Muito do que você viu satirizado em "El Presidente"e em "Jogo da Corrupção", você vai encontrar documentado na minissérie de 4 episódios da Netflix, "Esquemas da FIFA". Se nos dois primeiros episódios o foco é a transformação de entidade depois da chegada do brasileiro João Havelange ao poder, o que se segue é uma série de fatos que notadamente coloca o esporte e o respeito pela paixão do torcedor em descaso - das escolhas das sedes para as Copas do Mundo (principalmente da Rússia em 2018 e Catar em 2022) às absurdas negociações para conquista de votos na busca pela reeleição (leia-se "pelo poder"), o documentário, infelizmente, vai te provocar uma análise completamente diferente sobre o futebol, pelo viés político e econômico em sua pior versão.
"FIFA Uncovered" (no original) revela a história conturbada da organização ao explorar as investigações dos casos de corrupção que foram descobertos a partir de 2015. A minissérie documental também acompanha os critérios para a escolha das sedes da Copa do Mundo e os bastidores da construção de uma poderosa ferramenta de marketing e influente entidade politica. Confira o trailer (em inglês):
Além de um assunto muito interessante (embora indigesto) para quem gosta e acompanha o futebol além do esporte, o que mais chama a atenção em "Esquemas da FIFA" são os personagens entrevistados pela produção da minissérie. A partir de uma escolha narrativa que equilibra perfeitamente o valor histórico da FIFA e a transformação da entidade máxima do futebol em um verdadeiro (e poderoso) império, com fortes elementos do jornalismo investigativo, o diretor trouxe para os holofotes uma visão imparcial (mas dura) sobre pontos muito sensíveis do desenvolvimento recente do esporte (como negócio) pela voz de muitos de seus protagonistas, entre eles Jérôme Valcke, Ricardo Teixeira e o próprio Joseph Blatter.
Ao nos apresentar uma linha do tempo bastante fluída, fica fácil entender como a disputa pelo poder, a ambição e, principalmente, a corrupção foram se inserindo dentro da organização. Embora o documentário não afirme com todas as letras, o capítulo sobre a escolha do Catar como sede de uma Copa do Mundo, vencendo o favorito EUA de Bill Clinton, parece vital para o que veio a se tornar público na operação do FBI que ficou conhecida como "FIFAGate". O incrível, inclusive, é que até a Phaedra Almajid, responsável pela comunicação da candidatura do Catar, aparece durante o documentário repetindo as mesmas acusações gravíssimas de suborno contra dirigentes africanos que votaram a favor do seu país, enquanto o próprio Hassan Al Thawadi, que liderou a candidatura, tenta (muitas vezes sem muito sucesso) dar a sua versão sobre as polêmicas que envolveram (e envolvem) o evento.
"Esquemas da FIFA", de fato, é um recorte histórico dos mais envolventes, até para quem não gosta do esporte. Agora, é inegável que para quem conhece muitos dos personagens que transitam pelos bastidores da FIFA, essa minissérie além de muito reveladora, é simplesmente imperdível!
Vale muito o seu play!
Muito do que você viu satirizado em "El Presidente"e em "Jogo da Corrupção", você vai encontrar documentado na minissérie de 4 episódios da Netflix, "Esquemas da FIFA". Se nos dois primeiros episódios o foco é a transformação de entidade depois da chegada do brasileiro João Havelange ao poder, o que se segue é uma série de fatos que notadamente coloca o esporte e o respeito pela paixão do torcedor em descaso - das escolhas das sedes para as Copas do Mundo (principalmente da Rússia em 2018 e Catar em 2022) às absurdas negociações para conquista de votos na busca pela reeleição (leia-se "pelo poder"), o documentário, infelizmente, vai te provocar uma análise completamente diferente sobre o futebol, pelo viés político e econômico em sua pior versão.
"FIFA Uncovered" (no original) revela a história conturbada da organização ao explorar as investigações dos casos de corrupção que foram descobertos a partir de 2015. A minissérie documental também acompanha os critérios para a escolha das sedes da Copa do Mundo e os bastidores da construção de uma poderosa ferramenta de marketing e influente entidade politica. Confira o trailer (em inglês):
Além de um assunto muito interessante (embora indigesto) para quem gosta e acompanha o futebol além do esporte, o que mais chama a atenção em "Esquemas da FIFA" são os personagens entrevistados pela produção da minissérie. A partir de uma escolha narrativa que equilibra perfeitamente o valor histórico da FIFA e a transformação da entidade máxima do futebol em um verdadeiro (e poderoso) império, com fortes elementos do jornalismo investigativo, o diretor trouxe para os holofotes uma visão imparcial (mas dura) sobre pontos muito sensíveis do desenvolvimento recente do esporte (como negócio) pela voz de muitos de seus protagonistas, entre eles Jérôme Valcke, Ricardo Teixeira e o próprio Joseph Blatter.
Ao nos apresentar uma linha do tempo bastante fluída, fica fácil entender como a disputa pelo poder, a ambição e, principalmente, a corrupção foram se inserindo dentro da organização. Embora o documentário não afirme com todas as letras, o capítulo sobre a escolha do Catar como sede de uma Copa do Mundo, vencendo o favorito EUA de Bill Clinton, parece vital para o que veio a se tornar público na operação do FBI que ficou conhecida como "FIFAGate". O incrível, inclusive, é que até a Phaedra Almajid, responsável pela comunicação da candidatura do Catar, aparece durante o documentário repetindo as mesmas acusações gravíssimas de suborno contra dirigentes africanos que votaram a favor do seu país, enquanto o próprio Hassan Al Thawadi, que liderou a candidatura, tenta (muitas vezes sem muito sucesso) dar a sua versão sobre as polêmicas que envolveram (e envolvem) o evento.
"Esquemas da FIFA", de fato, é um recorte histórico dos mais envolventes, até para quem não gosta do esporte. Agora, é inegável que para quem conhece muitos dos personagens que transitam pelos bastidores da FIFA, essa minissérie além de muito reveladora, é simplesmente imperdível!
Vale muito o seu play!
O "Estrangulador de Boston" é um excelente filme para quem está com saudades de uma trama bem construída, inteligente e sensível, onde as motivações perante a investigação são até mais importantes do que o impacto visual ou a brutalidade dos crimes em si. E aqui existe um componente que impacta diretamente na nossa experiência como audiência, mas que de forma alguma nos distancia do estilo "true crime" que a ficção carrega em seu DNA: as protagonistas, jornalistas, tem uma segunda camada que acaba dando um certo charme para a narrativa, já que nos anos 60 as mulheres praticamente não tinham voz nas redações dos jornais e muito menos no universo policial.
O filme acompanha os reflexos sociais provocados por um misterioso assassino que fazia cada vez mais vítimas (todas mulheres) e por Loretta McLaughlin (Keira Knightley), que se tornou uma das primeiras jornalistas a conectar os crimes do estrangulador de Boston ao termo que nem existia ainda: serial killer. Todavia, quando Loretta passa a seguir sua investigação ao lado da colega Jean Cole (Carrie Coon), a dupla se vê prejudicada pelo implacável sexismo da época. Mesmo assim, elas seguem corajosamente, arriscando suas vidas em uma busca para descobrir a verdade antes que a próxima vítima seja encontrada. Confira o trailer:
Entender o que leva uma jornalista a tentar resolver um caso notadamente policial, onde outras mulheres são vitimas de um cruel assassino, é quase uma jornada íntima de auto-sobrevivência fantasiada de motivação profissional - basta lembrar do excelente (e imperdível) documentário da HBO, "Eu Terei Sumido na Escuridão". No caso da escritora Michelle McNamara estávamos de frente com uma narração em off que foi capaz de transmitir as angustias, medos, revoltas e até com uma certa coragem, as fragilidades de uma mulher que buscava, incansavelmente, desvendar uma das maiores sequências de crimes bárbaros da história dos EUA. Com Loretta McLaughlin é a mesma coisa, porém aqui, enxergamos a personagem, seu drama se torna mais palpável e com isso nossa relação com a trama passa a ser outra já que nos identificamos com os anseios da jornalista antes mesmo de nos sentirmos impactados pelos crimes. Veja, em nenhum momento conseguimos dissociar sua busca por igualdade com a preocupação para com as próximas vítimas.
Essa conceito do diretor e roteirista Matt Ruskin (de "Crown Heights") cobra seu preço: em alguns momentos a narrativa fica cadenciada demais, perde um pouco da dinâmica investigativa/policial para focar nos reflexos das escolhas pessoais e profissionais das personagens. Keira Knightley e Carrie Coon sustentam o filme mesmo quando o conflito principal se dissipa e isso nos dá uma certa sensação de desequilíbrio - é como se "Estrangulador de Boston" se distanciasse do estilo "Zodíaco" de David Fincher e se aproximasse de "Ela Disse" de Maria Schrader. Por outro lado o filme ganha em humanidade, em sororidade - é impressionante como Ruskin pontua elementos biográficos como a "coragem" e a "resiliência" dessas mulheres, para retratar como elas precisaram deixar de lado uma parte importante de suas vidas, para que pudessem passar a ser reconhecidas como profissionais de respeito.
Dito isso, é possível afirmar que o maior triunfo de "O Estrangulador de Boston" não é o de contar uma angustiante e misteriosa história sobre cruéis assassinatos em série, muito menos de glamourizar esses crimes ou seus autores, naquela busca incansável por encontrar padrões e com isso construir um perfil psicológico que nos ajude a resolver o caso. Embora exista um pouco disso tudo, o foco aqui é até menos impactante, já que as histórias como a de McLaughlin e de Cole falam por si só e certamente nos ajudam a refletir sobre como o machismo estrutural pode nos atingir em diferentes esferas e como o jornalismo sério pode mudar o jogo com competência e liberdade.
Vale muito seu play!
O "Estrangulador de Boston" é um excelente filme para quem está com saudades de uma trama bem construída, inteligente e sensível, onde as motivações perante a investigação são até mais importantes do que o impacto visual ou a brutalidade dos crimes em si. E aqui existe um componente que impacta diretamente na nossa experiência como audiência, mas que de forma alguma nos distancia do estilo "true crime" que a ficção carrega em seu DNA: as protagonistas, jornalistas, tem uma segunda camada que acaba dando um certo charme para a narrativa, já que nos anos 60 as mulheres praticamente não tinham voz nas redações dos jornais e muito menos no universo policial.
O filme acompanha os reflexos sociais provocados por um misterioso assassino que fazia cada vez mais vítimas (todas mulheres) e por Loretta McLaughlin (Keira Knightley), que se tornou uma das primeiras jornalistas a conectar os crimes do estrangulador de Boston ao termo que nem existia ainda: serial killer. Todavia, quando Loretta passa a seguir sua investigação ao lado da colega Jean Cole (Carrie Coon), a dupla se vê prejudicada pelo implacável sexismo da época. Mesmo assim, elas seguem corajosamente, arriscando suas vidas em uma busca para descobrir a verdade antes que a próxima vítima seja encontrada. Confira o trailer:
Entender o que leva uma jornalista a tentar resolver um caso notadamente policial, onde outras mulheres são vitimas de um cruel assassino, é quase uma jornada íntima de auto-sobrevivência fantasiada de motivação profissional - basta lembrar do excelente (e imperdível) documentário da HBO, "Eu Terei Sumido na Escuridão". No caso da escritora Michelle McNamara estávamos de frente com uma narração em off que foi capaz de transmitir as angustias, medos, revoltas e até com uma certa coragem, as fragilidades de uma mulher que buscava, incansavelmente, desvendar uma das maiores sequências de crimes bárbaros da história dos EUA. Com Loretta McLaughlin é a mesma coisa, porém aqui, enxergamos a personagem, seu drama se torna mais palpável e com isso nossa relação com a trama passa a ser outra já que nos identificamos com os anseios da jornalista antes mesmo de nos sentirmos impactados pelos crimes. Veja, em nenhum momento conseguimos dissociar sua busca por igualdade com a preocupação para com as próximas vítimas.
Essa conceito do diretor e roteirista Matt Ruskin (de "Crown Heights") cobra seu preço: em alguns momentos a narrativa fica cadenciada demais, perde um pouco da dinâmica investigativa/policial para focar nos reflexos das escolhas pessoais e profissionais das personagens. Keira Knightley e Carrie Coon sustentam o filme mesmo quando o conflito principal se dissipa e isso nos dá uma certa sensação de desequilíbrio - é como se "Estrangulador de Boston" se distanciasse do estilo "Zodíaco" de David Fincher e se aproximasse de "Ela Disse" de Maria Schrader. Por outro lado o filme ganha em humanidade, em sororidade - é impressionante como Ruskin pontua elementos biográficos como a "coragem" e a "resiliência" dessas mulheres, para retratar como elas precisaram deixar de lado uma parte importante de suas vidas, para que pudessem passar a ser reconhecidas como profissionais de respeito.
Dito isso, é possível afirmar que o maior triunfo de "O Estrangulador de Boston" não é o de contar uma angustiante e misteriosa história sobre cruéis assassinatos em série, muito menos de glamourizar esses crimes ou seus autores, naquela busca incansável por encontrar padrões e com isso construir um perfil psicológico que nos ajude a resolver o caso. Embora exista um pouco disso tudo, o foco aqui é até menos impactante, já que as histórias como a de McLaughlin e de Cole falam por si só e certamente nos ajudam a refletir sobre como o machismo estrutural pode nos atingir em diferentes esferas e como o jornalismo sério pode mudar o jogo com competência e liberdade.
Vale muito seu play!
Dividido em 2 partes de 1 hora, em média, essa minissérie documental da HBO mostra o julgamento de Michelle Carter, uma jovem de 17 anos que foi acusada de incentivar o namorado, Conrad Roy, de 18 anos, a se suicidar. O curioso dessa história é que eles sempre estiveram a mais de 60 km de distância um do outro. Todo relacionamento era baseado em mensagens de celular (60.000 pra ser exato)! Por mais maluca que possa parecer essa história, a diretora Erin Lee Carr (Mommy Dead and Dearest) foi muito inteligente em humanizar o caso sem levantar nenhuma bandeira e por mais que sejamos convidados a fazer nossos próprios julgamentos, a cada nova informação nossa cabeça dá um nó!
No dia 14 de julho de 2014, Conrad Roy foi encontrado morto depois de respirar uma enorme quantidade de monóxido de carbono dentro da sua caminhonete, no estacionamento de um supermercado. O que parecia mais um caso de suicídio logo se transformou em uma acusação de homicídio culposo quando, junto ao corpo, foi encontrado um celular sem bateria. Já com o inicio das investigações, foi descoberto uma série de mensagens que, aparentemente, incentivaram Roy a se matar. A responsável por essas mensagens era Michelle Carter, sua namorada. Roy e Michelle namoraram cerca de 2 anos e nesse período se encontraram apenas 5 vezes. A distância e o tempo não afastou o casal, pelo contrário, só fortaleceu a relação: as várias de mensagens que eles trocavam diariamente, só comprovam a enorme sintonia que existia entre os dois - e a minissérie usa muito bem esse material como conceito narrativo, o que dá um tom de proximidade com nossa realidade impressionante. O fato é que eles realmente pareciam se amar e se apoiar em todas as situações, porém Roy sofria de uma depressão severa e Michelle apresentava fortes sinais de sociopatia, ou seja, essa relação era uma bomba prestes a explodir!
É nesse cenário que o documentário ganha força. Com depoimentos da família Roy, dos investigadores, de um jornalista, do advogado de Michelle e de um psiquiatra, "Eu Te Amo, Agora Morra" mostra toda a cronologia do caso: da preparação do suicídio até o veredito do juiz, usando as trocas de mensagens entre o casal como uma espécie de "narrador" (o som das mensagem saindo e chegando são angustiantes) e as cenas do julgamento e das reportagens da época como "fechamentos de bloco", extremamente bem montados, diga-se de passagem. Esse é o tipo de documentário, aliás, que você não consegue tirar o olho da tela - ele é dinâmico, envolvente, interessante e até o último segundo fica impossível cravar qual será o resultado dessa trama tão complexa e mesmo assim a grande discussão moral da história fica martelando na nossa cabeça por algum tempo! Olha, vale o play!!!!
PS: A abertura da minissérie é de um bom gosto incrível!!!!
Dividido em 2 partes de 1 hora, em média, essa minissérie documental da HBO mostra o julgamento de Michelle Carter, uma jovem de 17 anos que foi acusada de incentivar o namorado, Conrad Roy, de 18 anos, a se suicidar. O curioso dessa história é que eles sempre estiveram a mais de 60 km de distância um do outro. Todo relacionamento era baseado em mensagens de celular (60.000 pra ser exato)! Por mais maluca que possa parecer essa história, a diretora Erin Lee Carr (Mommy Dead and Dearest) foi muito inteligente em humanizar o caso sem levantar nenhuma bandeira e por mais que sejamos convidados a fazer nossos próprios julgamentos, a cada nova informação nossa cabeça dá um nó!
No dia 14 de julho de 2014, Conrad Roy foi encontrado morto depois de respirar uma enorme quantidade de monóxido de carbono dentro da sua caminhonete, no estacionamento de um supermercado. O que parecia mais um caso de suicídio logo se transformou em uma acusação de homicídio culposo quando, junto ao corpo, foi encontrado um celular sem bateria. Já com o inicio das investigações, foi descoberto uma série de mensagens que, aparentemente, incentivaram Roy a se matar. A responsável por essas mensagens era Michelle Carter, sua namorada. Roy e Michelle namoraram cerca de 2 anos e nesse período se encontraram apenas 5 vezes. A distância e o tempo não afastou o casal, pelo contrário, só fortaleceu a relação: as várias de mensagens que eles trocavam diariamente, só comprovam a enorme sintonia que existia entre os dois - e a minissérie usa muito bem esse material como conceito narrativo, o que dá um tom de proximidade com nossa realidade impressionante. O fato é que eles realmente pareciam se amar e se apoiar em todas as situações, porém Roy sofria de uma depressão severa e Michelle apresentava fortes sinais de sociopatia, ou seja, essa relação era uma bomba prestes a explodir!
É nesse cenário que o documentário ganha força. Com depoimentos da família Roy, dos investigadores, de um jornalista, do advogado de Michelle e de um psiquiatra, "Eu Te Amo, Agora Morra" mostra toda a cronologia do caso: da preparação do suicídio até o veredito do juiz, usando as trocas de mensagens entre o casal como uma espécie de "narrador" (o som das mensagem saindo e chegando são angustiantes) e as cenas do julgamento e das reportagens da época como "fechamentos de bloco", extremamente bem montados, diga-se de passagem. Esse é o tipo de documentário, aliás, que você não consegue tirar o olho da tela - ele é dinâmico, envolvente, interessante e até o último segundo fica impossível cravar qual será o resultado dessa trama tão complexa e mesmo assim a grande discussão moral da história fica martelando na nossa cabeça por algum tempo! Olha, vale o play!!!!
PS: A abertura da minissérie é de um bom gosto incrível!!!!
Dos documentários "true crime" que já assisti e analisei até hoje, "Eu Terei Sumido na Escuridão" da HBO talvez seja o mais humano de todos. Essa característica não faz dele o melhor ou o pior do gênero, mas certamente nos entrega uma narrativa diferente, nos provocando a embarcar em uma história terrível, mas sob o ponto de vista de uma terceira pessoa, a escritora Michelle McNamara, que é capaz de nos conquistar com suas angustias, medos, revoltas e até com uma certa coragem ao expôr suas fragilidades da mesma forma com que tenta, incansavelmente, desvendar uma das maiores sequências de crimes bárbaros da história dos EUA.
McNamara é a autora do livro homônimo "I'll Be Gone in the Dark" (título original), onde narra sua jornada como escritora durante a investigação de uma série de casos de estupros e assassinatos em Sacramento durante as décadas de 70 e 80 que posteriormente ficou conhecido como "O caso do assassino de Golden State". Confira o trailer:
A série conta em detalhes todo o trabalho de Michelle McNamara como jornalista investigativa até o momento em que passa a se dedicar integralmente ao caso não resolvido do assassino de Golden State, que estuprou 50 mulheres e matou outras 10 pessoas. O interessante dessa jornada é que pouco a pouco a obstinação de McNamara vai se transformando em uma enorme obsessão, fazendo com que o próprio assassino (ou o que ele representa) domine sua mente e interfira visivelmente na sua vida pessoal - e aqui temos o ponto alto da série: essa linha tênue onde McNamara tenta se equilibrar tem reflexos cruciais e eles são muito mais profundos do que qualquer um que vivia com ela poderia imaginar. Olha, em vários momentos é preciso ter estômago, já que muitas sobreviventes contam sobre os ataques que sofreram com uma riqueza de sensações assustadora e em outros, sofremos na pele as mesmas angústias de uma McNamara inconformada (e pressionada) com o fato do assassino ainda estar solto e isso, de certa forma, vai nos impulsionando a torcer por uma resolução, mesmo sabendo que a protagonista não estará lá para ver!
Escrito por Liz Garbus (que também dirige dois episódios), a série se divide entre a investigação de McNamara e sua biografia recente, até que ambos se misturam quando ela começa a escrever o livro sobre o assassino. Se apoiando muito na semiótica, Garbus (que já foi indicada para dois Oscars: um com "The Farm: Angola, USA" e outro com o excepcional "What Happened, Miss Simone?") soube trabalhar como ninguém o fato de que McNamara nunca esteve presente durante a produção da série - ao usar suas palavras escritas no livro, brilhantemente narradas por Karen Kilgariff, a diretora acabou criando um tom poético para a visão de McNamara ao mesmo tempo que a força emocional de suas palavras contrastam com a brutalidade dos ataques.
Garbus alternou inúmeras entrevistas bem interessantes, com imagens de arquivo e até uma ou outra dramatização. Dar voz ao marido de McNamara, aos amigos, fãs do blog que escrevia, policiais que trabalharam na investigação na época dos crimes e, por fim, para os seus próprios parceiros de trabalho, mostram exatamente a quantidade de informações relevantes que essa história demanda. O bacana é que mesmo com tanto material, em nenhum momento nos sentimos perdidos - o ritmo é intenso, mas muito bem construído, com muitos elementos de ficção, inclusive, só que extremamente pertinentes ao conceito narrativo imposto pela diretora!
""Eu Terei Sumido na Escuridão" vai agradar quem gosta de séries policiais de crimes reais da mesma forma de quem gosta de biografias com pessoas interessantes e inteligentes. Essa mistura de gêneros entrega um resultado impecável e que, certamente, virá muito forte na temporada de premiações do ano que vem. Vale muito o seu play, de verdade!
Dos documentários "true crime" que já assisti e analisei até hoje, "Eu Terei Sumido na Escuridão" da HBO talvez seja o mais humano de todos. Essa característica não faz dele o melhor ou o pior do gênero, mas certamente nos entrega uma narrativa diferente, nos provocando a embarcar em uma história terrível, mas sob o ponto de vista de uma terceira pessoa, a escritora Michelle McNamara, que é capaz de nos conquistar com suas angustias, medos, revoltas e até com uma certa coragem ao expôr suas fragilidades da mesma forma com que tenta, incansavelmente, desvendar uma das maiores sequências de crimes bárbaros da história dos EUA.
McNamara é a autora do livro homônimo "I'll Be Gone in the Dark" (título original), onde narra sua jornada como escritora durante a investigação de uma série de casos de estupros e assassinatos em Sacramento durante as décadas de 70 e 80 que posteriormente ficou conhecido como "O caso do assassino de Golden State". Confira o trailer:
A série conta em detalhes todo o trabalho de Michelle McNamara como jornalista investigativa até o momento em que passa a se dedicar integralmente ao caso não resolvido do assassino de Golden State, que estuprou 50 mulheres e matou outras 10 pessoas. O interessante dessa jornada é que pouco a pouco a obstinação de McNamara vai se transformando em uma enorme obsessão, fazendo com que o próprio assassino (ou o que ele representa) domine sua mente e interfira visivelmente na sua vida pessoal - e aqui temos o ponto alto da série: essa linha tênue onde McNamara tenta se equilibrar tem reflexos cruciais e eles são muito mais profundos do que qualquer um que vivia com ela poderia imaginar. Olha, em vários momentos é preciso ter estômago, já que muitas sobreviventes contam sobre os ataques que sofreram com uma riqueza de sensações assustadora e em outros, sofremos na pele as mesmas angústias de uma McNamara inconformada (e pressionada) com o fato do assassino ainda estar solto e isso, de certa forma, vai nos impulsionando a torcer por uma resolução, mesmo sabendo que a protagonista não estará lá para ver!
Escrito por Liz Garbus (que também dirige dois episódios), a série se divide entre a investigação de McNamara e sua biografia recente, até que ambos se misturam quando ela começa a escrever o livro sobre o assassino. Se apoiando muito na semiótica, Garbus (que já foi indicada para dois Oscars: um com "The Farm: Angola, USA" e outro com o excepcional "What Happened, Miss Simone?") soube trabalhar como ninguém o fato de que McNamara nunca esteve presente durante a produção da série - ao usar suas palavras escritas no livro, brilhantemente narradas por Karen Kilgariff, a diretora acabou criando um tom poético para a visão de McNamara ao mesmo tempo que a força emocional de suas palavras contrastam com a brutalidade dos ataques.
Garbus alternou inúmeras entrevistas bem interessantes, com imagens de arquivo e até uma ou outra dramatização. Dar voz ao marido de McNamara, aos amigos, fãs do blog que escrevia, policiais que trabalharam na investigação na época dos crimes e, por fim, para os seus próprios parceiros de trabalho, mostram exatamente a quantidade de informações relevantes que essa história demanda. O bacana é que mesmo com tanto material, em nenhum momento nos sentimos perdidos - o ritmo é intenso, mas muito bem construído, com muitos elementos de ficção, inclusive, só que extremamente pertinentes ao conceito narrativo imposto pela diretora!
""Eu Terei Sumido na Escuridão" vai agradar quem gosta de séries policiais de crimes reais da mesma forma de quem gosta de biografias com pessoas interessantes e inteligentes. Essa mistura de gêneros entrega um resultado impecável e que, certamente, virá muito forte na temporada de premiações do ano que vem. Vale muito o seu play, de verdade!
Assistir "Every Breath You Take" é como olhar para os dramas psicológicos, daqueles com fortes elementos de suspense do passado, como "Mulher Solteira Procura" ou "A Mão que Balança o Berço", porém com uma nova perspectiva de tentar focar no desenvolvimento de personagens mais complexos - funciona, mas até certo ponto. De fato o filme dirigido pelo Vaughn Stein (de "A Vingança Perfeita") entrega uma narrativa tensa e envolvente, mesmo com algumas passagens mais cadenciadas, explorando com inteligência as complexidades da mente humana. No entanto, o roteiro do novato David Murray acaba tropeçando na falta de originalidade de sua trama e na simplicidade de suas conclusões - isso acaba colocando um filme com muito potencial naquela prateleira de "apenas um excelente entretenimento para um sábado chuvoso". Eu diria que aqui temos um filme bom, fácil e bastante divertido, mas não inesquecível!
Após a trágica morte de Daphne (Emily Alyn Lind), uma de suas pacientes e com quem estabeleceu um forte vinculo emocional, o renomado psicólogo Philip (Casey Affleck) se vê envolvido em uma teia de segredos e obsessão. Ele passa a ser perseguido por James (Sam Claflin), o irmão perturbado de Daphne, que acredita ter motivos suficientes para aterrorizar Philip e toda sua família. Confira o trailer (em inglês):
Um dos pontos positivos de "Every Breath You Take" é o desempenho do elenco. Casey Affleck traz uma intensidade sutil ao seu papel, transmitindo a confusão e a angústia de seu personagem de maneira convincente - ele sabe trabalhar o silêncio e a dor mais íntima, criando uma atmosfera de melancolia impressionante. Reparem como ele se relaciona com sua mulher, Grace (Michelle Monaghan), e como essa relação vai ganhando força e desconstruindo toda uma expectativa de "volta por cima" para essa família. Já Sam Claflin, de certa forma, também se destaca como o antagonista - em alguns momentos ele pode até parecer mais estereotipado, mas é inegável sua capacidade de transmitir um tom de ameaça constante e perturbadora sem precisar se apoiar nos diálogos.
A direção de Vaughn Stein é competente, apresentando uma estética pesada que chama atenção. Ao lado do fotógrafo Michael Merriman (responsável pela segunda unidade de "Green Book"), Stein se aproveita de um conceito visualmente desconfortável, valorizando uma palheta mais fria e um cenário gélido - isso aproxima o drama do suspense com a gramática correta. Ao criar essa atmosfera de tensão permanente, ele nos conquista pela forma e não necessariamente pelo conteúdo - no terceiro ato, mesmo com uma reviravolta interessante (e talvez óbvia), essa afirmação fica ainda mais clara.
"Every Breath You Take" é um filme que se propõe a examinar as consequências devastadoras da psicopatia, explorando os limites da moralidade de uma maneira mais clássica. Com performances intensas e uma direção habilidosa, o filme nos leva por um caminho sinuoso, onde nada pode ser descartado quando o assunto é a dor íntima, a depressão. Ao mergulhar em uma história naturalmente envolvente, nos permitimos entender as fraquezas do roteiro como parte da imaturidade de seu roteirista, mas que nem por isso deixa de entregar uma trama divertida.
Pela pipoca, pelo cobertor e pelo entretenimento despretensioso, vá para o play!
Assistir "Every Breath You Take" é como olhar para os dramas psicológicos, daqueles com fortes elementos de suspense do passado, como "Mulher Solteira Procura" ou "A Mão que Balança o Berço", porém com uma nova perspectiva de tentar focar no desenvolvimento de personagens mais complexos - funciona, mas até certo ponto. De fato o filme dirigido pelo Vaughn Stein (de "A Vingança Perfeita") entrega uma narrativa tensa e envolvente, mesmo com algumas passagens mais cadenciadas, explorando com inteligência as complexidades da mente humana. No entanto, o roteiro do novato David Murray acaba tropeçando na falta de originalidade de sua trama e na simplicidade de suas conclusões - isso acaba colocando um filme com muito potencial naquela prateleira de "apenas um excelente entretenimento para um sábado chuvoso". Eu diria que aqui temos um filme bom, fácil e bastante divertido, mas não inesquecível!
Após a trágica morte de Daphne (Emily Alyn Lind), uma de suas pacientes e com quem estabeleceu um forte vinculo emocional, o renomado psicólogo Philip (Casey Affleck) se vê envolvido em uma teia de segredos e obsessão. Ele passa a ser perseguido por James (Sam Claflin), o irmão perturbado de Daphne, que acredita ter motivos suficientes para aterrorizar Philip e toda sua família. Confira o trailer (em inglês):
Um dos pontos positivos de "Every Breath You Take" é o desempenho do elenco. Casey Affleck traz uma intensidade sutil ao seu papel, transmitindo a confusão e a angústia de seu personagem de maneira convincente - ele sabe trabalhar o silêncio e a dor mais íntima, criando uma atmosfera de melancolia impressionante. Reparem como ele se relaciona com sua mulher, Grace (Michelle Monaghan), e como essa relação vai ganhando força e desconstruindo toda uma expectativa de "volta por cima" para essa família. Já Sam Claflin, de certa forma, também se destaca como o antagonista - em alguns momentos ele pode até parecer mais estereotipado, mas é inegável sua capacidade de transmitir um tom de ameaça constante e perturbadora sem precisar se apoiar nos diálogos.
A direção de Vaughn Stein é competente, apresentando uma estética pesada que chama atenção. Ao lado do fotógrafo Michael Merriman (responsável pela segunda unidade de "Green Book"), Stein se aproveita de um conceito visualmente desconfortável, valorizando uma palheta mais fria e um cenário gélido - isso aproxima o drama do suspense com a gramática correta. Ao criar essa atmosfera de tensão permanente, ele nos conquista pela forma e não necessariamente pelo conteúdo - no terceiro ato, mesmo com uma reviravolta interessante (e talvez óbvia), essa afirmação fica ainda mais clara.
"Every Breath You Take" é um filme que se propõe a examinar as consequências devastadoras da psicopatia, explorando os limites da moralidade de uma maneira mais clássica. Com performances intensas e uma direção habilidosa, o filme nos leva por um caminho sinuoso, onde nada pode ser descartado quando o assunto é a dor íntima, a depressão. Ao mergulhar em uma história naturalmente envolvente, nos permitimos entender as fraquezas do roteiro como parte da imaturidade de seu roteirista, mas que nem por isso deixa de entregar uma trama divertida.
Pela pipoca, pelo cobertor e pelo entretenimento despretensioso, vá para o play!
"Evil" é muito bacana - um ótimo e despretensioso entretenimento que foi capaz de juntar elementos de "Código da Vinci", da franquia "Invocação do Mal", de "O Advogado do Diabo" e até de "Arquivo X". Por mais que essa mistura soe até indigesta, tudo funciona perfeitamente, pois a série segue o conceito procedural para construir a sua linha narrativa, ou seja, em cada episódio temos um misterioso caso para ser investigado, enquanto acompanhamos um arco maior baseado nos problemas e nas relações conflituosas entre os personagens.
Um seminarista chamado David Acosta (Mike Colter) trabalha para a igreja católica usando sua fé e sua sensibilidade para investigar possíveis casos sobrenaturais. Mas, ele precisa contratar a psicóloga forense Kristen Bouchard (Katja Herbers) para oferecer um contraponto e levantar as dúvidas que naturalmente poderiam surgir. Confira o trailer:
"Evil" (que por aqui ganhou um sugestivo subtítulo, "Contatos Sobrenaturais") foi criada por Robert e Michelle King, o casal responsável por "The Good Wife" e pelo derivado "The Good Fight" e tem Michael Emerson (o Ben de "Lost") no seu elenco. Dito isso, já é possível antecipar que a série não deve ser tão levada a sério para que ela se torne aquele compromisso de "apenas um episódio antes de dormir". Ela carrega esse mood informal e antes de nos darmos conta, estamos viciados - então cuidado!
Vendida como um suspense, posso te garantir que ela não passa nem perto da experiência de assistir "A Maldição da Residência Hill" da Netflix - é importante alinhar essa expectativa. Você pode até levar um susto aqui e outro ali, mas nada que possa impactar na sua noite de sono. Os episódios partem do principio fantástico das situações, mas finalizam com respostas céticas e palpáveis sobre os ditos "fenômenos", porém existe algo por trás e a genialidade do roteiro está em nos dar detalhes que, justamente, não podem ser explicados - essa dualidade de interpretações é muito interessante e praticamente nos transformam em um detetive da internet para encontrar uma possível brecha ou a inconsistência de uma tese.
Outro ponto que me agradou, mesmo não se preocupando em se aprofundar, são os confrontos ideológicos entre ciência e religião. Personificadas por Acosta e Bouchard (e essa ainda conta com a ajuda do ótimo Ben Shakir), as discussões são interessantes, respeitosas e até provocadoras - o clima entre os dois personagens e a tensão sexual que os rodeiam, ajudam criar outro elemento narrativo que funciona perfeitamente com a proposta da série: o que é certo e o que é errado, perante a fé ou a ciência? Os subtextos são excelentes e merecem uma certa atenção, mas nunca interferem na linha mais leve dos episódios - mesmo em assuntos densos.
O final da primeira temporada estabelece alguns ganchos interessantes, mas talvez tenha sido expositiva demais. Por outro lado, o roteiro deixa claro que não existe a menor necessidade de se prender aos casos da semana para a série funcionar - focar na mitologia do arco maior foi uma acerto muito bem explorado na segunda temporada que mantém a qualidade, surpreende até e ainda garante uma renovação para a terceira.
Mais uma vez, "Evil - Contatos Sobrenaturais" é entretenimento puro e muito divertido!
"Evil" é muito bacana - um ótimo e despretensioso entretenimento que foi capaz de juntar elementos de "Código da Vinci", da franquia "Invocação do Mal", de "O Advogado do Diabo" e até de "Arquivo X". Por mais que essa mistura soe até indigesta, tudo funciona perfeitamente, pois a série segue o conceito procedural para construir a sua linha narrativa, ou seja, em cada episódio temos um misterioso caso para ser investigado, enquanto acompanhamos um arco maior baseado nos problemas e nas relações conflituosas entre os personagens.
Um seminarista chamado David Acosta (Mike Colter) trabalha para a igreja católica usando sua fé e sua sensibilidade para investigar possíveis casos sobrenaturais. Mas, ele precisa contratar a psicóloga forense Kristen Bouchard (Katja Herbers) para oferecer um contraponto e levantar as dúvidas que naturalmente poderiam surgir. Confira o trailer:
"Evil" (que por aqui ganhou um sugestivo subtítulo, "Contatos Sobrenaturais") foi criada por Robert e Michelle King, o casal responsável por "The Good Wife" e pelo derivado "The Good Fight" e tem Michael Emerson (o Ben de "Lost") no seu elenco. Dito isso, já é possível antecipar que a série não deve ser tão levada a sério para que ela se torne aquele compromisso de "apenas um episódio antes de dormir". Ela carrega esse mood informal e antes de nos darmos conta, estamos viciados - então cuidado!
Vendida como um suspense, posso te garantir que ela não passa nem perto da experiência de assistir "A Maldição da Residência Hill" da Netflix - é importante alinhar essa expectativa. Você pode até levar um susto aqui e outro ali, mas nada que possa impactar na sua noite de sono. Os episódios partem do principio fantástico das situações, mas finalizam com respostas céticas e palpáveis sobre os ditos "fenômenos", porém existe algo por trás e a genialidade do roteiro está em nos dar detalhes que, justamente, não podem ser explicados - essa dualidade de interpretações é muito interessante e praticamente nos transformam em um detetive da internet para encontrar uma possível brecha ou a inconsistência de uma tese.
Outro ponto que me agradou, mesmo não se preocupando em se aprofundar, são os confrontos ideológicos entre ciência e religião. Personificadas por Acosta e Bouchard (e essa ainda conta com a ajuda do ótimo Ben Shakir), as discussões são interessantes, respeitosas e até provocadoras - o clima entre os dois personagens e a tensão sexual que os rodeiam, ajudam criar outro elemento narrativo que funciona perfeitamente com a proposta da série: o que é certo e o que é errado, perante a fé ou a ciência? Os subtextos são excelentes e merecem uma certa atenção, mas nunca interferem na linha mais leve dos episódios - mesmo em assuntos densos.
O final da primeira temporada estabelece alguns ganchos interessantes, mas talvez tenha sido expositiva demais. Por outro lado, o roteiro deixa claro que não existe a menor necessidade de se prender aos casos da semana para a série funcionar - focar na mitologia do arco maior foi uma acerto muito bem explorado na segunda temporada que mantém a qualidade, surpreende até e ainda garante uma renovação para a terceira.
Mais uma vez, "Evil - Contatos Sobrenaturais" é entretenimento puro e muito divertido!
"Exército de Ladrões" é entretenimento puro, divertido e muito bem realizado! Dito isso, é preciso apontar, na minha concepção, seu único ponto fraco - a necessidade absurda do roteiro em ter que conectar o filme ao seu "produto principal", "Army of the Dead: Invasão em Las Vegas". Aliás, para quem não se lembra, "Exército de Ladrões" funciona como uma espécie de prequel do filme dirigido pelo Zack Snyder para a Netflix - sem ao menos precisar que ele existisse, mas com o intuito estratégico de expandir um universo e criar uma franquia promissora.
O filme, que se passa algum tempo antes de "Army of the Dead", acompanha Sebastian Schlencht-Wöhnert (Matthias Schweighöfer, antes de se tornar Ludwig Dieter), um pacato caixa de banco que trabalha na cidade de Munique. Sebastian acaba sendo atraído para a aventura de sua vida após uma jovem misteriosa, a experiente ladra Gwendoline (Nathalie Emmanuel), o recrutar para ser parte de uma equipe formada por alguns dos criminosos mais procurados da Interpol, com o claro objetivo de roubar uma sequência de cofres lendários por toda Europa - esses desenhados de forma ornamentada por um dos maiores artesãos do história e praticamente impossíveis de arrobar. Confira o trailer:
"Exército de Ladrões: Invasão da Europa" também funciona como uma história de origem do carismático personagem Ludwig Dieter. Por si só, essa conexão já seria suficiente para criar um laço emocional com tudo que viria a seguir, porém a forma escolhida pelo roteirista Shay Hatten mais atrapalha do que ajuda - o fato é que não precisava de tantas citações sobre uma pandemia zumbi nos EUA. Por outro lado, Matthias Schweingöfer (que aqui também assume a direção) foi muito inteligente em se afastar do estilo de Snyder e assim criar uma identidade para o prequel que impõe um certo ar de independência - ao lado do diretor de fotografia alemão Bernhard Jasper, eles optaram por uma linguagem mais clean, com um mood sofisticado, apoiado nos tons mais frios da Europa e do aço dos cofres que os protagonistas pretendem roubar.
Embora construído em uma base completamente fantasiosa, "Exército de Ladrões" trabalha seu conceito estético (e narrativo) para se aproximar muito mais de "La Casa de Papel", "Onze Homens e um Segredo" e "Um Truque de Mestre" do que propriamente de "Army of the Dead". Essa escolha cria uma atmosfera perfeita para nos conectarmos com os personagens e torcermos por eles - na trama a expectativa de superar algo que parecia impossível é muito mais importante do que as cenas de ação em si. Claro que existe ação, mas a diversão parte da relação entre os personagens. Schweingöfer mostra uma genuína paixão pelo seu Ludwig Dieter, fortalecendo ainda mais os alívios cômicos com os quais ele já havia trabalhado no filme anterior e transformando definitivamente o personagem em um protagonista carismático e cheio de potencial para mais produtos.
"Exército de Ladrões: Invasão da Europa" explora a gênese de Dieter a partir de uma história que vai se completando com parte do material que já conhecíamos - e isso funciona muito bem. Existe um tom mais intimista ao propor o primeiro amor ao herói improvável e uma direção para a construção de um mito capaz de arrombar qualquer tipo de cofre? Sim - e isso funciona também. Eu diria que dadas as devidas diferenças, muitos elementos que nos conquistaram em "Lupin", retorna por aqui - com a mesma proposta de suspensão da realidade, mas igualmente gostoso de assistir!
Vela o play!
"Exército de Ladrões" é entretenimento puro, divertido e muito bem realizado! Dito isso, é preciso apontar, na minha concepção, seu único ponto fraco - a necessidade absurda do roteiro em ter que conectar o filme ao seu "produto principal", "Army of the Dead: Invasão em Las Vegas". Aliás, para quem não se lembra, "Exército de Ladrões" funciona como uma espécie de prequel do filme dirigido pelo Zack Snyder para a Netflix - sem ao menos precisar que ele existisse, mas com o intuito estratégico de expandir um universo e criar uma franquia promissora.
O filme, que se passa algum tempo antes de "Army of the Dead", acompanha Sebastian Schlencht-Wöhnert (Matthias Schweighöfer, antes de se tornar Ludwig Dieter), um pacato caixa de banco que trabalha na cidade de Munique. Sebastian acaba sendo atraído para a aventura de sua vida após uma jovem misteriosa, a experiente ladra Gwendoline (Nathalie Emmanuel), o recrutar para ser parte de uma equipe formada por alguns dos criminosos mais procurados da Interpol, com o claro objetivo de roubar uma sequência de cofres lendários por toda Europa - esses desenhados de forma ornamentada por um dos maiores artesãos do história e praticamente impossíveis de arrobar. Confira o trailer:
"Exército de Ladrões: Invasão da Europa" também funciona como uma história de origem do carismático personagem Ludwig Dieter. Por si só, essa conexão já seria suficiente para criar um laço emocional com tudo que viria a seguir, porém a forma escolhida pelo roteirista Shay Hatten mais atrapalha do que ajuda - o fato é que não precisava de tantas citações sobre uma pandemia zumbi nos EUA. Por outro lado, Matthias Schweingöfer (que aqui também assume a direção) foi muito inteligente em se afastar do estilo de Snyder e assim criar uma identidade para o prequel que impõe um certo ar de independência - ao lado do diretor de fotografia alemão Bernhard Jasper, eles optaram por uma linguagem mais clean, com um mood sofisticado, apoiado nos tons mais frios da Europa e do aço dos cofres que os protagonistas pretendem roubar.
Embora construído em uma base completamente fantasiosa, "Exército de Ladrões" trabalha seu conceito estético (e narrativo) para se aproximar muito mais de "La Casa de Papel", "Onze Homens e um Segredo" e "Um Truque de Mestre" do que propriamente de "Army of the Dead". Essa escolha cria uma atmosfera perfeita para nos conectarmos com os personagens e torcermos por eles - na trama a expectativa de superar algo que parecia impossível é muito mais importante do que as cenas de ação em si. Claro que existe ação, mas a diversão parte da relação entre os personagens. Schweingöfer mostra uma genuína paixão pelo seu Ludwig Dieter, fortalecendo ainda mais os alívios cômicos com os quais ele já havia trabalhado no filme anterior e transformando definitivamente o personagem em um protagonista carismático e cheio de potencial para mais produtos.
"Exército de Ladrões: Invasão da Europa" explora a gênese de Dieter a partir de uma história que vai se completando com parte do material que já conhecíamos - e isso funciona muito bem. Existe um tom mais intimista ao propor o primeiro amor ao herói improvável e uma direção para a construção de um mito capaz de arrombar qualquer tipo de cofre? Sim - e isso funciona também. Eu diria que dadas as devidas diferenças, muitos elementos que nos conquistaram em "Lupin", retorna por aqui - com a mesma proposta de suspensão da realidade, mas igualmente gostoso de assistir!
Vela o play!
O Brasil é mestre em criar personagens que, com o tempo, vão se mostrando mais complexos do que a própria mídia costuma retratar - e para o bem do entretenimento (e apenas dele), suas histórias vão sendo contadas de uma forma envolvente e, muitas vezes, surpreendente. A minissérie documental "Flordelis: Questiona ou Adora" é mais um ótimo exemplo dessa exploração da "vida como ela é" após um fato marcante, nesse caso um crime! Aqui temos um recorte dos mais interessantes sobre os escândalos em torno da figura pública, pastora evangélica e deputada-federal mulher mais votada do país em 2018 (pelo Rio de Janeiro), Flordelis dos Santos de Souza. Essa produção da Boutique de Filmes para o Globoplay, mergulha nos detalhes do assassinato do marido de Flordelis, Anderson do Carmo, em um crime que chocou o Brasil em 2019 e levantou questões perturbadoras sobre a moralidade, poder e manipulação a partir de uma personagem de aparente santidade. A produção parte de uma investigação intensa e detalhada ao mesmo tempo que traça um perfil psicológico e social de uma mulher cujas contradições são tão grandes quanto sua notoriedade.
Ao longo de seis episódios, vemos como Flordelis, uma líder religiosa carismática e influente, com uma trajetória de vida que ia da adoção de dezenas de crianças à atuação como parlamentar, transformou-se em ré em um julgamento acusada de ser a mandante do assassinato de seu próprio marido. A narrativa constrói uma visão em camadas da vida de Flordelis, desde sua ascensão meteórica como pastora e política, até a queda abrupta após as revelações chocantes sobre seu envolvimento no crime. Confira o trailer aqui:
É inegável que "Flordelis: Questiona ou Adora" é mais uma aula de narrativa documental que nos remete ao melhor do drama policial. A forma como a diretora Mariana Jaspe consegue equilibrar o factual com uma exploração mais profunda da figura pública de Flordelis e do impacto que suas ações tiveram na sociedade ao longo dos anos, é de se aplaudir de pé. O tom de mistério, da fotografia às inserções gráficas, potencializa a maneira como a minissérie levanta perguntas essenciais sobre poder, fé e manipulação, especialmente no contexto de líderes religiosos e sociais que têm influência não apenas dentro de suas igrejas, mas também em esferas políticas e na comunidade. O roteiro é muito eficaz em nos colocar diante de uma figura que, por anos, foi venerada por muitos, inclusive por repórteres e celebridades, mas que se viu envolta em um turbilhão de acusações, inclusive de assassinato.
Jaspe utiliza imagens de arquivo e reconstituições, além de uma variedade de fontes, incluindo entrevistas com familiares, investigadores, ex-integrantes da igreja, jornalistas e autoridades envolvidas no caso, para oferecer um panorama completo dos eventos que levaram ao assassinato de Anderson do Carmo e as investigações que se seguiram. Essa multiplicidade de perspectivas enriquece a narrativa, permitindo uma reflexão sobre as diversas faces da vida de Flordelis - desde a figura materna e de pastora carismática até a de uma mulher dissimulada acusada de tramar um crime brutal. Nesse sentido a montagem da minissérie dá um show - ela é muito eficaz ao manter o ritmo e a tensão constante, revelando as reviravoltas de forma não-linear, o que nos mantém intrigados e, ao mesmo tempo, chocados com as informações que surgem a cada episódio. O formato escolhido por Jaspe permite que a audiência acompanhe o desenvolvimento dos fatos em tempo real, trazendo à tona os detalhes da investigações e o processo judicial, sem perder de vista as complexidades do caso e o histórico de vida dos personagens.
O subtítulo "Questiona ou Adora" é uma provocação inteligente por refletir perfeitamente a dualidade que permeia a imagem de Flordelis: aqueles que a seguiam cegamente, admirando sua história de vida e devoção religiosa, e aqueles que começaram a questionar sua verdadeira índole quando as primeiras suspeitas sobre seu envolvimento no assassinato surgiram. A minissérie é muito competente ao explorar essa dicotomia, sempre de maneira cuidadosa, sem tentar oferecer respostas fáceis ou unilaterais, mas se aproveitando da ambiguidade que ronda a personagem principal para entregar uma peça sólida para quem busca entender mais sobre os aspectos sombrios que podem cercar figuras ditas "autoridade moral".
Vale muito o seu play!
O Brasil é mestre em criar personagens que, com o tempo, vão se mostrando mais complexos do que a própria mídia costuma retratar - e para o bem do entretenimento (e apenas dele), suas histórias vão sendo contadas de uma forma envolvente e, muitas vezes, surpreendente. A minissérie documental "Flordelis: Questiona ou Adora" é mais um ótimo exemplo dessa exploração da "vida como ela é" após um fato marcante, nesse caso um crime! Aqui temos um recorte dos mais interessantes sobre os escândalos em torno da figura pública, pastora evangélica e deputada-federal mulher mais votada do país em 2018 (pelo Rio de Janeiro), Flordelis dos Santos de Souza. Essa produção da Boutique de Filmes para o Globoplay, mergulha nos detalhes do assassinato do marido de Flordelis, Anderson do Carmo, em um crime que chocou o Brasil em 2019 e levantou questões perturbadoras sobre a moralidade, poder e manipulação a partir de uma personagem de aparente santidade. A produção parte de uma investigação intensa e detalhada ao mesmo tempo que traça um perfil psicológico e social de uma mulher cujas contradições são tão grandes quanto sua notoriedade.
Ao longo de seis episódios, vemos como Flordelis, uma líder religiosa carismática e influente, com uma trajetória de vida que ia da adoção de dezenas de crianças à atuação como parlamentar, transformou-se em ré em um julgamento acusada de ser a mandante do assassinato de seu próprio marido. A narrativa constrói uma visão em camadas da vida de Flordelis, desde sua ascensão meteórica como pastora e política, até a queda abrupta após as revelações chocantes sobre seu envolvimento no crime. Confira o trailer aqui:
É inegável que "Flordelis: Questiona ou Adora" é mais uma aula de narrativa documental que nos remete ao melhor do drama policial. A forma como a diretora Mariana Jaspe consegue equilibrar o factual com uma exploração mais profunda da figura pública de Flordelis e do impacto que suas ações tiveram na sociedade ao longo dos anos, é de se aplaudir de pé. O tom de mistério, da fotografia às inserções gráficas, potencializa a maneira como a minissérie levanta perguntas essenciais sobre poder, fé e manipulação, especialmente no contexto de líderes religiosos e sociais que têm influência não apenas dentro de suas igrejas, mas também em esferas políticas e na comunidade. O roteiro é muito eficaz em nos colocar diante de uma figura que, por anos, foi venerada por muitos, inclusive por repórteres e celebridades, mas que se viu envolta em um turbilhão de acusações, inclusive de assassinato.
Jaspe utiliza imagens de arquivo e reconstituições, além de uma variedade de fontes, incluindo entrevistas com familiares, investigadores, ex-integrantes da igreja, jornalistas e autoridades envolvidas no caso, para oferecer um panorama completo dos eventos que levaram ao assassinato de Anderson do Carmo e as investigações que se seguiram. Essa multiplicidade de perspectivas enriquece a narrativa, permitindo uma reflexão sobre as diversas faces da vida de Flordelis - desde a figura materna e de pastora carismática até a de uma mulher dissimulada acusada de tramar um crime brutal. Nesse sentido a montagem da minissérie dá um show - ela é muito eficaz ao manter o ritmo e a tensão constante, revelando as reviravoltas de forma não-linear, o que nos mantém intrigados e, ao mesmo tempo, chocados com as informações que surgem a cada episódio. O formato escolhido por Jaspe permite que a audiência acompanhe o desenvolvimento dos fatos em tempo real, trazendo à tona os detalhes da investigações e o processo judicial, sem perder de vista as complexidades do caso e o histórico de vida dos personagens.
O subtítulo "Questiona ou Adora" é uma provocação inteligente por refletir perfeitamente a dualidade que permeia a imagem de Flordelis: aqueles que a seguiam cegamente, admirando sua história de vida e devoção religiosa, e aqueles que começaram a questionar sua verdadeira índole quando as primeiras suspeitas sobre seu envolvimento no assassinato surgiram. A minissérie é muito competente ao explorar essa dicotomia, sempre de maneira cuidadosa, sem tentar oferecer respostas fáceis ou unilaterais, mas se aproveitando da ambiguidade que ronda a personagem principal para entregar uma peça sólida para quem busca entender mais sobre os aspectos sombrios que podem cercar figuras ditas "autoridade moral".
Vale muito o seu play!
David Fincher é daqueles poucos diretores capaz de criar um ambiente de extrema tensão apenas posicionando a câmera no lugar certo e deixando que a história (com a ajuda de ótimas performances) se conte sozinha - talvez seja esse o maior mérito de "Garota Exemplar". Mesmo se apropriando de diversos elementos narrativos que nos dão a exata sensação de estarmos diante de um complexo thriller policial, Fincher vai além ao nos entregar um inteligente ensaio sobre as interações humanas, a vida adulta e a convivência de um relacionamento.
Adaptação de livro homônimo de Gillian Flynn (a mesma de "Sharp Objects" da HBO), que também assume o papel de roteirista no filme, "Garota Exemplar" conta a história de Nick (Ben Affleck) e Amy Dunne (Rosamund Pike). Após um casamento dos sonhos, eles se veem obrigados a deixar a vida em Nova York e se mudar para uma cidadezinha no Missouri após a notícia de que a mãe de Nick está com câncer. No dia em que comemorariam o aniversário de cinco anos de casamento, Nick retorna para casa e encontra o lugar completamente revirado. Ao não encontrar sua esposa, ele chama a polícia, mas o que ele não imaginava é que a partir daí ele se tornaria o principal suspeito. Confira o trailer:
Depois desse belíssimo trailer ao som de "She" (de Elvis Costello), já dá para se ter uma ideia do que esperar de "Garota Exemplar" e acreditem: você não vai se decepcionar. Com uma fotografia bastante contrastada e trazendo o verde para o primeiro plano da iluminação do diretor Jeff Cronenweth (indicado ao Oscar duas vezes por "The Girl with the Dragon Tattoo" e "Rede Social") e somando com um trabalho de design de som e uma trilha sonora incríveis, o filme nos remete aos bons tempos dos dramas policiais cheio de reviravoltas como "Seven" ou "Zodíaco" (para ficar só na filmografia de Fincher)! Outro ponto que merece muito destaque é a montagem de Kirk Baxter - a forma original como a história vai sendo contada, mesclando cenas atuais, com flashbackse sequências que são fruto da imaginação dos personagens, é simplesmente extraordinária!
O roteiro, fielmente adaptado por Flynn, se apropria do conceito narrativo do livro, mas expande nossa percepção graças ao trabalho detalhista do diretor - se nas cenas do presente, temos o foco no homem, que é objeto de investigação e que segura o mistério até o último ato; nos flashbacks o que interessa é o ponto de vista de Amy, com sua narração humana e que retrata exatamente o que ela mesmo escrevia em seu diário de uma forma quase juvenil - não à toa que Pike foi indicada ao Oscar por essa performance profunda e cheia de camadas. Você vai se surpreender com essa personagem!
O caminho percorrido pelos personagens através da condução segura de Fincher vai além do óbvio. Tecnicamente exemplar (sem nenhum trocadilho), "Gone Girl" (no original) é de uma originalidade artística acima da média e muito atraente para uma audiência disposta a enfrentar aquele universo tão particular. Cheio de contrastes como a vida costuma ser, o filme brinca com nossa percepção da mesma forma que nos provoca a reflexão. Impecável até mesmo diante dos altos parâmetros aos quais constrói sua história, Fincher é capaz de atender aos mais diferentes níveis de leitura, como poucos. Entretenimento de qualidade, "Garota Exemplar" já pode ser considerado um marco na carreira do diretor!
Vale muito o seu play e o seu replay!
David Fincher é daqueles poucos diretores capaz de criar um ambiente de extrema tensão apenas posicionando a câmera no lugar certo e deixando que a história (com a ajuda de ótimas performances) se conte sozinha - talvez seja esse o maior mérito de "Garota Exemplar". Mesmo se apropriando de diversos elementos narrativos que nos dão a exata sensação de estarmos diante de um complexo thriller policial, Fincher vai além ao nos entregar um inteligente ensaio sobre as interações humanas, a vida adulta e a convivência de um relacionamento.
Adaptação de livro homônimo de Gillian Flynn (a mesma de "Sharp Objects" da HBO), que também assume o papel de roteirista no filme, "Garota Exemplar" conta a história de Nick (Ben Affleck) e Amy Dunne (Rosamund Pike). Após um casamento dos sonhos, eles se veem obrigados a deixar a vida em Nova York e se mudar para uma cidadezinha no Missouri após a notícia de que a mãe de Nick está com câncer. No dia em que comemorariam o aniversário de cinco anos de casamento, Nick retorna para casa e encontra o lugar completamente revirado. Ao não encontrar sua esposa, ele chama a polícia, mas o que ele não imaginava é que a partir daí ele se tornaria o principal suspeito. Confira o trailer:
Depois desse belíssimo trailer ao som de "She" (de Elvis Costello), já dá para se ter uma ideia do que esperar de "Garota Exemplar" e acreditem: você não vai se decepcionar. Com uma fotografia bastante contrastada e trazendo o verde para o primeiro plano da iluminação do diretor Jeff Cronenweth (indicado ao Oscar duas vezes por "The Girl with the Dragon Tattoo" e "Rede Social") e somando com um trabalho de design de som e uma trilha sonora incríveis, o filme nos remete aos bons tempos dos dramas policiais cheio de reviravoltas como "Seven" ou "Zodíaco" (para ficar só na filmografia de Fincher)! Outro ponto que merece muito destaque é a montagem de Kirk Baxter - a forma original como a história vai sendo contada, mesclando cenas atuais, com flashbackse sequências que são fruto da imaginação dos personagens, é simplesmente extraordinária!
O roteiro, fielmente adaptado por Flynn, se apropria do conceito narrativo do livro, mas expande nossa percepção graças ao trabalho detalhista do diretor - se nas cenas do presente, temos o foco no homem, que é objeto de investigação e que segura o mistério até o último ato; nos flashbacks o que interessa é o ponto de vista de Amy, com sua narração humana e que retrata exatamente o que ela mesmo escrevia em seu diário de uma forma quase juvenil - não à toa que Pike foi indicada ao Oscar por essa performance profunda e cheia de camadas. Você vai se surpreender com essa personagem!
O caminho percorrido pelos personagens através da condução segura de Fincher vai além do óbvio. Tecnicamente exemplar (sem nenhum trocadilho), "Gone Girl" (no original) é de uma originalidade artística acima da média e muito atraente para uma audiência disposta a enfrentar aquele universo tão particular. Cheio de contrastes como a vida costuma ser, o filme brinca com nossa percepção da mesma forma que nos provoca a reflexão. Impecável até mesmo diante dos altos parâmetros aos quais constrói sua história, Fincher é capaz de atender aos mais diferentes níveis de leitura, como poucos. Entretenimento de qualidade, "Garota Exemplar" já pode ser considerado um marco na carreira do diretor!
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O documentário "Ghislaine Maxwell: Poder e Perversão" é praticamente uma escolha obrigatória para quem assistiu (e gostou) de "Jeffrey Epstein: Poder e Perversão". Embora sem o mesmo brilhantismo narrativo da minissérie de 4 episódios que nos apresentou os detalhes mais secretos do esquema de pirâmide sexual com menores de Epstein, que envolvia poderosos políticos, empresários, acadêmicos e até celebridades; o filme sobre sua parceira Ghislaine serve, basicamente, como um epílogo de uma história que embrulha o estômago por todo contexto que envolveu suas vítimas.
Este documentário parte dos pontos que ficaram abertos depois dos acontecimentos da minissérie. Os detalhes sobre o caso de tráfico sexual pelo prisma do envolvimento de Ghislaine Maxwell, socialite e cúmplice de Jeffrey Epstein, ganha ainda mais força com os depoimentos das próprias vítimas e do recente julgamento pelo qual ela passou. Confira o trailer (em inglês):
Se "Ghislaine Maxwell: Poder e Perversão" fosse o quinto episódio de "Jeffrey Epstein: Poder e Perversão" tudo faria mais sentido - porém há dois anos atrás Ghislaine sequer tinha sido indiciada, o que, claro, impactou na escolha da diretora Lisa Bryant em fechar o primeiro ciclo com o rico material que ela tinha na época. E aqui cabe uma observação relevante: a minissérie foi baseada no ivro de James Patterson “Filthy Rich: The Shocking True Story of Jeffrey Epstein”, o que permitiu a Lisa se aprofundar em diversos detalhes que, infelizmente, não se repetiu no filme de Ghislaine. Em muitos momentos, inclusive, a narrativa se torna até repetitiva e incrivelmente superficial com o claro intuito de tentar relembrar o caso Epstein sem tirar o foco da nova protagonista.
Isso prejudica a experiência? Absolutamente não, porém cria um vinculo tão grande com a obra anterior que seria desrespeitoso da minha parte dizer que a história de "Ghislaine Maxwell: Poder e Perversão" se conta sozinha - não, ela não se conta e isolada perde completamente sua força! Com a ajuda de Maiken Baird (produtora de sucessos como "Ícaro" e "Allen contra Farrow") Lisa revisita alguns elementos que conectados ao caso, nos ajudam a entender um pouco mais da relação entre Ghislaine e Epstein - o ponto alto, no entanto, se dá na construção do perfil de Ghislaine e como sua relação com o pai, o milionário da mídia Robert Maxwell, definiu traços da sua personalidade marcante (e doentia).
"Ghislaine Maxwell: Poder e Perversão" basicamente repete a fragilidade de “Who is Ghislaine Maxwell?”, da HBO, que bebeu da fonte de "Jeffrey Epstein: Poder e Perversão", mas que trouxe poucas novidades para o entendimento do caso como um todo (inclusive de sua investigação e julgamento). Eu diria que esse documentário é até dinâmico, bem produzido, bem dirigido e que funciona muito bem como encerramento de um assunto que passou de novidade (e até surpreendente pelos nomes envolvidos e pelo fim trágico de Epstein) para um tema que dominou os noticiários por muito tempo e que me pareceu ter se desgastado demais.
Repetindo: vale seu play, apenas se você já assistiu "Jeffrey Epstein: Poder e Perversão"!
O documentário "Ghislaine Maxwell: Poder e Perversão" é praticamente uma escolha obrigatória para quem assistiu (e gostou) de "Jeffrey Epstein: Poder e Perversão". Embora sem o mesmo brilhantismo narrativo da minissérie de 4 episódios que nos apresentou os detalhes mais secretos do esquema de pirâmide sexual com menores de Epstein, que envolvia poderosos políticos, empresários, acadêmicos e até celebridades; o filme sobre sua parceira Ghislaine serve, basicamente, como um epílogo de uma história que embrulha o estômago por todo contexto que envolveu suas vítimas.
Este documentário parte dos pontos que ficaram abertos depois dos acontecimentos da minissérie. Os detalhes sobre o caso de tráfico sexual pelo prisma do envolvimento de Ghislaine Maxwell, socialite e cúmplice de Jeffrey Epstein, ganha ainda mais força com os depoimentos das próprias vítimas e do recente julgamento pelo qual ela passou. Confira o trailer (em inglês):
Se "Ghislaine Maxwell: Poder e Perversão" fosse o quinto episódio de "Jeffrey Epstein: Poder e Perversão" tudo faria mais sentido - porém há dois anos atrás Ghislaine sequer tinha sido indiciada, o que, claro, impactou na escolha da diretora Lisa Bryant em fechar o primeiro ciclo com o rico material que ela tinha na época. E aqui cabe uma observação relevante: a minissérie foi baseada no ivro de James Patterson “Filthy Rich: The Shocking True Story of Jeffrey Epstein”, o que permitiu a Lisa se aprofundar em diversos detalhes que, infelizmente, não se repetiu no filme de Ghislaine. Em muitos momentos, inclusive, a narrativa se torna até repetitiva e incrivelmente superficial com o claro intuito de tentar relembrar o caso Epstein sem tirar o foco da nova protagonista.
Isso prejudica a experiência? Absolutamente não, porém cria um vinculo tão grande com a obra anterior que seria desrespeitoso da minha parte dizer que a história de "Ghislaine Maxwell: Poder e Perversão" se conta sozinha - não, ela não se conta e isolada perde completamente sua força! Com a ajuda de Maiken Baird (produtora de sucessos como "Ícaro" e "Allen contra Farrow") Lisa revisita alguns elementos que conectados ao caso, nos ajudam a entender um pouco mais da relação entre Ghislaine e Epstein - o ponto alto, no entanto, se dá na construção do perfil de Ghislaine e como sua relação com o pai, o milionário da mídia Robert Maxwell, definiu traços da sua personalidade marcante (e doentia).
"Ghislaine Maxwell: Poder e Perversão" basicamente repete a fragilidade de “Who is Ghislaine Maxwell?”, da HBO, que bebeu da fonte de "Jeffrey Epstein: Poder e Perversão", mas que trouxe poucas novidades para o entendimento do caso como um todo (inclusive de sua investigação e julgamento). Eu diria que esse documentário é até dinâmico, bem produzido, bem dirigido e que funciona muito bem como encerramento de um assunto que passou de novidade (e até surpreendente pelos nomes envolvidos e pelo fim trágico de Epstein) para um tema que dominou os noticiários por muito tempo e que me pareceu ter se desgastado demais.
Repetindo: vale seu play, apenas se você já assistiu "Jeffrey Epstein: Poder e Perversão"!
"Glass Onion" já começa com a chancela de um subtítulo que nem o diretor Rian Johnson aprovou, mas que inegavelmente contextualiza a jornada que está prestes a começar. "Um Mistério Knives Out" deixa claro que "Entre Facas e Segredos"(o "Knives Out" em versão tupiniquim) vai se estabelecer como uma franquia de mistério com leves elementos de humor e que seu protagonista Benoit Blanc (Daniel Craig) já pode ser considerado uma espécie de Sherlock Holmes moderno!
Nesse segundo capítulo da franquia, Benoit se encontra em uma luxuosa propriedade privada em uma ilha grega onde conhece um grupo de amigos que foram reunidos a convite do bilionário Miles Bron (Edward Norton) para um jogo onde seu "suposto" assassinato aconteceria - claro que os convidados seriam os detetives. O interessante é que cada um dos convidados, de fato, teriam motivos suficientes para matar Miles de verdade, porém quando um deles aparece morto, todos passam a ser suspeitos e é aí que Benoit entra em cena para descobrir como uma rede de segredos, mentiras e motivações se transformaram em um crime real. Confira o trailer:
"Glass Onion: Um Mistério Knives Out" pode até não repetir aquela sensação de novidade narrativa do primeiro filme, mas certamente se apoia de novo naquilo que levou a produção ao titulo de uma das melhores surpresas daquele ano: seu elenco. Agora, com um orçamento bem maior que os 40 milhões de "Entre Facas e Segredos", Edward Norton,Janelle Monáe,Kathryn Hahn,Kate Hudson eDave Bautista se juntam ao Daniel Craig em uma dinâmica que repete a mesma estrutura que funcionou há 3 anos atrás (em 2019) e que mais uma vez nos remete aos deliciosos clássicos de Agatha Christie.
É interessante perceber como Johnson empacotou o novo filme sem perder as referências do antecessor - em sua forma e em seu conteúdo. Se antes a história acontecia entre os cômodos de uma mansão decadente, agora o cenário é uma ilha paradisíaca com tudo de excêntrico que um CEO de uma empresa de tecnologia poderia sonhar em ter - mais uma vez o diretor usa de alegorias para atacar a elite econômica (e pseudo-intelectual) dos EUA e a maneira como ela trabalha pela manutenção do seu status quo. Talvez a única fraqueza do roteiro, mesmo brincando com a quebra de linearidade com muita inteligência, seja o mistério em si - é um fato que ele é mais óbvio que o anterior, por outro lado as camadas construídas até a revelação, nesse caso, parecem mais consistentes e lógicas.
Muito bem realizado, com uma montagem frenética e um desenho de som espetacular, "Glass Onion: Um Mistério Knives Out" está longe de ser um filme perfeito, mas muito próximo de ser um dos filmes mais divertidos de 2022 - é entretenimento puro, do começo ao fim!
Vale muito a pena!
"Glass Onion" já começa com a chancela de um subtítulo que nem o diretor Rian Johnson aprovou, mas que inegavelmente contextualiza a jornada que está prestes a começar. "Um Mistério Knives Out" deixa claro que "Entre Facas e Segredos"(o "Knives Out" em versão tupiniquim) vai se estabelecer como uma franquia de mistério com leves elementos de humor e que seu protagonista Benoit Blanc (Daniel Craig) já pode ser considerado uma espécie de Sherlock Holmes moderno!
Nesse segundo capítulo da franquia, Benoit se encontra em uma luxuosa propriedade privada em uma ilha grega onde conhece um grupo de amigos que foram reunidos a convite do bilionário Miles Bron (Edward Norton) para um jogo onde seu "suposto" assassinato aconteceria - claro que os convidados seriam os detetives. O interessante é que cada um dos convidados, de fato, teriam motivos suficientes para matar Miles de verdade, porém quando um deles aparece morto, todos passam a ser suspeitos e é aí que Benoit entra em cena para descobrir como uma rede de segredos, mentiras e motivações se transformaram em um crime real. Confira o trailer:
"Glass Onion: Um Mistério Knives Out" pode até não repetir aquela sensação de novidade narrativa do primeiro filme, mas certamente se apoia de novo naquilo que levou a produção ao titulo de uma das melhores surpresas daquele ano: seu elenco. Agora, com um orçamento bem maior que os 40 milhões de "Entre Facas e Segredos", Edward Norton,Janelle Monáe,Kathryn Hahn,Kate Hudson eDave Bautista se juntam ao Daniel Craig em uma dinâmica que repete a mesma estrutura que funcionou há 3 anos atrás (em 2019) e que mais uma vez nos remete aos deliciosos clássicos de Agatha Christie.
É interessante perceber como Johnson empacotou o novo filme sem perder as referências do antecessor - em sua forma e em seu conteúdo. Se antes a história acontecia entre os cômodos de uma mansão decadente, agora o cenário é uma ilha paradisíaca com tudo de excêntrico que um CEO de uma empresa de tecnologia poderia sonhar em ter - mais uma vez o diretor usa de alegorias para atacar a elite econômica (e pseudo-intelectual) dos EUA e a maneira como ela trabalha pela manutenção do seu status quo. Talvez a única fraqueza do roteiro, mesmo brincando com a quebra de linearidade com muita inteligência, seja o mistério em si - é um fato que ele é mais óbvio que o anterior, por outro lado as camadas construídas até a revelação, nesse caso, parecem mais consistentes e lógicas.
Muito bem realizado, com uma montagem frenética e um desenho de som espetacular, "Glass Onion: Um Mistério Knives Out" está longe de ser um filme perfeito, mas muito próximo de ser um dos filmes mais divertidos de 2022 - é entretenimento puro, do começo ao fim!
Vale muito a pena!
"Godzilla Minus One" é um "filme de monstro" raiz - na sua forma e na sua essência! Justamente por essa característica tão marcante, fugindo desse estereótipo blockbuster mais genérico onde efeitos especiais cansativos se sobrepõem perante uma narrativa menos estruturada, é que essa produção japonesa, vencedora do Oscar de "Melhor Efeitos Visuais" em 2014, surge como uma relevante surpresa no universo kaiju (subgênero da ficção científica, criado pelos diretores Eiji Tsuburaya e Ishiro Honda, mentes por trás do "Godzilla" original de 1954). Dirigida pelo mestre japonês Takashi Yamazaki ("Papeis em Branco"), essa nova versão nos leva ao Japão do pós-Segunda Guerra Mundial, um país devastado e em reconstrução, assombrado por uma criatura colossal que emerge do mar para semear o terror. E aqui cabe um comentário importante: mais do que um monstro gigante, esse Godzilla se torna um símbolo das feridas ainda abertas da guerra, um lembrete cruel da fragilidade da paz e do custo humano que deixaram marcas em várias gerações daquele país.
Basicamente, a trama de "Minus One"acompanha a jornada de um jovem piloto kamikaze, Koichi Shikishima (Ryunosuke Kamiki), que se junta à uma força-tarefa encarregada de impedir que um misterioso monstro, Godzilla, chegue em Tóquio. Ao lado de outros sobreviventes da guerra, Koichi terá que enfrentar não apenas a fúria dessa criatura, mas também seus próprios traumas e demônios interiores. Confira o trailer (com legendas em inglês):
Pensado para celebrar o aniversário de 70 anos de Gojira (nome original do monstrão), "Godzilla Minus One" se destaca por sua simplicidade narrativa e por um visual belíssimo - e não falo apenas dos incríveis efeitos especiais, mas de uma fotografia cheia de identidade e criatividade que soa até improvável dado o surpreendente baixo orçamento da produção. Densa e com camadas emocionais bastante sensíveis, essa versão de Godzilla vai além da simples proposta de mostrar o tamanho da destruição proporcionada pelo monstro ao se apropriar de personagens que se colocam no centro de uma reflexão mais ampla sobre a tradição e os costumes de toda uma sociedade ainda em reconstrução pós-guerra. Ao explorar temas como a culpa, a importância da sobrevivência como nação, a esperança como fator humano e a busca por uma redenção em um mundo em ruínas, Yamazaki constrói com maestria uma atmosfera opressiva e angustiante que praticamente nos impede de tirar os olhos da tela durante os 120 minutos de filme.
Se as cenas de ação são de tirar o fôlego, com efeitos visuais realmente impressionantes, eu diria que é conexão com uma realidade palpável que faz de "Godzilla Minus One" mais impactante - embora a estética seja diferente de"Cloverfield", as sensações que o caos nos provoca são parecidas. Yamazaki sabe fazer do seu monstro um catalisador para o desenvolvimento dos personagens principais sem cair no estereótipo do herói hollywoodiano - embora Koichi tenha um pouquinho de "William Wallace", é inegável. A trilha sonora de Naoki Satô (seis vezes indicado ao Oscar do Japão, o "Awards of the Japanese Academy") é sensacional - ela funciona tão bem com o desenho de som criado pelo Moin G. Khan que somos incapazes de afirmar o que é real e o que é diegético. Tem uma cena no terceiro ato onde a total ausência de som dá o tom do drama - reparem na dramaticidade que essa escolha conceitual provoca!
O fato é "Minus One" é uma experiência completa, que nos faz sentir o horror do incontrolável, que nos faz pensar sobre o valor da vida e que até nos emociona por tudo que envolve aquela jornada. Falta alguma coragem para o roteiro assumir alguns riscos e deixar a entrega menos previsível? Sim, mas com tudo dentro do aceitável, é impossível negar que essa versão de "Godzilla" dá um baile em tudo que já foi feito, com muito mais dinheiro, no recente "Monsterverso". Aliás, essa é a prova que muitas vezes o retorno ao essencial bem feito vale muito mais do que o novo feito na superficialidade!
Vale muito o seu play!
"Godzilla Minus One" é um "filme de monstro" raiz - na sua forma e na sua essência! Justamente por essa característica tão marcante, fugindo desse estereótipo blockbuster mais genérico onde efeitos especiais cansativos se sobrepõem perante uma narrativa menos estruturada, é que essa produção japonesa, vencedora do Oscar de "Melhor Efeitos Visuais" em 2014, surge como uma relevante surpresa no universo kaiju (subgênero da ficção científica, criado pelos diretores Eiji Tsuburaya e Ishiro Honda, mentes por trás do "Godzilla" original de 1954). Dirigida pelo mestre japonês Takashi Yamazaki ("Papeis em Branco"), essa nova versão nos leva ao Japão do pós-Segunda Guerra Mundial, um país devastado e em reconstrução, assombrado por uma criatura colossal que emerge do mar para semear o terror. E aqui cabe um comentário importante: mais do que um monstro gigante, esse Godzilla se torna um símbolo das feridas ainda abertas da guerra, um lembrete cruel da fragilidade da paz e do custo humano que deixaram marcas em várias gerações daquele país.
Basicamente, a trama de "Minus One"acompanha a jornada de um jovem piloto kamikaze, Koichi Shikishima (Ryunosuke Kamiki), que se junta à uma força-tarefa encarregada de impedir que um misterioso monstro, Godzilla, chegue em Tóquio. Ao lado de outros sobreviventes da guerra, Koichi terá que enfrentar não apenas a fúria dessa criatura, mas também seus próprios traumas e demônios interiores. Confira o trailer (com legendas em inglês):
Pensado para celebrar o aniversário de 70 anos de Gojira (nome original do monstrão), "Godzilla Minus One" se destaca por sua simplicidade narrativa e por um visual belíssimo - e não falo apenas dos incríveis efeitos especiais, mas de uma fotografia cheia de identidade e criatividade que soa até improvável dado o surpreendente baixo orçamento da produção. Densa e com camadas emocionais bastante sensíveis, essa versão de Godzilla vai além da simples proposta de mostrar o tamanho da destruição proporcionada pelo monstro ao se apropriar de personagens que se colocam no centro de uma reflexão mais ampla sobre a tradição e os costumes de toda uma sociedade ainda em reconstrução pós-guerra. Ao explorar temas como a culpa, a importância da sobrevivência como nação, a esperança como fator humano e a busca por uma redenção em um mundo em ruínas, Yamazaki constrói com maestria uma atmosfera opressiva e angustiante que praticamente nos impede de tirar os olhos da tela durante os 120 minutos de filme.
Se as cenas de ação são de tirar o fôlego, com efeitos visuais realmente impressionantes, eu diria que é conexão com uma realidade palpável que faz de "Godzilla Minus One" mais impactante - embora a estética seja diferente de"Cloverfield", as sensações que o caos nos provoca são parecidas. Yamazaki sabe fazer do seu monstro um catalisador para o desenvolvimento dos personagens principais sem cair no estereótipo do herói hollywoodiano - embora Koichi tenha um pouquinho de "William Wallace", é inegável. A trilha sonora de Naoki Satô (seis vezes indicado ao Oscar do Japão, o "Awards of the Japanese Academy") é sensacional - ela funciona tão bem com o desenho de som criado pelo Moin G. Khan que somos incapazes de afirmar o que é real e o que é diegético. Tem uma cena no terceiro ato onde a total ausência de som dá o tom do drama - reparem na dramaticidade que essa escolha conceitual provoca!
O fato é "Minus One" é uma experiência completa, que nos faz sentir o horror do incontrolável, que nos faz pensar sobre o valor da vida e que até nos emociona por tudo que envolve aquela jornada. Falta alguma coragem para o roteiro assumir alguns riscos e deixar a entrega menos previsível? Sim, mas com tudo dentro do aceitável, é impossível negar que essa versão de "Godzilla" dá um baile em tudo que já foi feito, com muito mais dinheiro, no recente "Monsterverso". Aliás, essa é a prova que muitas vezes o retorno ao essencial bem feito vale muito mais do que o novo feito na superficialidade!
Vale muito o seu play!
Esse é um filme sobre os horrores da guerra pela perspectiva do silêncio. E aqui não estou falando sobre "a ausência de som" e sim sobre a sua jornada solitária de alguém que precisa tomar decisões que impactam a vida de milhares de semelhantes e que precisa carregar a dor de estar nessa posição. Se você está em busca de uma experiência íntima que mistura o drama das tensões geopolíticas com a luta de um personagem histórico que pouca gente conhece, "Golda" é simplesmente imperdível. Dirigido por Guy Nattiv, o filme nos transporta para um momento crucial na história de Israel a partir de uma narrativa truncada, cadenciada, mas extremamente envolvente para aqueles que se identificam com o tema e com esse tipo de dinâmica. Bem ao estilo de "Oslo" ou de "O Destino de uma Nação", "Golda" é um filme que se destaca, proporcionando uma visão única e poderosa desse doloroso capítulo da humanidade.
Ambientado na Guerra do Yom Kippur, em 1973, esse drama político baseado em uma história real, mostra como a primeira-ministra Golda Meir (Helen Mirren), conhecida como a “Dama de Ferro” de Israel, enfrenta uma possível destruição do Estado, tomando decisões de alto risco, enquanto trava uma batalha pessoal contra o câncer. Confira o trailer (em inglês):
Esteja preparado para se deparar com um filme difícil na sua proposta narrativa, mas genial na forma com que explora não apenas os desafios políticos da protagonista, mas também sua luta pessoal contra o câncer, oferecendo um olhar íntimo e humano de um momento crítico na história de Israel e também impactante na sua vida. O brilhantismo do trabalho de Mirren, que inexplicavelmente não foi indicada ao Oscar 2024 por esse personagem, está justamente em desmistificar a imagem de Golda Meir como uma líder incansável e segura que toma decisões de alto risco para salvar seu país de uma iminente destruição. Aqui, o que vemos é a fragilidade, o receio, o medo, a dor, e até a insegurança sobre o futuro, mas sempre com muita sensibilidade - o sentimento de Meir está no olhar não nas palavras e isso é bonito demais!
Obviamente que "Golda" brilha não apenas por sua narrativa envolvente ou por uma performance notavelmente acima da média, mas também por elementos técnicos e artísticos que elevam a nossa jornada como audiência. A fotografia do Jasper Wolf (de "Monos - Entre o Céu e o Inferno"), por exemplo, captura de maneira extremamente realista a atmosfera tensa da guerra através dos sentidos - olhar esse horror por uma tela ou escutar o sofrimento por um rádio, estando em segurança, exige do ator um trabalho de introspecção difícil, mas com uma lente fechada (85mm) que super expõe essa condição, conseguimos não só sentir a angustia e a tensão como também testemunhar os reflexos das decisões ali tomadas, sejam elas certas ou erradas. A direção habilidosa de Guy Nattiv (vencedor do Oscar de "Melhor Curta-Metragem" em 2019 por "Skin") sabe da importância dessa dicotomia e não por acaso mescla imagens documentais com suas reconstituições, nos guiando por essas reviravoltas politicas (e bélicas) com a eficiência de quem não esquece que é o ser humano quem transforma uma história.
Dito isso, é de se elogiar como "Golda" demonstra um compromisso impressionante com a autenticidade histórica, recriando fielmente os eventos da época bem como transformando Helen Mirren na própria Meir com uma maquiagem que rendeu até uma indicação ao Oscar para o time de " ais do que um filme histórico, muito bem produzido e realizado, "Golda" é uma jornada emocional que nos leva aos corredores do poder, revelando a complexidade e coragem por trás da "Dama de Ferro" de Israel. Todo mundo vai gostar? Acho que não, mas se você leu até aqui, pode dar o play porque você não vai se arrepender. História pura, simplesmente imperdível!
Esse é um filme sobre os horrores da guerra pela perspectiva do silêncio. E aqui não estou falando sobre "a ausência de som" e sim sobre a sua jornada solitária de alguém que precisa tomar decisões que impactam a vida de milhares de semelhantes e que precisa carregar a dor de estar nessa posição. Se você está em busca de uma experiência íntima que mistura o drama das tensões geopolíticas com a luta de um personagem histórico que pouca gente conhece, "Golda" é simplesmente imperdível. Dirigido por Guy Nattiv, o filme nos transporta para um momento crucial na história de Israel a partir de uma narrativa truncada, cadenciada, mas extremamente envolvente para aqueles que se identificam com o tema e com esse tipo de dinâmica. Bem ao estilo de "Oslo" ou de "O Destino de uma Nação", "Golda" é um filme que se destaca, proporcionando uma visão única e poderosa desse doloroso capítulo da humanidade.
Ambientado na Guerra do Yom Kippur, em 1973, esse drama político baseado em uma história real, mostra como a primeira-ministra Golda Meir (Helen Mirren), conhecida como a “Dama de Ferro” de Israel, enfrenta uma possível destruição do Estado, tomando decisões de alto risco, enquanto trava uma batalha pessoal contra o câncer. Confira o trailer (em inglês):
Esteja preparado para se deparar com um filme difícil na sua proposta narrativa, mas genial na forma com que explora não apenas os desafios políticos da protagonista, mas também sua luta pessoal contra o câncer, oferecendo um olhar íntimo e humano de um momento crítico na história de Israel e também impactante na sua vida. O brilhantismo do trabalho de Mirren, que inexplicavelmente não foi indicada ao Oscar 2024 por esse personagem, está justamente em desmistificar a imagem de Golda Meir como uma líder incansável e segura que toma decisões de alto risco para salvar seu país de uma iminente destruição. Aqui, o que vemos é a fragilidade, o receio, o medo, a dor, e até a insegurança sobre o futuro, mas sempre com muita sensibilidade - o sentimento de Meir está no olhar não nas palavras e isso é bonito demais!
Obviamente que "Golda" brilha não apenas por sua narrativa envolvente ou por uma performance notavelmente acima da média, mas também por elementos técnicos e artísticos que elevam a nossa jornada como audiência. A fotografia do Jasper Wolf (de "Monos - Entre o Céu e o Inferno"), por exemplo, captura de maneira extremamente realista a atmosfera tensa da guerra através dos sentidos - olhar esse horror por uma tela ou escutar o sofrimento por um rádio, estando em segurança, exige do ator um trabalho de introspecção difícil, mas com uma lente fechada (85mm) que super expõe essa condição, conseguimos não só sentir a angustia e a tensão como também testemunhar os reflexos das decisões ali tomadas, sejam elas certas ou erradas. A direção habilidosa de Guy Nattiv (vencedor do Oscar de "Melhor Curta-Metragem" em 2019 por "Skin") sabe da importância dessa dicotomia e não por acaso mescla imagens documentais com suas reconstituições, nos guiando por essas reviravoltas politicas (e bélicas) com a eficiência de quem não esquece que é o ser humano quem transforma uma história.
Dito isso, é de se elogiar como "Golda" demonstra um compromisso impressionante com a autenticidade histórica, recriando fielmente os eventos da época bem como transformando Helen Mirren na própria Meir com uma maquiagem que rendeu até uma indicação ao Oscar para o time de " ais do que um filme histórico, muito bem produzido e realizado, "Golda" é uma jornada emocional que nos leva aos corredores do poder, revelando a complexidade e coragem por trás da "Dama de Ferro" de Israel. Todo mundo vai gostar? Acho que não, mas se você leu até aqui, pode dar o play porque você não vai se arrepender. História pura, simplesmente imperdível!
Antes de mais nada é preciso alinhar as expectativas, já que "Holy Spider" pode ser entendido de duas formas: uma pela perspectiva mais sócio-cultural e religiosa do cinema independente iraniano e outra pelo olhar mais investigativo do entretenimento nórdico. Pois bem, se analisarmos o filme mais superficialmente, eu diria que essa produção dinamarquesa dirigida pelo iraniano Ali Abbasi (de "Border"), é apenas um mediado (para bom) thriller policial. Então não caia nessa armadilha, pois essa atmosfera "serial killer" é apenas o pano de fundo para discutir camadas muito mais delicadas sobre a relação visceral entre o ser humano extremista e a violência misógina do Irã. Um dos lançamentos mais comentados de 2022, dividindo opiniões e gerando debates acalorados, "Holy Spider" chega chancelado por mais de 20 prêmios em festivais ao redor do planeta incluindo o de Melhor Atriz no Festival de Cannes para Zar Amir Ebrahimi.
A trama acompanha a saga da destemida jornalista Arezoo Rahimi (Amir-Ebrahimi), que se infiltra no submundo da cidade sagrada de Mashhad, no Irã, em busca de um serial killer que aterroriza a comunidade: o "Aranha Assassina". Motivado por crenças religiosas distorcidas e sexistas, ele se autoproclama o purificador da cidade, exterminando prostitutas que considera "impuras". Confira o trailer (com legendas em inglês):
Impactante no seu conteúdo e provocar na forma como esse conteúdo é apresentado, Abbasi merece todos os elogios por nos entregar um retrato cru e sem concessões sobre a realidade iraniana, onde a misoginia está enraizada na cultura e na religião. Embora em um primeiro olhar "Holy Spider" pareça focar na investigação de Rahimi, o roteiro do próprio diretor com o estreante Afshin Kamran Bahrami, sai do óbvio ao colocar a jornalista em uma verdadeira rota de colisão com as autoridades corruptas e os homens misóginos que defendem os atos do assassino. Se a cada passo, Rahimi enfrenta os perigos e os obstáculos de uma mulher, solteira, jornalista e forasteira, tentando entender a razão da polícia local não estar dando atenção aos crimes, seu impulso, sem dúvida, está na razão pela qual essa busca por justiça acontece: é preciso dar voz às mulheres silenciadas pela violência.
O diretor constrói uma atmosfera claustrofóbica e sufocante, utilizando planos fechados e uma paleta de cores sombrias que refletem a opressão e a violência presentes na história. Esse estilo de fotografia do dinamarquês Nadim Carlsen nos remete aos excelentes policiais nórdicos - aqui sem o azul gélido, mas com o verde e o marrom das paisagens de Mashhad totalmente alinhados ao conceito mais documental de Abbasi. Ele usa muito da câmera solta para trazer veracidade para a narrativa e valorizar a história que é baseada em fatos reais. As performances dos atores são igualmente competentes, com destaque para Zar Amir-Ebrahimi, que entrega uma jornada comovente como Rahimi.
"Holy Spider" é realmente um filme mais difícil, que vai exigir um olhar mais holístico sobre a trama e por se tratar de uma forte crítica social, profunda e contundente, que expõe a hipocrisia e a brutalidade de um sistema patriarcal que oprime e silencia as mulheres iranianas. É um filme que choca e que revolta, mas que também nos convida para uma reflexão importante sobre a força e a resiliência das mulheres em sua luta por justiça e liberdade. Então se você busca uma experiência cinematográfica perturbadora e ao mesmo tempo instigante, que te fará questionar as estruturas de poder e as raízes da violência contra as mulheres, "Holy Spider" é um filme imperdível - especialmente por um terceiro ato digno de muitos prêmios.
Prepare-se para ser confrontado com realidades duras e incômodas, mas também com a força e a bravura de uma mulher que luta por um mundo mais justo. Pode dar o play!
Antes de mais nada é preciso alinhar as expectativas, já que "Holy Spider" pode ser entendido de duas formas: uma pela perspectiva mais sócio-cultural e religiosa do cinema independente iraniano e outra pelo olhar mais investigativo do entretenimento nórdico. Pois bem, se analisarmos o filme mais superficialmente, eu diria que essa produção dinamarquesa dirigida pelo iraniano Ali Abbasi (de "Border"), é apenas um mediado (para bom) thriller policial. Então não caia nessa armadilha, pois essa atmosfera "serial killer" é apenas o pano de fundo para discutir camadas muito mais delicadas sobre a relação visceral entre o ser humano extremista e a violência misógina do Irã. Um dos lançamentos mais comentados de 2022, dividindo opiniões e gerando debates acalorados, "Holy Spider" chega chancelado por mais de 20 prêmios em festivais ao redor do planeta incluindo o de Melhor Atriz no Festival de Cannes para Zar Amir Ebrahimi.
A trama acompanha a saga da destemida jornalista Arezoo Rahimi (Amir-Ebrahimi), que se infiltra no submundo da cidade sagrada de Mashhad, no Irã, em busca de um serial killer que aterroriza a comunidade: o "Aranha Assassina". Motivado por crenças religiosas distorcidas e sexistas, ele se autoproclama o purificador da cidade, exterminando prostitutas que considera "impuras". Confira o trailer (com legendas em inglês):
Impactante no seu conteúdo e provocar na forma como esse conteúdo é apresentado, Abbasi merece todos os elogios por nos entregar um retrato cru e sem concessões sobre a realidade iraniana, onde a misoginia está enraizada na cultura e na religião. Embora em um primeiro olhar "Holy Spider" pareça focar na investigação de Rahimi, o roteiro do próprio diretor com o estreante Afshin Kamran Bahrami, sai do óbvio ao colocar a jornalista em uma verdadeira rota de colisão com as autoridades corruptas e os homens misóginos que defendem os atos do assassino. Se a cada passo, Rahimi enfrenta os perigos e os obstáculos de uma mulher, solteira, jornalista e forasteira, tentando entender a razão da polícia local não estar dando atenção aos crimes, seu impulso, sem dúvida, está na razão pela qual essa busca por justiça acontece: é preciso dar voz às mulheres silenciadas pela violência.
O diretor constrói uma atmosfera claustrofóbica e sufocante, utilizando planos fechados e uma paleta de cores sombrias que refletem a opressão e a violência presentes na história. Esse estilo de fotografia do dinamarquês Nadim Carlsen nos remete aos excelentes policiais nórdicos - aqui sem o azul gélido, mas com o verde e o marrom das paisagens de Mashhad totalmente alinhados ao conceito mais documental de Abbasi. Ele usa muito da câmera solta para trazer veracidade para a narrativa e valorizar a história que é baseada em fatos reais. As performances dos atores são igualmente competentes, com destaque para Zar Amir-Ebrahimi, que entrega uma jornada comovente como Rahimi.
"Holy Spider" é realmente um filme mais difícil, que vai exigir um olhar mais holístico sobre a trama e por se tratar de uma forte crítica social, profunda e contundente, que expõe a hipocrisia e a brutalidade de um sistema patriarcal que oprime e silencia as mulheres iranianas. É um filme que choca e que revolta, mas que também nos convida para uma reflexão importante sobre a força e a resiliência das mulheres em sua luta por justiça e liberdade. Então se você busca uma experiência cinematográfica perturbadora e ao mesmo tempo instigante, que te fará questionar as estruturas de poder e as raízes da violência contra as mulheres, "Holy Spider" é um filme imperdível - especialmente por um terceiro ato digno de muitos prêmios.
Prepare-se para ser confrontado com realidades duras e incômodas, mas também com a força e a bravura de uma mulher que luta por um mundo mais justo. Pode dar o play!
Intrigante! Uma atmosfera que nos remete ao excelente "Devs", mas que não nos deixa esquecer de "Ruptura" - só que com o mérito de ter sido lançada bem antes dessas duas pérolas do streaming. O fato é que "Homecoming" é muito mais que uma minissérie de suspense psicológico, ela é um verdadeiro quebra-cabeça narrativo que nos provoca e nos surpreende a cada nova peça apresentada. Criada por Sam Esmail (a mente criativa por trás de "Mr. Robot") essa recomendação é um prato cheio para quem aprecia um bom thriller com fortes elementos de mistério e algumas camadas de drama. Vale lembrar, inclusive, que "Homecoming" venceu o Satellite Awards como Melhor Série Dramática em 2019, além de ter recebido indicações importantes no Globo de Ouro e no Emmy do mesmo ano.
Boas intenções. Chefes inconstantes. Paranoia crescente. Consequências imprevistas saindo de controle. Heidi (Julia Roberts) trabalha em Homecoming, uma unidade que ajuda soldados no processo de transição para a vida civil. Anos após ela começar uma nova vida, o Departamento de Defesa do EUA passa a questionar Heidi para entender os reais motivos de sua saída do misterioso programa e é justamente a partir daí que ela entende que há uma outra história por trás daquela que ela acreditava ser a verdadeira. Confira o trailer (em inglês):
Nem o amável sorriso de Heidi consegue disfarçar que há algo de errado em "Homecoming" - desde o primeiro episódio somos fisgados pelo clima de tensão e mistério que vai tomando conta dos corredores deste que se anuncia como um projeto revolucionário, mas que claramente esconde nos seus benefícios, interesses maliciosos. Explorando a fragilidade da mente humana e os efeitos psicológicos do trauma, Esmail sabe exatamente como criar uma complexa e bem elaborada trama, com personagens realmente intrigantes e uma atmosfera que nos faz questionar, a cada episódio, tudo o que sabemos, ou pelo menos, tudo o que nos vai sendo contado.
Com duas linhas temporais distintas, que inicialmente não se completam, "Homecoming" dá um show como proposta narrativa e conceito estético - mais do que uma mudança sutil no visual da protagonista, os períodos são filmados de modos muito diferentes. Enquanto o passado ocupa toda a tela da TV e valoriza as cores do arborizado e moderno centro de recuperação, o presente é apresentado no formato 4:3, aquele mais quadrado, com tons opacos e acinzentados - tudo isso para criar um sentimento de angustia e melancolia que se misturam e que acaba se justificando pela perspectiva de uma inteligente metáfora que vai surgindo com o final da temporada. O fato é que, em "Homecoming", nada é por acaso.
Com atuações impecáveis de Julia Roberts e Stephan James (que interpreta o soldado Walter Cruz que Heidi monitora) o que vemos na tela é a potencialização da complexidade emocional do ser humano se sobrepondo perante sua própria fragilidade. Sim, a sentença pode até soar redundante, mas ao mergulharmos na proposta de Esmail entendemos perfeitamente sua estratégia de criar esse senso de desorientação permanente, nos provocando e instigando nossa curiosidade como poucas vezes experienciamos. No entanto, antes do play, saiba que "Homecoming" não é uma jornada simples, sua narrativa é mais cadenciada e seu propósito como obra é naturalmente pouco expositivo. Dito isso, se prepare para uma jornada viciante (ainda mais sabendo que cada episódio tem apenas 30 minutos) onde os perigos do poder e da manipulação serão ótimos assuntos para uma discussão - pós-créditos, claro.
Imperdível!
Intrigante! Uma atmosfera que nos remete ao excelente "Devs", mas que não nos deixa esquecer de "Ruptura" - só que com o mérito de ter sido lançada bem antes dessas duas pérolas do streaming. O fato é que "Homecoming" é muito mais que uma minissérie de suspense psicológico, ela é um verdadeiro quebra-cabeça narrativo que nos provoca e nos surpreende a cada nova peça apresentada. Criada por Sam Esmail (a mente criativa por trás de "Mr. Robot") essa recomendação é um prato cheio para quem aprecia um bom thriller com fortes elementos de mistério e algumas camadas de drama. Vale lembrar, inclusive, que "Homecoming" venceu o Satellite Awards como Melhor Série Dramática em 2019, além de ter recebido indicações importantes no Globo de Ouro e no Emmy do mesmo ano.
Boas intenções. Chefes inconstantes. Paranoia crescente. Consequências imprevistas saindo de controle. Heidi (Julia Roberts) trabalha em Homecoming, uma unidade que ajuda soldados no processo de transição para a vida civil. Anos após ela começar uma nova vida, o Departamento de Defesa do EUA passa a questionar Heidi para entender os reais motivos de sua saída do misterioso programa e é justamente a partir daí que ela entende que há uma outra história por trás daquela que ela acreditava ser a verdadeira. Confira o trailer (em inglês):
Nem o amável sorriso de Heidi consegue disfarçar que há algo de errado em "Homecoming" - desde o primeiro episódio somos fisgados pelo clima de tensão e mistério que vai tomando conta dos corredores deste que se anuncia como um projeto revolucionário, mas que claramente esconde nos seus benefícios, interesses maliciosos. Explorando a fragilidade da mente humana e os efeitos psicológicos do trauma, Esmail sabe exatamente como criar uma complexa e bem elaborada trama, com personagens realmente intrigantes e uma atmosfera que nos faz questionar, a cada episódio, tudo o que sabemos, ou pelo menos, tudo o que nos vai sendo contado.
Com duas linhas temporais distintas, que inicialmente não se completam, "Homecoming" dá um show como proposta narrativa e conceito estético - mais do que uma mudança sutil no visual da protagonista, os períodos são filmados de modos muito diferentes. Enquanto o passado ocupa toda a tela da TV e valoriza as cores do arborizado e moderno centro de recuperação, o presente é apresentado no formato 4:3, aquele mais quadrado, com tons opacos e acinzentados - tudo isso para criar um sentimento de angustia e melancolia que se misturam e que acaba se justificando pela perspectiva de uma inteligente metáfora que vai surgindo com o final da temporada. O fato é que, em "Homecoming", nada é por acaso.
Com atuações impecáveis de Julia Roberts e Stephan James (que interpreta o soldado Walter Cruz que Heidi monitora) o que vemos na tela é a potencialização da complexidade emocional do ser humano se sobrepondo perante sua própria fragilidade. Sim, a sentença pode até soar redundante, mas ao mergulharmos na proposta de Esmail entendemos perfeitamente sua estratégia de criar esse senso de desorientação permanente, nos provocando e instigando nossa curiosidade como poucas vezes experienciamos. No entanto, antes do play, saiba que "Homecoming" não é uma jornada simples, sua narrativa é mais cadenciada e seu propósito como obra é naturalmente pouco expositivo. Dito isso, se prepare para uma jornada viciante (ainda mais sabendo que cada episódio tem apenas 30 minutos) onde os perigos do poder e da manipulação serão ótimos assuntos para uma discussão - pós-créditos, claro.
Imperdível!
"Homeland" ganhou os principais prêmios no Emmy de 2012, entre eles o de melhor roteiro e melhor série dramática - o que foi uma surpresa na época. Na verdade, eu nunca havia me interessado pelo seu argumento, achava que seria "mais do mesmo"! Mas por causa dessa premiação resolvi assistir o "piloto" para entender como uma série sobre terrorismo conseguiu desbancar pesos-pesados que já acompanha como "Mad Men" e "Game of Thrones". Pois bem meus amigos, "Homeland" é genial! O roteiro de piloto é muito intrigante e chega a lembrar "24 horas" nos seus melhores anos. Não dá vontade parar de assistir. A estrutura do roteiro casa muito bem os dramas pessoais dos protagonistas (e é aí que Homeland dá um banho em 24 horas) com a tensão constante do terrorismo que está no argumento. É sensacional!
Após o desaparecimento de dois soldados americanos no Iraque, um deles, o sargento Nicholas Brody (Damian Lewis), retorna aos EUA após ser resgatado pelo exército. Repatriado, ele é recebido como herói pela família, pelos amigos e pelo governo. Porém a agente da CIA Carrie Mathison (Claire Danes), especialista em anti-terrorismo e que passou vários anos infiltrada no Afeganistão, não acredita que Brody seja realmente um herói de guerra - ela desconfia que ele é, na verdade, um espião iraquiano preparando o próximo ataque terrorista em solo dos EUA.
O ponto alto de "Homeland", como comentei acima, é a relação entre os dois personagens principais. Fica claro, logo de cara, que realmente existe algo de errado com Brody - suas atitudes remetem a uma série de referências ao islamismo ou a cultura daquela região, porém ninguém consegue reparar que essa sua postura pode significar algo que vai além do respeito às tradições. Carrie parece ser a única pessoa que consegue detectar algo suspeito nas atitudes de Brody, acontece que ela sofre de um distúrbio bipolar e sua obsessão em descobrir a verdade soa como desequilíbrio e paranóia para a maioria dos seus superiores, o que, óbvio, só a motiva em descobrir a verdade - mesmo que usando de artifícios pouco convencionais para uma agente da CIA.
É fato que o roteiro das primeiras temporadas são mais dinâmicos e inteligentes, porém a série, já com várias temporadas, consegue manter parte do seu público engajado mesmo com as trocas de elenco e as várias mudanças nas motivações de Carrie. Embora não seja uma antologia como em "24 horas", por exemplo, "Homeland" procura equilibrar suas histórias pontuais com os dramas que a protagonista tem que lidar para continuar sua caminhada como heroína. As vezes a série falha, parece perder o fôlego, mas de repente algo surge e trás um sentido novo que levanta a história novamente e a mantém sendo produzida - aliás, a produção continua excelente e mesmo com episódios de 2011, a série está em ótima forma no que diz respeito aos conceitos cinematográficos!
"Homeland" é uma livre adaptação de uma série israelense de muito sucesso chamada "Hatufim", que significa “Sequestrados” - traduzida para o inglês como "Prisioneiros de Guerra" .Ela vale cada episódio, cada temporada; e posso afirmar que já se transformou em uma referência que merece ser vista por quem gosta do gênero!
"Homeland" ganhou os principais prêmios no Emmy de 2012, entre eles o de melhor roteiro e melhor série dramática - o que foi uma surpresa na época. Na verdade, eu nunca havia me interessado pelo seu argumento, achava que seria "mais do mesmo"! Mas por causa dessa premiação resolvi assistir o "piloto" para entender como uma série sobre terrorismo conseguiu desbancar pesos-pesados que já acompanha como "Mad Men" e "Game of Thrones". Pois bem meus amigos, "Homeland" é genial! O roteiro de piloto é muito intrigante e chega a lembrar "24 horas" nos seus melhores anos. Não dá vontade parar de assistir. A estrutura do roteiro casa muito bem os dramas pessoais dos protagonistas (e é aí que Homeland dá um banho em 24 horas) com a tensão constante do terrorismo que está no argumento. É sensacional!
Após o desaparecimento de dois soldados americanos no Iraque, um deles, o sargento Nicholas Brody (Damian Lewis), retorna aos EUA após ser resgatado pelo exército. Repatriado, ele é recebido como herói pela família, pelos amigos e pelo governo. Porém a agente da CIA Carrie Mathison (Claire Danes), especialista em anti-terrorismo e que passou vários anos infiltrada no Afeganistão, não acredita que Brody seja realmente um herói de guerra - ela desconfia que ele é, na verdade, um espião iraquiano preparando o próximo ataque terrorista em solo dos EUA.
O ponto alto de "Homeland", como comentei acima, é a relação entre os dois personagens principais. Fica claro, logo de cara, que realmente existe algo de errado com Brody - suas atitudes remetem a uma série de referências ao islamismo ou a cultura daquela região, porém ninguém consegue reparar que essa sua postura pode significar algo que vai além do respeito às tradições. Carrie parece ser a única pessoa que consegue detectar algo suspeito nas atitudes de Brody, acontece que ela sofre de um distúrbio bipolar e sua obsessão em descobrir a verdade soa como desequilíbrio e paranóia para a maioria dos seus superiores, o que, óbvio, só a motiva em descobrir a verdade - mesmo que usando de artifícios pouco convencionais para uma agente da CIA.
É fato que o roteiro das primeiras temporadas são mais dinâmicos e inteligentes, porém a série, já com várias temporadas, consegue manter parte do seu público engajado mesmo com as trocas de elenco e as várias mudanças nas motivações de Carrie. Embora não seja uma antologia como em "24 horas", por exemplo, "Homeland" procura equilibrar suas histórias pontuais com os dramas que a protagonista tem que lidar para continuar sua caminhada como heroína. As vezes a série falha, parece perder o fôlego, mas de repente algo surge e trás um sentido novo que levanta a história novamente e a mantém sendo produzida - aliás, a produção continua excelente e mesmo com episódios de 2011, a série está em ótima forma no que diz respeito aos conceitos cinematográficos!
"Homeland" é uma livre adaptação de uma série israelense de muito sucesso chamada "Hatufim", que significa “Sequestrados” - traduzida para o inglês como "Prisioneiros de Guerra" .Ela vale cada episódio, cada temporada; e posso afirmar que já se transformou em uma referência que merece ser vista por quem gosta do gênero!
Talvez você ainda não tenha assistido um filme sobre ataques terroristas ao redor do planeta por uma perspectiva tão brutal como em "Hotel Mumbai". Esse filme realmente traz o horror dessa experiência tão marcante de uma forma muito palpável, visceral eu diria, que é impossível não se sentir impactado - sua narrativa me lembrou muito o documentário (também imperdível), "13 de Novembro: Terror em Paris". O fato é que "Atentado ao Hotel Taj Mahal" (título nacional), filme de estréia do diretor Anthony Maras, é uma obra cinematográfica que se destaca não apenas pela sua excelência técnica, mas também pela maneira como sua narrativa constrói uma jornada de profunda humanidade e coragem de personagens. Baseado nos eventos reais do atentado ao Hotel Taj Mahal Palace em Mumbai, Índia, o filme oferece uma visão angustiante e comovente sobre os horrores do terrorismo e a resiliência do espírito humano. Recebendo elogios tanto da crítica quanto do público, esse é aquele tipo de obra que transcende os limites do entretenimento e que, de fato, nos faz refletir sobre o extremismo e suas implicações na sociedade - em vários níveis, aliás.
Basicamente "Hotel Mumbai" acompanha a história real de alguns dos seus funcionários, incluindo o renomado chef Hemant Oberoi (Anupam Kher) e de seu ajudante Arjun (Dev Patel), que arriscam suas próprias vidas para proteger os hóspedes do requintado Hotel Taj Mahal Palace durante os ataques terroristas de 2008. Enquanto o caos se desenrola ao seu redor, esses funcionários se tornam heróis improváveis, lutando para manter a calma e a esperança em meio à violência dos extremistas e ao desespero de seus hóspedes. Confira o trailer:
É perceptível a tentativa do diretor Anthony Maras de fazer de "Hotel Mumbai" um recorte intimista do que realmente aconteceu naquele 26 de novembro de 2008 - e por isso fica fácil atestar que sua proposta se destaca pela autenticidade e realismo com que narra os bastidores do atentado. Sua direção é magistral, justamente por criar uma impressionante atmosfera de tensão, capaz de transportar a audiência para dentro do caos sem pedir muita licença. “Golpear contra um símbolo da riqueza e do progresso daÍndia” - era esse um dos objetivos do grupo terrorista Lashkar-e-Taiba ao atacar o Taj Mahal Palace Hotel e outros pontos isolados de Mumbai e é seguindo uma ordem cronológica das mais interessantes que Maras nos dá a exata noção da carnificina que aconteceu na cidade naquele dia. Veja, se o filme propositalmente não se aprofunda nas relações entre os diversos personagens, é nessa sensação de abandono que sua narrativa se apoia - reparem como as histórias pessoais de cada um dos personagens (sejam eles terroristas, hóspedes ou funcionários) são mais sugeridas do que escancaradas.
Existe um conceito claro em "Hotel Mumbai" que ajuda na nossa imersão: em muitos momentos o diretor mistura cenas reais (imagens de arquivo mesmo) com sua versão na ficção - a reconstituição é tão bem feita que vai exigir muito da audiência caso ela queira diferenciar uma da outra. A fotografia do também estreante Nick Remy Matthews, é impecável, já que ele é capaz de captar cada momento com uma intensidade absurda e sem esquecer das referências reais daquelas horas intermináveis de terror. Junto com a montagem e com a direção, sem dúvida, que é a fotografia quem expõe o poder do roteiro de John Collee (de "Mestre dos Mares") em transitar entre o suspense e o drama com a mesma competência e sensibilidade.
Antes de finalizar, impossível não citar as performances dos atores. Dev Patel entrega um trabalho emotivo e poderoso como Arjun, o garçom determinado a proteger os hóspedes do hotel a todo custo, independente do preconceito que sofria. Seu desempenho convincente é a base para brilhante interpretação de Anupam Kher (chef Oberoi) cuja coragem e liderança inspiraram aqueles ao seu redor - a química entre eles é lindo de ver.
"Hotel Mumbai" é uma homenagem aos heróis anônimos que emergiram em meio àquela tragédia, demonstrando coragem, compaixão e humanidade em face do terror. O filme sabe de sua força ao nos servir como um meio de nos transportar para lugares e experiências além de nossa imaginação e vontade, ou seja, não serão raras as vezes que você vai se pegar pensando em "o que eu faria" se estivesse no Hotel Taj Mahal aquela noite. Como "Utoya 22 de Julho", sua narrativa envolvente, performances emocionantes e uma direção habilidosa, "Hotel Mumbai" é uma obra que ficará gravada na sua memória, pode ter certeza!
Vale seu play!
Talvez você ainda não tenha assistido um filme sobre ataques terroristas ao redor do planeta por uma perspectiva tão brutal como em "Hotel Mumbai". Esse filme realmente traz o horror dessa experiência tão marcante de uma forma muito palpável, visceral eu diria, que é impossível não se sentir impactado - sua narrativa me lembrou muito o documentário (também imperdível), "13 de Novembro: Terror em Paris". O fato é que "Atentado ao Hotel Taj Mahal" (título nacional), filme de estréia do diretor Anthony Maras, é uma obra cinematográfica que se destaca não apenas pela sua excelência técnica, mas também pela maneira como sua narrativa constrói uma jornada de profunda humanidade e coragem de personagens. Baseado nos eventos reais do atentado ao Hotel Taj Mahal Palace em Mumbai, Índia, o filme oferece uma visão angustiante e comovente sobre os horrores do terrorismo e a resiliência do espírito humano. Recebendo elogios tanto da crítica quanto do público, esse é aquele tipo de obra que transcende os limites do entretenimento e que, de fato, nos faz refletir sobre o extremismo e suas implicações na sociedade - em vários níveis, aliás.
Basicamente "Hotel Mumbai" acompanha a história real de alguns dos seus funcionários, incluindo o renomado chef Hemant Oberoi (Anupam Kher) e de seu ajudante Arjun (Dev Patel), que arriscam suas próprias vidas para proteger os hóspedes do requintado Hotel Taj Mahal Palace durante os ataques terroristas de 2008. Enquanto o caos se desenrola ao seu redor, esses funcionários se tornam heróis improváveis, lutando para manter a calma e a esperança em meio à violência dos extremistas e ao desespero de seus hóspedes. Confira o trailer:
É perceptível a tentativa do diretor Anthony Maras de fazer de "Hotel Mumbai" um recorte intimista do que realmente aconteceu naquele 26 de novembro de 2008 - e por isso fica fácil atestar que sua proposta se destaca pela autenticidade e realismo com que narra os bastidores do atentado. Sua direção é magistral, justamente por criar uma impressionante atmosfera de tensão, capaz de transportar a audiência para dentro do caos sem pedir muita licença. “Golpear contra um símbolo da riqueza e do progresso daÍndia” - era esse um dos objetivos do grupo terrorista Lashkar-e-Taiba ao atacar o Taj Mahal Palace Hotel e outros pontos isolados de Mumbai e é seguindo uma ordem cronológica das mais interessantes que Maras nos dá a exata noção da carnificina que aconteceu na cidade naquele dia. Veja, se o filme propositalmente não se aprofunda nas relações entre os diversos personagens, é nessa sensação de abandono que sua narrativa se apoia - reparem como as histórias pessoais de cada um dos personagens (sejam eles terroristas, hóspedes ou funcionários) são mais sugeridas do que escancaradas.
Existe um conceito claro em "Hotel Mumbai" que ajuda na nossa imersão: em muitos momentos o diretor mistura cenas reais (imagens de arquivo mesmo) com sua versão na ficção - a reconstituição é tão bem feita que vai exigir muito da audiência caso ela queira diferenciar uma da outra. A fotografia do também estreante Nick Remy Matthews, é impecável, já que ele é capaz de captar cada momento com uma intensidade absurda e sem esquecer das referências reais daquelas horas intermináveis de terror. Junto com a montagem e com a direção, sem dúvida, que é a fotografia quem expõe o poder do roteiro de John Collee (de "Mestre dos Mares") em transitar entre o suspense e o drama com a mesma competência e sensibilidade.
Antes de finalizar, impossível não citar as performances dos atores. Dev Patel entrega um trabalho emotivo e poderoso como Arjun, o garçom determinado a proteger os hóspedes do hotel a todo custo, independente do preconceito que sofria. Seu desempenho convincente é a base para brilhante interpretação de Anupam Kher (chef Oberoi) cuja coragem e liderança inspiraram aqueles ao seu redor - a química entre eles é lindo de ver.
"Hotel Mumbai" é uma homenagem aos heróis anônimos que emergiram em meio àquela tragédia, demonstrando coragem, compaixão e humanidade em face do terror. O filme sabe de sua força ao nos servir como um meio de nos transportar para lugares e experiências além de nossa imaginação e vontade, ou seja, não serão raras as vezes que você vai se pegar pensando em "o que eu faria" se estivesse no Hotel Taj Mahal aquela noite. Como "Utoya 22 de Julho", sua narrativa envolvente, performances emocionantes e uma direção habilidosa, "Hotel Mumbai" é uma obra que ficará gravada na sua memória, pode ter certeza!
Vale seu play!
"House of Cards", criada por Beau Willimon e baseada no romance homônimo de Michael Dobbs, é uma série que redefiniu o drama político na televisão. Lançada em 2013 pela Netflix, a série rapidamente se tornou um fenômeno cultural, destacando-se por sua narrativa intricada, personagens complexos e uma visão cínica e implacável do mundo da política americana. Ao longo de suas seis temporadas, "House of Cards" ofereceu um mergulho profundo no poder e na corrupção, capturando a atenção e a imaginação dos espectadores em todo o mundo.
A trama de "House of Cards" segue Francis "Frank" Underwood (Kevin Spacey), um político ambicioso e implacável que, após ser preterido para o cargo de Secretário de Estado, embarca em uma jornada de vingança e manipulação para conquistar a presidência dos Estados Unidos. Ao seu lado está sua igualmente ambiciosa esposa, Claire Underwood (Robin Wright), cuja busca por poder e influência é tão implacável quanto a de Frank. Juntos, eles formam uma das duplas mais formidáveis e temíveis da televisão.
O maior trunfo de "House of Cards" está em suas performances soberbas, especialmente as de Kevin Spacey e Robin Wright. Spacey traz uma intensidade magnética a Frank Underwood, quebrando a quarta parede com seus monólogos cínicos e perspicazes, que revelam as profundezas de sua mente maquiavélica. Robin Wright, por sua vez, entrega uma atuação igualmente poderosa como Claire Underwood, evoluindo de uma parceira silenciosa para uma figura de poder autônoma e dominante. Sua química é palpável e sua dinâmica, fascinante, sustentando a série mesmo nos momentos mais sombrios.
A direção de David Fincher no piloto estabelece o tom visual da série: elegante, sombrio e imbuído de uma sensação constante de tensão. A cinematografia de Igor Martinovic e a trilha sonora de Jeff Beal complementam perfeitamente a narrativa, criando uma atmosfera opressiva que espelha o mundo moralmente ambíguo que os personagens habitam. As escolhas estéticas e a atenção aos detalhes visuais reforçam a sensação de decadência e corrupção que permeia a série. A narrativa de "House of Cards" é intricada e cheia de reviravoltas, explorando os mecanismos sombrios da política e do poder. A série é habilidosa em desenvolver arcos complexos e personagens multifacetados, onde cada ação tem consequências profundas e muitas vezes devastadoras. A escrita de Beau Willimon e sua equipe é afiada, com diálogos mordazes e uma trama que mantém os espectadores na ponta da cadeira.
No entanto, "House of Cards" não está isenta de controvérsias e desafios. As alegações de má conduta contra Kevin Spacey resultaram em sua saída abrupta após a quinta temporada, obrigando a série a reformular sua narrativa para a temporada final. Robin Wright assumiu o papel principal, e embora sua performance tenha sido amplamente elogiada, a série lutou para manter a mesma intensidade e coesão sem a presença de Spacey. Além disso, alguns críticos apontaram que as temporadas posteriores não conseguiram capturar a mesma magia das primeiras, com tramas que, por vezes, se tornaram excessivamente enroladas e menos impactantes.
Ainda assim, "House of Cards" permaneça uma série marcante e influente, que ofereceu uma visão corajosa e muitas vezes perturbadora do mundo da política. Seu impacto na cultura pop é inegável, inspirando inúmeras discussões e análises sobre poder, ética e corrupção. A série é um testemunho da capacidade da televisão de explorar temas complexos e de desafiar os espectadores a refletir sobre a natureza do poder e da ambição.
Em resumo, temos uma obra imperdível para os amantes de dramas políticos que vale muito o seu play!
"House of Cards", criada por Beau Willimon e baseada no romance homônimo de Michael Dobbs, é uma série que redefiniu o drama político na televisão. Lançada em 2013 pela Netflix, a série rapidamente se tornou um fenômeno cultural, destacando-se por sua narrativa intricada, personagens complexos e uma visão cínica e implacável do mundo da política americana. Ao longo de suas seis temporadas, "House of Cards" ofereceu um mergulho profundo no poder e na corrupção, capturando a atenção e a imaginação dos espectadores em todo o mundo.
A trama de "House of Cards" segue Francis "Frank" Underwood (Kevin Spacey), um político ambicioso e implacável que, após ser preterido para o cargo de Secretário de Estado, embarca em uma jornada de vingança e manipulação para conquistar a presidência dos Estados Unidos. Ao seu lado está sua igualmente ambiciosa esposa, Claire Underwood (Robin Wright), cuja busca por poder e influência é tão implacável quanto a de Frank. Juntos, eles formam uma das duplas mais formidáveis e temíveis da televisão.
O maior trunfo de "House of Cards" está em suas performances soberbas, especialmente as de Kevin Spacey e Robin Wright. Spacey traz uma intensidade magnética a Frank Underwood, quebrando a quarta parede com seus monólogos cínicos e perspicazes, que revelam as profundezas de sua mente maquiavélica. Robin Wright, por sua vez, entrega uma atuação igualmente poderosa como Claire Underwood, evoluindo de uma parceira silenciosa para uma figura de poder autônoma e dominante. Sua química é palpável e sua dinâmica, fascinante, sustentando a série mesmo nos momentos mais sombrios.
A direção de David Fincher no piloto estabelece o tom visual da série: elegante, sombrio e imbuído de uma sensação constante de tensão. A cinematografia de Igor Martinovic e a trilha sonora de Jeff Beal complementam perfeitamente a narrativa, criando uma atmosfera opressiva que espelha o mundo moralmente ambíguo que os personagens habitam. As escolhas estéticas e a atenção aos detalhes visuais reforçam a sensação de decadência e corrupção que permeia a série. A narrativa de "House of Cards" é intricada e cheia de reviravoltas, explorando os mecanismos sombrios da política e do poder. A série é habilidosa em desenvolver arcos complexos e personagens multifacetados, onde cada ação tem consequências profundas e muitas vezes devastadoras. A escrita de Beau Willimon e sua equipe é afiada, com diálogos mordazes e uma trama que mantém os espectadores na ponta da cadeira.
No entanto, "House of Cards" não está isenta de controvérsias e desafios. As alegações de má conduta contra Kevin Spacey resultaram em sua saída abrupta após a quinta temporada, obrigando a série a reformular sua narrativa para a temporada final. Robin Wright assumiu o papel principal, e embora sua performance tenha sido amplamente elogiada, a série lutou para manter a mesma intensidade e coesão sem a presença de Spacey. Além disso, alguns críticos apontaram que as temporadas posteriores não conseguiram capturar a mesma magia das primeiras, com tramas que, por vezes, se tornaram excessivamente enroladas e menos impactantes.
Ainda assim, "House of Cards" permaneça uma série marcante e influente, que ofereceu uma visão corajosa e muitas vezes perturbadora do mundo da política. Seu impacto na cultura pop é inegável, inspirando inúmeras discussões e análises sobre poder, ética e corrupção. A série é um testemunho da capacidade da televisão de explorar temas complexos e de desafiar os espectadores a refletir sobre a natureza do poder e da ambição.
Em resumo, temos uma obra imperdível para os amantes de dramas políticos que vale muito o seu play!
Enquanto Bryan Fogel se propunha a documentar uma experiência pessoal para entender os efeitos do doping na performance de um atleta, no caso de um ciclista, uma reunião casual com um cientista acabou transformando completamente seu projeto: ele começa a descobrir uma verdade extremamente inconveniente sobre o sistema de doping no esporte russo. Confira o trailer (em inglês):
O vencedor do Oscar de melhor Documentário do Oscar de 2018 era pra ser uma espécie de "Super Size Me" do doping e virou uma das maiores revelações conspiratórias do esporte mundial de todos os tempos - se não a maior! Por muita sorte do diretor (e a história é inacreditável), o documentário mostra como a Rússia vinha burlando os exames anti-doping em competições olímpicas há anos - com 50% (dados reais) dos atletas que disputaram as Olimpíadas de Londres competindo a base de protocolos proibidos. Ainda mais surpreendente é a atuação do Governo (leia-se Vladimir Putin) na troca das amostras de urina dos atletas na Olimpíadas de Inverno em Sochi 2014.
O triste é, mais uma vez, comprovar que "o crime compensa" - pelo menos aos olhos da Política!!! "Ícaro" é um grande documentário, que usou o "acaso" a seu favor e foi capaz de construir um storytelling dinâmico e surpreendente, mostrando que as as melhores histórias estão por aí, mas ta estar disposto a descobri-las! Olha, esse documentário é realmente imperdível! Vale muito o seu play!!!
Enquanto Bryan Fogel se propunha a documentar uma experiência pessoal para entender os efeitos do doping na performance de um atleta, no caso de um ciclista, uma reunião casual com um cientista acabou transformando completamente seu projeto: ele começa a descobrir uma verdade extremamente inconveniente sobre o sistema de doping no esporte russo. Confira o trailer (em inglês):
O vencedor do Oscar de melhor Documentário do Oscar de 2018 era pra ser uma espécie de "Super Size Me" do doping e virou uma das maiores revelações conspiratórias do esporte mundial de todos os tempos - se não a maior! Por muita sorte do diretor (e a história é inacreditável), o documentário mostra como a Rússia vinha burlando os exames anti-doping em competições olímpicas há anos - com 50% (dados reais) dos atletas que disputaram as Olimpíadas de Londres competindo a base de protocolos proibidos. Ainda mais surpreendente é a atuação do Governo (leia-se Vladimir Putin) na troca das amostras de urina dos atletas na Olimpíadas de Inverno em Sochi 2014.
O triste é, mais uma vez, comprovar que "o crime compensa" - pelo menos aos olhos da Política!!! "Ícaro" é um grande documentário, que usou o "acaso" a seu favor e foi capaz de construir um storytelling dinâmico e surpreendente, mostrando que as as melhores histórias estão por aí, mas ta estar disposto a descobri-las! Olha, esse documentário é realmente imperdível! Vale muito o seu play!!!
A epidemia de opioides é uma das crises de saúde pública mais devastadoras da nossa era e dois livros notáveis, "Pain Killer", de Barry Meier, e "Dopesick", de Beth Macy, mergulharam fundo nesse assunto tão complexo com um propósito claro: apresentar as várias perspectivas do problema - do médico, do representante comercial, do paciente, da polícia, dos viciados e suas relações familiares, e, claro, da lei. A premiada minissérie de ficção do Star+, dirigida pelos talentosos Danny Strong e Barry Levinson, baseada no livro de Macy, sem dúvida alguma já tinha cumprido o seu papel nesse sentido, no entanto a Netflix achou que ainda tinha uma história interessante para contar e assim surgiu "Império da Dor" - baseado na obra de Meier e no artigo "The Family That Built an Empire of Pain", de Patrick Radden Keefe. Obviamente que em um primeiro olhar a trama soa familiar, e de fato é, no entanto a minissérie do diretor Peter Berg (de "Friday Night Lights") deixa um pouco da densidade dramática de "Dopesick" de lado para apresentar o problema de uma forma (arriscada) com um conceito mais acessível e algum senso de humor - não que não tenha drama, mas o tom é infinitamente menos impactante. E te falo, na minha opinião, como entrada no assunto, funciona perfeitamente - mas a obra-prima é a outra!
Aqui, basicamente, acompanhamos todo o drama sobre as causas e consequências da epidemia de opioides nos Estados Unidos pelo olhar critico de Edie Flowers (Uzo Aduba), uma investigadora do Gabinete do Procurador dos EUA em Roanoke, que cuida de fraudes médicas. Ao perceber que o OxyContin passou a ser prescrito de forma generalizada, gerando inúmeros pacientes com dependência e milhares de mortes, Flowers começa uma luta intensa para tirar o medicamento das farmácias e ainda punir os executivos da Purdue que mentiram sobre os reais efeitos do Oxy. Confira o trailer:
Mesmo que a personagem Edie Flowers tenha sido criada pelos roteiristas Micah Fitzerman-Blue e Noah Harpster (ambos de "Transparent" e de "Um Lindo Dia na Vizinhança") com o único propósito de ser a voz que amarra cada um dos eventos de "Império da Dor", é de se elogiar a forma como Uzo Aduba nos apresenta sua jornada de maneira tão humana e visceral - seu sofrimento é, de fato, muito real. Digna de prêmios! É impressionante como ela dá o tom da minissérie e serve de equilíbrio para que os floreios gráficos e narrativos de Berg não diminuam o tamanho do drama que foi essa epidemia. É claro que o impacto dos prólogos de cada um dos seis episódios, onde famílias reais relembram seus dramas, nos diz exatamente onde vamos entrar, mas, sem dúvida alguma, é com a investigadora Flowers que caminhamos pela história!
Em "Império da Dor" os roteiristas transformam informações densas em histórias mais envolventes, nos mantendo cativados ao longo dos episódios - se de um lado a realidade nos embrulha o estômago, é perceptível a escolha pelo entretenimento para aliviar a tensão e evitar o churn. A construção cuidadosa de personagens, bem menos profundos que em "Dopesick", gera conexões ou julgamentos mais imediatos - é o caso do plot da família de Glenn (Taylor Kitsch) ou da trama de Shannon (West Duchovny), ambos mais estereotipados. O que eu quero dizer é que a dinâmica flui bem, intercalando contextos históricos com o dinamismo de um estilo mais pop - sim, isso deixa a narrativa tão coesa quanto acessível, mas não mexe tanto com nossas emoções. Para citar um exemplo, eu nunca odiei o Richard Sackler do Matthew Broderick de "Império da Dor"como odiei o do Michael Stuhlbarg de "Dopesick".
"Império da Dor" oferece perspectivas vívidas e inquietantes sobre a crise dos opioides, mas sem nos machucar tanto. Através de uma investigação meticulosa, de uma narrativa habilidosa e da exploração das emoções de quem viveu o drama, a minissérie consegue transcender o mero relato de fatos para se tornar um ótimo e fácil entretenimento. A produção da Netflix tem o grande mérito de contribuir para a compreensão do problema, para o entendimento da dinâmica entre os personagens reais e para pontuar o contexto histórico, mas saiba que o mergulho emocional mesmo, aquele mais profundo, bem, esse não está aqui, está na plataforma ao lado.
Aqui vale o play, mas se você gostar do assunto, não pare por aqui!
A epidemia de opioides é uma das crises de saúde pública mais devastadoras da nossa era e dois livros notáveis, "Pain Killer", de Barry Meier, e "Dopesick", de Beth Macy, mergulharam fundo nesse assunto tão complexo com um propósito claro: apresentar as várias perspectivas do problema - do médico, do representante comercial, do paciente, da polícia, dos viciados e suas relações familiares, e, claro, da lei. A premiada minissérie de ficção do Star+, dirigida pelos talentosos Danny Strong e Barry Levinson, baseada no livro de Macy, sem dúvida alguma já tinha cumprido o seu papel nesse sentido, no entanto a Netflix achou que ainda tinha uma história interessante para contar e assim surgiu "Império da Dor" - baseado na obra de Meier e no artigo "The Family That Built an Empire of Pain", de Patrick Radden Keefe. Obviamente que em um primeiro olhar a trama soa familiar, e de fato é, no entanto a minissérie do diretor Peter Berg (de "Friday Night Lights") deixa um pouco da densidade dramática de "Dopesick" de lado para apresentar o problema de uma forma (arriscada) com um conceito mais acessível e algum senso de humor - não que não tenha drama, mas o tom é infinitamente menos impactante. E te falo, na minha opinião, como entrada no assunto, funciona perfeitamente - mas a obra-prima é a outra!
Aqui, basicamente, acompanhamos todo o drama sobre as causas e consequências da epidemia de opioides nos Estados Unidos pelo olhar critico de Edie Flowers (Uzo Aduba), uma investigadora do Gabinete do Procurador dos EUA em Roanoke, que cuida de fraudes médicas. Ao perceber que o OxyContin passou a ser prescrito de forma generalizada, gerando inúmeros pacientes com dependência e milhares de mortes, Flowers começa uma luta intensa para tirar o medicamento das farmácias e ainda punir os executivos da Purdue que mentiram sobre os reais efeitos do Oxy. Confira o trailer:
Mesmo que a personagem Edie Flowers tenha sido criada pelos roteiristas Micah Fitzerman-Blue e Noah Harpster (ambos de "Transparent" e de "Um Lindo Dia na Vizinhança") com o único propósito de ser a voz que amarra cada um dos eventos de "Império da Dor", é de se elogiar a forma como Uzo Aduba nos apresenta sua jornada de maneira tão humana e visceral - seu sofrimento é, de fato, muito real. Digna de prêmios! É impressionante como ela dá o tom da minissérie e serve de equilíbrio para que os floreios gráficos e narrativos de Berg não diminuam o tamanho do drama que foi essa epidemia. É claro que o impacto dos prólogos de cada um dos seis episódios, onde famílias reais relembram seus dramas, nos diz exatamente onde vamos entrar, mas, sem dúvida alguma, é com a investigadora Flowers que caminhamos pela história!
Em "Império da Dor" os roteiristas transformam informações densas em histórias mais envolventes, nos mantendo cativados ao longo dos episódios - se de um lado a realidade nos embrulha o estômago, é perceptível a escolha pelo entretenimento para aliviar a tensão e evitar o churn. A construção cuidadosa de personagens, bem menos profundos que em "Dopesick", gera conexões ou julgamentos mais imediatos - é o caso do plot da família de Glenn (Taylor Kitsch) ou da trama de Shannon (West Duchovny), ambos mais estereotipados. O que eu quero dizer é que a dinâmica flui bem, intercalando contextos históricos com o dinamismo de um estilo mais pop - sim, isso deixa a narrativa tão coesa quanto acessível, mas não mexe tanto com nossas emoções. Para citar um exemplo, eu nunca odiei o Richard Sackler do Matthew Broderick de "Império da Dor"como odiei o do Michael Stuhlbarg de "Dopesick".
"Império da Dor" oferece perspectivas vívidas e inquietantes sobre a crise dos opioides, mas sem nos machucar tanto. Através de uma investigação meticulosa, de uma narrativa habilidosa e da exploração das emoções de quem viveu o drama, a minissérie consegue transcender o mero relato de fatos para se tornar um ótimo e fácil entretenimento. A produção da Netflix tem o grande mérito de contribuir para a compreensão do problema, para o entendimento da dinâmica entre os personagens reais e para pontuar o contexto histórico, mas saiba que o mergulho emocional mesmo, aquele mais profundo, bem, esse não está aqui, está na plataforma ao lado.
Aqui vale o play, mas se você gostar do assunto, não pare por aqui!