler, criadora e roteirista da minissérie, demonstra uma habilidade impressionante ao construir essa narrativa que é ao mesmo tempo dolorosamente realista e profundamente humana. Metzler tenta equilibrar com alguma sensibilidade o impacto dos temas que a história de Alex aborda, mas chega ser viceral como as discussões que ela levanta nos provoca. Falar sobre abuso doméstico, sobre as dores da falta de recursos mínimos, sobre saúde mental e, especialmente, sobre as falhas do sistema que deveria dar toda assistência que a mulher precisa, da fato, é indigesto. A partir de uma análise social interessante, Metzler evita o sensacionalismo e se concentra em pontuar as pequenas vitórias e, claro, a resiliência do espírito humano, oferecendo uma representação autêntica e dura das dificuldades enfrentadas por milhões de mulheres na vida real.
A direção de John Wells é fundamental - o tom cinematográfico escolhido por ele é a melhor representação da força dessa minissérie. Wells captura as lutas de Alex com intimidade, em uma direção que é ao mesmo tempo crua e compassiva. A fotografia de Guy Godfree (de "Maudie: Sua Vida e Sua Arte") é igualmente eficaz, utilizando uma paleta de cores que reflete perfeitamente as emoções e o estado mental de Alex - ele usa e abusa dos planos fechados e da câmera "mais nervosa" para assinalar o desespero e os momentos de esperança da protagonista sem fugir da realidade. Repare como as escolhas de enquadramento muitas vezes enfatizam a sensação de isolamento e claustrofobia que Alex sente durante sua luta para escapar de seu passado e assim tentar construir um futuro melhor - essa escolha conceitual reflete demais nas nossas sensações ao ponto de doer na alma!
Margaret Qualley encontra a força e a vulnerabilidade de uma personagem cheia de camadas com uma autenticidade cativante e comovente. Sua performance é o coração pulsante da minissérie, transmitindo a determinação silenciosa de uma jovem mãe que fará qualquer coisa para garantir o melhor para sua filha. Rylea Nevaeh Whittet, como Maddy, traz uma doçura e uma inocência que contrastam com a dureza da vida que Alex enfrenta, reforçando o vínculo profundo entre mãe e filha de uma maneira que fica impossível não se apaixonar por elas. Mas atenção: o ritmo da narrativa, que se concentra intensamente nos detalhes do cotidiano de Alex, pode soar lento em certos momentos. Além disso, a repetição dos desafios enfrentados por ela pode parecer cansativo para alguns, mas é justamente essas características que sublinham a realidade exaustiva, menos favorecida e angustiante de uma luta pela sobrevivência que parece injusta aos olhos da empatia. "Maid" é uma obra poderosa que destaca o poder do espírito humano em meio a adversidades imensas, eu diria até que é um retrato incisivo e comovente das dificuldades enfrentadas por aqueles que estão presos em um ciclo de pobreza e abuso, mas que mesmo assim tenta oferecer uma mensagem de esperança e resiliência.
Vale muito o seu play!
Olha, "Maid" é excelente, mas preciso te avisar: não será uma jornada das mais tranquilas! Essa minissérie da Netflix, criada pela Molly Smith Metzler (também responsável por "Shameless") e dirigida pelo incrível John Wells (26 vezes indicado ao Emmy e vencedor por "ER" e "West Wing"), é baseada no livro de memórias "Maid: Hard Work, Low Pay, and a Mother's Will to Survive" de Stephanie Land. Sua trama oferece uma exploração íntima e comovente das dificuldades enfrentadas por uma jovem mãe solteira enquanto luta para construir uma vida digna para ela e para sua filha, em meio a uma realidade dolorosa e a um sistema que muitas vezes parece estar contra quem mais precisa. Com uma narrativa emocionalmente delicada e performances realmente excepcionais, "Maid" merece demais sua atenção - certamente uma das produções mais impactantes de 2021.
A história segue Alex Russel (Margaret Qualley), uma jovem que resolve deixar de lado um relacionamento abusivo com seu namorado Sean (Nick Robinson). Sem nenhum apoio financeiro ou familiar, Alex começa a trabalhar como empregada doméstica para sustentar sua filha Maddy (Rylea Nevaeh Whittet). "Maid" documenta as lutas de Alex para encontrar estabilidade perante todas as complicações de ser mãe solteira, enquanto tenta navegar pelas dificuldades emocionais e psicológicas que surgem ao longo de sua jornada. Confira o trailer (em inglês):
Só pelo trailer é possível ter uma ideia da potência narrativa e visual de "Maid". Molly Smith Metzler, criadora e roteirista da minissérie, demonstra uma habilidade impressionante ao construir essa narrativa que é ao mesmo tempo dolorosamente realista e profundamente humana. Metzler tenta equilibrar com alguma sensibilidade o impacto dos temas que a história de Alex aborda, mas chega ser viceral como as discussões que ela levanta nos provoca. Falar sobre abuso doméstico, sobre as dores da falta de recursos mínimos, sobre saúde mental e, especialmente, sobre as falhas do sistema que deveria dar toda assistência que a mulher precisa, da fato, é indigesto. A partir de uma análise social interessante, Metzler evita o sensacionalismo e se concentra em pontuar as pequenas vitórias e, claro, a resiliência do espírito humano, oferecendo uma representação autêntica e dura das dificuldades enfrentadas por milhões de mulheres na vida real.
A direção de John Wells é fundamental - o tom cinematográfico escolhido por ele é a melhor representação da força dessa minissérie. Wells captura as lutas de Alex com intimidade, em uma direção que é ao mesmo tempo crua e compassiva. A fotografia de Guy Godfree (de "Maudie: Sua Vida e Sua Arte") é igualmente eficaz, utilizando uma paleta de cores que reflete perfeitamente as emoções e o estado mental de Alex - ele usa e abusa dos planos fechados e da câmera "mais nervosa" para assinalar o desespero e os momentos de esperança da protagonista sem fugir da realidade. Repare como as escolhas de enquadramento muitas vezes enfatizam a sensação de isolamento e claustrofobia que Alex sente durante sua luta para escapar de seu passado e assim tentar construir um futuro melhor - essa escolha conceitual reflete demais nas nossas sensações ao ponto de doer na alma!
Margaret Qualley encontra a força e a vulnerabilidade de uma personagem cheia de camadas com uma autenticidade cativante e comovente. Sua performance é o coração pulsante da minissérie, transmitindo a determinação silenciosa de uma jovem mãe que fará qualquer coisa para garantir o melhor para sua filha. Rylea Nevaeh Whittet, como Maddy, traz uma doçura e uma inocência que contrastam com a dureza da vida que Alex enfrenta, reforçando o vínculo profundo entre mãe e filha de uma maneira que fica impossível não se apaixonar por elas. Mas atenção: o ritmo da narrativa, que se concentra intensamente nos detalhes do cotidiano de Alex, pode soar lento em certos momentos. Além disso, a repetição dos desafios enfrentados por ela pode parecer cansativo para alguns, mas é justamente essas características que sublinham a realidade exaustiva, menos favorecida e angustiante de uma luta pela sobrevivência que parece injusta aos olhos da empatia. "Maid" é uma obra poderosa que destaca o poder do espírito humano em meio a adversidades imensas, eu diria até que é um retrato incisivo e comovente das dificuldades enfrentadas por aqueles que estão presos em um ciclo de pobreza e abuso, mas que mesmo assim tenta oferecer uma mensagem de esperança e resiliência.
Vale muito o seu play!
"Mais Forte que Bombas" é basicamente um outro recorte da história que vimos no belíssimo "Mil Vezes Boa Noite" do talentoso diretor norueguês Erik Poppe. Se no filme de Poppe a discussão era centrada no distanciamento familiar que a vida da fotógrafa de guerra Rebecca (Juliette Binoche) provocava, aqui o drama tem um outro aspecto, quase complementar: o luto da família de uma outra fotógrafa de guerra, Isabelle (Isabelle Huppert) que morreu em um acidente dois anos antes. As similaridades narrativas são evidentes, principalmente no que diz respeito as escolhas profissionais de uma mãe e as consequências que impactaram e acompanharam sua família (o marido, e dois filhos), mesmo anos após a sua morte.
Uma exposição celebrando a fotógrafa Isabelle Reed, dois anos após sua morte prematura, traz seu filho mais velho, Jonah (Jesse Eisenberg), de volta para a casa da família – forçando-o a passar mais tempo do que teve em anos com seu pai, Gene (Gabriel Byrne), e com seu recluso irmão adolescente, Conrad (Devin Druid). Com os três sob o mesmo teto, Gene tenta desesperadamente reconectar-se com seus dois filhos, mas eles lutam para reconciliar seus sentimentos em relação à mulher, da qual se lembram de maneiras tão diferentes. Confira o trailer:
"Mais Forte que Bombas" é o primeiro filme do premiado diretor dinamarquês Joachim Trier (indicado ao Oscar por "A Pior Pessoa do Mundo") com atores americanos e nem por isso ele se distancia de sua identidade cinematográfica de onde se apropria de uma estética extremamente autoral (e poética) para contar uma história profunda sobre o luto e a dinâmica das relações dentro de uma família completamente fragmentada. Aliás, essa fragmentação, não por acaso, é o que dita o ritmo de um drama bastante complexo e cadenciado que nos provoca inúmeras reflexões.
A partir da montagem do Olivier Bugge Coutté (companheiro de longa data de Trier e vencedor no Tribeca Festival por "Bridgend"), somos arremessados para dentro da família Reed sem o menor receio do que vamos encontrar. Ao construir a história, alternando os pontos de vista para uma mesma situação, Coutté e Trier entregam um verdadeiro tratado sobre algumas formas de lidar com o luto - até a rápida participação de Rachel Brosnahan (como Erin) ajuda a compor essa camada que definitivamente mexe com a gente. Tanto Byrne, quanto Druid e Eisenberg, se permitem encontrar a dor de seus personagens e assim estabelecer um reflexo obscuro em suas vidas - o encontro entre o intimo e a necessidade de seguir em frente é avassalador (cada qual com seus fantasmas, diga-se de passagem)!
Grande vencedor da Palma de Ouro em Cannes 2015, "Mais Forte que Bombas" não é nem de longe um filme fácil - sua densidade dramática não vai conquistar uma enorme audiência, mas com certeza vai impactar demais quem gosta do gênero (na sua "forma" e em seu "conteúdo").
Vale muito o seu play!
"Mais Forte que Bombas" é basicamente um outro recorte da história que vimos no belíssimo "Mil Vezes Boa Noite" do talentoso diretor norueguês Erik Poppe. Se no filme de Poppe a discussão era centrada no distanciamento familiar que a vida da fotógrafa de guerra Rebecca (Juliette Binoche) provocava, aqui o drama tem um outro aspecto, quase complementar: o luto da família de uma outra fotógrafa de guerra, Isabelle (Isabelle Huppert) que morreu em um acidente dois anos antes. As similaridades narrativas são evidentes, principalmente no que diz respeito as escolhas profissionais de uma mãe e as consequências que impactaram e acompanharam sua família (o marido, e dois filhos), mesmo anos após a sua morte.
Uma exposição celebrando a fotógrafa Isabelle Reed, dois anos após sua morte prematura, traz seu filho mais velho, Jonah (Jesse Eisenberg), de volta para a casa da família – forçando-o a passar mais tempo do que teve em anos com seu pai, Gene (Gabriel Byrne), e com seu recluso irmão adolescente, Conrad (Devin Druid). Com os três sob o mesmo teto, Gene tenta desesperadamente reconectar-se com seus dois filhos, mas eles lutam para reconciliar seus sentimentos em relação à mulher, da qual se lembram de maneiras tão diferentes. Confira o trailer:
"Mais Forte que Bombas" é o primeiro filme do premiado diretor dinamarquês Joachim Trier (indicado ao Oscar por "A Pior Pessoa do Mundo") com atores americanos e nem por isso ele se distancia de sua identidade cinematográfica de onde se apropria de uma estética extremamente autoral (e poética) para contar uma história profunda sobre o luto e a dinâmica das relações dentro de uma família completamente fragmentada. Aliás, essa fragmentação, não por acaso, é o que dita o ritmo de um drama bastante complexo e cadenciado que nos provoca inúmeras reflexões.
A partir da montagem do Olivier Bugge Coutté (companheiro de longa data de Trier e vencedor no Tribeca Festival por "Bridgend"), somos arremessados para dentro da família Reed sem o menor receio do que vamos encontrar. Ao construir a história, alternando os pontos de vista para uma mesma situação, Coutté e Trier entregam um verdadeiro tratado sobre algumas formas de lidar com o luto - até a rápida participação de Rachel Brosnahan (como Erin) ajuda a compor essa camada que definitivamente mexe com a gente. Tanto Byrne, quanto Druid e Eisenberg, se permitem encontrar a dor de seus personagens e assim estabelecer um reflexo obscuro em suas vidas - o encontro entre o intimo e a necessidade de seguir em frente é avassalador (cada qual com seus fantasmas, diga-se de passagem)!
Grande vencedor da Palma de Ouro em Cannes 2015, "Mais Forte que Bombas" não é nem de longe um filme fácil - sua densidade dramática não vai conquistar uma enorme audiência, mas com certeza vai impactar demais quem gosta do gênero (na sua "forma" e em seu "conteúdo").
Vale muito o seu play!
"Malcolm e Marie" é excelente, porém é preciso fazer um alerta: como a história se apoia, basicamente, em uma longa discussão entre um jovem casal; toda narrativa fica muito cadenciada, naturalmente verborrágica e isso, normalmente, cansa quem não é adepto a esse estilo de filme. Além disso, ele foi todo rodado em "preto e branco" e em película, o que traz para a imagem uma certa granulação que, mais uma vez, pode incomodar quem assiste e é indiferente a esse conceito mais "retrô". Dito isso, e se você não enxergou nenhum problema nesses elementos conceituais que o diretor Sam Levinson trouxe para sua obra, "Malcolm e Marie" não decepciona ao discutir sob o olhar profundo e cirurgicamente dividido em várias camadas, o desafio de um relacionamento construído em cima de expectativas que muitas vezes não são atingidas por um simples detalhe: as pessoas são únicas e enxergam algumas passagens da vida de forma diferente - nem certo, nem errado, apenas diferente!
Na história acompanhamos um cineasta, Malcolm (John David Washington), voltando para casa com sua namorada, Marie (Zendaya), após a pré-estreia de seu novo filme. Enquanto espera as primeiras críticas sobre seu filme, Malcolm e Marie iniciam uma conversa despretensiosa que acaba se transformando em uma longa e reveladora discussão - o fato é que uma “pequena” fagulha estoura uma bomba de acusações com muita tensão acumulada, mágoas, reflexões e arrependimentos. Uma noite que seria de comemoração, muda repentinamente e coloca em teste a força do amor do casal. Confira o trailer:
Desde o seu anúncio, "Malcolm e Marie" já flertava com a possibilidade de algumas indicações para o Oscar 2021 e, de fato, não seria surpresa se John David Washington, Zendaya, Marcell Rév (Diretor de Fotografia) e talvez Sam Levinson, fossem indicados. Não acredito que o filme tenha força para alcançar voos mais altos pelo simples fato de que são os atores a base de toda narrativa e tanto o diretor, quanto o fotógrafo, estão ali apenas para servir de apoio e potencializar o trabalho deles - que é simplesmente sensacional (e do mesmo nível), diga-se de passagem.
Alguns diálogos escritos pelo próprio diretor são capazes de nos remeter a situações que já passamos, mas outros não acrescentam absolutamente nada para a história e acabam virando monólogos sem muito propósito. Na verdade até existe um propósito, mas não se encaixa ao que está acontecendo com aqueles personagens - toda a discussão racial, por exemplo, embora importante, cansa um pouco, já que perde muita força por ter sido inserida em um contexto muito frágil e que pouco impacta nos dramas de Malcolm e Marie como casal. As referências do universo do cinema também podem deixar algumas pessoas "boiando" - da mesma forma como aconteceu recentemente com Mank!
Talvez o grande mérito do filme, tenha sido a capacidade do diretor Sam Levinson em mostrar um retrato cruel e extremamente realista de como algumas relações podem se tornar complicadas quando as expectativas não são alcançadas, mesmo entre pessoas que se amam. Basta um querer discutir para que uma pequena mágoa se transforme em um motivo para rever a relação - "Malcolm e Marie" é isso! Tenho a impressão que o filme poderia agradar mais pessoas se fosse mais direto, sem tantos rodeios poéticos e ações sem sentido - certamente traria mais dinâmica para narrativa! Se você gosta de um texto "estilo Woody Allen", mas com um certo peso emocional de "História de um Casamento", esse filme foi feito para você!
"Malcolm e Marie" é excelente, porém é preciso fazer um alerta: como a história se apoia, basicamente, em uma longa discussão entre um jovem casal; toda narrativa fica muito cadenciada, naturalmente verborrágica e isso, normalmente, cansa quem não é adepto a esse estilo de filme. Além disso, ele foi todo rodado em "preto e branco" e em película, o que traz para a imagem uma certa granulação que, mais uma vez, pode incomodar quem assiste e é indiferente a esse conceito mais "retrô". Dito isso, e se você não enxergou nenhum problema nesses elementos conceituais que o diretor Sam Levinson trouxe para sua obra, "Malcolm e Marie" não decepciona ao discutir sob o olhar profundo e cirurgicamente dividido em várias camadas, o desafio de um relacionamento construído em cima de expectativas que muitas vezes não são atingidas por um simples detalhe: as pessoas são únicas e enxergam algumas passagens da vida de forma diferente - nem certo, nem errado, apenas diferente!
Na história acompanhamos um cineasta, Malcolm (John David Washington), voltando para casa com sua namorada, Marie (Zendaya), após a pré-estreia de seu novo filme. Enquanto espera as primeiras críticas sobre seu filme, Malcolm e Marie iniciam uma conversa despretensiosa que acaba se transformando em uma longa e reveladora discussão - o fato é que uma “pequena” fagulha estoura uma bomba de acusações com muita tensão acumulada, mágoas, reflexões e arrependimentos. Uma noite que seria de comemoração, muda repentinamente e coloca em teste a força do amor do casal. Confira o trailer:
Desde o seu anúncio, "Malcolm e Marie" já flertava com a possibilidade de algumas indicações para o Oscar 2021 e, de fato, não seria surpresa se John David Washington, Zendaya, Marcell Rév (Diretor de Fotografia) e talvez Sam Levinson, fossem indicados. Não acredito que o filme tenha força para alcançar voos mais altos pelo simples fato de que são os atores a base de toda narrativa e tanto o diretor, quanto o fotógrafo, estão ali apenas para servir de apoio e potencializar o trabalho deles - que é simplesmente sensacional (e do mesmo nível), diga-se de passagem.
Alguns diálogos escritos pelo próprio diretor são capazes de nos remeter a situações que já passamos, mas outros não acrescentam absolutamente nada para a história e acabam virando monólogos sem muito propósito. Na verdade até existe um propósito, mas não se encaixa ao que está acontecendo com aqueles personagens - toda a discussão racial, por exemplo, embora importante, cansa um pouco, já que perde muita força por ter sido inserida em um contexto muito frágil e que pouco impacta nos dramas de Malcolm e Marie como casal. As referências do universo do cinema também podem deixar algumas pessoas "boiando" - da mesma forma como aconteceu recentemente com Mank!
Talvez o grande mérito do filme, tenha sido a capacidade do diretor Sam Levinson em mostrar um retrato cruel e extremamente realista de como algumas relações podem se tornar complicadas quando as expectativas não são alcançadas, mesmo entre pessoas que se amam. Basta um querer discutir para que uma pequena mágoa se transforme em um motivo para rever a relação - "Malcolm e Marie" é isso! Tenho a impressão que o filme poderia agradar mais pessoas se fosse mais direto, sem tantos rodeios poéticos e ações sem sentido - certamente traria mais dinâmica para narrativa! Se você gosta de um texto "estilo Woody Allen", mas com um certo peso emocional de "História de um Casamento", esse filme foi feito para você!
Toda escolha gera uma consequência, isso é um fato e faz parte do ciclo da vida, porém são os reflexos dessas consequências que muitas vezes não podemos prever ou controlar - e é justamente seguindo esse conceito narrativo que o talentoso diretor norueguês Erik Poppe (que depois veio a dirigir o imperdível "Utoya 22 de Julho") entrega mais um filme visceral sobre as dores do terrorismo e o impacto dessas experiências nos relacionamentos de quem viveu o drama de perto . O fato é que "Mil Vezes Boa Noite" é aquele tipo de filme autoral, belíssimo visualmente, quase poético, e extremamente profundo que merece ser aplaudido de pé!
Rebecca (Juliette Binoche) é uma das melhores fotógrafas de guerra em atividade e precisa enfrentar um turbilhão de emoções quando seu marido (Nikolaj Coster-Waldau) lhe dá um ultimato: ou o trabalho ou a família. Ele e a filha mais velha do casal, Stephanie (Lauryn Canny), não suportam mais sua rotina arriscada e exigem mudanças, mas ela, apesar de amar a família, tem verdadeira adoração pela profissão e pelos impactos que seu trabalho podem provocar na sociedade. Confira o trailer:
Pope é um ex-fotografo de guerra, talvez por isso ele tenha escolhido falar sobre o tema para iniciar sua carreira internacional - mesmo sendo uma produção norueguesa, "Mil Vezes Boa Noite" é falado totalmente em inglês. É possível perceber no filme o esmero estético - cada plano é uma verdadeira poesia visual, trazendo para o movimento a profundidade do still. Ao lado do seu diretor de fotografia, John Christian Rosenlund (de "A onda"), Pope equilibra perfeitamente o drama das situações em que a protagonista está inserida com a dor introspectiva dessas experiências. Veja, não serão poucas as vezes que você vai encontrar um plano aberto visualmente deslumbrante (como a de Rebecca sozinha em uma praia deserta a noite) e imediatamente depois um plano fechado onde os atores contracenam apenas com os olhares (como na cena do café da manhã após o retorno de Rebecca).
Pope, notadamente um especialista na construção de imagens, é também um exímio diretor de atores - o trabalho que ele faz ao lado de Binoche é lindo. As dores das decisões da personagem, bem como o conflito interno sobre o amor que sente pela família, mas que não a completa por inteiro, é desenvolvido com camadas tão sensíveis que chega a mexer com nossa percepção de "certo" e "errado" - sim, você vai julga-la muitas vezes. Tanto Coster-Waldau quanto Canny também merecem destaque - a química entre eles três é algo de se elogiar incansavelmente, tanto que todos foram indicados ou ganharam prêmios em festivais pelo mundo graças a esses personagens.
"Mil Vezes Boa Noite" só escorrega em institucionalizar alguns discursos levemente didáticos para explicar os males do mundo - mesmo que muito faça sentido, o texto soa falso. Porém se existe um trunfo que Pope sabe mesmo desenvolver e aproveitar como poucos, eu diria que é o silêncio - as cenas falam por si só, mesmo que com o auxilio do desenho de som ou uma trilha sonora fantástica que pontuam esse silêncio, visualmente o filme é maravilhoso e muito sensorial. Poppe é um craque, ele acredita no que filma e justamente por isso não tem como não mergulharmos na sua proposta.
Grande filme, cadenciado, profundo, sensível, mas imperdível para quem gosta de dramas existenciais!
Toda escolha gera uma consequência, isso é um fato e faz parte do ciclo da vida, porém são os reflexos dessas consequências que muitas vezes não podemos prever ou controlar - e é justamente seguindo esse conceito narrativo que o talentoso diretor norueguês Erik Poppe (que depois veio a dirigir o imperdível "Utoya 22 de Julho") entrega mais um filme visceral sobre as dores do terrorismo e o impacto dessas experiências nos relacionamentos de quem viveu o drama de perto . O fato é que "Mil Vezes Boa Noite" é aquele tipo de filme autoral, belíssimo visualmente, quase poético, e extremamente profundo que merece ser aplaudido de pé!
Rebecca (Juliette Binoche) é uma das melhores fotógrafas de guerra em atividade e precisa enfrentar um turbilhão de emoções quando seu marido (Nikolaj Coster-Waldau) lhe dá um ultimato: ou o trabalho ou a família. Ele e a filha mais velha do casal, Stephanie (Lauryn Canny), não suportam mais sua rotina arriscada e exigem mudanças, mas ela, apesar de amar a família, tem verdadeira adoração pela profissão e pelos impactos que seu trabalho podem provocar na sociedade. Confira o trailer:
Pope é um ex-fotografo de guerra, talvez por isso ele tenha escolhido falar sobre o tema para iniciar sua carreira internacional - mesmo sendo uma produção norueguesa, "Mil Vezes Boa Noite" é falado totalmente em inglês. É possível perceber no filme o esmero estético - cada plano é uma verdadeira poesia visual, trazendo para o movimento a profundidade do still. Ao lado do seu diretor de fotografia, John Christian Rosenlund (de "A onda"), Pope equilibra perfeitamente o drama das situações em que a protagonista está inserida com a dor introspectiva dessas experiências. Veja, não serão poucas as vezes que você vai encontrar um plano aberto visualmente deslumbrante (como a de Rebecca sozinha em uma praia deserta a noite) e imediatamente depois um plano fechado onde os atores contracenam apenas com os olhares (como na cena do café da manhã após o retorno de Rebecca).
Pope, notadamente um especialista na construção de imagens, é também um exímio diretor de atores - o trabalho que ele faz ao lado de Binoche é lindo. As dores das decisões da personagem, bem como o conflito interno sobre o amor que sente pela família, mas que não a completa por inteiro, é desenvolvido com camadas tão sensíveis que chega a mexer com nossa percepção de "certo" e "errado" - sim, você vai julga-la muitas vezes. Tanto Coster-Waldau quanto Canny também merecem destaque - a química entre eles três é algo de se elogiar incansavelmente, tanto que todos foram indicados ou ganharam prêmios em festivais pelo mundo graças a esses personagens.
"Mil Vezes Boa Noite" só escorrega em institucionalizar alguns discursos levemente didáticos para explicar os males do mundo - mesmo que muito faça sentido, o texto soa falso. Porém se existe um trunfo que Pope sabe mesmo desenvolver e aproveitar como poucos, eu diria que é o silêncio - as cenas falam por si só, mesmo que com o auxilio do desenho de som ou uma trilha sonora fantástica que pontuam esse silêncio, visualmente o filme é maravilhoso e muito sensorial. Poppe é um craque, ele acredita no que filma e justamente por isso não tem como não mergulharmos na sua proposta.
Grande filme, cadenciado, profundo, sensível, mas imperdível para quem gosta de dramas existenciais!