Vou procurar ser o mais honesto e direto possível ao analisar "Maligno": só assista se você gostar do estilo de narrativa do Stephen King (embora essa não seja uma obra do autor) e se você não se incomodar com a linha extremamente tênue entre o trash e o suspense sobrenatural com toques de terror "anos 80". Veja, nenhuma dessas características que citei devem ser interpretadas como depreciativas, muito pelo contrário, pois esse filme dirigido pelo James Wan (de "Invocação do Mal") além de ter a sua já conhecida identidade, é um mergulho no terror clássico como obra cinematográfica de extrema qualidade.
No filme, acompanhamos Madison Mitchell (Annabelle Wallis) tendo dificuldades de relacionamento com o marido, deixando claro se tratar de um casamento repleto de violência doméstica. Até que um vulto cresce das sombras, como uma espécie de assombração, para por fim nessa questão. Recém viúva, Madison passa a ter assustadoras visões de pessoas sendo assassinadas seguindo o mesmo padrão da forma como seu marido foi morto, transformando sua posição de vítima em uma potencial suspeita de todos esses crimes. Confira o trailer:
Talvez o que mais chama a atenção em "Maligno" seja a forma como o roteiro (da romena Ingrid Bisu e da já parceira de Wam, Akela Cooper) transita entre os vários subgêneros do terror e do suspense, usando de inúmeras referências narrativas e visuais para contar sua história - eu diria que é quase uma homenagem velada. Essa escolha conceitual se mostra muito acertada, já que Wan, além de dominar a gramática do terror, se apropria de elementos narrativos tão vastos que criam uma total imprevisibilidade para a trama. Se inicialmente temos a impressão de que o filme vai beber da fonte de um clássico horror japonês, rapidamente somos arremessados pelo suspense sobrenatural (em uma clara citação a “Poltergeist") até chegarmos em um thriller de investigação como em "Outsider", por exemplo. A questão é que essa dinâmica muda tão rapidamente que pode incomodar quem assiste pela quebra de expectativa ou até pela decepção pelos caminhos escolhidos.
Embora o roteiro seja bastante competente (e aqui eu destaco os ótimos e pontuais alívios cômicos), todos os personagens se apoiam no estereótipo para compor as cenas e criar o clima que Wan quer "homenagear". A transformação da trama e o impacto nos personagens vão se transformando do realismo cotidiano brutal das relações tóxicas até chegar no anti-naturalismo digno de Quentin Tarantino. Tudo é muito bem orquestrado artisticamente e tecnicamente, com um desenho de produção belíssimo da Desma Murphy, uma fotografia ajustada ao conceito de Wan do seu sempre parceiro Michael Burgess, um trilha sonora de personalidade do Joseph Bishara até chegar na bem executada cenas de CG com efeitos visuais excelentes.
Resumindo, ao sintetizar e nos mostrar tudo do que o gênero pode entregar, "Maligno" transporta para as telas muito dos medos e dos receios que permeiam o imaginário coletivo, com gatinhos emocionais que nos puxam da memória aquilo que mais nos marcou quando nem ao menos sabíamos diferenciar o que era ficção de realidade. O filme é sim uma declaração de amor aos fãs do terror, mas sem esquecer do prazer que é assistir um entretenimento de ótima qualidade que não tem a menor obrigação de se levar a sério sempre.
Vale a pena, mas só para aqueles que estiverem dispostos a embarcar na proposta original de um filme que não tem nada de "original".
Vou procurar ser o mais honesto e direto possível ao analisar "Maligno": só assista se você gostar do estilo de narrativa do Stephen King (embora essa não seja uma obra do autor) e se você não se incomodar com a linha extremamente tênue entre o trash e o suspense sobrenatural com toques de terror "anos 80". Veja, nenhuma dessas características que citei devem ser interpretadas como depreciativas, muito pelo contrário, pois esse filme dirigido pelo James Wan (de "Invocação do Mal") além de ter a sua já conhecida identidade, é um mergulho no terror clássico como obra cinematográfica de extrema qualidade.
No filme, acompanhamos Madison Mitchell (Annabelle Wallis) tendo dificuldades de relacionamento com o marido, deixando claro se tratar de um casamento repleto de violência doméstica. Até que um vulto cresce das sombras, como uma espécie de assombração, para por fim nessa questão. Recém viúva, Madison passa a ter assustadoras visões de pessoas sendo assassinadas seguindo o mesmo padrão da forma como seu marido foi morto, transformando sua posição de vítima em uma potencial suspeita de todos esses crimes. Confira o trailer:
Talvez o que mais chama a atenção em "Maligno" seja a forma como o roteiro (da romena Ingrid Bisu e da já parceira de Wam, Akela Cooper) transita entre os vários subgêneros do terror e do suspense, usando de inúmeras referências narrativas e visuais para contar sua história - eu diria que é quase uma homenagem velada. Essa escolha conceitual se mostra muito acertada, já que Wan, além de dominar a gramática do terror, se apropria de elementos narrativos tão vastos que criam uma total imprevisibilidade para a trama. Se inicialmente temos a impressão de que o filme vai beber da fonte de um clássico horror japonês, rapidamente somos arremessados pelo suspense sobrenatural (em uma clara citação a “Poltergeist") até chegarmos em um thriller de investigação como em "Outsider", por exemplo. A questão é que essa dinâmica muda tão rapidamente que pode incomodar quem assiste pela quebra de expectativa ou até pela decepção pelos caminhos escolhidos.
Embora o roteiro seja bastante competente (e aqui eu destaco os ótimos e pontuais alívios cômicos), todos os personagens se apoiam no estereótipo para compor as cenas e criar o clima que Wan quer "homenagear". A transformação da trama e o impacto nos personagens vão se transformando do realismo cotidiano brutal das relações tóxicas até chegar no anti-naturalismo digno de Quentin Tarantino. Tudo é muito bem orquestrado artisticamente e tecnicamente, com um desenho de produção belíssimo da Desma Murphy, uma fotografia ajustada ao conceito de Wan do seu sempre parceiro Michael Burgess, um trilha sonora de personalidade do Joseph Bishara até chegar na bem executada cenas de CG com efeitos visuais excelentes.
Resumindo, ao sintetizar e nos mostrar tudo do que o gênero pode entregar, "Maligno" transporta para as telas muito dos medos e dos receios que permeiam o imaginário coletivo, com gatinhos emocionais que nos puxam da memória aquilo que mais nos marcou quando nem ao menos sabíamos diferenciar o que era ficção de realidade. O filme é sim uma declaração de amor aos fãs do terror, mas sem esquecer do prazer que é assistir um entretenimento de ótima qualidade que não tem a menor obrigação de se levar a sério sempre.
Vale a pena, mas só para aqueles que estiverem dispostos a embarcar na proposta original de um filme que não tem nada de "original".
"Midsommar" é uma experiência interessante, principalmente se você entender a proposta, se permitir mergulhar na dinâmica narrativa e na psique dos personagens. Veja, a história acompanha Dani (Florence Pugh) que após um terrível incidente que tirou a vida de toda sua família, se vê sozinha. Ao buscar o apoio em seu namorado Christian (Jack Reynor), ela percebe que os dois passam por um momento delicado do relacionamento - o que só aumenta sua insegurança. Quando Pelle (Vilhelm Blomgren), amigo sueco de Christian, convida ele e mais dois amigos para uma tradicional celebração de verão na aldeia onde cresceu, Dani não lida muito bem com a situação e praticamente obriga o namorado a convidá-la. O fato é que ela vê nessa viagem a chance de processar seu luto, porém o que ela encontra é algo completamente fora do esperado, do seu entendimento, o que transforma essa experiência em algo extremamente macabro. Confira o trailer:
"Midsommar" é o segundo trabalho do diretor Ari Aster, do excelente e premiadíssimo "Hereditário" - talvez por essa razão, o filme chegou cheio de expectativas entre os amantes de suspense com uma levada mais "Boa Noite, Mamãe" de 2014. Embora completamente distintos, existe um ponto de convergência entre esses filmes que nos ajuda a entender o fascínio pela forma como Ari Aster constrói a história: o desenvolvimento na relação dos personagens com o ambiente que eles estão inseridos é delicadamente formatado por camadas que, juntas, intensificam a sensação de angústia e que separadas focam em elementos essências para um bom suspense: umas são mais delicadas, outras mais brutas, mas quando tudo nos leva a crer que o problema é externo - visualmente representada por cenas bem impactantes; entendemos que é o íntimo que transforma a situação em algo quase insuportável. Isso tudo para dizer que "Midsommar" é um filme que vai além do que vemos na tela e isso não deve agradar a todos, porém é preciso elogiar o trabalho conceitual que o diretor nos entrega.Vale muito a pena se você gostar do gênero e da forma como ele é representado!
É característica desse diretor/roteirista trabalhar muita coisa ao mesmo tempo, e nem sempre isso é visto com bons olhos - até porque o filme acaba ficando longo e, para alguns, cansativo. O relacionamento dos protagonistas trazem a sutileza do desconforto mútuo entre pessoas que já não se gostam mais como antes, mas também o medo de perder aquilo que já faz parte da sua vida. Mesmo inconstante psicologicamente, Christian não quer deixar Dani, mas ela já entendeu que tudo que viveu com ele talvez já não faça mais sentido - só que ele não sabe ainda. Essa relação de insegurança perante a vida do ser humano é extremamente difícil de se retratar sem estereotipar uma ou outra situação e é aí que Ari Aster brilha: ele deixa para estereotipar o "em torno" e nunca o sentimento dos personagens, então quando misturamos tudo isso, parece loucura, algo sem noção, mas na verdade é só a forma natural como ele provoca os personagens a lidarem com suas dores mais profundas em um universo tão distante da realidade deles! Quando Aster se dedica na construção de uma atmosfera misteriosa, com um toque de terror pastoral - bem mais intenso que Shayamalan imprimiu em "A Vila", entendemos porque o comportamento daquelas pessoas que vivem na Aldeia nos causam tanto desconforto. O trabalho sutil do medo é validado por atitudes extremas, esse é o conceito!
Se em alguns momentos tudo aquilo parece um pouco ensaiado demais, logo lembramos que se trata de um culto e a repetição trás essa característica. É tão interessante o impacto que isso causa nos outros personagens, mesmo que superficialmente, que eu diria que se "Midsommar" fosse uma série, estaríamos tão intrigados como nos tempos de "Lost". O fato é que o filme trabalha muito bem o que pode ser mostrado e o que deve ser sugerido e isso pode causar um certo distanciamento do público que quer "tomar sustos" - não estamos falando desse tipo de filme, que fique claro, porém o que vemos no primeiro ato, para mim, já foi mais que o suficiente e me deixou ansioso e receoso pelo o que eu poderia encontrar no restante da história. Para alguns isso pode parecer inconstância, para mim foi estratégico e no final do filme, a sensação de alivio foi tão intensa que as próprias escolhas duvidosas do roteiro foram esquecidas.
Reparem como "Midsommar" tem cara de suspense psicológico independente, mas está fantasiado de filme comercial! No final das contas eu gostei e indico para o assinante mais disposto a refletir sobre o que vai ver na tela e sobre o que poderia ter visto, mas o diretor preferiu não entregar!
"Midsommar" é uma experiência interessante, principalmente se você entender a proposta, se permitir mergulhar na dinâmica narrativa e na psique dos personagens. Veja, a história acompanha Dani (Florence Pugh) que após um terrível incidente que tirou a vida de toda sua família, se vê sozinha. Ao buscar o apoio em seu namorado Christian (Jack Reynor), ela percebe que os dois passam por um momento delicado do relacionamento - o que só aumenta sua insegurança. Quando Pelle (Vilhelm Blomgren), amigo sueco de Christian, convida ele e mais dois amigos para uma tradicional celebração de verão na aldeia onde cresceu, Dani não lida muito bem com a situação e praticamente obriga o namorado a convidá-la. O fato é que ela vê nessa viagem a chance de processar seu luto, porém o que ela encontra é algo completamente fora do esperado, do seu entendimento, o que transforma essa experiência em algo extremamente macabro. Confira o trailer:
"Midsommar" é o segundo trabalho do diretor Ari Aster, do excelente e premiadíssimo "Hereditário" - talvez por essa razão, o filme chegou cheio de expectativas entre os amantes de suspense com uma levada mais "Boa Noite, Mamãe" de 2014. Embora completamente distintos, existe um ponto de convergência entre esses filmes que nos ajuda a entender o fascínio pela forma como Ari Aster constrói a história: o desenvolvimento na relação dos personagens com o ambiente que eles estão inseridos é delicadamente formatado por camadas que, juntas, intensificam a sensação de angústia e que separadas focam em elementos essências para um bom suspense: umas são mais delicadas, outras mais brutas, mas quando tudo nos leva a crer que o problema é externo - visualmente representada por cenas bem impactantes; entendemos que é o íntimo que transforma a situação em algo quase insuportável. Isso tudo para dizer que "Midsommar" é um filme que vai além do que vemos na tela e isso não deve agradar a todos, porém é preciso elogiar o trabalho conceitual que o diretor nos entrega.Vale muito a pena se você gostar do gênero e da forma como ele é representado!
É característica desse diretor/roteirista trabalhar muita coisa ao mesmo tempo, e nem sempre isso é visto com bons olhos - até porque o filme acaba ficando longo e, para alguns, cansativo. O relacionamento dos protagonistas trazem a sutileza do desconforto mútuo entre pessoas que já não se gostam mais como antes, mas também o medo de perder aquilo que já faz parte da sua vida. Mesmo inconstante psicologicamente, Christian não quer deixar Dani, mas ela já entendeu que tudo que viveu com ele talvez já não faça mais sentido - só que ele não sabe ainda. Essa relação de insegurança perante a vida do ser humano é extremamente difícil de se retratar sem estereotipar uma ou outra situação e é aí que Ari Aster brilha: ele deixa para estereotipar o "em torno" e nunca o sentimento dos personagens, então quando misturamos tudo isso, parece loucura, algo sem noção, mas na verdade é só a forma natural como ele provoca os personagens a lidarem com suas dores mais profundas em um universo tão distante da realidade deles! Quando Aster se dedica na construção de uma atmosfera misteriosa, com um toque de terror pastoral - bem mais intenso que Shayamalan imprimiu em "A Vila", entendemos porque o comportamento daquelas pessoas que vivem na Aldeia nos causam tanto desconforto. O trabalho sutil do medo é validado por atitudes extremas, esse é o conceito!
Se em alguns momentos tudo aquilo parece um pouco ensaiado demais, logo lembramos que se trata de um culto e a repetição trás essa característica. É tão interessante o impacto que isso causa nos outros personagens, mesmo que superficialmente, que eu diria que se "Midsommar" fosse uma série, estaríamos tão intrigados como nos tempos de "Lost". O fato é que o filme trabalha muito bem o que pode ser mostrado e o que deve ser sugerido e isso pode causar um certo distanciamento do público que quer "tomar sustos" - não estamos falando desse tipo de filme, que fique claro, porém o que vemos no primeiro ato, para mim, já foi mais que o suficiente e me deixou ansioso e receoso pelo o que eu poderia encontrar no restante da história. Para alguns isso pode parecer inconstância, para mim foi estratégico e no final do filme, a sensação de alivio foi tão intensa que as próprias escolhas duvidosas do roteiro foram esquecidas.
Reparem como "Midsommar" tem cara de suspense psicológico independente, mas está fantasiado de filme comercial! No final das contas eu gostei e indico para o assinante mais disposto a refletir sobre o que vai ver na tela e sobre o que poderia ter visto, mas o diretor preferiu não entregar!
Se em um primeiro momento "Não Volte para Casa" parece mais um terror ao melhor estilo "mansão mal-assombrada" (algo como "A Maldição da Residência Hill"), se prepare para se surpreender, pois essa minissérie tailandesa da Netflix está muito mais para uma ótima ficção-científica na linha de "Dark"! Criada pelo novato Woottidanai Intarakaset, "Não Volte para Casa" parece um amontoado de clichês em um primeiro olhar, especialmente por abusar de gatilhos dramáticos muito característico do terror ou do suspense psicológico onde seu único objetivo é dar sustos na audiência. Aqui, o que vemos nos primeiros episódios são inúmeras cenas marcadas por uma trilha sonora que estabelece um contexto de medo ou movimentos de câmera que rapidamente trocam um plano pelo outro, só para enquadrar uma entidade sobrenatural atrás de algum personagem desavisado (sempre bem alinhado com aquele efeito sonoro impactante, claro). Acontece que tudo isso é proposital e assim que entendemos a proposta conceitual de Intarakaset, somos jogados em um verdadeiro e bem construído turbilhão de mistérios, quase catártico eu diria, onde o passado sombrio da protagonista passa a impactar não só na sua história, como também na de sua filha.
A história acompanha Varee (Woranuch BhiromBhakdi), uma jovem que retorna à sua cidade natal após 30 anos de ausência para tentar recomeçar sua vida após um casamento abusivo. A volta para a casa da família, no entanto, desencadeia uma série de eventos estranhos e perturbadores, incluindo visões do passado, comportamentos inexplicáveis entre os moradores locais e a reabertura de feridas emocionais que ela pensava ter deixado para trás. O problema é que à medida em que tenta desvendar os segredos de sua família, Varee precisa lidar com o recente desaparecimento de sua filha Min (Ploypaphas Fonkaewsiwaporn) e com a desconfiança da investigadora local, Aon (Savika Kanchanamas). Confira o trailer (com legendas em inglês):
A combinação de elementos sobrenaturais com uma narrativa de investigação que te leva para uma complexa ficção científica soa confusa demais, eu admito, no entanto é justamente essa mistura inusitada que faz de "Não Volte para Casa" uma minissérie interessante ao ponto de manter a audiência em constante estado de alerta - aliás, chega ser irritante a qualidade absurda que são os ganchos entre um episódio e outro! Intarakaset constrói sua narrativa com uma habilidade que merece atenção já que ele enfatiza a tensão, com uma abordagem clássica e que soa ultrapassada, mas que com o passar dos episódios vai sendo desconstruída para entregar um final realmente satisfatório. O roteiro, também escrito pelo diretor, vai te envolvendo e te provocando, no mínimo, muita curiosidade - e por ser cheio de camadas, ele nos tira da zona de conforto e vai nos posicionando perante o mistério de forma muito homeopática, mas sempre no tempo certo.
O legal de "Não Volte para Casa" é que ela brinca com nossa percepção. Ao mesmo tempo que explora a fragilidade da memória com uma série de signos e nuances, o roteiro ainda sugere com muita inteligência que a relação entre o passado e o presente vai muito além do que um mero artifício narrativo para se tornar uma solução dramática bem planejadinha - embora carregue um certo didatismo que poderia ser deixado de lado. Veja, Varee desponta como uma personagem para lá de complexa, cuja jornada é marcada tanto pela busca por respostas quanto por seu próprio processo de enfrentamento de traumas. A narrativa, nesse sentido, sabe misturar pistas e reviravoltas com maestria, mantendo a audiência intrigada até o sexto e derradeiro episódio.
Embora a minissérie seja bem-sucedida em criar uma atmosfera de suspense e mistério, será necessário embarcar na proposta de Intarakaset com alguma boa vontade e paciência. O ritmo da narrativa pode ser um desafio para alguns e suas soluções complicadas de entender, mas posso garantir que tudo vai fazer sentido no final e nenhuma peça colocada no tabuleiro está ali por acaso - ok, talvez algumas estejam ali só para confundir, mas no geral a trama é realmente bem construída. Se as revelações sobre os segredos envolvendo Varee, sua família e o desaparecimento de sua filha exigem certa abstração da realidade, como entretenimento, "Não Volte para Casa" cumpre muito bem sua função, criando uma experiência tanto como uma história de mistério quanto uma jornada de busca pelas peças certas dentro de um quebra-cabeça temporal que, de fato, exige do intelecto da audiência.
Inesquecível? Com certeza não, mas desafiadora ao ponto de merecer o seu play - especialmente para aqueles dispostos a reviver a empolgação de "Dark", de "Durante a Tormenta" ou de "A Ligação"!
Se em um primeiro momento "Não Volte para Casa" parece mais um terror ao melhor estilo "mansão mal-assombrada" (algo como "A Maldição da Residência Hill"), se prepare para se surpreender, pois essa minissérie tailandesa da Netflix está muito mais para uma ótima ficção-científica na linha de "Dark"! Criada pelo novato Woottidanai Intarakaset, "Não Volte para Casa" parece um amontoado de clichês em um primeiro olhar, especialmente por abusar de gatilhos dramáticos muito característico do terror ou do suspense psicológico onde seu único objetivo é dar sustos na audiência. Aqui, o que vemos nos primeiros episódios são inúmeras cenas marcadas por uma trilha sonora que estabelece um contexto de medo ou movimentos de câmera que rapidamente trocam um plano pelo outro, só para enquadrar uma entidade sobrenatural atrás de algum personagem desavisado (sempre bem alinhado com aquele efeito sonoro impactante, claro). Acontece que tudo isso é proposital e assim que entendemos a proposta conceitual de Intarakaset, somos jogados em um verdadeiro e bem construído turbilhão de mistérios, quase catártico eu diria, onde o passado sombrio da protagonista passa a impactar não só na sua história, como também na de sua filha.
A história acompanha Varee (Woranuch BhiromBhakdi), uma jovem que retorna à sua cidade natal após 30 anos de ausência para tentar recomeçar sua vida após um casamento abusivo. A volta para a casa da família, no entanto, desencadeia uma série de eventos estranhos e perturbadores, incluindo visões do passado, comportamentos inexplicáveis entre os moradores locais e a reabertura de feridas emocionais que ela pensava ter deixado para trás. O problema é que à medida em que tenta desvendar os segredos de sua família, Varee precisa lidar com o recente desaparecimento de sua filha Min (Ploypaphas Fonkaewsiwaporn) e com a desconfiança da investigadora local, Aon (Savika Kanchanamas). Confira o trailer (com legendas em inglês):
A combinação de elementos sobrenaturais com uma narrativa de investigação que te leva para uma complexa ficção científica soa confusa demais, eu admito, no entanto é justamente essa mistura inusitada que faz de "Não Volte para Casa" uma minissérie interessante ao ponto de manter a audiência em constante estado de alerta - aliás, chega ser irritante a qualidade absurda que são os ganchos entre um episódio e outro! Intarakaset constrói sua narrativa com uma habilidade que merece atenção já que ele enfatiza a tensão, com uma abordagem clássica e que soa ultrapassada, mas que com o passar dos episódios vai sendo desconstruída para entregar um final realmente satisfatório. O roteiro, também escrito pelo diretor, vai te envolvendo e te provocando, no mínimo, muita curiosidade - e por ser cheio de camadas, ele nos tira da zona de conforto e vai nos posicionando perante o mistério de forma muito homeopática, mas sempre no tempo certo.
O legal de "Não Volte para Casa" é que ela brinca com nossa percepção. Ao mesmo tempo que explora a fragilidade da memória com uma série de signos e nuances, o roteiro ainda sugere com muita inteligência que a relação entre o passado e o presente vai muito além do que um mero artifício narrativo para se tornar uma solução dramática bem planejadinha - embora carregue um certo didatismo que poderia ser deixado de lado. Veja, Varee desponta como uma personagem para lá de complexa, cuja jornada é marcada tanto pela busca por respostas quanto por seu próprio processo de enfrentamento de traumas. A narrativa, nesse sentido, sabe misturar pistas e reviravoltas com maestria, mantendo a audiência intrigada até o sexto e derradeiro episódio.
Embora a minissérie seja bem-sucedida em criar uma atmosfera de suspense e mistério, será necessário embarcar na proposta de Intarakaset com alguma boa vontade e paciência. O ritmo da narrativa pode ser um desafio para alguns e suas soluções complicadas de entender, mas posso garantir que tudo vai fazer sentido no final e nenhuma peça colocada no tabuleiro está ali por acaso - ok, talvez algumas estejam ali só para confundir, mas no geral a trama é realmente bem construída. Se as revelações sobre os segredos envolvendo Varee, sua família e o desaparecimento de sua filha exigem certa abstração da realidade, como entretenimento, "Não Volte para Casa" cumpre muito bem sua função, criando uma experiência tanto como uma história de mistério quanto uma jornada de busca pelas peças certas dentro de um quebra-cabeça temporal que, de fato, exige do intelecto da audiência.
Inesquecível? Com certeza não, mas desafiadora ao ponto de merecer o seu play - especialmente para aqueles dispostos a reviver a empolgação de "Dark", de "Durante a Tormenta" ou de "A Ligação"!
"Noite Passada em Soho" é um filme extremamente envolvente - pela história e pelo visual! Esse suspense que transita entre o psicológico e o sobrenatural é quase uma mistura do coreano "A Ligação" com o clássico de Darren Aronofsky, "Cisne Negro".
No filme acompanhamos Eloise (Thomasin Mckenzie) quando ela decide deixar a sua pequena cidade natal para estudar moda em Londres. Obcecada pelos anos 60, ela se depara com uma vida dinâmica e moderna onde nem tudo parece corresponder às suas românticas expectativas. O impacto dessa mudança tão radical gera uma série de frustrações para Eloise - que leva ela se mudar para um antigo apartamento no centro do Soho, administrado pela curiosa Ms. Collins (Diana Rigg). A situação se complica ainda mais quando a protagonista passa a ter sonhos extremamente realistas com a misteriosa Sandie (Anya Taylor-Joy), uma aspirante a cantora cujas atitudes e escolhas passam a interferir fortemente na vida da própria Eloise. Confira o trailer:
A primeira vista, "Noite Passada em Soho" impacta pela perfeita combinação entre um filme esteticamente impecável, muito mérito do diretor Edgar Wright, com uma trilha sonora fantástica, assinada por Steven Price (vencedor do Oscar por "Gravidade"). Mas também temos um outro lado, e é quando entra em cena o roteiro da Krysty Wilson-Cairns (indicada ao Oscar por "1917") baseado em uma história que o próprio Wright trouxe para o desenvolvimento ao se propor resgatar suas fantasias de adolescente e sua relação mais íntima com o Soho londrino. Veja, o filme não tem a menor pretensão de transformar sua narrativa em uma experiência empírica comprovada por qualquer que seja a linha cientifica ou espiritual de sua interpretação - as coisas simplesmente acontecem, dentro de uma dinâmica particular do diretor e suficiente para nos fazer ficar de olhos grudados na tela por quase duas horas.
Cheio de referências conceituais, as escolhas de Wright direcionam a audiência para uma jornada única, uma linha tênue entre o surreal e o patológico, entre o sonho e a experiência mediúnica - tudo isso sendo construído por duas protagonistas cheias de camadas, brilhantemente conduzidas por uma trama que traz muitos signos, como se o filme fosse um "Alice no País das Maravilhas" de Eloise. Reparem como o uso dos espelhos, por exemplo, cria uma sensação de incerteza e mistério impressionantes. É, de fato, um trabalho fenomenal de direção, fotografia e montagem - além de ter um suporte de efeitos especiais bastante competente e nada invasivo.
Obviamente que ter Anya Taylor-Joy, Thomasin Mckenzie, Diana Rigg e Matt Smith só ajuda, mas é preciso dizer que "Noite Passada em Soho" é o resultado do seu diretor como maestro - um filme maduro, divertido, inteligente, bonito e ainda dinâmico. Se não tem a profundidade de "Cisne Negro", posso garantir que é um entretenimento de primeira; que, mesmo com algumas soluções até que previsíveis, muito desse quebra-cabeça vai se resolvendo sem roubar no jogo e acaba entregando um final bastante correto.
Vale a pena!
"Noite Passada em Soho" é um filme extremamente envolvente - pela história e pelo visual! Esse suspense que transita entre o psicológico e o sobrenatural é quase uma mistura do coreano "A Ligação" com o clássico de Darren Aronofsky, "Cisne Negro".
No filme acompanhamos Eloise (Thomasin Mckenzie) quando ela decide deixar a sua pequena cidade natal para estudar moda em Londres. Obcecada pelos anos 60, ela se depara com uma vida dinâmica e moderna onde nem tudo parece corresponder às suas românticas expectativas. O impacto dessa mudança tão radical gera uma série de frustrações para Eloise - que leva ela se mudar para um antigo apartamento no centro do Soho, administrado pela curiosa Ms. Collins (Diana Rigg). A situação se complica ainda mais quando a protagonista passa a ter sonhos extremamente realistas com a misteriosa Sandie (Anya Taylor-Joy), uma aspirante a cantora cujas atitudes e escolhas passam a interferir fortemente na vida da própria Eloise. Confira o trailer:
A primeira vista, "Noite Passada em Soho" impacta pela perfeita combinação entre um filme esteticamente impecável, muito mérito do diretor Edgar Wright, com uma trilha sonora fantástica, assinada por Steven Price (vencedor do Oscar por "Gravidade"). Mas também temos um outro lado, e é quando entra em cena o roteiro da Krysty Wilson-Cairns (indicada ao Oscar por "1917") baseado em uma história que o próprio Wright trouxe para o desenvolvimento ao se propor resgatar suas fantasias de adolescente e sua relação mais íntima com o Soho londrino. Veja, o filme não tem a menor pretensão de transformar sua narrativa em uma experiência empírica comprovada por qualquer que seja a linha cientifica ou espiritual de sua interpretação - as coisas simplesmente acontecem, dentro de uma dinâmica particular do diretor e suficiente para nos fazer ficar de olhos grudados na tela por quase duas horas.
Cheio de referências conceituais, as escolhas de Wright direcionam a audiência para uma jornada única, uma linha tênue entre o surreal e o patológico, entre o sonho e a experiência mediúnica - tudo isso sendo construído por duas protagonistas cheias de camadas, brilhantemente conduzidas por uma trama que traz muitos signos, como se o filme fosse um "Alice no País das Maravilhas" de Eloise. Reparem como o uso dos espelhos, por exemplo, cria uma sensação de incerteza e mistério impressionantes. É, de fato, um trabalho fenomenal de direção, fotografia e montagem - além de ter um suporte de efeitos especiais bastante competente e nada invasivo.
Obviamente que ter Anya Taylor-Joy, Thomasin Mckenzie, Diana Rigg e Matt Smith só ajuda, mas é preciso dizer que "Noite Passada em Soho" é o resultado do seu diretor como maestro - um filme maduro, divertido, inteligente, bonito e ainda dinâmico. Se não tem a profundidade de "Cisne Negro", posso garantir que é um entretenimento de primeira; que, mesmo com algumas soluções até que previsíveis, muito desse quebra-cabeça vai se resolvendo sem roubar no jogo e acaba entregando um final bastante correto.
Vale a pena!
"Nove Desconhecidos" chegou com status de "minissérie premium da HBO" na Prime Vídeo, principalmente por todos os nomes envolvidos, como o showrunner David E. Kelley de “The Undoing” e a autora australiana Liane Moriarty de “Big Little Lies”, sem falar, obviamente, de Nicole Kidman como protagonista, apoiada em um elenco com Melissa McCarthy, Regina Hall, Luke Evans, Michael Shannon e Bobby Cannavale. Como comentamos no Blog da Viu Review, "Nove Desconhecidos" foi cercada de muita expectativa e após a exibição de 3 episódios muitas incertezas começaram aparecer (e com razão), mas só no final do episódio 8 que foi possível cravar que a minissérie estava longe de ser um decepção como muitos previam - muito pelo contrário, eu diria que vale muito a pena, desde que você embarque no conceito narrativo, digamos, psicodélico!
Frustrados com suas vidas, nove estranhos embarcam em um programa de relaxamento e espiritualidade criado por um SPA de luxo liderado por Marsha (Nicole Kidman), mas ao longo dos dias eles percebem que a experiência pode acabar colocando suas vidas e sanidade em perigo, confira o trailer:
Talvez a o grande problema de "Nove Desconhecidos" seja a falta de identidade - mas não pela história não se posicionar perante um gênero especifico ou um conceito narrativo e estético inovador, e sim pela própria expectativa que nós mesmos criamos. É claro que o roteiro colabora para essa sensação de que algo extraordinário está prestes a acontecer a todo momento e que a trama vem repleta de reviravoltas surpreendentes, mas a fato é que isso tem mais a ver com quem assiste do que com a minissérie em si. Embora seja necessário uma boa dose de suspensão da realidade e mesmo sabendo que muitos personagens são completamente estereotipados, em nenhum momento o roteiro rouba no jogo - ele só demora para mostrar as peças certas que, juntas, entregam um final bem satisfatório.
No fundo, "Nove Desconhecidos" é um recorte de uma era onde os programas de auto-conhecimento e os coachings de terapias holísticas se tornaram sinônimos de superficialidade e oportunismo - por isso sempre esperamos o pior da protagonista, afinal acreditamos nesse estereótipo, mesmo que inconscientemente. Veja, enquanto a narrativa demonstra elementos que facilmente nos remetem as conexões com a espiritualidade, temos a impressão de que se trata de uma história cheia de mistérios, mas quando os psicotrópicos vão ganhando força de uma maneira muito natural dentro da trama, somos transportados para situações mais palpáveis e é quando começamos a reconhecer o valor da história - e isso não quer dizer que o mistério desaparece, ele só se transforma. Diferente do livro, não se tem tempo suficiente para desenvolver cada um dos personagens com deveria e é por isso que alguns se sobressaem: a história da família Marconi formada por Napoleon (Michael Shannon), Heather (Asher Keddie) e Zoe (Grace Van Patten) é um caso e a forte relação entre Frances (Melissa McCarthy) e Tony (Bobby Cannavale), é outro destaque - se a série chamasse "Cinco Desconhecidos" teríamos o mesmo resultado, acreditem!
A atmosfera poética criada ao redor de Masha, criadora da Tranquillum House, vai se dissipar com o passar dos episódios e sua motivação se tornará cada vez mais clara. A questão dos métodos ou da ilegalidade de suas ações também geram boas discussões. Com isso temos bons conflitos e outros nem tanto, mas quando nos apegarmos na real proposta de "Nove Desconhecidos", passamos a entender que o processo de "perdão" e a "cura emocional" de cada um dos personagens guiam uma crítica velada sobre a ética, a legalidade e o real benefício de alguns, digamos, treinamentos de reprogramação.
Vale o play!
"Nove Desconhecidos" chegou com status de "minissérie premium da HBO" na Prime Vídeo, principalmente por todos os nomes envolvidos, como o showrunner David E. Kelley de “The Undoing” e a autora australiana Liane Moriarty de “Big Little Lies”, sem falar, obviamente, de Nicole Kidman como protagonista, apoiada em um elenco com Melissa McCarthy, Regina Hall, Luke Evans, Michael Shannon e Bobby Cannavale. Como comentamos no Blog da Viu Review, "Nove Desconhecidos" foi cercada de muita expectativa e após a exibição de 3 episódios muitas incertezas começaram aparecer (e com razão), mas só no final do episódio 8 que foi possível cravar que a minissérie estava longe de ser um decepção como muitos previam - muito pelo contrário, eu diria que vale muito a pena, desde que você embarque no conceito narrativo, digamos, psicodélico!
Frustrados com suas vidas, nove estranhos embarcam em um programa de relaxamento e espiritualidade criado por um SPA de luxo liderado por Marsha (Nicole Kidman), mas ao longo dos dias eles percebem que a experiência pode acabar colocando suas vidas e sanidade em perigo, confira o trailer:
Talvez a o grande problema de "Nove Desconhecidos" seja a falta de identidade - mas não pela história não se posicionar perante um gênero especifico ou um conceito narrativo e estético inovador, e sim pela própria expectativa que nós mesmos criamos. É claro que o roteiro colabora para essa sensação de que algo extraordinário está prestes a acontecer a todo momento e que a trama vem repleta de reviravoltas surpreendentes, mas a fato é que isso tem mais a ver com quem assiste do que com a minissérie em si. Embora seja necessário uma boa dose de suspensão da realidade e mesmo sabendo que muitos personagens são completamente estereotipados, em nenhum momento o roteiro rouba no jogo - ele só demora para mostrar as peças certas que, juntas, entregam um final bem satisfatório.
No fundo, "Nove Desconhecidos" é um recorte de uma era onde os programas de auto-conhecimento e os coachings de terapias holísticas se tornaram sinônimos de superficialidade e oportunismo - por isso sempre esperamos o pior da protagonista, afinal acreditamos nesse estereótipo, mesmo que inconscientemente. Veja, enquanto a narrativa demonstra elementos que facilmente nos remetem as conexões com a espiritualidade, temos a impressão de que se trata de uma história cheia de mistérios, mas quando os psicotrópicos vão ganhando força de uma maneira muito natural dentro da trama, somos transportados para situações mais palpáveis e é quando começamos a reconhecer o valor da história - e isso não quer dizer que o mistério desaparece, ele só se transforma. Diferente do livro, não se tem tempo suficiente para desenvolver cada um dos personagens com deveria e é por isso que alguns se sobressaem: a história da família Marconi formada por Napoleon (Michael Shannon), Heather (Asher Keddie) e Zoe (Grace Van Patten) é um caso e a forte relação entre Frances (Melissa McCarthy) e Tony (Bobby Cannavale), é outro destaque - se a série chamasse "Cinco Desconhecidos" teríamos o mesmo resultado, acreditem!
A atmosfera poética criada ao redor de Masha, criadora da Tranquillum House, vai se dissipar com o passar dos episódios e sua motivação se tornará cada vez mais clara. A questão dos métodos ou da ilegalidade de suas ações também geram boas discussões. Com isso temos bons conflitos e outros nem tanto, mas quando nos apegarmos na real proposta de "Nove Desconhecidos", passamos a entender que o processo de "perdão" e a "cura emocional" de cada um dos personagens guiam uma crítica velada sobre a ética, a legalidade e o real benefício de alguns, digamos, treinamentos de reprogramação.
Vale o play!
"O Aviso" é mais um daqueles suspenses psicológicos intrigantes, muito bem realizado e com um roteiro interessante, mas por conta de uma pequena solução narrativa, certamente, vai dividir opiniões. Esse filme espanhol, produzido pela Netflix se baseia no livro de Paul Pen e conta a história de Jon (Raúl Arévalo) que ao ver seu melhor amigo, David (Sergio Mur), ser baleado enquanto estavam em um posto de gasolina, começa investigar o crime até que percebe um estranho padrão matemático entre vários incidentes que ocorreram no mesmo local durante anos. Ao mesmo tempo, mas dez anos a frente, acompanhamos Nico (Hugo Arbúes), uma criança de nove anos que certo dia recebe um bilhete dizendo que sua vida pode estar em risco se ele for nesse posto de gasolina no dia do seu aniversário. É, eu sei que pode parecer confuso, mas o filme contorna muito bem essa premissa com inteligência. Confira o trailer, dublado:
"O Aviso", na minha opinião, tem mais acertos do que erros - principalmente se você assistir sem muita expectativa e mergulhar na paranóia do protagonista na busca alucinada para entender os padrões que construíram todos os crimes que ocorreram naquele local. Não espere explicações lógicas, por mais controversa que possa parecer a frase já que os números "não mentem" - o fato é que a trama vai fazer algum sentido se você não se preocupar com as respostas e sim com as suposições que o roteiro vai inserindo na história pouco a pouco... e isso é muito divertido!
O diretor Daniel Calparsoro (de "Tormenta" e o "O Silêncio da Cidade Branca") acertou ao brincar com a temporalidade do roteiro sem a necessidade de parecer didático com quem assiste. No início pode causar algum estranhamento, mas lentamente fica fácil entender exatamente quando cada linha narrativa acontece e, claro, nos provoca a imaginar como elas se encontrarão - apenas algumas cenas com um filtro sépia para invocar um passado distante, incomoda um pouco e embora a escolha visual seja justificável, faltou coragem para manter aquele conceito visual mais neutro! A partir do segundo ato, essa conjunção temporal vai ficando cada vez mais óbvia, mas o valor do roteiro de Chris Sparling ("Mercy") e Jorge Guerricaechevarría ("Quem com ferro fere") está em, justamente, não deixar o óbvio atrapalhar a experiência - eles vão nos apresentando outros elementos (inclusive sobrenaturais) com o objetivo de criar mais dúvidas do que repostas - da mesma forma como o grande M. Night Shyamalan nos presenteava em um passado distante.
O elenco merece destaque também: Raúl Arévalo entrega um personagem (Jon) bastante honesto - por sofrer de esquizofrenia e da culpa pelo acidente do amigo, a tendência óbvia era fugir do tom e super valorizar o drama ou o estereótipo; não foi o caso - nem mesmo as aplicações de insetos em um CG bem mequetrefe, atrapalharam seu trabalho! Aura Garrido, a Laura, mãe de Nico, também não cede a tentação do overacting e funciona bem ao equilibrar o fato de ser super protetora com a necessidade de preparar seu filho para enfrentar o mundo! Hugo Arbúes, o Nico, traduz exatamente o que representa uma infância insegura e ameaçada pelo bullying que pode viver um menino mais introvertido nos dias de hoje.
No geral, "O Aviso" funciona muito bem como um ótimo entretenimento que mistura mistério, investigação e suspense (com uma pitada de sobrenatural), que nos deixam intrigados e imersos em uma infinidade de possibilidades que nos movem até o final do filme. Talvez esse final possa decepcionar um pouco (foi o que aconteceu comigo), porém a jornada foi tão divertida que nem dei muita bola para esse vacilo do roteiro. Eu indico, mais pela diversão do que por ser um filme inesquecível!
"O Aviso" é mais um daqueles suspenses psicológicos intrigantes, muito bem realizado e com um roteiro interessante, mas por conta de uma pequena solução narrativa, certamente, vai dividir opiniões. Esse filme espanhol, produzido pela Netflix se baseia no livro de Paul Pen e conta a história de Jon (Raúl Arévalo) que ao ver seu melhor amigo, David (Sergio Mur), ser baleado enquanto estavam em um posto de gasolina, começa investigar o crime até que percebe um estranho padrão matemático entre vários incidentes que ocorreram no mesmo local durante anos. Ao mesmo tempo, mas dez anos a frente, acompanhamos Nico (Hugo Arbúes), uma criança de nove anos que certo dia recebe um bilhete dizendo que sua vida pode estar em risco se ele for nesse posto de gasolina no dia do seu aniversário. É, eu sei que pode parecer confuso, mas o filme contorna muito bem essa premissa com inteligência. Confira o trailer, dublado:
"O Aviso", na minha opinião, tem mais acertos do que erros - principalmente se você assistir sem muita expectativa e mergulhar na paranóia do protagonista na busca alucinada para entender os padrões que construíram todos os crimes que ocorreram naquele local. Não espere explicações lógicas, por mais controversa que possa parecer a frase já que os números "não mentem" - o fato é que a trama vai fazer algum sentido se você não se preocupar com as respostas e sim com as suposições que o roteiro vai inserindo na história pouco a pouco... e isso é muito divertido!
O diretor Daniel Calparsoro (de "Tormenta" e o "O Silêncio da Cidade Branca") acertou ao brincar com a temporalidade do roteiro sem a necessidade de parecer didático com quem assiste. No início pode causar algum estranhamento, mas lentamente fica fácil entender exatamente quando cada linha narrativa acontece e, claro, nos provoca a imaginar como elas se encontrarão - apenas algumas cenas com um filtro sépia para invocar um passado distante, incomoda um pouco e embora a escolha visual seja justificável, faltou coragem para manter aquele conceito visual mais neutro! A partir do segundo ato, essa conjunção temporal vai ficando cada vez mais óbvia, mas o valor do roteiro de Chris Sparling ("Mercy") e Jorge Guerricaechevarría ("Quem com ferro fere") está em, justamente, não deixar o óbvio atrapalhar a experiência - eles vão nos apresentando outros elementos (inclusive sobrenaturais) com o objetivo de criar mais dúvidas do que repostas - da mesma forma como o grande M. Night Shyamalan nos presenteava em um passado distante.
O elenco merece destaque também: Raúl Arévalo entrega um personagem (Jon) bastante honesto - por sofrer de esquizofrenia e da culpa pelo acidente do amigo, a tendência óbvia era fugir do tom e super valorizar o drama ou o estereótipo; não foi o caso - nem mesmo as aplicações de insetos em um CG bem mequetrefe, atrapalharam seu trabalho! Aura Garrido, a Laura, mãe de Nico, também não cede a tentação do overacting e funciona bem ao equilibrar o fato de ser super protetora com a necessidade de preparar seu filho para enfrentar o mundo! Hugo Arbúes, o Nico, traduz exatamente o que representa uma infância insegura e ameaçada pelo bullying que pode viver um menino mais introvertido nos dias de hoje.
No geral, "O Aviso" funciona muito bem como um ótimo entretenimento que mistura mistério, investigação e suspense (com uma pitada de sobrenatural), que nos deixam intrigados e imersos em uma infinidade de possibilidades que nos movem até o final do filme. Talvez esse final possa decepcionar um pouco (foi o que aconteceu comigo), porém a jornada foi tão divertida que nem dei muita bola para esse vacilo do roteiro. Eu indico, mais pela diversão do que por ser um filme inesquecível!
"O Beco do Pesadelo" tem a identidade de peso do seu diretor, Guillermo del Toro ("A Forma da Água" e "O Labirinto do Fauno") - visualmente impecável, com um história envolvente e que te prende do começo ao fim (sempre com uma lição escondida). Talvez um pouco menos "poético" que seus dois filmes que citamos, "O Beco do Pesadelo" usa a exploração da miséria humana (e aqui a "miséria" não tem necessariamente a ver com dinheiro) para discutir sobre a ambição descomedida que pode ser levada aos últimos níveis (e aqui sim estamos falando só de dinheiro)!
No filme conhecemos Stanton Carlisle (Bradley Cooper), um homem de passado nebuloso que encontra ocupação e companhia junto a outros marginalizados em uma espécie de circo itinerante repleto de espetáculos bizarros. Percebendo ótimas oportunidades de enganar as pessoas utilizando artimanhas bastante duvidosas, Stan se junta a Molly Cahill (Rooney Mara) em busca de melhores oportunidades até se tornar reconhecido como um mentalista famoso, ludibriando a elite rica da sociedade de Nova York dos anos 1940. Já é nesse contexto que ele conhece a psiquiatra Lilith Ritter (Cate Blanchett), iniciando uma parceria entre eles que transforma golpes até então inofensivos em um perigoso jogo de mentiras. Confira o trailer:
É impossível assistir "O Beco do Pesadelo" e não ficar deslumbrado com a qualidade visual do filme - do desenho de produção da premiada Tamara Deverell (Star Trek: Discovery) até a fotografia do sempre genial Dan Laustsen (A Forma da Água). Obviamente que todo departamento de arte segue esse mesmo cuidado estético, ajudando Del Toro a contar essa história com muito esmero visual - reparem como conseguimos perceber a presença de determinados personagens, mesmo antes deles serem totalmente enquadrados para que a cena de fato aconteça.
Ao focar no visual temos a impressão que o roteiro perde força, não é o caso - aqui a adaptação da obra homônima de William Lindsay Gresham se ajusta perfeitamente com a proposta do diretor que mistura elementos fantásticos, com um bom drama de personagem, usando vários gatilhos de suspense (e até de terror, eu diria), em uma dinâmica narrativa muito interessante (mesmo que um pouco longa para o meu gosto). Se no primeiro ato Del Toro nos direciona para um estilo narrativo mais explicativo, a partir do segundo, ele simplesmente transforma a história em uma espécie de fábula que expõe as profundas consequências perante algumas atitudes duvidosas que são tomadas na busca de uma ascensão social frágil e nada honesta.
Se nas cenas iniciais vemos um homem que chegou ao fundo do poço sendo cruelmente explorado por mera diversão, logo nos deparamos com outro que deseja apenas recomeçar sua vida "custe o que custar". Sabiamente Del Toro fomenta essa dicotomia a todo momento, mostrando as fragilidades dos personagens e onde isso pode leva-los. Dito isso, "O Beco do Pesadelo" não deve ser encarado como um suspense noir como o recente "Noite Passada em Soho", muito pelo contrário, o filme é muito mais um drama de personagem na sua essência - que aliás é potencializado pelo irretocável trabalho do trio Bradley Cooper, Cate Blanchett e Rooney Mara, e com a participação luxuosa de Toni Collette e Willem Dafoe.
Vale muito a pena!
"O Beco do Pesadelo" tem a identidade de peso do seu diretor, Guillermo del Toro ("A Forma da Água" e "O Labirinto do Fauno") - visualmente impecável, com um história envolvente e que te prende do começo ao fim (sempre com uma lição escondida). Talvez um pouco menos "poético" que seus dois filmes que citamos, "O Beco do Pesadelo" usa a exploração da miséria humana (e aqui a "miséria" não tem necessariamente a ver com dinheiro) para discutir sobre a ambição descomedida que pode ser levada aos últimos níveis (e aqui sim estamos falando só de dinheiro)!
No filme conhecemos Stanton Carlisle (Bradley Cooper), um homem de passado nebuloso que encontra ocupação e companhia junto a outros marginalizados em uma espécie de circo itinerante repleto de espetáculos bizarros. Percebendo ótimas oportunidades de enganar as pessoas utilizando artimanhas bastante duvidosas, Stan se junta a Molly Cahill (Rooney Mara) em busca de melhores oportunidades até se tornar reconhecido como um mentalista famoso, ludibriando a elite rica da sociedade de Nova York dos anos 1940. Já é nesse contexto que ele conhece a psiquiatra Lilith Ritter (Cate Blanchett), iniciando uma parceria entre eles que transforma golpes até então inofensivos em um perigoso jogo de mentiras. Confira o trailer:
É impossível assistir "O Beco do Pesadelo" e não ficar deslumbrado com a qualidade visual do filme - do desenho de produção da premiada Tamara Deverell (Star Trek: Discovery) até a fotografia do sempre genial Dan Laustsen (A Forma da Água). Obviamente que todo departamento de arte segue esse mesmo cuidado estético, ajudando Del Toro a contar essa história com muito esmero visual - reparem como conseguimos perceber a presença de determinados personagens, mesmo antes deles serem totalmente enquadrados para que a cena de fato aconteça.
Ao focar no visual temos a impressão que o roteiro perde força, não é o caso - aqui a adaptação da obra homônima de William Lindsay Gresham se ajusta perfeitamente com a proposta do diretor que mistura elementos fantásticos, com um bom drama de personagem, usando vários gatilhos de suspense (e até de terror, eu diria), em uma dinâmica narrativa muito interessante (mesmo que um pouco longa para o meu gosto). Se no primeiro ato Del Toro nos direciona para um estilo narrativo mais explicativo, a partir do segundo, ele simplesmente transforma a história em uma espécie de fábula que expõe as profundas consequências perante algumas atitudes duvidosas que são tomadas na busca de uma ascensão social frágil e nada honesta.
Se nas cenas iniciais vemos um homem que chegou ao fundo do poço sendo cruelmente explorado por mera diversão, logo nos deparamos com outro que deseja apenas recomeçar sua vida "custe o que custar". Sabiamente Del Toro fomenta essa dicotomia a todo momento, mostrando as fragilidades dos personagens e onde isso pode leva-los. Dito isso, "O Beco do Pesadelo" não deve ser encarado como um suspense noir como o recente "Noite Passada em Soho", muito pelo contrário, o filme é muito mais um drama de personagem na sua essência - que aliás é potencializado pelo irretocável trabalho do trio Bradley Cooper, Cate Blanchett e Rooney Mara, e com a participação luxuosa de Toni Collette e Willem Dafoe.
Vale muito a pena!
É impossível assistir "O Chalé" (ou "The Lodge", título original) e não lembrar de "Hereditário". De fato existem muitas semelhanças, principalmente por usar de alguns elementos visuais e até de um certo conceito narrativo para trazer o mesmo tom de suspense, porém se o filme do diretor Ari Aster se apoiava no sobrenatural, o da dupla Severin Fiala e Veronika Franz (a mesma do excelente "Boa Noite, Mamãe" de 2014) usa mais do psicológico (mesmo que flertando com o inexplicável).
"O Chalé" conta a história de Aidan (Jaeden Martell) e Mia (Lia McHugh) que após viverem um drama familiar, são levados pelo pai, Richard (Richard Armitage), até um chalé da família para passar o Natal com sua nova namorada, Grace (Riley Keough). O problema é que ele precisa se ausentar alguns uns dias para trabalhar e a única opção é deixar as crianças com Grace, que mal as conhecem e ainda é taxada como a culpada pela separação de Richard. O que poderia ser uma ótima oportunidade de aproximação entre eles, logo se transforma em um verdadeiro terror quando situações inexplicáveis começam acontecer. Confira o trailer:
Na verdade "O Chalé" não me pareceu um filme tão autoral quanto "Hereditário", embora conceitualmente, seja! Minha percepção foi que Severin Fiala e Veronika Franz entregam um filme não tão profundo, sem tantas camadas e que exige menos da interpretação. O que eu quero dizer é que, mesmo misterioso, "O Chalé" é um filme mais fácil de entender, onde as peças do quebra-cabeça vão se encaixando com o tempo e no final tudo faz sentido e pronto - não precisamos sair igual loucos buscando mais informações além do que acabamos de assistir! Sendo assim, é um filme que deve agradar mais pessoas: aquelas que gostam do gênero e pretendem se entreter com ele, sem a necessidade de depois ficar discutindo sobre os mínimos detalhes! Eu gostei e indico com mais tranquilidade que "Hereitário" ou que o próprio "Boa Noite, Mamãe", mas saiba que se você se envolve com esse tipo de narrativa, sua diversão está garantida!
O roteiro de Sergio Casci, Veronika Franz e Severin Fiala consegue criar aquela dúvida interminável desde o momento em que o filme mergulha na tensão entre as crianças e a futura madrasta. O mérito de carregar tantas perguntas sem respostas até o final do segundo ato, merece ser destacado - poucos filmes conseguem manter o nível de tensão, de abstração dos fatos e de mistério com tanta competência. O problema, ao meu ver, é justamente o terceiro ato: não pelo conteúdo, mas pela forma como tudo é resolvido - me pareceu rápido demais! Até a metade do segundo ato, mais ou menos, o roteiro chega a empolgar: ele transita entre uma boa atmosfera de suspense sobrenatural e uma excelente linha de terror psicológico. Não que o final não faça sentido ou que seja ruim, longe disso, ele só é resolvido sem muitos questionamentos, tudo fica muito claro e explicado demais - até alguns enquadramentos são didáticos além da conta.
"O Chalé" não se apoia em tantas alegorias como "Hereditário", embora use muitos elementos que parecem ser até uma cópia do filme de Aster (e lógico que não é); cito duas: a sensação angustiante de misturar planos do chalé com a de uma casa em miniatura, que nos faz perder completamente a noção de espaço e realidade, e as referências às seitas religiosas (ou satânicas, dependendo do ponto de vista) - aqui temos uma cena sensacional gravada em vídeo, bem documental, que é angustiante e que explica muito sobre Grace e seus fantasmas - reparem! Além disso existe um certo mergulho na psiquê dos personagens que também são similares, principalmente da própria Grace (Riley Keough) e de Laura (Alicia Silverstone, em uma participação curta, mas marcante) com relação à Annie de Toni Collette. Sobre o elenco, mais um excelente trabalho, comedido, no tom certo e ao mesmo tempo bastante convincente do Jaeden Martell ("Em defesa de Jacob") - esse menino é um fenômeno e logo será reconhecido por isso - podem me cobrar!
O diretores já haviam provado conhecer exatamente essa gramática cinematográfica do suspense e, mais uma vez, fazem uma leitura visual muito interessante ao fixar a câmera e deixar que os atores contem a história como se estivessem em um palco. Quando escolhem os planos mais fechados, normalmente no rosto dos atores e em momentos extremamente introspectivos, temos a impressão que somos capazes que compreender perfeitamente aquele olhar e ao escutar o silêncio de suas pausas, vem aquela sensação aterrorizante de desconhecido - Riley Keough usa e abusa dessas pausas com muita maestria! A fotografia do grego Thimios Bakatakis (de "O Sacrifício do Cervo Sagrado") é linda e o Desenho de Som do Sylvain Bellemare (vencedor do Oscar com "A Chegada") e Paul Lucien Col (responsável por grandes sucessos da HBO como "Sharp Objects" e "Big Little Lies") é digno de prêmios!
"O Chalé" não é um filme de "sustos", é um filme de personagens complexos em sentimentos que, mesmo sem um mergulho tão profundo, nos provocam a reinterpretar as situações de acordo com a nossa crença - e isso é um dos pontos altos do filme. Ele é angustiante, um pouco claustrofóbico, mas bastante honesto ao construir o suspense baseado em uma trama que não rouba no jogo, que entrega as pistas nos momentos certos e nos deixa viajar em várias teorias. Vale como entretenimento sem a menor dúvida!
É impossível assistir "O Chalé" (ou "The Lodge", título original) e não lembrar de "Hereditário". De fato existem muitas semelhanças, principalmente por usar de alguns elementos visuais e até de um certo conceito narrativo para trazer o mesmo tom de suspense, porém se o filme do diretor Ari Aster se apoiava no sobrenatural, o da dupla Severin Fiala e Veronika Franz (a mesma do excelente "Boa Noite, Mamãe" de 2014) usa mais do psicológico (mesmo que flertando com o inexplicável).
"O Chalé" conta a história de Aidan (Jaeden Martell) e Mia (Lia McHugh) que após viverem um drama familiar, são levados pelo pai, Richard (Richard Armitage), até um chalé da família para passar o Natal com sua nova namorada, Grace (Riley Keough). O problema é que ele precisa se ausentar alguns uns dias para trabalhar e a única opção é deixar as crianças com Grace, que mal as conhecem e ainda é taxada como a culpada pela separação de Richard. O que poderia ser uma ótima oportunidade de aproximação entre eles, logo se transforma em um verdadeiro terror quando situações inexplicáveis começam acontecer. Confira o trailer:
Na verdade "O Chalé" não me pareceu um filme tão autoral quanto "Hereditário", embora conceitualmente, seja! Minha percepção foi que Severin Fiala e Veronika Franz entregam um filme não tão profundo, sem tantas camadas e que exige menos da interpretação. O que eu quero dizer é que, mesmo misterioso, "O Chalé" é um filme mais fácil de entender, onde as peças do quebra-cabeça vão se encaixando com o tempo e no final tudo faz sentido e pronto - não precisamos sair igual loucos buscando mais informações além do que acabamos de assistir! Sendo assim, é um filme que deve agradar mais pessoas: aquelas que gostam do gênero e pretendem se entreter com ele, sem a necessidade de depois ficar discutindo sobre os mínimos detalhes! Eu gostei e indico com mais tranquilidade que "Hereitário" ou que o próprio "Boa Noite, Mamãe", mas saiba que se você se envolve com esse tipo de narrativa, sua diversão está garantida!
O roteiro de Sergio Casci, Veronika Franz e Severin Fiala consegue criar aquela dúvida interminável desde o momento em que o filme mergulha na tensão entre as crianças e a futura madrasta. O mérito de carregar tantas perguntas sem respostas até o final do segundo ato, merece ser destacado - poucos filmes conseguem manter o nível de tensão, de abstração dos fatos e de mistério com tanta competência. O problema, ao meu ver, é justamente o terceiro ato: não pelo conteúdo, mas pela forma como tudo é resolvido - me pareceu rápido demais! Até a metade do segundo ato, mais ou menos, o roteiro chega a empolgar: ele transita entre uma boa atmosfera de suspense sobrenatural e uma excelente linha de terror psicológico. Não que o final não faça sentido ou que seja ruim, longe disso, ele só é resolvido sem muitos questionamentos, tudo fica muito claro e explicado demais - até alguns enquadramentos são didáticos além da conta.
"O Chalé" não se apoia em tantas alegorias como "Hereditário", embora use muitos elementos que parecem ser até uma cópia do filme de Aster (e lógico que não é); cito duas: a sensação angustiante de misturar planos do chalé com a de uma casa em miniatura, que nos faz perder completamente a noção de espaço e realidade, e as referências às seitas religiosas (ou satânicas, dependendo do ponto de vista) - aqui temos uma cena sensacional gravada em vídeo, bem documental, que é angustiante e que explica muito sobre Grace e seus fantasmas - reparem! Além disso existe um certo mergulho na psiquê dos personagens que também são similares, principalmente da própria Grace (Riley Keough) e de Laura (Alicia Silverstone, em uma participação curta, mas marcante) com relação à Annie de Toni Collette. Sobre o elenco, mais um excelente trabalho, comedido, no tom certo e ao mesmo tempo bastante convincente do Jaeden Martell ("Em defesa de Jacob") - esse menino é um fenômeno e logo será reconhecido por isso - podem me cobrar!
O diretores já haviam provado conhecer exatamente essa gramática cinematográfica do suspense e, mais uma vez, fazem uma leitura visual muito interessante ao fixar a câmera e deixar que os atores contem a história como se estivessem em um palco. Quando escolhem os planos mais fechados, normalmente no rosto dos atores e em momentos extremamente introspectivos, temos a impressão que somos capazes que compreender perfeitamente aquele olhar e ao escutar o silêncio de suas pausas, vem aquela sensação aterrorizante de desconhecido - Riley Keough usa e abusa dessas pausas com muita maestria! A fotografia do grego Thimios Bakatakis (de "O Sacrifício do Cervo Sagrado") é linda e o Desenho de Som do Sylvain Bellemare (vencedor do Oscar com "A Chegada") e Paul Lucien Col (responsável por grandes sucessos da HBO como "Sharp Objects" e "Big Little Lies") é digno de prêmios!
"O Chalé" não é um filme de "sustos", é um filme de personagens complexos em sentimentos que, mesmo sem um mergulho tão profundo, nos provocam a reinterpretar as situações de acordo com a nossa crença - e isso é um dos pontos altos do filme. Ele é angustiante, um pouco claustrofóbico, mas bastante honesto ao construir o suspense baseado em uma trama que não rouba no jogo, que entrega as pistas nos momentos certos e nos deixa viajar em várias teorias. Vale como entretenimento sem a menor dúvida!
Mais pela sua história do que propriamente pela qualidade do documentário, "O Diabo no Tribunal" é um filme imperdível para aqueles que gostam de tramas impactantes na linha do sobrenatural e que se deliciaram com "Invocação do Mal 3: A Ordem do Demônio" - até porquê a história de um é a base do outro, naquela linha tênue entre o "true crime" e o "filme de horror". Aqui temos um mergulho dos mais intrigantes em uma atmosfera, de fato, obscura do mundo da possessão demoníaca - as imagens e gravações disponibilizadas pelo diretor Chris Holt (do elogiado "I, Sniper") são realmente impressionantes, contextualizando (e para muitos justificando) o notório caso de David Glatzel, Arne Cheyenne Johnson e o trágico assassinato de Alan Bono.
"The Devil on Trial" (no original) acompanha as investigações dos eventos assustadores que cercam o caso Glatzel-Johnson. O pesadelo começa no início da década de 1980 quando David Glatzel, um garoto de 11 anos, acredita ter sido possuído por uma entidade demoníaca. A situação, no entanto, toma um rumo ainda mais trágico quando Arne Cheyenne Johnson, cunhado de David, diz ser o novo hospedeiro da força sobrenatural e que por isso assassinou seu amigo, Alan Bono. Confira o trailer:
Em um primeiro olhar, o filme se destaca pelo tom assustador da sua narrativa que é 100% validado pela presença de quem realmente esteve envolvido no caso em todas as suas fases, incluindo o próprio David, seus irmãos (Alan e Carl), e até mesmo Arne. A partir de algumas gravações caseiras, com fotos e áudios que nunca antes foram mostrados ao público, as reconstituições com atores que recontam os eventos dão um ar de ficção para o documentário, mas o que mais nos provoca mesmo é o fato de sabermos que tudo aquilo é verdade - ou pelo menos que é a verdade que cada um tem para contar! "Existem pessoas que mentem. Mas eu sentei com o David, o Arne, o Alan e Carl por horas a fio e a história nunca mudou. Eu acho que eles estão me contando a verdade - mas é a interpretação deles da verdade, em vez de ser um fato consolidado. Mas eles acreditam, e eu também acredito, que o que dizem é verdadeiro", disse o diretor Chris Holt para a Variety na época do lançamento.
No entanto, e aí eu acho que "O Diabo no Tribunal" poderia ter ido um pouquinho mais longe, algumas questões vão sendo postas em dúvida. Para começar, o famoso casal Ed e Lorraine Warren, são tratados com certa superficialidade pelo roteiro. Veja, ao mesmo tempo que a participação e histórico da dupla de investigadores soem importantes, a veracidade de suas conquistas são colocadas a prova em todo momento - nem mesmo a rápida retrospectiva sobre eles e os depoimentos de seu neto, Chris McKinnell, ajudam a audiência a ter uma noção definitiva sobre as intenções dos Warren com o caso. Outro ponto que poderia ser melhor explorado (e não da forma "plot twist" que o roteiro propôs) é a relação de Judy Glatzel com seus filhos e marido - a dinâmica familiar me pareceu problemática, no entanto faltou um estilo mais "Making a Murderer" de abordagem.
Para finalizar, eu diria que "O Diabo no Tribunal" transcende as convenções dos documentários de true crime ao adicionar uma camada de horror que explora o impacto visceral da possessão demoníaca na vida daquelas pessoas. A habilidade do Chris Holt em equilibrar a recriação dos eventos com depoimentos reais e evidências que os Warren coletaram proporciona uma experiência mais autêntica e angustiante do que estamos acostumados encontrar no gênero. No entanto, minha única crítica fica pela falta de uma pesquisa mais minuciosa e não apenas na espetacularização dos fatos - essa estratégia narrativa instiga reflexões? Claro que sim, mas fica a sensação de que daria para ir além (sem trocadilhos).
Se você é curioso e gosta do assunto, seu entretenimento está garantido!
Mais pela sua história do que propriamente pela qualidade do documentário, "O Diabo no Tribunal" é um filme imperdível para aqueles que gostam de tramas impactantes na linha do sobrenatural e que se deliciaram com "Invocação do Mal 3: A Ordem do Demônio" - até porquê a história de um é a base do outro, naquela linha tênue entre o "true crime" e o "filme de horror". Aqui temos um mergulho dos mais intrigantes em uma atmosfera, de fato, obscura do mundo da possessão demoníaca - as imagens e gravações disponibilizadas pelo diretor Chris Holt (do elogiado "I, Sniper") são realmente impressionantes, contextualizando (e para muitos justificando) o notório caso de David Glatzel, Arne Cheyenne Johnson e o trágico assassinato de Alan Bono.
"The Devil on Trial" (no original) acompanha as investigações dos eventos assustadores que cercam o caso Glatzel-Johnson. O pesadelo começa no início da década de 1980 quando David Glatzel, um garoto de 11 anos, acredita ter sido possuído por uma entidade demoníaca. A situação, no entanto, toma um rumo ainda mais trágico quando Arne Cheyenne Johnson, cunhado de David, diz ser o novo hospedeiro da força sobrenatural e que por isso assassinou seu amigo, Alan Bono. Confira o trailer:
Em um primeiro olhar, o filme se destaca pelo tom assustador da sua narrativa que é 100% validado pela presença de quem realmente esteve envolvido no caso em todas as suas fases, incluindo o próprio David, seus irmãos (Alan e Carl), e até mesmo Arne. A partir de algumas gravações caseiras, com fotos e áudios que nunca antes foram mostrados ao público, as reconstituições com atores que recontam os eventos dão um ar de ficção para o documentário, mas o que mais nos provoca mesmo é o fato de sabermos que tudo aquilo é verdade - ou pelo menos que é a verdade que cada um tem para contar! "Existem pessoas que mentem. Mas eu sentei com o David, o Arne, o Alan e Carl por horas a fio e a história nunca mudou. Eu acho que eles estão me contando a verdade - mas é a interpretação deles da verdade, em vez de ser um fato consolidado. Mas eles acreditam, e eu também acredito, que o que dizem é verdadeiro", disse o diretor Chris Holt para a Variety na época do lançamento.
No entanto, e aí eu acho que "O Diabo no Tribunal" poderia ter ido um pouquinho mais longe, algumas questões vão sendo postas em dúvida. Para começar, o famoso casal Ed e Lorraine Warren, são tratados com certa superficialidade pelo roteiro. Veja, ao mesmo tempo que a participação e histórico da dupla de investigadores soem importantes, a veracidade de suas conquistas são colocadas a prova em todo momento - nem mesmo a rápida retrospectiva sobre eles e os depoimentos de seu neto, Chris McKinnell, ajudam a audiência a ter uma noção definitiva sobre as intenções dos Warren com o caso. Outro ponto que poderia ser melhor explorado (e não da forma "plot twist" que o roteiro propôs) é a relação de Judy Glatzel com seus filhos e marido - a dinâmica familiar me pareceu problemática, no entanto faltou um estilo mais "Making a Murderer" de abordagem.
Para finalizar, eu diria que "O Diabo no Tribunal" transcende as convenções dos documentários de true crime ao adicionar uma camada de horror que explora o impacto visceral da possessão demoníaca na vida daquelas pessoas. A habilidade do Chris Holt em equilibrar a recriação dos eventos com depoimentos reais e evidências que os Warren coletaram proporciona uma experiência mais autêntica e angustiante do que estamos acostumados encontrar no gênero. No entanto, minha única crítica fica pela falta de uma pesquisa mais minuciosa e não apenas na espetacularização dos fatos - essa estratégia narrativa instiga reflexões? Claro que sim, mas fica a sensação de que daria para ir além (sem trocadilhos).
Se você é curioso e gosta do assunto, seu entretenimento está garantido!
"O Eleito" pode te surpreender, mas será preciso embarcar na proposta de seu criador Mark Millar e ter alguma paciência já que a série de 6 episódios da Netflix começa a engrenar mesmo, lá pelo terceiro episódio. Muito bem dirigida pelo Everardo Gout (de "Caleidoscópio"), essa produção americana falada em espanhol, se aproveita da premissa do ótimo (e até hoje lembrado pelo seu cancelamento prematuro) "Messiah", para discutir o comportamento humano a partir de dogmas religiosos, nos dias de hoje, pela perspectiva de 5 jovens que moram em uma cidadezinha no México em 1999. Além da dinâmica "Stranger Things"da narrativa, é muito importante ressaltar a profundidade que a história vai ganhando ao discutir temas como a idolatria e a megalomania do "todo" perante a jornada mais íntima e, claro, repleta de imperfeições do "indivíduo".
Na trama acompanhamos a história de Jodie (Bobby Luhnow), um jovem de 12 anos que passa a suspeitar ser a reencarnação de Jesus Cristo. Capaz de fazer uma pessoa voltar a andar, transformar água em vinho e até mesmo ressuscitar os mortos, ele precisa aprender a lidar com seu destino durante a fase das maiores descobertas da vida, a adolescência.. Entre a ideia de ser alguém especial ou um garoto que quer apenas se divertir com os amigos, cabe a Jodie decidir se vai ou não atender esse "chamado divino". Confira o trailer:
De fato, a série derrapa um pouco na sua contextualização. Os primeiros episódios soam infantis e desconexos - como se o roteiro tivesse necessidade de estabelecer o conflito logo de cara para rapidamente começar a explorar como Jodie lida com seu destino divino, enfrentando seus desafios pessoais e as forças obscuras que o rodeiam, enquanto tenta compreender e aceitar sua missão. Eu diria, inclusive, que o conceito estético escolhido pelo diretor pouco ajuda nesse momento, já que a montagem é extremamente fragmentada, o aspecto de tela é um pouco desconfortável em seu "antigo" 4:3 e a imagem é bastante granulada. No entanto, ao entender que esse conceito está 100% alinhado com aquele universo onde a história acontece em seu tempo, espaço e assunto, tudo muda - e aí passamos a achar tudo aquilo bem envolvente e imersivo.
A jornada pessoal de Jodie é o coração de "O Eleito" e quando entendemos que suas dúvidas, medos e anseios diante da revelação de sua identidade divina são muito mais profundos do que uma trama infanto-juvenil com toques de sobrenatural, nos conectamos com a série e passamos a nos surpreender com as soluções propostas pelo roteiro. Os relacionamentos complexos entre os personagens que inicialmente soavam superficiais, se transformam em reflexões relevantes: suas lutas internas (e cada um tem a sua) ao lado da necessidade constante dos discursos religiosos de definir o que é do bem e o que é do mal, evocam uma gama de emoções, que vão desde a empatia por alguns personagens até uma tensão improvável pelas ações de outros. Reparem como a paleta de cores, o desenho de produção e arte, além da iluminação e da trilha sonora, são capazes de refletir os aspectos espirituais e terrenos da história com a mesma propriedade.
"O Eleito" é muito feliz em trazer para tela temas universais como identidade, fé e destino - temas esses que naturalmente nos provocam algumas reflexões sobre nossas próprias crenças e escolhas. Agora, o ponto alto dessa premissa, sem dúvida, está em projetar o "e se" de fato algo parecido acontecesse na vida real? Ao explorar com muita habilidade "o sagrado" e "o profano" na jornada de um adolescente com um destino extraordinário, a série oferece uma experiência que desafia, inspira e nos mantém ansiosos por mais episódios - e que as próximas temporadas tragam ainda mais respostas, porque o gancho do final é simplesmente excelente!
Vale seu play!
"O Eleito" pode te surpreender, mas será preciso embarcar na proposta de seu criador Mark Millar e ter alguma paciência já que a série de 6 episódios da Netflix começa a engrenar mesmo, lá pelo terceiro episódio. Muito bem dirigida pelo Everardo Gout (de "Caleidoscópio"), essa produção americana falada em espanhol, se aproveita da premissa do ótimo (e até hoje lembrado pelo seu cancelamento prematuro) "Messiah", para discutir o comportamento humano a partir de dogmas religiosos, nos dias de hoje, pela perspectiva de 5 jovens que moram em uma cidadezinha no México em 1999. Além da dinâmica "Stranger Things"da narrativa, é muito importante ressaltar a profundidade que a história vai ganhando ao discutir temas como a idolatria e a megalomania do "todo" perante a jornada mais íntima e, claro, repleta de imperfeições do "indivíduo".
Na trama acompanhamos a história de Jodie (Bobby Luhnow), um jovem de 12 anos que passa a suspeitar ser a reencarnação de Jesus Cristo. Capaz de fazer uma pessoa voltar a andar, transformar água em vinho e até mesmo ressuscitar os mortos, ele precisa aprender a lidar com seu destino durante a fase das maiores descobertas da vida, a adolescência.. Entre a ideia de ser alguém especial ou um garoto que quer apenas se divertir com os amigos, cabe a Jodie decidir se vai ou não atender esse "chamado divino". Confira o trailer:
De fato, a série derrapa um pouco na sua contextualização. Os primeiros episódios soam infantis e desconexos - como se o roteiro tivesse necessidade de estabelecer o conflito logo de cara para rapidamente começar a explorar como Jodie lida com seu destino divino, enfrentando seus desafios pessoais e as forças obscuras que o rodeiam, enquanto tenta compreender e aceitar sua missão. Eu diria, inclusive, que o conceito estético escolhido pelo diretor pouco ajuda nesse momento, já que a montagem é extremamente fragmentada, o aspecto de tela é um pouco desconfortável em seu "antigo" 4:3 e a imagem é bastante granulada. No entanto, ao entender que esse conceito está 100% alinhado com aquele universo onde a história acontece em seu tempo, espaço e assunto, tudo muda - e aí passamos a achar tudo aquilo bem envolvente e imersivo.
A jornada pessoal de Jodie é o coração de "O Eleito" e quando entendemos que suas dúvidas, medos e anseios diante da revelação de sua identidade divina são muito mais profundos do que uma trama infanto-juvenil com toques de sobrenatural, nos conectamos com a série e passamos a nos surpreender com as soluções propostas pelo roteiro. Os relacionamentos complexos entre os personagens que inicialmente soavam superficiais, se transformam em reflexões relevantes: suas lutas internas (e cada um tem a sua) ao lado da necessidade constante dos discursos religiosos de definir o que é do bem e o que é do mal, evocam uma gama de emoções, que vão desde a empatia por alguns personagens até uma tensão improvável pelas ações de outros. Reparem como a paleta de cores, o desenho de produção e arte, além da iluminação e da trilha sonora, são capazes de refletir os aspectos espirituais e terrenos da história com a mesma propriedade.
"O Eleito" é muito feliz em trazer para tela temas universais como identidade, fé e destino - temas esses que naturalmente nos provocam algumas reflexões sobre nossas próprias crenças e escolhas. Agora, o ponto alto dessa premissa, sem dúvida, está em projetar o "e se" de fato algo parecido acontecesse na vida real? Ao explorar com muita habilidade "o sagrado" e "o profano" na jornada de um adolescente com um destino extraordinário, a série oferece uma experiência que desafia, inspira e nos mantém ansiosos por mais episódios - e que as próximas temporadas tragam ainda mais respostas, porque o gancho do final é simplesmente excelente!
Vale seu play!
"O Farol" ("The Lighthouse", título original) do diretor de "A Bruxa", Robert Eggers, é uma experiência sensorial incrível, porém se apoia em um tipo de narrativa pouco convencional e isso, certamente, vai dividir opiniões - eu diria que é uma experiência bem parecida com a de assistir "Pi" do Darren Aronofsky.
Na história, dois marinheiros: um veterano, Thomas Wake (Willem Dafoe) e um novato, Ephraim Winslow (Robert Pattinson); são enviados para uma ilha, aparentemente, remota, para cuidar da manutenção de um farol. Ambos precisam dividir algumas tarefas e conviver como "colegas de quarto" até que novos marinheiros possam substituí-los. Claro, não demora muito para que a diferença de hierarquia imposta pelo veterano Wake passe a incomodar Winslow tornando esse isolamento, o tédio do dia a dia e a própria convivência entre os dois, insuportável. Confira o trailer:
Como o já mencionado "Pi", "O Farol" é quase um tratado da loucura, ao analisar o comportamento humano quando levado aos extremos - e aqui cabe um observação interessante: existe uma espécie de mitologia entre marinheiros, com lendas e superstições que praticamente moldam o caráter e o respeito dessa classe perante o mar e é justamente a partir desse conceito que os personagens direcionam suas ações durante todo o filme. O grande problema é que a linha tênue entre a realidade e a imaginação vai praticamente se desfazendo conforme os dias vão passando naquele ambiente tão particular e a constante tensão entre Wake e Winslow apenas acelera esse movimento, ou seja, a partir do segundo ato, o filme nos provoca a esperar sempre o pior, já que os limites aceitáveis de uma relação entre duas pessoas simplesmente desaparece! Não espere sustos, o horror não está naquilo que vemos e sim no que sentimos - lembrem-se disso!
O diretor e seu irmão Max Eggers escreveram um roteiro primoroso, que pode até causar um certo estranhamento inicial, já que os diálogos foram construídos em cima de um inglês mais antigo, com linguajar próprio de "velhos homens do mar"! Esse toque conceitual está completamente alinhado com a estética visual do filme: branco e preto, filmado em um aspecto 1.19:1 (mais fechado que os 4:3 das TVs antigas), em 35mm e com lentes da década de 1930. A própria captação do som foi feita em "mono" o que nos provoca uma certa sensação claustrofóbica, de abafado, potencializando a angústia dos personagens, sempre espremidos em ambientes escuros, sujos, mal cuidados. O desenho de som e a trilha sonora do Mark Korven misturam elementos metálicos e graves, ensurdecedores, que dialogam perfeitamente com um certo zumbido do mau tempo constante da ilha!
A direção de Robert Eggers é espetacular, como em seu filme anterior, ele cuida de cada detalhe para que nossa experiência seja inesquecível - e de fato ele alcança esse objetivo. Se possível, assista esse filme com o som bem alto e perceba como até o silêncio atua como catalizador de emoções - veja, para muitos, o filme vai parecer muito mais um delírio autoral do que uma narrativa minimamente compreensível! Acontece que essa escolha conceitual serve justamente para construir uma tensão permanente e quando o diretor de fotografia, Jarin Blaschk (única indicação ao Oscar 2020), enquadra os atores, o que encontramos é uma aula de atuação - tanto de Willem Dafoe, quanto de Robert Pattinson - ambos inacreditavelmente esquecidos pela Academia!
O filme tem um estranho tipo de humor, irônico e sombrio, além disso trabalha o simbolismo como poucos - a referência de Aronofsky acaba fazendo muito sentido por esse ponto de vista! Saiba que se trata de uma história repleta de mistérios, tensão e suspense, pontuadas com ritmo cirúrgico da trilha sonora e com uma conclusão sem nenhuma explicação, mas que chega a nos causar um certo alívio. Como na filmografia de Ari Aster de "Hereditário" e "Midsommar" ou da dupla Severin Fiala e Veronika Franz de "O Chalé" e "Boa Noite, Mamãe", assistir o trabalho de Robert Eggers não deve agradar a todos, mas para quem está disposto a embarcar no "pouco convencional", certamente, o entretenimento de qualidade está garantido!
"O Farol" ("The Lighthouse", título original) do diretor de "A Bruxa", Robert Eggers, é uma experiência sensorial incrível, porém se apoia em um tipo de narrativa pouco convencional e isso, certamente, vai dividir opiniões - eu diria que é uma experiência bem parecida com a de assistir "Pi" do Darren Aronofsky.
Na história, dois marinheiros: um veterano, Thomas Wake (Willem Dafoe) e um novato, Ephraim Winslow (Robert Pattinson); são enviados para uma ilha, aparentemente, remota, para cuidar da manutenção de um farol. Ambos precisam dividir algumas tarefas e conviver como "colegas de quarto" até que novos marinheiros possam substituí-los. Claro, não demora muito para que a diferença de hierarquia imposta pelo veterano Wake passe a incomodar Winslow tornando esse isolamento, o tédio do dia a dia e a própria convivência entre os dois, insuportável. Confira o trailer:
Como o já mencionado "Pi", "O Farol" é quase um tratado da loucura, ao analisar o comportamento humano quando levado aos extremos - e aqui cabe um observação interessante: existe uma espécie de mitologia entre marinheiros, com lendas e superstições que praticamente moldam o caráter e o respeito dessa classe perante o mar e é justamente a partir desse conceito que os personagens direcionam suas ações durante todo o filme. O grande problema é que a linha tênue entre a realidade e a imaginação vai praticamente se desfazendo conforme os dias vão passando naquele ambiente tão particular e a constante tensão entre Wake e Winslow apenas acelera esse movimento, ou seja, a partir do segundo ato, o filme nos provoca a esperar sempre o pior, já que os limites aceitáveis de uma relação entre duas pessoas simplesmente desaparece! Não espere sustos, o horror não está naquilo que vemos e sim no que sentimos - lembrem-se disso!
O diretor e seu irmão Max Eggers escreveram um roteiro primoroso, que pode até causar um certo estranhamento inicial, já que os diálogos foram construídos em cima de um inglês mais antigo, com linguajar próprio de "velhos homens do mar"! Esse toque conceitual está completamente alinhado com a estética visual do filme: branco e preto, filmado em um aspecto 1.19:1 (mais fechado que os 4:3 das TVs antigas), em 35mm e com lentes da década de 1930. A própria captação do som foi feita em "mono" o que nos provoca uma certa sensação claustrofóbica, de abafado, potencializando a angústia dos personagens, sempre espremidos em ambientes escuros, sujos, mal cuidados. O desenho de som e a trilha sonora do Mark Korven misturam elementos metálicos e graves, ensurdecedores, que dialogam perfeitamente com um certo zumbido do mau tempo constante da ilha!
A direção de Robert Eggers é espetacular, como em seu filme anterior, ele cuida de cada detalhe para que nossa experiência seja inesquecível - e de fato ele alcança esse objetivo. Se possível, assista esse filme com o som bem alto e perceba como até o silêncio atua como catalizador de emoções - veja, para muitos, o filme vai parecer muito mais um delírio autoral do que uma narrativa minimamente compreensível! Acontece que essa escolha conceitual serve justamente para construir uma tensão permanente e quando o diretor de fotografia, Jarin Blaschk (única indicação ao Oscar 2020), enquadra os atores, o que encontramos é uma aula de atuação - tanto de Willem Dafoe, quanto de Robert Pattinson - ambos inacreditavelmente esquecidos pela Academia!
O filme tem um estranho tipo de humor, irônico e sombrio, além disso trabalha o simbolismo como poucos - a referência de Aronofsky acaba fazendo muito sentido por esse ponto de vista! Saiba que se trata de uma história repleta de mistérios, tensão e suspense, pontuadas com ritmo cirúrgico da trilha sonora e com uma conclusão sem nenhuma explicação, mas que chega a nos causar um certo alívio. Como na filmografia de Ari Aster de "Hereditário" e "Midsommar" ou da dupla Severin Fiala e Veronika Franz de "O Chalé" e "Boa Noite, Mamãe", assistir o trabalho de Robert Eggers não deve agradar a todos, mas para quem está disposto a embarcar no "pouco convencional", certamente, o entretenimento de qualidade está garantido!
"O Mal que nos Habita" é um terror clássico com aquele toque independente do cinema argentino. Esse filme, aliás, foi considerado o melhor lançamento do gênero em 2023 e mesmo que possa soar um exagero para alguns, é inegável sua qualidade como narrativa e força como gramática visual. O fato é que "Quando acecha la maldade", no original, chega forte ao streaming depois de conquistar crítica e público por sua atmosfera claustrofóbica, por sua proposta mais original e por performances visceralmente convincentes - a repercussão lembrou muito a onda dos elogiados filmes espanhóis de terror e suspense como "Verônica", por exemplo. Agora fica o aviso: a sensação de estar assistindo algo verdadeiramente perturbador vai te acompanhar até subirem os créditos, ou seja, esteja preparado para uma jornada realmente desconfortante!
A trama se passa em uma pacata cidade do interior, onde dois irmãos encontram um corpo mutilado perto de sua propriedade. Ao iniciar uma investigação eles acabam descobrindo um homem infectado por algo misterioso que os mais religiosos dizem ser obra do diabo que está prestes a dar a luz a um demônio. Desesperados, os irmãos tentam avisar os habitantes e assim escapar do local antes que o ser maligno venha à terra, no entanto o tempo parece não estar a seu favor e o caos é instaurado por completo. Confira o trailer:
O interessante desse filme dirigido pelo Demián Rugna (de "Aterrorizados") é justamente sua abordagem crua e sem concessões que raramente encontramos no gênero terror ou do suspense. Muito mais que impactar, os gatilhos narrativos fazem com que a história não se limite em criar oportunidades para os sustos fáceis, mas sim em construir uma atmosfera densa e sufocante, explorando os medos mais primitivos do ser humano em uma jornada cheia de simbolismos. O bacana é que Rugna não esquece do seu propósito de entreter, sem complicar demais, nos confrontando, a cada cena, com sua visão sobre a brutalidade do ser humano sob a perspectiva mística de um Mal que assola aquela cidade - é sério, o que testemunhamos são atos verdadeiramente terríveis que testam a sanidade dos personagens com a mesma força que nos tiram do equilíbrio.
Rugna, que também assina o roteiro, tem uma enorme capacidade de explorar as profundezas da alma humana sem soar pretensioso demais. Repare como a cada decisão tomada pelos protagonistas, somos convidados a questionar nossos próprios limites morais e a refletir sobre a fragilidade da psique diante de situações limite onde o horror pauta ações desesperadas. Obviamente que a possessão demoníaca serve como metáfora para os males que residem dentro de cada um de nós, criando uma sensação de confronto iminente com nossos próprios demônios interiores. Criando um ritmo frenético e hipnotizante desde os primeiros minutos, "O Mal que nos Habita" prende a nossa atenção - a fotografia escura e claustrofóbica contribui para essa imersão em uma atmosfera opressiva, enquanto a trilha sonora mais minimalista estabelece a tensão e desespero ao melhor estilo Stephen King.
"O Mal que nos Habita" vai além do terror convencional, propondo uma reflexão mais profunda sobre a natureza do mal, a fragilidade da psique humana e as consequências de nossas ações. Sem querer ser didático demais, o roteiro nos faz pensar, sentir e questionar aquela realidade - que tem tudo para deixar uma marca profunda em quem o assiste. Agora, é preciso que se diga: a beleza do filme não está nas respostas fáceis - se ele não tem a complexidade de "Midsommar", ele também não é um entretenimento pipoca como "Maligno". Então se você é um apreciador do terror em sua forma mais clássica e perturbadora, sem deixar de ser autêntico, esse filme pode ser mesmo imperdível.
"O Mal que nos Habita" é um terror clássico com aquele toque independente do cinema argentino. Esse filme, aliás, foi considerado o melhor lançamento do gênero em 2023 e mesmo que possa soar um exagero para alguns, é inegável sua qualidade como narrativa e força como gramática visual. O fato é que "Quando acecha la maldade", no original, chega forte ao streaming depois de conquistar crítica e público por sua atmosfera claustrofóbica, por sua proposta mais original e por performances visceralmente convincentes - a repercussão lembrou muito a onda dos elogiados filmes espanhóis de terror e suspense como "Verônica", por exemplo. Agora fica o aviso: a sensação de estar assistindo algo verdadeiramente perturbador vai te acompanhar até subirem os créditos, ou seja, esteja preparado para uma jornada realmente desconfortante!
A trama se passa em uma pacata cidade do interior, onde dois irmãos encontram um corpo mutilado perto de sua propriedade. Ao iniciar uma investigação eles acabam descobrindo um homem infectado por algo misterioso que os mais religiosos dizem ser obra do diabo que está prestes a dar a luz a um demônio. Desesperados, os irmãos tentam avisar os habitantes e assim escapar do local antes que o ser maligno venha à terra, no entanto o tempo parece não estar a seu favor e o caos é instaurado por completo. Confira o trailer:
O interessante desse filme dirigido pelo Demián Rugna (de "Aterrorizados") é justamente sua abordagem crua e sem concessões que raramente encontramos no gênero terror ou do suspense. Muito mais que impactar, os gatilhos narrativos fazem com que a história não se limite em criar oportunidades para os sustos fáceis, mas sim em construir uma atmosfera densa e sufocante, explorando os medos mais primitivos do ser humano em uma jornada cheia de simbolismos. O bacana é que Rugna não esquece do seu propósito de entreter, sem complicar demais, nos confrontando, a cada cena, com sua visão sobre a brutalidade do ser humano sob a perspectiva mística de um Mal que assola aquela cidade - é sério, o que testemunhamos são atos verdadeiramente terríveis que testam a sanidade dos personagens com a mesma força que nos tiram do equilíbrio.
Rugna, que também assina o roteiro, tem uma enorme capacidade de explorar as profundezas da alma humana sem soar pretensioso demais. Repare como a cada decisão tomada pelos protagonistas, somos convidados a questionar nossos próprios limites morais e a refletir sobre a fragilidade da psique diante de situações limite onde o horror pauta ações desesperadas. Obviamente que a possessão demoníaca serve como metáfora para os males que residem dentro de cada um de nós, criando uma sensação de confronto iminente com nossos próprios demônios interiores. Criando um ritmo frenético e hipnotizante desde os primeiros minutos, "O Mal que nos Habita" prende a nossa atenção - a fotografia escura e claustrofóbica contribui para essa imersão em uma atmosfera opressiva, enquanto a trilha sonora mais minimalista estabelece a tensão e desespero ao melhor estilo Stephen King.
"O Mal que nos Habita" vai além do terror convencional, propondo uma reflexão mais profunda sobre a natureza do mal, a fragilidade da psique humana e as consequências de nossas ações. Sem querer ser didático demais, o roteiro nos faz pensar, sentir e questionar aquela realidade - que tem tudo para deixar uma marca profunda em quem o assiste. Agora, é preciso que se diga: a beleza do filme não está nas respostas fáceis - se ele não tem a complexidade de "Midsommar", ele também não é um entretenimento pipoca como "Maligno". Então se você é um apreciador do terror em sua forma mais clássica e perturbadora, sem deixar de ser autêntico, esse filme pode ser mesmo imperdível.
As vezes eu tenho a nítida impressão que até a Netflix se perde dentro do seu sistema de produção e divulgação de conteúdo, deixando títulos excelentes de lado para priorizar aquilo que é, digamos, bem mais duvidoso. Feita essa observação inicial, é impossível não citar a qualidade narrativa e visual de "O Milagre", adaptação do livro homônimo de Emma Donoghue, brilhantemente dirigido pelo chileno Sebastián Lelio (de "Uma Mulher Fantástica"). Embora cadenciado e sem a menor pressa de conectar as pontas soltas, o filme é um drama denso, envolvente e, principalmente, provocador quando usa da metalinguagem para questionar as histórias e crenças enquanto expõe a miopia parental de lidar com fatos extremos através do fundamentalismo - é de embrulhar o estômago.
Na Irlanda de 1862, uma jovem de 11 anos para de comer por 4 meses, mas permanece milagrosamente viva e razoavelmente bem de saúde, chamando a atenção de toda comunidade e de jornalistas mundo afora. A enfermeira inglesa Lib Wright (Florence Pugh) é então chamada para observar Anna O'Donnell (Kíla Lord Cassidy) e assim tentar entender o que está acontecendo e provar a veracidade dos fatos. Nesse drama psicológico, o grande mistério gira em torno de uma aldeia extremamente religiosa que acredita estar abrigando uma santa - ou mistérios mais sinistros do que parecem. Confira o trailer:
Adaptado pelo próprio Lelio ao lado Alice Birch (do ótimo "Normal People"), o roteiro de "O Milagre" é extremamente feliz ao equilibrar alguns elementos narrativos que pontuam assuntos espinhosos como "fé" e "ceticismo", transportando temas tão atuais para um universo quase figurado do século XIX em um período marcado pela "Grande Fome". Aliás, essa ligação entre a forma e o conteúdo com que observamos determinados temas ao longo do tempo, cria um verdadeiro embate emocional na história do filme, permitindo ao diretor se aproveitar de uma proposta curiosa (que se inicia no prólogo) para nos convidar a embarcar em uma jornada aparentemente real, mas com claros ares de ficção, como se procurasse nos detalhes, o nosso julgamento ideológico que se encerra em um epílogo muito criativo onde uma pergunta parece martelar nossa cabeça: estamos "dentro" (in) ou "fora" (out) daquilo tudo?
O filme é uma pintura, o que naturalmente contrasta com o peso da narrativa e das introspectivas performances de Pugh e Cassidy. A diretora de fotografia Ari Wegner (indicada ao Oscar por "Ataque dos Cães"), se aproveita das belas locações, bem como do desenho de produção digno de prêmios, para construir planos lindos e sensivelmente profundos - sem exagero, lembra muito o elogiado trabalho de Claire Mathon em "Retrato de uma Jovem em Chamas" de 2019. Esse esmero visual funciona tão bem para narrativa que Lelio chega a dar um leve toque de Robert Eggers (de "A Bruxa") para a trama, criando uma a sensação permanente de desconforto apoiado em um quase insuportável grunhido de cordas e de sons da natureza do compositor Matthew Herbert.
Inexplicavelmente esquecido no Oscar 2023, "O Milagre" foi indicado na categoria "Melhor Filme" no BAFTA - chancelando a qualidade técnica e artística da produção da Netflix que, sem a menor sombra de dúvidas, consegue entregar um drama da melhor qualidade e poderoso para aqueles dispostos a refletir sobre temas que vão além do que é mostrado nas telas, mas que de alguma maneira fazem parte de nossa percepção de como enxergamos o mundo - mesmo que em outra realidade.
Vale muito o seu play!
As vezes eu tenho a nítida impressão que até a Netflix se perde dentro do seu sistema de produção e divulgação de conteúdo, deixando títulos excelentes de lado para priorizar aquilo que é, digamos, bem mais duvidoso. Feita essa observação inicial, é impossível não citar a qualidade narrativa e visual de "O Milagre", adaptação do livro homônimo de Emma Donoghue, brilhantemente dirigido pelo chileno Sebastián Lelio (de "Uma Mulher Fantástica"). Embora cadenciado e sem a menor pressa de conectar as pontas soltas, o filme é um drama denso, envolvente e, principalmente, provocador quando usa da metalinguagem para questionar as histórias e crenças enquanto expõe a miopia parental de lidar com fatos extremos através do fundamentalismo - é de embrulhar o estômago.
Na Irlanda de 1862, uma jovem de 11 anos para de comer por 4 meses, mas permanece milagrosamente viva e razoavelmente bem de saúde, chamando a atenção de toda comunidade e de jornalistas mundo afora. A enfermeira inglesa Lib Wright (Florence Pugh) é então chamada para observar Anna O'Donnell (Kíla Lord Cassidy) e assim tentar entender o que está acontecendo e provar a veracidade dos fatos. Nesse drama psicológico, o grande mistério gira em torno de uma aldeia extremamente religiosa que acredita estar abrigando uma santa - ou mistérios mais sinistros do que parecem. Confira o trailer:
Adaptado pelo próprio Lelio ao lado Alice Birch (do ótimo "Normal People"), o roteiro de "O Milagre" é extremamente feliz ao equilibrar alguns elementos narrativos que pontuam assuntos espinhosos como "fé" e "ceticismo", transportando temas tão atuais para um universo quase figurado do século XIX em um período marcado pela "Grande Fome". Aliás, essa ligação entre a forma e o conteúdo com que observamos determinados temas ao longo do tempo, cria um verdadeiro embate emocional na história do filme, permitindo ao diretor se aproveitar de uma proposta curiosa (que se inicia no prólogo) para nos convidar a embarcar em uma jornada aparentemente real, mas com claros ares de ficção, como se procurasse nos detalhes, o nosso julgamento ideológico que se encerra em um epílogo muito criativo onde uma pergunta parece martelar nossa cabeça: estamos "dentro" (in) ou "fora" (out) daquilo tudo?
O filme é uma pintura, o que naturalmente contrasta com o peso da narrativa e das introspectivas performances de Pugh e Cassidy. A diretora de fotografia Ari Wegner (indicada ao Oscar por "Ataque dos Cães"), se aproveita das belas locações, bem como do desenho de produção digno de prêmios, para construir planos lindos e sensivelmente profundos - sem exagero, lembra muito o elogiado trabalho de Claire Mathon em "Retrato de uma Jovem em Chamas" de 2019. Esse esmero visual funciona tão bem para narrativa que Lelio chega a dar um leve toque de Robert Eggers (de "A Bruxa") para a trama, criando uma a sensação permanente de desconforto apoiado em um quase insuportável grunhido de cordas e de sons da natureza do compositor Matthew Herbert.
Inexplicavelmente esquecido no Oscar 2023, "O Milagre" foi indicado na categoria "Melhor Filme" no BAFTA - chancelando a qualidade técnica e artística da produção da Netflix que, sem a menor sombra de dúvidas, consegue entregar um drama da melhor qualidade e poderoso para aqueles dispostos a refletir sobre temas que vão além do que é mostrado nas telas, mas que de alguma maneira fazem parte de nossa percepção de como enxergamos o mundo - mesmo que em outra realidade.
Vale muito o seu play!
"O Pálido Olho Azul" é excelente! Mesmo com um estilo narrativo um pouco mais cadenciado, com diálogos cheio de nuances e uma fotografia um pouco mais densa, eu diria que a história é muito bem amarrada, construída em cima de camadas bem desenvolvidas e com um final que pode surpreender muita gente - sem falar, óbvio, na performance digna de prêmios de Christian Bale e Harry Melling.
Baseado no romance de Louis Bayard, o filme acompanha o detetive Augustus Landor (Bale) que viaja para West Point, em Nova York, para investigar uma série de assassinatos assombrosos que colocam em xeque a reputação e a segurança da Academia Militar dos Estados Unidos. Ao chegar lá, Landor se alia a um dos cadetes locais, Edgar Allan Poe (Melling), para encontrar pistas acerca de quem pode estar por trás dos crimes. Entretanto, o detetive descobre que as coisas são muito mais complicadas do que parecem quando ele compreende que os homicídios são apenas o primeiro passo de um plano ainda mais macabro. Confira o trailer:
Em uma temporada onde Benoit Blanc trouxe seu charme para o segundo capítulo de "Knives Out" com muito mistério, leveza e um toque homeopático de humor, transportar exatamente o mesmo subgênero investigativo para 1830, em um cenário mais sinistro, que se confunde entre a literatura e o teatro, ao melhor estilo Sherlock Holmes, só que dessa vez pautado no drama mais obscuro, com um forte elemento de suspense sobrenatural, é no mínimo um risco calculado! O filme muito bem dirigido pelo Scott Cooper (de "Espíritos Obscuros") nos convida para uma imersão clara naquela atmosfera gélida e esfumaçada, onde os personagens carregam no olhar o sofrimento de suas histórias mais íntimas ao mesmo tempo em que precisam lidar com o medo do desconhecido.
Mesmo com um roteiro que mostra certa dificuldade para unir essas duas pontas, muitas vezes se apoiando em diálogos expositivos demais, é de se elogiar a forma como a atmosfera de "The Pale Blue Eye"(no original) nos envolve - existe uma tensão constante em meio a um afinado elemento gótico, poético e excêntrico personificado em Edgar Allan Poe que se encaixa perfeitamente ao estilo investigativo de Landor que parece beber na mesma fonte de Robert Langdon e da simbologia "ocultista" de Dan Brown.
Tecnicamente muito bem realizado, "O Pálido Olho Azul" tem o impacto necessário para nos deixar muito satisfeito com sua resolução, mesmo que soe um pouco exagerado em alguns momentos. As peças se encaixam perfeitamente e olhando em retrospectiva, tudo faz sentido - do seu conceito narrativo que se mostra completamente alinhado com a forma como Cooper e o diretor de fotografia, Masanobu Takayanagi (de "O canto do cisne"), decodificam as falhas de caráter do ser humano à dicotomia de um universo misterioso dividido entre o fúnebre e a paixão pela vida.
Vale muito seu play!
"O Pálido Olho Azul" é excelente! Mesmo com um estilo narrativo um pouco mais cadenciado, com diálogos cheio de nuances e uma fotografia um pouco mais densa, eu diria que a história é muito bem amarrada, construída em cima de camadas bem desenvolvidas e com um final que pode surpreender muita gente - sem falar, óbvio, na performance digna de prêmios de Christian Bale e Harry Melling.
Baseado no romance de Louis Bayard, o filme acompanha o detetive Augustus Landor (Bale) que viaja para West Point, em Nova York, para investigar uma série de assassinatos assombrosos que colocam em xeque a reputação e a segurança da Academia Militar dos Estados Unidos. Ao chegar lá, Landor se alia a um dos cadetes locais, Edgar Allan Poe (Melling), para encontrar pistas acerca de quem pode estar por trás dos crimes. Entretanto, o detetive descobre que as coisas são muito mais complicadas do que parecem quando ele compreende que os homicídios são apenas o primeiro passo de um plano ainda mais macabro. Confira o trailer:
Em uma temporada onde Benoit Blanc trouxe seu charme para o segundo capítulo de "Knives Out" com muito mistério, leveza e um toque homeopático de humor, transportar exatamente o mesmo subgênero investigativo para 1830, em um cenário mais sinistro, que se confunde entre a literatura e o teatro, ao melhor estilo Sherlock Holmes, só que dessa vez pautado no drama mais obscuro, com um forte elemento de suspense sobrenatural, é no mínimo um risco calculado! O filme muito bem dirigido pelo Scott Cooper (de "Espíritos Obscuros") nos convida para uma imersão clara naquela atmosfera gélida e esfumaçada, onde os personagens carregam no olhar o sofrimento de suas histórias mais íntimas ao mesmo tempo em que precisam lidar com o medo do desconhecido.
Mesmo com um roteiro que mostra certa dificuldade para unir essas duas pontas, muitas vezes se apoiando em diálogos expositivos demais, é de se elogiar a forma como a atmosfera de "The Pale Blue Eye"(no original) nos envolve - existe uma tensão constante em meio a um afinado elemento gótico, poético e excêntrico personificado em Edgar Allan Poe que se encaixa perfeitamente ao estilo investigativo de Landor que parece beber na mesma fonte de Robert Langdon e da simbologia "ocultista" de Dan Brown.
Tecnicamente muito bem realizado, "O Pálido Olho Azul" tem o impacto necessário para nos deixar muito satisfeito com sua resolução, mesmo que soe um pouco exagerado em alguns momentos. As peças se encaixam perfeitamente e olhando em retrospectiva, tudo faz sentido - do seu conceito narrativo que se mostra completamente alinhado com a forma como Cooper e o diretor de fotografia, Masanobu Takayanagi (de "O canto do cisne"), decodificam as falhas de caráter do ser humano à dicotomia de um universo misterioso dividido entre o fúnebre e a paixão pela vida.
Vale muito seu play!
"O que ficou para trás" é um filme cheio de simbolismo e não por isso menos assustador! Bem ao estilo Jordan Peele ("Corra" e "Nós"), essa produção ds Netflix com a BBC será uma agradável surpresa para quem gosta de um suspense psicológico com elementos sobrenaturais. Talvez com uma temática menos convencional, o filme se arrisca muito na concepção narrativa, mas ao mesmo tempo entrega um conceito visual simples e que se ajusta perfeitamente na proposta do diretor, o estreante Remi Weekes.
Na história, um jovem casal, Rial (Wunmi Mosaku) e Bol (Sope Dirisu) consegue escapar da guerra civil no Sudão e, depois de completarem a difícil jornada até o Reino Unido, acabam detidos em um centro de refugiados. A esperança de uma vida digna e segura começa a se tornar realidade quando eles são liberados e se mudam para uma casa indicada pelo governo local. Porém uma série de fenômenos sobrenaturais começa a assombra-los, transformando o inicio de uma nova vida em um verdadeiro pesadelo. O que eles precisam descobrir é se de fato existe algo sinistro escondido nas paredes da casa ou se são seus fantasmas mais íntimos que voltaram para cobrar por suas decisões! Confira o trailer:
Embora os sustos realmente aconteçam enquanto assistimos ao filme, eu diria que toda aquela conhecida e importante gramática cinematográfica que envolve os elementos sobrenaturais de uma casa mal-assombrada serve muito mais como simbolismo para lidar a culpa, com os traumas e, claro, com as perdas de refugiar-se em um outro país, do que de bengala para prender a atenção da audiência! Então fica a primeira dica: enxergue além do que está na tela! As batidas nas paredes são muito mais profundas do que o medo que elas podem causar e isso vai impactar diretamente na sua experiência ao assistir "O que ficou para trás"! Vamos falar mais sobre isso abaixo, mas se você gosta de um suspense inteligente e não muito difícil, essa é uma ótima opção e fique tranquilo: as respostas mais importantes virão!
Para começar, sugiro uma reflexão: reparem como um roteiro bem escrito nos provoca uma sensação de realidade mesmo quando lidamos com elementos completamente fantasiosos. Em "His House" (título original) encontramos o equilíbrio perfeito entre o passado e o presente: a história é contada de maneira econômica e nem por isso deixa de ser auto-explicativa. De cara sabemos o que aconteceu durante a fuga do Sudão, entendemos o peso da dor que Rial e Bol carregam e ainda vemos como suas crenças interferem na esperança de "começar de novo". Apesar de alguns traumas do passado pontuarem a narrativa, o preconceito e a intolerância são os fantasmas do dia a dia - veja, quando eles ganham o direito de sair do abrigo de refugiados para viverem em um novo local, percebemos a força das restrições impostas, o que eleva a tensão a cada ação (ou situação) já que o governo está apenas esperando algum vacilo para justificar uma deportação.
A casa parece ser apenas uma ferramenta para explorar essa tensão e aqui a direção de Weekes merece elogios: ele demonstra total domínio sobre os clichês do gênero, oferecendo muitos sustos ao mesmo tempo que desencadeia a dúvida sobre a sanidade dos personagens - e esse não seria o motivo suficiente que o governo precisa para expulsá-los? Enquanto Bol tenta lidar com a razão, Rial faz questão de cultivar os rituais de sua terra natal e isso faz com que o casal se desconecte! O bacana é que a entrada dos elementos sobrenaturais na história apenas enaltece as discussões sócio-culturais entre o casal e suas experiências fora de casa, acabam ganhando "forma" com a presença sobrenatural que os assombram. Percebam como a complexidade do tema vai além do que vemos na tela!
"O que ficou para trás" é um ótimo exemplo de um filme bem escrito, bem realizado, bem produzido e completamente adaptado ao baixo orçamento, que resolve as limitações técnicas com muita criatividade e competência! O elenco está impecável, tanto Sope Dirisu, quanto Wunmi Mosaku, são verdadeiros talentos! O trabalho de Weekes é seguro, do roteiro à direção, e com muita simplicidade consegue assustar ao mesmo tempo em que levanta discussões relevantes (Jordan Peele fazendo escola).
Mesmo com várias alegorias estéticas, o filme é simples para quem enxerga superficialmente e inteligente para quem busca uma maior profundidade no texto, ou seja, a chance de agradar aos dois públicos será muito grande - se puder, fique com a segunda forma de ver e enxergar a história! Vale muito a pena o seu play!
"O que ficou para trás" é um filme cheio de simbolismo e não por isso menos assustador! Bem ao estilo Jordan Peele ("Corra" e "Nós"), essa produção ds Netflix com a BBC será uma agradável surpresa para quem gosta de um suspense psicológico com elementos sobrenaturais. Talvez com uma temática menos convencional, o filme se arrisca muito na concepção narrativa, mas ao mesmo tempo entrega um conceito visual simples e que se ajusta perfeitamente na proposta do diretor, o estreante Remi Weekes.
Na história, um jovem casal, Rial (Wunmi Mosaku) e Bol (Sope Dirisu) consegue escapar da guerra civil no Sudão e, depois de completarem a difícil jornada até o Reino Unido, acabam detidos em um centro de refugiados. A esperança de uma vida digna e segura começa a se tornar realidade quando eles são liberados e se mudam para uma casa indicada pelo governo local. Porém uma série de fenômenos sobrenaturais começa a assombra-los, transformando o inicio de uma nova vida em um verdadeiro pesadelo. O que eles precisam descobrir é se de fato existe algo sinistro escondido nas paredes da casa ou se são seus fantasmas mais íntimos que voltaram para cobrar por suas decisões! Confira o trailer:
Embora os sustos realmente aconteçam enquanto assistimos ao filme, eu diria que toda aquela conhecida e importante gramática cinematográfica que envolve os elementos sobrenaturais de uma casa mal-assombrada serve muito mais como simbolismo para lidar a culpa, com os traumas e, claro, com as perdas de refugiar-se em um outro país, do que de bengala para prender a atenção da audiência! Então fica a primeira dica: enxergue além do que está na tela! As batidas nas paredes são muito mais profundas do que o medo que elas podem causar e isso vai impactar diretamente na sua experiência ao assistir "O que ficou para trás"! Vamos falar mais sobre isso abaixo, mas se você gosta de um suspense inteligente e não muito difícil, essa é uma ótima opção e fique tranquilo: as respostas mais importantes virão!
Para começar, sugiro uma reflexão: reparem como um roteiro bem escrito nos provoca uma sensação de realidade mesmo quando lidamos com elementos completamente fantasiosos. Em "His House" (título original) encontramos o equilíbrio perfeito entre o passado e o presente: a história é contada de maneira econômica e nem por isso deixa de ser auto-explicativa. De cara sabemos o que aconteceu durante a fuga do Sudão, entendemos o peso da dor que Rial e Bol carregam e ainda vemos como suas crenças interferem na esperança de "começar de novo". Apesar de alguns traumas do passado pontuarem a narrativa, o preconceito e a intolerância são os fantasmas do dia a dia - veja, quando eles ganham o direito de sair do abrigo de refugiados para viverem em um novo local, percebemos a força das restrições impostas, o que eleva a tensão a cada ação (ou situação) já que o governo está apenas esperando algum vacilo para justificar uma deportação.
A casa parece ser apenas uma ferramenta para explorar essa tensão e aqui a direção de Weekes merece elogios: ele demonstra total domínio sobre os clichês do gênero, oferecendo muitos sustos ao mesmo tempo que desencadeia a dúvida sobre a sanidade dos personagens - e esse não seria o motivo suficiente que o governo precisa para expulsá-los? Enquanto Bol tenta lidar com a razão, Rial faz questão de cultivar os rituais de sua terra natal e isso faz com que o casal se desconecte! O bacana é que a entrada dos elementos sobrenaturais na história apenas enaltece as discussões sócio-culturais entre o casal e suas experiências fora de casa, acabam ganhando "forma" com a presença sobrenatural que os assombram. Percebam como a complexidade do tema vai além do que vemos na tela!
"O que ficou para trás" é um ótimo exemplo de um filme bem escrito, bem realizado, bem produzido e completamente adaptado ao baixo orçamento, que resolve as limitações técnicas com muita criatividade e competência! O elenco está impecável, tanto Sope Dirisu, quanto Wunmi Mosaku, são verdadeiros talentos! O trabalho de Weekes é seguro, do roteiro à direção, e com muita simplicidade consegue assustar ao mesmo tempo em que levanta discussões relevantes (Jordan Peele fazendo escola).
Mesmo com várias alegorias estéticas, o filme é simples para quem enxerga superficialmente e inteligente para quem busca uma maior profundidade no texto, ou seja, a chance de agradar aos dois públicos será muito grande - se puder, fique com a segunda forma de ver e enxergar a história! Vale muito a pena o seu play!
"O Telefone Preto" chega com aquele ar de "clássico do suspense" em pleno 2022! Sim, pode parecer brincadeira, mas o filme do diretor Scott Derrickson (de "O Exorcismo de Emily Rose" e "A Entidade") recupera elementos narrativos que equilibram perfeitamente o "psicológico" com o "sobrenatural" ao melhor estilo "Stephen King" (mas sem decepcionar no final) - aliás, diga-se de passagem, o conto que deu origem ao filme é de autoria do filho de King, Joe Hill e foi retirado do best-seller do New York Times, "Fantasmas do Século XX".
Finney Shaw (Mason Thames), um menino tímido e inteligente, de 13 anos, é sequestrado pelo sádico "Grabbler" (Ethan Hawke) e preso em um porão à prova de som. Quando um telefone preto desconectado na parede começa a tocar, Finney descobre que pode ouvir as vozes das cinco vítimas anteriores do assassino. São eles que tentam garantir que Finney possa ter um destino diferente do deles. Confira o trailer:
É bem possível que você, amante do gênero, tenha a impressão de já ter assistido algo semelhante ao "O Telefone Preto". O roteiro do próprio Derrickson com seu parceiro de "A Entidade" e "Doutor Estranho I", C. Robert Cargill, traz fortes referências de filmes como "It" e o "O Sexto Sentido" - eu diria até que não seria nada absurdo dizer que aqui temos uma mistura das duas obras, com seus méritos, com seus clichês e com suas falhas (mesmo que nenhuma delas impactem na nossa experiência como audiência se estivermos dispostos a mergulhar naquele universo proposto pela história).
Um dos grandes méritos de Derrickson é o de criar personagens interessantes e profundos que geram empatia logo de cara - ninguém gosta de ver um garoto bonzinho sendo ameaçado na escola ou a irmã mais nova apanhando do pai alcoólatra e depressivo. Aliás, mesmo como coadjuvante, Jeremy Davies (o inesquecível Dr. Daniel Faraday de "Lost") está excelente como o pai de Finney e de sua irmã Gwen (Madeleine McGraw). Pois bem, estabelecida essa conexão com o protagonista, é impossível pensar que a trama de suspense que vem pela frente não possa ser bem sucedida, afinal já nos importamos com os personagens e com suas dores. Mas o diretor ainda fortalece essa possibilidade ao mostrar sua enorme competência em criar uma atmosfera aterrorizante: se você lembrar do drama psicológico e perturbador de "3096 Dias" ou dos sustos de "A Entidade", vai entender exatamente o que "O Telefone Preto" quer te provocar.
Alinhar as expectativas será essencial para que você se envolva com o filme, ou seja, "O Telefone Preto" não é (e muito menos se propõe a ser) um terror raiz. Derrickson está bem mais preocupado na criação de uma tensão constante do que em te impactar com imagens grotescas ou banhos de sangue - não que não tenha, mas não é o que vai mais te interessar. Se o protagonista parece ter saído de "Stranger Things" enquanto o antagonista deixa claro ser grande fã de John Kramer (de "Jogos Mortais") e de Hannibal Lecter (de "Silêncio dos Inocentes") é de se esperar uma trama com uma boa história, alguns sustos e ótimos personagens - e é isso!
Antes de finalizar, reparou como eu citei vários filmes para descrever essa produção da Blumhouse? Pois bem, será essa a receita que vai te fazer ficar satisfeito quando os créditos subirem!
Vale o play!
"O Telefone Preto" chega com aquele ar de "clássico do suspense" em pleno 2022! Sim, pode parecer brincadeira, mas o filme do diretor Scott Derrickson (de "O Exorcismo de Emily Rose" e "A Entidade") recupera elementos narrativos que equilibram perfeitamente o "psicológico" com o "sobrenatural" ao melhor estilo "Stephen King" (mas sem decepcionar no final) - aliás, diga-se de passagem, o conto que deu origem ao filme é de autoria do filho de King, Joe Hill e foi retirado do best-seller do New York Times, "Fantasmas do Século XX".
Finney Shaw (Mason Thames), um menino tímido e inteligente, de 13 anos, é sequestrado pelo sádico "Grabbler" (Ethan Hawke) e preso em um porão à prova de som. Quando um telefone preto desconectado na parede começa a tocar, Finney descobre que pode ouvir as vozes das cinco vítimas anteriores do assassino. São eles que tentam garantir que Finney possa ter um destino diferente do deles. Confira o trailer:
É bem possível que você, amante do gênero, tenha a impressão de já ter assistido algo semelhante ao "O Telefone Preto". O roteiro do próprio Derrickson com seu parceiro de "A Entidade" e "Doutor Estranho I", C. Robert Cargill, traz fortes referências de filmes como "It" e o "O Sexto Sentido" - eu diria até que não seria nada absurdo dizer que aqui temos uma mistura das duas obras, com seus méritos, com seus clichês e com suas falhas (mesmo que nenhuma delas impactem na nossa experiência como audiência se estivermos dispostos a mergulhar naquele universo proposto pela história).
Um dos grandes méritos de Derrickson é o de criar personagens interessantes e profundos que geram empatia logo de cara - ninguém gosta de ver um garoto bonzinho sendo ameaçado na escola ou a irmã mais nova apanhando do pai alcoólatra e depressivo. Aliás, mesmo como coadjuvante, Jeremy Davies (o inesquecível Dr. Daniel Faraday de "Lost") está excelente como o pai de Finney e de sua irmã Gwen (Madeleine McGraw). Pois bem, estabelecida essa conexão com o protagonista, é impossível pensar que a trama de suspense que vem pela frente não possa ser bem sucedida, afinal já nos importamos com os personagens e com suas dores. Mas o diretor ainda fortalece essa possibilidade ao mostrar sua enorme competência em criar uma atmosfera aterrorizante: se você lembrar do drama psicológico e perturbador de "3096 Dias" ou dos sustos de "A Entidade", vai entender exatamente o que "O Telefone Preto" quer te provocar.
Alinhar as expectativas será essencial para que você se envolva com o filme, ou seja, "O Telefone Preto" não é (e muito menos se propõe a ser) um terror raiz. Derrickson está bem mais preocupado na criação de uma tensão constante do que em te impactar com imagens grotescas ou banhos de sangue - não que não tenha, mas não é o que vai mais te interessar. Se o protagonista parece ter saído de "Stranger Things" enquanto o antagonista deixa claro ser grande fã de John Kramer (de "Jogos Mortais") e de Hannibal Lecter (de "Silêncio dos Inocentes") é de se esperar uma trama com uma boa história, alguns sustos e ótimos personagens - e é isso!
Antes de finalizar, reparou como eu citei vários filmes para descrever essa produção da Blumhouse? Pois bem, será essa a receita que vai te fazer ficar satisfeito quando os créditos subirem!
Vale o play!
É tipo "Lost"! Se você já ouviu falar da nova série de mistério, "Origem" (ou "From" em seu original), é bem possível que a afirmação sobre a semelhança com o sucesso dos anos 2000, "Lost", venha logo em seguida para chancelar sua história que, de fato, carrega muitos elementos narrativos da série de J. J. Abrams, Jeffrey Lieber, Damon Lindelof. Aliás, nem só no roteiro encontramos semelhanças, mas também na fotografia, na direção, na trilha sonora e, obviamente, no mood da série - e isso tem seu lado bom, afinal é inegável o envolvimento da audiência com esse tipo de trama; mas também carrega o seu lado ruim, afinal, será que com tantas perguntas abertas, seu criador, John Griffi, sabe para onde está conduzindo a história?
Basicamente "Origem" acompanha os residentes de uma misteriosa cidade que simplesmente aprisiona todos que chegam ali. Enquanto alguns deles tentam desesperadamente escapar do local, todos os moradores precisam sobreviver às ameaças que vem floresta: criaturas terríveis que aparecem a noite e que tentam te convencer a deixa-las entrar em suas casas (para matar). Confira o trailer:
Produzida pelos irmãos Russo e por Jack Bender, uma das mentes criativas que também produziu e dirigiu "Lost", "Origem" chama a atenção de cara por toda atmosfera de tensão que o primeiro episódio foi capaz dos nos apresentar - sem, obviamente, gastar o orçamento absurdo (para época) do piloto de duas horas de "Lost". É inegável que o novo projeto de Griffi possui um roteiro dos mais inteligentes, repleto de possibilidades e teorias que funcionam como isca para que a audiência não pare de assistir os demais episódios por nada desse mundo - a trama é uma verdadeira batalha contra o desconhecido, onde a nossa paciência e capacidade de dedução, ainda bem, são colocadas à prova novamente, 15 anos depois.
Embora a cidade seja um organismo vivo, como a ilha, existe um certo receio de "viajar demais" e isso acaba trazendo uma sensação de equilíbrio para a história que transita perfeitamente entre o suspense, o terror e drama - bem na linha Stephen King, diga-se de passagem. Bender, como diretor, sabe das fragilidades de "Lost" (que nunca foi na direção) então praticamente repete só o que deu certo, ou seja,submeter seus personagens ao desconhecido, ao terror daquilo que não se pode descrever com exatidão, e como isso aproveita dos pesadelos torturantes de vários episódios para em algum momento também oferecer um suspiro de esperança - suficiente para que a audiência acredite que teremos algumas respostas em breve em meio a algumas teorias e suposições.
"Origem" tem cara de TV aberta, mas é do MGM+, então com certeza, não deve sofrer com episódios sem força para suportar a trama. Isso é bem perceptível na primeira temporada inteira que praticamente nos deixa sem fôlego em várias passagens - a sequência da invasão da Casa Colônia é angustiante, embora tenha faltado um pouco mais de coragem para o roteiro ser ainda mais impactante (algo como o "casamento vermelho", por exemplo). Nada que prejudique, muito pelo contrário, já que o potencial está ali e é perceptível. Depois de dez episódios, minha mais sincera impressão é que finalmente "Lost" pode encontrar sua redenção graças ao "primo pobre" que aprendeu a lição e se transformou em um grande fenômeno justamente por isso! Vamos aguardar!
Vale muito o seu play!
É tipo "Lost"! Se você já ouviu falar da nova série de mistério, "Origem" (ou "From" em seu original), é bem possível que a afirmação sobre a semelhança com o sucesso dos anos 2000, "Lost", venha logo em seguida para chancelar sua história que, de fato, carrega muitos elementos narrativos da série de J. J. Abrams, Jeffrey Lieber, Damon Lindelof. Aliás, nem só no roteiro encontramos semelhanças, mas também na fotografia, na direção, na trilha sonora e, obviamente, no mood da série - e isso tem seu lado bom, afinal é inegável o envolvimento da audiência com esse tipo de trama; mas também carrega o seu lado ruim, afinal, será que com tantas perguntas abertas, seu criador, John Griffi, sabe para onde está conduzindo a história?
Basicamente "Origem" acompanha os residentes de uma misteriosa cidade que simplesmente aprisiona todos que chegam ali. Enquanto alguns deles tentam desesperadamente escapar do local, todos os moradores precisam sobreviver às ameaças que vem floresta: criaturas terríveis que aparecem a noite e que tentam te convencer a deixa-las entrar em suas casas (para matar). Confira o trailer:
Produzida pelos irmãos Russo e por Jack Bender, uma das mentes criativas que também produziu e dirigiu "Lost", "Origem" chama a atenção de cara por toda atmosfera de tensão que o primeiro episódio foi capaz dos nos apresentar - sem, obviamente, gastar o orçamento absurdo (para época) do piloto de duas horas de "Lost". É inegável que o novo projeto de Griffi possui um roteiro dos mais inteligentes, repleto de possibilidades e teorias que funcionam como isca para que a audiência não pare de assistir os demais episódios por nada desse mundo - a trama é uma verdadeira batalha contra o desconhecido, onde a nossa paciência e capacidade de dedução, ainda bem, são colocadas à prova novamente, 15 anos depois.
Embora a cidade seja um organismo vivo, como a ilha, existe um certo receio de "viajar demais" e isso acaba trazendo uma sensação de equilíbrio para a história que transita perfeitamente entre o suspense, o terror e drama - bem na linha Stephen King, diga-se de passagem. Bender, como diretor, sabe das fragilidades de "Lost" (que nunca foi na direção) então praticamente repete só o que deu certo, ou seja,submeter seus personagens ao desconhecido, ao terror daquilo que não se pode descrever com exatidão, e como isso aproveita dos pesadelos torturantes de vários episódios para em algum momento também oferecer um suspiro de esperança - suficiente para que a audiência acredite que teremos algumas respostas em breve em meio a algumas teorias e suposições.
"Origem" tem cara de TV aberta, mas é do MGM+, então com certeza, não deve sofrer com episódios sem força para suportar a trama. Isso é bem perceptível na primeira temporada inteira que praticamente nos deixa sem fôlego em várias passagens - a sequência da invasão da Casa Colônia é angustiante, embora tenha faltado um pouco mais de coragem para o roteiro ser ainda mais impactante (algo como o "casamento vermelho", por exemplo). Nada que prejudique, muito pelo contrário, já que o potencial está ali e é perceptível. Depois de dez episódios, minha mais sincera impressão é que finalmente "Lost" pode encontrar sua redenção graças ao "primo pobre" que aprendeu a lição e se transformou em um grande fenômeno justamente por isso! Vamos aguardar!
Vale muito o seu play!
Depois de 10 incríveis episódios, eu já posso cravar: "Outsider" é uma das melhores adaptações da obra doStephen King já produzidas! É realmente um espetáculo essa série: a experiência de acompanhar toda a jornada dos detetives Ralph Anderson e Holli Gibney e com a HBO nos entregando um final de verdade, admito, é uma sensação muito próxima de ter terminado um bom livro.
A série começa com o detetive Ralph Anderson (Ben Mendelsohn de "Bloodline") investigando o brutal assassinato de um garoto de 11 anos chamado Frankie Peterson. Encontrado completamente dilacerado em um bosque de uma pequena cidade do interior da Georgia - o principal suspeito passa ser o técnico do time infantil de beisebol: Terry Maitland (Jason Bateman de "Ozark"). Terry sempre foi muito amável com todos, inclusive com o filho de Ralph, mas o fato dele ter sido identificado por três testemunhas em situações que, de alguma maneira, o ligavam à Frankie no dia do crime, acabou selando o destino do treinador. Acontece que Ralph descobre que no mesmo dia do assassinato, Terry estava em uma convenção de professores, 100 km distante dali - um álibi incontestável que bagunça completamente a investigação e obriga a policia a buscar ajuda com uma especialista para desvendar o mistério, a detetive Holly Gibney. Veja o trailer:
"Outsider" é imperdível e vale muito o seu play, porém a dúvida que fica no final do 10º episódio é se o que acabamos de assistir é uma série ou uma minissérie, pois o arco é completamente finalizado e mesmo com uma cena pós-crédito que nos dá uma pista do que pode acontecer em breve, ainda nada foi divulgado pela HBO.
Depois dos dois primeiros, temos a sensação de que a série não vai ter fôlego para segurar mais 8 episódios - erro de percepção! O assassinato de Frankie Peterson é só o inicio de uma grande investigação que engloba alguns outros crimes que seguiram o mesmo padrão, inclusive de tempo entre um e outro - vale a pena reparar nesse detalhe! Mais acostumada a esse tipo de mistério, Holly Gibney se torna peça chave no desenvolvimento da história, pois ela é a parte que não descarta o desconhecido ou o inexplicável, enquanto Ralph Anderson tem um séria dificuldade em lidar com aquilo que ele não pode provar empiricamente. É óbvio que por se tratar de uma obra do Stephen King os elementos sobrenaturais tem enorme relevância na trama, mas o roteiro do Richard Price (o mesmo de "The Night Of") equilibra tão bem o mistério possível com o medo do desconhecido que embarcamos facilmente em várias teorias levantadas durante a temporada!
Eu já havia comentado sobre a qualidade da produção assim que assisti o lançamento de "Outsider", então peço licença para ratificar minha opinião (mesmo que possa soar repetitivo): tudo é um primor, coisa de gente grande! Jason Bateman dirigiu apenas os dois primeiros episódios, porém a continuidade do conceito estético e narrativo se manteve linear, coerente - é um grande trabalho de concepção e de realização! A trilha sonora também continuou me chamando a atenção e a fotografia, olha, é linda demais - responsabilidade de Kevin McKnight, Zak Mulligan e Rasmus Heise.
Antes de finalizar, duas observações bastante pertinentes: os episódios 9 e 10 são surpreendentes, tensos, corajosos, só com um pequeno vacilo, mas que pode justificar minha segunda observação: ficou claro que o arco de investigação do Ralph Anderson terminou, porém a "cena pós-créditos" indica que Holly Gibney pode render mais histórias e o fato da personagem estar presente em outras obras de King fortalece a minha aposta: teremos uma serie antológica da personagem!
Enquanto aguardamos mais novidades, eu sugiro que você enfrente essa jornada! Vale muito a pena! Parabéns HBO!
Up Date: a HBO cancelou o que poderia ser uma série, mas isso não impacta na história ou muito menos na jornada do detetive Ralph Anderson, ou seja, aproveite os episódios ao máximo, pois "Outsider" pode ser considerada uma minissérie com um final bastante interessante.
Depois de 10 incríveis episódios, eu já posso cravar: "Outsider" é uma das melhores adaptações da obra doStephen King já produzidas! É realmente um espetáculo essa série: a experiência de acompanhar toda a jornada dos detetives Ralph Anderson e Holli Gibney e com a HBO nos entregando um final de verdade, admito, é uma sensação muito próxima de ter terminado um bom livro.
A série começa com o detetive Ralph Anderson (Ben Mendelsohn de "Bloodline") investigando o brutal assassinato de um garoto de 11 anos chamado Frankie Peterson. Encontrado completamente dilacerado em um bosque de uma pequena cidade do interior da Georgia - o principal suspeito passa ser o técnico do time infantil de beisebol: Terry Maitland (Jason Bateman de "Ozark"). Terry sempre foi muito amável com todos, inclusive com o filho de Ralph, mas o fato dele ter sido identificado por três testemunhas em situações que, de alguma maneira, o ligavam à Frankie no dia do crime, acabou selando o destino do treinador. Acontece que Ralph descobre que no mesmo dia do assassinato, Terry estava em uma convenção de professores, 100 km distante dali - um álibi incontestável que bagunça completamente a investigação e obriga a policia a buscar ajuda com uma especialista para desvendar o mistério, a detetive Holly Gibney. Veja o trailer:
"Outsider" é imperdível e vale muito o seu play, porém a dúvida que fica no final do 10º episódio é se o que acabamos de assistir é uma série ou uma minissérie, pois o arco é completamente finalizado e mesmo com uma cena pós-crédito que nos dá uma pista do que pode acontecer em breve, ainda nada foi divulgado pela HBO.
Depois dos dois primeiros, temos a sensação de que a série não vai ter fôlego para segurar mais 8 episódios - erro de percepção! O assassinato de Frankie Peterson é só o inicio de uma grande investigação que engloba alguns outros crimes que seguiram o mesmo padrão, inclusive de tempo entre um e outro - vale a pena reparar nesse detalhe! Mais acostumada a esse tipo de mistério, Holly Gibney se torna peça chave no desenvolvimento da história, pois ela é a parte que não descarta o desconhecido ou o inexplicável, enquanto Ralph Anderson tem um séria dificuldade em lidar com aquilo que ele não pode provar empiricamente. É óbvio que por se tratar de uma obra do Stephen King os elementos sobrenaturais tem enorme relevância na trama, mas o roteiro do Richard Price (o mesmo de "The Night Of") equilibra tão bem o mistério possível com o medo do desconhecido que embarcamos facilmente em várias teorias levantadas durante a temporada!
Eu já havia comentado sobre a qualidade da produção assim que assisti o lançamento de "Outsider", então peço licença para ratificar minha opinião (mesmo que possa soar repetitivo): tudo é um primor, coisa de gente grande! Jason Bateman dirigiu apenas os dois primeiros episódios, porém a continuidade do conceito estético e narrativo se manteve linear, coerente - é um grande trabalho de concepção e de realização! A trilha sonora também continuou me chamando a atenção e a fotografia, olha, é linda demais - responsabilidade de Kevin McKnight, Zak Mulligan e Rasmus Heise.
Antes de finalizar, duas observações bastante pertinentes: os episódios 9 e 10 são surpreendentes, tensos, corajosos, só com um pequeno vacilo, mas que pode justificar minha segunda observação: ficou claro que o arco de investigação do Ralph Anderson terminou, porém a "cena pós-créditos" indica que Holly Gibney pode render mais histórias e o fato da personagem estar presente em outras obras de King fortalece a minha aposta: teremos uma serie antológica da personagem!
Enquanto aguardamos mais novidades, eu sugiro que você enfrente essa jornada! Vale muito a pena! Parabéns HBO!
Up Date: a HBO cancelou o que poderia ser uma série, mas isso não impacta na história ou muito menos na jornada do detetive Ralph Anderson, ou seja, aproveite os episódios ao máximo, pois "Outsider" pode ser considerada uma minissérie com um final bastante interessante.
Antes de mais nada, eu preciso admitir que eu quase desisti de "Por trás dos seus olhos" algumas vezes e assim que terminou, senti aquela sensação de alívio por ter ido até o final! Veja, esse comentário em hipótese nenhuma deve te impedir de assistir a minissérie da Netflix, mas em vários momentos você vai achar algumas situações uma grande bobagem, ou algumas atuações completamente estereotipadas e acima do tom, mas acredite NADA que acontece durante os 5 primeiros episódios é por acaso e tudo vai ficar muito bem explicado no sexto e último ato! Pode confiar!
Baseado no livro de sucesso de Sarah Pinborough, a minissérie acompanha a história de Louise (Simona Brown), uma mãe recém divorciada que teve um affair casual com um homem casado e que descobre no dia seguinte ser seu novo chefe, o psiquiatra David (Tom Bateman). Porém tudo começa a mudar de rumo quando Louise, acidentalmente, conhece a esposa dele, Adele (Eve Hewson) e a partir daí passam a construir uma amizade repleta de confissões e segredos. Confira o trailer:
É de se elogiar a estratégia quase suicida da Netflix em não se aprofundar na sinopse e focar no marketing de "Por trás dos seus olhos" como um suspense psicológico cheio de romance, drama, mistérios e relações extraconjugais - apoiando-se, inclusive, em um conceito narrativo bem anos 90. Ao se apegar nessa premissa, já mergulhamos na história logo de cara e os quatro primeiros episódios, embora com algumas escorregadas conceituais (que depois descobrimos serem propositais), nos prendem e nos provocam uma enorme curiosidade! Aqui cabe um rápido disclaimer: não estamos falando de uma super produção, com um super orçamento, com rostos famosos e um diretor extremamente criativo; talvez por isso eu tenha ficado tão desconfiado ao perceber que a história vai se enrolando sozinha e encontrando atalhos não tão conectados com a realidade que estávamos acompanhando até ali - e isso fica muito claro a partir do quinto episódio! Mas não desista!
Ao nos aproximarmos do final, aquela trama, aparentemente bem construída, vai trazendo elementos de fantasia e nos afastando da realidade dramática que chega a desanimar - até pela forma pouco criativa que o diretor usou para contar uma ou outra passagem, digamos "extra-corporal". Tá, eu sei que o texto pode estar ficando confuso, mas eu estou tomando o máximo de cuidado para não te dar nenhum spoiler e ao mesmo tempo tentando te convencer a ir até o final, mesmo com um monte de "bobagens" que você vai encontrar nos episódios. Então vou te pedir novamente: não desista!
Ao longo dos episódios, a série vai nos dando dicas que a história não se trata apenas de mais um dramalhão como "Não fale com estranhos", por exemplo. O fato é que o roteiro nos engana muito bem, pois a estrutura narrativa é muito realista, não envolvem situações fora do ceticismo e isso se subverte de tal maneira que nos surpreende demais, desde que você embarque na proposta e assuma uma certa suspensão da realidade - tipo "Sexto Sentido", sabe? Aliás, "Por trás dos seus olhos" traz uma referência muito inteligente e completamente coerente de um filme de 1998, chamado "Fallen" (deixe para pesquisar sobre esse filme depois que você assistir o último episódio).
"Por trás dos seus olhos" vale a pena, vai por mim!
Antes de mais nada, eu preciso admitir que eu quase desisti de "Por trás dos seus olhos" algumas vezes e assim que terminou, senti aquela sensação de alívio por ter ido até o final! Veja, esse comentário em hipótese nenhuma deve te impedir de assistir a minissérie da Netflix, mas em vários momentos você vai achar algumas situações uma grande bobagem, ou algumas atuações completamente estereotipadas e acima do tom, mas acredite NADA que acontece durante os 5 primeiros episódios é por acaso e tudo vai ficar muito bem explicado no sexto e último ato! Pode confiar!
Baseado no livro de sucesso de Sarah Pinborough, a minissérie acompanha a história de Louise (Simona Brown), uma mãe recém divorciada que teve um affair casual com um homem casado e que descobre no dia seguinte ser seu novo chefe, o psiquiatra David (Tom Bateman). Porém tudo começa a mudar de rumo quando Louise, acidentalmente, conhece a esposa dele, Adele (Eve Hewson) e a partir daí passam a construir uma amizade repleta de confissões e segredos. Confira o trailer:
É de se elogiar a estratégia quase suicida da Netflix em não se aprofundar na sinopse e focar no marketing de "Por trás dos seus olhos" como um suspense psicológico cheio de romance, drama, mistérios e relações extraconjugais - apoiando-se, inclusive, em um conceito narrativo bem anos 90. Ao se apegar nessa premissa, já mergulhamos na história logo de cara e os quatro primeiros episódios, embora com algumas escorregadas conceituais (que depois descobrimos serem propositais), nos prendem e nos provocam uma enorme curiosidade! Aqui cabe um rápido disclaimer: não estamos falando de uma super produção, com um super orçamento, com rostos famosos e um diretor extremamente criativo; talvez por isso eu tenha ficado tão desconfiado ao perceber que a história vai se enrolando sozinha e encontrando atalhos não tão conectados com a realidade que estávamos acompanhando até ali - e isso fica muito claro a partir do quinto episódio! Mas não desista!
Ao nos aproximarmos do final, aquela trama, aparentemente bem construída, vai trazendo elementos de fantasia e nos afastando da realidade dramática que chega a desanimar - até pela forma pouco criativa que o diretor usou para contar uma ou outra passagem, digamos "extra-corporal". Tá, eu sei que o texto pode estar ficando confuso, mas eu estou tomando o máximo de cuidado para não te dar nenhum spoiler e ao mesmo tempo tentando te convencer a ir até o final, mesmo com um monte de "bobagens" que você vai encontrar nos episódios. Então vou te pedir novamente: não desista!
Ao longo dos episódios, a série vai nos dando dicas que a história não se trata apenas de mais um dramalhão como "Não fale com estranhos", por exemplo. O fato é que o roteiro nos engana muito bem, pois a estrutura narrativa é muito realista, não envolvem situações fora do ceticismo e isso se subverte de tal maneira que nos surpreende demais, desde que você embarque na proposta e assuma uma certa suspensão da realidade - tipo "Sexto Sentido", sabe? Aliás, "Por trás dos seus olhos" traz uma referência muito inteligente e completamente coerente de um filme de 1998, chamado "Fallen" (deixe para pesquisar sobre esse filme depois que você assistir o último episódio).
"Por trás dos seus olhos" vale a pena, vai por mim!
"Room 104" é uma série na HBO, que chegou sem tanta publicidade, mas que é muito interessante! Na verdade, eu estava muito curioso pra conhecer esse projeto, pois é dos mesmos caras de uma outra série que eu gosto muito: "Togetherness" - os irmão Duplass!
A série traz a tendência das antologias para HBO, se não por temporada, episódica - ou seja, cada episódio tem começo, meio e fim! A pegada é muito focada no roteiro e não na produção - como os ingleses adoram fazer e fazem muito bem há anos, inclusive. São histórias independentes e com sub-gêneros diferentes, onde o ponto de conexão entre todas essas histórias é "apenas" o "Quarto número 104" de um hotel beira de estrada dos EUA e mais nada! Confira o trailer:
Como acontece em "Twilight Zone", por exemplo, posso adiantar: existem histórias melhores, outras piores... Umas mais dinâmicas, outras conceituais demais, mas o fato é que a maioria dos roteiros são muito inteligentes e os diretores transitam muito bem nessa pluralidade de histórias, gêneros e até conceitos estéticos / narrativos - quase um experimento visual de luxo bancado pela HBO!
É uma série rápida com 12 episódios de 25 minutos, mas que não deve agradar todo mundo - então, só assista se você estiver disposto a se surpreender positivamente ou até negativamente com algum episódio e digo isso sem o receio de ser injusto, mas algumas pessoas tendem a gostar mais de um gênero do que de outro e assim por diante. "Room 104" é aquele tipo de série que depende muito de gosto!
A crítica adora, o publico é fiel e por isso já temos quatro temporadas produzidas! Vale o play e a surpresa em cada episódio.
"Room 104" é uma série na HBO, que chegou sem tanta publicidade, mas que é muito interessante! Na verdade, eu estava muito curioso pra conhecer esse projeto, pois é dos mesmos caras de uma outra série que eu gosto muito: "Togetherness" - os irmão Duplass!
A série traz a tendência das antologias para HBO, se não por temporada, episódica - ou seja, cada episódio tem começo, meio e fim! A pegada é muito focada no roteiro e não na produção - como os ingleses adoram fazer e fazem muito bem há anos, inclusive. São histórias independentes e com sub-gêneros diferentes, onde o ponto de conexão entre todas essas histórias é "apenas" o "Quarto número 104" de um hotel beira de estrada dos EUA e mais nada! Confira o trailer:
Como acontece em "Twilight Zone", por exemplo, posso adiantar: existem histórias melhores, outras piores... Umas mais dinâmicas, outras conceituais demais, mas o fato é que a maioria dos roteiros são muito inteligentes e os diretores transitam muito bem nessa pluralidade de histórias, gêneros e até conceitos estéticos / narrativos - quase um experimento visual de luxo bancado pela HBO!
É uma série rápida com 12 episódios de 25 minutos, mas que não deve agradar todo mundo - então, só assista se você estiver disposto a se surpreender positivamente ou até negativamente com algum episódio e digo isso sem o receio de ser injusto, mas algumas pessoas tendem a gostar mais de um gênero do que de outro e assim por diante. "Room 104" é aquele tipo de série que depende muito de gosto!
A crítica adora, o publico é fiel e por isso já temos quatro temporadas produzidas! Vale o play e a surpresa em cada episódio.