indika.tv - ml-violencia

O Último Duelo

"O Último Duelo" não é um filme de ação, de disputas politicas ou religiosas, de traição ou violência - embora tenha tudo isso. "O Último Duelo" é um drama (profundo) sobre a verdade, mesmo que essa venha mascarada por um contexto de época onde a misoginia e o patriarcado significavam honra e virilidade. O roteiro escrito por Matt Damon, Ben Affleck e Nicole Holofcener, é baseado em um livro sobre o último duelo judicial oficialmente reconhecido na França, mas que chega acompanhado por um subtexto atual e importante que ganha muita potência na mão (e na cabeça) criativa de Ridley Scott que resolveu contar a mesma história a partir de três diferentes perspectivas. 

No filme acompanhamos a história real de uma mulher francesa do século XIV, Marguerite de Carrouges (Jodie Comer), que desafiou os costumes medievais ao denunciar e levar a julgamento o homem que a violentou, Jacque Le Cris (Adam Driver), ex-companheiro de batalhas e desafeto de seu marido, Jean de Carrouges (Matt Damon). Confira o trailer:

Embora "O Último Duelo" tenha sido muito criticado por se preocupar mais em estabelecer a rivalidade entre Le Cris e Jean de Carrouges, do que pela luta por justiça de Marguerite em uma época em que a Igreja ditava as regras e um Rei simplesmente as aplicava de acordo com sua vontade, eu gostei e, sinceramente, não tive essa leitura - muito pelo contrário, o valor das circunstâncias que levaram ao duelo, para mim, são muito mais potentes do que as disputas carregadas de vaidade entre os personagens, porém Scott usa desse gatilho para gerar entretenimento ao mesmo tempo em que cria pontos de reflexão sobre o ato sofrido por Marguerite.

Partindo do conceito de que uma história possui três versões, "O Último Duelo" se aproveita de uma montagem competente da Claire Simpson (vencedora do Oscar pelo inesquecível "Platoon") para criar uma dinâmica narrativa muito interessante e provocadora - reparem como vamos mudando nossa "interpretação da verdade" a cada perspectiva. Pois bem, alinhado a isso, Scott vai entregando pequenos detalhes que vão diferenciando cada uma das versões - são pequenas nuances, diálogos em ordens diferentes e até olhares significantes que vão remodelando a narrativa. É muito bacana!

Alternando cenas de batalhas (sangrentas) bem construídas, que nos lembram os bons tempos de Scott comandando "Gladiador" (2000), com momentos bastante intimistas mesmo envolto a crueldade daquele universo, "O Último Duelo" deve agradar uma audiência mais sensível aos assuntos que exigem um olhar menos superficial e também aqueles que buscam, simplesmente, entretenimento de qualidade. Tecnicamente muito seguro como sempre, Scott sabe o seu valor, marcando essa condução tão polarizada com planos perfeitos e movimentos de câmera belíssimos, sem falar, é claro, da marcante fotografia cinzenta e sombria (ao melhor estilo Game of Thrones) de Dariusz Wolski (de "Relatos do Mundo").

Olha, vale muito o seu play!

Assista Agora

"O Último Duelo" não é um filme de ação, de disputas politicas ou religiosas, de traição ou violência - embora tenha tudo isso. "O Último Duelo" é um drama (profundo) sobre a verdade, mesmo que essa venha mascarada por um contexto de época onde a misoginia e o patriarcado significavam honra e virilidade. O roteiro escrito por Matt Damon, Ben Affleck e Nicole Holofcener, é baseado em um livro sobre o último duelo judicial oficialmente reconhecido na França, mas que chega acompanhado por um subtexto atual e importante que ganha muita potência na mão (e na cabeça) criativa de Ridley Scott que resolveu contar a mesma história a partir de três diferentes perspectivas. 

No filme acompanhamos a história real de uma mulher francesa do século XIV, Marguerite de Carrouges (Jodie Comer), que desafiou os costumes medievais ao denunciar e levar a julgamento o homem que a violentou, Jacque Le Cris (Adam Driver), ex-companheiro de batalhas e desafeto de seu marido, Jean de Carrouges (Matt Damon). Confira o trailer:

Embora "O Último Duelo" tenha sido muito criticado por se preocupar mais em estabelecer a rivalidade entre Le Cris e Jean de Carrouges, do que pela luta por justiça de Marguerite em uma época em que a Igreja ditava as regras e um Rei simplesmente as aplicava de acordo com sua vontade, eu gostei e, sinceramente, não tive essa leitura - muito pelo contrário, o valor das circunstâncias que levaram ao duelo, para mim, são muito mais potentes do que as disputas carregadas de vaidade entre os personagens, porém Scott usa desse gatilho para gerar entretenimento ao mesmo tempo em que cria pontos de reflexão sobre o ato sofrido por Marguerite.

Partindo do conceito de que uma história possui três versões, "O Último Duelo" se aproveita de uma montagem competente da Claire Simpson (vencedora do Oscar pelo inesquecível "Platoon") para criar uma dinâmica narrativa muito interessante e provocadora - reparem como vamos mudando nossa "interpretação da verdade" a cada perspectiva. Pois bem, alinhado a isso, Scott vai entregando pequenos detalhes que vão diferenciando cada uma das versões - são pequenas nuances, diálogos em ordens diferentes e até olhares significantes que vão remodelando a narrativa. É muito bacana!

Alternando cenas de batalhas (sangrentas) bem construídas, que nos lembram os bons tempos de Scott comandando "Gladiador" (2000), com momentos bastante intimistas mesmo envolto a crueldade daquele universo, "O Último Duelo" deve agradar uma audiência mais sensível aos assuntos que exigem um olhar menos superficial e também aqueles que buscam, simplesmente, entretenimento de qualidade. Tecnicamente muito seguro como sempre, Scott sabe o seu valor, marcando essa condução tão polarizada com planos perfeitos e movimentos de câmera belíssimos, sem falar, é claro, da marcante fotografia cinzenta e sombria (ao melhor estilo Game of Thrones) de Dariusz Wolski (de "Relatos do Mundo").

Olha, vale muito o seu play!

Assista Agora

13 de Novembro: Terror em Paris

Por mais dolorido que possa parecer, a série documental da Netflix é um retrato da capacidade humana de se reinventar, seja nos momentos mais extremos, seja pela forma como ela reage ao evento que transformou sua vida!

São 3 episódios de quase 1 hora, mostrando minuto a minuto, tudo o que aconteceu naquela noite em Paris quando as primeiras explosões chamaram a atenção de todos que acompanhavam o amistoso França e Alemanha no Stade de France em Saint-Denis. As 80 mil pessoas que ali estavam, não tinham a menor noção do se transformaria aquela noite quando, poucos minutos depois, restaurantes e bares começaram a ser atacados por terroristas, culminando no massacre da boate Bataclan.

Pelo olhar e a lembrança de quem estava lá, em cada um desses lugares, ou pelos depoimentos de quem socorreu as vítimas naquela noite, e até pelas constatações dos políticos e policiais que precisaram tomar decisões difíceis durante os ataques, "13 de Novembro: Terror em Paris", talvez seja o documentário mais humano sobre um ataque terrorista que eu já assisti. É impressionante, marcante, mas, principalmente, necessário, pois só assim vamos entender o quanto a humanidade está machucada, mas ainda luta para continuar caminhando com a cabeça erguida!

A série mistura depoimentos com imagens de arquivos, vídeos feitos por celulares e até gravações da própria polícia, para ilustrar, em detalhes, o inferno de quem viveu e sobreviveu aos atentados. Muito interessante é a dinâmica que os diretores Gédéon Naudet e Jules Naudet, que já ganharam um Emmy pelo também excelente "9/11" de 2002, usaram para contar cada uma das histórias do ataque. Em nenhum momento sentimos um viés político, muito pelo contrário - nem o Estado Islâmico é citado durante os episódios. O foco é realmente o lado humano dos atentados e é aí que o drama pega forte. Fica fácil de visualizar aqueles momentos tão particulares que são contados pelos sobreviventes e isso dói. Os relatos são impressionantes, sinceros, sem nenhum tipo de máscara ou receio. É forte!!!!

Um dos artifícios usados pelos irmãos Naudet foi a inserção de elementos gráficos que serviram para pontuar o trajeto que os terroristas fizeram até chegar na Bataclan. Enquanto o primeiro episódio da série se dedica aos ataques nos restaurantes e bares, o segundo e o terceiro mergulham no interior da boate - o bacana é que, mesmo complexos, os fatos são facilmente explicados e localizados por uma  animação que ilustra perfeitamente onde estavam os personagens, os terroristas e, finalmente, os policiais. Fica tudo muito simples, fluido, o que, sem dúvida, nos coloca dentro da história sem a menor piedade. É belo como obra, como técnica de storytelling, mas difícil de digerir como ser humano!

"13 de Novembro: Terror em Paris" é uma bela surpresa escondida dentro do catálogo da Netflix. É preciso estar disposto para encarar uma história como essa, mas a experiência é extremamente imersiva e provocadora. É impossível não se colocar no lugar daquelas pessoas quando relatam o silêncio após os disparos, o cheiro de sangue misturado com pólvora, os clarões das explosões e até o barulho ensurdecedor dos celulares das vítimas tocando depois do massacre.  Embora esse seja o melhor elogio que um documentário pode receber, estar ali dentro, mesmo que pelos olhos dos outros, não é uma tarefa fácil!!!

Eu indico tranquilamente, mas assista sabendo que o assunto vai machucar e que o resultado da obra é um relato emocionante, cheio de detalhes, de uma noite que nunca mais será esquecida!!!!

Assista Agora 

Por mais dolorido que possa parecer, a série documental da Netflix é um retrato da capacidade humana de se reinventar, seja nos momentos mais extremos, seja pela forma como ela reage ao evento que transformou sua vida!

São 3 episódios de quase 1 hora, mostrando minuto a minuto, tudo o que aconteceu naquela noite em Paris quando as primeiras explosões chamaram a atenção de todos que acompanhavam o amistoso França e Alemanha no Stade de France em Saint-Denis. As 80 mil pessoas que ali estavam, não tinham a menor noção do se transformaria aquela noite quando, poucos minutos depois, restaurantes e bares começaram a ser atacados por terroristas, culminando no massacre da boate Bataclan.

Pelo olhar e a lembrança de quem estava lá, em cada um desses lugares, ou pelos depoimentos de quem socorreu as vítimas naquela noite, e até pelas constatações dos políticos e policiais que precisaram tomar decisões difíceis durante os ataques, "13 de Novembro: Terror em Paris", talvez seja o documentário mais humano sobre um ataque terrorista que eu já assisti. É impressionante, marcante, mas, principalmente, necessário, pois só assim vamos entender o quanto a humanidade está machucada, mas ainda luta para continuar caminhando com a cabeça erguida!

A série mistura depoimentos com imagens de arquivos, vídeos feitos por celulares e até gravações da própria polícia, para ilustrar, em detalhes, o inferno de quem viveu e sobreviveu aos atentados. Muito interessante é a dinâmica que os diretores Gédéon Naudet e Jules Naudet, que já ganharam um Emmy pelo também excelente "9/11" de 2002, usaram para contar cada uma das histórias do ataque. Em nenhum momento sentimos um viés político, muito pelo contrário - nem o Estado Islâmico é citado durante os episódios. O foco é realmente o lado humano dos atentados e é aí que o drama pega forte. Fica fácil de visualizar aqueles momentos tão particulares que são contados pelos sobreviventes e isso dói. Os relatos são impressionantes, sinceros, sem nenhum tipo de máscara ou receio. É forte!!!!

Um dos artifícios usados pelos irmãos Naudet foi a inserção de elementos gráficos que serviram para pontuar o trajeto que os terroristas fizeram até chegar na Bataclan. Enquanto o primeiro episódio da série se dedica aos ataques nos restaurantes e bares, o segundo e o terceiro mergulham no interior da boate - o bacana é que, mesmo complexos, os fatos são facilmente explicados e localizados por uma  animação que ilustra perfeitamente onde estavam os personagens, os terroristas e, finalmente, os policiais. Fica tudo muito simples, fluido, o que, sem dúvida, nos coloca dentro da história sem a menor piedade. É belo como obra, como técnica de storytelling, mas difícil de digerir como ser humano!

"13 de Novembro: Terror em Paris" é uma bela surpresa escondida dentro do catálogo da Netflix. É preciso estar disposto para encarar uma história como essa, mas a experiência é extremamente imersiva e provocadora. É impossível não se colocar no lugar daquelas pessoas quando relatam o silêncio após os disparos, o cheiro de sangue misturado com pólvora, os clarões das explosões e até o barulho ensurdecedor dos celulares das vítimas tocando depois do massacre.  Embora esse seja o melhor elogio que um documentário pode receber, estar ali dentro, mesmo que pelos olhos dos outros, não é uma tarefa fácil!!!

Eu indico tranquilamente, mas assista sabendo que o assunto vai machucar e que o resultado da obra é um relato emocionante, cheio de detalhes, de uma noite que nunca mais será esquecida!!!!

Assista Agora 

15:17 Destino Paris

Baseado no livro “The 15:17 to Paris: The True Story of a Terrorist, a Train, and Three American Soldiers”, o filme de Clint Eastwood conta a história de três americanos, Spencer Stone, Anthony Sadler e Alek Skarlatos. Amigos desde a infância, eles estavam viajando pela Europa quando acabaram reféns de um terrorista marroquino, Ayoub El-Khazzani (Ray Corasani), em um trem que ia de Amsterdã para Paris.

Pelo trailer temos a impressão que é mais um grande filme sobre heróis americanos "15:17 Destino Paris", certo? Pois é, de fato, esse é o objetivo de Eastwood, mas o resultado talvez deixe a desejar para os mais exigentes, embora seja um bom entretenimento se você não assistir com as expectativas que um filme do diretor carrega!

"15:17 Destino Paris" é muito bem dirigido por uma cara que domina a gramática cinematográfica como ninguém - é perceptível a qualidade técnica e a capacidade que Eastwood tem de contar uma história que dialoga com seus propósitos, mas para mim, o maior problema do filme acabou sendo seu roteiro! Ele é muito inconsistente - parece que editaram para caber na "Tela Quente", sabe? 

O roteiro de Dorothy Blyskal transita entre a vida adulta e a infância dos três protagonistas, porém, o que poderia ser um trabalho profundo sobre a formação do caráter e dos valores dos futuros heróis em diversas camadas, é só um retrato de três garotos fazendo malcriação! Já adultos, o filme soa mais como uma espécie de Road Movie, quase colegial, com diálogos muitas vezes superficiais e sem muito propósito para o que mais interessa: os momentos de tensão perante uma experiência marcante e aterrorizante vivida naquele 21 de agosto de 2015 - como, por exemplo, Paul Greengrass fez brilhantemente no excelente "Voo United 93".

A parte curiosa do filme é que Clint Eastwood não usou atores para contar a história! Quem viveu aquele dia, reviveu na ficção - e isso pesa no filme! Spencer Stone, Anthony Sadler e Alek Skarlatos se esforçam, mas não entregam a dramaticidade que o filme pedia!

Olha, de fato, "15:17 Destino Paris" era uma história que merecia ser contada! Vale como referência histórica, como retrato de uma sociedade doentia, mas como filme em si, é aquele típico entretenimento "Sessão da Tarde" sem maiores pretensões ou seja, vale pela diversão!

Assista Agora

Baseado no livro “The 15:17 to Paris: The True Story of a Terrorist, a Train, and Three American Soldiers”, o filme de Clint Eastwood conta a história de três americanos, Spencer Stone, Anthony Sadler e Alek Skarlatos. Amigos desde a infância, eles estavam viajando pela Europa quando acabaram reféns de um terrorista marroquino, Ayoub El-Khazzani (Ray Corasani), em um trem que ia de Amsterdã para Paris.

Pelo trailer temos a impressão que é mais um grande filme sobre heróis americanos "15:17 Destino Paris", certo? Pois é, de fato, esse é o objetivo de Eastwood, mas o resultado talvez deixe a desejar para os mais exigentes, embora seja um bom entretenimento se você não assistir com as expectativas que um filme do diretor carrega!

"15:17 Destino Paris" é muito bem dirigido por uma cara que domina a gramática cinematográfica como ninguém - é perceptível a qualidade técnica e a capacidade que Eastwood tem de contar uma história que dialoga com seus propósitos, mas para mim, o maior problema do filme acabou sendo seu roteiro! Ele é muito inconsistente - parece que editaram para caber na "Tela Quente", sabe? 

O roteiro de Dorothy Blyskal transita entre a vida adulta e a infância dos três protagonistas, porém, o que poderia ser um trabalho profundo sobre a formação do caráter e dos valores dos futuros heróis em diversas camadas, é só um retrato de três garotos fazendo malcriação! Já adultos, o filme soa mais como uma espécie de Road Movie, quase colegial, com diálogos muitas vezes superficiais e sem muito propósito para o que mais interessa: os momentos de tensão perante uma experiência marcante e aterrorizante vivida naquele 21 de agosto de 2015 - como, por exemplo, Paul Greengrass fez brilhantemente no excelente "Voo United 93".

A parte curiosa do filme é que Clint Eastwood não usou atores para contar a história! Quem viveu aquele dia, reviveu na ficção - e isso pesa no filme! Spencer Stone, Anthony Sadler e Alek Skarlatos se esforçam, mas não entregam a dramaticidade que o filme pedia!

Olha, de fato, "15:17 Destino Paris" era uma história que merecia ser contada! Vale como referência histórica, como retrato de uma sociedade doentia, mas como filme em si, é aquele típico entretenimento "Sessão da Tarde" sem maiores pretensões ou seja, vale pela diversão!

Assista Agora

22 July

Um filme europeu chamou muito a minha atenção quando esteve em Berlin: Utøya 22. juli. - pelo "simples" fato do filme ser um plano sequência de mais de uma hora. Pois bem, eu não conhecia a história dos atentados a um grupo de jovens que estavam em um ilha na Noruega antes de assistir esse filme, e de fato é realmente perturbador! Agora a Netflix que não é boba nem nada, resolveu trazer para o seu catálogo original esses terríveis e dramáticos acontecimentos com uma visão mais complexa. Então, ninguém melhor que Paul Greengrass (de "Vôo United 93" e "Capitão Phillips") para contar parte da história real que o filme do Erik Poppe não contou. Aliás, se tiverem oportunidade, não deixem de assistir os dois, eles se completam - da mesma forma que "Dunkirk" foi essencial para contar parte da história que "O Destino de uma Nação" não contou.

Noruega, 2011. Anders Behring Breivik, consumido pelos seus ideias fundamentalistas cristãos e anti-islâmicos, mata 75 pessoas a tiros em um acampamento na Ilha de Utoya. Os sobreviventes do ataque pedem justiça ao governo Norueguês, enquanto os advogados do terrorista condenado se mobilizam para defendê-lo perante a lei. Confira o trailer:

"22 July" não é visceral como "Utøya", mas nem por isso deixa de ser um grande filme, muito pelo contrário, cinematograficamente falando é até mais relevante pois mostra muito mais do que o ataque a ilha, mostra a causa, a consequência, o debate, os absurdos que o extremismo pode gerar em uma sociedade cheia de pessoas doentes (estou falando só do filme, ok?). O roteiro foi baseado no livro do Åsne Seierstad ("One of Us") - ponto alto do filme ao lado da camera solta, quase documental, do Greengrass.

Se no filme norueguês sofremos com aqueles adolescentes que estavam sem saída na ilha, nessa versão da Netflix vemos o inicio dos atentados, o que pensava o terrorista, como ele agiu, como ele planejou e como ele lidou com a prisão. É curioso que na ilha mesmo, são poucas cenas, e não sentimos falta porque nada é gratuito no filme. As sequências se constroem de uma forma tão orgânica que você nem sente as mais de duas horas passarem.

Pessoalmente achei "Utøya" mais marcante (quase uma experiência sensorial), enquanto "22 July" é mais um entretenimento - os dois são excelentes filmes, que fique claro. A dica, no entanto, é para que você assista os dois e tenha experiências tão diferentes quanto complementares! Pode acreditar, vai valer muito a pena!

Assista Agora

Um filme europeu chamou muito a minha atenção quando esteve em Berlin: Utøya 22. juli. - pelo "simples" fato do filme ser um plano sequência de mais de uma hora. Pois bem, eu não conhecia a história dos atentados a um grupo de jovens que estavam em um ilha na Noruega antes de assistir esse filme, e de fato é realmente perturbador! Agora a Netflix que não é boba nem nada, resolveu trazer para o seu catálogo original esses terríveis e dramáticos acontecimentos com uma visão mais complexa. Então, ninguém melhor que Paul Greengrass (de "Vôo United 93" e "Capitão Phillips") para contar parte da história real que o filme do Erik Poppe não contou. Aliás, se tiverem oportunidade, não deixem de assistir os dois, eles se completam - da mesma forma que "Dunkirk" foi essencial para contar parte da história que "O Destino de uma Nação" não contou.

Noruega, 2011. Anders Behring Breivik, consumido pelos seus ideias fundamentalistas cristãos e anti-islâmicos, mata 75 pessoas a tiros em um acampamento na Ilha de Utoya. Os sobreviventes do ataque pedem justiça ao governo Norueguês, enquanto os advogados do terrorista condenado se mobilizam para defendê-lo perante a lei. Confira o trailer:

"22 July" não é visceral como "Utøya", mas nem por isso deixa de ser um grande filme, muito pelo contrário, cinematograficamente falando é até mais relevante pois mostra muito mais do que o ataque a ilha, mostra a causa, a consequência, o debate, os absurdos que o extremismo pode gerar em uma sociedade cheia de pessoas doentes (estou falando só do filme, ok?). O roteiro foi baseado no livro do Åsne Seierstad ("One of Us") - ponto alto do filme ao lado da camera solta, quase documental, do Greengrass.

Se no filme norueguês sofremos com aqueles adolescentes que estavam sem saída na ilha, nessa versão da Netflix vemos o inicio dos atentados, o que pensava o terrorista, como ele agiu, como ele planejou e como ele lidou com a prisão. É curioso que na ilha mesmo, são poucas cenas, e não sentimos falta porque nada é gratuito no filme. As sequências se constroem de uma forma tão orgânica que você nem sente as mais de duas horas passarem.

Pessoalmente achei "Utøya" mais marcante (quase uma experiência sensorial), enquanto "22 July" é mais um entretenimento - os dois são excelentes filmes, que fique claro. A dica, no entanto, é para que você assista os dois e tenha experiências tão diferentes quanto complementares! Pode acreditar, vai valer muito a pena!

Assista Agora

A Casa que Jack Construiu

A Casa que Jack Construiu

Lars Von Trier (de "Melancolia") nos presenteia com algo insano e incandescente. Uma aula de como desenvolver personagens complexos, metáforas imponentes e um roteiro genial!

Um dia, durante um encontro fortuito na estrada, o arquiteto Jack (Matt Dillon) mata uma mulher. Este evento provoca um prazer inesperado no personagem, que passa a assassinar dezenas de pessoas ao longo de doze anos. Devido ao descaso das autoridades e a indiferença dos habitantes locais, o criminoso não encontra dificuldade em planejar seus crimes, executa-los ao olhar de todos e guardar os cadáveres num grande frigorífico. Tempos mais tarde, ele compartilha os seus casos mais marcantes com o sábio Virgílio (Bruno Ganz) em uma jornada rumo ao inferno. Confira o trailer:

Indubitavelmente Lars Von Trier nos choca! Uma mente doentia? Um gênio incompreendido? Talvez seja a mistura dos dois, porém, não podemos ter a audácia de mencionar que ele não engrandece o cinema em geral - esqueça seus escândalos pessoais, estou focando no artista, e com esse foco, ele figura na prateleira de cima dos diretores deste século. Sempre será um desperdício encararmos qualquer filme de Von Trier com uma mente fechada, objetiva e crua. O alcance mensurado por suas hipérboles sistemáticas conceituais sobre religião, credo e cor nos inflamam e nos causam estranheza e repúdio, no entanto, se olharmos com olhos de libertação ou até, uma libertinagem utópica, talvez a compreensão de seus filmes passam a ser mais “mastigáveis” para o grande público.

O modo com que Lars molda essa narrativa é grosseiramente genial. O clímax imposto em cada passagem de incidentes, é fluida e intrigante. A maneira como é diluída o tesão no âmago do protagonista psicopata que usa e abusa de diálogos efervescentes e metáforas distópicas, com o único e belo intuito de colecionar corpos, é instigante e soberbo. A violência gráfica é essencial, observamos que o diretor não quer nos chocar, e sim passar a mensagem de que o mundo caminha para o limbo social - o nocivo está presente em cada canto, no entanto, sua perceptividade em demonstrar as fraquezas do protagonista, aproximando ele da audiência, nos causa medo, e esse receio não é deferido pelas atrocidades mostradas, e sim por não sabermos quem é quem no mundo de hoje, não há nada mais aterrorizante do que não saber em quem confiar, a maldade pode estar ao seu lado.

Mas o mal tem cura? O desejo de esfolar, decapitar, estrangular é subversivo? Nascemos com isso ou vamos lapidando esse ódio continuo sobre o próximo com o passar do tempo? Lars Von Trier usa a arte como ponto de ebulição. O mal é derivado desse ostracismo artístico. O diretor nos presenteia com um filme asqueroso, impactante, lindo e reflexivo. Afinal, o inferno é alcançado após a morte ou já estamos nele? Assistam, é uma viagem existencial, quase espectral, até a podridão humana!

Um serial Killer com traços normais. Você conseguiria reconhecer um assassino em série? Eu aposto que não! "A Casa que Jack Construiu" é uma obra-prima!

Escrito por Bruno Overbeck - uma parceria @overcinee

Assista Agora

Lars Von Trier (de "Melancolia") nos presenteia com algo insano e incandescente. Uma aula de como desenvolver personagens complexos, metáforas imponentes e um roteiro genial!

Um dia, durante um encontro fortuito na estrada, o arquiteto Jack (Matt Dillon) mata uma mulher. Este evento provoca um prazer inesperado no personagem, que passa a assassinar dezenas de pessoas ao longo de doze anos. Devido ao descaso das autoridades e a indiferença dos habitantes locais, o criminoso não encontra dificuldade em planejar seus crimes, executa-los ao olhar de todos e guardar os cadáveres num grande frigorífico. Tempos mais tarde, ele compartilha os seus casos mais marcantes com o sábio Virgílio (Bruno Ganz) em uma jornada rumo ao inferno. Confira o trailer:

Indubitavelmente Lars Von Trier nos choca! Uma mente doentia? Um gênio incompreendido? Talvez seja a mistura dos dois, porém, não podemos ter a audácia de mencionar que ele não engrandece o cinema em geral - esqueça seus escândalos pessoais, estou focando no artista, e com esse foco, ele figura na prateleira de cima dos diretores deste século. Sempre será um desperdício encararmos qualquer filme de Von Trier com uma mente fechada, objetiva e crua. O alcance mensurado por suas hipérboles sistemáticas conceituais sobre religião, credo e cor nos inflamam e nos causam estranheza e repúdio, no entanto, se olharmos com olhos de libertação ou até, uma libertinagem utópica, talvez a compreensão de seus filmes passam a ser mais “mastigáveis” para o grande público.

O modo com que Lars molda essa narrativa é grosseiramente genial. O clímax imposto em cada passagem de incidentes, é fluida e intrigante. A maneira como é diluída o tesão no âmago do protagonista psicopata que usa e abusa de diálogos efervescentes e metáforas distópicas, com o único e belo intuito de colecionar corpos, é instigante e soberbo. A violência gráfica é essencial, observamos que o diretor não quer nos chocar, e sim passar a mensagem de que o mundo caminha para o limbo social - o nocivo está presente em cada canto, no entanto, sua perceptividade em demonstrar as fraquezas do protagonista, aproximando ele da audiência, nos causa medo, e esse receio não é deferido pelas atrocidades mostradas, e sim por não sabermos quem é quem no mundo de hoje, não há nada mais aterrorizante do que não saber em quem confiar, a maldade pode estar ao seu lado.

Mas o mal tem cura? O desejo de esfolar, decapitar, estrangular é subversivo? Nascemos com isso ou vamos lapidando esse ódio continuo sobre o próximo com o passar do tempo? Lars Von Trier usa a arte como ponto de ebulição. O mal é derivado desse ostracismo artístico. O diretor nos presenteia com um filme asqueroso, impactante, lindo e reflexivo. Afinal, o inferno é alcançado após a morte ou já estamos nele? Assistam, é uma viagem existencial, quase espectral, até a podridão humana!

Um serial Killer com traços normais. Você conseguiria reconhecer um assassino em série? Eu aposto que não! "A Casa que Jack Construiu" é uma obra-prima!

Escrito por Bruno Overbeck - uma parceria @overcinee

Assista Agora

A Lenda de Candyman

Se você gosta de um bom suspense, com aqueles elementos que já fizeram muito sucesso em filmes de terror na década de 90, que transformam a jornada em algo ainda mais violento e sombrio, e ainda com uma história muito interessante que provoca o inconsciente coletivo e nossa memória afetiva, "A Lenda de Candyman" definitivamente é para você!

Em um bairro pobre de Chicago, a lenda de um espírito assassino conhecido como Candyman (Tony Todd) assolou a população anos atrás, aterrorizando os moradores do complexo habitacional de Cabini-Green. Agora, o local foi renovado e é lar de cidadãos de alta classe, na sua maioria brancos. O artista visual Anthony McCoy (Yahya Abdul-Mateen III) e sua namorada, diretora da galeria, Brianna Cartwright (Teyona Parris), se mudam para Cabrini, onde Anthony encontra uma nova fonte de inspiração para sua próxima exposição. Mas quando o espírito maligno retorna, os novos habitantes também são obrigados a enfrentar a ira de Candyman. Confira o trailer:

Antes de mais nada é preciso contextualizar "A Lenda de Candyman" na linha do tempo: durante a década de 90 foram feitos três filmes a partir do conto "The Forbidden", do escritor britânico Clive Barker - pelas mãos do diretor Bernard Rose (de "Minha Amada Imortal"), e do ator Tony Todd, foi que Candyman se tomou conhecido do grande público. O personagem foi tirado da Inglaterra e levado para os Estados Unidos de 1992, onde sofreu algumas adaptações que impactaram na sua mitologia até hoje: o cenário que era um decadente conjunto habitacional de classe média se tornou um conjunto habitacional marginalizado; sua raça ganhou força ao ser apresentado como um homem negro, enquanto entidade é um reflexo de um crime de ódio que passou a ser movido por vingança e que se apoia na violência para deixar sua mensagem.

Pois bem, o filme original, "O Mistério de Candyman", sem a menor dúvida enriqueceu a obra de Barker e inovou ao ir além de um conto de terror sobre lendas urbanas para incorporar discussões sobre o preconceito e exclusão. Como os outros dois filmes, "Candyman 2: A Vingança" e "Candyman 3: Dia dos Mortos" reduziram o personagem a mais um assassino slasher, por favor, desconsiderem; mas em relação ao primeiro, o respeito da diretora Nia DaCosta (Passando dos Limites) e dos produtores (e roteiristas) Jordan Peele ("Corra" e "Nós") e Win Rosenfeld (Infiltrados na Klan), entrelaçando as duas histórias ao ponto de recriar representações conceituais em um belíssimo teatro de sombras, acabam nos mostrando um universo cheio de detalhes que colocam uma franquia adormecida (quase esquecida) em outro patamar. 

Mas é preciso assistir ao primeiro filme? Não, mas caso o faça, sua experiência será mais rica - até porquê existe um certo espelhamento entre os protagonistas: o Anthony McCoy de hoje e a Helen Lyle (Virginia Madsen) de 92. O fato é que a história de "A Lenda de Candyman" se conta sozinha, sem esquecer do seu legado, claro, mas de uma forma coerente e muito inteligente. Bem dirigido e com um desenho de som que funciona perfeitamente como gatilhos emocionais sem exagerar na dose, o filme é uma aula de gramática cinematográfica de gênero e um entretenimento da melhor qualidade. Confesso o meu receio desde que assisti o primeiro trailer, porém te tranquilizo: o filme é supreendentemente bom!

Vale o seu play!

Assista Agora

Se você gosta de um bom suspense, com aqueles elementos que já fizeram muito sucesso em filmes de terror na década de 90, que transformam a jornada em algo ainda mais violento e sombrio, e ainda com uma história muito interessante que provoca o inconsciente coletivo e nossa memória afetiva, "A Lenda de Candyman" definitivamente é para você!

Em um bairro pobre de Chicago, a lenda de um espírito assassino conhecido como Candyman (Tony Todd) assolou a população anos atrás, aterrorizando os moradores do complexo habitacional de Cabini-Green. Agora, o local foi renovado e é lar de cidadãos de alta classe, na sua maioria brancos. O artista visual Anthony McCoy (Yahya Abdul-Mateen III) e sua namorada, diretora da galeria, Brianna Cartwright (Teyona Parris), se mudam para Cabrini, onde Anthony encontra uma nova fonte de inspiração para sua próxima exposição. Mas quando o espírito maligno retorna, os novos habitantes também são obrigados a enfrentar a ira de Candyman. Confira o trailer:

Antes de mais nada é preciso contextualizar "A Lenda de Candyman" na linha do tempo: durante a década de 90 foram feitos três filmes a partir do conto "The Forbidden", do escritor britânico Clive Barker - pelas mãos do diretor Bernard Rose (de "Minha Amada Imortal"), e do ator Tony Todd, foi que Candyman se tomou conhecido do grande público. O personagem foi tirado da Inglaterra e levado para os Estados Unidos de 1992, onde sofreu algumas adaptações que impactaram na sua mitologia até hoje: o cenário que era um decadente conjunto habitacional de classe média se tornou um conjunto habitacional marginalizado; sua raça ganhou força ao ser apresentado como um homem negro, enquanto entidade é um reflexo de um crime de ódio que passou a ser movido por vingança e que se apoia na violência para deixar sua mensagem.

Pois bem, o filme original, "O Mistério de Candyman", sem a menor dúvida enriqueceu a obra de Barker e inovou ao ir além de um conto de terror sobre lendas urbanas para incorporar discussões sobre o preconceito e exclusão. Como os outros dois filmes, "Candyman 2: A Vingança" e "Candyman 3: Dia dos Mortos" reduziram o personagem a mais um assassino slasher, por favor, desconsiderem; mas em relação ao primeiro, o respeito da diretora Nia DaCosta (Passando dos Limites) e dos produtores (e roteiristas) Jordan Peele ("Corra" e "Nós") e Win Rosenfeld (Infiltrados na Klan), entrelaçando as duas histórias ao ponto de recriar representações conceituais em um belíssimo teatro de sombras, acabam nos mostrando um universo cheio de detalhes que colocam uma franquia adormecida (quase esquecida) em outro patamar. 

Mas é preciso assistir ao primeiro filme? Não, mas caso o faça, sua experiência será mais rica - até porquê existe um certo espelhamento entre os protagonistas: o Anthony McCoy de hoje e a Helen Lyle (Virginia Madsen) de 92. O fato é que a história de "A Lenda de Candyman" se conta sozinha, sem esquecer do seu legado, claro, mas de uma forma coerente e muito inteligente. Bem dirigido e com um desenho de som que funciona perfeitamente como gatilhos emocionais sem exagerar na dose, o filme é uma aula de gramática cinematográfica de gênero e um entretenimento da melhor qualidade. Confesso o meu receio desde que assisti o primeiro trailer, porém te tranquilizo: o filme é supreendentemente bom!

Vale o seu play!

Assista Agora

A Primeira Profecia

Olha, "A Primeira Profecia" não é uma jornada das mais tranquilas! Visualmente impactante em vários momentos, o filme surpreende pela sua qualidade conceitual e pela forma como o roteiro se conecta com o clássico de 1977 sem se esquecer do novo. Pois bem, para quem não sabe, aqui temos um prequel que se propõe a explorar as origens do filme "A Profecia" (ou "The Omen") - com um enfoque na construção de um suspense mais realista e uma abordagem desenvolvida em cima de elementos psicológicos bastante atuais, a diretora Arkasha Stevenson (de "Legion") nos oferece, de fato, uma história surpreendentemente potente que busca expandir o universo da franquia, mergulhando nas raízes do mal e que posteriormente levaria ao nascimento de Damien. 

A trama acompanha a jovem americana Margaret (Nell Tiger Free), que é enviada a Roma para viver a serviço da igreja. No local, ela se afeiçoa por Carlita (Nicole Sorace), uma jovem quieta e sozinha, que também mora no convento. Ao questionar o passado e a situação da garota para as outras irmãs da igreja, ela é alertada para se manter afastada. No entanto, antes de seguir o conselho, Margaret se depara com práticas obscuras que a faz questionar sua fé. Com a ajuda de um padre exonerado, Brennan (Ralph Ineson), ela acaba descobrindo uma conspiração tenebrosa, que por anos foi ocultada pela igreja local, e que tentava esconder o inevitável: a volta do mal encarnado, o chamado Anticristo. Confira o trailer:

Com o claro objetivo de oferecer para uma nova audiência aquele olhar mais profundo sobre os eventos que antecedem o terror que se desenrola em "A Profecia", "The First Omen" (no original) entrega uma mistura de suspense psicológico com elementos sobrenaturais de encher os olhos. O roteiro, escrito por Stevenson ao lado de Tim Smith e de Keith Thomas, equilibra perfeitamente aquela gramática cinematográfica mais lenta do mistério e do suspense com momentos de terror realmente viscerais. Ao explorar temas como a fé, o destino e o eterno conflito entre o bem e o mal, utilizando a história de Katherine como uma lente para examinar questões mais amplas, "A Primeira Profecia" se escora no original, prestando a reverência necessária, mas sem se tornar obrigatório qualquer conhecimento prévio.

Arkasha Stevenson, em sua estreia como diretora de longa-metragem, demonstra uma habilidade notável para criar essa atmosfera de crescente tensão e desconforto. A diretora utiliza uma abordagem visual estilizada, com uma paleta de cores sombria e uma cinematografia que enfatiza a claustrofobia e o isolamento. A direção de fotografia do Aaron Morton (de "A Morte do Demônio") é particularmente eficaz, utilizando luz e sombras para sugerir a presença de forças invisíveis e ameaçadoras. Aqui cabe um comentário: repare como o uso dos cenários e a atenção aos pequenos detalhes ajudam a construir uma sensação constante de inquietação - quando Margaret está trancada no quarto, por exemplo, a porta está cheia de marcas de unhas em um claro sinal de desespero. Nesse sentido,Nell Tiger Free merece elogios - no tom certo, ela é capaz de transmitir de forma eficaz toda a transformação de sua personagem, desde a incredulidade inicial até o reconhecimento inevitável do horror que a cerca. Sua performance é fundamentada em uma autenticidade emocional que ancora o filme, tornando Katherine uma protagonista cheia de camadas.

"A Primeira Profecia" não está isenta de críticas - o ritmo do filme pode soar deliberadamente lento para alguns, no entanto, o que mais incomoda é a previsibilidade do roteiro. Penso que faltou um pouco de sensibilidade ou talvez até um certo grau de experiência para Stevenson controlar melhor nossas expectativas. Mas isso impacta na nossa experiência? Não muito, desde que você embarque na proposta da diretora - especialmente se você conhece o filme original. Em suma, "A Primeira Profecia" é uma adição digna ao universo de "A Profecia", uma exploração rica das origens do mal que assombrou e conduziu a franquia durante anos. Tenho certeza que para os fãs do suspense, aqueles que gostam de tomar alguns sustos mesmo e de se sentir provocados visualmente, "A Primeira Profecia" vai valer muito o play!

Assista Agora

Olha, "A Primeira Profecia" não é uma jornada das mais tranquilas! Visualmente impactante em vários momentos, o filme surpreende pela sua qualidade conceitual e pela forma como o roteiro se conecta com o clássico de 1977 sem se esquecer do novo. Pois bem, para quem não sabe, aqui temos um prequel que se propõe a explorar as origens do filme "A Profecia" (ou "The Omen") - com um enfoque na construção de um suspense mais realista e uma abordagem desenvolvida em cima de elementos psicológicos bastante atuais, a diretora Arkasha Stevenson (de "Legion") nos oferece, de fato, uma história surpreendentemente potente que busca expandir o universo da franquia, mergulhando nas raízes do mal e que posteriormente levaria ao nascimento de Damien. 

A trama acompanha a jovem americana Margaret (Nell Tiger Free), que é enviada a Roma para viver a serviço da igreja. No local, ela se afeiçoa por Carlita (Nicole Sorace), uma jovem quieta e sozinha, que também mora no convento. Ao questionar o passado e a situação da garota para as outras irmãs da igreja, ela é alertada para se manter afastada. No entanto, antes de seguir o conselho, Margaret se depara com práticas obscuras que a faz questionar sua fé. Com a ajuda de um padre exonerado, Brennan (Ralph Ineson), ela acaba descobrindo uma conspiração tenebrosa, que por anos foi ocultada pela igreja local, e que tentava esconder o inevitável: a volta do mal encarnado, o chamado Anticristo. Confira o trailer:

Com o claro objetivo de oferecer para uma nova audiência aquele olhar mais profundo sobre os eventos que antecedem o terror que se desenrola em "A Profecia", "The First Omen" (no original) entrega uma mistura de suspense psicológico com elementos sobrenaturais de encher os olhos. O roteiro, escrito por Stevenson ao lado de Tim Smith e de Keith Thomas, equilibra perfeitamente aquela gramática cinematográfica mais lenta do mistério e do suspense com momentos de terror realmente viscerais. Ao explorar temas como a fé, o destino e o eterno conflito entre o bem e o mal, utilizando a história de Katherine como uma lente para examinar questões mais amplas, "A Primeira Profecia" se escora no original, prestando a reverência necessária, mas sem se tornar obrigatório qualquer conhecimento prévio.

Arkasha Stevenson, em sua estreia como diretora de longa-metragem, demonstra uma habilidade notável para criar essa atmosfera de crescente tensão e desconforto. A diretora utiliza uma abordagem visual estilizada, com uma paleta de cores sombria e uma cinematografia que enfatiza a claustrofobia e o isolamento. A direção de fotografia do Aaron Morton (de "A Morte do Demônio") é particularmente eficaz, utilizando luz e sombras para sugerir a presença de forças invisíveis e ameaçadoras. Aqui cabe um comentário: repare como o uso dos cenários e a atenção aos pequenos detalhes ajudam a construir uma sensação constante de inquietação - quando Margaret está trancada no quarto, por exemplo, a porta está cheia de marcas de unhas em um claro sinal de desespero. Nesse sentido,Nell Tiger Free merece elogios - no tom certo, ela é capaz de transmitir de forma eficaz toda a transformação de sua personagem, desde a incredulidade inicial até o reconhecimento inevitável do horror que a cerca. Sua performance é fundamentada em uma autenticidade emocional que ancora o filme, tornando Katherine uma protagonista cheia de camadas.

"A Primeira Profecia" não está isenta de críticas - o ritmo do filme pode soar deliberadamente lento para alguns, no entanto, o que mais incomoda é a previsibilidade do roteiro. Penso que faltou um pouco de sensibilidade ou talvez até um certo grau de experiência para Stevenson controlar melhor nossas expectativas. Mas isso impacta na nossa experiência? Não muito, desde que você embarque na proposta da diretora - especialmente se você conhece o filme original. Em suma, "A Primeira Profecia" é uma adição digna ao universo de "A Profecia", uma exploração rica das origens do mal que assombrou e conduziu a franquia durante anos. Tenho certeza que para os fãs do suspense, aqueles que gostam de tomar alguns sustos mesmo e de se sentir provocados visualmente, "A Primeira Profecia" vai valer muito o play!

Assista Agora

A Separação

"A Separação" do iraniano Asghar Farhadi é simplesmente fantástico - uma obra que transcende fronteiras culturais e linguísticas capaz de nos oferecer um drama humano e com uma intensidade que raramente encontramos no cinema atual. Com um roteiro impecável, indicado ao Oscar de "Original" e vencedor na categoria de "Melhor Filme Estrangeiro", ambos em 2012, além do Urso de Ouro no Festival de Berlim de 2011, esse filme tem uma capacidade acima da média para discutir com muita sensibilidade temas como a moralidade, a responsabilidade e a complexidade das relações humanas por uma ótica bastante provocadora.

Na trama, Nader (Peyman Maadi) e Simin (Leila Hatami) enfrentam uma decisão difícil: melhorar a vida de sua filha, Termeh (Sarina Farhadi), mudando-se para outro país, ou permanecer no Irã para cuidar do pai de Nader, que sofre de Alzheimer. Nesse contexto que a separação do casal desencadeia uma série de eventos que expõem as tensões sociais e morais da sociedade iraniana até que uma empregada, Razieh (Sareh Bayat), e seu marido, Hodjat (Shahab Hosseini), entram na história, complicando ainda mais a situação. Confira o trailer:

Como não poderia deixar de ser ao se tratar de Farhadi (de "O Apartamento"), o diretor constrói sua narrativa com uma habilidade impressionante, utilizando o posicionamento da câmera para criar uma sensação de proximidade e tensão constantes - existe uma similaridade angustiante que nos lembra toda aquela atmosfera de "A Caça" (mais em sua forma do que em seu conteúdo, antecipo). A fotografia de Mahmoud Kalari (de "O Passado") usa alguns planos mais nervosos e muitos close-ups para nos colocar no centro dos conflitos, tornando essa experiência quase claustrofóbica. A atenção aos detalhes, desde a desordem do apartamento de Nader até os olhares trocados entre os personagens, contribui para uma sensação de realismo que é tão palpável quanto insuportável.

O elenco é um elemento fundamental em "A Separação". Peyman Maadi e Leila Hatami entregam performances complexas e cheia de nuances, capturando a dor, a raiva e a frustração de um casal à beira do colapso - a sensação de caos é crescente entre eles, nos dando a exata sensação de que nada será capaz de mudar o rumo de um destino que poderia ser outro. Sareh Bayat, como Razieh, também merece atenção: sua performance é emocionante, trazendo à tona a luta interna entre a fé e as dificuldades da vida com muita competência. Aqui entra a trilha sonora de Sattar Oraki - em vez de dominar a cena, a música sutilmente complementa o drama, intensificando as emoções sem jamais se sobrepor à narrativa.  

As escolhas de Farhadi em termos de produção, desde a ambientação até o figurino, ajudam a criar um retrato autêntico da vida cotidiana no Irã, ao mesmo tempo em que destacam as questões sociais e políticas subjacentes - isso pode até não ser uma grande novidade nos dias de hoje, mas com o toque visceral da narrativa , olha, o filme muda de patamar! Sim, "A Separação" é uma experiência cinematográfica realmente profunda e comovente e que deixa uma marca dolorida. É um filme que exige certa reflexão sobre os dilemas morais e as diversas camadas das relações que desafiam nossas percepções e proporcionam um olhar íntimo sobre a condição humana.

Para aqueles que buscam um entretenimento mais leve, talvez seja melhor procurar uma outro opção, caso contrário o cinema autoral de Asghar Farhadi em "A Separação" vai realmente te conquistar!

Assista Agora

"A Separação" do iraniano Asghar Farhadi é simplesmente fantástico - uma obra que transcende fronteiras culturais e linguísticas capaz de nos oferecer um drama humano e com uma intensidade que raramente encontramos no cinema atual. Com um roteiro impecável, indicado ao Oscar de "Original" e vencedor na categoria de "Melhor Filme Estrangeiro", ambos em 2012, além do Urso de Ouro no Festival de Berlim de 2011, esse filme tem uma capacidade acima da média para discutir com muita sensibilidade temas como a moralidade, a responsabilidade e a complexidade das relações humanas por uma ótica bastante provocadora.

Na trama, Nader (Peyman Maadi) e Simin (Leila Hatami) enfrentam uma decisão difícil: melhorar a vida de sua filha, Termeh (Sarina Farhadi), mudando-se para outro país, ou permanecer no Irã para cuidar do pai de Nader, que sofre de Alzheimer. Nesse contexto que a separação do casal desencadeia uma série de eventos que expõem as tensões sociais e morais da sociedade iraniana até que uma empregada, Razieh (Sareh Bayat), e seu marido, Hodjat (Shahab Hosseini), entram na história, complicando ainda mais a situação. Confira o trailer:

Como não poderia deixar de ser ao se tratar de Farhadi (de "O Apartamento"), o diretor constrói sua narrativa com uma habilidade impressionante, utilizando o posicionamento da câmera para criar uma sensação de proximidade e tensão constantes - existe uma similaridade angustiante que nos lembra toda aquela atmosfera de "A Caça" (mais em sua forma do que em seu conteúdo, antecipo). A fotografia de Mahmoud Kalari (de "O Passado") usa alguns planos mais nervosos e muitos close-ups para nos colocar no centro dos conflitos, tornando essa experiência quase claustrofóbica. A atenção aos detalhes, desde a desordem do apartamento de Nader até os olhares trocados entre os personagens, contribui para uma sensação de realismo que é tão palpável quanto insuportável.

O elenco é um elemento fundamental em "A Separação". Peyman Maadi e Leila Hatami entregam performances complexas e cheia de nuances, capturando a dor, a raiva e a frustração de um casal à beira do colapso - a sensação de caos é crescente entre eles, nos dando a exata sensação de que nada será capaz de mudar o rumo de um destino que poderia ser outro. Sareh Bayat, como Razieh, também merece atenção: sua performance é emocionante, trazendo à tona a luta interna entre a fé e as dificuldades da vida com muita competência. Aqui entra a trilha sonora de Sattar Oraki - em vez de dominar a cena, a música sutilmente complementa o drama, intensificando as emoções sem jamais se sobrepor à narrativa.  

As escolhas de Farhadi em termos de produção, desde a ambientação até o figurino, ajudam a criar um retrato autêntico da vida cotidiana no Irã, ao mesmo tempo em que destacam as questões sociais e políticas subjacentes - isso pode até não ser uma grande novidade nos dias de hoje, mas com o toque visceral da narrativa , olha, o filme muda de patamar! Sim, "A Separação" é uma experiência cinematográfica realmente profunda e comovente e que deixa uma marca dolorida. É um filme que exige certa reflexão sobre os dilemas morais e as diversas camadas das relações que desafiam nossas percepções e proporcionam um olhar íntimo sobre a condição humana.

Para aqueles que buscam um entretenimento mais leve, talvez seja melhor procurar uma outro opção, caso contrário o cinema autoral de Asghar Farhadi em "A Separação" vai realmente te conquistar!

Assista Agora

A Tragédia de Macbeth

"A Tragédia de Macbeth" é um filmaço, mas não assista com sono!

Brincadeiras à parte, é preciso que se diga que essa produção original para a AppleTV+, com Denzel Washington eFrances McDormand, usa de uma linguagem cinematográfica extremamente poética para adaptar a obra de William Shakespeare, respeitando prioritariamente o seu texto - e quando pontuo esse elemento narrativo tão importante, coloco o roteiro, do também diretor Joel Coen, em um outro patamar, mesmo com uma linguagem clássica de difícil entendimento, mas que está completamente alinhada com uma fotografia deslumbrante do diretor Bruno Delbonnel (cinco vezes indicado ao Oscar, sendo a última por "A Hora mais Escura"), performances no limiar entre a impostação teatral (de corpo e voz) e a profundidade emocional do cinema, e ainda uma construção cênica incrivelmente criativa e dinâmica.

O filme conta a história de Macbeth (Denzel Washington), homem poderoso que é convencido por um trio de bruxas que se tornará o rei da Escócia. Essa visão porém, o toma pela ganância do poder. Rapidamente, o protagonista fica obcecado em fazer com que a profecia se torne realidade, mesmo que para isso ele tenha que eliminar todos aqueles se coloquem entre ele e o trono do seu país. Confira o trailer:

Veja, é bem possível que poucos se encantem com "A Tragédia de Macbeth". De fato o filme é difícil e, embora fabuloso visualmente, as escolhas estéticas e narrativas de Coen e Delbonnel tendem a afastar o, digamos, grande público - dadas as devidas diferenças, inclusive de gênero, se você não gostou de "O Farol", você não vai gostar de "A Tragédia de Macbeth". Ambos os filmes têm diálogos rebuscados, profundos e que aqui ainda carregam o peso do "inglês clássico shakesperiano". Cada linha dita pelos atores estão repletas de metáforas e referências de época, característica do texto do dramaturgo inglês, e brilhantemente preservado por Cohen. Ao dar o play, a tela da TV praticamente se transforma em uma janela para um palco teatral, em preto e branco e com um aspecto 4:3 (aquele quadrado de antigamente). Os ambientes onde as cenas acontecem vão se transformando durante as transições, como um jogo de luz (do teatro) e de imagem (do cinema) e praticamente não temos objetos de cena, mesmo em ambientes tão amplos e imponentes - o que acaba criando uma sensação de vazio avassalador, reparem.

Toda essa ambientação é só parte do contexto para uma história potente e muito bem adaptada. A sensação da existência de um “palco” é tão clara quanto importante para que o filme Coen se torne único - todas as filmagens foram feitas em estúdio, com cenários especialmente construídos para a produção, o que imediatamente nos remete a sensação de artificialidade e, acreditem, de claustrofobia e ansiedade. As soluções criativas do roteiro, como o mergulho nas mentes perturbadas do casal Macbeth e a relação dos personagens com as bruxas, dão exatamente o tom obscuro da obra - é como se víssemos um "Game of Thrones" mais adulto, depressivo, visceral!

"A Tragédia de Macbeth" é um filme impositivo, potente, poético ao extremo, verdadeiramente lindo e bem realizado. Tecnicamente perfeito! Artisticamente irretocável e muito criativo - mas não vai ganhar o Oscar de melhor do ano por ser um clássico, quase inacessível, de William Shakespeare. Uma pena! Embora inicialmente você perceba essa certa estranheza pelo texto rebuscado, logo a trama de traição vai ganhando corpo e nossa percepção vai se acostumando com todo aquele movimento estético. Por isso eu digo sem medo de errar: se você estiver disposto a enfrentar um texto pesado, sua experiência visual será inesquecível!

Vale muito a pena!

Assista Agora

"A Tragédia de Macbeth" é um filmaço, mas não assista com sono!

Brincadeiras à parte, é preciso que se diga que essa produção original para a AppleTV+, com Denzel Washington eFrances McDormand, usa de uma linguagem cinematográfica extremamente poética para adaptar a obra de William Shakespeare, respeitando prioritariamente o seu texto - e quando pontuo esse elemento narrativo tão importante, coloco o roteiro, do também diretor Joel Coen, em um outro patamar, mesmo com uma linguagem clássica de difícil entendimento, mas que está completamente alinhada com uma fotografia deslumbrante do diretor Bruno Delbonnel (cinco vezes indicado ao Oscar, sendo a última por "A Hora mais Escura"), performances no limiar entre a impostação teatral (de corpo e voz) e a profundidade emocional do cinema, e ainda uma construção cênica incrivelmente criativa e dinâmica.

O filme conta a história de Macbeth (Denzel Washington), homem poderoso que é convencido por um trio de bruxas que se tornará o rei da Escócia. Essa visão porém, o toma pela ganância do poder. Rapidamente, o protagonista fica obcecado em fazer com que a profecia se torne realidade, mesmo que para isso ele tenha que eliminar todos aqueles se coloquem entre ele e o trono do seu país. Confira o trailer:

Veja, é bem possível que poucos se encantem com "A Tragédia de Macbeth". De fato o filme é difícil e, embora fabuloso visualmente, as escolhas estéticas e narrativas de Coen e Delbonnel tendem a afastar o, digamos, grande público - dadas as devidas diferenças, inclusive de gênero, se você não gostou de "O Farol", você não vai gostar de "A Tragédia de Macbeth". Ambos os filmes têm diálogos rebuscados, profundos e que aqui ainda carregam o peso do "inglês clássico shakesperiano". Cada linha dita pelos atores estão repletas de metáforas e referências de época, característica do texto do dramaturgo inglês, e brilhantemente preservado por Cohen. Ao dar o play, a tela da TV praticamente se transforma em uma janela para um palco teatral, em preto e branco e com um aspecto 4:3 (aquele quadrado de antigamente). Os ambientes onde as cenas acontecem vão se transformando durante as transições, como um jogo de luz (do teatro) e de imagem (do cinema) e praticamente não temos objetos de cena, mesmo em ambientes tão amplos e imponentes - o que acaba criando uma sensação de vazio avassalador, reparem.

Toda essa ambientação é só parte do contexto para uma história potente e muito bem adaptada. A sensação da existência de um “palco” é tão clara quanto importante para que o filme Coen se torne único - todas as filmagens foram feitas em estúdio, com cenários especialmente construídos para a produção, o que imediatamente nos remete a sensação de artificialidade e, acreditem, de claustrofobia e ansiedade. As soluções criativas do roteiro, como o mergulho nas mentes perturbadas do casal Macbeth e a relação dos personagens com as bruxas, dão exatamente o tom obscuro da obra - é como se víssemos um "Game of Thrones" mais adulto, depressivo, visceral!

"A Tragédia de Macbeth" é um filme impositivo, potente, poético ao extremo, verdadeiramente lindo e bem realizado. Tecnicamente perfeito! Artisticamente irretocável e muito criativo - mas não vai ganhar o Oscar de melhor do ano por ser um clássico, quase inacessível, de William Shakespeare. Uma pena! Embora inicialmente você perceba essa certa estranheza pelo texto rebuscado, logo a trama de traição vai ganhando corpo e nossa percepção vai se acostumando com todo aquele movimento estético. Por isso eu digo sem medo de errar: se você estiver disposto a enfrentar um texto pesado, sua experiência visual será inesquecível!

Vale muito a pena!

Assista Agora

A Viatura

Se em 1971, "Encurralado" mostrou para o mercado o potencial do diretor Steven Spielberg; dadas as devidas proporções, "A Viatura" representou a mesma coisa para o jovem diretor de 34 anos, Jon Watts, em 2015 - ano em que esse filme esteve Top Ten Independent Films pela National Board of Review dos EUA. Aliás, foi graças a "Cop Car" (no original), que Watts recebeu o convite para dirigir a nova trilogia do "Homem- Aranha" para a Sony.

Em um ótimo filme de ação com inúmeras referências ao estilo "Vince Gilligan" (de "Breaking Bad") de contar uma história que transita entre a angustia e a tensão (cheia de humor ácido), dois amigos com 10 anos de idade encontram um carro da polícia abandonado e decidem dirigi-lo para se divertir. Porém, ambos não sabem como fazer isso e acabam se afastando do local onde estavam. Acontece que a viatura pertence ao corrupto xerife da cidade que, claro, decide reaver seu carro para não se complicar - é aí que o jogo de gato e rato começa. Confira o trailer (em inglês):

Para entender o caráter independente de  "A Viatura", o filme foi destaque no Festival de Sundance em 2015 - o mesmo festival que também catapultou as carreiras de nomes (hoje) consagrados como Kevin Smith, Quentin Tarantino, Bryan Singer, Noah Baumbach, David O. Russell. De fato Watts conseguiu a mesma coisa ao transportar para o filme, em pouco menos de 90 minutos, toda a ingenuidade de dois garotos que só queriam se divertir, mas que tomaram decisões erradas por não entenderem o real perigo que estavam passando - sair dirigindo qualquer carro com dez anos de idade já seria um absurdo, imagina uma viatura de policia no interior dos EUA?

O interessante do roteiro escrito por Watts e Christopher Ford (de "Mundo em Caos") é que é a partir dessa ingenuidade que a tensão vai se construindo. Aquele principio da "bola de neve" que Gilligan usou em "Breaking Bad" é exatamente o mesmo aqui. As similaridades não são apenas narrativas, mas também conceituais, já que Watts está sempre procurando posicionar sua câmera de uma forma criativa para contar a história certa, no momento certo, aproveitando todos os detalhes que a própria ação deixou para trás - reparem nos gravetos deixados pelos garotos e na garrafa quebrada na estrada (pode parecer besteira, mas não, tudo tem uma razão de ser e de estar em cena). O desenho de som é outra forte referência de Gilligan - ele conta a história, mas mais do que isso, também serve para potencializar a tensão que está sendo construída ou que está prestes a estourar. Reparem no som "ensurdecedor" dos moinhos de vento no terceiro ato do filme.

De fato "A Viatura" não é um filme inesquecível, mas é tão bom dentro da sua simplicidade que fica fácil entender porque Watts foi exaltado. Seu trabalho com os jovens atores James Freedson-Jackson e Hays Wellford, foi sensacional. O direcionamento para que Kevin Bacon, mais uma vez, também brilhasse, merece elogios. Sua habilidade em subverter algumas ações simples em algo aterrorizante ditou o ritmo do filme (dois meninos mexendo em armas de fogo com nenhum cuidado, ajuda a definir essa sensação). Tendo em mente que o filme custou menos de um milhão de dólares, posso te garantir que saiu barato pelo entretenimento que ele proporciona!

Vale o play! 

Assista Agora

Se em 1971, "Encurralado" mostrou para o mercado o potencial do diretor Steven Spielberg; dadas as devidas proporções, "A Viatura" representou a mesma coisa para o jovem diretor de 34 anos, Jon Watts, em 2015 - ano em que esse filme esteve Top Ten Independent Films pela National Board of Review dos EUA. Aliás, foi graças a "Cop Car" (no original), que Watts recebeu o convite para dirigir a nova trilogia do "Homem- Aranha" para a Sony.

Em um ótimo filme de ação com inúmeras referências ao estilo "Vince Gilligan" (de "Breaking Bad") de contar uma história que transita entre a angustia e a tensão (cheia de humor ácido), dois amigos com 10 anos de idade encontram um carro da polícia abandonado e decidem dirigi-lo para se divertir. Porém, ambos não sabem como fazer isso e acabam se afastando do local onde estavam. Acontece que a viatura pertence ao corrupto xerife da cidade que, claro, decide reaver seu carro para não se complicar - é aí que o jogo de gato e rato começa. Confira o trailer (em inglês):

Para entender o caráter independente de  "A Viatura", o filme foi destaque no Festival de Sundance em 2015 - o mesmo festival que também catapultou as carreiras de nomes (hoje) consagrados como Kevin Smith, Quentin Tarantino, Bryan Singer, Noah Baumbach, David O. Russell. De fato Watts conseguiu a mesma coisa ao transportar para o filme, em pouco menos de 90 minutos, toda a ingenuidade de dois garotos que só queriam se divertir, mas que tomaram decisões erradas por não entenderem o real perigo que estavam passando - sair dirigindo qualquer carro com dez anos de idade já seria um absurdo, imagina uma viatura de policia no interior dos EUA?

O interessante do roteiro escrito por Watts e Christopher Ford (de "Mundo em Caos") é que é a partir dessa ingenuidade que a tensão vai se construindo. Aquele principio da "bola de neve" que Gilligan usou em "Breaking Bad" é exatamente o mesmo aqui. As similaridades não são apenas narrativas, mas também conceituais, já que Watts está sempre procurando posicionar sua câmera de uma forma criativa para contar a história certa, no momento certo, aproveitando todos os detalhes que a própria ação deixou para trás - reparem nos gravetos deixados pelos garotos e na garrafa quebrada na estrada (pode parecer besteira, mas não, tudo tem uma razão de ser e de estar em cena). O desenho de som é outra forte referência de Gilligan - ele conta a história, mas mais do que isso, também serve para potencializar a tensão que está sendo construída ou que está prestes a estourar. Reparem no som "ensurdecedor" dos moinhos de vento no terceiro ato do filme.

De fato "A Viatura" não é um filme inesquecível, mas é tão bom dentro da sua simplicidade que fica fácil entender porque Watts foi exaltado. Seu trabalho com os jovens atores James Freedson-Jackson e Hays Wellford, foi sensacional. O direcionamento para que Kevin Bacon, mais uma vez, também brilhasse, merece elogios. Sua habilidade em subverter algumas ações simples em algo aterrorizante ditou o ritmo do filme (dois meninos mexendo em armas de fogo com nenhum cuidado, ajuda a definir essa sensação). Tendo em mente que o filme custou menos de um milhão de dólares, posso te garantir que saiu barato pelo entretenimento que ele proporciona!

Vale o play! 

Assista Agora

Abutres

É até natural imaginar que todo drama mais, digamos, denso e obscuro com o ator argentino Ricardo Darín nos remeta ao imperdível "O Segredo dos Seus Olhos" ou até ao menos inspirado (mas muito bom) "Tese Sobre um Homicídio". No entanto em "Abutres" a linha narrativa é um pouco diferente, embora em um primeiro olhar possa até nos causar certa identificação com um mistério policial, mas o fato é que o filme do diretor Pablo Trapero (de "Elefante Branco") é muito mais uma jornada íntima de um personagem que vive no caos, mas que busca encontrar um caminho para ser feliz a qualquer preço - algo como vimos em "Jóias Brutas" (aqui um pouco mais cadenciado, sem aquela adrenalina alucinante). Com um olhar crítico e provocador sobre a natureza humana, esse thriller mergulha nas profundezas da moralidade, nos deixando tão intrigado quanto perturbado, com aquela sensação de que "se está ruim, a tendência é piorar ainda mais"!

Sosa (Ricardo Darin) é um advogado que perdeu sua licença, mas que está envolvido em um esquema bastante sombrio e muito lucrativo - ele literalmente caça vítimas de acidentes de trânsito para obter uma parte do seguro, mesmo que para isso seja preciso fraudar todo o processo. Cheio de dividas, as coisas se complicam ainda mais quando ele se depara com a bela Luján (Martina Gusman), uma paramédica que está disposta a transforma-lo em um homem melhor. Confira o trailer:

Talvez o que torna "Abutres" verdadeiramente interessante é a forma como Trapero cria uma atmosfera que equilibra a tensão e o suspense, ao mesmo tempo em que mergulha nas complexidades morais de personagens realmente profundos - mesmo que inicialmente eles soem até estereotipados. Existe um tom de controversa muito bem desenvolvido no roteiro escrito pelo Alejandro Fadel, pelo Martín Mauregui e pelo Santiago Mitre (todos de "Leonera" e o último de "Argentina, 1985"), que aproxima, mas também repele, Sosa e Luján, já que seus trabalhos são completamente opostos: enquanto ela tenta a todo custo salvar a vida de seus pacientes, ele tenta lucrar com a possível morte deles. 

É aí que, mais uma vez, Ricardo Darín brilha. O ator nos oferece uma performance memorável, transmitindo com maestria a dualidade moral de seu personagem - que mais uma vez vai te conectar com o trabalho magnifico de Adam Sandler em "Jóias Brutas". Uma camada que fortalece a trama, sem dúvida, reside na tensão palpável entre os personagens de Darín e de Martina Gusmán - cada cena é um duelo construído na base da desconfiança, mas essencialmente suportado pelo afeto imediato entre eles. Outro ponto que nos marca é atmosfera urbana criada pelo diretor e ratificada com uma fotografia gélida assinada pelo Julián Apezteguia (de "O Anjo") - repare como ele captura a decadência e o desespero de uma Buenos Aires pouco acolhedora, refletindo exatamente a batalha íntima e moral do protagonista,

"Abutres" pode ter um começo mais cadenciado, um segundo ato com um desenvolvimento mais emaranhado, mas é no terceiro ato que a história vira de uma forma muito envolvente. O filme usa dos gatilhos que ele prepara durante uma hora e meia, para realmente desafiar as convenções nos minutos finais. Se você está em busca de um filme que o mantenha preso às expectativas que os personagens vão criando em cima de suas próprias falhas morais até que o perigo iminente se concretize, não perca tempo e dê o play - tenho certeza que será uma experiência que vai além do entretenimento superficial com um toque independente de qualidade e bastante autoral.

Assista Agora

É até natural imaginar que todo drama mais, digamos, denso e obscuro com o ator argentino Ricardo Darín nos remeta ao imperdível "O Segredo dos Seus Olhos" ou até ao menos inspirado (mas muito bom) "Tese Sobre um Homicídio". No entanto em "Abutres" a linha narrativa é um pouco diferente, embora em um primeiro olhar possa até nos causar certa identificação com um mistério policial, mas o fato é que o filme do diretor Pablo Trapero (de "Elefante Branco") é muito mais uma jornada íntima de um personagem que vive no caos, mas que busca encontrar um caminho para ser feliz a qualquer preço - algo como vimos em "Jóias Brutas" (aqui um pouco mais cadenciado, sem aquela adrenalina alucinante). Com um olhar crítico e provocador sobre a natureza humana, esse thriller mergulha nas profundezas da moralidade, nos deixando tão intrigado quanto perturbado, com aquela sensação de que "se está ruim, a tendência é piorar ainda mais"!

Sosa (Ricardo Darin) é um advogado que perdeu sua licença, mas que está envolvido em um esquema bastante sombrio e muito lucrativo - ele literalmente caça vítimas de acidentes de trânsito para obter uma parte do seguro, mesmo que para isso seja preciso fraudar todo o processo. Cheio de dividas, as coisas se complicam ainda mais quando ele se depara com a bela Luján (Martina Gusman), uma paramédica que está disposta a transforma-lo em um homem melhor. Confira o trailer:

Talvez o que torna "Abutres" verdadeiramente interessante é a forma como Trapero cria uma atmosfera que equilibra a tensão e o suspense, ao mesmo tempo em que mergulha nas complexidades morais de personagens realmente profundos - mesmo que inicialmente eles soem até estereotipados. Existe um tom de controversa muito bem desenvolvido no roteiro escrito pelo Alejandro Fadel, pelo Martín Mauregui e pelo Santiago Mitre (todos de "Leonera" e o último de "Argentina, 1985"), que aproxima, mas também repele, Sosa e Luján, já que seus trabalhos são completamente opostos: enquanto ela tenta a todo custo salvar a vida de seus pacientes, ele tenta lucrar com a possível morte deles. 

É aí que, mais uma vez, Ricardo Darín brilha. O ator nos oferece uma performance memorável, transmitindo com maestria a dualidade moral de seu personagem - que mais uma vez vai te conectar com o trabalho magnifico de Adam Sandler em "Jóias Brutas". Uma camada que fortalece a trama, sem dúvida, reside na tensão palpável entre os personagens de Darín e de Martina Gusmán - cada cena é um duelo construído na base da desconfiança, mas essencialmente suportado pelo afeto imediato entre eles. Outro ponto que nos marca é atmosfera urbana criada pelo diretor e ratificada com uma fotografia gélida assinada pelo Julián Apezteguia (de "O Anjo") - repare como ele captura a decadência e o desespero de uma Buenos Aires pouco acolhedora, refletindo exatamente a batalha íntima e moral do protagonista,

"Abutres" pode ter um começo mais cadenciado, um segundo ato com um desenvolvimento mais emaranhado, mas é no terceiro ato que a história vira de uma forma muito envolvente. O filme usa dos gatilhos que ele prepara durante uma hora e meia, para realmente desafiar as convenções nos minutos finais. Se você está em busca de um filme que o mantenha preso às expectativas que os personagens vão criando em cima de suas próprias falhas morais até que o perigo iminente se concretize, não perca tempo e dê o play - tenho certeza que será uma experiência que vai além do entretenimento superficial com um toque independente de qualidade e bastante autoral.

Assista Agora

Adão Negro

Mesmo com algumas críticas, eu te garanto: "Adão Negro" é um ótimo filme de herói - daqueles bem realizados, com boas cenas de ação, uma história descomplicada e um personagem para lá de cativante (muito mérito do The Rock, diga-se de passagem)! Seu único "problema" é que ele não parece um filme da DC, ele é uma cópia descarada da cartilha da Marvel - então não espere aquele belíssimo visual mais sombrio (e requintado) dos tempos de Snyder e muito menos o refinamento e a densidade narrativa de "The Batman" ou de "Coringa".

Alter ego de Teth-Adam e filho do faraó Ramsés II, "Adão Negro" conta a história de origem do anti-herói que foi consumido por poderes mágicos e transformado em um feiticeiro com habilidades inimagináveis com um forte sentimento de vingança. Campeão de Kahndaq que combateu a escravidão para salvar seu povo na Antiguidade, Adam é libertado por caçadores de relíquias no Oriente Médio após mais de 5.000 anos e agora precisa encontrar o seu verdadeiro caminho, além de impor o seu senso de justiça perante um mundo onde a humanidade está à beira do caos. Confira o trailer:

Embora descartado da primeira fase do que tende a ser uma nova era no Universo DC no cinema e no streaming, "Adão Negro" cumpre o seu papel como entretenimento e ganha uma sobrevida para um futuro retorno em melhores condições, digamos, de planejamento. Dinâmico e mais equilibrado que muitos dos últimos filmes da Marvel, incluindo "Thor: Amor e Trovão", o filme dirigido pelo espanhol Jaume Collet-Serra (de "Jungle Cruise" e "Águas Rasas") tem o mérito de mexer com a nossa curiosidade ao apresentar um personagem com potencial de encarar ícones da cultura pop como o próprio Super-Homem, afinal sua super força, sua velocidade, resistência, capacidade de voar e de disparar raios são a maior representatividade do que esses personagens míticos podem representar perante os humanos - algo muito bem trabalhado no passado, como vimos em "O Homem de Aço" e "Batman vs Superman: A Origem da Justiça", e que vinha sendo descartado aos poucos.

Ao citar essas duas obras de Zack Snyder e justamente por isso colocar na balança a qualidade cinematográfica do filme de Collet-Serra, percebemos um outro nível de experiência (inferior, claro); no entanto os elementos narrativos testados e aprovados pelo MCU estão lá e isso faz com que "Adão Negro" mais acerte do que erre como filme de gênero, mesmo que aquela incômoda sensação de "já vi isso em algum lugar" nos acompanhe durante toda a jornada - o dispensável arco de apresentação da Sociedade da Justiça e de seus membros são um bom exemplo disso: tem um Senhor Destino que parece o Doutor Estranho, um Esmaga-Átomo que é a "cara" do Homem-Formiga com um toque de "Homem-Aranha", sem falar no Pantera, digo Gavião Negro, e até aquele QG com nave espacial e tudo, ao melhor estilo "X-Men".

Se a cena pós-crédito de "Liga da Justiça"(o "Snyder Cut", óbvio) nos encheu de esperança, eu diria que a de "Adão Negro" foi capaz de definir exatamente o que um verdadeiro fã de HQ imaginou durante muitos anos. Pena que o atual "todo poderoso da DC" já disse que aquilo não vai acontecer exatamente como nos foi apresentado (e aqui vou te poupar de spolers - você vai entender rapidamente quando assistir), mas é inegável que "Adão Negro" prova que a pancadaria muitas vezes se justifica como escolha narrativa e que a profundidade dos personagens e suas cruzadas mais íntimas não necessariamente precisam conviver em harmonia em todo projeto, desde que, claro, a identidade tenha solidez, o conceito seja respeitado e que a construção do Universo se mantenha coerente com a proposta como um todo.

"Adão Negro" vale sim o seu play, mesmo com as derrapadas cômicas que não se encaixam na DC, mas que tanta gente adora que nem a cópia vai incomodar! 

Assista Agora

Mesmo com algumas críticas, eu te garanto: "Adão Negro" é um ótimo filme de herói - daqueles bem realizados, com boas cenas de ação, uma história descomplicada e um personagem para lá de cativante (muito mérito do The Rock, diga-se de passagem)! Seu único "problema" é que ele não parece um filme da DC, ele é uma cópia descarada da cartilha da Marvel - então não espere aquele belíssimo visual mais sombrio (e requintado) dos tempos de Snyder e muito menos o refinamento e a densidade narrativa de "The Batman" ou de "Coringa".

Alter ego de Teth-Adam e filho do faraó Ramsés II, "Adão Negro" conta a história de origem do anti-herói que foi consumido por poderes mágicos e transformado em um feiticeiro com habilidades inimagináveis com um forte sentimento de vingança. Campeão de Kahndaq que combateu a escravidão para salvar seu povo na Antiguidade, Adam é libertado por caçadores de relíquias no Oriente Médio após mais de 5.000 anos e agora precisa encontrar o seu verdadeiro caminho, além de impor o seu senso de justiça perante um mundo onde a humanidade está à beira do caos. Confira o trailer:

Embora descartado da primeira fase do que tende a ser uma nova era no Universo DC no cinema e no streaming, "Adão Negro" cumpre o seu papel como entretenimento e ganha uma sobrevida para um futuro retorno em melhores condições, digamos, de planejamento. Dinâmico e mais equilibrado que muitos dos últimos filmes da Marvel, incluindo "Thor: Amor e Trovão", o filme dirigido pelo espanhol Jaume Collet-Serra (de "Jungle Cruise" e "Águas Rasas") tem o mérito de mexer com a nossa curiosidade ao apresentar um personagem com potencial de encarar ícones da cultura pop como o próprio Super-Homem, afinal sua super força, sua velocidade, resistência, capacidade de voar e de disparar raios são a maior representatividade do que esses personagens míticos podem representar perante os humanos - algo muito bem trabalhado no passado, como vimos em "O Homem de Aço" e "Batman vs Superman: A Origem da Justiça", e que vinha sendo descartado aos poucos.

Ao citar essas duas obras de Zack Snyder e justamente por isso colocar na balança a qualidade cinematográfica do filme de Collet-Serra, percebemos um outro nível de experiência (inferior, claro); no entanto os elementos narrativos testados e aprovados pelo MCU estão lá e isso faz com que "Adão Negro" mais acerte do que erre como filme de gênero, mesmo que aquela incômoda sensação de "já vi isso em algum lugar" nos acompanhe durante toda a jornada - o dispensável arco de apresentação da Sociedade da Justiça e de seus membros são um bom exemplo disso: tem um Senhor Destino que parece o Doutor Estranho, um Esmaga-Átomo que é a "cara" do Homem-Formiga com um toque de "Homem-Aranha", sem falar no Pantera, digo Gavião Negro, e até aquele QG com nave espacial e tudo, ao melhor estilo "X-Men".

Se a cena pós-crédito de "Liga da Justiça"(o "Snyder Cut", óbvio) nos encheu de esperança, eu diria que a de "Adão Negro" foi capaz de definir exatamente o que um verdadeiro fã de HQ imaginou durante muitos anos. Pena que o atual "todo poderoso da DC" já disse que aquilo não vai acontecer exatamente como nos foi apresentado (e aqui vou te poupar de spolers - você vai entender rapidamente quando assistir), mas é inegável que "Adão Negro" prova que a pancadaria muitas vezes se justifica como escolha narrativa e que a profundidade dos personagens e suas cruzadas mais íntimas não necessariamente precisam conviver em harmonia em todo projeto, desde que, claro, a identidade tenha solidez, o conceito seja respeitado e que a construção do Universo se mantenha coerente com a proposta como um todo.

"Adão Negro" vale sim o seu play, mesmo com as derrapadas cômicas que não se encaixam na DC, mas que tanta gente adora que nem a cópia vai incomodar! 

Assista Agora

Alerta Máximo

Assistir "Alerta Máximo" é como jogar uma boa partida de "Fair Cry" ou como viajar para os anos 80 ou 90 e reviver os clássicos filmes de ação onde um herói improvável ao melhor estilo Nicolas Cage, Bruce Willis, Steven Seagal ou até Sylvester Stallone, busca sua redenção tentando salvar um grupo de pessoas em uma perigosa (para não dizer suicida) jornada contra mercenários infinitamente melhor equipados que ele. Dito isso, já dá para imaginar o tamanho da abstração da realidade que será necessário para embarcar nessa aventura , certo? Então soma-se o fato de um piloto tentando pousar um avião comercial em uma estrada de terra, com árvores para todo lado, durante uma forte tempestade noturna e sem nenhum tipo de instrumento de navegação para auxiliá-lo. Difícil, né? Mas acredite: tudo isso é muito (mais muito) divertido!

O experiente piloto Brodie Torrance (Gerard Butler), após ser atingido por um raio em meio a uma forte tempestade, salva seus passageirosfazendo um pouso arriscado em uma ilha devastada pela guerra civil – é ali que ele descobre que sobreviver a um acidente aéreo será apenas o começo de uma perigosa jornada. Quando a maioria dos passageiros são feitos de reféns por perigosos rebeldes, a única pessoa com quem Torrance pode contar para ajudar no resgate é Louis Gaspare (Mike Colter), um acusado de assassinato que estava sendo transportado pelo FBI. Confira o trailer:

Como um bom filme de ação deve ser, os roteiristas J. P. Davis (de "Contrato Perigoso) e o estreante Charles Cumming não perdem muito tempo na apresentação dos personagens, muito menos nas motivações que os colocaram naquela situação - mesmo que o gatilho emocional seja a conexão familiar, sua exposição superficial praticamente não interfere no andamento da trama, ou seja, você até vai encontrar algum sentimentalismo barato (natural), mas o que vai te divertir mesmo serão os tiros para tudo quanto é lado. Obviamente que essa dinâmica narrativa tão particular nos exige certo relaxamento intelectual, porém é de se elogiar a forma como o diretor francês Jean-François Richet (de "Assalto ao 13° Distrito" e "Inimigo Público") se alinha ao texto e nos entrega um excelente entretenimento de pouco mais de 90 minutos.

Richet não esconde suas referências que vão de "Duro de Matar" ao game "Call of Duty" em apenas um corte de câmera - ele conduz a narrativa com uma eficaz alternância de estilos, chancelando sua capacidade e conhecimento sobre a gramática cinematográfica do gênero. Se no primeiro ato ele se apoia no tradicional da câmera fixa, a partir do segundo sua câmera nervosa tira a audiência do papel de observador e rapidamente nos coloca como parte da tropa, aproveitando todo clima de tensão e angustia que os personagens estão vivendo - e aqui cabe um comentário: a sequência de caos quando o avião é atingido pelo raio e as consequências desse acidente funcionam lindamente (que chega a dar uma saudade de "Lost").

No final das contas, "Plane" (no original) pode até parecer um emaranhado de referências e estilos narrativos, mas na verdade ele simplesmente segue, linha a linha, a cartilha do bom filme de ação dos anos 80 e 90 - e com muitos méritos eu diria! Então se você viveu esses anos dourados do cinema de gênero e gostou de "obras-primas" como "Con Air", "A Outra Face", "A Força em Alerta", etc; pode ter certeza que você vai se amarrar em "Alerta Máximo" e ainda colocar o ator escocês Gerard Butler naquela prateleira que poucos tem a honra de estar!

Vale muito a pena!

Assista Agora

Assistir "Alerta Máximo" é como jogar uma boa partida de "Fair Cry" ou como viajar para os anos 80 ou 90 e reviver os clássicos filmes de ação onde um herói improvável ao melhor estilo Nicolas Cage, Bruce Willis, Steven Seagal ou até Sylvester Stallone, busca sua redenção tentando salvar um grupo de pessoas em uma perigosa (para não dizer suicida) jornada contra mercenários infinitamente melhor equipados que ele. Dito isso, já dá para imaginar o tamanho da abstração da realidade que será necessário para embarcar nessa aventura , certo? Então soma-se o fato de um piloto tentando pousar um avião comercial em uma estrada de terra, com árvores para todo lado, durante uma forte tempestade noturna e sem nenhum tipo de instrumento de navegação para auxiliá-lo. Difícil, né? Mas acredite: tudo isso é muito (mais muito) divertido!

O experiente piloto Brodie Torrance (Gerard Butler), após ser atingido por um raio em meio a uma forte tempestade, salva seus passageirosfazendo um pouso arriscado em uma ilha devastada pela guerra civil – é ali que ele descobre que sobreviver a um acidente aéreo será apenas o começo de uma perigosa jornada. Quando a maioria dos passageiros são feitos de reféns por perigosos rebeldes, a única pessoa com quem Torrance pode contar para ajudar no resgate é Louis Gaspare (Mike Colter), um acusado de assassinato que estava sendo transportado pelo FBI. Confira o trailer:

Como um bom filme de ação deve ser, os roteiristas J. P. Davis (de "Contrato Perigoso) e o estreante Charles Cumming não perdem muito tempo na apresentação dos personagens, muito menos nas motivações que os colocaram naquela situação - mesmo que o gatilho emocional seja a conexão familiar, sua exposição superficial praticamente não interfere no andamento da trama, ou seja, você até vai encontrar algum sentimentalismo barato (natural), mas o que vai te divertir mesmo serão os tiros para tudo quanto é lado. Obviamente que essa dinâmica narrativa tão particular nos exige certo relaxamento intelectual, porém é de se elogiar a forma como o diretor francês Jean-François Richet (de "Assalto ao 13° Distrito" e "Inimigo Público") se alinha ao texto e nos entrega um excelente entretenimento de pouco mais de 90 minutos.

Richet não esconde suas referências que vão de "Duro de Matar" ao game "Call of Duty" em apenas um corte de câmera - ele conduz a narrativa com uma eficaz alternância de estilos, chancelando sua capacidade e conhecimento sobre a gramática cinematográfica do gênero. Se no primeiro ato ele se apoia no tradicional da câmera fixa, a partir do segundo sua câmera nervosa tira a audiência do papel de observador e rapidamente nos coloca como parte da tropa, aproveitando todo clima de tensão e angustia que os personagens estão vivendo - e aqui cabe um comentário: a sequência de caos quando o avião é atingido pelo raio e as consequências desse acidente funcionam lindamente (que chega a dar uma saudade de "Lost").

No final das contas, "Plane" (no original) pode até parecer um emaranhado de referências e estilos narrativos, mas na verdade ele simplesmente segue, linha a linha, a cartilha do bom filme de ação dos anos 80 e 90 - e com muitos méritos eu diria! Então se você viveu esses anos dourados do cinema de gênero e gostou de "obras-primas" como "Con Air", "A Outra Face", "A Força em Alerta", etc; pode ter certeza que você vai se amarrar em "Alerta Máximo" e ainda colocar o ator escocês Gerard Butler naquela prateleira que poucos tem a honra de estar!

Vale muito a pena!

Assista Agora

Anônimo

Se você gostou de "Breaking Bad", pode dar o play com a mais absoluta certeza, pois você vai amar "Nobody" (título original de "Anônimo" e que, cá entre nós, faz muito mais sentido que o título nacional). Seguindo a cartilha narrativa (e não visual) do Vince Gilligan, o filme é uma mistura perfeita de gêneros, cirurgicamente equilibrados entre as excelentes sequências de ação (bastante intensas, eu diria), aquele toque de humor quase sádico, além, é claro, de um drama de personagem cheio de camadas que, por incrível que pareça, colocam o filme em outro patamar - aliás aqui, de fato, temos uma experiência cinematográfica completa e que certamente agradará muita gente!

O roteiro, escrito por Derek Kolstad, o mesmo criador de "John Wick", acompanha a história de Hutch Mansell (Bob Odenkirk), um pacato pai e marido que sempre arca com as injustiças da vida, sem revidar. Quando dois ladrões invadem sua casa, Hutch se recusa a defender a si mesmo e sua família na esperança de evitar qualquer violência - o que acaba desapontando seu filho por sua passividade e, para ele, covardia. As consequências do incidente, no entanto, acabam despertando uma raiva latente em Hutch, desencadeando instintos adormecidos e impulsionando-o em um caminho brutal que irá trazer à tona segredos sombrios e habilidades letais de seu passado. Confira o trailer:

Obviamente que as referências de Gilligan vão além do processo de redenção e da transformação de seu personagem em algo muito maior do que a própria sociedade (daquele universo) estaria disposta a reconhecer - o filme traz o rosto conhecido de Odenkirk (o eterno Jimmy McGill) que oferece uma performance impressionante, mostrando uma versatilidade surpreendente. Ele é capaz de transitar habilmente entre os momentos de ação explosiva com as passagens mais introspectivas, que expõem sua vulnerabilidade emocional, adicionando profundidade ao personagem e fazendo com que nos importemos com sua jornada logo de cara. Além de Odenkirk, o elenco de apoio também merece elogios - o destaque, para mim, fica com Christopher Lloyd, o pai de Hutch, um personagem carismático e cheio de camadas que vai te surpreender..

A direção de Ilya Naishuller é outro ponto que merece muitos elogios - e se aqui ele não mostra a mesma capacidade criativa de Gilligan, certamente ele impõe sua identidade com uma tocada ágil e precisa, garantindo que as cenas de ação sejam realizadas de forma magistral. As sequências de luta são coreografadas de uma maneira quase realista, porém muito brutal, ou seja, Naishuller não se apoia em exageros desnecessários, porém nos mantém envolvidos visualmente com aquele toque "filme de herói" das cenas. A fotografia de Pawel Pogorzelski (de "Fresh") e a trilha sonora de David Buckley (de "Destruição Final") merecem sua atenção - reparem como tudo contribui para a construção de uma atmosfera tensa, potencializando nossa imersão de uma forma impressionante..

Veja, embora priorize a ação, "Anônimo" não é apenas um festival de pancadarias. Ele aborda temas mais profundos e sensíveis, como o valor que a identidade pode ter para um ser humano mesmo com as marcas do arrependimento e a necessidade da redenção para encontrar seu lugar de paz. Tudo isso sem soar pretensioso demais para um filme de pouco mais de 90 minutos, onde através da jornada interna de seu protagonista, somos provocados a refletir sobre o real significado da vida e o impacto de nossas escolhas em nós e nos que estão ao nosso redor.

Vale muito o seu play!

Assista Agora

Se você gostou de "Breaking Bad", pode dar o play com a mais absoluta certeza, pois você vai amar "Nobody" (título original de "Anônimo" e que, cá entre nós, faz muito mais sentido que o título nacional). Seguindo a cartilha narrativa (e não visual) do Vince Gilligan, o filme é uma mistura perfeita de gêneros, cirurgicamente equilibrados entre as excelentes sequências de ação (bastante intensas, eu diria), aquele toque de humor quase sádico, além, é claro, de um drama de personagem cheio de camadas que, por incrível que pareça, colocam o filme em outro patamar - aliás aqui, de fato, temos uma experiência cinematográfica completa e que certamente agradará muita gente!

O roteiro, escrito por Derek Kolstad, o mesmo criador de "John Wick", acompanha a história de Hutch Mansell (Bob Odenkirk), um pacato pai e marido que sempre arca com as injustiças da vida, sem revidar. Quando dois ladrões invadem sua casa, Hutch se recusa a defender a si mesmo e sua família na esperança de evitar qualquer violência - o que acaba desapontando seu filho por sua passividade e, para ele, covardia. As consequências do incidente, no entanto, acabam despertando uma raiva latente em Hutch, desencadeando instintos adormecidos e impulsionando-o em um caminho brutal que irá trazer à tona segredos sombrios e habilidades letais de seu passado. Confira o trailer:

Obviamente que as referências de Gilligan vão além do processo de redenção e da transformação de seu personagem em algo muito maior do que a própria sociedade (daquele universo) estaria disposta a reconhecer - o filme traz o rosto conhecido de Odenkirk (o eterno Jimmy McGill) que oferece uma performance impressionante, mostrando uma versatilidade surpreendente. Ele é capaz de transitar habilmente entre os momentos de ação explosiva com as passagens mais introspectivas, que expõem sua vulnerabilidade emocional, adicionando profundidade ao personagem e fazendo com que nos importemos com sua jornada logo de cara. Além de Odenkirk, o elenco de apoio também merece elogios - o destaque, para mim, fica com Christopher Lloyd, o pai de Hutch, um personagem carismático e cheio de camadas que vai te surpreender..

A direção de Ilya Naishuller é outro ponto que merece muitos elogios - e se aqui ele não mostra a mesma capacidade criativa de Gilligan, certamente ele impõe sua identidade com uma tocada ágil e precisa, garantindo que as cenas de ação sejam realizadas de forma magistral. As sequências de luta são coreografadas de uma maneira quase realista, porém muito brutal, ou seja, Naishuller não se apoia em exageros desnecessários, porém nos mantém envolvidos visualmente com aquele toque "filme de herói" das cenas. A fotografia de Pawel Pogorzelski (de "Fresh") e a trilha sonora de David Buckley (de "Destruição Final") merecem sua atenção - reparem como tudo contribui para a construção de uma atmosfera tensa, potencializando nossa imersão de uma forma impressionante..

Veja, embora priorize a ação, "Anônimo" não é apenas um festival de pancadarias. Ele aborda temas mais profundos e sensíveis, como o valor que a identidade pode ter para um ser humano mesmo com as marcas do arrependimento e a necessidade da redenção para encontrar seu lugar de paz. Tudo isso sem soar pretensioso demais para um filme de pouco mais de 90 minutos, onde através da jornada interna de seu protagonista, somos provocados a refletir sobre o real significado da vida e o impacto de nossas escolhas em nós e nos que estão ao nosso redor.

Vale muito o seu play!

Assista Agora

Anticristo

"Anticristo" é um filme do diretor dinamarquês Lars Von Trier (Dogville) e somente por isso fico a vontade em fazer duas afirmações: é um dos filme mais fortes e perturbadores que eu já recomendei por aqui e, por consequência, é também uma aula de cinema - mas isso vou explicar melhor logo mais a frente!

O filme conta a história de um casal devastado pela morte do seu único filho, que se mudam para uma casa no meio de uma floresta para tentar superar esse episódio profundamente traumático. Acontece que os questionamentos do marido, um psicanalista (cujo personagem não tem nome propositalmente e é interpretado pelo excelente Willem Dafoe), começam a abalar qualquer tentativa de reaproximação do casal - as reflexões sobre a dor do luto e o reflexo em sua esposa (Charlotte Gainsbourg) desencadeiam uma espiral de acontecimentos misteriosos e assustadores onde as consequências dessa jornada psicológica se transformam no pior pesadelo que uma pessoa poderia vivenciar! 

Pois bem, vamos retomar à primeira afirmação que fiz no inicio do texto: o filme é difícil de assistir! O tema é extremamente polêmico e a forma com que o diretor (e também roteirista) escolhe para nos mostrar as sequências dos fatos é tão explícita e sem o menor pudor que chega a embrulhar o estômago - e isso é uma das marcas de Von Trier, portanto, então se você não se identifica com o diretor, esqueça, não dê o play, porque você vai se chocar! 

O roteiro fortalece uma história que poderia ser considerada uma espécie de tratado psicanalítico digno de doutorado - são signos e metáforas que constroem uma trama que nos remete à inúmeras sensações, muitas delas não tão agradáveis. Admito que não foi fácil o caminho até o final, então fortaleço meu conselho: se você não tem estômago, fuja! Agora, se a idéia é encarar as quase duas horas do filme, se prepare para ver um primor de direção - e um convite para uma experiencia extremamente sensorial e propositalmente desconfortável. Como cinema, os enquadramentos são lindos, a fotografia do diretor Anthony Dod Mantle (vencedor do Oscar em 2009 por "Quem quer ser um Milionário?") é linda, a trilha sonora do também dinamarquês, Kristian Eidnes Andersen, é genial.

É preciso ressaltar que Lars Von Trier foi capaz de contar uma história densa com uma técnica ímpar - quando começa o “prólogo” em PB (preto e branco), rodando em 60, 120 quadros por segundo (mais lento), mas com uma intensidade que vai além da velocidade de captação da câmera, alternando planos abertos com super closes ao som de uma trilha bastante intimista, nossa, é para ver e rever - por isso da minha segunda afirmação! Quando retomamos a história, que inteligentemente é dividida em 4 atos, percebemos uma progressão na narrativa contada pela fotografia, pelos movimentos, pelos enquadramentos, que é genial! Repare! As performances dos protagonistas, Willem Dafoe e Charlotte Gainsbourg, também merece destaque - são viscerais e apoiadas em muita técnica. Lindo de ver e difícil de digerir!

Certamente não é um filme que diverte, que vai agradar a um público muito pequeno, mas garanto que é um filme que ensina muito! Indico com todas as ressalvas que o texto pontuou!

Assista Agora

"Anticristo" é um filme do diretor dinamarquês Lars Von Trier (Dogville) e somente por isso fico a vontade em fazer duas afirmações: é um dos filme mais fortes e perturbadores que eu já recomendei por aqui e, por consequência, é também uma aula de cinema - mas isso vou explicar melhor logo mais a frente!

O filme conta a história de um casal devastado pela morte do seu único filho, que se mudam para uma casa no meio de uma floresta para tentar superar esse episódio profundamente traumático. Acontece que os questionamentos do marido, um psicanalista (cujo personagem não tem nome propositalmente e é interpretado pelo excelente Willem Dafoe), começam a abalar qualquer tentativa de reaproximação do casal - as reflexões sobre a dor do luto e o reflexo em sua esposa (Charlotte Gainsbourg) desencadeiam uma espiral de acontecimentos misteriosos e assustadores onde as consequências dessa jornada psicológica se transformam no pior pesadelo que uma pessoa poderia vivenciar! 

Pois bem, vamos retomar à primeira afirmação que fiz no inicio do texto: o filme é difícil de assistir! O tema é extremamente polêmico e a forma com que o diretor (e também roteirista) escolhe para nos mostrar as sequências dos fatos é tão explícita e sem o menor pudor que chega a embrulhar o estômago - e isso é uma das marcas de Von Trier, portanto, então se você não se identifica com o diretor, esqueça, não dê o play, porque você vai se chocar! 

O roteiro fortalece uma história que poderia ser considerada uma espécie de tratado psicanalítico digno de doutorado - são signos e metáforas que constroem uma trama que nos remete à inúmeras sensações, muitas delas não tão agradáveis. Admito que não foi fácil o caminho até o final, então fortaleço meu conselho: se você não tem estômago, fuja! Agora, se a idéia é encarar as quase duas horas do filme, se prepare para ver um primor de direção - e um convite para uma experiencia extremamente sensorial e propositalmente desconfortável. Como cinema, os enquadramentos são lindos, a fotografia do diretor Anthony Dod Mantle (vencedor do Oscar em 2009 por "Quem quer ser um Milionário?") é linda, a trilha sonora do também dinamarquês, Kristian Eidnes Andersen, é genial.

É preciso ressaltar que Lars Von Trier foi capaz de contar uma história densa com uma técnica ímpar - quando começa o “prólogo” em PB (preto e branco), rodando em 60, 120 quadros por segundo (mais lento), mas com uma intensidade que vai além da velocidade de captação da câmera, alternando planos abertos com super closes ao som de uma trilha bastante intimista, nossa, é para ver e rever - por isso da minha segunda afirmação! Quando retomamos a história, que inteligentemente é dividida em 4 atos, percebemos uma progressão na narrativa contada pela fotografia, pelos movimentos, pelos enquadramentos, que é genial! Repare! As performances dos protagonistas, Willem Dafoe e Charlotte Gainsbourg, também merece destaque - são viscerais e apoiadas em muita técnica. Lindo de ver e difícil de digerir!

Certamente não é um filme que diverte, que vai agradar a um público muito pequeno, mas garanto que é um filme que ensina muito! Indico com todas as ressalvas que o texto pontuou!

Assista Agora

As Flores Perdidas de Alice Hart

"As Flores Perdidas de Alice Hart" é daquelas minisséries que você se pergunta: por que não assisti isso antes? É sério, que espetáculo de roteiro! Lançada em 2023 pela Prime Video, "As Flores Perdidas de Alice Hart"é um drama profundo que transita pelas nuances do trauma e do luto em uma atmosfera de muito mistério, onde a busca pela cura em meio à beleza e ao simbolismo das flores transforma nossa jornada em uma experiência das mais envolventes e surpreendentes. Criada por Sarah Lambert e baseada no romance homônimo de Holly Ringland, a produção é dirigida por Glendyn Ivin (do excelente "Em Prantos") e apresenta uma narrativa que, assim como "Big Little Lies" e "Sharp Objects", parte dos fantasmas mais íntimos para explorar questões delicadas como violência doméstica, laços familiares e autodescoberta.

A história acompanha Alice Hart (interpretada por Alycia Debnam-Carey na fase adulta e por Alyla Browne na infância), uma jovem que perde os pais em um incêndio traumático. Depois da tragédia, Alice vai morar com sua avó June (Sigourney Weaver) em uma fazenda remota chamada Thornfield, onde flores nativas são cultivadas e utilizadas para expressar sentimentos que palavras não conseguem transmitir. Ao longo dos anos, Alice descobre segredos obscuros sobre sua família e enfrenta os próprios demônios enquanto busca um caminho para a cura e para uma liberdade emocional. Confira o trailer (em inglês):

Mesmo que soe cadenciada em um primeiro momento, a narrativa proposta pela Sarah Lambert é muito fiel ao espírito da obra de Ringland, equilibrando a exploração emocional com o mistério que envolve os segredos familiares da protagonista. O roteiro é construída de forma não linear, utilizando a quebra temporal para revelar gradualmente as conexões entre alguns personagens - é essa estrutura que nos mantém intrigados, enquanto somos provocados a olhar por diversas perspectivas na busca por uma compreensão mais profunda das motivações e escolhas que moldam a trajetória de Alice. É aqui que entra a direção de Glendyn Ivin - sua sensibilidade e habilidade para construir momentos de introspecção através de uma narrativa visualmente rica, é de se aplaudir de pé. Já no primeiro episódio, mesmo com momentos realmente impactantes,  temos a exata noção de que estamos diante de um profissional capaz de traduzir sensações em uma certa poesia visual - algo como o saudoso Jean-Marc Vallée fazia com maestria. 

A fotografia de "As Flores Perdidas de Alice Hart" também chama atenção. O trabalho do Sam Chiplin (parceiro de Ivin em "Em Prantos") captura a beleza das paisagens australianas e das flores que servem como metáfora para as emoções dos personagens, de uma forma magnifica. A diversidade da paleta de cores e toda iluminação são cuidadosamente trabalhadas, refletindo tanto a serenidade quanto a tensão que permeiam a história. As flores e seu simbolismo, sem dúvida, funcionam como um elemento narrativo poderoso, adicionando profundidade e significado para a jornada. Alycia Debnam-Carey sabe transformar essa atmosfera semiótica, sutil e poderosa, em energia para sua Alice - repare como ela transmite a complexidade de sua personagem na luta para superar o passado e encontrar seu próprio lugar no mundo. Sigourney Weaver também entrega uma performance que merece destaque - contida e intensa, ela vai revelando as camadas de uma mulher forte, mas que é cheia de falhas e que carrega o peso dos segredos e das decisões difíceis que já teve que tomar. A química entre as duas, aliás, é essencial para dar o tom do relacionamento conturbado entre avó e neta. E rapidamente cito Alyla Browne, a Alice na infância - que atuação sensível e comovente. Olho nessa garota!

"As Flores Perdidas de Alice Hart" não tem medo de confrontar a dor e a complexidade das relações familiares, explorando o peso do trauma e como ele pode ser transmitido de geração em geração. Embora muitas vezes densa demais, a narrativa também oferece momentos de esperança, mostrando que é possível encontrar um certo significado mesmo em meio à escuridão. Se seu ritmo pode soar lento e introspectivo demais, entenda que é essa escolha conceitual que traz a profundidade emocional que a história merece. O que eu quero dizer é que estamos diante de uma minissérie diferente, visualmente deslumbrante e emocionalmente profunda, que sabe explorar as obscuridades da vida, pontuando perfeitamente o valor da resiliência e da autodescoberta como forma de sobrevivência sem esquecer da importância da sororidade.  

Imperdível! 

Assista Agora

"As Flores Perdidas de Alice Hart" é daquelas minisséries que você se pergunta: por que não assisti isso antes? É sério, que espetáculo de roteiro! Lançada em 2023 pela Prime Video, "As Flores Perdidas de Alice Hart"é um drama profundo que transita pelas nuances do trauma e do luto em uma atmosfera de muito mistério, onde a busca pela cura em meio à beleza e ao simbolismo das flores transforma nossa jornada em uma experiência das mais envolventes e surpreendentes. Criada por Sarah Lambert e baseada no romance homônimo de Holly Ringland, a produção é dirigida por Glendyn Ivin (do excelente "Em Prantos") e apresenta uma narrativa que, assim como "Big Little Lies" e "Sharp Objects", parte dos fantasmas mais íntimos para explorar questões delicadas como violência doméstica, laços familiares e autodescoberta.

A história acompanha Alice Hart (interpretada por Alycia Debnam-Carey na fase adulta e por Alyla Browne na infância), uma jovem que perde os pais em um incêndio traumático. Depois da tragédia, Alice vai morar com sua avó June (Sigourney Weaver) em uma fazenda remota chamada Thornfield, onde flores nativas são cultivadas e utilizadas para expressar sentimentos que palavras não conseguem transmitir. Ao longo dos anos, Alice descobre segredos obscuros sobre sua família e enfrenta os próprios demônios enquanto busca um caminho para a cura e para uma liberdade emocional. Confira o trailer (em inglês):

Mesmo que soe cadenciada em um primeiro momento, a narrativa proposta pela Sarah Lambert é muito fiel ao espírito da obra de Ringland, equilibrando a exploração emocional com o mistério que envolve os segredos familiares da protagonista. O roteiro é construída de forma não linear, utilizando a quebra temporal para revelar gradualmente as conexões entre alguns personagens - é essa estrutura que nos mantém intrigados, enquanto somos provocados a olhar por diversas perspectivas na busca por uma compreensão mais profunda das motivações e escolhas que moldam a trajetória de Alice. É aqui que entra a direção de Glendyn Ivin - sua sensibilidade e habilidade para construir momentos de introspecção através de uma narrativa visualmente rica, é de se aplaudir de pé. Já no primeiro episódio, mesmo com momentos realmente impactantes,  temos a exata noção de que estamos diante de um profissional capaz de traduzir sensações em uma certa poesia visual - algo como o saudoso Jean-Marc Vallée fazia com maestria. 

A fotografia de "As Flores Perdidas de Alice Hart" também chama atenção. O trabalho do Sam Chiplin (parceiro de Ivin em "Em Prantos") captura a beleza das paisagens australianas e das flores que servem como metáfora para as emoções dos personagens, de uma forma magnifica. A diversidade da paleta de cores e toda iluminação são cuidadosamente trabalhadas, refletindo tanto a serenidade quanto a tensão que permeiam a história. As flores e seu simbolismo, sem dúvida, funcionam como um elemento narrativo poderoso, adicionando profundidade e significado para a jornada. Alycia Debnam-Carey sabe transformar essa atmosfera semiótica, sutil e poderosa, em energia para sua Alice - repare como ela transmite a complexidade de sua personagem na luta para superar o passado e encontrar seu próprio lugar no mundo. Sigourney Weaver também entrega uma performance que merece destaque - contida e intensa, ela vai revelando as camadas de uma mulher forte, mas que é cheia de falhas e que carrega o peso dos segredos e das decisões difíceis que já teve que tomar. A química entre as duas, aliás, é essencial para dar o tom do relacionamento conturbado entre avó e neta. E rapidamente cito Alyla Browne, a Alice na infância - que atuação sensível e comovente. Olho nessa garota!

"As Flores Perdidas de Alice Hart" não tem medo de confrontar a dor e a complexidade das relações familiares, explorando o peso do trauma e como ele pode ser transmitido de geração em geração. Embora muitas vezes densa demais, a narrativa também oferece momentos de esperança, mostrando que é possível encontrar um certo significado mesmo em meio à escuridão. Se seu ritmo pode soar lento e introspectivo demais, entenda que é essa escolha conceitual que traz a profundidade emocional que a história merece. O que eu quero dizer é que estamos diante de uma minissérie diferente, visualmente deslumbrante e emocionalmente profunda, que sabe explorar as obscuridades da vida, pontuando perfeitamente o valor da resiliência e da autodescoberta como forma de sobrevivência sem esquecer da importância da sororidade.  

Imperdível! 

Assista Agora

Assassinos da Lua das Flores

Martin Scorsese é um dos maiores cineastas da história do cinema - isso não há como negar. Com uma carreira de mais de 50 anos, ele já dirigiu alguns dos filmes mais importantes e aclamados de todos os tempos, como "Taxi Driver", "Os Bons Companheiros", "Cassino" e "A Invenção de Hugo Cabret", só para citar os clássicos. Scorsese já foi indicado 9 vezes ao Oscar de  "Melhor Diretor" e venceu por "Os Infiltrados". De fato um currículo de respeito e é certamente por isso que nos propomos a assistir mais de três horas e meia de seu mais recente trabalho, o drama "Assassinos da Lua das Flores". Olha, o filme é realmente muito bom, dos melhores de sua carreira como diretor, mas meu amigo, é longo demais! Será preciso uma dose extra de empolgação para encarar essa jornada, mesmo sabendo que a qualidade técnica e artística é tão alta que nem vemos o tempo passar. "Assassinos da Lua das Flores" é mais uma prova do talento e da maestria de Scorsese, mas como uma minissérie, a experiência seria bem menos cansativa. 

Baseado no livro homônimo de David Grann, "Assassinos da Lua das Flores" conta a história real de uma série de assassinatos misteriosos que ocorreram na década de 1920 na tribo indígena Osage, no estado americano de Oklahoma. Os Osage eram donos de terras ricas em petróleo, e suas mortes levantaram suspeitas de que poderiam ter sido encomendadas por pessoas que queriam se apoderar de suas riquezas, especialmente William Hale (Robert De Niro). Confira o trailer:

Produzido pela AppleTV+ e estrelado por Leonardo DiCaprio, Jesse Plemons, Robert De Niro e Lily Gladstone, "Assassinos da Lua das Flores" tem todos os elementos que fazem os olhos dos votantes do Oscar brilhar. Sério, o filme é de cair o queixo - pela qualidade, pelo tamanho da produção, e, claro, pela forma que Scorsese reproduziu uma atmosfera de recorrente tensão e desconfiança, em pleno anos 20, com tanta perfeição. Você analisa os detalhes, destrincha o roteiro, repara em tudo e não encontra um vacilo sequer - é impressionante como a direção de Scorsese é impecável ao ponto de prender nossa atenção do início ao fim, em um misto de horror e poesia. Reparem como o roteiro do genial Eric Roth (vencedor do Oscar por "Forrest Gump" e indicado mais seis vezes, a última por "Duna") transita com perfeição entre a ganância, a vaidade e o desejo do individuo que se sobrepõe ao meio em que a história acontece - eu diria, uma espécie de faroeste macabro onde a tensão e a violência desenfreada dão o tom das relações sociais e humanas pela perspectiva de quem sofre e de quem comete crimes tão brutais.

DiCaprio interpreta Ernest Burkhart, um homem branco que se casa com uma mulher Osage, Mollie (Lily Gladstone), e se torna um dos responsáveis por articular os crimes a mando do tio William - e aqui cabe um observação sobre o texto: se inicialmente tudo fica subentendido, com o passar do tempo as motivações e ações ficam completamente escancaradas. Em nenhum momento o roteiro se propõe a seguir a sinopse, criar um mistério e gerar dúvidas - tudo é muito claro, no entanto são nas consequências intimas dos personagens que a trama ganha profundidade e reflexão (e talvez por isso o filme não tenha sido uma unanimidade). As performances dos atores são excelentes: DiCaprio dá um tom de complexidade e ambivalência ao seu Ernest que, na minha opinião, o credenciaria, no mínimo, para uma indicação ao Oscar. Já Lily Gladstone, essa vai ser a barbada do ano na categoria "Melhor Atriz", pode me cobrar depois.

Se "Assassinos da Lua das Flores" sabe explorar temas como corrupção e preconceito com certa brutalidade no seu "conteúdo", mas saiba que é na sua "forma" que o filme oferece uma visão verdadeiramente fascinante sobre aquele período turbulento da história americana. A fotografia do Rodrigo Prieto (mexicano parceiro de Alejandro G. Iñárritu e indicado cinco vezes ao Oscar) e a trilha sonora de Robbie Robertson (de "O Irlandês") provocam na audiência um misto de emoções que se alternam entre a tensão e a preocupação, e com aquela típica frieza do diretor, narra visualmente um banho de sangue étnico, com suas consequências sociais e impactos psicológicos, de um jeito onde o cinema parece funcionar, mais uma vez, como uma janela para muito do que acontece nos dias de hoje ao redor do nosso planeta.

Obrigado Scorsese!

Vale muito o play. Vale muito a reflexão!

Assista Agora

Martin Scorsese é um dos maiores cineastas da história do cinema - isso não há como negar. Com uma carreira de mais de 50 anos, ele já dirigiu alguns dos filmes mais importantes e aclamados de todos os tempos, como "Taxi Driver", "Os Bons Companheiros", "Cassino" e "A Invenção de Hugo Cabret", só para citar os clássicos. Scorsese já foi indicado 9 vezes ao Oscar de  "Melhor Diretor" e venceu por "Os Infiltrados". De fato um currículo de respeito e é certamente por isso que nos propomos a assistir mais de três horas e meia de seu mais recente trabalho, o drama "Assassinos da Lua das Flores". Olha, o filme é realmente muito bom, dos melhores de sua carreira como diretor, mas meu amigo, é longo demais! Será preciso uma dose extra de empolgação para encarar essa jornada, mesmo sabendo que a qualidade técnica e artística é tão alta que nem vemos o tempo passar. "Assassinos da Lua das Flores" é mais uma prova do talento e da maestria de Scorsese, mas como uma minissérie, a experiência seria bem menos cansativa. 

Baseado no livro homônimo de David Grann, "Assassinos da Lua das Flores" conta a história real de uma série de assassinatos misteriosos que ocorreram na década de 1920 na tribo indígena Osage, no estado americano de Oklahoma. Os Osage eram donos de terras ricas em petróleo, e suas mortes levantaram suspeitas de que poderiam ter sido encomendadas por pessoas que queriam se apoderar de suas riquezas, especialmente William Hale (Robert De Niro). Confira o trailer:

Produzido pela AppleTV+ e estrelado por Leonardo DiCaprio, Jesse Plemons, Robert De Niro e Lily Gladstone, "Assassinos da Lua das Flores" tem todos os elementos que fazem os olhos dos votantes do Oscar brilhar. Sério, o filme é de cair o queixo - pela qualidade, pelo tamanho da produção, e, claro, pela forma que Scorsese reproduziu uma atmosfera de recorrente tensão e desconfiança, em pleno anos 20, com tanta perfeição. Você analisa os detalhes, destrincha o roteiro, repara em tudo e não encontra um vacilo sequer - é impressionante como a direção de Scorsese é impecável ao ponto de prender nossa atenção do início ao fim, em um misto de horror e poesia. Reparem como o roteiro do genial Eric Roth (vencedor do Oscar por "Forrest Gump" e indicado mais seis vezes, a última por "Duna") transita com perfeição entre a ganância, a vaidade e o desejo do individuo que se sobrepõe ao meio em que a história acontece - eu diria, uma espécie de faroeste macabro onde a tensão e a violência desenfreada dão o tom das relações sociais e humanas pela perspectiva de quem sofre e de quem comete crimes tão brutais.

DiCaprio interpreta Ernest Burkhart, um homem branco que se casa com uma mulher Osage, Mollie (Lily Gladstone), e se torna um dos responsáveis por articular os crimes a mando do tio William - e aqui cabe um observação sobre o texto: se inicialmente tudo fica subentendido, com o passar do tempo as motivações e ações ficam completamente escancaradas. Em nenhum momento o roteiro se propõe a seguir a sinopse, criar um mistério e gerar dúvidas - tudo é muito claro, no entanto são nas consequências intimas dos personagens que a trama ganha profundidade e reflexão (e talvez por isso o filme não tenha sido uma unanimidade). As performances dos atores são excelentes: DiCaprio dá um tom de complexidade e ambivalência ao seu Ernest que, na minha opinião, o credenciaria, no mínimo, para uma indicação ao Oscar. Já Lily Gladstone, essa vai ser a barbada do ano na categoria "Melhor Atriz", pode me cobrar depois.

Se "Assassinos da Lua das Flores" sabe explorar temas como corrupção e preconceito com certa brutalidade no seu "conteúdo", mas saiba que é na sua "forma" que o filme oferece uma visão verdadeiramente fascinante sobre aquele período turbulento da história americana. A fotografia do Rodrigo Prieto (mexicano parceiro de Alejandro G. Iñárritu e indicado cinco vezes ao Oscar) e a trilha sonora de Robbie Robertson (de "O Irlandês") provocam na audiência um misto de emoções que se alternam entre a tensão e a preocupação, e com aquela típica frieza do diretor, narra visualmente um banho de sangue étnico, com suas consequências sociais e impactos psicológicos, de um jeito onde o cinema parece funcionar, mais uma vez, como uma janela para muito do que acontece nos dias de hoje ao redor do nosso planeta.

Obrigado Scorsese!

Vale muito o play. Vale muito a reflexão!

Assista Agora

Ataque dos Cães

"Ataque dos Cães" é um filme essencialmente sobre vingança e que tem como seu maior mérito criar um clima de tensão permanente, onde em minuto algum sabemos exatamente o que vai acontecer ou qual será o gatilho para que todas aquelas relações desmoronem - e aqui cabe meu primeiro elogio: é impressionante como a diretora  (e roteirista) Jane Campion, vencedora do Oscar por "O Piano", consegue manter essa sensação de angústia durante toda trama, sem perder o controle, mesmo com uma narrativa completamente cadenciada e reflexiva pelo ponto de vista de quatro personagens-chave. É, de fato, incrível!

O filme conta a história de Phil (Benedict Cumberbatch) e George (Jesse Plemons), dois irmãos, ricos e proprietários da maior fazenda de Montana em plena década de 1920. Enquanto o primeiro é brilhante, mas cruel, o segundo é a gentileza em pessoa. Tão diferentes, a relação de cumplicidade entre os dois vai do céu ao inferno quando George se casa secretamente com uma viúva local, Rose (Kirsten Dunst), e ainda resolve cuidar do seu filho Peter (Kodi Smit-McPhee), um jovem introspectivo e profundamente marcado pelo suicídio do pai. Invejoso, inseguro e solitário, Phil tenta de todas as formas fazer com que essa relação não se sustente dentro do seu ambiente, fazendo com que suas atitudes machistas e seu comportamento rústico vá minando, pouco a pouco, a tranquilidade de Rose e de Peter. Confira o trailer:

"The Power of the Dog" é o livro que originou "Ataque dos Cães". Ele foi lançado em 1967 pelo autor Thomas Savage - que é uma referência dentro do gênero literário de Faroeste e que teve inúmeras obras publicadas entre 1944 e 1988. Pois bem, o desafio dessa adaptação de Campion era justamente o de trazer para a tela uma proposta muito mais intimista do que estamos acostumados assistir no gênero e isso era considerado um risco - é por essa razão que todas as tentativas de adaptar o livro para o cinema falharam até aqui.

Com o sinal verde da Netflix, que aposta (e com razão) no reconhecimento da Academia no Oscar de 2022, Campion montou um verdadeiro dream team para surpreender aqueles não buscariam em um "faroeste", um drama de relações tão profundo como esse. Obviamente que todos os elementos visuais que o gênero pede estão impecáveis no filme: de uma fotografia maravilhosa da diretora Ari Wegner (de "Lady Macbeth") ao cenário primoroso de Grant Major (de "Senhor dos Anéis - O Retorno do Rei"), passando pelos lindos figurinos de Kirsty Cameron (de "Oeste sem Lei") e, claro, pela trilha sonora marcante e essencial para o conceito narrativo funcionar, de Jonny Greenwood (indicado ao Oscar por "Trama Fantasma").

Jane Campion tem como característica um cuidado quase patológico com os detalhes para que seus filmes se tornem uma experiência totalmente sensorial. Em "Ataque dos Cães" ela alinha o artístico e o técnico perfeitamente, praticamente quebrando qualquer barreira que separe esses elementos, trazendo para o nosso olhar, enquadramentos de objetos, mãos e reações, de uma forma tão orgânica que chegamos a sentir arrepios com sua precisão. Reparem que, por mais discretos ou mesmo secretos que sejam, nenhum detalhe escapa e o desenho de som (apoiado na trilha sonora) só potencializa essa percepção de que tudo faz sentido, mesmo que quase nunca seja explicado (as revistas de fisiculturismo que Peter encontra é um ótimo exemplo disso e, certamente, o final também). 

"Ataque dos Cães" pode colocar Benedict Cumberbatch em uma prateleira de ainda mais destaque, embora todo o elenco principal seja vital para isso - e não me surpreenderia se todos eles ganharem muitas indicações na próxima temporada de premiações, inclusive no Oscar. Acontece que o veredito, depois de mais de duas horas de filme, vai muito além do que imaginamos como trama, já que precisamos de alguns minutos para processar tudo que assistimos. Se a discussão sobre as relações de poder e a repressão dos desejos mais íntimos são categorizados como uma visão de masculinidade problemática enraizada na sociedade, pode ter certeza que o contraponto também está lá e será percebido naquele último suspiro antes dos créditos.

Vale muito a pena!

Up-date: "Ataque dos Cães" foi indicado em doze categorias no Oscar 2022, mas levou apenas como Melhor Direção! 

Assista Agora

"Ataque dos Cães" é um filme essencialmente sobre vingança e que tem como seu maior mérito criar um clima de tensão permanente, onde em minuto algum sabemos exatamente o que vai acontecer ou qual será o gatilho para que todas aquelas relações desmoronem - e aqui cabe meu primeiro elogio: é impressionante como a diretora  (e roteirista) Jane Campion, vencedora do Oscar por "O Piano", consegue manter essa sensação de angústia durante toda trama, sem perder o controle, mesmo com uma narrativa completamente cadenciada e reflexiva pelo ponto de vista de quatro personagens-chave. É, de fato, incrível!

O filme conta a história de Phil (Benedict Cumberbatch) e George (Jesse Plemons), dois irmãos, ricos e proprietários da maior fazenda de Montana em plena década de 1920. Enquanto o primeiro é brilhante, mas cruel, o segundo é a gentileza em pessoa. Tão diferentes, a relação de cumplicidade entre os dois vai do céu ao inferno quando George se casa secretamente com uma viúva local, Rose (Kirsten Dunst), e ainda resolve cuidar do seu filho Peter (Kodi Smit-McPhee), um jovem introspectivo e profundamente marcado pelo suicídio do pai. Invejoso, inseguro e solitário, Phil tenta de todas as formas fazer com que essa relação não se sustente dentro do seu ambiente, fazendo com que suas atitudes machistas e seu comportamento rústico vá minando, pouco a pouco, a tranquilidade de Rose e de Peter. Confira o trailer:

"The Power of the Dog" é o livro que originou "Ataque dos Cães". Ele foi lançado em 1967 pelo autor Thomas Savage - que é uma referência dentro do gênero literário de Faroeste e que teve inúmeras obras publicadas entre 1944 e 1988. Pois bem, o desafio dessa adaptação de Campion era justamente o de trazer para a tela uma proposta muito mais intimista do que estamos acostumados assistir no gênero e isso era considerado um risco - é por essa razão que todas as tentativas de adaptar o livro para o cinema falharam até aqui.

Com o sinal verde da Netflix, que aposta (e com razão) no reconhecimento da Academia no Oscar de 2022, Campion montou um verdadeiro dream team para surpreender aqueles não buscariam em um "faroeste", um drama de relações tão profundo como esse. Obviamente que todos os elementos visuais que o gênero pede estão impecáveis no filme: de uma fotografia maravilhosa da diretora Ari Wegner (de "Lady Macbeth") ao cenário primoroso de Grant Major (de "Senhor dos Anéis - O Retorno do Rei"), passando pelos lindos figurinos de Kirsty Cameron (de "Oeste sem Lei") e, claro, pela trilha sonora marcante e essencial para o conceito narrativo funcionar, de Jonny Greenwood (indicado ao Oscar por "Trama Fantasma").

Jane Campion tem como característica um cuidado quase patológico com os detalhes para que seus filmes se tornem uma experiência totalmente sensorial. Em "Ataque dos Cães" ela alinha o artístico e o técnico perfeitamente, praticamente quebrando qualquer barreira que separe esses elementos, trazendo para o nosso olhar, enquadramentos de objetos, mãos e reações, de uma forma tão orgânica que chegamos a sentir arrepios com sua precisão. Reparem que, por mais discretos ou mesmo secretos que sejam, nenhum detalhe escapa e o desenho de som (apoiado na trilha sonora) só potencializa essa percepção de que tudo faz sentido, mesmo que quase nunca seja explicado (as revistas de fisiculturismo que Peter encontra é um ótimo exemplo disso e, certamente, o final também). 

"Ataque dos Cães" pode colocar Benedict Cumberbatch em uma prateleira de ainda mais destaque, embora todo o elenco principal seja vital para isso - e não me surpreenderia se todos eles ganharem muitas indicações na próxima temporada de premiações, inclusive no Oscar. Acontece que o veredito, depois de mais de duas horas de filme, vai muito além do que imaginamos como trama, já que precisamos de alguns minutos para processar tudo que assistimos. Se a discussão sobre as relações de poder e a repressão dos desejos mais íntimos são categorizados como uma visão de masculinidade problemática enraizada na sociedade, pode ter certeza que o contraponto também está lá e será percebido naquele último suspiro antes dos créditos.

Vale muito a pena!

Up-date: "Ataque dos Cães" foi indicado em doze categorias no Oscar 2022, mas levou apenas como Melhor Direção! 

Assista Agora

Até os Ossos

Olha, "Até os Ossos" não é nada fácil e justamente por isso deve dividir opiniões - até pela zona um pouco cinzenta por onde ele transita, entre um profundo drama de relações e um suspense com boa dose de realismo. O filme dirigido por Luca Guadagnino (de "Me Chame pelo Seu Nome), mergulha, sem receios, nas complexidades da condição humana, explorando dois temas bastante sensíveis: o primeiro, identidade; o segundo, muito chocante, canibalismo. Com uma abordagem visceral e perturbadora, o filme nos desafia a confrontar nossas próprias noções de existência e a questionar o "diferente" por um olhar mais íntimo - mas cuidado: você pode se impressionar com as cenas que você vai assistir ao dar o play.

Assombrada por um instinto que é incapaz de controlar, a jovem Maren Yearly (Taylor Russell) embarca em uma jornada em busca de suas raízes após ceder a um novo ataque canibal. No caminho, ela encontra o misterioso Lee (Timothée Chalamet), que demonstra padecer do mesmo problema. Juntos, eles percebem que a aceitação deve se sobressair à compreensão de sua verdadeira essência, e buscam por formas que autorizem a manutenção de seu relacionamento. Confira o trailer:

Talvez a melhor forma de definir "Até os Ossos" seja: um suspense com alma. Digo isso pois o roteiro escrito pelo David Kajganich (de "Suspíria: A Dança do Medo") e pela Camille DeAngelis (que criou a história) foge do lugar comum ao tentar equilibrar uma trama de certa forma simples, mas com elementos pouco explorados no cinema ao longo dos anos - embora seja inegável que o tema "canibalismo" venha ganhando cada vez mais holofotes em produções recentes. Talvez, essa ousadia do roteiro tenha encontrado uma gramática cinematográfica perfeita nas mãos de Guadagnino, já que o diretor é capaz de levar o público para uma jornada emocional e psicológica extremamente desconfortável sem se esquecer de que por trás do impacto visual, existe dores muito particulares de seus personagens - reparem como o texto transmite a vulnerabilidade e a intensidade dos personagens com a mesma precisão.

Sua direção é mais uma vez primorosa. Com uma abordagem visual arrojada, seguindo aquele estilo mais independente, com cenas de diálogos importantes resolvidas sem cortes e muita, muita, criatividade para refletir a angústia e a desconexão daquela realidade em imagens - e aqui cabe um outro elogio: o desenho de som, muitas vezes faz o mesmo papel da imagem com maestria, já que Guadagnino "sugere" e "mostra" com a igual potência. A fotografia do bielorrusso Arseni Khachaturan (de "The Idol") é marcada por imagens impactantes sim, mas também por muito simbolismo já que precisa retratar uma condição que enxerga beleza e um desejo peculiar pelo corpo humano, de uma forma completamente diferente de quem assiste - que, inclusive, sente na pele uma enorme repulsa.

Por fim é preciso destacar as performances de Russell e Chalamet. Ambos com uma entrega visceral, além de uma capacidade de se expressar e trabalhar uma gama de emoções sem usar muito das palavras - lindo de ver. Outro que merece aplausos é Mark Rylance como Sully - é incrível como ele transmite sua dor e sua frustração, ao mesmo tempo em que o olhar indica sua obsessão. Olha, digno de prêmios!

O fato é que "Bones and All" (no original) não vai ter meio termo, ou você vai amar ou vai odiar - principalmente se você levar em consideração que depois do prólogo (genial), o primeiro ato patina um pouco, deixando o segundo ato para ajustar o tom da narrativa e entregar um terceiro ato bem mais redondinho e surpreendente. Agora, também é preciso dizer que, embarcado na experiência, o filme não terá problemas em se mostrar desafiador ao mergulhar nas profundezas de uma condição humana muito desconfortável.

Se eu fosse você, eu arriscaria!  

Assista Agora

Olha, "Até os Ossos" não é nada fácil e justamente por isso deve dividir opiniões - até pela zona um pouco cinzenta por onde ele transita, entre um profundo drama de relações e um suspense com boa dose de realismo. O filme dirigido por Luca Guadagnino (de "Me Chame pelo Seu Nome), mergulha, sem receios, nas complexidades da condição humana, explorando dois temas bastante sensíveis: o primeiro, identidade; o segundo, muito chocante, canibalismo. Com uma abordagem visceral e perturbadora, o filme nos desafia a confrontar nossas próprias noções de existência e a questionar o "diferente" por um olhar mais íntimo - mas cuidado: você pode se impressionar com as cenas que você vai assistir ao dar o play.

Assombrada por um instinto que é incapaz de controlar, a jovem Maren Yearly (Taylor Russell) embarca em uma jornada em busca de suas raízes após ceder a um novo ataque canibal. No caminho, ela encontra o misterioso Lee (Timothée Chalamet), que demonstra padecer do mesmo problema. Juntos, eles percebem que a aceitação deve se sobressair à compreensão de sua verdadeira essência, e buscam por formas que autorizem a manutenção de seu relacionamento. Confira o trailer:

Talvez a melhor forma de definir "Até os Ossos" seja: um suspense com alma. Digo isso pois o roteiro escrito pelo David Kajganich (de "Suspíria: A Dança do Medo") e pela Camille DeAngelis (que criou a história) foge do lugar comum ao tentar equilibrar uma trama de certa forma simples, mas com elementos pouco explorados no cinema ao longo dos anos - embora seja inegável que o tema "canibalismo" venha ganhando cada vez mais holofotes em produções recentes. Talvez, essa ousadia do roteiro tenha encontrado uma gramática cinematográfica perfeita nas mãos de Guadagnino, já que o diretor é capaz de levar o público para uma jornada emocional e psicológica extremamente desconfortável sem se esquecer de que por trás do impacto visual, existe dores muito particulares de seus personagens - reparem como o texto transmite a vulnerabilidade e a intensidade dos personagens com a mesma precisão.

Sua direção é mais uma vez primorosa. Com uma abordagem visual arrojada, seguindo aquele estilo mais independente, com cenas de diálogos importantes resolvidas sem cortes e muita, muita, criatividade para refletir a angústia e a desconexão daquela realidade em imagens - e aqui cabe um outro elogio: o desenho de som, muitas vezes faz o mesmo papel da imagem com maestria, já que Guadagnino "sugere" e "mostra" com a igual potência. A fotografia do bielorrusso Arseni Khachaturan (de "The Idol") é marcada por imagens impactantes sim, mas também por muito simbolismo já que precisa retratar uma condição que enxerga beleza e um desejo peculiar pelo corpo humano, de uma forma completamente diferente de quem assiste - que, inclusive, sente na pele uma enorme repulsa.

Por fim é preciso destacar as performances de Russell e Chalamet. Ambos com uma entrega visceral, além de uma capacidade de se expressar e trabalhar uma gama de emoções sem usar muito das palavras - lindo de ver. Outro que merece aplausos é Mark Rylance como Sully - é incrível como ele transmite sua dor e sua frustração, ao mesmo tempo em que o olhar indica sua obsessão. Olha, digno de prêmios!

O fato é que "Bones and All" (no original) não vai ter meio termo, ou você vai amar ou vai odiar - principalmente se você levar em consideração que depois do prólogo (genial), o primeiro ato patina um pouco, deixando o segundo ato para ajustar o tom da narrativa e entregar um terceiro ato bem mais redondinho e surpreendente. Agora, também é preciso dizer que, embarcado na experiência, o filme não terá problemas em se mostrar desafiador ao mergulhar nas profundezas de uma condição humana muito desconfortável.

Se eu fosse você, eu arriscaria!  

Assista Agora

Athena

"Athena" chama muito mais atenção por sua experiência visual do que propriamente por um roteiro impecável - e isso não é um grande problema se lembrarmos de "1917", que segue justamente esse mesmo conceito (dadas as devidas proporções técnicas e de orçamento). Aqui, é possível perceber que o filme do francês Romain Gavras usa de elementos dramáticos extremamente atuais, muitos deles referenciados no grande sucesso "Os Miseráveis", de 2019, para entregar uma dinâmica focada no caos, muito mais próxima do mexicano "Nuevo Orden", inclusive.

Em um Conjunto Habitacional conhecido como Athena, um crime brutal abala toda a comunidade. A trágica história se passa na vida de três jovens, que têm os seus destinos completamente transformados quando o irmão mais novo é morto sob circunstâncias inexplicáveis. Os irmãos de origem argelina e indignados com o assassinato, dão início a uma cruzada em busca de respostas e de justiça, cada um da sua maneira. Porém os embates violentos em Athena colocam eles no centro de um conflito, obrigando-os a ressignificar o luto e a dor em uma revolta organizada de enormes proporções. Confira o trailer (em inglês):

É de se admirar a escolha de Gavras em acompanhar seus personagens principais a partir de longos e eficientes planos sequência - o do prólogo, por exemplo, é de uma qualidade técnica e artística de fazer inveja a muito diretor experiente. No entanto a pirotecnia visual acaba se sobressaindo perante um roteiro que beira a superficialidade, mesmo quando traz para discussão assuntos relevantes como a realidade multicultural na França e a intolerância que essa condição provoca. Dos três irmãos (e protagonistas), Abdel (Dali Benssalah) e Karim (Sami Slimane) possuem arcos até que interessantes (e corajosos); já o terceiro, que segue Moktar (Ouassini Embarek), eu diria que é completamente dispensável.

De fato, a impressão que dá é que "Athena" poderia ser uma minissérie de 4 episódios tranquilamente - com os três primeiros contando a história do ponto de vista de cada um dos irmãos e o quarto seguindo o policial Jérôme (Anthony Bajon). Dito isso, Gavras se apoia no roteiro (que contou com a ilustre colaboração de Ladj Ly de "Os Miseráveis") para priorizar muito mais o "movimento" do que a "profundidade" - isso impacta na nossa percepção do caos, do barril de pólvora que já explodiu, criando uma sensação de desconforto impressionante, mas acaba prejudicando aqueles que buscam um pouco mais de camadas para nos conectarmos emocionalmente com os personagens. A impressão é que são tantas histórias para contar que o filme acaba não contando nenhuma delas tão bem.

Ainda que "Athena" seja um filme de muita (muita mesmo) qualidade, extremamente bem filmado e com várias sequências inacreditáveis de tão boas; as emoções e a indignação que a morte de um jovem naquelas condições provocaria, não florescem. Isso deixa muito claro que aqui, o drama deu lugar para a ação da mesma forma que a reflexão sucumbiu ao entretenimento. Funciona? Sim, funciona muito bem, mas como recomendação sugiro que antes de "Athena" você assista "Os Miseráveis" para que todo esse contexto social e cultural faça ainda mais sentido na narrativa como um todo.

Vale seu play!

Assista Agora

"Athena" chama muito mais atenção por sua experiência visual do que propriamente por um roteiro impecável - e isso não é um grande problema se lembrarmos de "1917", que segue justamente esse mesmo conceito (dadas as devidas proporções técnicas e de orçamento). Aqui, é possível perceber que o filme do francês Romain Gavras usa de elementos dramáticos extremamente atuais, muitos deles referenciados no grande sucesso "Os Miseráveis", de 2019, para entregar uma dinâmica focada no caos, muito mais próxima do mexicano "Nuevo Orden", inclusive.

Em um Conjunto Habitacional conhecido como Athena, um crime brutal abala toda a comunidade. A trágica história se passa na vida de três jovens, que têm os seus destinos completamente transformados quando o irmão mais novo é morto sob circunstâncias inexplicáveis. Os irmãos de origem argelina e indignados com o assassinato, dão início a uma cruzada em busca de respostas e de justiça, cada um da sua maneira. Porém os embates violentos em Athena colocam eles no centro de um conflito, obrigando-os a ressignificar o luto e a dor em uma revolta organizada de enormes proporções. Confira o trailer (em inglês):

É de se admirar a escolha de Gavras em acompanhar seus personagens principais a partir de longos e eficientes planos sequência - o do prólogo, por exemplo, é de uma qualidade técnica e artística de fazer inveja a muito diretor experiente. No entanto a pirotecnia visual acaba se sobressaindo perante um roteiro que beira a superficialidade, mesmo quando traz para discussão assuntos relevantes como a realidade multicultural na França e a intolerância que essa condição provoca. Dos três irmãos (e protagonistas), Abdel (Dali Benssalah) e Karim (Sami Slimane) possuem arcos até que interessantes (e corajosos); já o terceiro, que segue Moktar (Ouassini Embarek), eu diria que é completamente dispensável.

De fato, a impressão que dá é que "Athena" poderia ser uma minissérie de 4 episódios tranquilamente - com os três primeiros contando a história do ponto de vista de cada um dos irmãos e o quarto seguindo o policial Jérôme (Anthony Bajon). Dito isso, Gavras se apoia no roteiro (que contou com a ilustre colaboração de Ladj Ly de "Os Miseráveis") para priorizar muito mais o "movimento" do que a "profundidade" - isso impacta na nossa percepção do caos, do barril de pólvora que já explodiu, criando uma sensação de desconforto impressionante, mas acaba prejudicando aqueles que buscam um pouco mais de camadas para nos conectarmos emocionalmente com os personagens. A impressão é que são tantas histórias para contar que o filme acaba não contando nenhuma delas tão bem.

Ainda que "Athena" seja um filme de muita (muita mesmo) qualidade, extremamente bem filmado e com várias sequências inacreditáveis de tão boas; as emoções e a indignação que a morte de um jovem naquelas condições provocaria, não florescem. Isso deixa muito claro que aqui, o drama deu lugar para a ação da mesma forma que a reflexão sucumbiu ao entretenimento. Funciona? Sim, funciona muito bem, mas como recomendação sugiro que antes de "Athena" você assista "Os Miseráveis" para que todo esse contexto social e cultural faça ainda mais sentido na narrativa como um todo.

Vale seu play!

Assista Agora