"O Pintassilgo" chegou com a pretensão de disputar prêmios importantes em 2019/2020, porém, mesmo sendo um bom entretenimento, sua expectativa não foi nem um pouco alcançada e, para mim, o principal problema está no seu roteiro e na falta de identidade que a história carrega por mais de duas horas. O filme é uma adaptação do livro homônimo escrito por uma autora americana chamada Donna Tartt que, inclusive, lhe rendeu o prêmio Pulitzer de ficção em 2014 e a Medalha Andrew Carnegie de Excelência em Ficção no mesmo ano.
A história acompanha a jornada do personagem Theodore Decker (Oakes Fegley/Ansel Elgort), um garoto de 13 anos que perde a mãe em um ataque terrorista no Metropolitan Museum of Art de Nova Iorque. Esse acontecimento impacta para sempre a vida do jovem, porém o elo emocional estabelecido na época do atentado que sobrevive ao tempo (e não sabemos exatamente a razão, mas desconfiamos) é um quadro que estava exposto no museu, “O Pintassilgo“, e que Theodore é incentivado por um desconhecido a levar consigo antes que as autoridades chegassem ao local. Confira o trailer:
Muito mais que um drama profundo, cheio de camadas, que o trailer sugere e que o livro, provavelmente, deve entregar, essa adaptação de "O Pintassilgo" foca no reflexo que o atentado gerou na vida do protagonista e na sua busca pela paz interior através do tempo, mas de uma forma superficial e até atrapalhada. Por se tratar de uma jornada de vida, muitas histórias são desenvolvidas paralelamente, fica impossível conectá-las de uma maneira orgânica e equilibrada, mesmo com o esforço da montadora Kelley Dixon - que notavelmente conhece essa gramática de misturar presente com passado por ter trabalhado em nada mais, nada menos do que "Breaking Bad" e "Better Call Saul".
De fato, o filme não é ruim, eu diria que é até bom, com ótimos momentos - um pouco mais dramáticos no primeiro ato, mais adolescente no segundo e quase um thriller nórdico no terceiro; mas é a falta de unidade entre esses três atos que pode incomodar um pouco se você busca um drama mais existencial e com uma narrativa mais equilibrada como "Em Pedaços", por exemplo. Tecnicamente o filme também é muito bem realizado, tendo o talentoso diretor John Crowley (vencedor do BAFTA em 2016 com "Brooklyn" e em 2007 com "Boy A") no comando e o sensacional diretor de fotografia, multi-premiado (14 vezes indicado ao Oscar e vencedor por "Blade Runner 2049" e "1917"), Roger Deakins, ao seu lado - reparem na belíssima cena em que Theodore está no balanço com seu amigo Boris (Finn Wolfhard)! No elenco Nicole Kidman e Jeffrey Wright sempre competentes, mesmo com personagens secundários e, claro, Finn Wolfhard e Oakes Fegley dão um show.
Olha, sinceramente, vale pelo entretenimento, por ótimas atuações e por um história que é boa.
"O Pintassilgo" chegou com a pretensão de disputar prêmios importantes em 2019/2020, porém, mesmo sendo um bom entretenimento, sua expectativa não foi nem um pouco alcançada e, para mim, o principal problema está no seu roteiro e na falta de identidade que a história carrega por mais de duas horas. O filme é uma adaptação do livro homônimo escrito por uma autora americana chamada Donna Tartt que, inclusive, lhe rendeu o prêmio Pulitzer de ficção em 2014 e a Medalha Andrew Carnegie de Excelência em Ficção no mesmo ano.
A história acompanha a jornada do personagem Theodore Decker (Oakes Fegley/Ansel Elgort), um garoto de 13 anos que perde a mãe em um ataque terrorista no Metropolitan Museum of Art de Nova Iorque. Esse acontecimento impacta para sempre a vida do jovem, porém o elo emocional estabelecido na época do atentado que sobrevive ao tempo (e não sabemos exatamente a razão, mas desconfiamos) é um quadro que estava exposto no museu, “O Pintassilgo“, e que Theodore é incentivado por um desconhecido a levar consigo antes que as autoridades chegassem ao local. Confira o trailer:
Muito mais que um drama profundo, cheio de camadas, que o trailer sugere e que o livro, provavelmente, deve entregar, essa adaptação de "O Pintassilgo" foca no reflexo que o atentado gerou na vida do protagonista e na sua busca pela paz interior através do tempo, mas de uma forma superficial e até atrapalhada. Por se tratar de uma jornada de vida, muitas histórias são desenvolvidas paralelamente, fica impossível conectá-las de uma maneira orgânica e equilibrada, mesmo com o esforço da montadora Kelley Dixon - que notavelmente conhece essa gramática de misturar presente com passado por ter trabalhado em nada mais, nada menos do que "Breaking Bad" e "Better Call Saul".
De fato, o filme não é ruim, eu diria que é até bom, com ótimos momentos - um pouco mais dramáticos no primeiro ato, mais adolescente no segundo e quase um thriller nórdico no terceiro; mas é a falta de unidade entre esses três atos que pode incomodar um pouco se você busca um drama mais existencial e com uma narrativa mais equilibrada como "Em Pedaços", por exemplo. Tecnicamente o filme também é muito bem realizado, tendo o talentoso diretor John Crowley (vencedor do BAFTA em 2016 com "Brooklyn" e em 2007 com "Boy A") no comando e o sensacional diretor de fotografia, multi-premiado (14 vezes indicado ao Oscar e vencedor por "Blade Runner 2049" e "1917"), Roger Deakins, ao seu lado - reparem na belíssima cena em que Theodore está no balanço com seu amigo Boris (Finn Wolfhard)! No elenco Nicole Kidman e Jeffrey Wright sempre competentes, mesmo com personagens secundários e, claro, Finn Wolfhard e Oakes Fegley dão um show.
Olha, sinceramente, vale pelo entretenimento, por ótimas atuações e por um história que é boa.
Assistam esse filme - é sério!
Mesmo que essa jornada seja daquelas de apertar o coração, é bem provável que ao subirem os créditos, a sensação seja a melhor possível. Eu diria, inclusive, que "O Pior Vizinho do Mundo" tem muito do que fez nos apaixonarmos por "O Método Kominsky" - do mal humor do protagonista à sua maneira de lidar com um mundo que parece não servir mais para nada por estar repleto de idiotas (palavras do protagonista, não minhas...rs). Dirigido pelo alemão Marc Forster (de "Em Busca da Terra do Nunca"), "A Man Called Otto" (no original) é básico em muitos sentidos, mas sem dúvida alguma se aproveita da presença de Tom Hanks e da sua enorme capacidade como ator, para criar um ponto de conexão com a audiência que torna impossível não torcer por ele e por sua felicidade. É clichê dos grandes, eu sei - mas funciona demais aqui!
Otto Anderson (Hanks), é um viúvo, mal-humorado e cheio de hábitos, na sua maioria ranzinzas. Quando um jovem e atrapalhado casal, com suas duas filhas pequenas, chegam no bairro, Otto começa a perceber nos pequenos gestos de sua vizinha Marisol (Mariana Treviño), uma nova forma de olhar para a vida, o que leva para uma amizade improvável e que, por outro lado, coloca seu mundo (todo organizadinho) de cabeça para baixo. Confira o trailer:
Inspirado no livro de Fredrik Beckman, o roteiro de "O Pior Vizinho do Mundo" não surpreende ao seguir um padrão linear de narrativa (o que torna sua trama bastante previsível) onde os eventos se desenrolam de maneira conveniente para o desenvolvimento emocional do protagonista - veja, isso não é um problema se ficar claro desde a primeira cena, que estamos falando de um filme essencialmente de ator. Hanks, como não poderia deixar de ser, leva o filme nas costas e naturalmente vai entregando algumas peças que ao olharmos para o todo, um pouco mais a frente, fazem muito sentido - embora fique claro que essa sempre foi a zona de conforto do filme. Isso faz do filme ruim? Não, pelo contrário, apenas estabelece a proposta do diretor de priorizar a complexidade do ser humano, e de seus sentimentos, ao invés de uma espetacularização superficial de uma condição que merece ser discutida com mais profundidade.
Com a anuência do roteirista David Magee (do live-action de "A Pequena Sereia"), Forster abre mão do desenvolvimento dos personagens secundários para não tirar o foco do processo de transformação de Otto. Esses personagens têm certa importância, se relacionam com o protagonista no presente (alguns até no passado - nos flashbacks que ajudam a explicar alguns fatos), têm impacto na vida dele, mas são pouco explorados - eles acabam sendo retratados de maneira mais passageira, com características estereotipadas e unidimensionais, servindo como equilíbrio entre o drama e a comédia. Reparem no arco de Anita (Juanita Jennings) e Reuben (Peter Lawson Jones); eles são a personificação da dualidade desse conceito - a passagem onde Otto critica os carros de Reuben é impagável, mas o seu significado intimo vai além da escolha de uma marca de automóvel.
Por mais desconfortável que possa ser acompanhar Otto tentando o tirar sua vida, a forma como essas cenas são retratadas no filme, acreditem, trazem até uma certa comicidade para o assunto, onde suas falhas acabam mostrando muito mais um lado otimista do que o peso do ato em si - definir "O Pior Vizinho do Mundo" como uma dramédia clássica ajuda muito a entender esse conceito. Essa dualidade, que em muitos momentos define o jogo narrativo proposto por Magee e Forster dão o tom e entregam uma mensagem de mais empatia, de redenção e de aceitação sobre a importância das relações humanas (verdadeiras). A história de Otto se mistura com a de alguém que conhecemos e por isso acaba oferecendo ótimas reflexões sobre o envelhecimento, sobre a solidão e, principalmente, sobre a busca por um ressignificado na vida.
Dito tudo isso, minha recomendação é a seguinte: dê o play e seja feliz!
Assistam esse filme - é sério!
Mesmo que essa jornada seja daquelas de apertar o coração, é bem provável que ao subirem os créditos, a sensação seja a melhor possível. Eu diria, inclusive, que "O Pior Vizinho do Mundo" tem muito do que fez nos apaixonarmos por "O Método Kominsky" - do mal humor do protagonista à sua maneira de lidar com um mundo que parece não servir mais para nada por estar repleto de idiotas (palavras do protagonista, não minhas...rs). Dirigido pelo alemão Marc Forster (de "Em Busca da Terra do Nunca"), "A Man Called Otto" (no original) é básico em muitos sentidos, mas sem dúvida alguma se aproveita da presença de Tom Hanks e da sua enorme capacidade como ator, para criar um ponto de conexão com a audiência que torna impossível não torcer por ele e por sua felicidade. É clichê dos grandes, eu sei - mas funciona demais aqui!
Otto Anderson (Hanks), é um viúvo, mal-humorado e cheio de hábitos, na sua maioria ranzinzas. Quando um jovem e atrapalhado casal, com suas duas filhas pequenas, chegam no bairro, Otto começa a perceber nos pequenos gestos de sua vizinha Marisol (Mariana Treviño), uma nova forma de olhar para a vida, o que leva para uma amizade improvável e que, por outro lado, coloca seu mundo (todo organizadinho) de cabeça para baixo. Confira o trailer:
Inspirado no livro de Fredrik Beckman, o roteiro de "O Pior Vizinho do Mundo" não surpreende ao seguir um padrão linear de narrativa (o que torna sua trama bastante previsível) onde os eventos se desenrolam de maneira conveniente para o desenvolvimento emocional do protagonista - veja, isso não é um problema se ficar claro desde a primeira cena, que estamos falando de um filme essencialmente de ator. Hanks, como não poderia deixar de ser, leva o filme nas costas e naturalmente vai entregando algumas peças que ao olharmos para o todo, um pouco mais a frente, fazem muito sentido - embora fique claro que essa sempre foi a zona de conforto do filme. Isso faz do filme ruim? Não, pelo contrário, apenas estabelece a proposta do diretor de priorizar a complexidade do ser humano, e de seus sentimentos, ao invés de uma espetacularização superficial de uma condição que merece ser discutida com mais profundidade.
Com a anuência do roteirista David Magee (do live-action de "A Pequena Sereia"), Forster abre mão do desenvolvimento dos personagens secundários para não tirar o foco do processo de transformação de Otto. Esses personagens têm certa importância, se relacionam com o protagonista no presente (alguns até no passado - nos flashbacks que ajudam a explicar alguns fatos), têm impacto na vida dele, mas são pouco explorados - eles acabam sendo retratados de maneira mais passageira, com características estereotipadas e unidimensionais, servindo como equilíbrio entre o drama e a comédia. Reparem no arco de Anita (Juanita Jennings) e Reuben (Peter Lawson Jones); eles são a personificação da dualidade desse conceito - a passagem onde Otto critica os carros de Reuben é impagável, mas o seu significado intimo vai além da escolha de uma marca de automóvel.
Por mais desconfortável que possa ser acompanhar Otto tentando o tirar sua vida, a forma como essas cenas são retratadas no filme, acreditem, trazem até uma certa comicidade para o assunto, onde suas falhas acabam mostrando muito mais um lado otimista do que o peso do ato em si - definir "O Pior Vizinho do Mundo" como uma dramédia clássica ajuda muito a entender esse conceito. Essa dualidade, que em muitos momentos define o jogo narrativo proposto por Magee e Forster dão o tom e entregam uma mensagem de mais empatia, de redenção e de aceitação sobre a importância das relações humanas (verdadeiras). A história de Otto se mistura com a de alguém que conhecemos e por isso acaba oferecendo ótimas reflexões sobre o envelhecimento, sobre a solidão e, principalmente, sobre a busca por um ressignificado na vida.
Dito tudo isso, minha recomendação é a seguinte: dê o play e seja feliz!
"O Poder da Intuição" é um documentário islandês (embora falado em inglês) de 2016, dos mais interessantes. Ele parte da seguinte questão para desenvolver sua narrativa e provocar nossa reflexão: Vivemos com a cabeça e não com nossas emoções. Sendo assim, como isso afeta nossas vidas?
Depois que Hrund Gunnsteinsdottir pede demissão de seu alto cargo dentro da ONU por acreditar que seu propósito estava se tornando cada vez mais administrativo em vez de humanitário, ela resolve se unir com a diretora (e amiga pessoal), Kristín Ólafsdóttir, para iniciar uma jornada de pesquisa que conectasse elementos como a alma, a ciência, a natureza e a criatividade para assim entender o real poder da intuição. O documentário é uma viagem global na busca por respostas que nos ajudem a olhar para o "eu interior" em um mundo repleto de distrações e stress. Confira o trailer (em inglês):
Pessoalmente, tenho uma enorme aversão com qualquer narrativa que possa soar "auto-ajuda" - no sentido pejorativo e oportunista da palavra. Em "InnSaei" (título original) isso não acontece. Veja, ao nos depararmos com o conceito islandês "InnSaei", que pode significar “o mar de dentro” ou aquele que move o nosso mundo interior e está em constante movimento, começamos a entender para qual direção a narrativa pretende seguir, porém a palavra "InnSaei" é tão complexa quanto aquilo que ela pretende representar - alguns historiadores ainda definem esse conceito como “ver o interior”, ou seja, buscar as respostas dentro de si mesmo; ou ainda “ver de dentro para fora” indicando que podemos mudar as coisas, mas só depois que aceitarmos que precisamos de um tempo focado apenas em nós.
Gunnsteinsdottir e Ólafsdóttir (ainda bem que estou escrevendo essa análise e não falando sobre ela) foram muito felizes ao trazer para seu storytteling uma série de reflexões, seja de pensadores ou de espiritualistas, sobre o impacto do mundo moderno nas nossas vidas - principalmente no que diz respeito as decisões que tomamos diariamente. Ao iniciar essa busca em Harvard fica claro a predisposição de Gunnsteinsdottir em encontrar respostas mais racionais e é muito interessante como isso vai se desconstruindo - e aqui cabe uma provocação: será que você não partiria do mesmo lugar, estando preso na lógica e deixando de pensar sobre outras possibilidades, seja por crença limitante ou até por falta de tempo?
Quando uma espiritualista diz no documentário que o fracasso deve fazer parte da jornada e só a intuição pode nos ajudar a sair dele já subvertemos completamente o pré-conceito empreendedor que aceita o fracasso, mas que busca nos dados uma forma de responder nossas dúvidas. É claro que isso é importante, mas será que não estamos fechando os olhos para outros elementos igualmente importantes, como a natureza, por exemplo? "O Poder da Intuição" levanta essas questões a todo momento e mais do que trazer algumas respostas, ele nos faz pensar sobre ter foco no momento para se ouvir e deixar fluir as ideias (desde que o celular esteja longe e ninguém nos chame pelo WhatsApp). Sim, essa provocação é irônica, mas pertinente - aconteceu comigo.
"InnSaei" vai te fazer refletir, te provocar, expor suas fragilidades como ser humano moderno e te tirar da zona de conforto. Entender que o mundo atual "está em colapso" graças a uma forte cultura do imediatismo, que não nos deixa apreciar o que está diante de nós e nos impede de olhar uns para os outros com mais empatia; pode abrir seus olhos paras as barreiras que te impede de avançar - e isso não está escrito em tom de auto-ajuda, te juro. São só 72 minutos, mas que vão te fazer ir além do que o Instagram ou qualquer outra distração pode estar te mostrando durante o mesmo período de tempo!
Vale muito a pena!
"O Poder da Intuição" é um documentário islandês (embora falado em inglês) de 2016, dos mais interessantes. Ele parte da seguinte questão para desenvolver sua narrativa e provocar nossa reflexão: Vivemos com a cabeça e não com nossas emoções. Sendo assim, como isso afeta nossas vidas?
Depois que Hrund Gunnsteinsdottir pede demissão de seu alto cargo dentro da ONU por acreditar que seu propósito estava se tornando cada vez mais administrativo em vez de humanitário, ela resolve se unir com a diretora (e amiga pessoal), Kristín Ólafsdóttir, para iniciar uma jornada de pesquisa que conectasse elementos como a alma, a ciência, a natureza e a criatividade para assim entender o real poder da intuição. O documentário é uma viagem global na busca por respostas que nos ajudem a olhar para o "eu interior" em um mundo repleto de distrações e stress. Confira o trailer (em inglês):
Pessoalmente, tenho uma enorme aversão com qualquer narrativa que possa soar "auto-ajuda" - no sentido pejorativo e oportunista da palavra. Em "InnSaei" (título original) isso não acontece. Veja, ao nos depararmos com o conceito islandês "InnSaei", que pode significar “o mar de dentro” ou aquele que move o nosso mundo interior e está em constante movimento, começamos a entender para qual direção a narrativa pretende seguir, porém a palavra "InnSaei" é tão complexa quanto aquilo que ela pretende representar - alguns historiadores ainda definem esse conceito como “ver o interior”, ou seja, buscar as respostas dentro de si mesmo; ou ainda “ver de dentro para fora” indicando que podemos mudar as coisas, mas só depois que aceitarmos que precisamos de um tempo focado apenas em nós.
Gunnsteinsdottir e Ólafsdóttir (ainda bem que estou escrevendo essa análise e não falando sobre ela) foram muito felizes ao trazer para seu storytteling uma série de reflexões, seja de pensadores ou de espiritualistas, sobre o impacto do mundo moderno nas nossas vidas - principalmente no que diz respeito as decisões que tomamos diariamente. Ao iniciar essa busca em Harvard fica claro a predisposição de Gunnsteinsdottir em encontrar respostas mais racionais e é muito interessante como isso vai se desconstruindo - e aqui cabe uma provocação: será que você não partiria do mesmo lugar, estando preso na lógica e deixando de pensar sobre outras possibilidades, seja por crença limitante ou até por falta de tempo?
Quando uma espiritualista diz no documentário que o fracasso deve fazer parte da jornada e só a intuição pode nos ajudar a sair dele já subvertemos completamente o pré-conceito empreendedor que aceita o fracasso, mas que busca nos dados uma forma de responder nossas dúvidas. É claro que isso é importante, mas será que não estamos fechando os olhos para outros elementos igualmente importantes, como a natureza, por exemplo? "O Poder da Intuição" levanta essas questões a todo momento e mais do que trazer algumas respostas, ele nos faz pensar sobre ter foco no momento para se ouvir e deixar fluir as ideias (desde que o celular esteja longe e ninguém nos chame pelo WhatsApp). Sim, essa provocação é irônica, mas pertinente - aconteceu comigo.
"InnSaei" vai te fazer refletir, te provocar, expor suas fragilidades como ser humano moderno e te tirar da zona de conforto. Entender que o mundo atual "está em colapso" graças a uma forte cultura do imediatismo, que não nos deixa apreciar o que está diante de nós e nos impede de olhar uns para os outros com mais empatia; pode abrir seus olhos paras as barreiras que te impede de avançar - e isso não está escrito em tom de auto-ajuda, te juro. São só 72 minutos, mas que vão te fazer ir além do que o Instagram ou qualquer outra distração pode estar te mostrando durante o mesmo período de tempo!
Vale muito a pena!
"O Problema dos 3 Corpos" é uma mistura de "Contato", "A Chegada" e até de "V" (aquela do SBT mesmo, dos extraterrestres lagartos e tal). Lançada em 2024 pela Netflix, essa série é uma adaptação ambiciosa da aclamada trilogia de ficção científica escrita por Cixin Liu e desenvolvida por nada menos que David Benioff e D. B. Weiss (de "Game of Thrones") e pelo Alexander Woo (de "True Blood"). Com um nível de produção bastante requintado, essa adaptação busca capturar a complexidade e a profundidade do material original, trazendo uma narrativa densa e intelectualmente estimulante para as telas, explorando os meandros da ciência, da filosofia, da humanidade e do mistério com muito equilíbrio e sem esquecer do entretenimento. E oha, que entretenimento bom!
A trama de "O Problema dos 3 Corpos" gira em torno da descoberta da existência de uma civilização alienígena em um sistema estelar triplamente complexo, que pode ameaçar a sobrevivência da humanidade em algum momento do futuro. A série alterna entre o passado e o presente, começando com os eventos da Revolução Cultural Chinesa e progredindo até os dias de hoje onde cientistas enfrentam a possibilidade de um invasão extraterrestre. Confira o trailer:
Benioff e Weiss, juntamente com Woo, trazem sua experiência em criar narrativas épicas para uma ficção científica que vai construindo camadas, de fato, envolventes. Desde o primeiro episódio, o que vemos é a essência filosófica e científica do romance de Liu, adaptada em uma história dinâmica e provocadora. O roteiro é denso e exige atenção pela falta de linearidade temporal e por carregar na sua gênese temas menos usuais para a audiência, por outro lado é recompensador para os apreciadores do gênero todo esse desafio intelectual e, principalmente, essa provocação sobre uma percepção de mundo cheia de simbolismos. A direção de Minkie Spiro (de "Fosse/Verdon") e dos outros diretores envolvidos no projeto, é eficaz ao capturar a grandiosidade do universo original com maestria - se há alguns anos essa adaptação parecia impossível, posso dizer que a cinematografia aplicada em "O Problema dos 3 Corpos" é realmente impressionante - com uma paleta de cores rica e efeitos visuais de alta qualidade, a direção foi capaz de criar cenários visualmente deslumbrantes. As sequências que retratam o sistema estelar triplamente complexo pela perspectiva de um jogo de video-game são particularmente notáveis, oferecendo uma sensação de maravilha pelo visual e de perigo iminente pela narrativa. Incrível!
A série também se destaca por performances convincentes de seu elenco realmente talentoso. Zine Tseng no passado e Rosalind Chao no presente, entregam uma jornada poderosa e emotiva para Ye Wenjie, capturando a dor e a determinação de uma mulher que testemunhou tragédias inimagináveis e que busca respostas em meio ao caos. já Eiza González (como Auggie Salazar), Jess Hong (como Jin Cheng) e Jovan Adepo (como Saul Durand) trazem uma mistura de curiosidade intelectual e vulnerabilidade emocional, tornando seus personagens cativantes em suas dinâmicas de amizade. Benedict Wong e Jonathan Pryce também merecem elogios por entregar atuações sólidas que ajudam a ancorar a narrativa em uma realidade que passa a ser palpável graças a eles - a cena em que Pryce tenta explicar sobre a mentira a partir de um conto de fadas para alguém que é literal é simplesmente sensacional.
É inegável que "O Problema dos 3 Corpos" carrega o peso de sua profundidade como narrativa e de sua densidade vinda do material original - não é uma série fácil de acompanhar e isso pode afastar aqueles que buscam só um entretenimento banal. Aqui, nada é banal - o que vemos na tela é realmente algo ambicioso e estimulante, uma história que oferece uma visão fascinante de um dos romances de ficção científica mais influentes dos últimos tempos e que, com um conceito visual estilizado e sua narrativa desafiadora, nos faz pensar com mais cuidado sobre a ciência e a existência humana através do tempo e do espaço. Simples, não?
Um golaço da Netflix que pede o seu play!
"O Problema dos 3 Corpos" é uma mistura de "Contato", "A Chegada" e até de "V" (aquela do SBT mesmo, dos extraterrestres lagartos e tal). Lançada em 2024 pela Netflix, essa série é uma adaptação ambiciosa da aclamada trilogia de ficção científica escrita por Cixin Liu e desenvolvida por nada menos que David Benioff e D. B. Weiss (de "Game of Thrones") e pelo Alexander Woo (de "True Blood"). Com um nível de produção bastante requintado, essa adaptação busca capturar a complexidade e a profundidade do material original, trazendo uma narrativa densa e intelectualmente estimulante para as telas, explorando os meandros da ciência, da filosofia, da humanidade e do mistério com muito equilíbrio e sem esquecer do entretenimento. E oha, que entretenimento bom!
A trama de "O Problema dos 3 Corpos" gira em torno da descoberta da existência de uma civilização alienígena em um sistema estelar triplamente complexo, que pode ameaçar a sobrevivência da humanidade em algum momento do futuro. A série alterna entre o passado e o presente, começando com os eventos da Revolução Cultural Chinesa e progredindo até os dias de hoje onde cientistas enfrentam a possibilidade de um invasão extraterrestre. Confira o trailer:
Benioff e Weiss, juntamente com Woo, trazem sua experiência em criar narrativas épicas para uma ficção científica que vai construindo camadas, de fato, envolventes. Desde o primeiro episódio, o que vemos é a essência filosófica e científica do romance de Liu, adaptada em uma história dinâmica e provocadora. O roteiro é denso e exige atenção pela falta de linearidade temporal e por carregar na sua gênese temas menos usuais para a audiência, por outro lado é recompensador para os apreciadores do gênero todo esse desafio intelectual e, principalmente, essa provocação sobre uma percepção de mundo cheia de simbolismos. A direção de Minkie Spiro (de "Fosse/Verdon") e dos outros diretores envolvidos no projeto, é eficaz ao capturar a grandiosidade do universo original com maestria - se há alguns anos essa adaptação parecia impossível, posso dizer que a cinematografia aplicada em "O Problema dos 3 Corpos" é realmente impressionante - com uma paleta de cores rica e efeitos visuais de alta qualidade, a direção foi capaz de criar cenários visualmente deslumbrantes. As sequências que retratam o sistema estelar triplamente complexo pela perspectiva de um jogo de video-game são particularmente notáveis, oferecendo uma sensação de maravilha pelo visual e de perigo iminente pela narrativa. Incrível!
A série também se destaca por performances convincentes de seu elenco realmente talentoso. Zine Tseng no passado e Rosalind Chao no presente, entregam uma jornada poderosa e emotiva para Ye Wenjie, capturando a dor e a determinação de uma mulher que testemunhou tragédias inimagináveis e que busca respostas em meio ao caos. já Eiza González (como Auggie Salazar), Jess Hong (como Jin Cheng) e Jovan Adepo (como Saul Durand) trazem uma mistura de curiosidade intelectual e vulnerabilidade emocional, tornando seus personagens cativantes em suas dinâmicas de amizade. Benedict Wong e Jonathan Pryce também merecem elogios por entregar atuações sólidas que ajudam a ancorar a narrativa em uma realidade que passa a ser palpável graças a eles - a cena em que Pryce tenta explicar sobre a mentira a partir de um conto de fadas para alguém que é literal é simplesmente sensacional.
É inegável que "O Problema dos 3 Corpos" carrega o peso de sua profundidade como narrativa e de sua densidade vinda do material original - não é uma série fácil de acompanhar e isso pode afastar aqueles que buscam só um entretenimento banal. Aqui, nada é banal - o que vemos na tela é realmente algo ambicioso e estimulante, uma história que oferece uma visão fascinante de um dos romances de ficção científica mais influentes dos últimos tempos e que, com um conceito visual estilizado e sua narrativa desafiadora, nos faz pensar com mais cuidado sobre a ciência e a existência humana através do tempo e do espaço. Simples, não?
Um golaço da Netflix que pede o seu play!
"O que ficou para trás" é um filme cheio de simbolismo e não por isso menos assustador! Bem ao estilo Jordan Peele ("Corra" e "Nós"), essa produção ds Netflix com a BBC será uma agradável surpresa para quem gosta de um suspense psicológico com elementos sobrenaturais. Talvez com uma temática menos convencional, o filme se arrisca muito na concepção narrativa, mas ao mesmo tempo entrega um conceito visual simples e que se ajusta perfeitamente na proposta do diretor, o estreante Remi Weekes.
Na história, um jovem casal, Rial (Wunmi Mosaku) e Bol (Sope Dirisu) consegue escapar da guerra civil no Sudão e, depois de completarem a difícil jornada até o Reino Unido, acabam detidos em um centro de refugiados. A esperança de uma vida digna e segura começa a se tornar realidade quando eles são liberados e se mudam para uma casa indicada pelo governo local. Porém uma série de fenômenos sobrenaturais começa a assombra-los, transformando o inicio de uma nova vida em um verdadeiro pesadelo. O que eles precisam descobrir é se de fato existe algo sinistro escondido nas paredes da casa ou se são seus fantasmas mais íntimos que voltaram para cobrar por suas decisões! Confira o trailer:
Embora os sustos realmente aconteçam enquanto assistimos ao filme, eu diria que toda aquela conhecida e importante gramática cinematográfica que envolve os elementos sobrenaturais de uma casa mal-assombrada serve muito mais como simbolismo para lidar a culpa, com os traumas e, claro, com as perdas de refugiar-se em um outro país, do que de bengala para prender a atenção da audiência! Então fica a primeira dica: enxergue além do que está na tela! As batidas nas paredes são muito mais profundas do que o medo que elas podem causar e isso vai impactar diretamente na sua experiência ao assistir "O que ficou para trás"! Vamos falar mais sobre isso abaixo, mas se você gosta de um suspense inteligente e não muito difícil, essa é uma ótima opção e fique tranquilo: as respostas mais importantes virão!
Para começar, sugiro uma reflexão: reparem como um roteiro bem escrito nos provoca uma sensação de realidade mesmo quando lidamos com elementos completamente fantasiosos. Em "His House" (título original) encontramos o equilíbrio perfeito entre o passado e o presente: a história é contada de maneira econômica e nem por isso deixa de ser auto-explicativa. De cara sabemos o que aconteceu durante a fuga do Sudão, entendemos o peso da dor que Rial e Bol carregam e ainda vemos como suas crenças interferem na esperança de "começar de novo". Apesar de alguns traumas do passado pontuarem a narrativa, o preconceito e a intolerância são os fantasmas do dia a dia - veja, quando eles ganham o direito de sair do abrigo de refugiados para viverem em um novo local, percebemos a força das restrições impostas, o que eleva a tensão a cada ação (ou situação) já que o governo está apenas esperando algum vacilo para justificar uma deportação.
A casa parece ser apenas uma ferramenta para explorar essa tensão e aqui a direção de Weekes merece elogios: ele demonstra total domínio sobre os clichês do gênero, oferecendo muitos sustos ao mesmo tempo que desencadeia a dúvida sobre a sanidade dos personagens - e esse não seria o motivo suficiente que o governo precisa para expulsá-los? Enquanto Bol tenta lidar com a razão, Rial faz questão de cultivar os rituais de sua terra natal e isso faz com que o casal se desconecte! O bacana é que a entrada dos elementos sobrenaturais na história apenas enaltece as discussões sócio-culturais entre o casal e suas experiências fora de casa, acabam ganhando "forma" com a presença sobrenatural que os assombram. Percebam como a complexidade do tema vai além do que vemos na tela!
"O que ficou para trás" é um ótimo exemplo de um filme bem escrito, bem realizado, bem produzido e completamente adaptado ao baixo orçamento, que resolve as limitações técnicas com muita criatividade e competência! O elenco está impecável, tanto Sope Dirisu, quanto Wunmi Mosaku, são verdadeiros talentos! O trabalho de Weekes é seguro, do roteiro à direção, e com muita simplicidade consegue assustar ao mesmo tempo em que levanta discussões relevantes (Jordan Peele fazendo escola).
Mesmo com várias alegorias estéticas, o filme é simples para quem enxerga superficialmente e inteligente para quem busca uma maior profundidade no texto, ou seja, a chance de agradar aos dois públicos será muito grande - se puder, fique com a segunda forma de ver e enxergar a história! Vale muito a pena o seu play!
"O que ficou para trás" é um filme cheio de simbolismo e não por isso menos assustador! Bem ao estilo Jordan Peele ("Corra" e "Nós"), essa produção ds Netflix com a BBC será uma agradável surpresa para quem gosta de um suspense psicológico com elementos sobrenaturais. Talvez com uma temática menos convencional, o filme se arrisca muito na concepção narrativa, mas ao mesmo tempo entrega um conceito visual simples e que se ajusta perfeitamente na proposta do diretor, o estreante Remi Weekes.
Na história, um jovem casal, Rial (Wunmi Mosaku) e Bol (Sope Dirisu) consegue escapar da guerra civil no Sudão e, depois de completarem a difícil jornada até o Reino Unido, acabam detidos em um centro de refugiados. A esperança de uma vida digna e segura começa a se tornar realidade quando eles são liberados e se mudam para uma casa indicada pelo governo local. Porém uma série de fenômenos sobrenaturais começa a assombra-los, transformando o inicio de uma nova vida em um verdadeiro pesadelo. O que eles precisam descobrir é se de fato existe algo sinistro escondido nas paredes da casa ou se são seus fantasmas mais íntimos que voltaram para cobrar por suas decisões! Confira o trailer:
Embora os sustos realmente aconteçam enquanto assistimos ao filme, eu diria que toda aquela conhecida e importante gramática cinematográfica que envolve os elementos sobrenaturais de uma casa mal-assombrada serve muito mais como simbolismo para lidar a culpa, com os traumas e, claro, com as perdas de refugiar-se em um outro país, do que de bengala para prender a atenção da audiência! Então fica a primeira dica: enxergue além do que está na tela! As batidas nas paredes são muito mais profundas do que o medo que elas podem causar e isso vai impactar diretamente na sua experiência ao assistir "O que ficou para trás"! Vamos falar mais sobre isso abaixo, mas se você gosta de um suspense inteligente e não muito difícil, essa é uma ótima opção e fique tranquilo: as respostas mais importantes virão!
Para começar, sugiro uma reflexão: reparem como um roteiro bem escrito nos provoca uma sensação de realidade mesmo quando lidamos com elementos completamente fantasiosos. Em "His House" (título original) encontramos o equilíbrio perfeito entre o passado e o presente: a história é contada de maneira econômica e nem por isso deixa de ser auto-explicativa. De cara sabemos o que aconteceu durante a fuga do Sudão, entendemos o peso da dor que Rial e Bol carregam e ainda vemos como suas crenças interferem na esperança de "começar de novo". Apesar de alguns traumas do passado pontuarem a narrativa, o preconceito e a intolerância são os fantasmas do dia a dia - veja, quando eles ganham o direito de sair do abrigo de refugiados para viverem em um novo local, percebemos a força das restrições impostas, o que eleva a tensão a cada ação (ou situação) já que o governo está apenas esperando algum vacilo para justificar uma deportação.
A casa parece ser apenas uma ferramenta para explorar essa tensão e aqui a direção de Weekes merece elogios: ele demonstra total domínio sobre os clichês do gênero, oferecendo muitos sustos ao mesmo tempo que desencadeia a dúvida sobre a sanidade dos personagens - e esse não seria o motivo suficiente que o governo precisa para expulsá-los? Enquanto Bol tenta lidar com a razão, Rial faz questão de cultivar os rituais de sua terra natal e isso faz com que o casal se desconecte! O bacana é que a entrada dos elementos sobrenaturais na história apenas enaltece as discussões sócio-culturais entre o casal e suas experiências fora de casa, acabam ganhando "forma" com a presença sobrenatural que os assombram. Percebam como a complexidade do tema vai além do que vemos na tela!
"O que ficou para trás" é um ótimo exemplo de um filme bem escrito, bem realizado, bem produzido e completamente adaptado ao baixo orçamento, que resolve as limitações técnicas com muita criatividade e competência! O elenco está impecável, tanto Sope Dirisu, quanto Wunmi Mosaku, são verdadeiros talentos! O trabalho de Weekes é seguro, do roteiro à direção, e com muita simplicidade consegue assustar ao mesmo tempo em que levanta discussões relevantes (Jordan Peele fazendo escola).
Mesmo com várias alegorias estéticas, o filme é simples para quem enxerga superficialmente e inteligente para quem busca uma maior profundidade no texto, ou seja, a chance de agradar aos dois públicos será muito grande - se puder, fique com a segunda forma de ver e enxergar a história! Vale muito a pena o seu play!
"O que os homens falam" é excelente! Esse premiado filme espanhol é simplesmente delicioso de assistir, desde que goste daquelas histórias sobre relações tão particulares do Woody Allen e que praticamente se tornaram um subgênero da dramédia com produções como "Easy" da Netflix ou "Modern Love"da própria Prime Vídeo.
Seguindo a estrutura de "Relatos Selvagens", aqui temos oito homens que enfrentam a crise de meia-idade divididos em cinco episódios independentes. E. (Eduardo Fernandez) é aquele homem que se acha um fracassado, ele acaba de perder tudo (inclusive a mulher) e volta a morar na casa da mãe com seus 45 anos; ele se encontra casualmente com um amigo de longa data, J. (Eduardo Sbaraglia), que venceu profissionalmente na vida, conquistando tudo que sempre desejou, mas que sofre de ansiedade e depressão. Já S. (Javier Camara) tenta retomar o casamento dois anos após o divórcio, enquanto G. (Ricardo Darín) confessa para o conhecido L. (Luis Tosar) que desconfia que sua esposa está traindo ele. P. (Eduardo Noriega) é um jovem que tenta seduzir uma colega durante uma festa de trabalho, mas acaba sendo surpreendido por ela. E para finalizar, conhecemos A. (Alberto San Juan) e M. (Jordi Mollà) dois grandes amigos que têm seus segredos íntimos revelados pelas mulheres quando estão a caminho de uma festa de aniversário. Confira o trailer (em espanhol):
Os dois elementos que mais chamam atenção logo a primeira vista e que merece todos os elogios possíveis são: o roteiro e o trabalho do elenco. Ao partirmos do princípio que o filme se apropria de um estilo de crônicas sobre o universo masculino, formatadas para serem facilmente digeridas pela audiência e equilibrando o drama da situação com a leveza do diálogo, fica muito claro a importância de um texto inteligente e da performance dos atores - é impressionante como as histórias são próximas de uma realidade que "já ouvimos falar". Basicamente, "O que os homens falam" são como esquetes teatrais, elas seguem um ritmo próprio e a composição dos temas discutidos são parecidos, mas são as ironias que dão o toque final - eu diria, aliás, que essas ironias são recheadas de uma honestidade brutal, e isso é incrível.
É preciso dizer que "Una pistola en cada mano" (título original) transita muito bem entre a angústia de uma situação com a necessidade de não expor os sentimentos - tão particular do gênero masculino. Essa sutileza dramática eleva conversas que aparentemente são banais, mas que carregam muitos sentimentos e inseguranças! Não esperem conclusões filosóficas ao final de cada história, não é essa a intenção do roteiro e muito menos do diretor Cesc Gay - o que precisa ser dito, é dito e pronto; o segredo (e a beleza desse tipo de narrativa) é o que fazemos com toda informação que nos é dada e como refletimos ao projetarmos a mesma situação em nossa vida.
"O que os homens falam" é um filme que poderia ser uma temporada de "Easy" facilmente (ou de duas séries inglesas com o mesmo tema: "Dates" e "True Love" que infelizmente não chamaram tanta atenção até aqui). Vale muito a pena, é um entretenimento inteligente, com um toque de provocação e curiosidade feminina - prato cheio para o julgamento, mas sensata ao desconstruir o esteriótipo do macho alpha!
Pode dar o play sem receio!
"O que os homens falam" é excelente! Esse premiado filme espanhol é simplesmente delicioso de assistir, desde que goste daquelas histórias sobre relações tão particulares do Woody Allen e que praticamente se tornaram um subgênero da dramédia com produções como "Easy" da Netflix ou "Modern Love"da própria Prime Vídeo.
Seguindo a estrutura de "Relatos Selvagens", aqui temos oito homens que enfrentam a crise de meia-idade divididos em cinco episódios independentes. E. (Eduardo Fernandez) é aquele homem que se acha um fracassado, ele acaba de perder tudo (inclusive a mulher) e volta a morar na casa da mãe com seus 45 anos; ele se encontra casualmente com um amigo de longa data, J. (Eduardo Sbaraglia), que venceu profissionalmente na vida, conquistando tudo que sempre desejou, mas que sofre de ansiedade e depressão. Já S. (Javier Camara) tenta retomar o casamento dois anos após o divórcio, enquanto G. (Ricardo Darín) confessa para o conhecido L. (Luis Tosar) que desconfia que sua esposa está traindo ele. P. (Eduardo Noriega) é um jovem que tenta seduzir uma colega durante uma festa de trabalho, mas acaba sendo surpreendido por ela. E para finalizar, conhecemos A. (Alberto San Juan) e M. (Jordi Mollà) dois grandes amigos que têm seus segredos íntimos revelados pelas mulheres quando estão a caminho de uma festa de aniversário. Confira o trailer (em espanhol):
Os dois elementos que mais chamam atenção logo a primeira vista e que merece todos os elogios possíveis são: o roteiro e o trabalho do elenco. Ao partirmos do princípio que o filme se apropria de um estilo de crônicas sobre o universo masculino, formatadas para serem facilmente digeridas pela audiência e equilibrando o drama da situação com a leveza do diálogo, fica muito claro a importância de um texto inteligente e da performance dos atores - é impressionante como as histórias são próximas de uma realidade que "já ouvimos falar". Basicamente, "O que os homens falam" são como esquetes teatrais, elas seguem um ritmo próprio e a composição dos temas discutidos são parecidos, mas são as ironias que dão o toque final - eu diria, aliás, que essas ironias são recheadas de uma honestidade brutal, e isso é incrível.
É preciso dizer que "Una pistola en cada mano" (título original) transita muito bem entre a angústia de uma situação com a necessidade de não expor os sentimentos - tão particular do gênero masculino. Essa sutileza dramática eleva conversas que aparentemente são banais, mas que carregam muitos sentimentos e inseguranças! Não esperem conclusões filosóficas ao final de cada história, não é essa a intenção do roteiro e muito menos do diretor Cesc Gay - o que precisa ser dito, é dito e pronto; o segredo (e a beleza desse tipo de narrativa) é o que fazemos com toda informação que nos é dada e como refletimos ao projetarmos a mesma situação em nossa vida.
"O que os homens falam" é um filme que poderia ser uma temporada de "Easy" facilmente (ou de duas séries inglesas com o mesmo tema: "Dates" e "True Love" que infelizmente não chamaram tanta atenção até aqui). Vale muito a pena, é um entretenimento inteligente, com um toque de provocação e curiosidade feminina - prato cheio para o julgamento, mas sensata ao desconstruir o esteriótipo do macho alpha!
Pode dar o play sem receio!
Talvez o primeiro passo para que uma relação seja bem sucedida, independente do tipo ou do propósito, sem a menor dúvida, diz respeito ao alinhamento de expectativas. Definitivamente, para os personagens de "O Refúgio" isso está longe de acontecer. Eu diria que a história que o ótimo diretor Sean Durkin conta, é tão impactante e visceral quanto a de "História de um Casamento" - embora o objeto do conflito, dessa vez, não seja um filho e sim o dinheiro (e a forma como ele é encarado).
Roy (Jude Law) é um empreendedor carismático e ambicioso que escolhe se mudar para Inglaterra com sua família, para aproveitar as oportunidades da Londres dos anos 80. Alisson (Carrie Coon), esposa de Roy, tem enormes dificuldades para se adaptar ao novo estilo de vida e vê os sonhos e as promessas do marido não se concretizarem, mais uma vez. O filme mostra o cotidiano do casal que precisa enfrentar as duras e indesejáveis verdades da vida, além da tentativa de encontrar uma forma de se conectar novamente - entre eles e com os filhos Bem (Charlie Shotwell) e Sam (Oona Roche). Confira o trailer (em inglês):
Já que o assunto é sobre "alinhar as expectativas", eu já antecipo: esse é mais um drama de relação denso e com uma narrativa bastante cadenciada onde o principal objetivo não é encontrar um fim e sim servir como "meio" para as provocações e reflexões que a história vai nos propondo durante os 100 minutos de filme. Veja, "O Refúgio" não se propõe a mostrar a transformação, mas quais são os gatilhos que podem nos levar até ela - e aqui é preciso deixar claro que esses gatilhos são dos mais dolorosos para quem se identifica com alguma passagem da trama.
Jude Law mais uma vez foi capaz de captar a essência daquela linha tênue entre a simpatia carismática cheia de energia com a insegurança e fragilidade de um homem que esperava mais (e mais) das suas conquistas - Law traz muito de Dan de "Closer" para o personagem. Já Carrie Coon é a personificação da angústia, da decepção, da falta de admiração pelo companheiro - ela é tão intensa que nos colocamos no seu lugar e passamos a enxergar seu marido com outros (não tão bons) olhos. Por se tratar de um "filme de relações", "O Refúgio" se movimenta muito mais pelos sentimentos dos personagens do que pela força da história.
Esse filme é um retrato absurdamente real de como uma vida de altos e baixos pode contaminar até os relacionamentos mais estáveis. Se Roy e Ali já demonstravam sinais de fragilidade antes mesmo da bomba estourar, certamente a relação familiar na presença dos filhos, não. E nesse ponto Durkin, que também assina o roteiro, soube valorizar (mesmo sem tempo de se aprofundar) como um relacionamento pesado pode impactar na vida das crianças - é para refletir!
Se você gosta de discutir as relações humanas, com personagens cheio de camadas, dê o play sem medo! Vale a pena!
Talvez o primeiro passo para que uma relação seja bem sucedida, independente do tipo ou do propósito, sem a menor dúvida, diz respeito ao alinhamento de expectativas. Definitivamente, para os personagens de "O Refúgio" isso está longe de acontecer. Eu diria que a história que o ótimo diretor Sean Durkin conta, é tão impactante e visceral quanto a de "História de um Casamento" - embora o objeto do conflito, dessa vez, não seja um filho e sim o dinheiro (e a forma como ele é encarado).
Roy (Jude Law) é um empreendedor carismático e ambicioso que escolhe se mudar para Inglaterra com sua família, para aproveitar as oportunidades da Londres dos anos 80. Alisson (Carrie Coon), esposa de Roy, tem enormes dificuldades para se adaptar ao novo estilo de vida e vê os sonhos e as promessas do marido não se concretizarem, mais uma vez. O filme mostra o cotidiano do casal que precisa enfrentar as duras e indesejáveis verdades da vida, além da tentativa de encontrar uma forma de se conectar novamente - entre eles e com os filhos Bem (Charlie Shotwell) e Sam (Oona Roche). Confira o trailer (em inglês):
Já que o assunto é sobre "alinhar as expectativas", eu já antecipo: esse é mais um drama de relação denso e com uma narrativa bastante cadenciada onde o principal objetivo não é encontrar um fim e sim servir como "meio" para as provocações e reflexões que a história vai nos propondo durante os 100 minutos de filme. Veja, "O Refúgio" não se propõe a mostrar a transformação, mas quais são os gatilhos que podem nos levar até ela - e aqui é preciso deixar claro que esses gatilhos são dos mais dolorosos para quem se identifica com alguma passagem da trama.
Jude Law mais uma vez foi capaz de captar a essência daquela linha tênue entre a simpatia carismática cheia de energia com a insegurança e fragilidade de um homem que esperava mais (e mais) das suas conquistas - Law traz muito de Dan de "Closer" para o personagem. Já Carrie Coon é a personificação da angústia, da decepção, da falta de admiração pelo companheiro - ela é tão intensa que nos colocamos no seu lugar e passamos a enxergar seu marido com outros (não tão bons) olhos. Por se tratar de um "filme de relações", "O Refúgio" se movimenta muito mais pelos sentimentos dos personagens do que pela força da história.
Esse filme é um retrato absurdamente real de como uma vida de altos e baixos pode contaminar até os relacionamentos mais estáveis. Se Roy e Ali já demonstravam sinais de fragilidade antes mesmo da bomba estourar, certamente a relação familiar na presença dos filhos, não. E nesse ponto Durkin, que também assina o roteiro, soube valorizar (mesmo sem tempo de se aprofundar) como um relacionamento pesado pode impactar na vida das crianças - é para refletir!
Se você gosta de discutir as relações humanas, com personagens cheio de camadas, dê o play sem medo! Vale a pena!
"O Sabor da Vida" é um típico drama francês - na sua essência e na sua cadência. O curioso, no entanto, é que o filme foi dirigido pelo Anh Hung Tran, de "O Cheiro do Papaia Verde" e de "As Luzes de um Verão" - todos reverenciados em Cannes. Esse imigrante vietnamita que desde os anos 90 se posicionou no cinema europeu como um contador de histórias sensíveis sobre as relações, sempre inseridas em um contexto poético, outra uma vez entrega um obra para, mais do que assistir, admirar! "La Passion de Dodin Bouffant" (no original) não é um filme tradicional, ele é mais uma poesia, cheia de simbolismos (claro), que explora a conexão íntima entre a gastronomia e as emoções humanas. Baseado na obra de Marcel Rouff, o filme retrata a relação complexa e profunda entre o renomado chef Dodin Bouffant e sua cozinheira Eugénie, em uma história que se desenrola na França de 1885. Com uma abordagem intimista e muito sensível, "O Sabor da Vida"evoca o universo sensorial da culinária como expressão de amor, desejo, dedicação e arte - uma espécie de "Chef's Table" do século XIX"!
A narrativa gira em torno da paixão que une Dodin (Benoît Magimel) e Eugénie (Juliette Binoche), tanto na cozinha quanto fora dela. Em meio à preparação de pratos elaborados e cenas de refinada técnica culinária, o relacionamento dos dois é revelado com muita sutileza. Dodin deseja que Eugénie se case com ele, mas ela hesita em aceitar, já que é uma mulher de princípios independentes e dedicada a sua arte - para ela, o amor entre os dois está na relação profissional. Acontece que a dualidade entre o desejo de liberdade de Eugénie e a conexão emocional que a gastronomia proporciona para ambos, reflete as nuances de uma relação que transcende as palavras até que Dodin, finalmente, resolve cozinhar para ela. Confira o trailer:
Até pela proposta narrativa de "O Sabor da Vida", imediatamente já entendemos o quanto a direção de Anh Hung Tran prioriza o sutil e o contemplativa. Capturando cada detalhe com precisão e profundidade, o diretor faz uso de uma cinematografia rica e texturizada, onde cada prato preparado se torna uma verdadeira obra de arte. A fotografia de Jonathan Ricquebourg volta sua câmera para as sensações e texturas daquele mundo cheio de cores e sabores - os pratos e ingredientes são filmados com um olhar cuidadoso, quase reverencial, evocando o fascínio e o respeito pela culinária francesa tradicional. Alinhado com o estilo de Hung Tran, Ricquebourg utiliza planos fechados que intensificam a experiência sensorial, permitindo que a audiência praticamente "sinta" o aroma e o gosto das preparações - um conselho: não assista esse filme com fome!
Benoît Magimel e Juliette Binoche, ambos com atuações sublimes, capturam a complexidade de seus personagens com uma química magnética (eles já foram um casal na vida real). Magimel traz a Dodin uma camada de profundidade que vai além do mero papel de um chef; ele é um homem apaixonado pela comida e pelas experiências que o sabor pode proporcionar, mas também é uma figura vulnerável e de certa forma inseguro perante seu amor por Eugénie. Binoche, por sua vez, oferece uma interpretação rica e contida, expressando uma força interior e uma independência que são fundamentais para o desenvolvimento da narrativa. A dinâmica entre os dois é carregada de desejo e respeito mútuo, se comunicando mais pelos gestos e olhares do que com palavras, em um retrato delicado do amor e do companheirismo verdadeiro.
Veja, o filme se concentra nos momentos de convivência silenciosa, nas delicadezas que revelam as profundezas emocionais dos protagonistas, ou seja, você está realmente diante de um drama de relações nada convencional, mas belíssimo de assistir. "O Sabor da Vida" poderia até ter, mas evita cenas dramáticas intensas para construir uma jornada onde os pequenos detalhes, como a preparação de uma refeição ou o ajuste cuidadoso de um prato, se tornam veículos de expressão muito mais potentes e representativos de um sentimento mais íntimo. Indicado ao Oscar de Filme Internacional pela França e premiado em festivais importantes em 2023, "O Sabor da Vida" é belo e reflexivo, moldado para aqueles que apreciam o cinema sensorial e o valor de uma boa gastronomia.
Vale muito o seu play!
"O Sabor da Vida" é um típico drama francês - na sua essência e na sua cadência. O curioso, no entanto, é que o filme foi dirigido pelo Anh Hung Tran, de "O Cheiro do Papaia Verde" e de "As Luzes de um Verão" - todos reverenciados em Cannes. Esse imigrante vietnamita que desde os anos 90 se posicionou no cinema europeu como um contador de histórias sensíveis sobre as relações, sempre inseridas em um contexto poético, outra uma vez entrega um obra para, mais do que assistir, admirar! "La Passion de Dodin Bouffant" (no original) não é um filme tradicional, ele é mais uma poesia, cheia de simbolismos (claro), que explora a conexão íntima entre a gastronomia e as emoções humanas. Baseado na obra de Marcel Rouff, o filme retrata a relação complexa e profunda entre o renomado chef Dodin Bouffant e sua cozinheira Eugénie, em uma história que se desenrola na França de 1885. Com uma abordagem intimista e muito sensível, "O Sabor da Vida"evoca o universo sensorial da culinária como expressão de amor, desejo, dedicação e arte - uma espécie de "Chef's Table" do século XIX"!
A narrativa gira em torno da paixão que une Dodin (Benoît Magimel) e Eugénie (Juliette Binoche), tanto na cozinha quanto fora dela. Em meio à preparação de pratos elaborados e cenas de refinada técnica culinária, o relacionamento dos dois é revelado com muita sutileza. Dodin deseja que Eugénie se case com ele, mas ela hesita em aceitar, já que é uma mulher de princípios independentes e dedicada a sua arte - para ela, o amor entre os dois está na relação profissional. Acontece que a dualidade entre o desejo de liberdade de Eugénie e a conexão emocional que a gastronomia proporciona para ambos, reflete as nuances de uma relação que transcende as palavras até que Dodin, finalmente, resolve cozinhar para ela. Confira o trailer:
Até pela proposta narrativa de "O Sabor da Vida", imediatamente já entendemos o quanto a direção de Anh Hung Tran prioriza o sutil e o contemplativa. Capturando cada detalhe com precisão e profundidade, o diretor faz uso de uma cinematografia rica e texturizada, onde cada prato preparado se torna uma verdadeira obra de arte. A fotografia de Jonathan Ricquebourg volta sua câmera para as sensações e texturas daquele mundo cheio de cores e sabores - os pratos e ingredientes são filmados com um olhar cuidadoso, quase reverencial, evocando o fascínio e o respeito pela culinária francesa tradicional. Alinhado com o estilo de Hung Tran, Ricquebourg utiliza planos fechados que intensificam a experiência sensorial, permitindo que a audiência praticamente "sinta" o aroma e o gosto das preparações - um conselho: não assista esse filme com fome!
Benoît Magimel e Juliette Binoche, ambos com atuações sublimes, capturam a complexidade de seus personagens com uma química magnética (eles já foram um casal na vida real). Magimel traz a Dodin uma camada de profundidade que vai além do mero papel de um chef; ele é um homem apaixonado pela comida e pelas experiências que o sabor pode proporcionar, mas também é uma figura vulnerável e de certa forma inseguro perante seu amor por Eugénie. Binoche, por sua vez, oferece uma interpretação rica e contida, expressando uma força interior e uma independência que são fundamentais para o desenvolvimento da narrativa. A dinâmica entre os dois é carregada de desejo e respeito mútuo, se comunicando mais pelos gestos e olhares do que com palavras, em um retrato delicado do amor e do companheirismo verdadeiro.
Veja, o filme se concentra nos momentos de convivência silenciosa, nas delicadezas que revelam as profundezas emocionais dos protagonistas, ou seja, você está realmente diante de um drama de relações nada convencional, mas belíssimo de assistir. "O Sabor da Vida" poderia até ter, mas evita cenas dramáticas intensas para construir uma jornada onde os pequenos detalhes, como a preparação de uma refeição ou o ajuste cuidadoso de um prato, se tornam veículos de expressão muito mais potentes e representativos de um sentimento mais íntimo. Indicado ao Oscar de Filme Internacional pela França e premiado em festivais importantes em 2023, "O Sabor da Vida" é belo e reflexivo, moldado para aqueles que apreciam o cinema sensorial e o valor de uma boa gastronomia.
Vale muito o seu play!
O Dr. Steven Murphy (Colin Farrell) é um cardiologista conceituado que é casado com Anna (Nicole Kidman), com quem tem dois filhos: Kim (Raffey Cassidy) e Bob (Sunny Suljic). Já há algum tempo ele mantém contato frequente com Martin (Barry Keoghan), um adolescente cujo pai morreu na mesa de operação, justamente quando era operado por Steven. Talvez tomado pela culpa, o médico se coloca em uma posição bastante fraternal perante Martin - a relação dos dois sugere certa intimidade e carinho, tanto que Steven lhe dá presentes e em um determinado momento decide, inclusive, apresentá-lo à família. Entretanto, quando o jovem passa a não receber mais a atenção de antigamente, ele decide elaborar um plano de vingança para que a vida que lhe foi tirada seja recompensada de alguma forma. Confira o trailer:
"O Sacrifício do Cervo Sagrado" nada mais é do que uma tentativa de transformar uma história rasa do grego Yorgos Lanthimos ("The Lobster") em um filme bem ao estilo "Darren Aronofsky" (de "Mãe!"). É um festival de travelling, de zoom in, zoom out, que chega a ser irritante para quem se apega ao elementos mais técnicos de um filme - não soa um conceito estético definido e sim uma sugestão de modernidade ou identidade que simplesmente não existe. O filme não é ruim, longe disso, mas tem um roteiro abaixo do real valor da premissa que assistimos no trailer, por exemplo
Existem elementos interessantes, simbolismos e diálogos inteligentes, mas quando juntamos tudo isso, parece uma enorme confusão de gêneros. Não sei, "O Sacrifício do Cervo Sagrado" tem bons momentos, algumas cenas fortes, gera uma certa tensão, mas no final percebemos que é só um bom entretenimento que vai agradar mais uns do que outros.
Os fãs do diretor vão gostar, então, provavelmente, é por isso que você está recebendo essa recomendação!
O Dr. Steven Murphy (Colin Farrell) é um cardiologista conceituado que é casado com Anna (Nicole Kidman), com quem tem dois filhos: Kim (Raffey Cassidy) e Bob (Sunny Suljic). Já há algum tempo ele mantém contato frequente com Martin (Barry Keoghan), um adolescente cujo pai morreu na mesa de operação, justamente quando era operado por Steven. Talvez tomado pela culpa, o médico se coloca em uma posição bastante fraternal perante Martin - a relação dos dois sugere certa intimidade e carinho, tanto que Steven lhe dá presentes e em um determinado momento decide, inclusive, apresentá-lo à família. Entretanto, quando o jovem passa a não receber mais a atenção de antigamente, ele decide elaborar um plano de vingança para que a vida que lhe foi tirada seja recompensada de alguma forma. Confira o trailer:
"O Sacrifício do Cervo Sagrado" nada mais é do que uma tentativa de transformar uma história rasa do grego Yorgos Lanthimos ("The Lobster") em um filme bem ao estilo "Darren Aronofsky" (de "Mãe!"). É um festival de travelling, de zoom in, zoom out, que chega a ser irritante para quem se apega ao elementos mais técnicos de um filme - não soa um conceito estético definido e sim uma sugestão de modernidade ou identidade que simplesmente não existe. O filme não é ruim, longe disso, mas tem um roteiro abaixo do real valor da premissa que assistimos no trailer, por exemplo
Existem elementos interessantes, simbolismos e diálogos inteligentes, mas quando juntamos tudo isso, parece uma enorme confusão de gêneros. Não sei, "O Sacrifício do Cervo Sagrado" tem bons momentos, algumas cenas fortes, gera uma certa tensão, mas no final percebemos que é só um bom entretenimento que vai agradar mais uns do que outros.
Os fãs do diretor vão gostar, então, provavelmente, é por isso que você está recebendo essa recomendação!
Como tudo na vida que possa soar oportunismo, muitas histórias interessantes acabaram caindo na definição pejorativa de auto-ajuda sem ao menos ter a chance de nos convencer do contrário. A mesma avalanche que traz, leva, e, certamente, esse movimento nos afastou de ótimas narrativas pelo simples fato de nos apoiarmos no preconceito como uma forma de defesa - natural pela enorme quantidade de besteiras que foram ditas e produzidas durante anos. O fato é que "O Segredo - Ouse Sonhar" recebeu esse olhar desconfiado (inclusive desse que vos escreve), injustamente, já que o filme é uma delicia de assistir e, sim, nos entrega mensagens que nos enchem de energia.
Baseado em uma das histórias do livro de sucesso "O Segredo", de Rhonda Byrne, o filme nos apresenta Miranda (Katie Holmes), uma viúva com três filhos que acaba se envolvendo em um acidente de trânsito que, sem ela desconfiar, vai mudar o rumo da sua vida. Ao se oferecer para consertar o parachoque danificado do carro de Miranda, Bray (Josh Lucas) passa a compartilhar com ela (e com seus filhos) sua filosofia e crença no poder do universo para entregar o que queremos. Bray explica sua teoria sobre a lei da atração e o quanto é importante acreditar que os pensamentos positivos têm um grande poder de influenciar diretamente no dia a dia de qualquer pessoa, sendo possível alcançar qualquer objetivo da vida da melhor forma - algo que para Miranda soa fora da realidade. Confira o trailer:
Inegavelmente que depois de ler a sinopse e assistir o trailer, temos a clara sensação de que se trata de mais um filme "água com açúcar" bem ao estilo "Sessão da Tarde" - e, de fato, a construção narrativa comprova essa percepção, mas nem por isso "O Segredo - Ouse Sonhar" deixa de ser um bom entretenimento. O filme surpreende pela forma fluída que a história é contada e pela qualidade da sua produção. O diretor Andy Tennant não inventa, apenas replica a mesma fórmula de sucesso que ele usou por muito tempo em "O Método Kominsky" - tratar de assuntos que beiram a superficialidade, com sensibilidade, inteligência e emoção. E veja, a superficialidade está no forma como reagimos ao nosso próprio preconceito, não necessariamente ao tema em si. Tennant é esperto, ele cria uma atmosfera muito confortável para quem assiste e quando nos damos conta, já estamos completamente envolvidos com os personagens. Katie Holmes continua sendo a Joe de "Dawson's Creek", só que 15 anos mais velha. Josh Lucas não é lá aquele grande ator, mas a verdade é que existe química entre ambos - a conexão funciona!
O roteiro, é preciso que se diga, cai na tentação de transformar Bray na salvação de uma Miranda pessimista e falida - essa interpretação é legítima, mas entendendo o real objetivo do filme, fica muito fácil embarcar na sua proposta e essa composição completamente estereotipada passa batido ou pelo menos não incomoda tanto. "O Segredo - Ouse Sonhar" está recheado de frases prontas e motivacionais, mas quem dá o play não se incomoda em ouvi-las e, sim, a sensação de bem-estar que o filme produz justifica a escolha. Se você acredita na frase: "É através das coincidências que Deus permanece anônimo", pode dar o play sem o menor receio que seu entretenimento e o sorriso ao final do filme estão garantidos!
Sorrindo, eu te digo: vale seu play!
Como tudo na vida que possa soar oportunismo, muitas histórias interessantes acabaram caindo na definição pejorativa de auto-ajuda sem ao menos ter a chance de nos convencer do contrário. A mesma avalanche que traz, leva, e, certamente, esse movimento nos afastou de ótimas narrativas pelo simples fato de nos apoiarmos no preconceito como uma forma de defesa - natural pela enorme quantidade de besteiras que foram ditas e produzidas durante anos. O fato é que "O Segredo - Ouse Sonhar" recebeu esse olhar desconfiado (inclusive desse que vos escreve), injustamente, já que o filme é uma delicia de assistir e, sim, nos entrega mensagens que nos enchem de energia.
Baseado em uma das histórias do livro de sucesso "O Segredo", de Rhonda Byrne, o filme nos apresenta Miranda (Katie Holmes), uma viúva com três filhos que acaba se envolvendo em um acidente de trânsito que, sem ela desconfiar, vai mudar o rumo da sua vida. Ao se oferecer para consertar o parachoque danificado do carro de Miranda, Bray (Josh Lucas) passa a compartilhar com ela (e com seus filhos) sua filosofia e crença no poder do universo para entregar o que queremos. Bray explica sua teoria sobre a lei da atração e o quanto é importante acreditar que os pensamentos positivos têm um grande poder de influenciar diretamente no dia a dia de qualquer pessoa, sendo possível alcançar qualquer objetivo da vida da melhor forma - algo que para Miranda soa fora da realidade. Confira o trailer:
Inegavelmente que depois de ler a sinopse e assistir o trailer, temos a clara sensação de que se trata de mais um filme "água com açúcar" bem ao estilo "Sessão da Tarde" - e, de fato, a construção narrativa comprova essa percepção, mas nem por isso "O Segredo - Ouse Sonhar" deixa de ser um bom entretenimento. O filme surpreende pela forma fluída que a história é contada e pela qualidade da sua produção. O diretor Andy Tennant não inventa, apenas replica a mesma fórmula de sucesso que ele usou por muito tempo em "O Método Kominsky" - tratar de assuntos que beiram a superficialidade, com sensibilidade, inteligência e emoção. E veja, a superficialidade está no forma como reagimos ao nosso próprio preconceito, não necessariamente ao tema em si. Tennant é esperto, ele cria uma atmosfera muito confortável para quem assiste e quando nos damos conta, já estamos completamente envolvidos com os personagens. Katie Holmes continua sendo a Joe de "Dawson's Creek", só que 15 anos mais velha. Josh Lucas não é lá aquele grande ator, mas a verdade é que existe química entre ambos - a conexão funciona!
O roteiro, é preciso que se diga, cai na tentação de transformar Bray na salvação de uma Miranda pessimista e falida - essa interpretação é legítima, mas entendendo o real objetivo do filme, fica muito fácil embarcar na sua proposta e essa composição completamente estereotipada passa batido ou pelo menos não incomoda tanto. "O Segredo - Ouse Sonhar" está recheado de frases prontas e motivacionais, mas quem dá o play não se incomoda em ouvi-las e, sim, a sensação de bem-estar que o filme produz justifica a escolha. Se você acredita na frase: "É através das coincidências que Deus permanece anônimo", pode dar o play sem o menor receio que seu entretenimento e o sorriso ao final do filme estão garantidos!
Sorrindo, eu te digo: vale seu play!
"O Tempo Que Te Dou" é um sopro de criatividade e inovação ao se propor contar uma bem construída e dinâmica história de amor, em dois tempos diferentes e em episódios de apenas 11 minutos - isso mesmo, a experiência de assistir episódios tão curtinhos e excelentes em sua essência, é demais! Auto-intitulada como "uma história de amor original Netflix", o projeto criado por Nadia de Santiago, Inés Pintor e Pablo Santidrián, além de visualmente impecável e cheio de identidade (trazendo o melhor do cinema independente espanhol pelas mãos de Santidrián e de Pintor), ainda tem um roteiro dos mais inteligentes e com um conceito narrativo extremamente original - veja, a cada episódio a história é dividida em minutos, sempre alternando entre passado e presente de acordo com o entendimento que a protagonista tem em relação ao término do seu namoro. Então se no começo da minissérie o passado tem mais peso perante o presente, com o passar dos episódios, o presente vai ganhando, minuto a minuto, mais importância - genial, não?
A minissérie basicamente, acompanha o casal Lina (Nadia de Santiago) e Nico (Álvaro de Cervantes), dois jovens que viveram um romance dos mais apaixonantes, mas que, aos poucos, foram se afastando. Quando o relacionamento com Nico chega ao fim, Lina precisa deixar as lembranças do relacionamento para trás e se concentrar em si mesma. Ao longo de 10 episódios, ela aprenderá a dedicar um minuto a menos ao passado e um a mais ao presente, dando novo significado à expressão “o tempo cura todas as feridas". Confira o trailer e se apaixone:
Tudo em "O Tempo Que Te Dou" merece sua máxima atenção, especialmente pela sensibilidade e delicadeza da sua narrativa . Aliás, essa narrativa que não segue uma linha temporal linear, mas sim um ritmo fragmentado, onde cada episódio dedica um tempo específico ao passado e ao presente, eu diria é ousada e intrigante. É praticamente impossível não se conectar com as diferentes fases da relação de Lina e Nico e criar um paralelo íntimos com nossas experiências de vida. É impressionante como o roteiro vai tecendo um mosaico de memórias, alegrias e tristezas e assim construindo a complexa personalidade dos personagens. Veja, não existe "mocinho" ou "bandido", mas sim uma relação de "causa e consequência" que chega a ser brutal emocionalmente - o final do episódio 6 é de cortar o coração!
A direção de Santidrián e de Pintor é precisa, explorando ao máximo as nuances das emoções de Lina - isso gera um range de sensações que toca a alma!. A fotografia do Alberto Pareja, por sua vez, é uma aula - reparem como ele evidencia os tons melancólicos no presente e as cores vibrantes no passado, traduzindo na tela o estado emocional dos personagens. Outro elemento sensacional da minissérie, claro, é a trilha sonora que se mistura entre o original e o pop espanhol amplificando a carga emocional de cada cena com muita elegância narrativa. Agora, o golaço mesmo está no elenco, especialmente Nadia de Santiago - ela entrega uma performance magistral, carregando nas costas o peso da história e nos presenteando com uma Lina autêntica e multifacetada. Sua atuação é visceral e comovente, capturando com perfeição a dor da perda, a saudade do passado e a esperança de um futuro melhor. Álvaro Cervantes também brilha, mesmo com menos tempo de tela - seu Nico é cativante e tão cheio de camadas que nos faz entender os motivos de suas atitudes até o término (o que não nos impede de torcer pela felicidade do casal).
Chega ser surpreendente que esse projeto não tenha recebido mais destaque já que "El tiempo que te doy" (no original) é na pura expressão das palavras: uma obra poética e profunda que explora com maestria os temas universais do amor, da perda, da superação e do autoconhecimento. Certamente um convite a refletir sobre nossas próprias relações, sobre os erros que cometemos e sobre as lições que aprendemos ao longo da vida. É um verdadeiro presente para quem gosta de boas histórias contadas de uma maneira criativa e original!
Vale demais esse play!
"O Tempo Que Te Dou" é um sopro de criatividade e inovação ao se propor contar uma bem construída e dinâmica história de amor, em dois tempos diferentes e em episódios de apenas 11 minutos - isso mesmo, a experiência de assistir episódios tão curtinhos e excelentes em sua essência, é demais! Auto-intitulada como "uma história de amor original Netflix", o projeto criado por Nadia de Santiago, Inés Pintor e Pablo Santidrián, além de visualmente impecável e cheio de identidade (trazendo o melhor do cinema independente espanhol pelas mãos de Santidrián e de Pintor), ainda tem um roteiro dos mais inteligentes e com um conceito narrativo extremamente original - veja, a cada episódio a história é dividida em minutos, sempre alternando entre passado e presente de acordo com o entendimento que a protagonista tem em relação ao término do seu namoro. Então se no começo da minissérie o passado tem mais peso perante o presente, com o passar dos episódios, o presente vai ganhando, minuto a minuto, mais importância - genial, não?
A minissérie basicamente, acompanha o casal Lina (Nadia de Santiago) e Nico (Álvaro de Cervantes), dois jovens que viveram um romance dos mais apaixonantes, mas que, aos poucos, foram se afastando. Quando o relacionamento com Nico chega ao fim, Lina precisa deixar as lembranças do relacionamento para trás e se concentrar em si mesma. Ao longo de 10 episódios, ela aprenderá a dedicar um minuto a menos ao passado e um a mais ao presente, dando novo significado à expressão “o tempo cura todas as feridas". Confira o trailer e se apaixone:
Tudo em "O Tempo Que Te Dou" merece sua máxima atenção, especialmente pela sensibilidade e delicadeza da sua narrativa . Aliás, essa narrativa que não segue uma linha temporal linear, mas sim um ritmo fragmentado, onde cada episódio dedica um tempo específico ao passado e ao presente, eu diria é ousada e intrigante. É praticamente impossível não se conectar com as diferentes fases da relação de Lina e Nico e criar um paralelo íntimos com nossas experiências de vida. É impressionante como o roteiro vai tecendo um mosaico de memórias, alegrias e tristezas e assim construindo a complexa personalidade dos personagens. Veja, não existe "mocinho" ou "bandido", mas sim uma relação de "causa e consequência" que chega a ser brutal emocionalmente - o final do episódio 6 é de cortar o coração!
A direção de Santidrián e de Pintor é precisa, explorando ao máximo as nuances das emoções de Lina - isso gera um range de sensações que toca a alma!. A fotografia do Alberto Pareja, por sua vez, é uma aula - reparem como ele evidencia os tons melancólicos no presente e as cores vibrantes no passado, traduzindo na tela o estado emocional dos personagens. Outro elemento sensacional da minissérie, claro, é a trilha sonora que se mistura entre o original e o pop espanhol amplificando a carga emocional de cada cena com muita elegância narrativa. Agora, o golaço mesmo está no elenco, especialmente Nadia de Santiago - ela entrega uma performance magistral, carregando nas costas o peso da história e nos presenteando com uma Lina autêntica e multifacetada. Sua atuação é visceral e comovente, capturando com perfeição a dor da perda, a saudade do passado e a esperança de um futuro melhor. Álvaro Cervantes também brilha, mesmo com menos tempo de tela - seu Nico é cativante e tão cheio de camadas que nos faz entender os motivos de suas atitudes até o término (o que não nos impede de torcer pela felicidade do casal).
Chega ser surpreendente que esse projeto não tenha recebido mais destaque já que "El tiempo que te doy" (no original) é na pura expressão das palavras: uma obra poética e profunda que explora com maestria os temas universais do amor, da perda, da superação e do autoconhecimento. Certamente um convite a refletir sobre nossas próprias relações, sobre os erros que cometemos e sobre as lições que aprendemos ao longo da vida. É um verdadeiro presente para quem gosta de boas histórias contadas de uma maneira criativa e original!
Vale demais esse play!
Finalista no Festival de Locarno em 2013, "O Último Amor de Mr. Morgan" é daqueles filmes que enchem nosso coração de felicidade - mesmo sendo completamente previsível e tendo uma história que parece que já vimos em algum lugar, sabe? No filme, Mr. Morgan (Michael Caine) acabou de perder a esposa (Jane Alexander) para o câncer. Embora americano, Mr. Morgan decide continuar em Paris onde mora, mesmo sem falar francês e vivendo praticamente sozinho, ele é tomado pela tristeza e pelas lembranças do grande amor da sua vida. Certo dia, ele conhece Pauline (Clémence Poésy), uma professora de dança que desperta uma nova motivação em sua rotina: a vontade de viver para poder estar ao lado dessa adorável jovem. Durante a história, ainda conhecemos a relação conturbada dele com os filhos Karen (Gillian Anderson) e Miles (Justin Kirk) e como isso impactou na sua forma de enxergar os laços familiares. Confira o trailer:
Um ano após o grande sucesso de Michael Haneke, "Amour" (Amor), "Last Love" (título original) fala sobre temas muito parecidos: os ciclos da vida, as relações familiares e, claro, sobre como a falta de comunicação pode nos afastar de um amor verdadeiro e nos encher de ressentimentos e arrependimentos. Embora não seja uma narrativa tão marcante, "O Último Amor de Mr. Morgan" é uma delicia de assistir e equilibra perfeitamente momentos leves e emotivos, com o drama e a profundidade de algumas marcas que a vida nos deixa.
Filme para curtir, em um lindo cenário, com uma trilha sonora maravilhosa que nos faz refletir em vários momentos e valorizar algumas coisas que teimamos em esquecer graças ao dia a dia corrido que vivemos!
A premiada diretora alemã, Sandra Nettelbeck (de "Bella Martha") é muito competente em criar uma atmosfera bastante nostálgica ao apresentar os conflitos de cada personagem. Com muita habilidade, ela trabalha enquadramentos que misturam realidade com imaginação que, muito mais que uma habilidade técnica, é capaz que nos proporcionar sensações bastante especiais. Reparem como Mr. Morgan se relaciona com a esposa morta com uma delicadeza impressionante!
Como roteirista, Nettelbeck, é muito inteligente em dividir muito bem a história - uma adaptação da obra de Françoise Dorner. No primeiro ato, o foco está na relação de Mr. Morgan e Pauline - uma jovem de certa forma misteriosa que apareceu na vida do protagonista em um momento de fragilidade e tristeza, com sua doçura e projetando nele uma figura paterna - aqui existe um jogo interessante proposto pelo texto: como sabemos pouco de Pauline e entendemos o momento de Morgan, é inevitável não se questionar se esse encantamento entre os dois pode ir além de uma inocente amizade, mas, sinceramente, os diálogos são tão bem escritos que até isso pouco importa diante do que ambos estão vivendo.
Pois bem, no segundo ato acompanhamos a entrada dos filhos de Mr. Morgan na história. Se no início acompanhamos o luto do protagonista e a esperança do recomeço ao conhecer Pauline, agora somos provocados a nos questionar perante o relacionamento familiar e a verdade que Morgan pode esconder através da sua personalidade - e aproveito para citar o excelente trabalho do ator Michael Caine. É no desenrolar desse ato que o roteiro de Nettelbeck acerta e erra ao mesmo tempo: se ela vai nos contando sobre a vida dos personagens nos momentos certos, ela vacila ao deixar claro por quem Pauline vai, de fato, se apaixonar - e fique tranquilo, isso não está nem perto de ser um spoiler de tão óbvio que é desde o primeiro momento!
Para finalizar, temos um terceiro ato onde sua relação com Pauline se mistura com os conflitos familiares em busca de uma solução - eu diria até, em busca de uma redenção e o texto não decepciona. Os diálogos são cirúrgicos ao não cair no piegas e Nettelbeck entrega, nos detalhes, um filme com alma! Daqueles que sentimos na pele ao assistir e que nos trazem coisas boas, mesmo quando algo ruim pode acontecer na tela. Emoção no ponto certo e aqui vai meu segundo destaque do elenco: Clémency Poésy é doce, talentosa e linda!
Ao som de uma trilha sonora de Hans Zimmer que conta com Norah Jones e uma belíssima versão de "Not to Late", “O Último Amor de Mr. Morgan” é um ótimo filme para assistir, sentir e se divertir! Vale muito a pena com aquele aperto no coração da saudade!
Finalista no Festival de Locarno em 2013, "O Último Amor de Mr. Morgan" é daqueles filmes que enchem nosso coração de felicidade - mesmo sendo completamente previsível e tendo uma história que parece que já vimos em algum lugar, sabe? No filme, Mr. Morgan (Michael Caine) acabou de perder a esposa (Jane Alexander) para o câncer. Embora americano, Mr. Morgan decide continuar em Paris onde mora, mesmo sem falar francês e vivendo praticamente sozinho, ele é tomado pela tristeza e pelas lembranças do grande amor da sua vida. Certo dia, ele conhece Pauline (Clémence Poésy), uma professora de dança que desperta uma nova motivação em sua rotina: a vontade de viver para poder estar ao lado dessa adorável jovem. Durante a história, ainda conhecemos a relação conturbada dele com os filhos Karen (Gillian Anderson) e Miles (Justin Kirk) e como isso impactou na sua forma de enxergar os laços familiares. Confira o trailer:
Um ano após o grande sucesso de Michael Haneke, "Amour" (Amor), "Last Love" (título original) fala sobre temas muito parecidos: os ciclos da vida, as relações familiares e, claro, sobre como a falta de comunicação pode nos afastar de um amor verdadeiro e nos encher de ressentimentos e arrependimentos. Embora não seja uma narrativa tão marcante, "O Último Amor de Mr. Morgan" é uma delicia de assistir e equilibra perfeitamente momentos leves e emotivos, com o drama e a profundidade de algumas marcas que a vida nos deixa.
Filme para curtir, em um lindo cenário, com uma trilha sonora maravilhosa que nos faz refletir em vários momentos e valorizar algumas coisas que teimamos em esquecer graças ao dia a dia corrido que vivemos!
A premiada diretora alemã, Sandra Nettelbeck (de "Bella Martha") é muito competente em criar uma atmosfera bastante nostálgica ao apresentar os conflitos de cada personagem. Com muita habilidade, ela trabalha enquadramentos que misturam realidade com imaginação que, muito mais que uma habilidade técnica, é capaz que nos proporcionar sensações bastante especiais. Reparem como Mr. Morgan se relaciona com a esposa morta com uma delicadeza impressionante!
Como roteirista, Nettelbeck, é muito inteligente em dividir muito bem a história - uma adaptação da obra de Françoise Dorner. No primeiro ato, o foco está na relação de Mr. Morgan e Pauline - uma jovem de certa forma misteriosa que apareceu na vida do protagonista em um momento de fragilidade e tristeza, com sua doçura e projetando nele uma figura paterna - aqui existe um jogo interessante proposto pelo texto: como sabemos pouco de Pauline e entendemos o momento de Morgan, é inevitável não se questionar se esse encantamento entre os dois pode ir além de uma inocente amizade, mas, sinceramente, os diálogos são tão bem escritos que até isso pouco importa diante do que ambos estão vivendo.
Pois bem, no segundo ato acompanhamos a entrada dos filhos de Mr. Morgan na história. Se no início acompanhamos o luto do protagonista e a esperança do recomeço ao conhecer Pauline, agora somos provocados a nos questionar perante o relacionamento familiar e a verdade que Morgan pode esconder através da sua personalidade - e aproveito para citar o excelente trabalho do ator Michael Caine. É no desenrolar desse ato que o roteiro de Nettelbeck acerta e erra ao mesmo tempo: se ela vai nos contando sobre a vida dos personagens nos momentos certos, ela vacila ao deixar claro por quem Pauline vai, de fato, se apaixonar - e fique tranquilo, isso não está nem perto de ser um spoiler de tão óbvio que é desde o primeiro momento!
Para finalizar, temos um terceiro ato onde sua relação com Pauline se mistura com os conflitos familiares em busca de uma solução - eu diria até, em busca de uma redenção e o texto não decepciona. Os diálogos são cirúrgicos ao não cair no piegas e Nettelbeck entrega, nos detalhes, um filme com alma! Daqueles que sentimos na pele ao assistir e que nos trazem coisas boas, mesmo quando algo ruim pode acontecer na tela. Emoção no ponto certo e aqui vai meu segundo destaque do elenco: Clémency Poésy é doce, talentosa e linda!
Ao som de uma trilha sonora de Hans Zimmer que conta com Norah Jones e uma belíssima versão de "Not to Late", “O Último Amor de Mr. Morgan” é um ótimo filme para assistir, sentir e se divertir! Vale muito a pena com aquele aperto no coração da saudade!
Em um primeiro olhar você até pode imaginar que a série "The Bear" (no original) é mais uma comédia que tem a gastronomia como pano de fundo como em "Chef" (por exemplo), porém bastam alguns minutos para entender que se trata mesmo é de um drama dos mais profundos, com personagens únicos, bem desenvolvidos, cheio de camadas - daqueles que costumamos a ver (e amar) nas séries de Vince Gilligan (de "Breaking Bad").
Aqui conhecemos o chef Carmy (Jeremy Allen White) que, após a morte do irmão mais velho, herda a lanchonete “The Original Beef de Chicago”. Carmy tem muito a oferecer, sua experiência em restaurantes renomados de NY contribui para seu novo objetivo: fazer o empreendimento do irmão prosperar. No entanto, tudo está do avesso, o lugar é caçado pela vigilância sanitária, as dívidas são enormes e a equipe é caótica, mal treinada e não leva a sério nada do que o próprio Carmy diz ou faz. Confira o trailer (em inglês):
O caos em uma cozinha obviamente rende ótimas histórias, mas em "O Urso" essa característica é só parte da dicotomia que são seus personagens: todos eles são solitários em suas dores mais profundas. É a partir desse choque de realidades que o diretor Christopher Storer (de "Ramy") constrói uma narrativa extremamente dinâmica que se aproveita de um universo muito envolvente para discutir temas diversos que vão do luto ao empreendedorismo em apenas um corte. Aliás, a montagem da série é um espetáculo a parte, com cortes rápidos e muitas vezes sem conexão entre eles, misturados com ótimos planos-sequência e inserts da cidade de Chicago ou de frames com pratos da alta gastronomia, Stores alinha seu conceito de extremos "do luxo ao lixo", tanto na "forma" quanto no "conteúdo".
É preciso dizer, no entanto, que a paixão pela série não é imediata - como em "Breaking Bad", é preciso entender a proposta conceitual do diretor e mergulhar naquela atmosfera aproveitando as atitudes e características muito peculiares dos próprios personagens para se conectar com a história. Veja, além do talento de Carmy naquele pequeno recorte de cenário (a cozinha da lanchonete onde 90% da série acontece) existem pelo menos mais quatro personagens riquíssimos a ser explorados - sem dúvida que nessa primeira temporada, o escolhido para dividir os holofotes com Jeremy Allen White foi o explosivo Richie ( com um Ebon Moss-Bachrach que dá um show), mas o roteiro é tão rico que é impossível não perceber o potencial da jovem e talentosa Sydney (Ayo Edebiri), ou do esforçado e resiliente Marcus (Lionel Boyce) e até da insegura e mal-humorada Tina (Liza Colón-Zayas).
O fato é que "O Urso" chega como uma das mais agradáveis surpresas de 2022 e postulante aos inúmeros troféus nas próximas temporadas de premiações, graças a sua impressionante força narrativa e uma enorme qualidade técnica e artística que se encaixaram de uma maneira raríssima. Imperdível!
Em um primeiro olhar você até pode imaginar que a série "The Bear" (no original) é mais uma comédia que tem a gastronomia como pano de fundo como em "Chef" (por exemplo), porém bastam alguns minutos para entender que se trata mesmo é de um drama dos mais profundos, com personagens únicos, bem desenvolvidos, cheio de camadas - daqueles que costumamos a ver (e amar) nas séries de Vince Gilligan (de "Breaking Bad").
Aqui conhecemos o chef Carmy (Jeremy Allen White) que, após a morte do irmão mais velho, herda a lanchonete “The Original Beef de Chicago”. Carmy tem muito a oferecer, sua experiência em restaurantes renomados de NY contribui para seu novo objetivo: fazer o empreendimento do irmão prosperar. No entanto, tudo está do avesso, o lugar é caçado pela vigilância sanitária, as dívidas são enormes e a equipe é caótica, mal treinada e não leva a sério nada do que o próprio Carmy diz ou faz. Confira o trailer (em inglês):
O caos em uma cozinha obviamente rende ótimas histórias, mas em "O Urso" essa característica é só parte da dicotomia que são seus personagens: todos eles são solitários em suas dores mais profundas. É a partir desse choque de realidades que o diretor Christopher Storer (de "Ramy") constrói uma narrativa extremamente dinâmica que se aproveita de um universo muito envolvente para discutir temas diversos que vão do luto ao empreendedorismo em apenas um corte. Aliás, a montagem da série é um espetáculo a parte, com cortes rápidos e muitas vezes sem conexão entre eles, misturados com ótimos planos-sequência e inserts da cidade de Chicago ou de frames com pratos da alta gastronomia, Stores alinha seu conceito de extremos "do luxo ao lixo", tanto na "forma" quanto no "conteúdo".
É preciso dizer, no entanto, que a paixão pela série não é imediata - como em "Breaking Bad", é preciso entender a proposta conceitual do diretor e mergulhar naquela atmosfera aproveitando as atitudes e características muito peculiares dos próprios personagens para se conectar com a história. Veja, além do talento de Carmy naquele pequeno recorte de cenário (a cozinha da lanchonete onde 90% da série acontece) existem pelo menos mais quatro personagens riquíssimos a ser explorados - sem dúvida que nessa primeira temporada, o escolhido para dividir os holofotes com Jeremy Allen White foi o explosivo Richie ( com um Ebon Moss-Bachrach que dá um show), mas o roteiro é tão rico que é impossível não perceber o potencial da jovem e talentosa Sydney (Ayo Edebiri), ou do esforçado e resiliente Marcus (Lionel Boyce) e até da insegura e mal-humorada Tina (Liza Colón-Zayas).
O fato é que "O Urso" chega como uma das mais agradáveis surpresas de 2022 e postulante aos inúmeros troféus nas próximas temporadas de premiações, graças a sua impressionante força narrativa e uma enorme qualidade técnica e artística que se encaixaram de uma maneira raríssima. Imperdível!
O espanhol "O Vazio do Domingo" é um filme daqueles "não assista com sono", mas não por ele ser ruim ou monótono demais, mas sim por ele ser muito cadenciado, com planos longos, um silêncio ensurdecedor e diálogos que não necessariamente expõem os sentimentos dos personagens (e muito menos suas intenções). Eu diria que esse é realmente um filme difícil, com uma pegada autoral bastante presente - o que certamente vai afastar muita gente do play, mas também é preciso dizer que para aqueles dispostos a embarcar na sensibilidade de um drama de relações denso e cheio de simbolismo como esse, ter a referência de "Sob a Pele do Lobo" pode ser um bom começo para não se decepcionar depois, porque o filme é realmente uma pancada!
Aqui conhecemos Anabel (Susi Sanchez), uma mulher de idade e bem sucedida que é surpreendida por Chiara (Bárbara Lennie), sua filha abandonada desde criança, que ressurge e a convida para passar dez dias em uma convivência bastante particular, sob causas e termos desconhecidos. Algumas experiências da relação entre as duas são colocadas à prova, juntamente com as surpresas impostas pela distância entre um passado marcante e um presente de ajuste de contas ainda duvidoso. Confira o trailer (em espanhol):
Vencedor de diversos prêmios, incluindo reconhecimento em festivais de prestígio, como o Festival de Cinema de San Sebastián e o de Tribeca, além do prêmio Goya de "Melhor Atriz" para Sanchez, "La Enfermedad del domingo" (no original) se destaca por uma narrativa extremamente contemplativa, envolvente visualmente e que provoca sensações marcantes em quem assiste com performances excepcionais da dupla de atrizes. Dirigido e escrito pelo Ramón Salazar (de "Vis a Vis") o filme explora com maestria (e certa poesia) a complexidade das relações humanas, com uma profundidade emocional impressionante e muito dura.
Um elemento que chama a nossa atenção é a fotografia do Ricardo de Gracia (de "Fariña") - ele é constrói uma atmosfera de melancolia intensa, como se fosse um retrato visualmente deslumbrante do campo, mas que captura na palheta mais gélida, toda a solidão de Chiara e o vazio Anabel. Veja, as composições são cuidadosamente planejadas, muitas vezes com a ação acontecendo em segundo plano, por isso você terá a sensação de distanciamento dos fatos e ao mesmo tempo a angustia de quem assiste uma cena sem a menor possibilidade de fazer algo para ajudar. Gracia te coloca lá dentro, mas deixa claro que nada mudaria aquilo que estamos testemunhando.
Em um filme onde o diretor não poupa alegorias para abordar, com muita originalidade, os conflitos geracionais que não necessariamente dizem respeito apenas a mãe e filha, "O Vazio do Domingo" vai muito além, com discussões potentes sobre abandono, solidão, maternidade, arrependimentos, finitude e redenção. No entanto, vale ressaltar que Salazar também descarta com elegância o final mais fácil e previsível, colocando uma pulga atrás da nossa orelha sobre os verdadeiros motivos que fizeram Anabel deixar Chiara ainda criança - as teorias sobre o passado sombrio da mãe parecem pertinentes, apenas não espere as respostas que "talvez" nem a própria filha teve, ou será que ela teve?
Vale o seu play, mas por conta e risco!
O espanhol "O Vazio do Domingo" é um filme daqueles "não assista com sono", mas não por ele ser ruim ou monótono demais, mas sim por ele ser muito cadenciado, com planos longos, um silêncio ensurdecedor e diálogos que não necessariamente expõem os sentimentos dos personagens (e muito menos suas intenções). Eu diria que esse é realmente um filme difícil, com uma pegada autoral bastante presente - o que certamente vai afastar muita gente do play, mas também é preciso dizer que para aqueles dispostos a embarcar na sensibilidade de um drama de relações denso e cheio de simbolismo como esse, ter a referência de "Sob a Pele do Lobo" pode ser um bom começo para não se decepcionar depois, porque o filme é realmente uma pancada!
Aqui conhecemos Anabel (Susi Sanchez), uma mulher de idade e bem sucedida que é surpreendida por Chiara (Bárbara Lennie), sua filha abandonada desde criança, que ressurge e a convida para passar dez dias em uma convivência bastante particular, sob causas e termos desconhecidos. Algumas experiências da relação entre as duas são colocadas à prova, juntamente com as surpresas impostas pela distância entre um passado marcante e um presente de ajuste de contas ainda duvidoso. Confira o trailer (em espanhol):
Vencedor de diversos prêmios, incluindo reconhecimento em festivais de prestígio, como o Festival de Cinema de San Sebastián e o de Tribeca, além do prêmio Goya de "Melhor Atriz" para Sanchez, "La Enfermedad del domingo" (no original) se destaca por uma narrativa extremamente contemplativa, envolvente visualmente e que provoca sensações marcantes em quem assiste com performances excepcionais da dupla de atrizes. Dirigido e escrito pelo Ramón Salazar (de "Vis a Vis") o filme explora com maestria (e certa poesia) a complexidade das relações humanas, com uma profundidade emocional impressionante e muito dura.
Um elemento que chama a nossa atenção é a fotografia do Ricardo de Gracia (de "Fariña") - ele é constrói uma atmosfera de melancolia intensa, como se fosse um retrato visualmente deslumbrante do campo, mas que captura na palheta mais gélida, toda a solidão de Chiara e o vazio Anabel. Veja, as composições são cuidadosamente planejadas, muitas vezes com a ação acontecendo em segundo plano, por isso você terá a sensação de distanciamento dos fatos e ao mesmo tempo a angustia de quem assiste uma cena sem a menor possibilidade de fazer algo para ajudar. Gracia te coloca lá dentro, mas deixa claro que nada mudaria aquilo que estamos testemunhando.
Em um filme onde o diretor não poupa alegorias para abordar, com muita originalidade, os conflitos geracionais que não necessariamente dizem respeito apenas a mãe e filha, "O Vazio do Domingo" vai muito além, com discussões potentes sobre abandono, solidão, maternidade, arrependimentos, finitude e redenção. No entanto, vale ressaltar que Salazar também descarta com elegância o final mais fácil e previsível, colocando uma pulga atrás da nossa orelha sobre os verdadeiros motivos que fizeram Anabel deixar Chiara ainda criança - as teorias sobre o passado sombrio da mãe parecem pertinentes, apenas não espere as respostas que "talvez" nem a própria filha teve, ou será que ela teve?
Vale o seu play, mas por conta e risco!
"O Verão de Sangaile" é quase um filme conceitual. Seu caráter independente, extremamente autoral e preocupado com o impacto estético transforma sua narrativa, quase sem diálogos, em um filme que parece não decolar (desculpe o trocadilho). Apenas parece, pois essa premiada produção lituana é cercada de sensibilidade e traz discussões pertinentes ao universo das protagonistas - de uma forma bem particular, claro, mas não menos inteligente ou profunda que outros filmes com a mesma temática - como "Duck Butter", por exemplo.
A jovem Sangaile (Julija Steponaitytė), de 17 anos, é fascinada por aviões de acrobacia. Ela conhece Auste (Aistė Diržiūtė), uma garota de sua idade, durante um show de aeronáutica no verão. Sangaile permite que a nova amiga descubra seus mais íntimos segredos e no meio do caminho cresce um amor adolescente - é aí que Auste acaba se tornando a única pessoa que realmente incentiva Sangaile a enfrentar seus medos e dramas pessoais. Confira o trailer em inglês:
Embora tenha uma identidade pouco comercial, "O Verão de Sangaile" impressiona pela fotografia e genialidade de Dominique Colin (O Fabuloso Destino de Amélie Poulain) que aproveita dos belíssimos cenários e de uma direção de arte afinadíssima para potencializar o trabalho da diretora Alante Kavaite como realizadora - ela imprime uma dinâmica bastante sutil, apostando no excelente trabalho de Julija Steponaitytė e de Aistė Diržiūtė, com muita coragem já que assume o risco de trocar o que é falado pelo o que é sentido! Certamente essa escolha pode afastar quem busca uma narrativa mais convencional, mas o fato é que Kavaite aproveita de cenas plasticamente bem executadas para provocar sentimentos e sensações ora acolhedoras, ora desconfortáveis - e aqui cabe uma observação: mesmo partindo de um mesmo plot de "La vie d'Adèle" (Azul é a cor mais quente), em nenhum momento nos sentimos incomodados ou chocados; todas as cenas são de muito bom gosto.
É interessante perceber que Sangailé, mesmo sofrendo por uma certa inadequação com o mundo em que vive, graças ao distanciamento quase mórbido que tem com sua família (especialmente com sua mãe) e sua solitária fascinação pelas apresentações de voos acrobáticos, é na vertigem que todos os pontos se unem - aquela expressa pela realidade cotidiana da adolescente e na metáfora que acompanha algumas passagens marcantes, como a necessidade de se auto-mutilar para se sentir viva. Reparem, são camadas sensíveis, mas muito bem desenvolvidas com uma relação artística interessante para aqueles dispostos a mergulhar na psiquê da protagonista.
"O Verão de Sangaile" fala sobre o vazio existencial, depressão, suicídio, amor, descobertas e sonhos, mas definitivamente de uma forma que apenas um público bem particular, alternativo e orientado para descobertas narrativas menos convencionais, vai gostar - é isso que o filme entrega e essa é a razão do seu sucesso nos vários festivais que participou pelo mundo. Vale dizer que Alante Kavaite venceu como melhor diretora em Sundance em 2015 e o filme foi indicado ao prêmio máximo do Festival.
Vale a pena, com certa identificação pela proposta artística!
"O Verão de Sangaile" é quase um filme conceitual. Seu caráter independente, extremamente autoral e preocupado com o impacto estético transforma sua narrativa, quase sem diálogos, em um filme que parece não decolar (desculpe o trocadilho). Apenas parece, pois essa premiada produção lituana é cercada de sensibilidade e traz discussões pertinentes ao universo das protagonistas - de uma forma bem particular, claro, mas não menos inteligente ou profunda que outros filmes com a mesma temática - como "Duck Butter", por exemplo.
A jovem Sangaile (Julija Steponaitytė), de 17 anos, é fascinada por aviões de acrobacia. Ela conhece Auste (Aistė Diržiūtė), uma garota de sua idade, durante um show de aeronáutica no verão. Sangaile permite que a nova amiga descubra seus mais íntimos segredos e no meio do caminho cresce um amor adolescente - é aí que Auste acaba se tornando a única pessoa que realmente incentiva Sangaile a enfrentar seus medos e dramas pessoais. Confira o trailer em inglês:
Embora tenha uma identidade pouco comercial, "O Verão de Sangaile" impressiona pela fotografia e genialidade de Dominique Colin (O Fabuloso Destino de Amélie Poulain) que aproveita dos belíssimos cenários e de uma direção de arte afinadíssima para potencializar o trabalho da diretora Alante Kavaite como realizadora - ela imprime uma dinâmica bastante sutil, apostando no excelente trabalho de Julija Steponaitytė e de Aistė Diržiūtė, com muita coragem já que assume o risco de trocar o que é falado pelo o que é sentido! Certamente essa escolha pode afastar quem busca uma narrativa mais convencional, mas o fato é que Kavaite aproveita de cenas plasticamente bem executadas para provocar sentimentos e sensações ora acolhedoras, ora desconfortáveis - e aqui cabe uma observação: mesmo partindo de um mesmo plot de "La vie d'Adèle" (Azul é a cor mais quente), em nenhum momento nos sentimos incomodados ou chocados; todas as cenas são de muito bom gosto.
É interessante perceber que Sangailé, mesmo sofrendo por uma certa inadequação com o mundo em que vive, graças ao distanciamento quase mórbido que tem com sua família (especialmente com sua mãe) e sua solitária fascinação pelas apresentações de voos acrobáticos, é na vertigem que todos os pontos se unem - aquela expressa pela realidade cotidiana da adolescente e na metáfora que acompanha algumas passagens marcantes, como a necessidade de se auto-mutilar para se sentir viva. Reparem, são camadas sensíveis, mas muito bem desenvolvidas com uma relação artística interessante para aqueles dispostos a mergulhar na psiquê da protagonista.
"O Verão de Sangaile" fala sobre o vazio existencial, depressão, suicídio, amor, descobertas e sonhos, mas definitivamente de uma forma que apenas um público bem particular, alternativo e orientado para descobertas narrativas menos convencionais, vai gostar - é isso que o filme entrega e essa é a razão do seu sucesso nos vários festivais que participou pelo mundo. Vale dizer que Alante Kavaite venceu como melhor diretora em Sundance em 2015 e o filme foi indicado ao prêmio máximo do Festival.
Vale a pena, com certa identificação pela proposta artística!
Um ótimo entretenimento para um sábado chuvoso - especialmente se você gostar daquelas narrativas bem angustiantes que não dá para saber muito bem o que é verdade e o que é imaginação. "Observador" filme lançado em 2022 e que ganhou certo destaque em festivais importantes do cenário independente como Sundance e SXSW Film Festival, é, na verdade, um suspense psicológico que explora a paranoia e o isolamento de uma mulher estrangeira em uma cidade desconhecida. Eu sei que a premissa não é das mais criativas ou inovadoras, mas o filme dirigido por Chloe Okuno (do curta "Storm Drain" de "V/H/S/94") tem uma identidade visual e narrativa bem interessante, que constrói uma linha tênue entre a percepção e a realidade que constantemente questionamos, criando assim uma atmosfera de crescente tensão e desconforto - dada as devidas proporções, uma mistura de "Janela Indiscreta" de Alfred Hitchcock com "O Homem Duplicado" de Denis Villeneuve. E sim, na minha opinião, ainda melhor que "A Mulher da Janela" e "The Voyeurs".
A trama segue Julia (Maika Monroe), uma jovem americana que se muda para Bucareste com seu marido, Francis (Karl Glusman). Vivendo em um apartamento amplo, mas sombrio, Julia começa a notar que um vizinho do prédio em frente a observa constantemente. Ao mesmo tempo, a cidade está assombrada por um assassino em série que ataca mulheres. Sentindo-se cada vez mais isolada, Julia luta para convencer Francis e as autoridades de que está sendo perseguida, mas encontra apenas desconfiança e ceticismo, o que intensifica seu sentimento de vulnerabilidade e paranoia. Confira o trailer (em inglês):
Logo de cara, percebemos que "Watcher", no original, se destaca pelo minimalismo narrativo e pela construção cuidadosa de um suspense que desafia as certezas da audiência. Chloe Okuno, em sua estreia como diretora de um longa-metragem propriamente dito, demonstra um controle preciso sobre esse tipo de gramática cinematográfica, excepcionalmente na construção dessa atmosfera, digamos, mais densa do filme. O que temos aqui é um exercício de contenção e sugestão, onde cada cena é planejada para aumentar a sensação de claustrofobia e incerteza. A diretora utiliza enquadramentos cirúrgicos para explorar tanto o ponto de vista de Julia quanto o do suposto observador, manipulando nossa percepção e gerando uma tensão latente. Repare como o silêncio é um elemento essencial nessa construção de suspense e como a escolha por limitar os diálogos em momentos-chave intensifica ainda mais esse desconforto.
Maika Monroe, conhecida por seu papel em "Corrente do Mal" e mais recentemente em "Longlegs - Vínculo Mortal", entrega uma performance convincente e sutil como Julia. Ela transmite de forma eficaz a sensação de alienação e impotência, equilibrando a fragilidade de sua personagem com a determinação crescente de descobrir a verdade. O fato é que Monroe carrega o filme em seus ombros, e sua atuação é essencial para criar a conexão necessária para que trama funcione - acompanhar cada passo de sua jornada, emocionalmente intensa, não é nada simples, diga-se de passagem. Já Karl Glusman oferece uma performance pouco mais contida, interpretando um marido que oscila entre o apoio incondicional e o ceticismo - sua postura, aliás, ajuda muito no aprofundamento dessa sensação de isolamento de Julia.
Outro fator que merece atenção é a fotografia do dinamarquês Benjamin Kirk Nielsen - sua Bucareste é retratada de forma fria e opressiva, com ruas desertas e prédios austeros que reforçam o clima de insegurança e ansiedade da protagonista. As cores desbotadas e a iluminação difusa contribuem para a sensação de inquietação, transformando a cidade em um espaço fascinante, mas ameaçador - cada cenário parece projetar as emoções de Julia, criando uma fusão entre o ambiente externo e sua psique fragilizada. Sensacional. O desenho de som também brilha - como já pontuei, momentos de silêncio absoluto são intercalados com sons ambientes que intensificam a paranoia da protagonista. A ausência de música em passagens críticas da trama só reforça a imersão e amplifica a sensação de que algo está à espreita, mas sempre fora de alcance.
"Observador", embora simples em sua estrutura, é eficiente em manter o suspense e o mistério. A narrativa se desenvolve lentamente, mas sem perder o ritmo, mantendo a audiência presa à perspectiva de Julia. Mas saiba que o filme é menos sobre a resolução de um mistério e mais sobre a experiência subjetiva de uma mulher que luta para validar seus instintos em um ambiente que a desconsidera. É essa abordagem que, simbolicamente, é especialmente relevante em tempos onde a discussão sobre a descrença perante as vozes femininas se torna cada vez mais pertinente.
Vale muito o seu play!
Um ótimo entretenimento para um sábado chuvoso - especialmente se você gostar daquelas narrativas bem angustiantes que não dá para saber muito bem o que é verdade e o que é imaginação. "Observador" filme lançado em 2022 e que ganhou certo destaque em festivais importantes do cenário independente como Sundance e SXSW Film Festival, é, na verdade, um suspense psicológico que explora a paranoia e o isolamento de uma mulher estrangeira em uma cidade desconhecida. Eu sei que a premissa não é das mais criativas ou inovadoras, mas o filme dirigido por Chloe Okuno (do curta "Storm Drain" de "V/H/S/94") tem uma identidade visual e narrativa bem interessante, que constrói uma linha tênue entre a percepção e a realidade que constantemente questionamos, criando assim uma atmosfera de crescente tensão e desconforto - dada as devidas proporções, uma mistura de "Janela Indiscreta" de Alfred Hitchcock com "O Homem Duplicado" de Denis Villeneuve. E sim, na minha opinião, ainda melhor que "A Mulher da Janela" e "The Voyeurs".
A trama segue Julia (Maika Monroe), uma jovem americana que se muda para Bucareste com seu marido, Francis (Karl Glusman). Vivendo em um apartamento amplo, mas sombrio, Julia começa a notar que um vizinho do prédio em frente a observa constantemente. Ao mesmo tempo, a cidade está assombrada por um assassino em série que ataca mulheres. Sentindo-se cada vez mais isolada, Julia luta para convencer Francis e as autoridades de que está sendo perseguida, mas encontra apenas desconfiança e ceticismo, o que intensifica seu sentimento de vulnerabilidade e paranoia. Confira o trailer (em inglês):
Logo de cara, percebemos que "Watcher", no original, se destaca pelo minimalismo narrativo e pela construção cuidadosa de um suspense que desafia as certezas da audiência. Chloe Okuno, em sua estreia como diretora de um longa-metragem propriamente dito, demonstra um controle preciso sobre esse tipo de gramática cinematográfica, excepcionalmente na construção dessa atmosfera, digamos, mais densa do filme. O que temos aqui é um exercício de contenção e sugestão, onde cada cena é planejada para aumentar a sensação de claustrofobia e incerteza. A diretora utiliza enquadramentos cirúrgicos para explorar tanto o ponto de vista de Julia quanto o do suposto observador, manipulando nossa percepção e gerando uma tensão latente. Repare como o silêncio é um elemento essencial nessa construção de suspense e como a escolha por limitar os diálogos em momentos-chave intensifica ainda mais esse desconforto.
Maika Monroe, conhecida por seu papel em "Corrente do Mal" e mais recentemente em "Longlegs - Vínculo Mortal", entrega uma performance convincente e sutil como Julia. Ela transmite de forma eficaz a sensação de alienação e impotência, equilibrando a fragilidade de sua personagem com a determinação crescente de descobrir a verdade. O fato é que Monroe carrega o filme em seus ombros, e sua atuação é essencial para criar a conexão necessária para que trama funcione - acompanhar cada passo de sua jornada, emocionalmente intensa, não é nada simples, diga-se de passagem. Já Karl Glusman oferece uma performance pouco mais contida, interpretando um marido que oscila entre o apoio incondicional e o ceticismo - sua postura, aliás, ajuda muito no aprofundamento dessa sensação de isolamento de Julia.
Outro fator que merece atenção é a fotografia do dinamarquês Benjamin Kirk Nielsen - sua Bucareste é retratada de forma fria e opressiva, com ruas desertas e prédios austeros que reforçam o clima de insegurança e ansiedade da protagonista. As cores desbotadas e a iluminação difusa contribuem para a sensação de inquietação, transformando a cidade em um espaço fascinante, mas ameaçador - cada cenário parece projetar as emoções de Julia, criando uma fusão entre o ambiente externo e sua psique fragilizada. Sensacional. O desenho de som também brilha - como já pontuei, momentos de silêncio absoluto são intercalados com sons ambientes que intensificam a paranoia da protagonista. A ausência de música em passagens críticas da trama só reforça a imersão e amplifica a sensação de que algo está à espreita, mas sempre fora de alcance.
"Observador", embora simples em sua estrutura, é eficiente em manter o suspense e o mistério. A narrativa se desenvolve lentamente, mas sem perder o ritmo, mantendo a audiência presa à perspectiva de Julia. Mas saiba que o filme é menos sobre a resolução de um mistério e mais sobre a experiência subjetiva de uma mulher que luta para validar seus instintos em um ambiente que a desconsidera. É essa abordagem que, simbolicamente, é especialmente relevante em tempos onde a discussão sobre a descrença perante as vozes femininas se torna cada vez mais pertinente.
Vale muito o seu play!
Ninguém sabe captar a solidão, o vazio existencial ou a dor da alma como Sofia Coppola, mesmo que tudo isso seja fruto das neuras de um personagem. "On The Rocks", recém lançado filme da Diretora para o AppleTV+, trás o melhor de "Encontros e Desencontros" (ou "Lost in Translation") e "Somewhere" em um terreno onde Coppola domina: a sensibilidade de retratar as relações! Mais uma vez encontramos um texto completamente alinhado com o forma como o filme se apresenta na tela, com uma fotografia linda, uma trilha sonora belíssima e, claro, com o cenário (no caso Nova York) moldando a história, quase como um personagem - ela já fez a mesma coisa com Tóquio e Los Angeles!
Em "On The Rocks", Laura (Rashida Jones) é uma mulher ocupada, que cuida das duas filhas enquanto o marido trabalha. No momento em que ela enfrenta um terrível bloqueio criativo e tenta se readaptar a uma rotina para escrever um livro, seu marido, Dean (Marlon Wayans), vive um período mágico na sua vida profissional, colhendo os frutos de sua dedicação na empresa que criou do zero. Graças a isso, Dean precisa viajar muito e alguns mal-entendidos acabam colocando uma pulga atrás da orelha de Laura - ela acredita que ele pode estar tendo um caso extraconjugal com sua bela assistente Fiona (Jessica Henwick). Com o objetivo de descobrir a verdade, ela se une com seu pai, Felix (Bill Murray), um típico bon vivantnova iorquino apaixonado pela filha. Eles passam a seguir Dean, se colocando em situações extremamente constrangedoras, mas que acaba permitindo que ambos tenham mais tempo juntos para discutir alguns assuntos que, de alguma forma, prejudicaram a relação ente eles. Confira o trailer:
Talvez "On The Rocks" seja o filme mais leve que Sofia Coppola já dirigiu, sugerindo, inclusive, uma "quase" postura de auto-análise - veja, Laura é casada há quase tanto tempo quanto Coppola; elas têm o mesmo número de filhos, ela vem de uma família rica e com um pai famoso e carismático. Porém mais interessante que essas "coincidências", são as "neuras" que as escolhas de vida pode provocar em nós e, certamente, Coppola precisou lidar com muitas delas em vários momentos e talvez por isso ela seja capaz de entregar um filme tão humano, com alma! Antes do play, saiba que se trata de mais um filme de uma diretora que tem uma identidade e defende seu conceito narrativo e estético com unhas e dentes, ou seja, se você não se relacionou com suas obras anteriores, fuja; porém se o contrário for verdadeiro, prepare-se para 1:40 de um filme delicioso de assistir!
Ninguém sabe captar a solidão, o vazio existencial ou a dor da alma como Sofia Coppola, mesmo que tudo isso seja fruto das neuras de um personagem. "On The Rocks", recém lançado filme da Diretora para o AppleTV+, trás o melhor de "Encontros e Desencontros" (ou "Lost in Translation") e "Somewhere" em um terreno onde Coppola domina: a sensibilidade de retratar as relações! Mais uma vez encontramos um texto completamente alinhado com o forma como o filme se apresenta na tela, com uma fotografia linda, uma trilha sonora belíssima e, claro, com o cenário (no caso Nova York) moldando a história, quase como um personagem - ela já fez a mesma coisa com Tóquio e Los Angeles!
Em "On The Rocks", Laura (Rashida Jones) é uma mulher ocupada, que cuida das duas filhas enquanto o marido trabalha. No momento em que ela enfrenta um terrível bloqueio criativo e tenta se readaptar a uma rotina para escrever um livro, seu marido, Dean (Marlon Wayans), vive um período mágico na sua vida profissional, colhendo os frutos de sua dedicação na empresa que criou do zero. Graças a isso, Dean precisa viajar muito e alguns mal-entendidos acabam colocando uma pulga atrás da orelha de Laura - ela acredita que ele pode estar tendo um caso extraconjugal com sua bela assistente Fiona (Jessica Henwick). Com o objetivo de descobrir a verdade, ela se une com seu pai, Felix (Bill Murray), um típico bon vivantnova iorquino apaixonado pela filha. Eles passam a seguir Dean, se colocando em situações extremamente constrangedoras, mas que acaba permitindo que ambos tenham mais tempo juntos para discutir alguns assuntos que, de alguma forma, prejudicaram a relação ente eles. Confira o trailer:
Talvez "On The Rocks" seja o filme mais leve que Sofia Coppola já dirigiu, sugerindo, inclusive, uma "quase" postura de auto-análise - veja, Laura é casada há quase tanto tempo quanto Coppola; elas têm o mesmo número de filhos, ela vem de uma família rica e com um pai famoso e carismático. Porém mais interessante que essas "coincidências", são as "neuras" que as escolhas de vida pode provocar em nós e, certamente, Coppola precisou lidar com muitas delas em vários momentos e talvez por isso ela seja capaz de entregar um filme tão humano, com alma! Antes do play, saiba que se trata de mais um filme de uma diretora que tem uma identidade e defende seu conceito narrativo e estético com unhas e dentes, ou seja, se você não se relacionou com suas obras anteriores, fuja; porém se o contrário for verdadeiro, prepare-se para 1:40 de um filme delicioso de assistir!
Seguindo o padrão Globo, "Onde nascem os fortes" pode ser definida como uma história de amores impossíveis, ódio e perdão, que se passa no sertão do Nordeste, um território onde, às vezes, quem vence é o mais forte e não a lei.
A minissérie da Globo mostra o desespero de uma irmã em busca de respostas - Nonato (Marco Pigossi) desaparece sem deixar rastros após flertar justamente com a amante de Pedro (Alexandre Nero), a sedutora Joana (Maeve Jinkings). O suposto envolvimento de Pedro, o homem mais poderoso da cidade, no sumiço de Nonato é o estopim de uma batalha que interrompe de forma abrupta romances, altera o destino de uns e obriga outros a desenterrarem segredos de família.
Eu costumo dizer que trabalho de Diretor bom é simples e ao mesmo tempo elegante. Em todos os projetos do José Luiz Villamarim (e sua parceria com o fotógrafo e diretor Walter Carvalho) a câmera está sempre no lugar certo, mesmo que seja no lugar mais inusitado. Dessa vez ele não dirigiu de ponta a ponta como de costume, mas sua condução artística está impressa em cada detalhe: nada de muitos cortes (aquela coisa de plano, contra-plano e geral); "pra que?" se dá pra fazer em um plano único e fica lindo! Mais uma vez vemos uma bela fotografia, como sempre cinematográfica! Alice Wegmann já tinha me chamado muito a atenção em "Ligações Perigosas" e agora, certamente, sobe de patamar. Alexandre Nero e Henrique Dias, impecáveis - mas aí não é novidade!
Já o texto do George Moura, mesmo com a forte personalidade que lhe é característica, não é consistente o bastante para suportar tantos episódios: 53 no total! Se fossem 10, eu diria que a minissérie seria um enorme sucesso pois, de fato, é uma linda produção, com uma premissa muito interessante (mesmo não sendo das mais originais), uma atmosfera criada pelo Villamarim que trouxe a angustia suficiente para nos identificarmos com a protagonista e querer segui-la durante toda essa dolorosa jornada. Pena que o texto foi perdendo força com episódios completamente dispensáveis. Pena mesmo!
Vale o play, claro, mas só se você estiver disposto a assistir uma novela um pouco mais curta!
Seguindo o padrão Globo, "Onde nascem os fortes" pode ser definida como uma história de amores impossíveis, ódio e perdão, que se passa no sertão do Nordeste, um território onde, às vezes, quem vence é o mais forte e não a lei.
A minissérie da Globo mostra o desespero de uma irmã em busca de respostas - Nonato (Marco Pigossi) desaparece sem deixar rastros após flertar justamente com a amante de Pedro (Alexandre Nero), a sedutora Joana (Maeve Jinkings). O suposto envolvimento de Pedro, o homem mais poderoso da cidade, no sumiço de Nonato é o estopim de uma batalha que interrompe de forma abrupta romances, altera o destino de uns e obriga outros a desenterrarem segredos de família.
Eu costumo dizer que trabalho de Diretor bom é simples e ao mesmo tempo elegante. Em todos os projetos do José Luiz Villamarim (e sua parceria com o fotógrafo e diretor Walter Carvalho) a câmera está sempre no lugar certo, mesmo que seja no lugar mais inusitado. Dessa vez ele não dirigiu de ponta a ponta como de costume, mas sua condução artística está impressa em cada detalhe: nada de muitos cortes (aquela coisa de plano, contra-plano e geral); "pra que?" se dá pra fazer em um plano único e fica lindo! Mais uma vez vemos uma bela fotografia, como sempre cinematográfica! Alice Wegmann já tinha me chamado muito a atenção em "Ligações Perigosas" e agora, certamente, sobe de patamar. Alexandre Nero e Henrique Dias, impecáveis - mas aí não é novidade!
Já o texto do George Moura, mesmo com a forte personalidade que lhe é característica, não é consistente o bastante para suportar tantos episódios: 53 no total! Se fossem 10, eu diria que a minissérie seria um enorme sucesso pois, de fato, é uma linda produção, com uma premissa muito interessante (mesmo não sendo das mais originais), uma atmosfera criada pelo Villamarim que trouxe a angustia suficiente para nos identificarmos com a protagonista e querer segui-la durante toda essa dolorosa jornada. Pena que o texto foi perdendo força com episódios completamente dispensáveis. Pena mesmo!
Vale o play, claro, mas só se você estiver disposto a assistir uma novela um pouco mais curta!
"Only Murders in the Building" é muito divertida - ao lado de "Ted Lasso" e "O Método Kominsky", talvez tenha sido a série que mais trouxe um frescor narrativo nos últimos anos para um gênero que tem dificuldade de chamar atenção de uma parte considerável dos assinantes de streaming. Com uma primeira temporada afinadíssima, a produção original da HULU, aqui distribuída pelo Star+, segue a linha conceitual do clássico "Os 7 Suspeitos" e das histórias de Agatha Christie, porém repaginada e pontualmente inserida no contexto dos recentes sucessos dos podcasts de "True Crime".
Na história conhecemos um inusitado trio de vizinhos que moram em um tradicional prédio de NY - o deslumbrante Arconia. Com personalidades completamente distintas, Charles-Haden Savage (Steve Martin), Oliver Putnam (Martin Short) e Mabel Mora (Selena Gomez) têm em comum a paixão por histórias de investigação policial. Embora a aproximação entres eles tenha acontecido por acaso, tudo muda quando os três se veem envolvidos em um possível caso de assassinato, que para a polícia não passa de um suicídio, e resolvem, por conta própria, tentar desvendar o mistério e ainda produzir um podcast sobre o caso. Confira o trailer:
É inegável que "Only Murders in the Building" caminha na linha tênue entre o "pastelão" e o "genial" - uma marca de Steve Martin nos anos 90 que ele replica ao lado de John Robert Hoffman (de "Grace and Frankie") com os devidos ajustes para equilibrar o mistério com a comédia transformando a série em algo genuinamente original e carismática. Chama atenção como o texto, mesmo satírico, consegue manter a história empolgante durante os dez episódios sem enjoar - existe um clima de leveza, quase ingênua, como se estivéssemos jogando uma partida de "Detetive" com os amigos.
No que diz respeito ao conceito narrativo, cada episódio procura brincar com a forma como os personagens são apresentados. Sempre com um narrador diferente, somos provocados a entender como cada um desses personagens podem interferir na história mesmo quando são meros e passageiros coadjuvantes. Essa dinâmica é divertida, pois as soluções são realmente muito criativas - veja, se em um episódio entendemos o life style novaiorquino a partir de um ator aposentado que vive do seu passado glorioso, mas que carrega o peso da solidão representada por atores fantasiados de personagens infantis; em outro conhecemos alguns fatos importantes da história pelo ponto de vista de um jovem surdo, ou seja, passamos o episódio inteiro sem ouvir um único diálogo - apenas observando a linguagem de sinais e fazendo leitura labial dos atores.
É fato que "Only Murders in the Building" pode parecer bobinha, mas não se engane: ela é tão inteligente quanto divertida. A história se encaixa, os protagonistas são um show a parte, o roteiro é sagaz e a produção é impecável - você vai perceber um certo toque vintageno figurino, no cenário e na trilha sonora, mesmo com um texto dinâmico e moderno. Aliás esse choque de gerações é muito bem explorado na relação de Martin e Short com Selena Gomez - a química entre eles surpreende. E pode se preparar que vem algumas indicações de Emmys e Globos de Ouro pela frente!
Vale muito o seu play!
"Only Murders in the Building" é muito divertida - ao lado de "Ted Lasso" e "O Método Kominsky", talvez tenha sido a série que mais trouxe um frescor narrativo nos últimos anos para um gênero que tem dificuldade de chamar atenção de uma parte considerável dos assinantes de streaming. Com uma primeira temporada afinadíssima, a produção original da HULU, aqui distribuída pelo Star+, segue a linha conceitual do clássico "Os 7 Suspeitos" e das histórias de Agatha Christie, porém repaginada e pontualmente inserida no contexto dos recentes sucessos dos podcasts de "True Crime".
Na história conhecemos um inusitado trio de vizinhos que moram em um tradicional prédio de NY - o deslumbrante Arconia. Com personalidades completamente distintas, Charles-Haden Savage (Steve Martin), Oliver Putnam (Martin Short) e Mabel Mora (Selena Gomez) têm em comum a paixão por histórias de investigação policial. Embora a aproximação entres eles tenha acontecido por acaso, tudo muda quando os três se veem envolvidos em um possível caso de assassinato, que para a polícia não passa de um suicídio, e resolvem, por conta própria, tentar desvendar o mistério e ainda produzir um podcast sobre o caso. Confira o trailer:
É inegável que "Only Murders in the Building" caminha na linha tênue entre o "pastelão" e o "genial" - uma marca de Steve Martin nos anos 90 que ele replica ao lado de John Robert Hoffman (de "Grace and Frankie") com os devidos ajustes para equilibrar o mistério com a comédia transformando a série em algo genuinamente original e carismática. Chama atenção como o texto, mesmo satírico, consegue manter a história empolgante durante os dez episódios sem enjoar - existe um clima de leveza, quase ingênua, como se estivéssemos jogando uma partida de "Detetive" com os amigos.
No que diz respeito ao conceito narrativo, cada episódio procura brincar com a forma como os personagens são apresentados. Sempre com um narrador diferente, somos provocados a entender como cada um desses personagens podem interferir na história mesmo quando são meros e passageiros coadjuvantes. Essa dinâmica é divertida, pois as soluções são realmente muito criativas - veja, se em um episódio entendemos o life style novaiorquino a partir de um ator aposentado que vive do seu passado glorioso, mas que carrega o peso da solidão representada por atores fantasiados de personagens infantis; em outro conhecemos alguns fatos importantes da história pelo ponto de vista de um jovem surdo, ou seja, passamos o episódio inteiro sem ouvir um único diálogo - apenas observando a linguagem de sinais e fazendo leitura labial dos atores.
É fato que "Only Murders in the Building" pode parecer bobinha, mas não se engane: ela é tão inteligente quanto divertida. A história se encaixa, os protagonistas são um show a parte, o roteiro é sagaz e a produção é impecável - você vai perceber um certo toque vintageno figurino, no cenário e na trilha sonora, mesmo com um texto dinâmico e moderno. Aliás esse choque de gerações é muito bem explorado na relação de Martin e Short com Selena Gomez - a química entre eles surpreende. E pode se preparar que vem algumas indicações de Emmys e Globos de Ouro pela frente!
Vale muito o seu play!
"Os Banshees de Inisherin" não será uma unanimidade e parte dessa certeza se dá pelo fato de seu texto ser extremamente teatral, razão pela qual, mesmo embrulhado em um pacote completamente realista, seu conteúdo prioriza muito mais o simbolismo (e o absurdo das situações) para retratar a complexidade das relações humanas. Indicado em 9 categorias no Oscar 2023, inclusive ao prêmio de "Melhor Filme", essa produção dirigida pelo talentoso Martin McDonagh (de "Três Anúncios para um Crime") sabe exatamente como manipular nossas emoções ao expor (sem o menor medo de parecer piegas) as nuances de um término de relação que parecia ser eterna - mas calma, não se trata de uma "dramalhão", longe disso, o filme é muito mais uma espécie de conto, que sabe equilibrar perfeitamente o sorriso com as lágrimas, sem ao menos se preocupar em entregar todas as respostas.
Toda a história se passa na ilha fictícia de Inisherin, por volta de 1923, durante a Guerra Civil Irlandesa. Pádraic (Colin Farrell) é um homem muito gentil que tem sua vida abalada depois de experimentar a crueldade abrupta e casual de Colm (Breendan Gleeson), amigo de longa data, que se distancia aparentemente sem motivo algum. Pádraic, confuso e devastado, tenta reatar essa amizade com o apoio de sua irmã Siobhan (Kerry Condon) e do jovem Dominic (Barry Keoghan), filho de um policial local. Porém, quando Colm lança um ultimato chocante para o ex-amigo e passa a agir pautado no extremo, toda aquela pequena comunidade começa a sentir os impactos do desequilíbrio emocional de seus habitantes. Confira o trailer:
Assistir "Os Banshees de Inisherin" vai exigir uma certa inspiração, pois a narrativa é bastante cadenciada e a conexão com os personagens não é imediata - mesmo com as performances irretocáveis de Farrell e Gleeson essa introdução é lenta e um pouco cansativa. Aliás, nem posso pontuar isso como um problema, mas sim entender como uma escolha consciente de McDonagh - já que ele faz sempre muita questão de impor sua identidade (bastante autoral) como cineasta. O roteiro praticamente impõe esse mood de solidão e silêncio que só é interrompido pelos tiros e bombas explodindo do outro lado do rio, no continente. Mesmo que os longos planos abertos e bem construídos pelo diretor de fotografia, o badalado Ben Davis (de "Doutor Estranho" e a "Vingadores: Era de Ultron"), visualmente, nos conecte com aquela realidade bem particular, é a partir do segundo ato que começamos a entender a importância que o conflito entre os protagonistas tem para a dinâmica daquela sociedade e como os reflexos dessa crise vão se ampliando pouco a pouco e destruindo a "pseudo-paz" de viver ali, "longe da guerra".
Veja, não por acaso, a beleza de "Os Banshees de Inisherin" está nos pequenos detalhes - existe um padrão semiótico capaz de nos provocar inúmeras interpretações e com isso nos afastar de uma história que a princípio parece nem ter força para suportar os 120 minutos de filme (esse é mais um fator que afastará parte da audiência, mas que com certeza coloca esse roteiro como um dos melhores do ano). Enxergar a dinâmica local de Inisherin é essencial para entender o organismo vivo que a ilha é - existe um tom de fábula, de final feliz, mas que vai se afastando quando a realidade passa a se sobrepor ao absurdo - o curioso é que essa transformação é contada pelos olhos de seu personagem mais fantasioso, como uma personificação do "destino" - a Sra. McCormack (Sheila Flitton).
Se para alguns "Os Banshees de Inisherin" vai parecer um filme bastante reflexivo, para outros será considerado "chato demais" - por isso fiz questão de pontuar a importância de se permitir mergulhar no simbolismo de McDonagh para enfim poder curtir a experiência, mesmo que tenha soado até repetitivo. Existe uma excentricidade nas entrelinhas, um humor negro tipicamente britânico e diálogos bastante caricatos, por outro lado, a jornada é poderosa, os temas discutidos são densos, complexos, mesmo que explorados em situações divertidas.
Por tudo isso e além de ser um dos filmes mais premiados da temporada, com mais de 130 prêmios nos festivais de todo planeta, "Os Banshees de Inisherin" vai, no mínimo, te tirar da zona de conforto! Vale seu play!
"Os Banshees de Inisherin" não será uma unanimidade e parte dessa certeza se dá pelo fato de seu texto ser extremamente teatral, razão pela qual, mesmo embrulhado em um pacote completamente realista, seu conteúdo prioriza muito mais o simbolismo (e o absurdo das situações) para retratar a complexidade das relações humanas. Indicado em 9 categorias no Oscar 2023, inclusive ao prêmio de "Melhor Filme", essa produção dirigida pelo talentoso Martin McDonagh (de "Três Anúncios para um Crime") sabe exatamente como manipular nossas emoções ao expor (sem o menor medo de parecer piegas) as nuances de um término de relação que parecia ser eterna - mas calma, não se trata de uma "dramalhão", longe disso, o filme é muito mais uma espécie de conto, que sabe equilibrar perfeitamente o sorriso com as lágrimas, sem ao menos se preocupar em entregar todas as respostas.
Toda a história se passa na ilha fictícia de Inisherin, por volta de 1923, durante a Guerra Civil Irlandesa. Pádraic (Colin Farrell) é um homem muito gentil que tem sua vida abalada depois de experimentar a crueldade abrupta e casual de Colm (Breendan Gleeson), amigo de longa data, que se distancia aparentemente sem motivo algum. Pádraic, confuso e devastado, tenta reatar essa amizade com o apoio de sua irmã Siobhan (Kerry Condon) e do jovem Dominic (Barry Keoghan), filho de um policial local. Porém, quando Colm lança um ultimato chocante para o ex-amigo e passa a agir pautado no extremo, toda aquela pequena comunidade começa a sentir os impactos do desequilíbrio emocional de seus habitantes. Confira o trailer:
Assistir "Os Banshees de Inisherin" vai exigir uma certa inspiração, pois a narrativa é bastante cadenciada e a conexão com os personagens não é imediata - mesmo com as performances irretocáveis de Farrell e Gleeson essa introdução é lenta e um pouco cansativa. Aliás, nem posso pontuar isso como um problema, mas sim entender como uma escolha consciente de McDonagh - já que ele faz sempre muita questão de impor sua identidade (bastante autoral) como cineasta. O roteiro praticamente impõe esse mood de solidão e silêncio que só é interrompido pelos tiros e bombas explodindo do outro lado do rio, no continente. Mesmo que os longos planos abertos e bem construídos pelo diretor de fotografia, o badalado Ben Davis (de "Doutor Estranho" e a "Vingadores: Era de Ultron"), visualmente, nos conecte com aquela realidade bem particular, é a partir do segundo ato que começamos a entender a importância que o conflito entre os protagonistas tem para a dinâmica daquela sociedade e como os reflexos dessa crise vão se ampliando pouco a pouco e destruindo a "pseudo-paz" de viver ali, "longe da guerra".
Veja, não por acaso, a beleza de "Os Banshees de Inisherin" está nos pequenos detalhes - existe um padrão semiótico capaz de nos provocar inúmeras interpretações e com isso nos afastar de uma história que a princípio parece nem ter força para suportar os 120 minutos de filme (esse é mais um fator que afastará parte da audiência, mas que com certeza coloca esse roteiro como um dos melhores do ano). Enxergar a dinâmica local de Inisherin é essencial para entender o organismo vivo que a ilha é - existe um tom de fábula, de final feliz, mas que vai se afastando quando a realidade passa a se sobrepor ao absurdo - o curioso é que essa transformação é contada pelos olhos de seu personagem mais fantasioso, como uma personificação do "destino" - a Sra. McCormack (Sheila Flitton).
Se para alguns "Os Banshees de Inisherin" vai parecer um filme bastante reflexivo, para outros será considerado "chato demais" - por isso fiz questão de pontuar a importância de se permitir mergulhar no simbolismo de McDonagh para enfim poder curtir a experiência, mesmo que tenha soado até repetitivo. Existe uma excentricidade nas entrelinhas, um humor negro tipicamente britânico e diálogos bastante caricatos, por outro lado, a jornada é poderosa, os temas discutidos são densos, complexos, mesmo que explorados em situações divertidas.
Por tudo isso e além de ser um dos filmes mais premiados da temporada, com mais de 130 prêmios nos festivais de todo planeta, "Os Banshees de Inisherin" vai, no mínimo, te tirar da zona de conforto! Vale seu play!