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Todo dia a mesma noite

"Todo dia a mesma noite" é excelente, porém é preciso um certo alerta para os pais e mães que estão lendo essa análise: a jornada será especialmente difícil, já que é impossível não gerar empatia por aqueles personagens e pelo momento que eles estão passando. A minissérie da Netflix que revive os acontecimentos da Boate Kiss em Santa Maria não é, necessariamente, sobre a noite da tragédia e sim sobre os reflexos na vida de quem sobreviveu e, principalmente, é sobre a luta por justiça daqueles que perderam seus filhos de uma forma tão absurda quanto brutal. Olha, a dor será quase insuportável!

Baseada no livro homônimo da jornalista e escritora Daniela Arbex, "Todo dia a mesma noite" relembra aquela noite de janeiro de 2013 onde 242 jovens perderam a vida na Boate Kiss e todas as noites que se repetiram para os sobreviventes e familiares até hoje. A partir dos trágicos acontecimentos, acompanhamos toda luta por justiça, liderada pelos pais das vítimas, para que algo parecido nunca mais se voltasse acontecer. Confira o trailer:

Existe uma certa economia narrativa (muito inteligente, aliás) ao reconstruir a linha do tempo da tragédia. Os cinco episódios, são mais do que necessários e tirando uma ou outra passagem, tem uma dinâmica extremamente eficaz que praticamente nos impede de parar de assistir enquanto o final não chega. A história é cruel, mas a forma como o roteirista Gustavo Lipsztein (de "1 Contra Todos") e a diretora geral Julia Rezende (de "De Pernas pro Ar 3") nos conduzem pela jornada, acaba provocando um efeito de solidariedade, uma identificação imediata, que mesmo naquele enorme desconforto, nos mantém envolvidos em um lugar bem particular entre a tristeza pelas vítimas e a indignação pela impunidade.

A produção é de altíssimo nível - tanto Julia quanto a co-diretora Carol Minêm (de "O Rei da TV") são extremamente competentes em usar uma certa limitação cênica à favor da narrativa. Veja, em nenhum momento a minissérie transforma o terror do interior da boate em algo que pudesse gerar muito impacto visual - assim que o incêndio começa, o foco se afasta dos personagens e passa a retratar a escuridão e o pânico em si. Rapidamente se estabelece o caos, de dentro para fora, mas nunca pautado no detalhe sórdido e descartável do sensacionalismo - esse equilíbrio é praticamente perfeito, porém alguns artifícios narrativos nos ferem demais: os celulares tocando em meio aos corpos cobertos após a noticia do incêndio começar a circular na pequena cidade e a sequência dos pais de um jovem procurando pelo carro no estacionamento e não pelo corpo do filho na rua, são ótimos e sensíveis exemplos desse cuidado com a verdade crua demais.

Paulo Gorgulho, Bianca Byington, Leonardo Medeiros, Debora Lamm e Thelmo Fernandes, mesmo derrapando no sotaque (pra que forçar algo que nunca funcionou?) e em algumas frases prontas, brilham na segunda metade da minissérie quando os holofotes passam a ser a luta por justiça e não a dor da perda de um filho. O desenho de produção que recriou o interior e o exterior da boate merece elogios e a fotografia do Dante Belluti (de "Todas as Mulheres do Mundo") está impecável no mesmo nível. Minha única crítica cai na necessidade de usar a trilha sonora como gatilho emocional quando a própria cena e o trabalho dos atores já dariam conta do recado - chega a irritar o fade in e fade out constante da música incidental!

"Todo dia a mesma noite" nos toca a alma ao mesmo tempo em que consegue mexer em uma ferida que vai além do sentimentalismo barato. A jornada é dura, densa, cruel, mas também é provocadora e importante para mostrar algo que todo mundo já sabe: o lixo que é nosso sistema judiciário e como os poderosos estão sempre protegidos. O fato é que "ninguém queria matar, mas matou" - e foram 242 jovens que, inclusive, poderiam ser filhos de qualquer um de nós!

Vale muito o seu play!

Assista Agora

"Todo dia a mesma noite" é excelente, porém é preciso um certo alerta para os pais e mães que estão lendo essa análise: a jornada será especialmente difícil, já que é impossível não gerar empatia por aqueles personagens e pelo momento que eles estão passando. A minissérie da Netflix que revive os acontecimentos da Boate Kiss em Santa Maria não é, necessariamente, sobre a noite da tragédia e sim sobre os reflexos na vida de quem sobreviveu e, principalmente, é sobre a luta por justiça daqueles que perderam seus filhos de uma forma tão absurda quanto brutal. Olha, a dor será quase insuportável!

Baseada no livro homônimo da jornalista e escritora Daniela Arbex, "Todo dia a mesma noite" relembra aquela noite de janeiro de 2013 onde 242 jovens perderam a vida na Boate Kiss e todas as noites que se repetiram para os sobreviventes e familiares até hoje. A partir dos trágicos acontecimentos, acompanhamos toda luta por justiça, liderada pelos pais das vítimas, para que algo parecido nunca mais se voltasse acontecer. Confira o trailer:

Existe uma certa economia narrativa (muito inteligente, aliás) ao reconstruir a linha do tempo da tragédia. Os cinco episódios, são mais do que necessários e tirando uma ou outra passagem, tem uma dinâmica extremamente eficaz que praticamente nos impede de parar de assistir enquanto o final não chega. A história é cruel, mas a forma como o roteirista Gustavo Lipsztein (de "1 Contra Todos") e a diretora geral Julia Rezende (de "De Pernas pro Ar 3") nos conduzem pela jornada, acaba provocando um efeito de solidariedade, uma identificação imediata, que mesmo naquele enorme desconforto, nos mantém envolvidos em um lugar bem particular entre a tristeza pelas vítimas e a indignação pela impunidade.

A produção é de altíssimo nível - tanto Julia quanto a co-diretora Carol Minêm (de "O Rei da TV") são extremamente competentes em usar uma certa limitação cênica à favor da narrativa. Veja, em nenhum momento a minissérie transforma o terror do interior da boate em algo que pudesse gerar muito impacto visual - assim que o incêndio começa, o foco se afasta dos personagens e passa a retratar a escuridão e o pânico em si. Rapidamente se estabelece o caos, de dentro para fora, mas nunca pautado no detalhe sórdido e descartável do sensacionalismo - esse equilíbrio é praticamente perfeito, porém alguns artifícios narrativos nos ferem demais: os celulares tocando em meio aos corpos cobertos após a noticia do incêndio começar a circular na pequena cidade e a sequência dos pais de um jovem procurando pelo carro no estacionamento e não pelo corpo do filho na rua, são ótimos e sensíveis exemplos desse cuidado com a verdade crua demais.

Paulo Gorgulho, Bianca Byington, Leonardo Medeiros, Debora Lamm e Thelmo Fernandes, mesmo derrapando no sotaque (pra que forçar algo que nunca funcionou?) e em algumas frases prontas, brilham na segunda metade da minissérie quando os holofotes passam a ser a luta por justiça e não a dor da perda de um filho. O desenho de produção que recriou o interior e o exterior da boate merece elogios e a fotografia do Dante Belluti (de "Todas as Mulheres do Mundo") está impecável no mesmo nível. Minha única crítica cai na necessidade de usar a trilha sonora como gatilho emocional quando a própria cena e o trabalho dos atores já dariam conta do recado - chega a irritar o fade in e fade out constante da música incidental!

"Todo dia a mesma noite" nos toca a alma ao mesmo tempo em que consegue mexer em uma ferida que vai além do sentimentalismo barato. A jornada é dura, densa, cruel, mas também é provocadora e importante para mostrar algo que todo mundo já sabe: o lixo que é nosso sistema judiciário e como os poderosos estão sempre protegidos. O fato é que "ninguém queria matar, mas matou" - e foram 242 jovens que, inclusive, poderiam ser filhos de qualquer um de nós!

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Todos já sabem

"Todos já sabem" é o primeiro filme do iraniano Asghar Farhadi fora do seu país. O filme é uma co-produção Espanha/França/Italia e nem por isso Farhadi precisou abrir mão do seu estilo e controle criativo em todo o processo. Mais uma vez ele escreve um roteiro com uma história bastante consistente e dirige o filme com a competência técnica e a segurança narrativa quase imperceptível que já virou sua marca. Sério, se você não conhece a filmografia do Asghar Farhadi, saiba que ele já ganhou um Oscar com "O Apartamento" (The Salesman) e outro com "A Separação", além da Palme d'Or (em Cannes) pelo seu "O Passado"!!! Ou seja, seus três últimos filmes ganharam quase todos os prêmios mais cobiçados do cinema mundial... Fraco o cara?

Em "Todos já sabem" ele coloca na tela uma ambientação muito particular, pois o filme se passa em um pequeno vilarejo próximo de Madrid, cidade natal de Laura (Penélope Cruz). Ela retorna, acompanhado dos seus filhos, para o casamento da sua irmã. Porém, durante a festa, sua filha mais velha desaparece em circunstâncias muito parecidas com um outro sequestro que marcou muito a região pelo seu fim trágico. O desaparecimento de Irene e sua investigação trás a tona uma série de segredos (ou não - por isso o nome do filme) e mágoas que só aumentaram com o passar dos anos. O mistério sobre o paradeiro de Irene é muito bem construído e como os personagens vão se envolvendo acaba criando uma sensação de superficialidade daquelas relações - é muito interessante pela particularidade das histórias mal resolvidas. É quase um arquétipo de uma família amargurada que vive apenas de aparências apoiada em um passado que não existe mais!!! Imaginem a força que isso ganha em uma cidade tão pequena onde todos se conhecem...  Me lembrou muito o clima que o Walter Salles criou em "Abril Despedaçado" e de como o "ressentimento" foi consumindo aqueles personagens de dentro para fora e tudo em sua volta foi embolorando!

Um dos pontos altos do filme é, sem dúvida, o elenco! É uma interpretação melhor que a outra, com destaque para Bárbara Lennie  (Bea) que dá um show pela sua capacidade de externar aqueles sentimentos tão silenciosos e de uma forma tão natural que chega a doer na gente! Obviamente que Ricardo Darín, Penélope Cruz, Javier Bardem e Eduard Fernández também estão voando, mas isso já era de se esperar!!! Um detalhe importante: Asghar Farhadi é um grande diretor de atores, todos os filmes dele estão apoiados em grandes atuações - reparem - o roteiro ajuda, mas os atores sempre estão no tom certo!!!! Bom, a fotografia do filme também merece um comentário: é um lindo trabalho do José Luis Alcaine, o mesmo de "A Pele que Habito" -  se atentem para as cenas da festa de casamento e de quando o personagem do Javier Bardem procura pela esposa em casa, já mais para o final do filme!

Eu já escrevi dois reviews de filmes do Farhadi aqui no Viu Review, então gostaria de destacar uma frase que usei para iniciar o texto de The Salesman: "Tem Diretor que te dá a certeza de um grande filme e o iraniano Asghar Farhadi, para mim, é um desses caras". Dito isso, eu te convido a conhecer o trabalho dele, um cineasta extremamente autoral, mas que vai te surpreender com filmes intensos, envolventes e inteligentes, com qualidade técnica e artística incontestáveis!

Dê essa chance que você não vai se arrepender.

Assista Agora

"Todos já sabem" é o primeiro filme do iraniano Asghar Farhadi fora do seu país. O filme é uma co-produção Espanha/França/Italia e nem por isso Farhadi precisou abrir mão do seu estilo e controle criativo em todo o processo. Mais uma vez ele escreve um roteiro com uma história bastante consistente e dirige o filme com a competência técnica e a segurança narrativa quase imperceptível que já virou sua marca. Sério, se você não conhece a filmografia do Asghar Farhadi, saiba que ele já ganhou um Oscar com "O Apartamento" (The Salesman) e outro com "A Separação", além da Palme d'Or (em Cannes) pelo seu "O Passado"!!! Ou seja, seus três últimos filmes ganharam quase todos os prêmios mais cobiçados do cinema mundial... Fraco o cara?

Em "Todos já sabem" ele coloca na tela uma ambientação muito particular, pois o filme se passa em um pequeno vilarejo próximo de Madrid, cidade natal de Laura (Penélope Cruz). Ela retorna, acompanhado dos seus filhos, para o casamento da sua irmã. Porém, durante a festa, sua filha mais velha desaparece em circunstâncias muito parecidas com um outro sequestro que marcou muito a região pelo seu fim trágico. O desaparecimento de Irene e sua investigação trás a tona uma série de segredos (ou não - por isso o nome do filme) e mágoas que só aumentaram com o passar dos anos. O mistério sobre o paradeiro de Irene é muito bem construído e como os personagens vão se envolvendo acaba criando uma sensação de superficialidade daquelas relações - é muito interessante pela particularidade das histórias mal resolvidas. É quase um arquétipo de uma família amargurada que vive apenas de aparências apoiada em um passado que não existe mais!!! Imaginem a força que isso ganha em uma cidade tão pequena onde todos se conhecem...  Me lembrou muito o clima que o Walter Salles criou em "Abril Despedaçado" e de como o "ressentimento" foi consumindo aqueles personagens de dentro para fora e tudo em sua volta foi embolorando!

Um dos pontos altos do filme é, sem dúvida, o elenco! É uma interpretação melhor que a outra, com destaque para Bárbara Lennie  (Bea) que dá um show pela sua capacidade de externar aqueles sentimentos tão silenciosos e de uma forma tão natural que chega a doer na gente! Obviamente que Ricardo Darín, Penélope Cruz, Javier Bardem e Eduard Fernández também estão voando, mas isso já era de se esperar!!! Um detalhe importante: Asghar Farhadi é um grande diretor de atores, todos os filmes dele estão apoiados em grandes atuações - reparem - o roteiro ajuda, mas os atores sempre estão no tom certo!!!! Bom, a fotografia do filme também merece um comentário: é um lindo trabalho do José Luis Alcaine, o mesmo de "A Pele que Habito" -  se atentem para as cenas da festa de casamento e de quando o personagem do Javier Bardem procura pela esposa em casa, já mais para o final do filme!

Eu já escrevi dois reviews de filmes do Farhadi aqui no Viu Review, então gostaria de destacar uma frase que usei para iniciar o texto de The Salesman: "Tem Diretor que te dá a certeza de um grande filme e o iraniano Asghar Farhadi, para mim, é um desses caras". Dito isso, eu te convido a conhecer o trabalho dele, um cineasta extremamente autoral, mas que vai te surpreender com filmes intensos, envolventes e inteligentes, com qualidade técnica e artística incontestáveis!

Dê essa chance que você não vai se arrepender.

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Tokyo Vice

Você não vai se apaixonar por "Tokyo Vice" imediatamente - será necessários pelo menos 3 ou 4 episódios para você desejar emendar um episódio no outro (e isso vai acontecer)! Basicamente, essa série da HBO Max é um drama policial com fortes elementos de jornalismo investigativo. Ambientado no submundo da Yakuza na Tóquio dos anos 90, a série criada por J.T. Rogers (de "Oslo"), captura como poucas a vibrante energia da capital japonesa, contrastando sua atmosfera histriônica com a brutalidade do crime organizado. Com uma narrativa até certo ponto cadenciada, mas naturalmente envolvente, atuações impecáveis e uma proposta de direção das mais interessantes, "Tokyo Vice" se destacou como uma das melhores séries de 2022, figurando, inclusive, em premiações como o Critics Choice Awards e o Gotham Independent Film Awards.

Jake Adelstein (Ansel Elgort) é um jovem jornalista americano obcecado pelo Japão que se muda para Tóquio em busca de uma oportunidade no prestigiado jornal Meicho Shimbun. Motivado por um idealismo ingênuo, ele logo se depara com a dura realidade do crime organizado, atraindo a atenção de Sato (Ken Watanabe), um detetive da divisão de homicídios que o guia pelas complexas teias da Yakuza. Confira o trailer:

Certamente o que vai mudar sua percepção sobre "Tokyo Vice" é o fato de se tratar de uma história real. Na verdade a série é inspirada no livro homônimo de memória de Adelstein, um jornalista judeu que realmente vivenciou as experiências retratadas na série. Naturalmente que não estamos falando de uma cópia página por página do livro, mas a essência dramática, acreditem, é a mesma. Observar um imigrante, natural do Meio-Oeste americano, vivendo em Tóquio e mergulhando na cultura nacionalista japonesa, é só uma das qualidades do roteiro de J.T. Roger. É impressionante como ele sabe aproveitar dessa base factual para agregar um peso extra à narrativa, conferindo veracidade aos eventos e seus personagens de uma forma realmente orgânica.

A atmosfera noirda série é lindamente potencializada pela fotografia impecável do Daniel Satinoff (e sua equipe) - ele captura a beleza noturna, totalmente neon, de Tóquio ao mesmo tempo que pontua uma aura de perigo constante do submundo do crime. São planos realmente muito bem planejados e impecáveis em sua realização, que ao lado de uma trilha sonora extremamente melancólica dão o tom exato do suspense e da tensão que a direção, especialmente, de Michael Mann ("Heat") exige - aliás, "Tokyo Vice" tem muito de "Colateral" na sua proposta visual e narrativa, uma pena que o talento de Mann na concepção de uma unidade estética vá se perdendo depois do piloto. Outro destaque, sem dúvida, é Ansel Elgort - ele entrega uma performance visceral como Jake, transmitindo sua ambição, ingenuidade e, principalmente, sua gradual desilusão com aquele mundo que o cerca. Ken Watanabe também rouba a cena como Sato, um detetive experiente e ambivalente, dividido entre a lealdade à lei e a necessidade de fazer justiça. 

O fato é que "Tokyo Vice" começa morninha, mas vai aquecendo ao ponto de ter garantido uma segunda temporada com muitos méritos. Essa é uma série imperdível para os fãs de thrillers policiais baseado em histórias reais que de alguma forma provoca inúmeras sensações: da solidão ao entusiasmo, passando pela ansiedade e pela melancolia de seu protagonista - que não raramente se confunde com a atmosfera desafiadora de Tóquio. Ao explorar alguns temas através de vários personagens que se cruzam e se conectam por pontos em comum, como a dificuldade de um choque cultural tão marcante ou a busca por uma identidade que traria algum conforto ou até mesmo pela luta por justiça em um sistema tão corrompido e hipócrita, enfim, toda essa combinação de elementos resulta em uma experiência, de fato, única e memorável que vale a pena dar uma chance - por mais que inicialmente soe enganosa.

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Você não vai se apaixonar por "Tokyo Vice" imediatamente - será necessários pelo menos 3 ou 4 episódios para você desejar emendar um episódio no outro (e isso vai acontecer)! Basicamente, essa série da HBO Max é um drama policial com fortes elementos de jornalismo investigativo. Ambientado no submundo da Yakuza na Tóquio dos anos 90, a série criada por J.T. Rogers (de "Oslo"), captura como poucas a vibrante energia da capital japonesa, contrastando sua atmosfera histriônica com a brutalidade do crime organizado. Com uma narrativa até certo ponto cadenciada, mas naturalmente envolvente, atuações impecáveis e uma proposta de direção das mais interessantes, "Tokyo Vice" se destacou como uma das melhores séries de 2022, figurando, inclusive, em premiações como o Critics Choice Awards e o Gotham Independent Film Awards.

Jake Adelstein (Ansel Elgort) é um jovem jornalista americano obcecado pelo Japão que se muda para Tóquio em busca de uma oportunidade no prestigiado jornal Meicho Shimbun. Motivado por um idealismo ingênuo, ele logo se depara com a dura realidade do crime organizado, atraindo a atenção de Sato (Ken Watanabe), um detetive da divisão de homicídios que o guia pelas complexas teias da Yakuza. Confira o trailer:

Certamente o que vai mudar sua percepção sobre "Tokyo Vice" é o fato de se tratar de uma história real. Na verdade a série é inspirada no livro homônimo de memória de Adelstein, um jornalista judeu que realmente vivenciou as experiências retratadas na série. Naturalmente que não estamos falando de uma cópia página por página do livro, mas a essência dramática, acreditem, é a mesma. Observar um imigrante, natural do Meio-Oeste americano, vivendo em Tóquio e mergulhando na cultura nacionalista japonesa, é só uma das qualidades do roteiro de J.T. Roger. É impressionante como ele sabe aproveitar dessa base factual para agregar um peso extra à narrativa, conferindo veracidade aos eventos e seus personagens de uma forma realmente orgânica.

A atmosfera noirda série é lindamente potencializada pela fotografia impecável do Daniel Satinoff (e sua equipe) - ele captura a beleza noturna, totalmente neon, de Tóquio ao mesmo tempo que pontua uma aura de perigo constante do submundo do crime. São planos realmente muito bem planejados e impecáveis em sua realização, que ao lado de uma trilha sonora extremamente melancólica dão o tom exato do suspense e da tensão que a direção, especialmente, de Michael Mann ("Heat") exige - aliás, "Tokyo Vice" tem muito de "Colateral" na sua proposta visual e narrativa, uma pena que o talento de Mann na concepção de uma unidade estética vá se perdendo depois do piloto. Outro destaque, sem dúvida, é Ansel Elgort - ele entrega uma performance visceral como Jake, transmitindo sua ambição, ingenuidade e, principalmente, sua gradual desilusão com aquele mundo que o cerca. Ken Watanabe também rouba a cena como Sato, um detetive experiente e ambivalente, dividido entre a lealdade à lei e a necessidade de fazer justiça. 

O fato é que "Tokyo Vice" começa morninha, mas vai aquecendo ao ponto de ter garantido uma segunda temporada com muitos méritos. Essa é uma série imperdível para os fãs de thrillers policiais baseado em histórias reais que de alguma forma provoca inúmeras sensações: da solidão ao entusiasmo, passando pela ansiedade e pela melancolia de seu protagonista - que não raramente se confunde com a atmosfera desafiadora de Tóquio. Ao explorar alguns temas através de vários personagens que se cruzam e se conectam por pontos em comum, como a dificuldade de um choque cultural tão marcante ou a busca por uma identidade que traria algum conforto ou até mesmo pela luta por justiça em um sistema tão corrompido e hipócrita, enfim, toda essa combinação de elementos resulta em uma experiência, de fato, única e memorável que vale a pena dar uma chance - por mais que inicialmente soe enganosa.

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Top of The Lake

“Top of The Lake” é uma série de suspense criminal original BBC criada por Jane Campion (do premiado “Ataque de Cães”) e Gerard Lee que merece sua atenção! Mas é preciso que se diga: inicialmente a série foi exibida em Sundance e só por isso já dá para saber que se trata de uma obra bastante intimista e fora da curva, semelhante aos filmes que são exibidos pela organização do Festival.

Na trama, a detetive Robin Griffin (Elisabeth Moss) precisa descobrir o que aconteceu com Tui Mitcham (Jacqueline Joe) e está decidida a encontrar o narcotraficante Matt Mitcham (Peter Mullan), o pai da menina, para obter mais informações. Mas, no caminho, ela se depara com o líder espiritual GJ (Holly Hunter) e percebe que a cidade esconde mais segredos do que ela imaginava. Confira o trailer (em inglês):

“Top of The Lake” é uma produção semelhante as mais recentes “Mare of Easttown”e “Sharp Objects”. Embora a série não esteja à altura das minisséries citadas, o thriller é bastante competente e entrega um final satisfatório (da primeira temporada) que compensa todo o ritmo cadenciado. Diferente de outras séries do gênero que focam muito na investigação, o trabalho de Campion (que também dirige os 8 episódios) se concentra nas complexidades dos personagens e do ambiente que os cercam. 

A única resposta que se pode esperar envolve o crime central - que em sua conclusão final surpreende com uma revelação inusitada. Minutos antes do mistério ser desvendado, você consegue captar o que vem a seguir, mas até o episódio de encerramento tudo é desconhecido. Já os personagens nunca tem seus dramas devidamente explorados, as incertezas são o charme da série que sempre busca trazer questionamentos sobre essas pessoas que estão em um ambiente caótico e de desesperança. A presença de Elisabeth Moss como Griffin é forte, um dos pontos altos da série - assim como Petter Mullan, que interpreta um homem detestável.

“Top of The Lake” testa a paciência de quem não costuma acompanhar séries com ritmo lento, mas compensa para quem aprecia dramas mais contemplativos e que exploram diversos temas, mesmo que em sua superfície.

Pode dar o play tranquilamente!

PS: A segunda temporada também já está disponível e mantem a enorme qualidade de roteiro e produção da primeira.

Escrito por Mark Hewes - uma parceria @indiqueipraver

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“Top of The Lake” é uma série de suspense criminal original BBC criada por Jane Campion (do premiado “Ataque de Cães”) e Gerard Lee que merece sua atenção! Mas é preciso que se diga: inicialmente a série foi exibida em Sundance e só por isso já dá para saber que se trata de uma obra bastante intimista e fora da curva, semelhante aos filmes que são exibidos pela organização do Festival.

Na trama, a detetive Robin Griffin (Elisabeth Moss) precisa descobrir o que aconteceu com Tui Mitcham (Jacqueline Joe) e está decidida a encontrar o narcotraficante Matt Mitcham (Peter Mullan), o pai da menina, para obter mais informações. Mas, no caminho, ela se depara com o líder espiritual GJ (Holly Hunter) e percebe que a cidade esconde mais segredos do que ela imaginava. Confira o trailer (em inglês):

“Top of The Lake” é uma produção semelhante as mais recentes “Mare of Easttown”e “Sharp Objects”. Embora a série não esteja à altura das minisséries citadas, o thriller é bastante competente e entrega um final satisfatório (da primeira temporada) que compensa todo o ritmo cadenciado. Diferente de outras séries do gênero que focam muito na investigação, o trabalho de Campion (que também dirige os 8 episódios) se concentra nas complexidades dos personagens e do ambiente que os cercam. 

A única resposta que se pode esperar envolve o crime central - que em sua conclusão final surpreende com uma revelação inusitada. Minutos antes do mistério ser desvendado, você consegue captar o que vem a seguir, mas até o episódio de encerramento tudo é desconhecido. Já os personagens nunca tem seus dramas devidamente explorados, as incertezas são o charme da série que sempre busca trazer questionamentos sobre essas pessoas que estão em um ambiente caótico e de desesperança. A presença de Elisabeth Moss como Griffin é forte, um dos pontos altos da série - assim como Petter Mullan, que interpreta um homem detestável.

“Top of The Lake” testa a paciência de quem não costuma acompanhar séries com ritmo lento, mas compensa para quem aprecia dramas mais contemplativos e que exploram diversos temas, mesmo que em sua superfície.

Pode dar o play tranquilamente!

PS: A segunda temporada também já está disponível e mantem a enorme qualidade de roteiro e produção da primeira.

Escrito por Mark Hewes - uma parceria @indiqueipraver

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Três Anúncios para um Crime

Três Anúncios para um Crime

Depois de meses sem ser encontrado o culpado no terrível caso de homicídio onde sua filha foi estuprada e depois carbonizada, Mildred Hayes (Frances McDormand) faz uma jogada ousada ao alugar três outdoors na entrada da pequena cidade de Ebbing no Missouri, e colocar uma mensagem polêmica dirigida a William Willoughby (Woody Harrelson), o respeitado chefe de polícia da cidade. Quando o seu parceiro Dixon (Sam Rockwell), um menino mimado pela mãe, extremamente imaturo e com uma inclinação para a violência, se envolve, a batalha entre Mildred e a policia, acaba saindo do controle. Confira o trailer:

Olha, "Três Anúncios para um Crime" é muito bom, mas não achei fenomenal! O roteiro é interessante, mas hoje em dia, com o que assistimos nas séries, acaba soando tão superficial no cinema que chega a ser cruel ter que entregar 200 páginas de roteiro para contar uma história como essa. Parece que não dá tempo de desenvolver a trama como ela merecia - foi uma sensação que tive e entendo que se trata de uma outra mídia, mas filmes de crimes (e principalmente quando envolve investigação) sofrem muito com essa limitação de tempo.

Agora, o filme parece que foi feito para Frances McDormand - vai ser difícil tirar o Oscar de "Melhor Atriz" dela. Sam Rockwell também está impecável - é meu favorito em ator coadjuvante. O Diretor foi muito bem, principalmente na direção dos atores, mas não dá pra comparar (ainda) com Del Toro e Nolan - e olha que ele, Martin McDonagh, já ganhou um Oscar em 2006 com seu Curta-Metragem "Six Shooter"- aliás, ele é o tipo de Diretor (e Roteirista) que vale a pena acompanhar!

Resumindo: "Three Billboards Outside Ebbing, Missouri" (título original) é sim um grande filme, teve 7 indicações em 2018, mas não seria minha aposta para maior prêmio da noite!

Up-date: "Três Anúncios para um Crime" ganhou em duas categorias no Oscar 2018: Melhor Atriz e Melhor Ator Coadjuvante! 

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Depois de meses sem ser encontrado o culpado no terrível caso de homicídio onde sua filha foi estuprada e depois carbonizada, Mildred Hayes (Frances McDormand) faz uma jogada ousada ao alugar três outdoors na entrada da pequena cidade de Ebbing no Missouri, e colocar uma mensagem polêmica dirigida a William Willoughby (Woody Harrelson), o respeitado chefe de polícia da cidade. Quando o seu parceiro Dixon (Sam Rockwell), um menino mimado pela mãe, extremamente imaturo e com uma inclinação para a violência, se envolve, a batalha entre Mildred e a policia, acaba saindo do controle. Confira o trailer:

Olha, "Três Anúncios para um Crime" é muito bom, mas não achei fenomenal! O roteiro é interessante, mas hoje em dia, com o que assistimos nas séries, acaba soando tão superficial no cinema que chega a ser cruel ter que entregar 200 páginas de roteiro para contar uma história como essa. Parece que não dá tempo de desenvolver a trama como ela merecia - foi uma sensação que tive e entendo que se trata de uma outra mídia, mas filmes de crimes (e principalmente quando envolve investigação) sofrem muito com essa limitação de tempo.

Agora, o filme parece que foi feito para Frances McDormand - vai ser difícil tirar o Oscar de "Melhor Atriz" dela. Sam Rockwell também está impecável - é meu favorito em ator coadjuvante. O Diretor foi muito bem, principalmente na direção dos atores, mas não dá pra comparar (ainda) com Del Toro e Nolan - e olha que ele, Martin McDonagh, já ganhou um Oscar em 2006 com seu Curta-Metragem "Six Shooter"- aliás, ele é o tipo de Diretor (e Roteirista) que vale a pena acompanhar!

Resumindo: "Three Billboards Outside Ebbing, Missouri" (título original) é sim um grande filme, teve 7 indicações em 2018, mas não seria minha aposta para maior prêmio da noite!

Up-date: "Três Anúncios para um Crime" ganhou em duas categorias no Oscar 2018: Melhor Atriz e Melhor Ator Coadjuvante! 

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Twilight Zone

"Twilight Zone" da CBS (all access), distribuído pela Amazon Prime Vídeo aqui no Brasil, é uma grande homenagem ao clássico programa de 1959. Criada por Rod Serling, "Além da Imaginação", como ficou conhecido por aqui, possui episódios independentes que mostram histórias com personagens que por alguma razão existencial precisam enfrentar algum problema (normalmente apresentado de forma exagerada) tendo como pano de fundo elementos de suspense, mistério e fantasia. Eu diria que  "Twilight Zone" é a versão raiz de "Black Mirror" e essa nova versão soube equilibrar muito bem a tradição e o conceito narrativo da série com a modernidade e as ferramentas de um cinema quase autoral. O resultado, embora satisfatório, varia de acordo com os episódios - existe sim uma inconsistência, mas que vai depender do gosto e das preferências de quem assiste e aí é que a série navega com tranquilidade, pois talvez não seja uma unanimidade total, mas vai divertir e entreter na maior parte do tempo. É uma boa pedida para maratonar da mesma forma que funciona em episódios isolados! Vale seu play!

Um dos elementos que encontramos no DNA de "Twilight Zone" e que depois foi muito bem trabalhado em "Amazing Stories" de Steven Spielberg - que aliás já está repaginando o seu formato com a equipe da Amblim deve fazer seu lançamento ainda esse ano na Apple TV+ - é subtexto por trás de cada história central dos episódios. É fundamental para quem assiste, entender que a série usa desse artificio como justificativa para o exagero ou para o aproveitar seu direito de ser inexplicável! Nessa nova versão é muito fácil encontrar esse subtexto, mas em alguns episódios ele parece tão superficial que chegamos a duvidar da sua eficiência, mesmo com um elenco de peso. Vejamos:

- Episódio 1: O comediante Samir Wassan (Kumail Nanjiani - indicado ao Emmy 2019 como "melhor ator convidado") quer ser famoso a qualquer custo, mas para isso é preciso pagar um preço e o roteiro trabalha muito bem esse conceito que nos acompanha durante toda a vida: será que estamos dispostos a pagar o preço para nos diferenciarmos na multidão? A grande maioria não quer, mas os poucos que querem, em algum momento, se perguntam se valeu a pena, mas aí já pode ser tarde! - Para mim, esse é um dos melhores episódios dessa primeira temporada.

-  Episódio 2: O jornalista Justin Sanderson (Adam Scott) encontra uma gravação que fala sobre o futuro e como suas decisões podem afetar o destino do Voo 1015, onde ele á passageiro. O episódio mostra a luta contra o tempo e a angustia de um homem que sabe como ajudar, mas é incompreendido pelas suas ações - tão atual, não? 

- Episódio 3: Uma velha filmadora tem o poder de rebobinar o tempo e esse excelente episódio mostra como o racismo é tão incontrolável quanto a vida cotidiana. Sem dúvida um dos melhores episódios e que nos convida à uma reflexão profunda. Agora prepare-se, tenho a impressão que é a história mais visceral e sufocante da temporada. Muito dolorida!

-  Episódio 4: É Natal e em uma cidade militar do Alaska, um viajante misterioso chega para movimentar a noite e provocar os mais diversos sentimentos nas pessoas. Esse episódio é meio arrastado. Mesmo com momentos interessantes, a história não me convenceu, embora o subtexto seja um dos mais provocativos ao trazer para discussão a hipocrisia humana!

- Episódio 5: Um profissional responsável por campanhas eleitorais está quase em ruínas quando resolve criar um novo ícone para concorrer a presidência dos EUA: no caso uma criança de 11 anos. Outro tema muito atual: a discussão do populismo e da força das mídias sociais - mas a história não me pareceu muito inspirada. Basta lembrar que o próprio "Black Mirror" fez algo muito parecido, porém com muito mais habilidade e criatividade em “The Waldo Moment”!

- Episódio 6: O mais "ficção científica" da temporada mostra uma tripulação tendo que fazer escolhas a todo momento para chegar a marte depois que os EUA sofrem um ataque nuclear da China! Mais um episódio arrastado na minha opinião. O conceito é excelente, mas na prática criou poucos conflitos interessantes e o final, embora cause uma certa surpresa, me pareceu bobo.

- Episódio 7: Depois de um chuva de meteoros, surge uma infecção que transforma a maneira como os homens reagem a determinadas situações. O assunto "a masculinidade tóxica" é discutido aqui com muita criatividade. Talvez esse seja o episódio com mais elementos de terror da temporada.

- Episódio 8: Uma rica dona de casa é levada para um centro de detenção sem entender muito bem os motivos, o que mexe com sua realidade e com seu passado. A discussão sobre os violentos centros de detenção de imigrantes nos EUA é o pano de fundo dessa história. Mais uma vez: embora o assunto seja excelente, o resultado do episódio fica muito aquém do seu potencial. Esse episódio eu achei chato!

- Episódio 9: Um professor de antropologia encontra um revolver que parece ter vida própria, no pente uma bala com seu nome. Esse é um episódio bem intrigante, fala sobre as mudanças da vida e como isso pode interferir na personalidade das pessoas. É interessante, mas não surpreende.

- Episódio 10: A roteirista (ficticia) do "Twilight Zone" é assombrada por uma entidade que representa muito do seu passado. Esse episódio é muito mais interessante pela homenagem as origens da série do que propriamente por uma história magnifica construída para encerrar a temporada em alto estilo. Na verdade eu diria até que o episódio fraco, mas o resgate do gênero com uma pegada mais de suspense e sobrenatural carregam a trama até um final de certa forma nostálgico. 

De fato os episódios são muito bem produzidos, embora a maioria deles usem de um mesmo cenário para contar toda a história o que não seria um problema se o texto fosse muito bom - o que não é o caso! A dinâmica narrativa sofre com essa limitação e, certamente, acusa o golpe quando os roteiros são menos inspirados. Jordan Peele é o narrador perfeito para a série - tem o tom, as pausas dramáticas e uma postura enigmática, além de ser uma referência, ou melhor, a personificação do renascimento de um gênero que estava esquecido: o suspense fantástico!

Como disse anteriormente,  "Twilight Zone" é agradável como entretenimento, mas não é e nem será o fenômeno que foi no final dos anos 50. Talvez uma segunda temporada traga mais oxigênio para série, quem sabe diminuindo o tempo dos episódios ou cuidando melhor das histórias, mas independente de qualquer coisa, vale como divertimento.

Assista Agora

"Twilight Zone" da CBS (all access), distribuído pela Amazon Prime Vídeo aqui no Brasil, é uma grande homenagem ao clássico programa de 1959. Criada por Rod Serling, "Além da Imaginação", como ficou conhecido por aqui, possui episódios independentes que mostram histórias com personagens que por alguma razão existencial precisam enfrentar algum problema (normalmente apresentado de forma exagerada) tendo como pano de fundo elementos de suspense, mistério e fantasia. Eu diria que  "Twilight Zone" é a versão raiz de "Black Mirror" e essa nova versão soube equilibrar muito bem a tradição e o conceito narrativo da série com a modernidade e as ferramentas de um cinema quase autoral. O resultado, embora satisfatório, varia de acordo com os episódios - existe sim uma inconsistência, mas que vai depender do gosto e das preferências de quem assiste e aí é que a série navega com tranquilidade, pois talvez não seja uma unanimidade total, mas vai divertir e entreter na maior parte do tempo. É uma boa pedida para maratonar da mesma forma que funciona em episódios isolados! Vale seu play!

Um dos elementos que encontramos no DNA de "Twilight Zone" e que depois foi muito bem trabalhado em "Amazing Stories" de Steven Spielberg - que aliás já está repaginando o seu formato com a equipe da Amblim deve fazer seu lançamento ainda esse ano na Apple TV+ - é subtexto por trás de cada história central dos episódios. É fundamental para quem assiste, entender que a série usa desse artificio como justificativa para o exagero ou para o aproveitar seu direito de ser inexplicável! Nessa nova versão é muito fácil encontrar esse subtexto, mas em alguns episódios ele parece tão superficial que chegamos a duvidar da sua eficiência, mesmo com um elenco de peso. Vejamos:

- Episódio 1: O comediante Samir Wassan (Kumail Nanjiani - indicado ao Emmy 2019 como "melhor ator convidado") quer ser famoso a qualquer custo, mas para isso é preciso pagar um preço e o roteiro trabalha muito bem esse conceito que nos acompanha durante toda a vida: será que estamos dispostos a pagar o preço para nos diferenciarmos na multidão? A grande maioria não quer, mas os poucos que querem, em algum momento, se perguntam se valeu a pena, mas aí já pode ser tarde! - Para mim, esse é um dos melhores episódios dessa primeira temporada.

-  Episódio 2: O jornalista Justin Sanderson (Adam Scott) encontra uma gravação que fala sobre o futuro e como suas decisões podem afetar o destino do Voo 1015, onde ele á passageiro. O episódio mostra a luta contra o tempo e a angustia de um homem que sabe como ajudar, mas é incompreendido pelas suas ações - tão atual, não? 

- Episódio 3: Uma velha filmadora tem o poder de rebobinar o tempo e esse excelente episódio mostra como o racismo é tão incontrolável quanto a vida cotidiana. Sem dúvida um dos melhores episódios e que nos convida à uma reflexão profunda. Agora prepare-se, tenho a impressão que é a história mais visceral e sufocante da temporada. Muito dolorida!

-  Episódio 4: É Natal e em uma cidade militar do Alaska, um viajante misterioso chega para movimentar a noite e provocar os mais diversos sentimentos nas pessoas. Esse episódio é meio arrastado. Mesmo com momentos interessantes, a história não me convenceu, embora o subtexto seja um dos mais provocativos ao trazer para discussão a hipocrisia humana!

- Episódio 5: Um profissional responsável por campanhas eleitorais está quase em ruínas quando resolve criar um novo ícone para concorrer a presidência dos EUA: no caso uma criança de 11 anos. Outro tema muito atual: a discussão do populismo e da força das mídias sociais - mas a história não me pareceu muito inspirada. Basta lembrar que o próprio "Black Mirror" fez algo muito parecido, porém com muito mais habilidade e criatividade em “The Waldo Moment”!

- Episódio 6: O mais "ficção científica" da temporada mostra uma tripulação tendo que fazer escolhas a todo momento para chegar a marte depois que os EUA sofrem um ataque nuclear da China! Mais um episódio arrastado na minha opinião. O conceito é excelente, mas na prática criou poucos conflitos interessantes e o final, embora cause uma certa surpresa, me pareceu bobo.

- Episódio 7: Depois de um chuva de meteoros, surge uma infecção que transforma a maneira como os homens reagem a determinadas situações. O assunto "a masculinidade tóxica" é discutido aqui com muita criatividade. Talvez esse seja o episódio com mais elementos de terror da temporada.

- Episódio 8: Uma rica dona de casa é levada para um centro de detenção sem entender muito bem os motivos, o que mexe com sua realidade e com seu passado. A discussão sobre os violentos centros de detenção de imigrantes nos EUA é o pano de fundo dessa história. Mais uma vez: embora o assunto seja excelente, o resultado do episódio fica muito aquém do seu potencial. Esse episódio eu achei chato!

- Episódio 9: Um professor de antropologia encontra um revolver que parece ter vida própria, no pente uma bala com seu nome. Esse é um episódio bem intrigante, fala sobre as mudanças da vida e como isso pode interferir na personalidade das pessoas. É interessante, mas não surpreende.

- Episódio 10: A roteirista (ficticia) do "Twilight Zone" é assombrada por uma entidade que representa muito do seu passado. Esse episódio é muito mais interessante pela homenagem as origens da série do que propriamente por uma história magnifica construída para encerrar a temporada em alto estilo. Na verdade eu diria até que o episódio fraco, mas o resgate do gênero com uma pegada mais de suspense e sobrenatural carregam a trama até um final de certa forma nostálgico. 

De fato os episódios são muito bem produzidos, embora a maioria deles usem de um mesmo cenário para contar toda a história o que não seria um problema se o texto fosse muito bom - o que não é o caso! A dinâmica narrativa sofre com essa limitação e, certamente, acusa o golpe quando os roteiros são menos inspirados. Jordan Peele é o narrador perfeito para a série - tem o tom, as pausas dramáticas e uma postura enigmática, além de ser uma referência, ou melhor, a personificação do renascimento de um gênero que estava esquecido: o suspense fantástico!

Como disse anteriormente,  "Twilight Zone" é agradável como entretenimento, mas não é e nem será o fenômeno que foi no final dos anos 50. Talvez uma segunda temporada traga mais oxigênio para série, quem sabe diminuindo o tempo dos episódios ou cuidando melhor das histórias, mas independente de qualquer coisa, vale como divertimento.

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Um Lugar Silencioso: Dia Um

Esse é um filme que divide opiniões, especialmente se as expectativas não estiverem muito bem alinhadas. Veja, é preciso olhar para "Um Lugar Silencioso: Dia Um" como uma peça de um jogo mais elaborado - com uma estrutura conceitual muito parecida com "Cloverfield", por exemplo, ou seja, você não vai encontrar todas as respostas aqui, mas vai se divertir com um ótimo entretenimento que mistura ficção científica com algum drama. "A Quiet Place: Day One", no original, dirigido por Michael Sarnoski (de "Pig: A Vingança"), expande o universo tenso e aterrorizante criado por John Krasinski, porém com um olhar para os eventos que precederam o filme original. Este prelúdio aprofunda o impacto inicial da invasão das criaturas sensíveis ao som, proporcionando um mergulho visceral e emocional em um dos dias mais caóticos e desesperadores da humanidade. Assim como em "Bird Box" e até como em "Last of Us", o filme explora a fragilidade humana diante de uma invasão repentina e incompreensível, equilibrando momentos de angustia com uma incansável luta pela sobrevivência.

A história acompanha Samira (Lupita Nyong'o), uma mulher doente e solitária, que precisa lidar com o caos de Nova York enquanto o pânico inicial pela chegada das criaturas alienígenas se desenrola, capturando a devastação do primeiro dia da invasão. Embora se conecte tematicamente aos dois primeiros filmes da franquia, "Dia Um" funciona como uma narrativa independente, explorando o impacto local ao horror avassalador de um mundo subitamente silencioso. O foco está na luta para compreender o novo e assim sobreviver em um ambiente onde o menor ruído pode significar morte certa. Confira o trailer:

Michael Sarnoski traz uma abordagem intimista e emocional para o gênero de ficção científica, enquanto respeita os elementos de suspense que definiram a franquia. Sua direção se concentra em momentos de certa vulnerabilidade e coragem de Samira, utilizando o caos para explorar as escolhas morais e emocionais feitas sob extrema pressão. O resultado é um filme que é ao mesmo tempo um espetáculo visual aterrorizante e uma meditação "silenciosa" sobre a resiliência humana. A estética de "Dia Um" reflete o estilo de seus predecessores, mas com uma escala ampliada para capturar a devastação de Nova York. As cenas de destruição e de ação são realizadas com precisão técnica e visual, equilibrando a gramática do suspense com as explosões de terror e adrenalina. A direção de fotografia de Pat Scola (companheiro de Sarnoski em "Pig" ) transita entre a câmera fixa e uma mais nervosa, para criar uma atmosfera claustrofóbica, muitas vezes próxima aos personagens, amplificando a sensação de perigo iminente.

O som, como esperado, desempenha um papel crucial na narrativa. A trilha sonora é utilizada com parcimônia, deixando que o silêncio e o som ambiente dominem o espaço. O design de som é meticuloso nesse sentido, já que é ele que pontua e destaca o impacto aterrador de cada ruído - sério, é angustiante, uma tensão constante. Esse domínio técnico permite que "Um Lugar Silencioso: Dia Um"mantenha a audiência à beira da cadeira, transformando a falta de som em uma ferramenta narrativa tão poderosa quanto as próprias criaturas. Lupita Nyong'o entrega uma interpretação convincente que ancora esse tipo de terror com emoções reais. Nyong'o e Joseph Quinn, como Erick, são humanos, com medos, dúvidas e até momentos de heroísmo, o que permite uma certa conecção com suas lutas e triunfos. Embora menos focado em um núcleo familiar, como os dois primeiros filmes, "Dia Um" expande o universo explorando outras perspectivas e histórias de sobrevivência - se não com tanto brilho, pelo menos como um ótimo entretenimento.

"Um Lugar Silencioso" é uma franquia de regras muito bem estabelecidas, onde, desde a primeira cena do filme original, já sabemos que o menor barulho pode ser fatal para qualquer personagem. Dito isso, a repetição da experiência sensorial proposta por Krasinski em 2018 é mais que suficiente para fazer com que esse prelúdio funcione bem, mesmo que alguns ainda busquem maiores explicações canônicas para a invasão alienígena - o que não é o melhor caminho, já que o que vale aqui é a luta pela sobrevivência e só!

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Esse é um filme que divide opiniões, especialmente se as expectativas não estiverem muito bem alinhadas. Veja, é preciso olhar para "Um Lugar Silencioso: Dia Um" como uma peça de um jogo mais elaborado - com uma estrutura conceitual muito parecida com "Cloverfield", por exemplo, ou seja, você não vai encontrar todas as respostas aqui, mas vai se divertir com um ótimo entretenimento que mistura ficção científica com algum drama. "A Quiet Place: Day One", no original, dirigido por Michael Sarnoski (de "Pig: A Vingança"), expande o universo tenso e aterrorizante criado por John Krasinski, porém com um olhar para os eventos que precederam o filme original. Este prelúdio aprofunda o impacto inicial da invasão das criaturas sensíveis ao som, proporcionando um mergulho visceral e emocional em um dos dias mais caóticos e desesperadores da humanidade. Assim como em "Bird Box" e até como em "Last of Us", o filme explora a fragilidade humana diante de uma invasão repentina e incompreensível, equilibrando momentos de angustia com uma incansável luta pela sobrevivência.

A história acompanha Samira (Lupita Nyong'o), uma mulher doente e solitária, que precisa lidar com o caos de Nova York enquanto o pânico inicial pela chegada das criaturas alienígenas se desenrola, capturando a devastação do primeiro dia da invasão. Embora se conecte tematicamente aos dois primeiros filmes da franquia, "Dia Um" funciona como uma narrativa independente, explorando o impacto local ao horror avassalador de um mundo subitamente silencioso. O foco está na luta para compreender o novo e assim sobreviver em um ambiente onde o menor ruído pode significar morte certa. Confira o trailer:

Michael Sarnoski traz uma abordagem intimista e emocional para o gênero de ficção científica, enquanto respeita os elementos de suspense que definiram a franquia. Sua direção se concentra em momentos de certa vulnerabilidade e coragem de Samira, utilizando o caos para explorar as escolhas morais e emocionais feitas sob extrema pressão. O resultado é um filme que é ao mesmo tempo um espetáculo visual aterrorizante e uma meditação "silenciosa" sobre a resiliência humana. A estética de "Dia Um" reflete o estilo de seus predecessores, mas com uma escala ampliada para capturar a devastação de Nova York. As cenas de destruição e de ação são realizadas com precisão técnica e visual, equilibrando a gramática do suspense com as explosões de terror e adrenalina. A direção de fotografia de Pat Scola (companheiro de Sarnoski em "Pig" ) transita entre a câmera fixa e uma mais nervosa, para criar uma atmosfera claustrofóbica, muitas vezes próxima aos personagens, amplificando a sensação de perigo iminente.

O som, como esperado, desempenha um papel crucial na narrativa. A trilha sonora é utilizada com parcimônia, deixando que o silêncio e o som ambiente dominem o espaço. O design de som é meticuloso nesse sentido, já que é ele que pontua e destaca o impacto aterrador de cada ruído - sério, é angustiante, uma tensão constante. Esse domínio técnico permite que "Um Lugar Silencioso: Dia Um"mantenha a audiência à beira da cadeira, transformando a falta de som em uma ferramenta narrativa tão poderosa quanto as próprias criaturas. Lupita Nyong'o entrega uma interpretação convincente que ancora esse tipo de terror com emoções reais. Nyong'o e Joseph Quinn, como Erick, são humanos, com medos, dúvidas e até momentos de heroísmo, o que permite uma certa conecção com suas lutas e triunfos. Embora menos focado em um núcleo familiar, como os dois primeiros filmes, "Dia Um" expande o universo explorando outras perspectivas e histórias de sobrevivência - se não com tanto brilho, pelo menos como um ótimo entretenimento.

"Um Lugar Silencioso" é uma franquia de regras muito bem estabelecidas, onde, desde a primeira cena do filme original, já sabemos que o menor barulho pode ser fatal para qualquer personagem. Dito isso, a repetição da experiência sensorial proposta por Krasinski em 2018 é mais que suficiente para fazer com que esse prelúdio funcione bem, mesmo que alguns ainda busquem maiores explicações canônicas para a invasão alienígena - o que não é o melhor caminho, já que o que vale aqui é a luta pela sobrevivência e só!

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Um Motivo para Lutar

"Um Motivo para Lutar" realmente pode te surpreender! O filme dirigido por Romain Cogitore é uma mistura equilibrada de drama e romance, que se apoia em uma narrativa emocionalmente intensa e cheia de contrastes bem ao estilo "Mil Vezes Boa Noite". Essa produção francesa da Disney, explora a interseção delicada entre a ideologia e as relações humanas, oferecendo uma reflexão profunda sobre o impacto das convicções em momentos de conflito. O filme se destaca ao discutir como o ativismo social e ambiental moldam as escolhas e as dinâmicas entre os personagens, criando dilemas complexos que desafiam os limites entre o dever e o afeto.

A trama segue Stella (Lyna Khoudri), uma jovem ativista engajada na resistência contra um projeto de construção em uma área ambientalmente protegida conhecida como "ZAD" (Zone à Défendre). No meio desse conflito, ela se envolve com Alexandre (François Civil), um policial infiltrado na comunidade de ativistas. À medida que o relacionamento entre eles se desenvolve, os dilemas éticos e emocionais emergem, colocando em risco tanto suas convicções quanto seus sentimentos. Confira o trailer (em francês):

Cogitore dirige o filme com uma sensibilidade impressionante, especialmente ao tratar da intimidade inserida dentro de um contexto de tensão política. Sua direção evita simplificações, focando justamente na ambiguidade moral que permeia a relação entre os protagonistas e a própria causa que eles defendem. A construção narrativa é tão cuidadosa que faz com que a tensão emocional entre Stella e Alexandre se desenvolva de um forma gradual, mantendo a audiência intrigada e entretida até o final. O roteiro escrito por Cogitore em parceria com Thomas Bidegain (de "Ferrugem e Osso") e Catherine Paillé (de "O Segredo da Câmara Escura") equilibra bem essa relação mais pessoal sem nunca abrir mão do pano de fundo político. A forma como "Um Motivo para Lutar"aborda a linha tênue entre o idealismo e o extremismo é notável, evitando juízos fáceis e oferecendo uma visão humana tanto dos ativistas quanto das forças de repressão. 

A performance do elenco encabeçado por Lyna Khoudri e François Civil, sem dúvida, é um dos pontos altos do filme. Khoudri entrega uma personagem autêntica e visceral, revelando a sua intensidade e a sua vulnerabilidade diante dos dilemas afetivos e sociais que permeiam a narrativa. Civil também brilha ao interpretar Alexandre, um homem dividido entre sua missão profissional e o envolvimento emocional que nasce dentro da comunidade - a química entre os dois é palpável, e suas interações refletem a tensão entre "dever e desejo" a cada cena. Outro fator que ajuda a construir essa atmosfera de dualidade é a fotografia de Julien Hirsch (de "Lady Chatterley") - ao capturar as paisagens naturais da "ZAD", ele reforça tanto a beleza quanto a fragilidade do local. Os ambientes densos e isolados simbolizam a resistência dos ativistas e a pressão crescente que eles enfrentam, enquanto a escolha de cores mais naturalistas e uma iluminação suave complementam o tom intimista da narrativa. Repare como essa estética acentua os momentos de silêncio e reflexão, intensificando o impacto da história.

O foco na construção emocional e nas nuances dos personagens é um ponto relevante do trabalho de Cogitore, por outro lado essa identidade mais autoral impacta no ritmo e isso pode desgarrar alguns - e também pode dar a sensação de que a trama se alonga desnecessariamente em alguns momentos. No entanto, "Une Zone à Défendre" (no original), posso garantir, é uma experiência bastante envolvente especialmente por explorar a dinâmica entre Stella e Alexandre, respeitando a complexidade dos vínculos formados em contextos de conflito e a dificuldade de conciliar afetos com convicções. Realmente um convite para a reflexão sobre a natureza do compromisso e as fronteiras entre o amor e a lealdade por um ideal.

Vale muito o seu play!

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"Um Motivo para Lutar" realmente pode te surpreender! O filme dirigido por Romain Cogitore é uma mistura equilibrada de drama e romance, que se apoia em uma narrativa emocionalmente intensa e cheia de contrastes bem ao estilo "Mil Vezes Boa Noite". Essa produção francesa da Disney, explora a interseção delicada entre a ideologia e as relações humanas, oferecendo uma reflexão profunda sobre o impacto das convicções em momentos de conflito. O filme se destaca ao discutir como o ativismo social e ambiental moldam as escolhas e as dinâmicas entre os personagens, criando dilemas complexos que desafiam os limites entre o dever e o afeto.

A trama segue Stella (Lyna Khoudri), uma jovem ativista engajada na resistência contra um projeto de construção em uma área ambientalmente protegida conhecida como "ZAD" (Zone à Défendre). No meio desse conflito, ela se envolve com Alexandre (François Civil), um policial infiltrado na comunidade de ativistas. À medida que o relacionamento entre eles se desenvolve, os dilemas éticos e emocionais emergem, colocando em risco tanto suas convicções quanto seus sentimentos. Confira o trailer (em francês):

Cogitore dirige o filme com uma sensibilidade impressionante, especialmente ao tratar da intimidade inserida dentro de um contexto de tensão política. Sua direção evita simplificações, focando justamente na ambiguidade moral que permeia a relação entre os protagonistas e a própria causa que eles defendem. A construção narrativa é tão cuidadosa que faz com que a tensão emocional entre Stella e Alexandre se desenvolva de um forma gradual, mantendo a audiência intrigada e entretida até o final. O roteiro escrito por Cogitore em parceria com Thomas Bidegain (de "Ferrugem e Osso") e Catherine Paillé (de "O Segredo da Câmara Escura") equilibra bem essa relação mais pessoal sem nunca abrir mão do pano de fundo político. A forma como "Um Motivo para Lutar"aborda a linha tênue entre o idealismo e o extremismo é notável, evitando juízos fáceis e oferecendo uma visão humana tanto dos ativistas quanto das forças de repressão. 

A performance do elenco encabeçado por Lyna Khoudri e François Civil, sem dúvida, é um dos pontos altos do filme. Khoudri entrega uma personagem autêntica e visceral, revelando a sua intensidade e a sua vulnerabilidade diante dos dilemas afetivos e sociais que permeiam a narrativa. Civil também brilha ao interpretar Alexandre, um homem dividido entre sua missão profissional e o envolvimento emocional que nasce dentro da comunidade - a química entre os dois é palpável, e suas interações refletem a tensão entre "dever e desejo" a cada cena. Outro fator que ajuda a construir essa atmosfera de dualidade é a fotografia de Julien Hirsch (de "Lady Chatterley") - ao capturar as paisagens naturais da "ZAD", ele reforça tanto a beleza quanto a fragilidade do local. Os ambientes densos e isolados simbolizam a resistência dos ativistas e a pressão crescente que eles enfrentam, enquanto a escolha de cores mais naturalistas e uma iluminação suave complementam o tom intimista da narrativa. Repare como essa estética acentua os momentos de silêncio e reflexão, intensificando o impacto da história.

O foco na construção emocional e nas nuances dos personagens é um ponto relevante do trabalho de Cogitore, por outro lado essa identidade mais autoral impacta no ritmo e isso pode desgarrar alguns - e também pode dar a sensação de que a trama se alonga desnecessariamente em alguns momentos. No entanto, "Une Zone à Défendre" (no original), posso garantir, é uma experiência bastante envolvente especialmente por explorar a dinâmica entre Stella e Alexandre, respeitando a complexidade dos vínculos formados em contextos de conflito e a dificuldade de conciliar afetos com convicções. Realmente um convite para a reflexão sobre a natureza do compromisso e as fronteiras entre o amor e a lealdade por um ideal.

Vale muito o seu play!

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Um Pesadelo Americano

"Um Pesadelo Americano" é um típico true crime de três episódios que além de intenso em sua proposta narrativa, é profundamente intrigante pela forma como a história é desconstruída. Chancelada por ser um projeto da mesma equipe criativa que produziu "O Golpista do Tinder", essa minissérie nos conduz por um caso absurdo pela perspectiva de quem investiga, mesmo que a narrativa seja feita por quem, de fato, foi vítima. É isso mesmo, essa quebra de expectativa entre o que vemos na tela e o que de fato aconteceu, nos provoca inúmeros julgamentos que diz muito sobre a maneira com que somos influenciados. Eu diria, inclusive, que essa produção original da Netflix é uma verdadeira imersão no obscuro labirinto da pseudo justiça e da hipocrisia da mídia americana, sem o receio de nos expor como parte desse circo - e aqui, ao surgir a comparação com "Garota Exemplar", entendemos exatamente onde a direção de Felicity Morris queria chegar.

"American Nightmare" (no original) foca na história do casal Denise Huskins e Aaron Quinn. Os dois são surpreendidos quando um grupo de pessoas em roupas de mergulho invadem sua casa e fazem os dois de reféns. Após serem supostamente drogados, Denise é levada pelos criminosos e Aaron só consegue fazer contato com a polícia no dia seguinte - é aí que o pesadelo começa, já que depois de um depoimento cheio de brechas, o jovem se torna o principal suspeito do desaparecimento misterioso da namorada. Confira o trailer:

Em um primeiro olhar, encontramos em "Um Pesadelo Americano" uma maestria técnica e artística empregada na sua realização que realmente chama atenção pela similaridade com uma obra de ficção. A forma como Morris explora cada nuance da história, capturando a intensidade emocional dos fatos e toda dinâmica da investigação, realmente nos faz lembrar de filmes do gênero, mais especificamente do próprio "Garota Exemplar" do grande David Fincher - que por curiosidade havia sido lançado um ano antes do crime. Obviamente que essa comparação extrapola o conceito narrativo para se transformar, por incrível que possa parecer, no ponto de partida da investigação diante dos depoimentos de Aaron Quinn e depois de  Denise Huskins.

Apresentando as versões sobre o caso a partir de três personagens chave e em episódios "independentes", a direção não só propõe a construção de um quebra-cabeça como também controla quais as peças quer nos entregar. Veja, o roteiro é muito bem amarrado, o que potencializa o trabalho do montador que se delicia com inúmeros depoimentos (inclusive do casal), imagens de câmeras e áudios de policiais e dos suspeitos durante as investigações, gravações de celulares, reportagens de tv da época, e-mails, fotos, enfim, uma quantidade enorme de material que ajudam a compor a linha do tempo de maneira clara e dinâmica, mesmo que de certa forma fragmentada. Veja, até quando a direção propõe algumas reconstituições, o que vemos é uma gramática visual simplesmente cinematográfica e muito envolvente.

Existe uma certa genialidade na minissérie ao desconstruir pré-conceitos e oferecer uma nova perspectiva sobre o caso a cada informação, interpretação ou dúvida levantada por alguém. Essa quebra de expectativa funciona perfeitamente nos dois primeiro episódios, criando uma atmosfera de mistério. No entanto, já o terceiro episódio parece perder um pouco dessa unidade narrativa - elementos aparentemente insignificantes ganham relevância, questionando a veracidade das acusações e provocando uma análise crítica sobre a responsabilidade da mídia e da polícia durante a investigação. Aqui não se trata mais sobre o que aconteceu com Denise e sim sobre como o caso foi tratado. Dito isso, "Pesadelo Americano" não conta apenas  com uma história intrigante, mas também nos convida a desafiar a forma como percebemos a verdade e a justiça com um toque de crítica social ao levantar discussões relevantes, especialmente, sobre a misoginia institucionalizada.

Vale seu play!

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"Um Pesadelo Americano" é um típico true crime de três episódios que além de intenso em sua proposta narrativa, é profundamente intrigante pela forma como a história é desconstruída. Chancelada por ser um projeto da mesma equipe criativa que produziu "O Golpista do Tinder", essa minissérie nos conduz por um caso absurdo pela perspectiva de quem investiga, mesmo que a narrativa seja feita por quem, de fato, foi vítima. É isso mesmo, essa quebra de expectativa entre o que vemos na tela e o que de fato aconteceu, nos provoca inúmeros julgamentos que diz muito sobre a maneira com que somos influenciados. Eu diria, inclusive, que essa produção original da Netflix é uma verdadeira imersão no obscuro labirinto da pseudo justiça e da hipocrisia da mídia americana, sem o receio de nos expor como parte desse circo - e aqui, ao surgir a comparação com "Garota Exemplar", entendemos exatamente onde a direção de Felicity Morris queria chegar.

"American Nightmare" (no original) foca na história do casal Denise Huskins e Aaron Quinn. Os dois são surpreendidos quando um grupo de pessoas em roupas de mergulho invadem sua casa e fazem os dois de reféns. Após serem supostamente drogados, Denise é levada pelos criminosos e Aaron só consegue fazer contato com a polícia no dia seguinte - é aí que o pesadelo começa, já que depois de um depoimento cheio de brechas, o jovem se torna o principal suspeito do desaparecimento misterioso da namorada. Confira o trailer:

Em um primeiro olhar, encontramos em "Um Pesadelo Americano" uma maestria técnica e artística empregada na sua realização que realmente chama atenção pela similaridade com uma obra de ficção. A forma como Morris explora cada nuance da história, capturando a intensidade emocional dos fatos e toda dinâmica da investigação, realmente nos faz lembrar de filmes do gênero, mais especificamente do próprio "Garota Exemplar" do grande David Fincher - que por curiosidade havia sido lançado um ano antes do crime. Obviamente que essa comparação extrapola o conceito narrativo para se transformar, por incrível que possa parecer, no ponto de partida da investigação diante dos depoimentos de Aaron Quinn e depois de  Denise Huskins.

Apresentando as versões sobre o caso a partir de três personagens chave e em episódios "independentes", a direção não só propõe a construção de um quebra-cabeça como também controla quais as peças quer nos entregar. Veja, o roteiro é muito bem amarrado, o que potencializa o trabalho do montador que se delicia com inúmeros depoimentos (inclusive do casal), imagens de câmeras e áudios de policiais e dos suspeitos durante as investigações, gravações de celulares, reportagens de tv da época, e-mails, fotos, enfim, uma quantidade enorme de material que ajudam a compor a linha do tempo de maneira clara e dinâmica, mesmo que de certa forma fragmentada. Veja, até quando a direção propõe algumas reconstituições, o que vemos é uma gramática visual simplesmente cinematográfica e muito envolvente.

Existe uma certa genialidade na minissérie ao desconstruir pré-conceitos e oferecer uma nova perspectiva sobre o caso a cada informação, interpretação ou dúvida levantada por alguém. Essa quebra de expectativa funciona perfeitamente nos dois primeiro episódios, criando uma atmosfera de mistério. No entanto, já o terceiro episódio parece perder um pouco dessa unidade narrativa - elementos aparentemente insignificantes ganham relevância, questionando a veracidade das acusações e provocando uma análise crítica sobre a responsabilidade da mídia e da polícia durante a investigação. Aqui não se trata mais sobre o que aconteceu com Denise e sim sobre como o caso foi tratado. Dito isso, "Pesadelo Americano" não conta apenas  com uma história intrigante, mas também nos convida a desafiar a forma como percebemos a verdade e a justiça com um toque de crítica social ao levantar discussões relevantes, especialmente, sobre a misoginia institucionalizada.

Vale seu play!

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Untold: Crime e Infrações

Uma história completamente surreal! Talvez seja essa a melhor definição para "Crime e Infrações", mais um episódio do selo "Untold" para a Netflix. Como todos o outros capítulos analisados até aqui, o esporte emerge de uma situação atípica, porém, dessa vez, não parece tão preocupado em entender as diversas camadas dos seus protagonistas como em "Federer x Fish"ou "Briga na NBA", para justificar uma passagem, uma atitude ou uma decisão; muito pelo contrário, o tom investigativo cria um paralelo até mais próximo de "A Bad Boy Billionaires"ou "Mito e Magnata: John Delorean".

Imagine que um time de hóquei, do que seria para nós uma espécie de "segunda divisão", é comprado por um homem multimilionário, com fortes ligações com a máfia, e que passa a ser liderado por seu filho de 17 anos, que carrega a marca da rebeldia em sua postura, e por isso resolve priorizar jogadores tão violentos quanto talentosos, subvertendo o propósito do esporte e transformando a nova franquia em um grande sucesso de marketing, mesmo que pautado em um posicionamento, digamos, duvidoso: o de "bad boys". Confira o trailer (em inglês):

Mais uma vez dirigido pela dupla Chapman e Maclain Way, "Untold: Crime e Infrações" foi muito feliz em criar uma narrativa que mistura o esporte com uma investigação policial para decupar a história do Danbury Trashers. Danbury, para quem não sabe, é uma cidadezinha localizada no estado americano de Connecticut, no Condado de Fairfield, onde um empresario do setor de coleta de lixo, James Galante, construiu um verdadeiro império. A grande questão (e por isso a comparação com "A Bad Boy Billionaires") é entender por quais meios que essa ascensão financeira e social se estabeleceu. Por outro lado, imaginem para os moradores de Danbury o que representou ter um time de hóquei profissional na cidade. Será que eles estava preocupados em entender a origem do dinheiro de Galante? - uma comparação com o Bangu de Castor de Andrade, nem soa tão absurda assim.

Como já se tornou costume, a linha narrativa da série "Untold" se apropria de inúmeras imagens de arquivo e entrevistas com quem realmente esteve envolvido na história, provocando uma viagem ao passado para, de certa forma, reinterpretar algo que, nesse caso, nem pareceu tão absurdo assim. Esse é o charme do episódio e é incrível como a relação entre os personagens, toda uma comunidade e até pela forma como a cobertura esportiva foi feita, parecem não entender o impacto que escolhas de um jovem de 17 anos, A.J. Galante, poderiam ter em curtíssimo prazo - é tão surreal a jornada de sucesso dos Trashers, que temos a exata sensação de que aquele recorte da sociedade americana não tem a menor chance de dar certo.

Esse episódio não traz nomes relevantes do esporte, mas nem por isso deixa de ser um retrato de como o poder e o dinheiro podem impactar as pessoas, toda uma comunidade e até destruir a reputação de uma instituição (no caso esportiva) mesmo quando o resultado (como negócio) parece positivo - aliás, só parece! Outro ponto que merece ser observado é a forma como as pessoas enxergavam James Galante - com um ar de "Pablo Escobar" e uma premissa de que os "meios", sim, justificam os fins! O fato é que "Untold: Crime e Infrações" impressiona muito mais pela história por trás do esporte do que em outros episódios da série, mas continua valendo muito a pena!

Assista Agora

Uma história completamente surreal! Talvez seja essa a melhor definição para "Crime e Infrações", mais um episódio do selo "Untold" para a Netflix. Como todos o outros capítulos analisados até aqui, o esporte emerge de uma situação atípica, porém, dessa vez, não parece tão preocupado em entender as diversas camadas dos seus protagonistas como em "Federer x Fish"ou "Briga na NBA", para justificar uma passagem, uma atitude ou uma decisão; muito pelo contrário, o tom investigativo cria um paralelo até mais próximo de "A Bad Boy Billionaires"ou "Mito e Magnata: John Delorean".

Imagine que um time de hóquei, do que seria para nós uma espécie de "segunda divisão", é comprado por um homem multimilionário, com fortes ligações com a máfia, e que passa a ser liderado por seu filho de 17 anos, que carrega a marca da rebeldia em sua postura, e por isso resolve priorizar jogadores tão violentos quanto talentosos, subvertendo o propósito do esporte e transformando a nova franquia em um grande sucesso de marketing, mesmo que pautado em um posicionamento, digamos, duvidoso: o de "bad boys". Confira o trailer (em inglês):

Mais uma vez dirigido pela dupla Chapman e Maclain Way, "Untold: Crime e Infrações" foi muito feliz em criar uma narrativa que mistura o esporte com uma investigação policial para decupar a história do Danbury Trashers. Danbury, para quem não sabe, é uma cidadezinha localizada no estado americano de Connecticut, no Condado de Fairfield, onde um empresario do setor de coleta de lixo, James Galante, construiu um verdadeiro império. A grande questão (e por isso a comparação com "A Bad Boy Billionaires") é entender por quais meios que essa ascensão financeira e social se estabeleceu. Por outro lado, imaginem para os moradores de Danbury o que representou ter um time de hóquei profissional na cidade. Será que eles estava preocupados em entender a origem do dinheiro de Galante? - uma comparação com o Bangu de Castor de Andrade, nem soa tão absurda assim.

Como já se tornou costume, a linha narrativa da série "Untold" se apropria de inúmeras imagens de arquivo e entrevistas com quem realmente esteve envolvido na história, provocando uma viagem ao passado para, de certa forma, reinterpretar algo que, nesse caso, nem pareceu tão absurdo assim. Esse é o charme do episódio e é incrível como a relação entre os personagens, toda uma comunidade e até pela forma como a cobertura esportiva foi feita, parecem não entender o impacto que escolhas de um jovem de 17 anos, A.J. Galante, poderiam ter em curtíssimo prazo - é tão surreal a jornada de sucesso dos Trashers, que temos a exata sensação de que aquele recorte da sociedade americana não tem a menor chance de dar certo.

Esse episódio não traz nomes relevantes do esporte, mas nem por isso deixa de ser um retrato de como o poder e o dinheiro podem impactar as pessoas, toda uma comunidade e até destruir a reputação de uma instituição (no caso esportiva) mesmo quando o resultado (como negócio) parece positivo - aliás, só parece! Outro ponto que merece ser observado é a forma como as pessoas enxergavam James Galante - com um ar de "Pablo Escobar" e uma premissa de que os "meios", sim, justificam os fins! O fato é que "Untold: Crime e Infrações" impressiona muito mais pela história por trás do esporte do que em outros episódios da série, mas continua valendo muito a pena!

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Vale o Escrito

Se você está com saudade dos bons tempos de "Game of Thrones" não deixe de assistir a minissérie documental, "Vale o Escrito: A Guerra do Jogo do Bicho"! Você vai precisar assistir apenas um episódio para entender que eu não estou exagerando - essa produção original da Globoplay, sem a menor sombra de dúvidas, é o "Game of Thrones da vida real"! Escrita e dirigida pelo jornalista Fellipe Awi (com a retaguarda de Ricardo Calil e de Gian Carlo Bellotti), a minissérie é uma verdadeira imersão na história sórdida (e fascinante) do Rio de Janeiro pela perspectiva da contravenção - ao assistir os sete episódios, não serão raras as reflexões sobre a seriedade de um país que acompanha de camarote uma verdadeira guerra, bem como fomenta a hipocrisia de uma sociedade marcada pelo crime, mas que faz vistas grossas por medo ou/e por admiração daqueles que se impõem pelo poder e pelo dinheiro.

"Vale o Escrito", basicamente, narra a ascensão e queda do jogo do bicho na Cidade Maravilhosa, entrelaçando a trajetória de duas famílias rivais, os Andrade e os Garcia, em uma guerra sangrenta pelo poder. A minissérie aborda desde seu início no século XIX, passando pela criminalização das apostas e dos jogos de azar, o investimento no carnaval pautado pelo ego até o envolvimento das milícias na conquista por territórios. Confira o trailer:

Narrado com maestria pelo Pedro Bial, que inclusive está na supervisão artística do novo projeto do "Conversa.Doc", núcleo de documentários do seu programa na TV, "Vale o Escrito: A Guerra do Jogo do Bicho" dá uma aula de storytelling! Sua uma narrativa é envolvente, densa e eletrizante - Awi tece com muita inteligência um verdadeiro drama politico, cheio de conspirações, traições e reviravoltas, sempre apoiado em imagens de arquivo, depoimentos de figuras chave dessa história e inserções gráficas impecáveis pela qualidade técnica e artística. A forma como a linha temporal é construída pelo roteiro (e pela edição) nos dá a exata noção do tamanho e da complexidade que é o submundo do jogo no Rio de Janeiro.

De fato, "Vale o Escrito" não se contenta em apenas apresentar os fatos históricos - a minissérie vai além ao fazer uma análise profunda dos impactos sociais, políticos e culturais do jogo do bicho na sociedade carioca ao longo de décadas. É impressionante como a própria mídia se relaciona com essa dinâmica - ao ponto de um dos maiores (e mais violentos) contraventores do país ser capa de revista e símbolo sexual por muitos anos. Através de entrevistas com especialistas em segurança (muitos deles da policia civil e do BOPE), jornalistas e, acreditem, com os próprios bicheiros e seus familiares, somos confrontados por aquela incomoda sensação de impunidade. Ao entendermos, ponto a ponto, como as relações que envolve essa atividade ilegal se dão, desde sua origem até os dias atuais, temos a certeza (mais uma vez) que é impossível esse país dar certo! 

Com uma estética impecável, "Vale o Escrito: A Guerra do Jogo do Bicho" captura a beleza e a sordidez do Rio de Janeiro com sabedoria - mesmo que o viés politico ainda mostre sua cara em alguns momentos. A montagem ágil e dinâmica nos guia por essa jornada como poucas vezes você experienciou - não é fácil deixar de emendar um episódio no outro. Na linha de "Doutor Castor"aqui também existe uma atmosfera envolvente e angustiante que ao longo dos episódios nos magnetiza e, com era de se esperar, ganha força ao retratar de maneira visceral a alma de um Rio de Janeiro esquecido, revelando as entranhas do poder, da corrupção e da violência que permeiam a história da cidade - sem cortes.

Olha, é uma pancada, mas que não deixa de ser uma material importante e simplesmente imperdível! Vale muito o seu play!

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Se você está com saudade dos bons tempos de "Game of Thrones" não deixe de assistir a minissérie documental, "Vale o Escrito: A Guerra do Jogo do Bicho"! Você vai precisar assistir apenas um episódio para entender que eu não estou exagerando - essa produção original da Globoplay, sem a menor sombra de dúvidas, é o "Game of Thrones da vida real"! Escrita e dirigida pelo jornalista Fellipe Awi (com a retaguarda de Ricardo Calil e de Gian Carlo Bellotti), a minissérie é uma verdadeira imersão na história sórdida (e fascinante) do Rio de Janeiro pela perspectiva da contravenção - ao assistir os sete episódios, não serão raras as reflexões sobre a seriedade de um país que acompanha de camarote uma verdadeira guerra, bem como fomenta a hipocrisia de uma sociedade marcada pelo crime, mas que faz vistas grossas por medo ou/e por admiração daqueles que se impõem pelo poder e pelo dinheiro.

"Vale o Escrito", basicamente, narra a ascensão e queda do jogo do bicho na Cidade Maravilhosa, entrelaçando a trajetória de duas famílias rivais, os Andrade e os Garcia, em uma guerra sangrenta pelo poder. A minissérie aborda desde seu início no século XIX, passando pela criminalização das apostas e dos jogos de azar, o investimento no carnaval pautado pelo ego até o envolvimento das milícias na conquista por territórios. Confira o trailer:

Narrado com maestria pelo Pedro Bial, que inclusive está na supervisão artística do novo projeto do "Conversa.Doc", núcleo de documentários do seu programa na TV, "Vale o Escrito: A Guerra do Jogo do Bicho" dá uma aula de storytelling! Sua uma narrativa é envolvente, densa e eletrizante - Awi tece com muita inteligência um verdadeiro drama politico, cheio de conspirações, traições e reviravoltas, sempre apoiado em imagens de arquivo, depoimentos de figuras chave dessa história e inserções gráficas impecáveis pela qualidade técnica e artística. A forma como a linha temporal é construída pelo roteiro (e pela edição) nos dá a exata noção do tamanho e da complexidade que é o submundo do jogo no Rio de Janeiro.

De fato, "Vale o Escrito" não se contenta em apenas apresentar os fatos históricos - a minissérie vai além ao fazer uma análise profunda dos impactos sociais, políticos e culturais do jogo do bicho na sociedade carioca ao longo de décadas. É impressionante como a própria mídia se relaciona com essa dinâmica - ao ponto de um dos maiores (e mais violentos) contraventores do país ser capa de revista e símbolo sexual por muitos anos. Através de entrevistas com especialistas em segurança (muitos deles da policia civil e do BOPE), jornalistas e, acreditem, com os próprios bicheiros e seus familiares, somos confrontados por aquela incomoda sensação de impunidade. Ao entendermos, ponto a ponto, como as relações que envolve essa atividade ilegal se dão, desde sua origem até os dias atuais, temos a certeza (mais uma vez) que é impossível esse país dar certo! 

Com uma estética impecável, "Vale o Escrito: A Guerra do Jogo do Bicho" captura a beleza e a sordidez do Rio de Janeiro com sabedoria - mesmo que o viés politico ainda mostre sua cara em alguns momentos. A montagem ágil e dinâmica nos guia por essa jornada como poucas vezes você experienciou - não é fácil deixar de emendar um episódio no outro. Na linha de "Doutor Castor"aqui também existe uma atmosfera envolvente e angustiante que ao longo dos episódios nos magnetiza e, com era de se esperar, ganha força ao retratar de maneira visceral a alma de um Rio de Janeiro esquecido, revelando as entranhas do poder, da corrupção e da violência que permeiam a história da cidade - sem cortes.

Olha, é uma pancada, mas que não deixa de ser uma material importante e simplesmente imperdível! Vale muito o seu play!

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Verdade seja dita

"Truth Be Told" (título original) chegou para ser uma espécie de "Big Little Liars" (HBO) do serviço de streaming da Apple e acabou se misturando com o conceito de "The Sinner"(Netflix). Na minha opinião, o resultado dramático que a série entregou está abaixo dessas duas referências diretas - embora o final tenha até uma certa originalidade, os suspeitos de "Verdade seja dita" vão sendo eliminados precocemente, diminuindo cada vez mais o mistério até sobrar o óbvio e isso atrapalha um pouco nossa experiência se fizermos a comparação com várias outras séries do gênero.

"Verdade seja dita" é uma adaptação do romance deKathleen Barber, "Are You Sleeping", que acompanha a jornada da podcaster Poppy Parnell (Octavia Spencer) que, ao descobrir novas evidências de que Warren Cave (Aaron Paul) pode ter ido para a cadeia por engano após "supostamente" ter assassinado seu vizinho, resolve iniciar uma nova investigação que vai servir de material para uma segunda parte do podcast que a transformou em uma verdadeira sensação nacional. Para isso ela tem que encarar o homem que ela ajudou a colocar atrás das grades e todos os personagens que estavam envolvidos nesse caso há 19 anos atrás. Confira o trailer legendado:

A série é muito bem produzida e embora tenha alguns problemas de roteiro (que vamos explicar mais abaixo), o resultado é muito satisfatório para quem gosta de histórias de investigação (e mostra o tamanho do potencial que a protagonista tem). Como todas as séries da AppleTV+ que analisamos até agora, "Verdade seja dita" precisa de alguns ajustes para decolar, mas mesmo com todos os vacilos dessa primeira temporada, temos 8 episódios (de 45 minutos) dinâmicos e que nos prendem até o final.

Para começar, é preciso dizer que "Verdade seja dita" nasceu como série, mas sua estrutura é de minissérie e com isso a Apple, ao lado da produtora (queridinha dos streamings) Reese Witherspoon, transformou sua primeira temporada em uma antologia - aquelas histórias com começo, meio e fim, mas que tem uma segunda temporada focada em um determinado personagem ou conceito narrativo para criar uma unidade. Nesse caso, a próxima trama continua com Parnell (Octavia Spencer) como protagonista produzindo conteúdo para seu famoso podcast só que investigando um outro crime. Segunda temporada que, aliás, já está confirmada!

Ao se afastar do livro "Are You Sleeping" onde Warren Cave (Aaron Paul) é o protagonista e assumir que Parnell será a responsável por conduzir a série, a criadora Nichelle D. Tramble (The Good Wife) surfa na similaridade do sucesso em podcast "Serial", comandado por Sarah Koenig*, mas se perde ao querer construir uma protagonista complexa com sub tramas sem uma grande relevância nessa primeira temporada - como a relação dela com o marido e com a família, especificamente com o pai doente. Com tantas distrações, a roteiro entrega uma trama morna - a vida de Cave na prisão é completamente dispensável. Sua relação com o nazismo cria um desconforto, mas é muito mal aproveitada. Mas o pior é a forma como as resoluções vão acontecendo sem muita preparação, explicação e até sem criar uma progressão dramática que se sustente até o final. Um dos pontos fortes do roteiro, na verdade acaba enfraquecendo a história - por mais paradoxal que possa parecer: ao ter a coragem de ir eliminando alguns personagens muito rapidamente, ela acaba não se aprofundando nos seus dramas pessoais e atitudes dos suspeitos, e com isso muitas lacunas ficam abertas - aqui cabe uma observação: a criadora da série é da escola de Shonda Rhimes (Get Away with Murder) o que justifica esse padrão de escrita!

O diretor dinamarquês Mikkel Nørgaard, embora tenha dirigido 3 episódios, criou toda uma atmosfera visual, trazendo muito da escola nórdica para o projeto. Diretor do excelente "Borgen", Nørgaard liderou mais quatro diretores com maestria, entregando uma unidade estética e, principalmente, uma qualidade irretocável para a série - nível HBO, eu diria. A fotografia, também dividida entre 4 diretores, segue o mesmo nível da direção e, claro, no elenco, Octavia Spencer está irretocável. Já Aaron Paul sofre demais com os problemas do roteiro e por isso não teve chance de mostrar seu trabalho como poderia, mas duas cenas valem sua atenção: quando ele conversa com sua mãe (Elizabeth Perkins) na cadeia e quando ele confronta Lanie (Lizzy Caplan) sobre a carta que ela mandou para ele. Reparem porque vale muito a pena!

Resumindo, "Verdade seja dita" é uma série boa, mas tem espaço para melhorar muito se o roteiro for desenvolvido com mais cuidado. Tecnicamente a série é perfeita, com uma produção de altíssimo nível, como, alias, todas da AppleTV+ lançadas até o momento. Eu indico tranquilamente por uma primeira temporada bem honesta e por uma segunda que promete ajustar o ritmo e acertar na narrativa!

*No podcast, a jornalista americana investigou novamente o caso de Adnan Syed, condenado à prisão perpétua por estrangular a ex-namorada em 1999. Ele jura inocência e Koenig jogou novas luzes sobre a tragédia.

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"Truth Be Told" (título original) chegou para ser uma espécie de "Big Little Liars" (HBO) do serviço de streaming da Apple e acabou se misturando com o conceito de "The Sinner"(Netflix). Na minha opinião, o resultado dramático que a série entregou está abaixo dessas duas referências diretas - embora o final tenha até uma certa originalidade, os suspeitos de "Verdade seja dita" vão sendo eliminados precocemente, diminuindo cada vez mais o mistério até sobrar o óbvio e isso atrapalha um pouco nossa experiência se fizermos a comparação com várias outras séries do gênero.

"Verdade seja dita" é uma adaptação do romance deKathleen Barber, "Are You Sleeping", que acompanha a jornada da podcaster Poppy Parnell (Octavia Spencer) que, ao descobrir novas evidências de que Warren Cave (Aaron Paul) pode ter ido para a cadeia por engano após "supostamente" ter assassinado seu vizinho, resolve iniciar uma nova investigação que vai servir de material para uma segunda parte do podcast que a transformou em uma verdadeira sensação nacional. Para isso ela tem que encarar o homem que ela ajudou a colocar atrás das grades e todos os personagens que estavam envolvidos nesse caso há 19 anos atrás. Confira o trailer legendado:

A série é muito bem produzida e embora tenha alguns problemas de roteiro (que vamos explicar mais abaixo), o resultado é muito satisfatório para quem gosta de histórias de investigação (e mostra o tamanho do potencial que a protagonista tem). Como todas as séries da AppleTV+ que analisamos até agora, "Verdade seja dita" precisa de alguns ajustes para decolar, mas mesmo com todos os vacilos dessa primeira temporada, temos 8 episódios (de 45 minutos) dinâmicos e que nos prendem até o final.

Para começar, é preciso dizer que "Verdade seja dita" nasceu como série, mas sua estrutura é de minissérie e com isso a Apple, ao lado da produtora (queridinha dos streamings) Reese Witherspoon, transformou sua primeira temporada em uma antologia - aquelas histórias com começo, meio e fim, mas que tem uma segunda temporada focada em um determinado personagem ou conceito narrativo para criar uma unidade. Nesse caso, a próxima trama continua com Parnell (Octavia Spencer) como protagonista produzindo conteúdo para seu famoso podcast só que investigando um outro crime. Segunda temporada que, aliás, já está confirmada!

Ao se afastar do livro "Are You Sleeping" onde Warren Cave (Aaron Paul) é o protagonista e assumir que Parnell será a responsável por conduzir a série, a criadora Nichelle D. Tramble (The Good Wife) surfa na similaridade do sucesso em podcast "Serial", comandado por Sarah Koenig*, mas se perde ao querer construir uma protagonista complexa com sub tramas sem uma grande relevância nessa primeira temporada - como a relação dela com o marido e com a família, especificamente com o pai doente. Com tantas distrações, a roteiro entrega uma trama morna - a vida de Cave na prisão é completamente dispensável. Sua relação com o nazismo cria um desconforto, mas é muito mal aproveitada. Mas o pior é a forma como as resoluções vão acontecendo sem muita preparação, explicação e até sem criar uma progressão dramática que se sustente até o final. Um dos pontos fortes do roteiro, na verdade acaba enfraquecendo a história - por mais paradoxal que possa parecer: ao ter a coragem de ir eliminando alguns personagens muito rapidamente, ela acaba não se aprofundando nos seus dramas pessoais e atitudes dos suspeitos, e com isso muitas lacunas ficam abertas - aqui cabe uma observação: a criadora da série é da escola de Shonda Rhimes (Get Away with Murder) o que justifica esse padrão de escrita!

O diretor dinamarquês Mikkel Nørgaard, embora tenha dirigido 3 episódios, criou toda uma atmosfera visual, trazendo muito da escola nórdica para o projeto. Diretor do excelente "Borgen", Nørgaard liderou mais quatro diretores com maestria, entregando uma unidade estética e, principalmente, uma qualidade irretocável para a série - nível HBO, eu diria. A fotografia, também dividida entre 4 diretores, segue o mesmo nível da direção e, claro, no elenco, Octavia Spencer está irretocável. Já Aaron Paul sofre demais com os problemas do roteiro e por isso não teve chance de mostrar seu trabalho como poderia, mas duas cenas valem sua atenção: quando ele conversa com sua mãe (Elizabeth Perkins) na cadeia e quando ele confronta Lanie (Lizzy Caplan) sobre a carta que ela mandou para ele. Reparem porque vale muito a pena!

Resumindo, "Verdade seja dita" é uma série boa, mas tem espaço para melhorar muito se o roteiro for desenvolvido com mais cuidado. Tecnicamente a série é perfeita, com uma produção de altíssimo nível, como, alias, todas da AppleTV+ lançadas até o momento. Eu indico tranquilamente por uma primeira temporada bem honesta e por uma segunda que promete ajustar o ritmo e acertar na narrativa!

*No podcast, a jornalista americana investigou novamente o caso de Adnan Syed, condenado à prisão perpétua por estrangular a ex-namorada em 1999. Ele jura inocência e Koenig jogou novas luzes sobre a tragédia.

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Virada no Jogo

O cenário político sempre foi terreno fértil para histórias fascinantes, e o filme "Virada no Jogo" não foge à regra - eu diria que é uma espécie de "House of Cards" da vida real. Essa é um história que provavelmente você não conhece, mas posso te garantir que o filme dirigido pelo talentoso Jay Roach (de "O Escândalo"), não apenas captura a essência eletrizante de uma campanha presidencial dos EUA, como também oferece uma visão única sobre os bastidores da eleição de 2008, após a entrada de Sarah Palin na chapa de John McCain. Se você é daqueles que não perdem um bom drama político, vai tranquilo para o play que você não vai se decepcionar!

"Game Change" (no original) nos apresenta o dilema enfrentado pela equipe que cuidava da campanha presidencial republicana após uma escolha surpreendente: apresentar Sarah Palin (Julianne Moore) como candidata a vice-presidente dos EUA. Steve Schmidt (Woody Harrelson) lidera uma equipe que se vê diante dos desafios de gerenciar a imagem pública de Palin, uma mulher extremamente carismática, mas visivelmente despreparada (tecnicamente e emocionalmente) para assumir o desafio de ajudar McCain a vencer Barak Obama em 2008. Confira o trailer (em inglês):

Mesmo chancelada por 12 indicações ao Emmy de 2012 (com 5 vitórias, inclusive na categoria de "Melhor Filme para TV"), é impossível não ressaltar a habilidade de Roach em construir uma narrativa capaz de nos colocar diante de toda aquela intensidade (e complexidade) de uma campanha presidencial. Se em "House of Cards" esse plot se confundia com as peripécias de seu protagonista, aqui a dinâmica não é muito diferente mesmo se tratando de uma história real. É muito interessante como o premiado roteiro de Danny Strong (de "Dopesick"), baseado no livro de Mark Halperin e John Heilemann, transcende as barreiras do drama político e oferece uma perspectiva mais íntima e cativante dos personagens - o caos psicológico de Palin, de motivo de chacotas à postulante a ser a segunda pessoa mais poderosa do mundo, é realmente a cereja do bolo de  "Virada no Jogo".

Aliás, a interpretação brilhante de Moore merece sua atenção. Ela não apenas se assemelha fisicamente a Palin, mas também é capaz de replicar essa dualidade de humor e de aceitação, tão comuns em uma disputa cheia de pressão e, claro, de hipocrisia - o processo de transformação da protagonista ao se ver diante de tanto poder, é sensacional. Por outro lado, Moore nos proporciona uma visão humana e multidimensional de uma figura pública despreparada, sem soar estereotipada demais. Woody Harrelson, Sarah Paulson e Ed Harris também merecem elogios e prêmios - saiba que esse foi o elenco mais vencedor na temporada de premiação de 2012. Moore, por exemplo, ganhou o Emmy, o Globo de Ouro, o Satellite Awards, o Screen Actors Guild Awards, o Critics Choice Television Awards e por aí vai.

Com uma direção magistral ao guiar seus atores nessa exploração de nuances emocionais, Roach é capaz de elevar a narrativa para um outro patamar e fazer de "Virada no Jogo" mais um "achado" dessa era de streaming que possivelmente passou batido por muita gente até aqui. Uma jornada complexa e verdadeira que nos leva a refletir sobre os altos custos emocionais da vida publica, do cenário político e da luta por poder, em um universo onde o peso das decisões tomadas faz toda diferença no resultado final de uma eleição. Tenha certeza que essa é uma obra que não apenas entretém, mas que também provoca uma análise profunda sobre o ego, sobre o propósito e sobre o momento em que ambos se confundem.

Vale muito o seu play!

Assista Agora

O cenário político sempre foi terreno fértil para histórias fascinantes, e o filme "Virada no Jogo" não foge à regra - eu diria que é uma espécie de "House of Cards" da vida real. Essa é um história que provavelmente você não conhece, mas posso te garantir que o filme dirigido pelo talentoso Jay Roach (de "O Escândalo"), não apenas captura a essência eletrizante de uma campanha presidencial dos EUA, como também oferece uma visão única sobre os bastidores da eleição de 2008, após a entrada de Sarah Palin na chapa de John McCain. Se você é daqueles que não perdem um bom drama político, vai tranquilo para o play que você não vai se decepcionar!

"Game Change" (no original) nos apresenta o dilema enfrentado pela equipe que cuidava da campanha presidencial republicana após uma escolha surpreendente: apresentar Sarah Palin (Julianne Moore) como candidata a vice-presidente dos EUA. Steve Schmidt (Woody Harrelson) lidera uma equipe que se vê diante dos desafios de gerenciar a imagem pública de Palin, uma mulher extremamente carismática, mas visivelmente despreparada (tecnicamente e emocionalmente) para assumir o desafio de ajudar McCain a vencer Barak Obama em 2008. Confira o trailer (em inglês):

Mesmo chancelada por 12 indicações ao Emmy de 2012 (com 5 vitórias, inclusive na categoria de "Melhor Filme para TV"), é impossível não ressaltar a habilidade de Roach em construir uma narrativa capaz de nos colocar diante de toda aquela intensidade (e complexidade) de uma campanha presidencial. Se em "House of Cards" esse plot se confundia com as peripécias de seu protagonista, aqui a dinâmica não é muito diferente mesmo se tratando de uma história real. É muito interessante como o premiado roteiro de Danny Strong (de "Dopesick"), baseado no livro de Mark Halperin e John Heilemann, transcende as barreiras do drama político e oferece uma perspectiva mais íntima e cativante dos personagens - o caos psicológico de Palin, de motivo de chacotas à postulante a ser a segunda pessoa mais poderosa do mundo, é realmente a cereja do bolo de  "Virada no Jogo".

Aliás, a interpretação brilhante de Moore merece sua atenção. Ela não apenas se assemelha fisicamente a Palin, mas também é capaz de replicar essa dualidade de humor e de aceitação, tão comuns em uma disputa cheia de pressão e, claro, de hipocrisia - o processo de transformação da protagonista ao se ver diante de tanto poder, é sensacional. Por outro lado, Moore nos proporciona uma visão humana e multidimensional de uma figura pública despreparada, sem soar estereotipada demais. Woody Harrelson, Sarah Paulson e Ed Harris também merecem elogios e prêmios - saiba que esse foi o elenco mais vencedor na temporada de premiação de 2012. Moore, por exemplo, ganhou o Emmy, o Globo de Ouro, o Satellite Awards, o Screen Actors Guild Awards, o Critics Choice Television Awards e por aí vai.

Com uma direção magistral ao guiar seus atores nessa exploração de nuances emocionais, Roach é capaz de elevar a narrativa para um outro patamar e fazer de "Virada no Jogo" mais um "achado" dessa era de streaming que possivelmente passou batido por muita gente até aqui. Uma jornada complexa e verdadeira que nos leva a refletir sobre os altos custos emocionais da vida publica, do cenário político e da luta por poder, em um universo onde o peso das decisões tomadas faz toda diferença no resultado final de uma eleição. Tenha certeza que essa é uma obra que não apenas entretém, mas que também provoca uma análise profunda sobre o ego, sobre o propósito e sobre o momento em que ambos se confundem.

Vale muito o seu play!

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Vítima Invisível - O Caso de Eliza Samudio

Na linha de "Isabella: O Caso Nardoni" e "Elize Matsunaga: Era Uma Vez Um Crime", a Netflix lança mais um documentário, dessa vez para contar a história bizarra por traz do desaparecimento de Eliza Samudio. "Vítima Invisível", dirigido pela Juliana Antunes, revisita um dos casos criminais mais chocantes de nossa história recente, o assassinato de Eliza Samudio, onde o principal suspeito era o então goleiro do Flamengo e estrela em ascensão, Bruno Fernandes. O interessante aqui é que a narrativa vai além da mera reconstrução dos eventos que levaram ao desaparecimento de Eliza, oferecendo uma análise crítica sobre a violência de gênero, a invisibilidade das vítimas de feminicídio e as falhas sistêmicas da justiça e da sociedade na proteção dessas mulheres.

O caso de Eliza Samudio, ocorrido em 2010, envolveu um crime brutal que recebeu enorme cobertura da mídia e abalou o Brasil. Eliza era mãe de um filho com Bruno, que inicialmente se recusava a reconhecer a paternidade da criança. Após uma série de ameaças e violência, Eliza desapareceu, e a investigação subsequente apontou para o envolvimento direto do "goleiro Bruno" no crime. O corpo de Eliza nunca foi encontrado, e as circunstâncias de sua morte continuam envoltas em mistério. O documentário explora esse contexto, mas não se limita aos fatos já amplamente divulgados pela imprensa, em vez disso, Antunes busca dar voz à própria Eliza através de mensagens que ela mesmo trocava com um amigo pelo computador, além de inúmeras imagens de arquivo que ajudam a construir esse drama. Confira o trailer:

A abordagem de Juliana Antunes em "Vítima Invisível - O Caso de Eliza Samudio" é sóbria e reflexiva. O filme evita o sensacionalismo que muitas vezes cerca casos de grande repercussão midiática e foca no impacto humano e emocional dessa história em quem viveu ela de perto - especialmente sua mãe, Sonia Moura, e o delegado responsável pelo caso, Edson Moreira da Silva. Mas Antunes não para por aí, ao dar destaque para opiniões de especialistas em violência de gênero, advogados e jornalistas, o documentário ainda contextualiza o crime dentro de uma narrativa maior sobre os altos índices de feminicídio no Brasil e a normalização da violência contra as mulheres em tempos de redes sociais, especialmente quando seu autor é uma celebridade.

Um dos aspectos mais poderosos aqui, é preciso que se diga, é a forma como Antunes reconstrói a imagem de Eliza Samudio. Muitas vezes retratada pela mídia de forma superficial, ora como uma oportunista ora como vítima, cuja história pessoal foi transformada em entretenimento, o documentário busca humanizar Eliza, independente de suas escolhas durante a vida - o roteiro acaba revelando suas aspirações, seu histórico familiar, seu papel como mãe e suas tentativas desesperadas de escapar de uma situação de violência. O título, "Vítima Invisível", faz referência à forma como a vida de Eliza foi, em muitos aspectos, ignorada e minimizada tanto pelo sistema judicial quanto pela sociedade em geral, até que ela se tornou mais uma ponto estatístico de um crime hediondo. É um fato que a direção de Antunes é marcada pela sensibilidade com que trata o tema - ela intercala entrevistas atuais, com imagens de arquivo e recriações simbólicas dos eventos, o que cria, propositalmente, uma atmosfera de empatia e respeito pela memória de Eliza, mas acreditem, mesmo assim, é difícil não julgar.

Outro ponto forte do documentário é a análise crítica da cobertura midiática do caso. O filme destaca como a mídia explorou "a história de amor" entre Bruno e sua amante para atrair audiência, muitas vezes sensacionalizando o caso e desumanizando Eliza mesmo antes de sua morte - ao invés de focar na gravidade da violência que ela sofria e na necessidade de ações preventivas para protege-la. Eliza chegou a ter uma medida protetiva negada por uma juíza. No entanto, um elemento dramático pode frustrar a audiência: a ausência de respostas definitivas sobre o destino de Eliza. Como o corpo dela nunca foi encontrado e alguns detalhes do crime permanecem incertos mesmo depois do julgamento, o documentário inevitavelmente deixa lacunas, refletindo a própria complexidade e incerteza do caso. Nesse sentido, as cenas no tribunal são muito interessantes como análise, mas as informações que você vai encontrar na sua tela após o final do documentário, essas sim vão explodir sua cabeça e dar a exata noção do mundo em que vivemos. Prestem atenção nos nomes em questão!

"Vítima Invisível - O Caso de Eliza Samudio" é um documentário poderoso e necessário que vai além do sensacionalismo em torno de um crime brutal para oferecer uma reflexão profunda sobre a violência de gênero e as falhas sistêmicas que perpetuam esse ciclo. pode acreditar, vai valer o seu play!

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Na linha de "Isabella: O Caso Nardoni" e "Elize Matsunaga: Era Uma Vez Um Crime", a Netflix lança mais um documentário, dessa vez para contar a história bizarra por traz do desaparecimento de Eliza Samudio. "Vítima Invisível", dirigido pela Juliana Antunes, revisita um dos casos criminais mais chocantes de nossa história recente, o assassinato de Eliza Samudio, onde o principal suspeito era o então goleiro do Flamengo e estrela em ascensão, Bruno Fernandes. O interessante aqui é que a narrativa vai além da mera reconstrução dos eventos que levaram ao desaparecimento de Eliza, oferecendo uma análise crítica sobre a violência de gênero, a invisibilidade das vítimas de feminicídio e as falhas sistêmicas da justiça e da sociedade na proteção dessas mulheres.

O caso de Eliza Samudio, ocorrido em 2010, envolveu um crime brutal que recebeu enorme cobertura da mídia e abalou o Brasil. Eliza era mãe de um filho com Bruno, que inicialmente se recusava a reconhecer a paternidade da criança. Após uma série de ameaças e violência, Eliza desapareceu, e a investigação subsequente apontou para o envolvimento direto do "goleiro Bruno" no crime. O corpo de Eliza nunca foi encontrado, e as circunstâncias de sua morte continuam envoltas em mistério. O documentário explora esse contexto, mas não se limita aos fatos já amplamente divulgados pela imprensa, em vez disso, Antunes busca dar voz à própria Eliza através de mensagens que ela mesmo trocava com um amigo pelo computador, além de inúmeras imagens de arquivo que ajudam a construir esse drama. Confira o trailer:

A abordagem de Juliana Antunes em "Vítima Invisível - O Caso de Eliza Samudio" é sóbria e reflexiva. O filme evita o sensacionalismo que muitas vezes cerca casos de grande repercussão midiática e foca no impacto humano e emocional dessa história em quem viveu ela de perto - especialmente sua mãe, Sonia Moura, e o delegado responsável pelo caso, Edson Moreira da Silva. Mas Antunes não para por aí, ao dar destaque para opiniões de especialistas em violência de gênero, advogados e jornalistas, o documentário ainda contextualiza o crime dentro de uma narrativa maior sobre os altos índices de feminicídio no Brasil e a normalização da violência contra as mulheres em tempos de redes sociais, especialmente quando seu autor é uma celebridade.

Um dos aspectos mais poderosos aqui, é preciso que se diga, é a forma como Antunes reconstrói a imagem de Eliza Samudio. Muitas vezes retratada pela mídia de forma superficial, ora como uma oportunista ora como vítima, cuja história pessoal foi transformada em entretenimento, o documentário busca humanizar Eliza, independente de suas escolhas durante a vida - o roteiro acaba revelando suas aspirações, seu histórico familiar, seu papel como mãe e suas tentativas desesperadas de escapar de uma situação de violência. O título, "Vítima Invisível", faz referência à forma como a vida de Eliza foi, em muitos aspectos, ignorada e minimizada tanto pelo sistema judicial quanto pela sociedade em geral, até que ela se tornou mais uma ponto estatístico de um crime hediondo. É um fato que a direção de Antunes é marcada pela sensibilidade com que trata o tema - ela intercala entrevistas atuais, com imagens de arquivo e recriações simbólicas dos eventos, o que cria, propositalmente, uma atmosfera de empatia e respeito pela memória de Eliza, mas acreditem, mesmo assim, é difícil não julgar.

Outro ponto forte do documentário é a análise crítica da cobertura midiática do caso. O filme destaca como a mídia explorou "a história de amor" entre Bruno e sua amante para atrair audiência, muitas vezes sensacionalizando o caso e desumanizando Eliza mesmo antes de sua morte - ao invés de focar na gravidade da violência que ela sofria e na necessidade de ações preventivas para protege-la. Eliza chegou a ter uma medida protetiva negada por uma juíza. No entanto, um elemento dramático pode frustrar a audiência: a ausência de respostas definitivas sobre o destino de Eliza. Como o corpo dela nunca foi encontrado e alguns detalhes do crime permanecem incertos mesmo depois do julgamento, o documentário inevitavelmente deixa lacunas, refletindo a própria complexidade e incerteza do caso. Nesse sentido, as cenas no tribunal são muito interessantes como análise, mas as informações que você vai encontrar na sua tela após o final do documentário, essas sim vão explodir sua cabeça e dar a exata noção do mundo em que vivemos. Prestem atenção nos nomes em questão!

"Vítima Invisível - O Caso de Eliza Samudio" é um documentário poderoso e necessário que vai além do sensacionalismo em torno de um crime brutal para oferecer uma reflexão profunda sobre a violência de gênero e as falhas sistêmicas que perpetuam esse ciclo. pode acreditar, vai valer o seu play!

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Volta Priscila

Da mesma forma que eu disse que "Pacto Brutal: O Assassinato de Daniella Perez"era uma minissérie dura de assistir, daquelas que precisamos parar e respirar em várias passagens, certamente em "Volta Priscila" a condição será a mesma - esses quatro episódios vão dilacerar o seu coração! Dirigida por Eduardo Rajabally e Bruna Rodrigues para o Disney+, "Volta Priscila" explora o misterioso e ainda não resolvido desaparecimento de Priscila Belfort, irmã do lutador de MMA Vitor Belfort. A produção traz uma abordagem sensível e cuidadosa sobre o caso, equilibrando o impacto emocional da tragédia familiar com uma análise investigativa dos eventos que levaram ao desaparecimento de Priscila em 2004. "Volta Priscila" não apenas revisita o caso, mas também lança luz sobre questões mais delicadas como as imposições nas relações familiares e o impacto da depressão na vida das pessoas.

A minissérie conta com entrevistas com familiares, amigos e envolvidos no processo que relembram os eventos em torno do desaparecimento de Priscila. Ela desapareceu em plena luz do dia no centro do Rio de Janeiro, e, apesar dos esforços incansáveis de sua família e de investigações, seu paradeiro ainda permanece desconhecido. O foco emocional da minissérie está em Jovita Belfort, que desde o desaparecimento da filha se tornou uma voz ativa na busca por respostas. Confira o trailer:

Inegavelmente que Rajabally e Rodrigues optam por uma abordagem delicada e respeitosa ao levantar algumas questões sobre o desaparecimento de Priscila - isso de fato impacta na nossa experiência como audiência já faltam provocações. Ao dar o play você não vai encontrar grandes novidades sobre o caso, mas vai entender perfeitamente todo o contexto familiar, pessoal e investigativo que deixaram muito mais perguntas do que respostas. Ao mesmo tempo que utilizam de recursos documentais tradicionais, como entrevistas e imagens de arquivo, a direção consegue entregar uma narrativa eficaz intercalando o passado e o presente, mas principalmente o intimo e o especulativo. Veja, com os depoimentos de Jovina, de Vitor, de Joana Prado e de algumas amigas de Priscila, temos um olhar humano e sincero do impacto devastador do desaparecimento em suas vidas. Os depoimentos de Joana, por exemplo, são especialmente tocantes, transmitindo a dor, a frustração e a esperança que perdura na família quase duas décadas depois, mas com um tom um pouco mais racional (mesmo que cheio de emoção).

Já quando minissérie explora o desaparecimento de Priscila em um cenário mais amplo, tentando analisar as falhas durante a investigação e como a mídia lidou com o caso, entendemos exatamente como algumas questões, especialmente institucionais, dificultam a busca por pessoas desaparecidas no país - minha crítica é pelo fato de não existir uma imersão tão evidente em alguns pontos sensíveis que facilmente percebemos durante a minissérie. A relação do pai de Priscila com o pai do namorado de sua filha, por exemplo, não é explorado, apenas citado. Aliás, só sabemos que a família desse namorado de Priscila é poderosa, mas não sabemos nem quem é e nem o que fazem (e consigo imaginar a razão)! Ao citar outras linhas de investigação durante esses "quase vinte anos", por outro lado, temos uma noção bem dolorosa de como é difícil lidar com as especulações e com a falta de humanidade das pessoas em um momento tão difícil. Em uma passagem do documentário, Vitor Belfort chega a falar abertamente sobre a dor permanente que a família enfrenta por ter que lidar com as respostas erradas diariamente: “Ontem meus pais enterraram minha irmã. Hoje temos que enterrar minha irmã de novo. É um enterro diário. É assim há 20 anos”!

Embora as investigações tenham chegado a vários becos sem saída, "Volta Priscila" foi inteligente ao revisitar alguns eventos, levantar algumas hipóteses e até discutir teorias que foram exploradas ao longo dos anos. Ao fazer isso, a minissérie nos mantém ligados, o tom de mistério nos acompanha e, sem sensacionalismo, cria uma abordagem interessante sobre o todo. Sim, eu sei que a falta de uma conclusão definitiva soa frustrante, dada a natureza não resolvida do caso, mas mais do que o aspecto "true crime" da narrativa, o recorte emocional é ainda mais potente - pode deixar uma sensação de vazio e talvez seja essa a razão que a torna interessante como conceito: tentar replicar 1% da dor que é viver com a incerteza! Funciona!

Vale muito o seu play!

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Da mesma forma que eu disse que "Pacto Brutal: O Assassinato de Daniella Perez"era uma minissérie dura de assistir, daquelas que precisamos parar e respirar em várias passagens, certamente em "Volta Priscila" a condição será a mesma - esses quatro episódios vão dilacerar o seu coração! Dirigida por Eduardo Rajabally e Bruna Rodrigues para o Disney+, "Volta Priscila" explora o misterioso e ainda não resolvido desaparecimento de Priscila Belfort, irmã do lutador de MMA Vitor Belfort. A produção traz uma abordagem sensível e cuidadosa sobre o caso, equilibrando o impacto emocional da tragédia familiar com uma análise investigativa dos eventos que levaram ao desaparecimento de Priscila em 2004. "Volta Priscila" não apenas revisita o caso, mas também lança luz sobre questões mais delicadas como as imposições nas relações familiares e o impacto da depressão na vida das pessoas.

A minissérie conta com entrevistas com familiares, amigos e envolvidos no processo que relembram os eventos em torno do desaparecimento de Priscila. Ela desapareceu em plena luz do dia no centro do Rio de Janeiro, e, apesar dos esforços incansáveis de sua família e de investigações, seu paradeiro ainda permanece desconhecido. O foco emocional da minissérie está em Jovita Belfort, que desde o desaparecimento da filha se tornou uma voz ativa na busca por respostas. Confira o trailer:

Inegavelmente que Rajabally e Rodrigues optam por uma abordagem delicada e respeitosa ao levantar algumas questões sobre o desaparecimento de Priscila - isso de fato impacta na nossa experiência como audiência já faltam provocações. Ao dar o play você não vai encontrar grandes novidades sobre o caso, mas vai entender perfeitamente todo o contexto familiar, pessoal e investigativo que deixaram muito mais perguntas do que respostas. Ao mesmo tempo que utilizam de recursos documentais tradicionais, como entrevistas e imagens de arquivo, a direção consegue entregar uma narrativa eficaz intercalando o passado e o presente, mas principalmente o intimo e o especulativo. Veja, com os depoimentos de Jovina, de Vitor, de Joana Prado e de algumas amigas de Priscila, temos um olhar humano e sincero do impacto devastador do desaparecimento em suas vidas. Os depoimentos de Joana, por exemplo, são especialmente tocantes, transmitindo a dor, a frustração e a esperança que perdura na família quase duas décadas depois, mas com um tom um pouco mais racional (mesmo que cheio de emoção).

Já quando minissérie explora o desaparecimento de Priscila em um cenário mais amplo, tentando analisar as falhas durante a investigação e como a mídia lidou com o caso, entendemos exatamente como algumas questões, especialmente institucionais, dificultam a busca por pessoas desaparecidas no país - minha crítica é pelo fato de não existir uma imersão tão evidente em alguns pontos sensíveis que facilmente percebemos durante a minissérie. A relação do pai de Priscila com o pai do namorado de sua filha, por exemplo, não é explorado, apenas citado. Aliás, só sabemos que a família desse namorado de Priscila é poderosa, mas não sabemos nem quem é e nem o que fazem (e consigo imaginar a razão)! Ao citar outras linhas de investigação durante esses "quase vinte anos", por outro lado, temos uma noção bem dolorosa de como é difícil lidar com as especulações e com a falta de humanidade das pessoas em um momento tão difícil. Em uma passagem do documentário, Vitor Belfort chega a falar abertamente sobre a dor permanente que a família enfrenta por ter que lidar com as respostas erradas diariamente: “Ontem meus pais enterraram minha irmã. Hoje temos que enterrar minha irmã de novo. É um enterro diário. É assim há 20 anos”!

Embora as investigações tenham chegado a vários becos sem saída, "Volta Priscila" foi inteligente ao revisitar alguns eventos, levantar algumas hipóteses e até discutir teorias que foram exploradas ao longo dos anos. Ao fazer isso, a minissérie nos mantém ligados, o tom de mistério nos acompanha e, sem sensacionalismo, cria uma abordagem interessante sobre o todo. Sim, eu sei que a falta de uma conclusão definitiva soa frustrante, dada a natureza não resolvida do caso, mas mais do que o aspecto "true crime" da narrativa, o recorte emocional é ainda mais potente - pode deixar uma sensação de vazio e talvez seja essa a razão que a torna interessante como conceito: tentar replicar 1% da dor que é viver com a incerteza! Funciona!

Vale muito o seu play!

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Voo 370

"Voo 370: O Avião Que Desapareceu" é um documentário em três episódios dos mais interessantes, mas é preciso alinhar as expectativas antes do play: embora tenha a investigação do desaparecimento do avião da Malasya Airlines como foco principal, a força do roteiro gira mesmo em torno de três teorias (em diferentes níveis de possibilidades) sobre o que de fato pode ter acontecido naquela noite de 8 de março de 2014, no trajeto entre Malásia e China, e não nas respostas definitivas sobre o caso. E olha, te garanto, você vai se surpreendente com alguns pontos bem, digamos, misteriosos.

Quando o Boeing 777-200 da Malasya Airlines saiu do Aeroporto Internacional de Kuala Lumpur em direção ao Aeroporto Internacional de Pequim, tudo parecia bem - o clima era ótimo, a equipe experiente, o avião em perfeito estado; porém, 40 minutos após a decolagem, o avião simplesmente desapareceu dos radares sem deixar nenhum (nenhum mesmo) vestígio. A bordo estavam 239 pessoas, incluindo tripulação e passageiros. O caso não teve uma explicação aceitável dada pelas autoridades da Malásia e, até hoje, a caixa preta ou os restos mortais dos passageiros não foram encontrados. Confira o trailer:

Com direção de Louise Malkinson (do premiado "The Detectives: Murder on the Streets"), a minissérie da Netflix tenta conectar algumas das pontas soltas em um dos casos mais absurdos e curiosos da aviação moderna a partir de inúmeras entrevistas com os familiares das vítimas e especialistas em aviação, além de um trabalho excelente de pesquisa muito bem montado com várias imagens de arquivo e alguma dramatização, em um projeto que envolveu sete países durante toda a investigação.

Com roteiro da própria Malkinson, "Voo 370: O Avião Que Desapareceu" se apoia em três teorias (para muitos "da conspiração") para tentar explicar detalhes importantes relacionados ao caso - as duas primeiras de autoria do jornalista Jeff Wise e a terceira baseado na obra "The Disappearing Act: The Impossible Case of MH370" de Florence de Changy. Essa dinâmica narrativa cria um vínculo com o mistério que nos impede de parar de assistir entre um episódio e outro - veja, o primeiro episódio, "O Piloto", procura investigar uma forte teoria que colocava o piloto Zaharie Ahmad Shah como principal suspeito - algo como se ele fosse o responsável por um suicido em massa. Já em "O Sequestro", entrevistados analisam uma teoria menos palpável, onde o avião poderia ter sido derrubado por grupos militares ou terroristas russos. Finalmente no terceiro e último episódio, "A Interceptação", outra teoria analisada aponta que o Boeing carregaria uma carga militar e que os EUA teriam abatido o avião para que ele não chegasse em território chinês.

Obviamente que nas três teorias, elementos não fazem sentido ou pelos menos fica difícil de acreditar, mas também é inegável que, no mínimo, cada uma delas coloca uma pulga atrás da nossa orelha - e é essa a graça de assistir "MH370: The Plane That Disappeared"(no original), pode acreditar. Antes de finalizarmos, aqui cabe um aviso: o documentário vai mexer com suas emoções, ele é intrigante, em alguns momentos um pouco angustiante e praticamente em toda a jornada, bastante comovente; então esteja preparado!

Se você gostou de "Queda Livre: A Tragédia do Caso Boeing", "Risco de Voo" ou "Milagre do Rio Hudson", pode dar o play sem receio algum!

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"Voo 370: O Avião Que Desapareceu" é um documentário em três episódios dos mais interessantes, mas é preciso alinhar as expectativas antes do play: embora tenha a investigação do desaparecimento do avião da Malasya Airlines como foco principal, a força do roteiro gira mesmo em torno de três teorias (em diferentes níveis de possibilidades) sobre o que de fato pode ter acontecido naquela noite de 8 de março de 2014, no trajeto entre Malásia e China, e não nas respostas definitivas sobre o caso. E olha, te garanto, você vai se surpreendente com alguns pontos bem, digamos, misteriosos.

Quando o Boeing 777-200 da Malasya Airlines saiu do Aeroporto Internacional de Kuala Lumpur em direção ao Aeroporto Internacional de Pequim, tudo parecia bem - o clima era ótimo, a equipe experiente, o avião em perfeito estado; porém, 40 minutos após a decolagem, o avião simplesmente desapareceu dos radares sem deixar nenhum (nenhum mesmo) vestígio. A bordo estavam 239 pessoas, incluindo tripulação e passageiros. O caso não teve uma explicação aceitável dada pelas autoridades da Malásia e, até hoje, a caixa preta ou os restos mortais dos passageiros não foram encontrados. Confira o trailer:

Com direção de Louise Malkinson (do premiado "The Detectives: Murder on the Streets"), a minissérie da Netflix tenta conectar algumas das pontas soltas em um dos casos mais absurdos e curiosos da aviação moderna a partir de inúmeras entrevistas com os familiares das vítimas e especialistas em aviação, além de um trabalho excelente de pesquisa muito bem montado com várias imagens de arquivo e alguma dramatização, em um projeto que envolveu sete países durante toda a investigação.

Com roteiro da própria Malkinson, "Voo 370: O Avião Que Desapareceu" se apoia em três teorias (para muitos "da conspiração") para tentar explicar detalhes importantes relacionados ao caso - as duas primeiras de autoria do jornalista Jeff Wise e a terceira baseado na obra "The Disappearing Act: The Impossible Case of MH370" de Florence de Changy. Essa dinâmica narrativa cria um vínculo com o mistério que nos impede de parar de assistir entre um episódio e outro - veja, o primeiro episódio, "O Piloto", procura investigar uma forte teoria que colocava o piloto Zaharie Ahmad Shah como principal suspeito - algo como se ele fosse o responsável por um suicido em massa. Já em "O Sequestro", entrevistados analisam uma teoria menos palpável, onde o avião poderia ter sido derrubado por grupos militares ou terroristas russos. Finalmente no terceiro e último episódio, "A Interceptação", outra teoria analisada aponta que o Boeing carregaria uma carga militar e que os EUA teriam abatido o avião para que ele não chegasse em território chinês.

Obviamente que nas três teorias, elementos não fazem sentido ou pelos menos fica difícil de acreditar, mas também é inegável que, no mínimo, cada uma delas coloca uma pulga atrás da nossa orelha - e é essa a graça de assistir "MH370: The Plane That Disappeared"(no original), pode acreditar. Antes de finalizarmos, aqui cabe um aviso: o documentário vai mexer com suas emoções, ele é intrigante, em alguns momentos um pouco angustiante e praticamente em toda a jornada, bastante comovente; então esteja preparado!

Se você gostou de "Queda Livre: A Tragédia do Caso Boeing", "Risco de Voo" ou "Milagre do Rio Hudson", pode dar o play sem receio algum!

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Vórtex

"Vórtex" é um espécie de "Ghost" com "Black Mirror" e mais ótimos elementos de "Efeito Borboleta". Embora essa produção francesa de 2022 exija uma boa dose de suspensão da realidade, principalmente no que diz respeito ao viés tecnológico da história, posso te garantir que o entretenimento, de fato, vale muito a pena. A trama dividida em 6 episódios de 60 minutos, constrói sua base em cima de um consistente drama policial, porém sem esquecer da importância das relações humanas, familiar e de casal, para nos proporcionar uma experiência das mais interessantes a partir de um gatilho narrativo que sempre chama atenção da audiência: a viagem no tempo.  

Em um futuro próximo, no ano de 2025, a realidade virtual se tornou uma ferramenta comum nas investigações policiais. O procedimento é simples: uma equipe de drones escaneia a cena do crime e os detetives acessam essas informações em um espaço de realidade virtual para tentar encontrar novas pistas. Depois do corpo de uma mulher ser encontrado na praia, a história se concentra em Ludovic Beguin (Tomer Sisley), conhecido como Ludo, um policial da cidade francesa de Brest que, graças a uma falha nessa tecnologia chamada "vórtex", consegue se comunicar sua mulher,Mélanie (Camille Claris), que havia morrido, misteriosamente, em 1998, no mesmo local do crime atual. Confira on trailer (em francês):

Embora "Vórtex" esteja longe de ser um primor estético de ficção cientifica como "Minority Report", um dos aspectos mais notáveis da produção é a forma como diretor Slimane-Baptiste Berhoun é capaz de criar uma atmosfera sombria e envolvente desde as primeiras cenas mesmo com todas as suas limitações técnicas  - em um primeiro olhar, ele traz muito do conceito visual (e até narrativo) das séries nórdicas. Sua competente direção explora uma sensação constante de tensão e mistério, fazendo com que a audiência  se sinta tão intrigada quanto confusa, principalmente quando o "Efeito Borboleta" entra em cena. Reparem como tudo se encaixa e como os detalhes são pontuados com muita sensibilidade pelo texto, ou seja, ou você presta muita atenção ou sua teoria de "quem matou?" pode ser bastante prejudicada. 

Um ponto interessante da minissérie é como o roteiro de Camille Couasse e Sarah Farkas, baseado na história de Franck Thilliez, aborda temas mais profundos e até existenciais, explorando questões sobre destino e livre arbítrio ao mesmo tempo em que o texto trabalha o caso policial como um verdadeiro clássico do gênero. Já o viés tecnológico é fraco, mas importante para a narrativa. Por outro lado, à medida que a trama vai se desenrolando, somos confrontados com questionamentos sobre a natureza da realidade e os limites do conhecimento humano, adicionando ainda mais camadas aos personagens e complexidade para a narrativa - o plot investigativo é muito bem desenhado e vai te surpreender.

Apesar de todas as qualidades, "Vórtex" pode apresentar alguns momentos onde o ritmo mais lento, especialmente nos episódios iniciais, quando a trama está sendo estabelecida, possa incomodar. No entanto, isso é compensado pelo aumento constante da tensão e do mistério, que vai ganhando cada vez mais corpo com as reviravoltas que ocorrem nos episódios subsequentes. Outro incômodo diz respeito ao distanciamento natural da ficção científica - ele vira um drama de relação até chegar em um thriller policial. Tudo isso é bem dinâmico, mas acontece.

Enfim "Vórtex" é divertido e envolvente. Mais uma agradável supresa que certamente vai te conquistar! Pode dar o play sem receio!

PS: as referências à Copa do Mundo de 1998, podem causar algum desconforto para os amantes do futebol...rs

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"Vórtex" é um espécie de "Ghost" com "Black Mirror" e mais ótimos elementos de "Efeito Borboleta". Embora essa produção francesa de 2022 exija uma boa dose de suspensão da realidade, principalmente no que diz respeito ao viés tecnológico da história, posso te garantir que o entretenimento, de fato, vale muito a pena. A trama dividida em 6 episódios de 60 minutos, constrói sua base em cima de um consistente drama policial, porém sem esquecer da importância das relações humanas, familiar e de casal, para nos proporcionar uma experiência das mais interessantes a partir de um gatilho narrativo que sempre chama atenção da audiência: a viagem no tempo.  

Em um futuro próximo, no ano de 2025, a realidade virtual se tornou uma ferramenta comum nas investigações policiais. O procedimento é simples: uma equipe de drones escaneia a cena do crime e os detetives acessam essas informações em um espaço de realidade virtual para tentar encontrar novas pistas. Depois do corpo de uma mulher ser encontrado na praia, a história se concentra em Ludovic Beguin (Tomer Sisley), conhecido como Ludo, um policial da cidade francesa de Brest que, graças a uma falha nessa tecnologia chamada "vórtex", consegue se comunicar sua mulher,Mélanie (Camille Claris), que havia morrido, misteriosamente, em 1998, no mesmo local do crime atual. Confira on trailer (em francês):

Embora "Vórtex" esteja longe de ser um primor estético de ficção cientifica como "Minority Report", um dos aspectos mais notáveis da produção é a forma como diretor Slimane-Baptiste Berhoun é capaz de criar uma atmosfera sombria e envolvente desde as primeiras cenas mesmo com todas as suas limitações técnicas  - em um primeiro olhar, ele traz muito do conceito visual (e até narrativo) das séries nórdicas. Sua competente direção explora uma sensação constante de tensão e mistério, fazendo com que a audiência  se sinta tão intrigada quanto confusa, principalmente quando o "Efeito Borboleta" entra em cena. Reparem como tudo se encaixa e como os detalhes são pontuados com muita sensibilidade pelo texto, ou seja, ou você presta muita atenção ou sua teoria de "quem matou?" pode ser bastante prejudicada. 

Um ponto interessante da minissérie é como o roteiro de Camille Couasse e Sarah Farkas, baseado na história de Franck Thilliez, aborda temas mais profundos e até existenciais, explorando questões sobre destino e livre arbítrio ao mesmo tempo em que o texto trabalha o caso policial como um verdadeiro clássico do gênero. Já o viés tecnológico é fraco, mas importante para a narrativa. Por outro lado, à medida que a trama vai se desenrolando, somos confrontados com questionamentos sobre a natureza da realidade e os limites do conhecimento humano, adicionando ainda mais camadas aos personagens e complexidade para a narrativa - o plot investigativo é muito bem desenhado e vai te surpreender.

Apesar de todas as qualidades, "Vórtex" pode apresentar alguns momentos onde o ritmo mais lento, especialmente nos episódios iniciais, quando a trama está sendo estabelecida, possa incomodar. No entanto, isso é compensado pelo aumento constante da tensão e do mistério, que vai ganhando cada vez mais corpo com as reviravoltas que ocorrem nos episódios subsequentes. Outro incômodo diz respeito ao distanciamento natural da ficção científica - ele vira um drama de relação até chegar em um thriller policial. Tudo isso é bem dinâmico, mas acontece.

Enfim "Vórtex" é divertido e envolvente. Mais uma agradável supresa que certamente vai te conquistar! Pode dar o play sem receio!

PS: as referências à Copa do Mundo de 1998, podem causar algum desconforto para os amantes do futebol...rs

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Vulcão Whakaari

Assistir o documentário produzido pelo Leonardo DiCaprio, "Vulcão Whakaari" (que no Brasil ganhou o subtítulo "Resgate na Nova Zelândia"), definitivamente não é uma jornada das mais tranquilas. Muito mais do que contar as histórias de quem esteve no centro da tragédia, essa produção da Netflix tem o cuidado de contextualizar as relações humanas, conectar os sentimentos de uma forma bastante sensível e, claro, construir uma linha narrativa que nos provoque uma experiência das mais marcantes como obra audiovisual - de fato, os depoimentos de quem sobreviveu e de quem participou do resgate nos tocam a alma!

Em 2019, a erupção do Vulcão Whakaari (conhecido como White Island) na Nova Zelândia colocou a vida de cerca de 50 turistas em risco quando, inexplicavelmente, entrou em erupção após 3 anos de silêncio. Com filmagens detalhadas e relatos que repassam cada minuto da tragédia, os sobreviventes relembram o pesadelo que viveram naquele dia de dezembro. Confira o trailer (em inglês):

Diferente dos documentários que cobriram os ataques em 11 de setembro como "11/9 - A Vida sob Ataque", "The Volcano: Rescue from Whakaari" (no original) não te conquista logo de cara pela repercussão do evento, sua densidade como trama é gradativa e exige um pouco de paciência. Isso não é um problema, mas sim uma solução conceitual que justifica a forma como o clímax vai sendo construído - é inegável que o distanciamento entre os fatos que culminam na tragédia e quem assiste o filme (especialmente aqui no Brasil) nos deixam em uma espécie de "estado de espera" até que algumas informações (e imagens) vão surgindo e, aí sim, nos impactando de uma forma avassaladora.

A diretora Rory Kennedy (indicada ao Oscar em 2015 por "Last Days in Vietnam" e responsável pelo indigesto "Queda Livre: A Tragédia do Caso Boeing") é craque em estabelecer o tamanho do problema de acordo com os testemunhos de quem sentiu a dor na pele. Kennedy vai se apropriando dos relatos para identificar alguns gatilhos emocionais que geram conexões imediatas, que nos prendem aos dramas pessoais e que ressignificam nossa posição de observador - um vulcão entrando em erupção parece não ter o mesmo valor que um avião batendo em um prédio no meio de Nova York até sabermos que o vapor desprendido por ele chega a 200 graus ou até vermos um helicóptero que ali estava, com suas hélices completamente derretidas após o fenômeno - ao ligarmos essas informações com as pessoas que não conseguiram sair a tempo da ilha, começamos a sentir o golpe.

O roteiro de Mark Bailey e Dallas Brennan, parceiros de longa data de Kennedy, ainda valoriza os feitos extraordinários de pessoas comuns que pelo "simples" impulso de ajudar o próximo, se colocam em perigo na busca incansável para recuperar uma vida - o interessante, inclusive, é que em nenhum momento o texto se apoia no sensacionalismo; todos os depoimentos, do chefe de policia da região ao piloto comercial de uma empresa de transporte aéreo, são muito humanos, sinceros, honestos. Agora é preciso que se diga um detalhe: embora sejam poucas as imagens da erupção em si (os áudios dos turistas são até mais impactantes do que as fotos ou as gravações dos celulares), o que vemos e ouvimos no terceiro ato de "Vulcão Whakaari: Resgate na Nova Zelândia" é de cortar o coração - são realmente imagens fortes e depoimentos duros!

Se você realmente estiver disposto esse "play" vai valer a pena! 

Assista Agora

Assistir o documentário produzido pelo Leonardo DiCaprio, "Vulcão Whakaari" (que no Brasil ganhou o subtítulo "Resgate na Nova Zelândia"), definitivamente não é uma jornada das mais tranquilas. Muito mais do que contar as histórias de quem esteve no centro da tragédia, essa produção da Netflix tem o cuidado de contextualizar as relações humanas, conectar os sentimentos de uma forma bastante sensível e, claro, construir uma linha narrativa que nos provoque uma experiência das mais marcantes como obra audiovisual - de fato, os depoimentos de quem sobreviveu e de quem participou do resgate nos tocam a alma!

Em 2019, a erupção do Vulcão Whakaari (conhecido como White Island) na Nova Zelândia colocou a vida de cerca de 50 turistas em risco quando, inexplicavelmente, entrou em erupção após 3 anos de silêncio. Com filmagens detalhadas e relatos que repassam cada minuto da tragédia, os sobreviventes relembram o pesadelo que viveram naquele dia de dezembro. Confira o trailer (em inglês):

Diferente dos documentários que cobriram os ataques em 11 de setembro como "11/9 - A Vida sob Ataque", "The Volcano: Rescue from Whakaari" (no original) não te conquista logo de cara pela repercussão do evento, sua densidade como trama é gradativa e exige um pouco de paciência. Isso não é um problema, mas sim uma solução conceitual que justifica a forma como o clímax vai sendo construído - é inegável que o distanciamento entre os fatos que culminam na tragédia e quem assiste o filme (especialmente aqui no Brasil) nos deixam em uma espécie de "estado de espera" até que algumas informações (e imagens) vão surgindo e, aí sim, nos impactando de uma forma avassaladora.

A diretora Rory Kennedy (indicada ao Oscar em 2015 por "Last Days in Vietnam" e responsável pelo indigesto "Queda Livre: A Tragédia do Caso Boeing") é craque em estabelecer o tamanho do problema de acordo com os testemunhos de quem sentiu a dor na pele. Kennedy vai se apropriando dos relatos para identificar alguns gatilhos emocionais que geram conexões imediatas, que nos prendem aos dramas pessoais e que ressignificam nossa posição de observador - um vulcão entrando em erupção parece não ter o mesmo valor que um avião batendo em um prédio no meio de Nova York até sabermos que o vapor desprendido por ele chega a 200 graus ou até vermos um helicóptero que ali estava, com suas hélices completamente derretidas após o fenômeno - ao ligarmos essas informações com as pessoas que não conseguiram sair a tempo da ilha, começamos a sentir o golpe.

O roteiro de Mark Bailey e Dallas Brennan, parceiros de longa data de Kennedy, ainda valoriza os feitos extraordinários de pessoas comuns que pelo "simples" impulso de ajudar o próximo, se colocam em perigo na busca incansável para recuperar uma vida - o interessante, inclusive, é que em nenhum momento o texto se apoia no sensacionalismo; todos os depoimentos, do chefe de policia da região ao piloto comercial de uma empresa de transporte aéreo, são muito humanos, sinceros, honestos. Agora é preciso que se diga um detalhe: embora sejam poucas as imagens da erupção em si (os áudios dos turistas são até mais impactantes do que as fotos ou as gravações dos celulares), o que vemos e ouvimos no terceiro ato de "Vulcão Whakaari: Resgate na Nova Zelândia" é de cortar o coração - são realmente imagens fortes e depoimentos duros!

Se você realmente estiver disposto esse "play" vai valer a pena! 

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Waco

Se você gostou de "Chernobyl"da HBO, assista "Waco"!

Embora os assuntos sejam completamente diferentes, os elementos dramáticos que nos impactaram na trama que expôs o acidente nuclear que aconteceu na Ucrânia, República da então União Soviética, em 1986, são exatamente os mesmos que colocam um enorme ponto de interrogação nas escolhas táticas da ATF (agência americana de controle de álcool, tabaco e armas) e depois do FBI, durante o processo de negociação para que uma seita religiosa na cidade Waco, no Texas, fosse dissolvida. Você vai se impressionar com o que vai assistir, então prepare o estômago!

A minissérie de seis episódios explora os detalhes da história real sobre os 51 dias de cerco montado pelo governo dos EUA contra a seita religiosa de David Koresh (Taylor Kitsch), os Branch Davidians. Trazendo perspectivas dos dois lados do conflito, "Waco" mostra de uma forma impactante qual o pior jeito de se enfrentar uma crise. Confira o trailer (em inglês):

Em 1993, a compra de armas em uma quantidade bastante suspeita chamou a atenção da ATF.  Quando descoberto que se tratava de uma seita religiosa, informações desencontradas rapidamente aumentaram o clima de tensão na pequena e árida Waco. Nos holofotes, de uma lado estava o intransigente líder religioso David Koresh, alguns homens, mulheres e crianças do Ramo Davidiano (uma seita criada por dissidentes da Igreja Adventista do Sétimo Dia); e de outro, um FBI completamente dividido entre os agentes a favor do uso de força militar como Mitch Decker (Shea Whigham), e os agentes pró-diplomacia, como o negociador-chefe Gary Noesner (Michael Shannon).

Embora o roteiro deixe algumas pontas soltas (que apenas os mais atentos devem perceber), ele tem o grande mérito de construir uma narrativa que explora os dois lados da história e nos provoca muitas reflexões. O fato da minissérie ter sido baseada nos livros, "Stalling for time", de Noesner, e "A place called Waco" de David Thibodeau, um dos sobreviventes da seita, deixa claro a intenção dos produtores John Erick Dowdle (diretor de filmes como "Quarentena" e "Horas de Desespero") e de seu irmão, Drew Dowdle (roteirista e produtor dos mesmos filmes), em levantar a discussão sobre a liberdade religiosa e como as agências do governo lidam com isso internamente.

Muito bem produzida pela Paramount, "Waco" é cuidadosa ao não romantizar a postura radical de Koresh, mesmo pontuando que os vilões da história são mesmo alguns agentes do FBI e da ATF. Em polêmicas revelações que envolveram o personagem, como poligamia e abuso de crianças (e tudo indique que a primeira seja verdadeira e a segunda completamente falsa), o roteiro mais ajuda do que atrapalha - a construção das camadas é tão profunda que nosso julgamento muda a cada episódio. Aliás, todos os episódios, especialmente o terceiro e o último, são de uma precisão narrativa impressionantes - é impossível não ser impactado pelo que assistimos.

"Waco" é o típico exemplo de uma minissérie sensacional, que está escondida no catálogo de uma plataforma de streaming (no caso da Globoplay) e que merecia muito mais destaque em marketing. A história é indigesta, forte, cruel até. Tecnicamente é impecável. Artisticamente uma aula - da direção do próprio John Erick Dowdle com a Dennie Gordon (de "Bloodline") às performances de todo elenco, com destaque para o já citado Kitsch, mas também sem esquecer de Shea Whigham, Michael Shannon, Paul Sparks, Julia Garner, Rory Culkin e o indicado ao Emmy de 2018 pelo papel, John Leguizamo.

Vale muito o seu play!

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Se você gostou de "Chernobyl"da HBO, assista "Waco"!

Embora os assuntos sejam completamente diferentes, os elementos dramáticos que nos impactaram na trama que expôs o acidente nuclear que aconteceu na Ucrânia, República da então União Soviética, em 1986, são exatamente os mesmos que colocam um enorme ponto de interrogação nas escolhas táticas da ATF (agência americana de controle de álcool, tabaco e armas) e depois do FBI, durante o processo de negociação para que uma seita religiosa na cidade Waco, no Texas, fosse dissolvida. Você vai se impressionar com o que vai assistir, então prepare o estômago!

A minissérie de seis episódios explora os detalhes da história real sobre os 51 dias de cerco montado pelo governo dos EUA contra a seita religiosa de David Koresh (Taylor Kitsch), os Branch Davidians. Trazendo perspectivas dos dois lados do conflito, "Waco" mostra de uma forma impactante qual o pior jeito de se enfrentar uma crise. Confira o trailer (em inglês):

Em 1993, a compra de armas em uma quantidade bastante suspeita chamou a atenção da ATF.  Quando descoberto que se tratava de uma seita religiosa, informações desencontradas rapidamente aumentaram o clima de tensão na pequena e árida Waco. Nos holofotes, de uma lado estava o intransigente líder religioso David Koresh, alguns homens, mulheres e crianças do Ramo Davidiano (uma seita criada por dissidentes da Igreja Adventista do Sétimo Dia); e de outro, um FBI completamente dividido entre os agentes a favor do uso de força militar como Mitch Decker (Shea Whigham), e os agentes pró-diplomacia, como o negociador-chefe Gary Noesner (Michael Shannon).

Embora o roteiro deixe algumas pontas soltas (que apenas os mais atentos devem perceber), ele tem o grande mérito de construir uma narrativa que explora os dois lados da história e nos provoca muitas reflexões. O fato da minissérie ter sido baseada nos livros, "Stalling for time", de Noesner, e "A place called Waco" de David Thibodeau, um dos sobreviventes da seita, deixa claro a intenção dos produtores John Erick Dowdle (diretor de filmes como "Quarentena" e "Horas de Desespero") e de seu irmão, Drew Dowdle (roteirista e produtor dos mesmos filmes), em levantar a discussão sobre a liberdade religiosa e como as agências do governo lidam com isso internamente.

Muito bem produzida pela Paramount, "Waco" é cuidadosa ao não romantizar a postura radical de Koresh, mesmo pontuando que os vilões da história são mesmo alguns agentes do FBI e da ATF. Em polêmicas revelações que envolveram o personagem, como poligamia e abuso de crianças (e tudo indique que a primeira seja verdadeira e a segunda completamente falsa), o roteiro mais ajuda do que atrapalha - a construção das camadas é tão profunda que nosso julgamento muda a cada episódio. Aliás, todos os episódios, especialmente o terceiro e o último, são de uma precisão narrativa impressionantes - é impossível não ser impactado pelo que assistimos.

"Waco" é o típico exemplo de uma minissérie sensacional, que está escondida no catálogo de uma plataforma de streaming (no caso da Globoplay) e que merecia muito mais destaque em marketing. A história é indigesta, forte, cruel até. Tecnicamente é impecável. Artisticamente uma aula - da direção do próprio John Erick Dowdle com a Dennie Gordon (de "Bloodline") às performances de todo elenco, com destaque para o já citado Kitsch, mas também sem esquecer de Shea Whigham, Michael Shannon, Paul Sparks, Julia Garner, Rory Culkin e o indicado ao Emmy de 2018 pelo papel, John Leguizamo.

Vale muito o seu play!

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White Lines

"White Lines" é a mais nova empreitada do criador de "La casa de papel". A primeira vista, a série parecia trazer fortes elementos de "Bloodline" (também da Netflix), se apoiando na tríade "drama familiar x paraíso turístico x investigação de um crime" De fato essa nova série do Alex Pina bebeu na fonte, mas sem a profundidade narrativa dos irmãos Kessler e de Daniel Zelman (criadores de "Bloodline"), e muito menos a elegância (nível HBO) do diretor Johan Renck - e aqui cabe um observação: "Bloodline" foi uma das maiores decepções da Netflix até hoje, com uma primeira temporada sensacional, a segunda mediana e a terceira beirando o constrangimento! Pois bem, voltando a "White Lines" de Pina, encontramos muito da sua marca - o que exige uma enorme abstração da realidade para que possamos nos divertir. Dessa vez, acompanhamos Zoe Walker (Laura Haddock) que, após vinte anos, tenta desvendar o motivo e o responsável pela morte do seu irmão mais velho, Axel (Tom Rhys Harries), um jovem DJ que saiu de Manchester, na Inglaterra, para se aventurar em Ibiza, na Espanha, após ser colocado para fora de casa pelo pai. Confira o trailer:

Pelo trailer temos a impressão de se tratar de uma história mais densa do que realmente ela é. A atmosfera adolescente lembra muito mais "Tidelands" do que a já comentada "Bloodline", porém com um roteiro melhor amarrado e se apoiando em personagens bem escritos. É verdade que Alex Pina sabe fazer muito bem isso e como em "La casa de papel", ele repete sua forma de contar histórias, usando a quebra da linha temporal para chamar nossa atenção e nos prender pela curiosidade (ao estilo "Breaking Bad") até nos entregar uma breve solução por episódio - com isso a temporada vai passando e nem nos damos conta! "White Lines" pode receber o selo de super-produção e de ótimo entretenimento, capaz de esconder o assassino de Axel até o último o episódio, o único "porém" é que o roteiro apresenta tantas possibilidades, que são tão mal exploradas, que nos cria uma sensação de superficialidade. Sabendo disso, vale pelo entretenimento!

Pina criou um universo gigantesco em "White Lines" e, na minha opinião, não soube explora-lo como deveria. Como em "La casa de papel", Pina usa a construção dos personagens para dar o peso das tramas e de muitas sub-tramas. O tom dramático da irmã inconformada com a morte do irmão, personificado na personagem de Zoe, se confunde excessivamente com o humor, quase pastelão, do personagem de Marcus (Daniel Mays), traficante, DJ e um dos melhores amigos de Axel. Essa transição entre drama e humor funciona na série, mas enfraquece a linha narrativa principal, já que Marcus "engole" Zoe em sua jornada - ele é tão mais carismático que em um determinado momento da temporada, já nem estava tão curioso para descobrir quem matou Axel, queria mesmo saber é como Marcus daria a volta por cima!

Outro exemplo cabe aos dois personagens que completam o entouragede Axel. Anna (Angela Griffin) nos é apresentada como uma organizadora de grande eventos sexuais (ou orgias, como preferir) em Ibiza, com grande influência em várias camadas da sociedade local - isso simplesmente desaparece depois do primeiro episódio, transformando sua personagem em uma coadjuvante sem muita importância em 70% da história, se limitando a ser a ex-mulher de Marcus. O quarto elemento, David (Laurence Fox) é a muleta non-sense de Pina (o Arturito de "La Casa") - todas as cenas de enrolação acontecem com David, uma espécie de líder espiritual e life coach. Além desse núcleo mais próximo de Axel, temos a versão "Romeu & Julieta" da série com a disputa entre as duas famílias mais poderosas de Ibiza: os Calafat e os Martinez. Tirando uma ou outra interação direta entre elas, os personagens Calafat, sem dúvida, são mais interessantes e importantes para a trama: nela temos o filho injustiçado pelo pai, Orio (Juan Diego Botto), principal suspeito de ter assassinato Axel, Kika (Marta Milans) ex-namorada de Axel (ops) e Conchita (Belén López), uma mãe que disputa os namorados com a filha e que super-protege o filho, viciada em sexo e adúltera confessa - sério, nada mais "novela mexicana"! Ah, esqueci do "todo poderoso" Andreu Calafat (Pedro Casablanc), mas esse personagem não mostrou a que veio nos dez episódios. Você acha que terminou? Não, ainda tem o segurança da família Calafat, o Big Boss da Boate e Bad Boy sensível, Boxer (Nuno Lopes) - outro personagem que resolve tudo, sai ileso sempre, mas vai perdendo força até praticamente sumir no final!

Pois bem, fiz questão de descrever rapidamente todos o personagens, até com uma certa ironia, para mostrar que Alex Pina transformou "White Lines" quase em uma novela. Todos se cruzam, claro, mas priorizam transitar por linhas completamente diferentes do que realmente interessa na série: "quem matou Axel?". Embora a própria Zoe tenha uma jornada de transformação ao deixar sua família na Inglaterra para enfrentar a "vida loca" de Ibiza, isso não se sustenta - a dinâmica de Pina não nos faz torcer por ela. Cada episódio praticamente se completa, deixando ganchos para o próximos, mas diminuindo a importância de tudo que já foi resolvido. As cenas de flashback servem para contextualizar e estabelecer um paralelo entre personagens nos anos 90, jovens, e a condição atual de cada um deles. Juntamente com o choque cultural entre ingleses e espanhóis (bem pontuado durante a temporada), esse "vai e vem" da história funciona muito bem para expôr a importância conceitual da narrativa e também serve de estratégia para nos manter entretidos sempre.

Resumindo: "White Lines" é um ótimo entretenimento, para quem gosta (ou está com saudades) de séries como "Revenge" - que exploram muito as características do ambiente onde a trama acontece, com personagens interessantes, mas que não precisam de um maior aprofundamento para fazer sentido na história e que carregam um certo mistério que aos poucos vão sendo desvendados. Vale pela diversão, pela beleza da fotografia e pela qualidade da produção!

Assista Agora

"White Lines" é a mais nova empreitada do criador de "La casa de papel". A primeira vista, a série parecia trazer fortes elementos de "Bloodline" (também da Netflix), se apoiando na tríade "drama familiar x paraíso turístico x investigação de um crime" De fato essa nova série do Alex Pina bebeu na fonte, mas sem a profundidade narrativa dos irmãos Kessler e de Daniel Zelman (criadores de "Bloodline"), e muito menos a elegância (nível HBO) do diretor Johan Renck - e aqui cabe um observação: "Bloodline" foi uma das maiores decepções da Netflix até hoje, com uma primeira temporada sensacional, a segunda mediana e a terceira beirando o constrangimento! Pois bem, voltando a "White Lines" de Pina, encontramos muito da sua marca - o que exige uma enorme abstração da realidade para que possamos nos divertir. Dessa vez, acompanhamos Zoe Walker (Laura Haddock) que, após vinte anos, tenta desvendar o motivo e o responsável pela morte do seu irmão mais velho, Axel (Tom Rhys Harries), um jovem DJ que saiu de Manchester, na Inglaterra, para se aventurar em Ibiza, na Espanha, após ser colocado para fora de casa pelo pai. Confira o trailer:

Pelo trailer temos a impressão de se tratar de uma história mais densa do que realmente ela é. A atmosfera adolescente lembra muito mais "Tidelands" do que a já comentada "Bloodline", porém com um roteiro melhor amarrado e se apoiando em personagens bem escritos. É verdade que Alex Pina sabe fazer muito bem isso e como em "La casa de papel", ele repete sua forma de contar histórias, usando a quebra da linha temporal para chamar nossa atenção e nos prender pela curiosidade (ao estilo "Breaking Bad") até nos entregar uma breve solução por episódio - com isso a temporada vai passando e nem nos damos conta! "White Lines" pode receber o selo de super-produção e de ótimo entretenimento, capaz de esconder o assassino de Axel até o último o episódio, o único "porém" é que o roteiro apresenta tantas possibilidades, que são tão mal exploradas, que nos cria uma sensação de superficialidade. Sabendo disso, vale pelo entretenimento!

Pina criou um universo gigantesco em "White Lines" e, na minha opinião, não soube explora-lo como deveria. Como em "La casa de papel", Pina usa a construção dos personagens para dar o peso das tramas e de muitas sub-tramas. O tom dramático da irmã inconformada com a morte do irmão, personificado na personagem de Zoe, se confunde excessivamente com o humor, quase pastelão, do personagem de Marcus (Daniel Mays), traficante, DJ e um dos melhores amigos de Axel. Essa transição entre drama e humor funciona na série, mas enfraquece a linha narrativa principal, já que Marcus "engole" Zoe em sua jornada - ele é tão mais carismático que em um determinado momento da temporada, já nem estava tão curioso para descobrir quem matou Axel, queria mesmo saber é como Marcus daria a volta por cima!

Outro exemplo cabe aos dois personagens que completam o entouragede Axel. Anna (Angela Griffin) nos é apresentada como uma organizadora de grande eventos sexuais (ou orgias, como preferir) em Ibiza, com grande influência em várias camadas da sociedade local - isso simplesmente desaparece depois do primeiro episódio, transformando sua personagem em uma coadjuvante sem muita importância em 70% da história, se limitando a ser a ex-mulher de Marcus. O quarto elemento, David (Laurence Fox) é a muleta non-sense de Pina (o Arturito de "La Casa") - todas as cenas de enrolação acontecem com David, uma espécie de líder espiritual e life coach. Além desse núcleo mais próximo de Axel, temos a versão "Romeu & Julieta" da série com a disputa entre as duas famílias mais poderosas de Ibiza: os Calafat e os Martinez. Tirando uma ou outra interação direta entre elas, os personagens Calafat, sem dúvida, são mais interessantes e importantes para a trama: nela temos o filho injustiçado pelo pai, Orio (Juan Diego Botto), principal suspeito de ter assassinato Axel, Kika (Marta Milans) ex-namorada de Axel (ops) e Conchita (Belén López), uma mãe que disputa os namorados com a filha e que super-protege o filho, viciada em sexo e adúltera confessa - sério, nada mais "novela mexicana"! Ah, esqueci do "todo poderoso" Andreu Calafat (Pedro Casablanc), mas esse personagem não mostrou a que veio nos dez episódios. Você acha que terminou? Não, ainda tem o segurança da família Calafat, o Big Boss da Boate e Bad Boy sensível, Boxer (Nuno Lopes) - outro personagem que resolve tudo, sai ileso sempre, mas vai perdendo força até praticamente sumir no final!

Pois bem, fiz questão de descrever rapidamente todos o personagens, até com uma certa ironia, para mostrar que Alex Pina transformou "White Lines" quase em uma novela. Todos se cruzam, claro, mas priorizam transitar por linhas completamente diferentes do que realmente interessa na série: "quem matou Axel?". Embora a própria Zoe tenha uma jornada de transformação ao deixar sua família na Inglaterra para enfrentar a "vida loca" de Ibiza, isso não se sustenta - a dinâmica de Pina não nos faz torcer por ela. Cada episódio praticamente se completa, deixando ganchos para o próximos, mas diminuindo a importância de tudo que já foi resolvido. As cenas de flashback servem para contextualizar e estabelecer um paralelo entre personagens nos anos 90, jovens, e a condição atual de cada um deles. Juntamente com o choque cultural entre ingleses e espanhóis (bem pontuado durante a temporada), esse "vai e vem" da história funciona muito bem para expôr a importância conceitual da narrativa e também serve de estratégia para nos manter entretidos sempre.

Resumindo: "White Lines" é um ótimo entretenimento, para quem gosta (ou está com saudades) de séries como "Revenge" - que exploram muito as características do ambiente onde a trama acontece, com personagens interessantes, mas que não precisam de um maior aprofundamento para fazer sentido na história e que carregam um certo mistério que aos poucos vão sendo desvendados. Vale pela diversão, pela beleza da fotografia e pela qualidade da produção!

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