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Yesterday

Certamente se você for um fã dos Beatles, a chance de identificação com "Yesterday" será maior, porém é preciso dizer que o filme vai além das referências e citações sobre quarteto de Liverpool. "Yesterday" é uma comédia romântica bem ao estilo "Notting Hill" - que aliás foi produzido pela mesma "Working Title": um amor impossível entre uma estrela e uma pessoa normal, uma mudança de perspectiva de vida da noite para o dia, um personagem sem noção para servir de alívio cômico e, claro, uma mensagem do tipo: não importa o que você tenha ou quem você é, a felicidade está nas pequenas coisas e, normalmente, está dentro de você!

Pois bem, com essa receita o também roteirista de "Notting Hill", Richard Curtis, nos apresenta a história de Jack Malik (Himesh Patel) um descendente de indianos, cantor e compositor frustrado que após um evento inexplicável (e vai continuar assim mesmo depois que o filme acabar) parece ser a única pessoa do planeta que conheceu os Beatles. Sim, é justamente esse elemento de fantasia que transforma a vida de Malik em um dos maiores astros da música moderna assim que ele resolve se apropriar da discografia dos Beatles como se fosse sua criação. Confira o trailer:

Parece um sonho, mas a fama cobra um preço e é esse o conflito do filme: Malik precisa lidar com a insegurança de uma mentira e o receio de um dia ser descoberto, além de sofrer com o afastamento das pessoas que realmente se importavam com ele, inclusive do seu grande amor Ellie (Lily James). "Yesterday" é dirigida pelo excelente Danny Boyle (Quem quer ser um Milionário?) e é finalista de um dos prêmios mais respeitados do cinema mundial: o espanhol Goya; porém, meu amigo, não passa de um filme bem água com açúcar, mas que é uma delicia de assistir.

Vamos lá, o que tem de muito bom no filme e que pode ter credenciado para os prêmios que ganhou? Simples, a inteligente e divertida descoberta da obra do Beatles pelos olhos (e ouvidos) de quem nunca os conheceram. Elementos que construíram o storytelling por trás da maior banda de todos os tempos é facilmente encontrado no roteiro de Curtis - dos nomes dos álbuns aos lugares que os astros frequentavam ou até as pessoas e movimentos que, de alguma forma, serviram de inspiração para algumas de suas músicas; é quase uma declaração de amor! Aqui eu destaco a participação de Ed Sheeran como ele mesmo no filme - em um determinado momento ele aconselha Malik a mudar a letra de "Hey Jude" para "Hey Dude" ou quando Malik vai até Liverpool para se "inspirar" e continuar escrevendo as músicas que ele não se recorda muito bem as letras! É bem divertido.

O que eu não gostei muito? A história de amor entre Malik e Ellie Appleton - não que não seja fofo ou que não exista química entre os atores, não é isso; mas, na minha opinião, a trama sobre a apropriação da obra dos Beatles e a forma como o Mundo recebe essa novidade é tão forte que acaba colocando de lado o romance entre os protagonistas - situação que não aconteceu em "Notting Hill" por exemplo. Aproveitando o gancho, até o "amigo sem noção" perde seu propósito por ser o elemento que humaniza essa relação - algo que Rhys Ifans fez tão bem com seu Spike e que Joel Fry tenta bravamente com o Rocky. Não sei, me deu a impressão que essas tramas paralelas se enfraqueceram com a originalidade do arco principal! Tá ok, e o evento que faz com que algumas marcas, pessoas e histórias simplesmente desapareçam do planeta? É só o elemento fantástico que dá liga ao filme e que passa despercebido pela história - e me parece propositalmente! O que eu quero dizer é que você só precisa embarcar na idéia, pois saber os motivos ou o que realmente aconteceu não vai mudar nada daquilo que o filme quer contar!

Ter Danny Boyle como diretor chega a surpreender, pois não é seu tipo de filme e o que vemos na tela não justifica seu talento. Claro que o filme é bem dirigido, que os atores estão bem (embora alguns estereotipados demais como a agente Debra Hammer, Kate McKinnon), mas seu estilo não está impresso! Se o filme tivesse sido dirigido pelo agora cultuado Todd Phillips talvez o resultado fosse exatamente o mesmo! A produção está excelente para um filme que custou apenas $26,000,000 e faturou cerca de $151,286,650 - um verdadeiro sucesso. A trilha sonora, como não poderia deixar de ser, é sensacional e a forma como ela pontua a história não deixa nenhum filme biografia recente se sobressair demais!

"Yesterday" é uma excelente opção de entretenimento, leve, bacana de assistir e sem a preocupação de parecer mais do que realmente entrega! Eu gostei e mesmo com uma história românica sem tanto brilho, o todo transforma a jornada em algo positivo, além do nostálgico! Vale muito a pena!

Assista Agora

Certamente se você for um fã dos Beatles, a chance de identificação com "Yesterday" será maior, porém é preciso dizer que o filme vai além das referências e citações sobre quarteto de Liverpool. "Yesterday" é uma comédia romântica bem ao estilo "Notting Hill" - que aliás foi produzido pela mesma "Working Title": um amor impossível entre uma estrela e uma pessoa normal, uma mudança de perspectiva de vida da noite para o dia, um personagem sem noção para servir de alívio cômico e, claro, uma mensagem do tipo: não importa o que você tenha ou quem você é, a felicidade está nas pequenas coisas e, normalmente, está dentro de você!

Pois bem, com essa receita o também roteirista de "Notting Hill", Richard Curtis, nos apresenta a história de Jack Malik (Himesh Patel) um descendente de indianos, cantor e compositor frustrado que após um evento inexplicável (e vai continuar assim mesmo depois que o filme acabar) parece ser a única pessoa do planeta que conheceu os Beatles. Sim, é justamente esse elemento de fantasia que transforma a vida de Malik em um dos maiores astros da música moderna assim que ele resolve se apropriar da discografia dos Beatles como se fosse sua criação. Confira o trailer:

Parece um sonho, mas a fama cobra um preço e é esse o conflito do filme: Malik precisa lidar com a insegurança de uma mentira e o receio de um dia ser descoberto, além de sofrer com o afastamento das pessoas que realmente se importavam com ele, inclusive do seu grande amor Ellie (Lily James). "Yesterday" é dirigida pelo excelente Danny Boyle (Quem quer ser um Milionário?) e é finalista de um dos prêmios mais respeitados do cinema mundial: o espanhol Goya; porém, meu amigo, não passa de um filme bem água com açúcar, mas que é uma delicia de assistir.

Vamos lá, o que tem de muito bom no filme e que pode ter credenciado para os prêmios que ganhou? Simples, a inteligente e divertida descoberta da obra do Beatles pelos olhos (e ouvidos) de quem nunca os conheceram. Elementos que construíram o storytelling por trás da maior banda de todos os tempos é facilmente encontrado no roteiro de Curtis - dos nomes dos álbuns aos lugares que os astros frequentavam ou até as pessoas e movimentos que, de alguma forma, serviram de inspiração para algumas de suas músicas; é quase uma declaração de amor! Aqui eu destaco a participação de Ed Sheeran como ele mesmo no filme - em um determinado momento ele aconselha Malik a mudar a letra de "Hey Jude" para "Hey Dude" ou quando Malik vai até Liverpool para se "inspirar" e continuar escrevendo as músicas que ele não se recorda muito bem as letras! É bem divertido.

O que eu não gostei muito? A história de amor entre Malik e Ellie Appleton - não que não seja fofo ou que não exista química entre os atores, não é isso; mas, na minha opinião, a trama sobre a apropriação da obra dos Beatles e a forma como o Mundo recebe essa novidade é tão forte que acaba colocando de lado o romance entre os protagonistas - situação que não aconteceu em "Notting Hill" por exemplo. Aproveitando o gancho, até o "amigo sem noção" perde seu propósito por ser o elemento que humaniza essa relação - algo que Rhys Ifans fez tão bem com seu Spike e que Joel Fry tenta bravamente com o Rocky. Não sei, me deu a impressão que essas tramas paralelas se enfraqueceram com a originalidade do arco principal! Tá ok, e o evento que faz com que algumas marcas, pessoas e histórias simplesmente desapareçam do planeta? É só o elemento fantástico que dá liga ao filme e que passa despercebido pela história - e me parece propositalmente! O que eu quero dizer é que você só precisa embarcar na idéia, pois saber os motivos ou o que realmente aconteceu não vai mudar nada daquilo que o filme quer contar!

Ter Danny Boyle como diretor chega a surpreender, pois não é seu tipo de filme e o que vemos na tela não justifica seu talento. Claro que o filme é bem dirigido, que os atores estão bem (embora alguns estereotipados demais como a agente Debra Hammer, Kate McKinnon), mas seu estilo não está impresso! Se o filme tivesse sido dirigido pelo agora cultuado Todd Phillips talvez o resultado fosse exatamente o mesmo! A produção está excelente para um filme que custou apenas $26,000,000 e faturou cerca de $151,286,650 - um verdadeiro sucesso. A trilha sonora, como não poderia deixar de ser, é sensacional e a forma como ela pontua a história não deixa nenhum filme biografia recente se sobressair demais!

"Yesterday" é uma excelente opção de entretenimento, leve, bacana de assistir e sem a preocupação de parecer mais do que realmente entrega! Eu gostei e mesmo com uma história românica sem tanto brilho, o todo transforma a jornada em algo positivo, além do nostálgico! Vale muito a pena!

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Zola

"Zola" é o típico filme que desde a primeira cena já entendemos que "vai dar ruim" - mais ou menos como a sensação de assistir "Victória"! Porém o que envolve sua premissa é o fato de que essa história é inteiramente baseada em uma sequência de 150 tweets, onde A’Ziah King conta uma experiência maluca que de fato aconteceu com ela. O filme estreou no Festival de Sundance em 2020 e recebeu, em sua maioria, críticas muito positivas o credenciando para um contrato de distribuição internacional pela HBO.

A história é relativamente simples, pois narra um período de 48 horas em que duas mulheres que se tornam amigas por acaso, Zola (Taylour Paige) e Stefani (Riley Keough), partem para uma viagem para se apresentar em casas noturnas de Tampa, na Flórida, mas acabam envolvidas no perigoso submundo da prostituição. Confira o trailer (em inglês):

Produzida pela A24 e muito fiel a um cenário pesado da noite americana, a diretora Janicza Bravo (de "Lemon") impõe uma identidade muito particular para sua narrativa, trazendo elementos quase experimentais, mas que a ajudam a criar um mood perfeito para essa jornada. Com cortes rapidíssimos, e aqui o filme merece muito destaque já que a montadora Joi McMillon (indicada ao Oscar por "Moonlight") foi muito premiada por esse trabalho; e muitos planos captados pelas câmeras de celular das próprias atrizes, Bravo cria uma dinâmica angustiante nos dando a impressão que a noite nunca vai acabar. Um detalhe interessante merece sua atenção: todos os personagens ao redor de Zola parecem estar sempre alucinados, porém em nenhum momento assistimos algum consumo de drogas durante o filme.

Visualmente o filme usa e abusa do neon e das cores marcantes que encontramos na Flórida, mesmo quando o cenário transita do luxo para o lixo (e vice-versa). O fato de ter sido filmado em 16 mm, também ajuda na percepção granulada e vintage da composição estética. Algumas referências vindas do "estilo Scorsese" de construir sua linha narrativa ficam claras - do ritmo frenético das ações à protagonista narrando sua história com freeze frames e um rock anos 50 de fundo. Mas tudo funciona. Tanto Taylour Paige quanto Riley Keough entregam ótimas (mas propositalmente diferentes) performances, porém é impossível não destacar o trabalho de Nicholas Braun (o eterno Greg de Succession).

"Zola" vai agradar mais aqueles que se conectam com produções independentes e circulam pelos festivais de cinema com muita propriedade. O fato da história ser real ajuda na nossa imersão pela história e nos faz torcer pela protagonista, porém uma coisa é fato: em nada o filme se aproxima da gramática convencional dos roteiros de cinema, ou seja. você vai assistir uma história que parece estar sendo cobrada por alguém ou lida em uma curiosa sequência de tweets.

Vale a pena!

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"Zola" é o típico filme que desde a primeira cena já entendemos que "vai dar ruim" - mais ou menos como a sensação de assistir "Victória"! Porém o que envolve sua premissa é o fato de que essa história é inteiramente baseada em uma sequência de 150 tweets, onde A’Ziah King conta uma experiência maluca que de fato aconteceu com ela. O filme estreou no Festival de Sundance em 2020 e recebeu, em sua maioria, críticas muito positivas o credenciando para um contrato de distribuição internacional pela HBO.

A história é relativamente simples, pois narra um período de 48 horas em que duas mulheres que se tornam amigas por acaso, Zola (Taylour Paige) e Stefani (Riley Keough), partem para uma viagem para se apresentar em casas noturnas de Tampa, na Flórida, mas acabam envolvidas no perigoso submundo da prostituição. Confira o trailer (em inglês):

Produzida pela A24 e muito fiel a um cenário pesado da noite americana, a diretora Janicza Bravo (de "Lemon") impõe uma identidade muito particular para sua narrativa, trazendo elementos quase experimentais, mas que a ajudam a criar um mood perfeito para essa jornada. Com cortes rapidíssimos, e aqui o filme merece muito destaque já que a montadora Joi McMillon (indicada ao Oscar por "Moonlight") foi muito premiada por esse trabalho; e muitos planos captados pelas câmeras de celular das próprias atrizes, Bravo cria uma dinâmica angustiante nos dando a impressão que a noite nunca vai acabar. Um detalhe interessante merece sua atenção: todos os personagens ao redor de Zola parecem estar sempre alucinados, porém em nenhum momento assistimos algum consumo de drogas durante o filme.

Visualmente o filme usa e abusa do neon e das cores marcantes que encontramos na Flórida, mesmo quando o cenário transita do luxo para o lixo (e vice-versa). O fato de ter sido filmado em 16 mm, também ajuda na percepção granulada e vintage da composição estética. Algumas referências vindas do "estilo Scorsese" de construir sua linha narrativa ficam claras - do ritmo frenético das ações à protagonista narrando sua história com freeze frames e um rock anos 50 de fundo. Mas tudo funciona. Tanto Taylour Paige quanto Riley Keough entregam ótimas (mas propositalmente diferentes) performances, porém é impossível não destacar o trabalho de Nicholas Braun (o eterno Greg de Succession).

"Zola" vai agradar mais aqueles que se conectam com produções independentes e circulam pelos festivais de cinema com muita propriedade. O fato da história ser real ajuda na nossa imersão pela história e nos faz torcer pela protagonista, porém uma coisa é fato: em nada o filme se aproxima da gramática convencional dos roteiros de cinema, ou seja. você vai assistir uma história que parece estar sendo cobrada por alguém ou lida em uma curiosa sequência de tweets.

Vale a pena!

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Zona de Confronto

Você vai se surpreender com esse filme! Essa produção dinamarquesa, muito premiada em festivais por todo mundo em 2020, têm muitos méritos e talvez o maior deles seja justamente o de trabalhar a dualidade do ser humano de acordo com o meio (ou condições) em que ele está inserido. Não serão poucas as vezes que você vai se perguntar quem é o "mocinho" e quem é o "bandido" - essa dinâmica se encaixa perfeitamente ao conceito narrativo que os diretores Frederik Louis Hviid e Anders Olholm imprimem na história e acredite: ele vai mexer com suas mais diversas emoções!

Quando um jovem árabe é gravemente ferido por oficiais durante uma operação, toda a comunidade de Svalegarden fica indignada e passa a clamar por justiça. A polícia, preocupada com uma possível insurreição na cidade, aumenta o número de viaturas nas ruas para manter a ordem. Até que os policiais Jens (Simons Sears) e Mike (Jacob Hauberg Lohmann) acabam encurralados durante a patrulha, já que a violência escala após a revelação de novas e chocantes informações sobre a ação do dia anterior. Presos dentro da comunidade para um acerto de contas e envolvidos em uma guerra sócio-cultural, os dois precisam encontrar uma forma de sair daquele ambiente e permanecerem vivos. Confira o trailer (com legendas em inglês):

Antes de qualquer coisa, é preciso alinhar as expectativas: embora "Shorta" (no original)  tenha vários elementos que nos direcionem para um ótimo thriller de ação policial (o que de fato existe na trama), o tom independente e autoral do filme também se faz igualmente presente. Em muitos momentos percebemos que a narrativa se torna mais cadenciada, focada nos dramas internos dos personagens e nas relações entre os pares que o roteiro apenas sugere, nos provocando a imaginar "como" e "por quê" aquela determinada tensão vai ganhando uma forma e uma dramaticidade quase insuportáveis.

O filme é de fato muito competente em mostrar os pontos de vista de todos os envolvidos - e o elenco (muito talentoso) ajuda demais nessa construção. A revolta dos imigrantes faz sentido por um lado, uma vez que são tratados pela sociedade como uma espécie de subcategoria de seres humanos, e frequentemente são brutalizados e vistos como marginais ao mesmo tempo, por outro lado, a polícia também tem seus fantasmas para lidar já que está sempre sob uma enorme pressão - o filme humaniza essas situações pelo olhar da "lei" através de Mike e Jens, respectivamente. Aliás, é essa dualidade que nos conecta imediatamente ao caso do norte-americano George Floyd e a onda de protestos do Black Lives Matter nos EUA, porém o roteiro foi mesmo baseado em um caso que aconteceu na Dinamarca em 1992.

Com um estilo parecido ao do Antoine Fuqua de "Dia de Treinamento" e até mesmo do brasileiro José Padilha de "Tropa de Elite", Hviid e Olholm entregam um filme dinâmico, profundo e corajoso, que além de te deixar tenso durante toda jornada, ainda vai te provocar uma série de reflexões - e aqui eu cito uma passagem importante de "Zona de Confronto" quando a mãe de um imigrante diz: “se você sempre é tratado como algo que não é, eventualmente você acaba acreditando que é”! Seja qual for sua percepção sobre o texto, eu te garanto que além do entretenimento, você terá muito o que discutir após os créditos - mas não espere por respostas fáceis!

Vale seu play!

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Você vai se surpreender com esse filme! Essa produção dinamarquesa, muito premiada em festivais por todo mundo em 2020, têm muitos méritos e talvez o maior deles seja justamente o de trabalhar a dualidade do ser humano de acordo com o meio (ou condições) em que ele está inserido. Não serão poucas as vezes que você vai se perguntar quem é o "mocinho" e quem é o "bandido" - essa dinâmica se encaixa perfeitamente ao conceito narrativo que os diretores Frederik Louis Hviid e Anders Olholm imprimem na história e acredite: ele vai mexer com suas mais diversas emoções!

Quando um jovem árabe é gravemente ferido por oficiais durante uma operação, toda a comunidade de Svalegarden fica indignada e passa a clamar por justiça. A polícia, preocupada com uma possível insurreição na cidade, aumenta o número de viaturas nas ruas para manter a ordem. Até que os policiais Jens (Simons Sears) e Mike (Jacob Hauberg Lohmann) acabam encurralados durante a patrulha, já que a violência escala após a revelação de novas e chocantes informações sobre a ação do dia anterior. Presos dentro da comunidade para um acerto de contas e envolvidos em uma guerra sócio-cultural, os dois precisam encontrar uma forma de sair daquele ambiente e permanecerem vivos. Confira o trailer (com legendas em inglês):

Antes de qualquer coisa, é preciso alinhar as expectativas: embora "Shorta" (no original)  tenha vários elementos que nos direcionem para um ótimo thriller de ação policial (o que de fato existe na trama), o tom independente e autoral do filme também se faz igualmente presente. Em muitos momentos percebemos que a narrativa se torna mais cadenciada, focada nos dramas internos dos personagens e nas relações entre os pares que o roteiro apenas sugere, nos provocando a imaginar "como" e "por quê" aquela determinada tensão vai ganhando uma forma e uma dramaticidade quase insuportáveis.

O filme é de fato muito competente em mostrar os pontos de vista de todos os envolvidos - e o elenco (muito talentoso) ajuda demais nessa construção. A revolta dos imigrantes faz sentido por um lado, uma vez que são tratados pela sociedade como uma espécie de subcategoria de seres humanos, e frequentemente são brutalizados e vistos como marginais ao mesmo tempo, por outro lado, a polícia também tem seus fantasmas para lidar já que está sempre sob uma enorme pressão - o filme humaniza essas situações pelo olhar da "lei" através de Mike e Jens, respectivamente. Aliás, é essa dualidade que nos conecta imediatamente ao caso do norte-americano George Floyd e a onda de protestos do Black Lives Matter nos EUA, porém o roteiro foi mesmo baseado em um caso que aconteceu na Dinamarca em 1992.

Com um estilo parecido ao do Antoine Fuqua de "Dia de Treinamento" e até mesmo do brasileiro José Padilha de "Tropa de Elite", Hviid e Olholm entregam um filme dinâmico, profundo e corajoso, que além de te deixar tenso durante toda jornada, ainda vai te provocar uma série de reflexões - e aqui eu cito uma passagem importante de "Zona de Confronto" quando a mãe de um imigrante diz: “se você sempre é tratado como algo que não é, eventualmente você acaba acreditando que é”! Seja qual for sua percepção sobre o texto, eu te garanto que além do entretenimento, você terá muito o que discutir após os créditos - mas não espere por respostas fáceis!

Vale seu play!

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Zona de Interesse

Mais do que um soco no estômago (o que de fato, é), "Zona de Interesse" é um verdadeiro tapa na cara da audiência quando, respeitando a potência e a importância da história que está sendo contata, criamos uma certa analogia com o mundo que vivemos hoje - especialmente se olharmos pelo prisma das diferenças sociais tão latentes e que cada vez vem ganhando mais espaço e profundidade pelas mãos do cinema independente (basta olharmos para o sucesso de "Parasita", por exemplo). Pois bem, o filme do diretor Jonathan Glazer nem de longe será uma unanimidade e certamente deve afastar aqueles que buscam respostas claras em uma narrativa. Aqui temos uma experiência cinematográfica visceral e perturbadora, mas muito mais pelo que é sugerido do que pelo que é mostrado - não por acaso que o filme surpreendeu no Oscar 2024 ao levar o prêmio de Melhor Desenho de Som. Aclamado pela crítica e vencedor do prêmio FIPRESCI no Festival de Cannes, além do Oscar de Melhor Filme Internacional, "Zona de Interesse" nos leva a um olhar instigante sobre a banalidade do egoísmo e da relação humana perante o desconfortável.

Na trama acompanhamos o comandante Rudolf Höss (Christian Friedel) e sua esposa Hedwig (Sandra Hüller) enquanto constroem uma vida familiar bucólica em uma casa de luxo exatamente ao lado do campo de concentração de Auschwitz. A rotina doméstica, com seus afazeres banais e conversas triviais, contrasta brutalmente com os horrores que se desenrolam a poucos metros de distância - não raramente simbolizado pelos sons de tiros, gritos e até de um potente incinerador noturno. Essa justaposição cria um efeito tão desconcertante que temos a exata noção do que é morar ao lado do inferno sem ter que olhar para ele. Confira o trailer e sinta o clima:

"Zona de Interesse" não é um filme fácil de assistir - em sua forma e em seu conteúdo. Através de sua abordagem original e corajosa, o filme nos convida a confrontar os horrores do passado e a refletir sobre as raízes do mal, tanto na sociedade quanto no indivíduo - existe um tom de urgência em sua proposta conceitual que sem a menor dúvida coloca o filme naquela prateleira de obra tão necessária quanto importante.Glazer, que basicamente construiu sua carreira dirigindo videos musicais de bandas consagradas como "Massive Attack"e "Radiohead", utiliza uma série de recursos técnicos e estéticos para criar e desenvolver a atmosfera extremamente claustrofóbica e opressora de Auschwitz com o cuidado de não expor visualmente nenhum de seus horrores. Aqui o foco não é o horror em si, mas a percepção dele pelo olhar de quem não quer enfrentá-lo por estar em uma posição mais confortável socialmente.

A fotografia do grande Lukasz Zal (indicado ao Oscar por "Guerra Fria" e pelo fabuloso "Ida") se apropria de enquadramentos rigorosos para criar uma abismo estético entre o real e o fantasioso. Se de um lado do muro as cores brotam do chão a partir da delicadeza das flores em um encontro simbólico entre a paz, a segurança e a tranquilidade; do outro o que vemos é o frio e o monocromático dos tons de cinza e marrom. Reparem como essa experiência visual nos lembra o contraste tão marcante de "Florida Project". A direção precisa de Glazer (uma das melhores do ano) sabe nos provocar de uma maneira muito sensorial, nos jogando por uma jornada perturbadora, sem jamais cair na exploração gratuita da violência ou no sentimentalismo - e é com o apoio da trilha sonora minimalista e de um premiado desenho de som, que temos uma mixagem/aula sobre criação de desconforto e de angústia constantes.

"Zona de Interesse" é mesmo um filme imperdível, mas sua identidade mais independente tende a dividir opiniões. Sem perder aquele natural incômodo de um ritmo super cadenciado, Glazer parece não querer questionar os motivos das crueldades que acontecem do "outro lado do muro" ou até mesmo as motivações dos Höss em se fazerem de surdos em troca de uma vida pautada pela comodidade - e aqui é muito interessante reparar como os personagens secundários lidam com essa mesma condição, mas com propósitos diametralmente opostos. Ainda que o filme pareça trazer para os holofotes toda a crueldade nazista, seu objetivo mesmo é pontuar como o comportamento humano se adapta àquela zona de conforto (ou de interesse) sem muito questionar o status quo.

Imperdível em vários sentidos!

Assista Agora

Mais do que um soco no estômago (o que de fato, é), "Zona de Interesse" é um verdadeiro tapa na cara da audiência quando, respeitando a potência e a importância da história que está sendo contata, criamos uma certa analogia com o mundo que vivemos hoje - especialmente se olharmos pelo prisma das diferenças sociais tão latentes e que cada vez vem ganhando mais espaço e profundidade pelas mãos do cinema independente (basta olharmos para o sucesso de "Parasita", por exemplo). Pois bem, o filme do diretor Jonathan Glazer nem de longe será uma unanimidade e certamente deve afastar aqueles que buscam respostas claras em uma narrativa. Aqui temos uma experiência cinematográfica visceral e perturbadora, mas muito mais pelo que é sugerido do que pelo que é mostrado - não por acaso que o filme surpreendeu no Oscar 2024 ao levar o prêmio de Melhor Desenho de Som. Aclamado pela crítica e vencedor do prêmio FIPRESCI no Festival de Cannes, além do Oscar de Melhor Filme Internacional, "Zona de Interesse" nos leva a um olhar instigante sobre a banalidade do egoísmo e da relação humana perante o desconfortável.

Na trama acompanhamos o comandante Rudolf Höss (Christian Friedel) e sua esposa Hedwig (Sandra Hüller) enquanto constroem uma vida familiar bucólica em uma casa de luxo exatamente ao lado do campo de concentração de Auschwitz. A rotina doméstica, com seus afazeres banais e conversas triviais, contrasta brutalmente com os horrores que se desenrolam a poucos metros de distância - não raramente simbolizado pelos sons de tiros, gritos e até de um potente incinerador noturno. Essa justaposição cria um efeito tão desconcertante que temos a exata noção do que é morar ao lado do inferno sem ter que olhar para ele. Confira o trailer e sinta o clima:

"Zona de Interesse" não é um filme fácil de assistir - em sua forma e em seu conteúdo. Através de sua abordagem original e corajosa, o filme nos convida a confrontar os horrores do passado e a refletir sobre as raízes do mal, tanto na sociedade quanto no indivíduo - existe um tom de urgência em sua proposta conceitual que sem a menor dúvida coloca o filme naquela prateleira de obra tão necessária quanto importante.Glazer, que basicamente construiu sua carreira dirigindo videos musicais de bandas consagradas como "Massive Attack"e "Radiohead", utiliza uma série de recursos técnicos e estéticos para criar e desenvolver a atmosfera extremamente claustrofóbica e opressora de Auschwitz com o cuidado de não expor visualmente nenhum de seus horrores. Aqui o foco não é o horror em si, mas a percepção dele pelo olhar de quem não quer enfrentá-lo por estar em uma posição mais confortável socialmente.

A fotografia do grande Lukasz Zal (indicado ao Oscar por "Guerra Fria" e pelo fabuloso "Ida") se apropria de enquadramentos rigorosos para criar uma abismo estético entre o real e o fantasioso. Se de um lado do muro as cores brotam do chão a partir da delicadeza das flores em um encontro simbólico entre a paz, a segurança e a tranquilidade; do outro o que vemos é o frio e o monocromático dos tons de cinza e marrom. Reparem como essa experiência visual nos lembra o contraste tão marcante de "Florida Project". A direção precisa de Glazer (uma das melhores do ano) sabe nos provocar de uma maneira muito sensorial, nos jogando por uma jornada perturbadora, sem jamais cair na exploração gratuita da violência ou no sentimentalismo - e é com o apoio da trilha sonora minimalista e de um premiado desenho de som, que temos uma mixagem/aula sobre criação de desconforto e de angústia constantes.

"Zona de Interesse" é mesmo um filme imperdível, mas sua identidade mais independente tende a dividir opiniões. Sem perder aquele natural incômodo de um ritmo super cadenciado, Glazer parece não querer questionar os motivos das crueldades que acontecem do "outro lado do muro" ou até mesmo as motivações dos Höss em se fazerem de surdos em troca de uma vida pautada pela comodidade - e aqui é muito interessante reparar como os personagens secundários lidam com essa mesma condição, mas com propósitos diametralmente opostos. Ainda que o filme pareça trazer para os holofotes toda a crueldade nazista, seu objetivo mesmo é pontuar como o comportamento humano se adapta àquela zona de conforto (ou de interesse) sem muito questionar o status quo.

Imperdível em vários sentidos!

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