“American Crime Story” é uma série antológica, onde a cada temporada uma história é contada (com começo, meio e fim como uma minissérie), que derivou do grande sucesso que foi “American Horror Story”, criada pelo badalado Ryan Murphy (de “Halston”) A diferença entre as duas, é que em "Crime Story”, como o próprio nome diz, cada temporada se baseia em um caso real, seja de assassinato ou não (tanto que o terceiro ano da série focou no escândalo envolvendo o ex presidente Bill Clinton e Mônica Lewinsky).
Nessa primeira temporada, acompanhamos o advogado Robert Shapiro (John Travolta) reunindo um time de estrelas para defender o ex-astro da NFL, OJ Simpson (Cuba Gooding Jr.). Os advogados foram chamados 13 dias depois dos assassinatos de Nicole Brown Simpson, ex-esposa de OJ e Ronald Lyle Goldman, um amigo que foi até a casa de Nicole para, supostamente, devolver um pertence da mãe dela. O interessante porém, é que depois do crime, todas as provas recolhidas pela policia não diziam outra coisa: OJ era culpado. Confira o trailer:
Embora fosse tão nítido a culpa do ex jogador de futebol americano, esse não era um caso comum - o envolvido era famoso, amado por todos e ainda era negro. A complexidade está em uma trama que conta uma história de maneira muito clara, não deixando dúvidas sobre quem foi o verdadeiro culpado, mas é na atuação de Cuba Gooding Jr., tão convincente, que por vezes você também pode ficar em dúvida se ele era realmente o assassino.
A trama frenética sempre está em movimento, afinal em um caso como esse não existiria tempo para respirar, tudo acontece muito rápido e toma proporções inimagináveis. É um turbilhão de emoções (e de discussões culturais) para todos os personagens envolvidos, e principalmente para nós como audiência. Para se ter uma ideia, uma revista foi capaz de "embranquecer" a figura de O.J. Simpson em uma capa de revista como se isso radicasse sua inocência - é quase surreal, mas acreditem, tudo isso realmente aconteceu.
A atriz Sarah Paulson, também foi uma escolha mais que certa para interpretar a promotora de justiça Marcia Clark - ela sempre foi muito assediada pela mídia, pelos seus companheiros de trabalho, especialmente porque nunca se preocupava com a aparência como outras mulheres, e para esses homens isso era quase de outro mundo. Ao dar vida para uma mulher que não tinha uma vida fácil, nem profissional e muito menos pessoal, Paulson brilhou, carregando nuances necessárias para transmitir todas as inseguranças da personagem com muita sensibilidade - esse performance, inclusive, lhe rendeu o Emmy de Melhor Atriz em 2016.
“American Crime Story: O Povo Contra O.J. Simpson” é exemplar! Essa primeira temporada, responsabilidade de Scott Alexander e Larry Karaszewski, acerta em todos os quesitos possíveis: seja na adaptação do livro em que se baseou, "The Run of His Life: The People v. O.J. Simpson" de Jeffrey Toobin; na direção do próprio Ryan Murphy; no casting maravilhoso que proporcionou atuações seguras e competentes e até mesmo no ritmo que proporciona uma maratona mais que bem vinda, afinal essa história vai te prender do inicio ao fim.
PS: O documentário "O.J. Simpson Made in America", grande vencedor do Oscar de 2017, faz com que tenhamos uma percepção da série um pouco diferente, mas não por isso menos interessante. A sensação de torcer para que tudo fosse mentira quando se assiste ao documentário, dado o carisma (e a história de superação) do O.J., praticamente some na ficção, já que fica impossível não torcer para os promotores - talvez por uma visão mais romântica dos fatos e por acabar se envolvendo mais com a narrativa proposta pelo roteiro, onde o backstage do processo está mais presente, a vida dos promotores mais exposta, etc. São experiências diferentes, mas complementares. Sugiro conhecer a história pelo documentário (que também está disponível no Star+) e depois partir para o entretenimento dessa série.
Escrito por Mark Hewes - uma parceria @indiqueipraver
“American Crime Story” é uma série antológica, onde a cada temporada uma história é contada (com começo, meio e fim como uma minissérie), que derivou do grande sucesso que foi “American Horror Story”, criada pelo badalado Ryan Murphy (de “Halston”) A diferença entre as duas, é que em "Crime Story”, como o próprio nome diz, cada temporada se baseia em um caso real, seja de assassinato ou não (tanto que o terceiro ano da série focou no escândalo envolvendo o ex presidente Bill Clinton e Mônica Lewinsky).
Nessa primeira temporada, acompanhamos o advogado Robert Shapiro (John Travolta) reunindo um time de estrelas para defender o ex-astro da NFL, OJ Simpson (Cuba Gooding Jr.). Os advogados foram chamados 13 dias depois dos assassinatos de Nicole Brown Simpson, ex-esposa de OJ e Ronald Lyle Goldman, um amigo que foi até a casa de Nicole para, supostamente, devolver um pertence da mãe dela. O interessante porém, é que depois do crime, todas as provas recolhidas pela policia não diziam outra coisa: OJ era culpado. Confira o trailer:
Embora fosse tão nítido a culpa do ex jogador de futebol americano, esse não era um caso comum - o envolvido era famoso, amado por todos e ainda era negro. A complexidade está em uma trama que conta uma história de maneira muito clara, não deixando dúvidas sobre quem foi o verdadeiro culpado, mas é na atuação de Cuba Gooding Jr., tão convincente, que por vezes você também pode ficar em dúvida se ele era realmente o assassino.
A trama frenética sempre está em movimento, afinal em um caso como esse não existiria tempo para respirar, tudo acontece muito rápido e toma proporções inimagináveis. É um turbilhão de emoções (e de discussões culturais) para todos os personagens envolvidos, e principalmente para nós como audiência. Para se ter uma ideia, uma revista foi capaz de "embranquecer" a figura de O.J. Simpson em uma capa de revista como se isso radicasse sua inocência - é quase surreal, mas acreditem, tudo isso realmente aconteceu.
A atriz Sarah Paulson, também foi uma escolha mais que certa para interpretar a promotora de justiça Marcia Clark - ela sempre foi muito assediada pela mídia, pelos seus companheiros de trabalho, especialmente porque nunca se preocupava com a aparência como outras mulheres, e para esses homens isso era quase de outro mundo. Ao dar vida para uma mulher que não tinha uma vida fácil, nem profissional e muito menos pessoal, Paulson brilhou, carregando nuances necessárias para transmitir todas as inseguranças da personagem com muita sensibilidade - esse performance, inclusive, lhe rendeu o Emmy de Melhor Atriz em 2016.
“American Crime Story: O Povo Contra O.J. Simpson” é exemplar! Essa primeira temporada, responsabilidade de Scott Alexander e Larry Karaszewski, acerta em todos os quesitos possíveis: seja na adaptação do livro em que se baseou, "The Run of His Life: The People v. O.J. Simpson" de Jeffrey Toobin; na direção do próprio Ryan Murphy; no casting maravilhoso que proporcionou atuações seguras e competentes e até mesmo no ritmo que proporciona uma maratona mais que bem vinda, afinal essa história vai te prender do inicio ao fim.
PS: O documentário "O.J. Simpson Made in America", grande vencedor do Oscar de 2017, faz com que tenhamos uma percepção da série um pouco diferente, mas não por isso menos interessante. A sensação de torcer para que tudo fosse mentira quando se assiste ao documentário, dado o carisma (e a história de superação) do O.J., praticamente some na ficção, já que fica impossível não torcer para os promotores - talvez por uma visão mais romântica dos fatos e por acabar se envolvendo mais com a narrativa proposta pelo roteiro, onde o backstage do processo está mais presente, a vida dos promotores mais exposta, etc. São experiências diferentes, mas complementares. Sugiro conhecer a história pelo documentário (que também está disponível no Star+) e depois partir para o entretenimento dessa série.
Escrito por Mark Hewes - uma parceria @indiqueipraver
Diferente das duas primeiras (excelentes) temporadas da série antológica "American Crime Story", dessa vez a vítima central é o foco da narrativa. Aqui não se trata de algo impactante como o destino do suposto criminoso O.J. Simpson e dos embates de seus advogados no tribunal americano, muito menos de desvendar os fantasmas do assassino de Gianni Versace, Andrew Cunanan - a construção de "Impeachment" basicamente deixa de lado a intimidade do presidente Bill Clinton para dar voz ao curioso e improvável lado mais fraco da história: Monica Lewinsky e sua relação com uma companheira de trabalho, a sempre dissimulada Linda Tripp.
"American Crime Story: Impeachment" se baseia no livro "A Vast Conspiracy", de Jeffrey Toobin, e acompanha os bastidores dos fatos que envolveram Bill Clinton (Clive Owen) quando era o presidente dos EUA (entre 1995 a 1997), e sua relação com a estagiária Monica Lewinsky (Beanie Feldstein). Assim que o caso se tornou inconveniente para Clinton, Monica foi transferida para o Pentágono, onde conheceu Linda Tripp (Sarah Paulson), ex-funcionária da Casa Branca que virou sua confidente e que, por acaso, nutria um profundo desprezo pela família do presidente - estava armada a bomba relógio! Confira o trailer (em inglês):
Durante muitos anos, Monica Lewinsky foi tratada como a mulher que tentou destruir o casamento do homem mais poderoso do mundo, enquanto as mentiras do então presidente dos EUA eram ignoradas em favor de uma esposa fiel, que perdoou o marido mesmo depois de tantas histórias de traição, e abuso de poder, vir a público - fatos que lhe causaram uma enorme humilhação. Dito isso, o que é mais perceptível nessa temporada de American Crime Story, não é necessariamente o fato (ou a relação) envolvendo Monica e Bill, mas sim mostrar a perspectiva do elo mais fraco - com suas fragilidades de caráter, sim, mas também explorando a "sacanagem" que fizeram com ela (e aqui não estou falando da sua relação "amorosa").
E é ai que entra o grande destaque dessa temporada: Sarah Paulson, atriz que brilhou em "O Povo Contra O.J. Simpson", onde, inclusive, ganhou o Emmy por sua performance como Marcia Clark; retorna à franquia de uma forma simplesmente impecável! Irreconhecível como Linda Tripp, ex-servidora da Casa Branca, a atriz dá vida a uma figura marcante no caso por ter se aproximado de Monica apenas para se "vingar" dos Clinton e por ter gravado conversas telefônicas com Monica, onde ela estimulava a estagiária a dar detalhes de todos encontros com o presidente. O interessante porém, é que Paulson constrói uma personagem com tantas camadas, profundidade e nuances que, por si só, já mereceria ser chamada de protagonista de "Impeachment" - ela dá um verdadeiro show!
"Impeachment" foi considerada por muitos a temporada mais fraca de "American Crime Story"- eu discordo! Eu diria que essa temporada é a mais humana de todas e talvez por isso a menos espetacular como narrativa. Assistir "American Crime Story: Impeachment" é como ler um livro que encontra nos detalhes a força de sua trama, onde o envolvimento é diretamente proporcional ao nosso interesse pelo fato em si. Veja, aqui não estamos falando de mortes envolvendo um astro do futebol americano ou do assassinato de um maiores estilistas de todos os tempos, estamos falando de uma jovem como tantas outras que teimava em romantizar uma relação improvável, extremamente sexual, que pagou um preço caro por sua ingenuidade e que precisou lidar com uma mídia (e uma sociedade) hipócrita e cruel.
Vale seu play!
Diferente das duas primeiras (excelentes) temporadas da série antológica "American Crime Story", dessa vez a vítima central é o foco da narrativa. Aqui não se trata de algo impactante como o destino do suposto criminoso O.J. Simpson e dos embates de seus advogados no tribunal americano, muito menos de desvendar os fantasmas do assassino de Gianni Versace, Andrew Cunanan - a construção de "Impeachment" basicamente deixa de lado a intimidade do presidente Bill Clinton para dar voz ao curioso e improvável lado mais fraco da história: Monica Lewinsky e sua relação com uma companheira de trabalho, a sempre dissimulada Linda Tripp.
"American Crime Story: Impeachment" se baseia no livro "A Vast Conspiracy", de Jeffrey Toobin, e acompanha os bastidores dos fatos que envolveram Bill Clinton (Clive Owen) quando era o presidente dos EUA (entre 1995 a 1997), e sua relação com a estagiária Monica Lewinsky (Beanie Feldstein). Assim que o caso se tornou inconveniente para Clinton, Monica foi transferida para o Pentágono, onde conheceu Linda Tripp (Sarah Paulson), ex-funcionária da Casa Branca que virou sua confidente e que, por acaso, nutria um profundo desprezo pela família do presidente - estava armada a bomba relógio! Confira o trailer (em inglês):
Durante muitos anos, Monica Lewinsky foi tratada como a mulher que tentou destruir o casamento do homem mais poderoso do mundo, enquanto as mentiras do então presidente dos EUA eram ignoradas em favor de uma esposa fiel, que perdoou o marido mesmo depois de tantas histórias de traição, e abuso de poder, vir a público - fatos que lhe causaram uma enorme humilhação. Dito isso, o que é mais perceptível nessa temporada de American Crime Story, não é necessariamente o fato (ou a relação) envolvendo Monica e Bill, mas sim mostrar a perspectiva do elo mais fraco - com suas fragilidades de caráter, sim, mas também explorando a "sacanagem" que fizeram com ela (e aqui não estou falando da sua relação "amorosa").
E é ai que entra o grande destaque dessa temporada: Sarah Paulson, atriz que brilhou em "O Povo Contra O.J. Simpson", onde, inclusive, ganhou o Emmy por sua performance como Marcia Clark; retorna à franquia de uma forma simplesmente impecável! Irreconhecível como Linda Tripp, ex-servidora da Casa Branca, a atriz dá vida a uma figura marcante no caso por ter se aproximado de Monica apenas para se "vingar" dos Clinton e por ter gravado conversas telefônicas com Monica, onde ela estimulava a estagiária a dar detalhes de todos encontros com o presidente. O interessante porém, é que Paulson constrói uma personagem com tantas camadas, profundidade e nuances que, por si só, já mereceria ser chamada de protagonista de "Impeachment" - ela dá um verdadeiro show!
"Impeachment" foi considerada por muitos a temporada mais fraca de "American Crime Story"- eu discordo! Eu diria que essa temporada é a mais humana de todas e talvez por isso a menos espetacular como narrativa. Assistir "American Crime Story: Impeachment" é como ler um livro que encontra nos detalhes a força de sua trama, onde o envolvimento é diretamente proporcional ao nosso interesse pelo fato em si. Veja, aqui não estamos falando de mortes envolvendo um astro do futebol americano ou do assassinato de um maiores estilistas de todos os tempos, estamos falando de uma jovem como tantas outras que teimava em romantizar uma relação improvável, extremamente sexual, que pagou um preço caro por sua ingenuidade e que precisou lidar com uma mídia (e uma sociedade) hipócrita e cruel.
Vale seu play!
Antes de mais nada, uma informação importante sobre "American Son": essa produção original da Netflix é uma adaptação de uma peça da Broadway, escrita por Christopher Demos-Brown que acompanha o drama de um ex-casal, em uma interminável noite de espera na delegacia, em busca de informações sobre o desaparecimento do seu filho. A história ganha ainda mais força por trazer para pauta um assunto delicado, o racismo em suas diversas formas de expressão e opressão, porém, é preciso que se diga: o filme não vai agradar a todos, não pelo conteúdo e sim pela forma. "American Son" se passa em um mesmo cenário 98% do tempo, com 4 atores se revezando entre diálogos longos, muitas vezes didáticos, sem um sentido cronológico e, muitas vezes, com atuações acima do tom - certamente funciona no palco, mas no cinema a dinâmica é outra (e o diretor Kenny Leon deveria saber disso). Só dê o play se você estiver consciente que se trata de uma oportunidade de assistir uma peça de teatro da Broadway (não é um musical) no seu serviço de streaming., com um texto forte, difícil de digerir e que expõe uma enorme discussão cheia dor, de ressentimento e de verdade!
Jamal, um jovem de 18 anos, negro, está desaparecido. Kendra, sua mãe, negra, está em uma delegacia esperando por notícias do filho. Um jovem policial, branco, faz o atendimento. O clima é tenso, é possível ver o desespero de uma mãe nessa situação. Os diálogos parecem traiçoeiros entre quem diz e quem escuta - tudo nos leva para discussões sobre diferenças raciais ou sobre a forma como isso interfere naquela investigação, em algum incidente que poderia ter corrido ou até no tratamento institucional entre o policial e a mãe. Quando o pai de Jamal, ex-marido de Kendra, Scott, um agente do FBI, branco, chega, as discussões ganham novos elementos como: postura perante o problema, machismo, ressentimentos entre homem e mulher, diferenças de ponto de vista sobre um mesmo tema, paternidade, maternidade, educação, escolhas de vida, etc; mas tudo isso tendo o racismo como reflexo de causa. É fato que o roteiro trás plots muito bem elaborados, consistentes e importantes para se discutir. Ele levanta temas que provavelmente passariam batidos por uns, mas que tem enorme importância para outros e aí vem o elemento dramático que mais merece destaque no filme: a necessidade de nos colocarmos no lugar do outro, de praticarmos a empatia! Eu diria que é esse sentimento que nos segura até o final (um ótimo final, inclusive).
Como disse anteriormente, o problema não está no "conteúdo" e sim na "forma". Adaptar uma peça de teatro em filme exige entender a gramática cinematográfica e ter a consciência que muita coisa vai precisar mudar, não tem jeito! Mesmo com a escolha de um único cenário (o que não seria problema nenhum, basta lembrar de "Nada a Esconder" ou "7 años") o roteiro poderia ser mais dinâmico, mas não, ele é teatral, respeita as entradas e saídas do atores usando os corredores da delegacia como coxias e isso é um grande equívoco, porque os tempos são diferentes. As atuações sofrem do mesmo problema - o atores da peça são exatamente os mesmos do filme e, claro, eles carregam o tom do teatro para a câmera e, em muitos momentos, ficar] over demais! Kerry Washington (Scandal) faz tantas caras e bocas que deixa as ótimas passagens do texto, superficiais demais - ela não mergulha no sofrimento, ela expões o sofrimento, e essa diferença é fatal (embora algumas pessoas tendem a gostar desse tipo de trabalho)! Talvez o único do elenco que tenha equilibrado (ou se adaptado melhor) a atuação foi o delegado John Stokes (Eugene Lee) - pontual e contido, na medida e no tempo certo!
Bom, mas você só criticou, por que eu devo assistir? A resposta é simples: a história é boa, o texto é bom (embora o roteiro nem tanto) e o assunto é importante, nos faz refletir em vários momentos, principalmente quando os pontos de vista são colocados na mesa sem medo de julgamentos. Eu, tranquilamente, assistiria essa peça e provavelmente sairia satisfeito, porém como obra cinematográfica, fica impossível elogiar. Uma pena!
Antes de mais nada, uma informação importante sobre "American Son": essa produção original da Netflix é uma adaptação de uma peça da Broadway, escrita por Christopher Demos-Brown que acompanha o drama de um ex-casal, em uma interminável noite de espera na delegacia, em busca de informações sobre o desaparecimento do seu filho. A história ganha ainda mais força por trazer para pauta um assunto delicado, o racismo em suas diversas formas de expressão e opressão, porém, é preciso que se diga: o filme não vai agradar a todos, não pelo conteúdo e sim pela forma. "American Son" se passa em um mesmo cenário 98% do tempo, com 4 atores se revezando entre diálogos longos, muitas vezes didáticos, sem um sentido cronológico e, muitas vezes, com atuações acima do tom - certamente funciona no palco, mas no cinema a dinâmica é outra (e o diretor Kenny Leon deveria saber disso). Só dê o play se você estiver consciente que se trata de uma oportunidade de assistir uma peça de teatro da Broadway (não é um musical) no seu serviço de streaming., com um texto forte, difícil de digerir e que expõe uma enorme discussão cheia dor, de ressentimento e de verdade!
Jamal, um jovem de 18 anos, negro, está desaparecido. Kendra, sua mãe, negra, está em uma delegacia esperando por notícias do filho. Um jovem policial, branco, faz o atendimento. O clima é tenso, é possível ver o desespero de uma mãe nessa situação. Os diálogos parecem traiçoeiros entre quem diz e quem escuta - tudo nos leva para discussões sobre diferenças raciais ou sobre a forma como isso interfere naquela investigação, em algum incidente que poderia ter corrido ou até no tratamento institucional entre o policial e a mãe. Quando o pai de Jamal, ex-marido de Kendra, Scott, um agente do FBI, branco, chega, as discussões ganham novos elementos como: postura perante o problema, machismo, ressentimentos entre homem e mulher, diferenças de ponto de vista sobre um mesmo tema, paternidade, maternidade, educação, escolhas de vida, etc; mas tudo isso tendo o racismo como reflexo de causa. É fato que o roteiro trás plots muito bem elaborados, consistentes e importantes para se discutir. Ele levanta temas que provavelmente passariam batidos por uns, mas que tem enorme importância para outros e aí vem o elemento dramático que mais merece destaque no filme: a necessidade de nos colocarmos no lugar do outro, de praticarmos a empatia! Eu diria que é esse sentimento que nos segura até o final (um ótimo final, inclusive).
Como disse anteriormente, o problema não está no "conteúdo" e sim na "forma". Adaptar uma peça de teatro em filme exige entender a gramática cinematográfica e ter a consciência que muita coisa vai precisar mudar, não tem jeito! Mesmo com a escolha de um único cenário (o que não seria problema nenhum, basta lembrar de "Nada a Esconder" ou "7 años") o roteiro poderia ser mais dinâmico, mas não, ele é teatral, respeita as entradas e saídas do atores usando os corredores da delegacia como coxias e isso é um grande equívoco, porque os tempos são diferentes. As atuações sofrem do mesmo problema - o atores da peça são exatamente os mesmos do filme e, claro, eles carregam o tom do teatro para a câmera e, em muitos momentos, ficar] over demais! Kerry Washington (Scandal) faz tantas caras e bocas que deixa as ótimas passagens do texto, superficiais demais - ela não mergulha no sofrimento, ela expões o sofrimento, e essa diferença é fatal (embora algumas pessoas tendem a gostar desse tipo de trabalho)! Talvez o único do elenco que tenha equilibrado (ou se adaptado melhor) a atuação foi o delegado John Stokes (Eugene Lee) - pontual e contido, na medida e no tempo certo!
Bom, mas você só criticou, por que eu devo assistir? A resposta é simples: a história é boa, o texto é bom (embora o roteiro nem tanto) e o assunto é importante, nos faz refletir em vários momentos, principalmente quando os pontos de vista são colocados na mesa sem medo de julgamentos. Eu, tranquilamente, assistiria essa peça e provavelmente sairia satisfeito, porém como obra cinematográfica, fica impossível elogiar. Uma pena!
A primeira temporada da nova série antológica do Disney+, "American Sports Story", é excelente - especialmente se você conhece de futebol americano e sabe quem foi Aaron Hernandez. Dito isso, o que você vai encontrar em 10 episódios é um verdadeiro manifesto de como fazer tudo errado, desde destruir uma carreira promissora até acabar na cadeia acusado de assassinato! E aqui eu deixo uma recomendação extra: independente se antes ou depois de terminar essa série, assista "A Mente do Assassino:Aaron Hernandez" da Netflix. Pois bem, criada por Stuart Zicherman (de "The Americans"), aqui temos um drama dos mais pesados que reconstitui os eventos marcantes da vida do ex-jogador do New England Patriots e fenômeno da NFL, Aaron Hernandez, mergulhando nos aspectos mais sombrios de sua carreira e nos atos que culminaram em sua condenação. Baseada no podcast "Gladiator: Aaron Hernandez and Football Inc"., produzido pelo The Boston Globe em parceria com a Wondery, a série examina a ascensão meteórica de Hernandez no esporte, sua queda dramática e os sistemas que contribuíram para seu trágico destino. Assim como "American Crime Story" a produção da FX oferece um estudo psicológico e social, mas agora com foco no impacto cultural e esportivo de sua história.
A primeira temporada da nova série antológica do Disney+, "American Sports Story", é excelente - especialmente se você conhece de futebol americano e sabe quem foi Aaron Hernandez. Dito isso, o que você vai encontrar em 10 episódios é um verdadeiro manifesto de como fazer tudo errado, desde destruir uma carreira promissora até acabar na cadeia acusado de assassinato! E aqui eu deixo uma recomendação extra: independente se antes ou depois de terminar essa série, assista "A Mente do Assassino:Aaron Hernandez" da Netflix. Pois bem, criada por Stuart Zicherman (de "The Americans"), aqui temos um drama dos mais pesados que reconstitui os eventos marcantes da vida do ex-jogador do New England Patriots e fenômeno da NFL, Aaron Hernandez, mergulhando nos aspectos mais sombrios de sua carreira e nos atos que culminaram em sua condenação. Baseada no podcast "Gladiator: Aaron Hernandez and Football Inc"., produzido pelo The Boston Globe em parceria com a Wondery, a série examina a ascensão meteórica de Hernandez no esporte, sua queda dramática e os sistemas que contribuíram para seu trágico destino. Assim como "American Crime Story" a produção da FX oferece um estudo psicológico e social, mas agora com foco no impacto cultural e esportivo de sua história.
"Amor e Morte" é a "versão HBO" da igualmente competente "Candy"- talvez um pouco menos estereotipada e sensivelmente mais profunda na construção das camadas dos personagens. Essa versão lançada em 2023, foi criada por David E. Kelley ("Acima de Qualquer Suspeita") e dirigida por Lesli Linka Glatter ("Homeland") e Clark Johnson (de "Seven Seconds"), ou seja, um time que definitivamente sabe o que está fazendo quando o assunto é construir tensão. Baseada em uma história real e adaptado do livro "Evidence of Love: A True Story of Passion and Death in the Suburbs", a minissérie mergulha nas profundezas da psique de Candy, explorando sua obsessão a partir de uma traição - eu diria que a trama faz um recorte muito interessante sobre escuridão que pode se esconder sob a superfície de vidas aparentemente comuns. Com uma narrativa que combina romance, investigação, suspense (psicológico) e até um toque de drama de tribunal, "Amor e Morte" oferece uma experiência, de fato, envolvente e emocionalmente complexa. Para os fãs de dramas criminais baseados em fatos reais, impossível não dar um play!
"Amor e Morte" é a "versão HBO" da igualmente competente "Candy"- talvez um pouco menos estereotipada e sensivelmente mais profunda na construção das camadas dos personagens. Essa versão lançada em 2023, foi criada por David E. Kelley ("Acima de Qualquer Suspeita") e dirigida por Lesli Linka Glatter ("Homeland") e Clark Johnson (de "Seven Seconds"), ou seja, um time que definitivamente sabe o que está fazendo quando o assunto é construir tensão. Baseada em uma história real e adaptado do livro "Evidence of Love: A True Story of Passion and Death in the Suburbs", a minissérie mergulha nas profundezas da psique de Candy, explorando sua obsessão a partir de uma traição - eu diria que a trama faz um recorte muito interessante sobre escuridão que pode se esconder sob a superfície de vidas aparentemente comuns. Com uma narrativa que combina romance, investigação, suspense (psicológico) e até um toque de drama de tribunal, "Amor e Morte" oferece uma experiência, de fato, envolvente e emocionalmente complexa. Para os fãs de dramas criminais baseados em fatos reais, impossível não dar um play!
Do mesmo diretor de "Joy: O Nome do Sucesso"e "Trapaça", o premiadíssimo David O. Russell, "Amsterdam" fatalmente vai entrar naquela prateleira do "ame ou odeie" - a própria bilheteria do filme provou essa tese. Bem na linha de Wes Anderson (de "O Grande Hotel Budapeste" e "A Crônica Francesa") com um leve toque de "Entre Facas e Segredos" a história tranquilamente poderia ter sido tirada da obra de Agatha Christie ou de um conto de Sherlock Holmes, porém (e aí que está a divisão do público) com uma narração mais cadenciada, muitas vezes até cansativa, onde os detalhes estéticos se sobrepõem à trama (que curiosamente foi baseada em fatos reais) - é como se estivéssemos lendo um livro do Jô Soares (O Xangô de Baker Street ) que era cheio de descrições contextuais, mas ainda assim com uma história com certa criatividade.
"Amsterdam" acompanha a jornada de três amigos que se conheceram durante a Primeira Guerra Mundial. Eles são Burt Berendsen (Christian Bale), um médico que perdeu o olho em combate; seu amigo advogado Harold Woodman (John David Washington); e uma excêntrica artista/enfermeira Valerie Voze (Margot Robbie). Após retornarem do campo de batalha, o trio passa um período se divertindo em Amsterdam, mas acabam se separando, apenas para se reunirem muitos anos depois no meio de um assassinato em plena década de 30, em que Burt e Harold são suspeitos. Os amigos, então, se unem para limpar seus nomes, enquanto tentam desvendar uma conspiração gigantesca. Confira o trailer:
Inegavelmente que o que mais chama atenção inicialmente é a qualidade da produção no que diz respeito ao departamento de arte - do desenho de produção, passando pelo figurino e maquiagem, "Amsterdam" brilha no quesito técnico e artístico extremamente alinhado com a fotografia do (sempre ele) Emmanuel Lubezki (vencedor de três Oscars, sendo o último deles por "O Regresso"). Logo depois, no entanto, o que vemos brilhar é o elenco - e aqui cabe uma observação importante: os protagonistas e os coadjuvantes são tão importantes quanto todo elenco de apoio que é recheado de convidados que vão de Taylor Swift até Robert De Niro.
O que teria tudo para fazer o filme brilhar, na verdade acaba escondendo um roteiro que soa um pouco confuso e uma edição (de Jay Cassidy) com soluções que várias vezes mais atrapalham do que nos conecta com a história - os flashbacks contextualizam, mas ao mesmo tempo quebram o ritmo. Além disso, o conceito narrativo que O. Russell propõe causa um certo estranhamento - demora para entendermos sua intenção (muitas delas, inclusive, criadas para funcionar como alivio cômico onde não precisava). É preciso dizer, no entanto, que a sensação de "caos" existe e ao embarcarmos na jornada, atentos a proposta, vemos que tudo isso faz sentido.
Após duas horas de filme, temos a exata noção que "Amsterdam" aproveita da sua excentricidade para discutir elementos políticos de uma época onde o fascismo começava a imperar. Mesmo que com essa caricatura visual na sua forma, é de se perceber o propósito politico de O. Russell no seu conteúdo até quando soa dispensável - o personagem de Chris Rock é um bom exemplo: ele aparece, faz um comentário sobre racismo e/ou supremacia branca e depois desaparece na mesma velocidade. O fato é que o filme transita entre a conspiração e a espionagem, mas com sua base enraizada na sátira política, quase pastelão, com aquele leve toque de drama de relação mais emocional. Confuso? Sim, mas como entretenimento é inegável o seu charme!
Do mesmo diretor de "Joy: O Nome do Sucesso"e "Trapaça", o premiadíssimo David O. Russell, "Amsterdam" fatalmente vai entrar naquela prateleira do "ame ou odeie" - a própria bilheteria do filme provou essa tese. Bem na linha de Wes Anderson (de "O Grande Hotel Budapeste" e "A Crônica Francesa") com um leve toque de "Entre Facas e Segredos" a história tranquilamente poderia ter sido tirada da obra de Agatha Christie ou de um conto de Sherlock Holmes, porém (e aí que está a divisão do público) com uma narração mais cadenciada, muitas vezes até cansativa, onde os detalhes estéticos se sobrepõem à trama (que curiosamente foi baseada em fatos reais) - é como se estivéssemos lendo um livro do Jô Soares (O Xangô de Baker Street ) que era cheio de descrições contextuais, mas ainda assim com uma história com certa criatividade.
"Amsterdam" acompanha a jornada de três amigos que se conheceram durante a Primeira Guerra Mundial. Eles são Burt Berendsen (Christian Bale), um médico que perdeu o olho em combate; seu amigo advogado Harold Woodman (John David Washington); e uma excêntrica artista/enfermeira Valerie Voze (Margot Robbie). Após retornarem do campo de batalha, o trio passa um período se divertindo em Amsterdam, mas acabam se separando, apenas para se reunirem muitos anos depois no meio de um assassinato em plena década de 30, em que Burt e Harold são suspeitos. Os amigos, então, se unem para limpar seus nomes, enquanto tentam desvendar uma conspiração gigantesca. Confira o trailer:
Inegavelmente que o que mais chama atenção inicialmente é a qualidade da produção no que diz respeito ao departamento de arte - do desenho de produção, passando pelo figurino e maquiagem, "Amsterdam" brilha no quesito técnico e artístico extremamente alinhado com a fotografia do (sempre ele) Emmanuel Lubezki (vencedor de três Oscars, sendo o último deles por "O Regresso"). Logo depois, no entanto, o que vemos brilhar é o elenco - e aqui cabe uma observação importante: os protagonistas e os coadjuvantes são tão importantes quanto todo elenco de apoio que é recheado de convidados que vão de Taylor Swift até Robert De Niro.
O que teria tudo para fazer o filme brilhar, na verdade acaba escondendo um roteiro que soa um pouco confuso e uma edição (de Jay Cassidy) com soluções que várias vezes mais atrapalham do que nos conecta com a história - os flashbacks contextualizam, mas ao mesmo tempo quebram o ritmo. Além disso, o conceito narrativo que O. Russell propõe causa um certo estranhamento - demora para entendermos sua intenção (muitas delas, inclusive, criadas para funcionar como alivio cômico onde não precisava). É preciso dizer, no entanto, que a sensação de "caos" existe e ao embarcarmos na jornada, atentos a proposta, vemos que tudo isso faz sentido.
Após duas horas de filme, temos a exata noção que "Amsterdam" aproveita da sua excentricidade para discutir elementos políticos de uma época onde o fascismo começava a imperar. Mesmo que com essa caricatura visual na sua forma, é de se perceber o propósito politico de O. Russell no seu conteúdo até quando soa dispensável - o personagem de Chris Rock é um bom exemplo: ele aparece, faz um comentário sobre racismo e/ou supremacia branca e depois desaparece na mesma velocidade. O fato é que o filme transita entre a conspiração e a espionagem, mas com sua base enraizada na sátira política, quase pastelão, com aquele leve toque de drama de relação mais emocional. Confuso? Sim, mas como entretenimento é inegável o seu charme!
"Anatomia de um Escândalo" é uma espécie de "The Undoing" da Netflix - e não por acaso também adaptado por David E. Kelley a partir do livro homônimo de Sarah Vaughan. Pois bem, mesmo tendo o DNA de Kelley é preciso deixar bem claro que a produção não carrega o "selo HBO" e isso pode ser sentido em sua forma, mas não no conteúdo, ou seja, se para você tudo que escrevi até aqui fez sentido, provavelmente você nem vai precisar ler a análise inteira para ter a certeza que seu entretenimento está garantido! "Anatomia de um Escândalo" foi lançada em 2022 trazendo o melhor do drama jurídico ao explorar as nuances de como o poder pode gerar privilégios nocivos a partir da sensação "natural" de impunidade nos bastidores da política - aqui, britânica. A minissérie de Kelly conta com a colaboração precisa de Melissa James Gibson (de "House of Cards") para traduzir as complexidades de um caso de abuso sexual envolvendo um político influente, expondo as fissuras nas instituições que frequentemente protegem os poderosos. Esteja preparado para uma narrativa envolvente, capaz de entregar uma experiência que equilibra perfeitamente o entretenimento com o drama pessoal e a crítica social.
James Whitehouse (Rupert Friend) é um político carismático e bem-sucedido que, após ser acusado de estuprar uma colega de trabalho, Olivia Lytton (Naomi Scott), se vê no centro de um escândalo midiático. Ao seu lado está sua esposa, Sophie (Sienna Miller), que enfrenta a difícil tarefa de reconciliar sua lealdade ao marido com as crescentes suspeitas sobre seu comportamento e integridade. Enquanto a narrativa se desenrola, vemos o caso sendo disputado no tribunal pela promotora Kate Woodcroft (Michelle Dockery), que busca justiça em meio ao que parece ser uma batalha desigual de um homem protegido por seu status contra uma mulher aparentemente desacreditada por muitos. Confira o trailer:
1 + 1 nem sempre é 2, pelo menos pela perspectiva de quem interpreta uma situação estando nela e "Anatomia de um Escândalo" é muito inteligente em criar essa atmosfera de dúvidas com muita sabedoria - através do seu roteiro, de sua montagem e de sua direção. Ao lado das montadoras Liana Del Giudice (de "Marcella") e Mary Finlay (de "A Cor do Poder"), a diretora S.J. Clarkson (de "Succession") trabalha os flashbacks e os cortes rápidos (e desconexos) para fortalecer o conceito de narrativa fragmentada que gradualmente revela os segredos e as motivações dos personagens ao mesmo tempo em que sugere um forte senso de desorientação. Repare como as cenas de tribunal são intensas, capturando a pressão e o drama de um julgamento onde as questões de consentimento são colocadas em primeiro plano, mas é no recorte pontual das situações, com o uso de ângulos e lentes que distorcem a percepção do espaço, que encontramos o colapso de verdades que antes pareciam absolutas - isso é muito bacana.
O roteiro, de fato, é eficiente em construir uma narrativa que se equilibra o suspense com o drama mais psicológico. Kelley e Gibson exploram de forma hábil os dilemas morais e as complexidades de um escândalo sexual no meio político, mostrando o privilégio de maneira crítica e como isso molda a percepção da verdade ao ponto de influenciar os desfechos judiciais, e mais do que isso, ainda destacam o impacto devastador não apenas sobre as vítimas, mas também sobre as pessoas que cercam o acusado. Sophie, por exemplo, é uma mulher que vê seu mundo desmoronar ao questionar tudo o que sabia sobre o marido e sobre seu casamento - a performance de Sienna Miller é cheia de camadas, capturando a dor e a confusão de uma esposa que é forçada a confrontar a realidade que sempre tentou ignorar. Sua evolução ao longo da minissérie é convincente, pois ela passa de uma figura passiva e protetora para alguém que precisa lidar com as duras verdades sobre o homem com quem escolheu compartilhar sua vida. Rupert Friend entrega uma atuação sólida, interpretando esse homem que, apesar de seu charme e aparente vulnerabilidade, carrega um tom de arrogância e frieza. E Michelle Dockery, o que dizer? Ela consegue equilibrar a frieza profissional e o envolvimento emocional, tornando sua performance um dos pilares da minissérie, mas saiba que o charme da sua personagem está mesmo é no subtexto - pontuado pela hipocrisia no primeiro momento e na dura auto-avaliação mais a frente!
Obviamente que "Anatomia de um Escândalo" sofre com os clichês típicos de dramas jurídicos e escândalos políticos, podendo se tornar até previsível, mas para os amantes do gênero eu posso garantir que a minissérie é bastante eficaz em proporcionar um ótimo e rápido entretenimento (são apenas 6 episódios) ao mesmo tempo que provoca boas discussões sobre os mecanismos que sustentam os privilégios de poucos e sobre a realidade por trás dos escândalos que frequentemente vemos na tv. Para pensar sem esquecer de se divertir!
Vale o seu play!
"Anatomia de um Escândalo" é uma espécie de "The Undoing" da Netflix - e não por acaso também adaptado por David E. Kelley a partir do livro homônimo de Sarah Vaughan. Pois bem, mesmo tendo o DNA de Kelley é preciso deixar bem claro que a produção não carrega o "selo HBO" e isso pode ser sentido em sua forma, mas não no conteúdo, ou seja, se para você tudo que escrevi até aqui fez sentido, provavelmente você nem vai precisar ler a análise inteira para ter a certeza que seu entretenimento está garantido! "Anatomia de um Escândalo" foi lançada em 2022 trazendo o melhor do drama jurídico ao explorar as nuances de como o poder pode gerar privilégios nocivos a partir da sensação "natural" de impunidade nos bastidores da política - aqui, britânica. A minissérie de Kelly conta com a colaboração precisa de Melissa James Gibson (de "House of Cards") para traduzir as complexidades de um caso de abuso sexual envolvendo um político influente, expondo as fissuras nas instituições que frequentemente protegem os poderosos. Esteja preparado para uma narrativa envolvente, capaz de entregar uma experiência que equilibra perfeitamente o entretenimento com o drama pessoal e a crítica social.
James Whitehouse (Rupert Friend) é um político carismático e bem-sucedido que, após ser acusado de estuprar uma colega de trabalho, Olivia Lytton (Naomi Scott), se vê no centro de um escândalo midiático. Ao seu lado está sua esposa, Sophie (Sienna Miller), que enfrenta a difícil tarefa de reconciliar sua lealdade ao marido com as crescentes suspeitas sobre seu comportamento e integridade. Enquanto a narrativa se desenrola, vemos o caso sendo disputado no tribunal pela promotora Kate Woodcroft (Michelle Dockery), que busca justiça em meio ao que parece ser uma batalha desigual de um homem protegido por seu status contra uma mulher aparentemente desacreditada por muitos. Confira o trailer:
1 + 1 nem sempre é 2, pelo menos pela perspectiva de quem interpreta uma situação estando nela e "Anatomia de um Escândalo" é muito inteligente em criar essa atmosfera de dúvidas com muita sabedoria - através do seu roteiro, de sua montagem e de sua direção. Ao lado das montadoras Liana Del Giudice (de "Marcella") e Mary Finlay (de "A Cor do Poder"), a diretora S.J. Clarkson (de "Succession") trabalha os flashbacks e os cortes rápidos (e desconexos) para fortalecer o conceito de narrativa fragmentada que gradualmente revela os segredos e as motivações dos personagens ao mesmo tempo em que sugere um forte senso de desorientação. Repare como as cenas de tribunal são intensas, capturando a pressão e o drama de um julgamento onde as questões de consentimento são colocadas em primeiro plano, mas é no recorte pontual das situações, com o uso de ângulos e lentes que distorcem a percepção do espaço, que encontramos o colapso de verdades que antes pareciam absolutas - isso é muito bacana.
O roteiro, de fato, é eficiente em construir uma narrativa que se equilibra o suspense com o drama mais psicológico. Kelley e Gibson exploram de forma hábil os dilemas morais e as complexidades de um escândalo sexual no meio político, mostrando o privilégio de maneira crítica e como isso molda a percepção da verdade ao ponto de influenciar os desfechos judiciais, e mais do que isso, ainda destacam o impacto devastador não apenas sobre as vítimas, mas também sobre as pessoas que cercam o acusado. Sophie, por exemplo, é uma mulher que vê seu mundo desmoronar ao questionar tudo o que sabia sobre o marido e sobre seu casamento - a performance de Sienna Miller é cheia de camadas, capturando a dor e a confusão de uma esposa que é forçada a confrontar a realidade que sempre tentou ignorar. Sua evolução ao longo da minissérie é convincente, pois ela passa de uma figura passiva e protetora para alguém que precisa lidar com as duras verdades sobre o homem com quem escolheu compartilhar sua vida. Rupert Friend entrega uma atuação sólida, interpretando esse homem que, apesar de seu charme e aparente vulnerabilidade, carrega um tom de arrogância e frieza. E Michelle Dockery, o que dizer? Ela consegue equilibrar a frieza profissional e o envolvimento emocional, tornando sua performance um dos pilares da minissérie, mas saiba que o charme da sua personagem está mesmo é no subtexto - pontuado pela hipocrisia no primeiro momento e na dura auto-avaliação mais a frente!
Obviamente que "Anatomia de um Escândalo" sofre com os clichês típicos de dramas jurídicos e escândalos políticos, podendo se tornar até previsível, mas para os amantes do gênero eu posso garantir que a minissérie é bastante eficaz em proporcionar um ótimo e rápido entretenimento (são apenas 6 episódios) ao mesmo tempo que provoca boas discussões sobre os mecanismos que sustentam os privilégios de poucos e sobre a realidade por trás dos escândalos que frequentemente vemos na tv. Para pensar sem esquecer de se divertir!
Vale o seu play!
Envolvente desde a primeira cena, "Anatomia de uma Queda" levanta os mesmos dilemas que encontramos na série "A Escada" da HBO, porém com o requinte narrativo e estético do melhor do cinema independente francês - não por acaso que o filme chegou no Oscar 2024 como um dos grandes favoritos, levando para casa o prêmio de "Melhor Roteiro Original", além de mais quatro indicações, inclusive a de "Melhor Filme do Ano". E aqui cabe um importante disclaimer: muito provavelmente, "Anatomia de uma Queda" seria o vencedor na categoria "Melhor Filme Internacional" fosse ele o representante da França na disputa, no entanto, por razões puramente politicas isso não aconteceu (a diretora Justine Triet criticou o programa de fomento do governo Macron publicamente, entendeu?). Para quem não sabe, o filme é uma espécie de drama de relações com fortes (e presentes) elementos de thriller psicológico que nos convida a desvendar os segredos de um casal em meio a um crime brutal. Vencedor da Palma de Ouro no Festival de Cannes, do César Awards, do Globo de Ouro e do Prêmio Goya, certamente você está diante de um dos melhores filmes de 2023!
O filme, basicamente, mostra os detalhes de uma investigação depois que um homem é encontrado morto na neve do lado de fora do chalé isolado onde morava com sua esposa Sandra (Sandra Hüller), uma escritora alemã, e seu filho de 11 anos com deficiência visual. Ao se tratar de uma "morte suspeita", é impossível saber ao certo se ele tirou a própria vida ou se existiam motivos para falarmos de assassinato. O fato é que a viúva é indiciada, o que coloca seu próprio filho no meio do conflito. Entre o julgamento e a vida familiar, as dúvidas pesam na relação mãe-filho, já que o jovem é a única testemunha do acontecido. Confira o trailer:
É impressionante como Triet é capaz de tecer uma narrativa tão intrigante e multifacetada, onde nada é o que parece. É sério, a diretora domina sua narrativa de uma forma onde, a cada cena, novas pistas e revelações vão surgindo, desafiando nossas percepções e nos levando a questionar se a culpa é realmente de Sandra. Sabiamente, ela utiliza, com maestria, elementos como flashbacks e muito simbolismo para construir um suspense psicológico envolvente e perturbador que se apoia em inúmeros gatilhos que costumamos a encontrar nos tão falados "true crimes".
A fotografia assinada pelo Simon Beaufils (de "À discrétion"), contribui demais na construção de uma atmosfera sombria e misteriosa - muito referenciado pelo cinema nórdico. Os cenários nevados e a casa isolada nos Alpes criam um clima de isolamento e claustrofobia angustiantes , ao mesmo tempo que os planos mais fechados dão a exata sensação do caos interno que aqueles personagens estão enfrentando. Reparem como a luz natural é utilizada de forma estratégica para destacar os momentos de tensão e de suspense dos flashbacks. As atuações de todo elenco são impecáveis, mas não tem como não destacar o trabalho de Sandra Hüller. Sandra é cirúrgica ao transmitir a ambiguidade dos sentimentos de sua personagem com a mesma capacidade com que explora a fragilidade de sua psique - digno de Oscar!
O fato é que "Anatomia de uma Queda" brinca de forma muito satisfatória com uma morbidez da situação que o próprio roteiro exalta. Se a investigação nos traz uma variedade de registros, sejam os áudios do casal brigando ou o vídeo da polícia reencenando os momentos antes e depois da queda, é possível perceber como a diretora sempre pontua as mais variadas percepções com o intuito de quebrar nossa expectativa e assim nos colocar na posição de julgamento. Veja, Triet sabe mudar de uma perspectiva para a outra com precisão e disposição, mas nunca com a intenção de entregar respostas e sim com o objetivo de nos fazer refletir sobre a natureza humana, sobre a culpa e sobre as fragilidades de uma relação destruída. Dito isso, se você procura um filme que te faça pensar (e muito), além de te deixar intrigado até o final, "Anatomia de uma Queda" é a escolha certa para hoje!
Envolvente desde a primeira cena, "Anatomia de uma Queda" levanta os mesmos dilemas que encontramos na série "A Escada" da HBO, porém com o requinte narrativo e estético do melhor do cinema independente francês - não por acaso que o filme chegou no Oscar 2024 como um dos grandes favoritos, levando para casa o prêmio de "Melhor Roteiro Original", além de mais quatro indicações, inclusive a de "Melhor Filme do Ano". E aqui cabe um importante disclaimer: muito provavelmente, "Anatomia de uma Queda" seria o vencedor na categoria "Melhor Filme Internacional" fosse ele o representante da França na disputa, no entanto, por razões puramente politicas isso não aconteceu (a diretora Justine Triet criticou o programa de fomento do governo Macron publicamente, entendeu?). Para quem não sabe, o filme é uma espécie de drama de relações com fortes (e presentes) elementos de thriller psicológico que nos convida a desvendar os segredos de um casal em meio a um crime brutal. Vencedor da Palma de Ouro no Festival de Cannes, do César Awards, do Globo de Ouro e do Prêmio Goya, certamente você está diante de um dos melhores filmes de 2023!
O filme, basicamente, mostra os detalhes de uma investigação depois que um homem é encontrado morto na neve do lado de fora do chalé isolado onde morava com sua esposa Sandra (Sandra Hüller), uma escritora alemã, e seu filho de 11 anos com deficiência visual. Ao se tratar de uma "morte suspeita", é impossível saber ao certo se ele tirou a própria vida ou se existiam motivos para falarmos de assassinato. O fato é que a viúva é indiciada, o que coloca seu próprio filho no meio do conflito. Entre o julgamento e a vida familiar, as dúvidas pesam na relação mãe-filho, já que o jovem é a única testemunha do acontecido. Confira o trailer:
É impressionante como Triet é capaz de tecer uma narrativa tão intrigante e multifacetada, onde nada é o que parece. É sério, a diretora domina sua narrativa de uma forma onde, a cada cena, novas pistas e revelações vão surgindo, desafiando nossas percepções e nos levando a questionar se a culpa é realmente de Sandra. Sabiamente, ela utiliza, com maestria, elementos como flashbacks e muito simbolismo para construir um suspense psicológico envolvente e perturbador que se apoia em inúmeros gatilhos que costumamos a encontrar nos tão falados "true crimes".
A fotografia assinada pelo Simon Beaufils (de "À discrétion"), contribui demais na construção de uma atmosfera sombria e misteriosa - muito referenciado pelo cinema nórdico. Os cenários nevados e a casa isolada nos Alpes criam um clima de isolamento e claustrofobia angustiantes , ao mesmo tempo que os planos mais fechados dão a exata sensação do caos interno que aqueles personagens estão enfrentando. Reparem como a luz natural é utilizada de forma estratégica para destacar os momentos de tensão e de suspense dos flashbacks. As atuações de todo elenco são impecáveis, mas não tem como não destacar o trabalho de Sandra Hüller. Sandra é cirúrgica ao transmitir a ambiguidade dos sentimentos de sua personagem com a mesma capacidade com que explora a fragilidade de sua psique - digno de Oscar!
O fato é que "Anatomia de uma Queda" brinca de forma muito satisfatória com uma morbidez da situação que o próprio roteiro exalta. Se a investigação nos traz uma variedade de registros, sejam os áudios do casal brigando ou o vídeo da polícia reencenando os momentos antes e depois da queda, é possível perceber como a diretora sempre pontua as mais variadas percepções com o intuito de quebrar nossa expectativa e assim nos colocar na posição de julgamento. Veja, Triet sabe mudar de uma perspectiva para a outra com precisão e disposição, mas nunca com a intenção de entregar respostas e sim com o objetivo de nos fazer refletir sobre a natureza humana, sobre a culpa e sobre as fragilidades de uma relação destruída. Dito isso, se você procura um filme que te faça pensar (e muito), além de te deixar intrigado até o final, "Anatomia de uma Queda" é a escolha certa para hoje!
"Angela Black" é uma minissérie de seis episódios fruto de uma parceria internacional entre a Spectrum (produtora responsável pelo excelente "Manhunt") e a emissora britânica ITV (principal concorrente da BBC). Exibida com exclusividade no Brasil pela Globoplay, "Angela Black" é um bom drama com elementos de investigação e suspense que toca em assuntos delicados como violência doméstica, por exemplo. Aliás, o prólogo do primeiro episódio já nos prende pelo impacto da sugestão, ao mesmo tempo que também entrega uma característica que pode incomodar uma audiência mais exigente: a direção de Craig Viveiros (Ghosted) é muito expositiva - mas vamos nos aprofundar sobre o assunto um pouco mais abaixo.
Na história conhecemos Angela (Joanne Froggatt de "Downton Abbey"), uma mulher que parece levar uma vida normal com uma uma linda casa no subúrbio de Londres. A personagem se mostra em uma vida perfeita, com dois lindos filhos e um marido bem sucedido, charmoso e trabalhador, além de prestar serviços voluntários em um abrigo para cães. Porém, na realidade, Angela vive em um casamento extremamente tóxico com Olivier Meyer (Michiel Huisman), um homem extremamente controlador e agressivo, que já a violentou várias vezes. Após um dos ataques de fúria de Meyer, ela se encontra com um estranho chamado Ed (Samuel Adewunmi), e é ele que acaba revelando todos os segredos e traições do seu marido, levando a Angela a querer resolver tudo da sua maneira. Confira o trailer (em inglês):
Vamos lá, antes de mais nada é preciso dizer que "Angela Black" é um ótimo entretenimento e mesmo que se afaste do tema pela qual a série ganhou muita relevância na Inglaterra (a violência doméstica), a narrativa não enrola, trazendo uma dinâmica interessante para a história, mesmo abusando dos esteriótipos do gênero. O que eu quero dizer é que "Angela Black" é uma mistura do clássico "Dormindo com o Inimigo", "Doctor Foster", "The Undoing", tudo isso com um toque muito presente do "estilo Harlan Coben" ("Não Fale com Estranhos") de mistério - e é daí que deve vir tanta exposição e didatismo!
Viveiros tem um bom roteiro na mão, com várias passagens que vão exigir uma certa suspensão da realidade (claro!), algumas tramas completamente dispensáveis de conspirações e assassinatos, mas é impossível negar que a história é, de fato, bem amarrada. Talvez por se tratar de um produto veiculado na TV aberta do Reino Unido, algumas escolhas conceituais acabam afastando a minissérie daquele "estilo HBO" de dramas profundos de investigação que fundem nossa cabeça. A performance dos atores soa um pouco acima do tom - a própria Froggatt parece não acreditar na dor e desespero íntimo que sua personagem está sentindo em muitos momentos. Huisman não prejudica, mas definitivamente não tem a capacidade de Alexander Skarsgård (o Perry Wright de "Big Little Lies"). A produção em si é excelente, com uma fotografia bem elaborada e até com uma direção interessante - os movimentos de câmera são ótimos, não fosse a obrigação de deixar tudo muito claro: se escutamos o marido bater na mulher, por que terminar a cena com um close no dente arrancado no chão?
"Angela Black" é mais um bom achado no catálogo da Globoplay que vai agradar muitas pessoas e mesmo com suas imperfeições, não deve afastar quem gosta de um bom mistério com um gostinho de vingança e superação.
Vale a pena!
"Angela Black" é uma minissérie de seis episódios fruto de uma parceria internacional entre a Spectrum (produtora responsável pelo excelente "Manhunt") e a emissora britânica ITV (principal concorrente da BBC). Exibida com exclusividade no Brasil pela Globoplay, "Angela Black" é um bom drama com elementos de investigação e suspense que toca em assuntos delicados como violência doméstica, por exemplo. Aliás, o prólogo do primeiro episódio já nos prende pelo impacto da sugestão, ao mesmo tempo que também entrega uma característica que pode incomodar uma audiência mais exigente: a direção de Craig Viveiros (Ghosted) é muito expositiva - mas vamos nos aprofundar sobre o assunto um pouco mais abaixo.
Na história conhecemos Angela (Joanne Froggatt de "Downton Abbey"), uma mulher que parece levar uma vida normal com uma uma linda casa no subúrbio de Londres. A personagem se mostra em uma vida perfeita, com dois lindos filhos e um marido bem sucedido, charmoso e trabalhador, além de prestar serviços voluntários em um abrigo para cães. Porém, na realidade, Angela vive em um casamento extremamente tóxico com Olivier Meyer (Michiel Huisman), um homem extremamente controlador e agressivo, que já a violentou várias vezes. Após um dos ataques de fúria de Meyer, ela se encontra com um estranho chamado Ed (Samuel Adewunmi), e é ele que acaba revelando todos os segredos e traições do seu marido, levando a Angela a querer resolver tudo da sua maneira. Confira o trailer (em inglês):
Vamos lá, antes de mais nada é preciso dizer que "Angela Black" é um ótimo entretenimento e mesmo que se afaste do tema pela qual a série ganhou muita relevância na Inglaterra (a violência doméstica), a narrativa não enrola, trazendo uma dinâmica interessante para a história, mesmo abusando dos esteriótipos do gênero. O que eu quero dizer é que "Angela Black" é uma mistura do clássico "Dormindo com o Inimigo", "Doctor Foster", "The Undoing", tudo isso com um toque muito presente do "estilo Harlan Coben" ("Não Fale com Estranhos") de mistério - e é daí que deve vir tanta exposição e didatismo!
Viveiros tem um bom roteiro na mão, com várias passagens que vão exigir uma certa suspensão da realidade (claro!), algumas tramas completamente dispensáveis de conspirações e assassinatos, mas é impossível negar que a história é, de fato, bem amarrada. Talvez por se tratar de um produto veiculado na TV aberta do Reino Unido, algumas escolhas conceituais acabam afastando a minissérie daquele "estilo HBO" de dramas profundos de investigação que fundem nossa cabeça. A performance dos atores soa um pouco acima do tom - a própria Froggatt parece não acreditar na dor e desespero íntimo que sua personagem está sentindo em muitos momentos. Huisman não prejudica, mas definitivamente não tem a capacidade de Alexander Skarsgård (o Perry Wright de "Big Little Lies"). A produção em si é excelente, com uma fotografia bem elaborada e até com uma direção interessante - os movimentos de câmera são ótimos, não fosse a obrigação de deixar tudo muito claro: se escutamos o marido bater na mulher, por que terminar a cena com um close no dente arrancado no chão?
"Angela Black" é mais um bom achado no catálogo da Globoplay que vai agradar muitas pessoas e mesmo com suas imperfeições, não deve afastar quem gosta de um bom mistério com um gostinho de vingança e superação.
Vale a pena!
É muito difícil pensar que "Aniquilação" seria uma unanimidade - pelo contrário, embora cheio de camadas e interpretações que realmente nos envolvem, o filme dirigido pelo Alex Garland (de "Devs") é muito mais para aquele amante do cinema que aprecia narrativas mais desafiadoras, com visuais deslumbrantes, mas fora do óbvio; do que para aquele que busca apenas o conforto de um bom entretenimento. Sim, "Aniquilação" é realmente desconfortável na sua essência, principalmente por explorar de uma forma muito inteligente, a fragilidade da humanidade perante o desconhecido, mergulhando fundo em conceitos existenciais e psicológicos que olha, são de cair o queixo.
Na trama, acompanhamos a jornada da bióloga Lena (Natalie Portman) para descobrir o motivo do desaparecimento de seu marido Kane (Oscar Isaac). Após um longo tempo sem respostas, Lena é contactada pela doutora Ventress (Jennifer Jason Leigh), uma psicóloga que trabalha para o governo e que há três anos estuda um fenômeno que vem ganhando proporções catastróficas. Conversando com a doutora, a bióloga descobre que o marido desapareceu em um local chamado "Area X", marco zero desse misterioso fenômeno. É então que Lena parte para uma expedição, com outras três cientistas, cada uma em sua especialidade, com o propósito de descobrir o que realmente está acontecendo naquela região. Confira o trailer:
Talvez o primeiro impacto de "Aniquilação" seja justamente a qualidade de diversos aspectos técnicos e artísticos. A direção de Alex Garland cria uma atmosfera intensa e misteriosa, incorporando elementos que vão desde o terror psicológico até a ficção científica extraterrestre, passando por ótimos momentos de ação e suspense. Ao usar na narrativa sua enorme capacidade de mergulhar na psicologia humana e explorar o desconhecido como poucos, Garland entrega personagens complexos emocionalmente em uma jornada de sobrevivência que vai muito além das mutações e dos eventos aparentemente inexplicáveis. Veja, o filme levanta questões profundas sobre identidade, sobre autodestruição e sobre a própria natureza como se fosse um enorme quebra-cabeça que nem todos estarão dispostos a desvendar.
Visualmente belíssimo, mas com algumas escolhas conceituais que também vão dividir opiniões, eu diria que é a fotografia do Rob Hardy (também de "Devs") que alinha as expectativas entre o bom gosto do real e e a provocação do imaginário como função cinematográfica - com visuais que misturam beleza e terror em um só golpe, tornando a "Área X" um lugar intrigante e amedrontador, "Aniquilação" ganha tons de angustia e ansiedade como dificilmente encontramos. É aí que entra uma trilha sonora simplesmente genial - Geoff Barrow e Ben Salisbury complementam a experiência, jogando a audiência em um verdadeiro estado imersivo e alucinante (literalmente).
Natalie Portman, claro, segura a história com elegância - ela captura a complexidade emocional de sua personagem enquanto enfrenta o desconhecido (externo e íntimo). Jennifer Jason Leigh, Tessa Thompson, Gina Rodriguez e Oscar Isaac também entregam boas performances, acrescentando certa profundidade aos membros da expedição, cada um com suas próprias motivações e medos - mas aqui eu achei que faltou um pouco de tempo de tela para que essas relações, de fato, impactassem no todo como poderia.
Produzido pela Netflix, "Aniquilação" nos desafia a questionar o que somos e como enfrentamos o que não podemos explicar, algo como vimos em "A Chegada". E creio eu que é essa reflexão que torna a obra realmente imperdível, então se você prefere narrativas mais leves e previsíveis, talvez seja melhor buscar outra opção, caso contrário pode dar o play sem medo!
É muito difícil pensar que "Aniquilação" seria uma unanimidade - pelo contrário, embora cheio de camadas e interpretações que realmente nos envolvem, o filme dirigido pelo Alex Garland (de "Devs") é muito mais para aquele amante do cinema que aprecia narrativas mais desafiadoras, com visuais deslumbrantes, mas fora do óbvio; do que para aquele que busca apenas o conforto de um bom entretenimento. Sim, "Aniquilação" é realmente desconfortável na sua essência, principalmente por explorar de uma forma muito inteligente, a fragilidade da humanidade perante o desconhecido, mergulhando fundo em conceitos existenciais e psicológicos que olha, são de cair o queixo.
Na trama, acompanhamos a jornada da bióloga Lena (Natalie Portman) para descobrir o motivo do desaparecimento de seu marido Kane (Oscar Isaac). Após um longo tempo sem respostas, Lena é contactada pela doutora Ventress (Jennifer Jason Leigh), uma psicóloga que trabalha para o governo e que há três anos estuda um fenômeno que vem ganhando proporções catastróficas. Conversando com a doutora, a bióloga descobre que o marido desapareceu em um local chamado "Area X", marco zero desse misterioso fenômeno. É então que Lena parte para uma expedição, com outras três cientistas, cada uma em sua especialidade, com o propósito de descobrir o que realmente está acontecendo naquela região. Confira o trailer:
Talvez o primeiro impacto de "Aniquilação" seja justamente a qualidade de diversos aspectos técnicos e artísticos. A direção de Alex Garland cria uma atmosfera intensa e misteriosa, incorporando elementos que vão desde o terror psicológico até a ficção científica extraterrestre, passando por ótimos momentos de ação e suspense. Ao usar na narrativa sua enorme capacidade de mergulhar na psicologia humana e explorar o desconhecido como poucos, Garland entrega personagens complexos emocionalmente em uma jornada de sobrevivência que vai muito além das mutações e dos eventos aparentemente inexplicáveis. Veja, o filme levanta questões profundas sobre identidade, sobre autodestruição e sobre a própria natureza como se fosse um enorme quebra-cabeça que nem todos estarão dispostos a desvendar.
Visualmente belíssimo, mas com algumas escolhas conceituais que também vão dividir opiniões, eu diria que é a fotografia do Rob Hardy (também de "Devs") que alinha as expectativas entre o bom gosto do real e e a provocação do imaginário como função cinematográfica - com visuais que misturam beleza e terror em um só golpe, tornando a "Área X" um lugar intrigante e amedrontador, "Aniquilação" ganha tons de angustia e ansiedade como dificilmente encontramos. É aí que entra uma trilha sonora simplesmente genial - Geoff Barrow e Ben Salisbury complementam a experiência, jogando a audiência em um verdadeiro estado imersivo e alucinante (literalmente).
Natalie Portman, claro, segura a história com elegância - ela captura a complexidade emocional de sua personagem enquanto enfrenta o desconhecido (externo e íntimo). Jennifer Jason Leigh, Tessa Thompson, Gina Rodriguez e Oscar Isaac também entregam boas performances, acrescentando certa profundidade aos membros da expedição, cada um com suas próprias motivações e medos - mas aqui eu achei que faltou um pouco de tempo de tela para que essas relações, de fato, impactassem no todo como poderia.
Produzido pela Netflix, "Aniquilação" nos desafia a questionar o que somos e como enfrentamos o que não podemos explicar, algo como vimos em "A Chegada". E creio eu que é essa reflexão que torna a obra realmente imperdível, então se você prefere narrativas mais leves e previsíveis, talvez seja melhor buscar outra opção, caso contrário pode dar o play sem medo!
Se você gostou de "Breaking Bad", pode dar o play com a mais absoluta certeza, pois você vai amar "Nobody" (título original de "Anônimo" e que, cá entre nós, faz muito mais sentido que o título nacional). Seguindo a cartilha narrativa (e não visual) do Vince Gilligan, o filme é uma mistura perfeita de gêneros, cirurgicamente equilibrados entre as excelentes sequências de ação (bastante intensas, eu diria), aquele toque de humor quase sádico, além, é claro, de um drama de personagem cheio de camadas que, por incrível que pareça, colocam o filme em outro patamar - aliás aqui, de fato, temos uma experiência cinematográfica completa e que certamente agradará muita gente!
O roteiro, escrito por Derek Kolstad, o mesmo criador de "John Wick", acompanha a história de Hutch Mansell (Bob Odenkirk), um pacato pai e marido que sempre arca com as injustiças da vida, sem revidar. Quando dois ladrões invadem sua casa, Hutch se recusa a defender a si mesmo e sua família na esperança de evitar qualquer violência - o que acaba desapontando seu filho por sua passividade e, para ele, covardia. As consequências do incidente, no entanto, acabam despertando uma raiva latente em Hutch, desencadeando instintos adormecidos e impulsionando-o em um caminho brutal que irá trazer à tona segredos sombrios e habilidades letais de seu passado. Confira o trailer:
Obviamente que as referências de Gilligan vão além do processo de redenção e da transformação de seu personagem em algo muito maior do que a própria sociedade (daquele universo) estaria disposta a reconhecer - o filme traz o rosto conhecido de Odenkirk (o eterno Jimmy McGill) que oferece uma performance impressionante, mostrando uma versatilidade surpreendente. Ele é capaz de transitar habilmente entre os momentos de ação explosiva com as passagens mais introspectivas, que expõem sua vulnerabilidade emocional, adicionando profundidade ao personagem e fazendo com que nos importemos com sua jornada logo de cara. Além de Odenkirk, o elenco de apoio também merece elogios - o destaque, para mim, fica com Christopher Lloyd, o pai de Hutch, um personagem carismático e cheio de camadas que vai te surpreender..
A direção de Ilya Naishuller é outro ponto que merece muitos elogios - e se aqui ele não mostra a mesma capacidade criativa de Gilligan, certamente ele impõe sua identidade com uma tocada ágil e precisa, garantindo que as cenas de ação sejam realizadas de forma magistral. As sequências de luta são coreografadas de uma maneira quase realista, porém muito brutal, ou seja, Naishuller não se apoia em exageros desnecessários, porém nos mantém envolvidos visualmente com aquele toque "filme de herói" das cenas. A fotografia de Pawel Pogorzelski (de "Fresh") e a trilha sonora de David Buckley (de "Destruição Final") merecem sua atenção - reparem como tudo contribui para a construção de uma atmosfera tensa, potencializando nossa imersão de uma forma impressionante..
Veja, embora priorize a ação, "Anônimo" não é apenas um festival de pancadarias. Ele aborda temas mais profundos e sensíveis, como o valor que a identidade pode ter para um ser humano mesmo com as marcas do arrependimento e a necessidade da redenção para encontrar seu lugar de paz. Tudo isso sem soar pretensioso demais para um filme de pouco mais de 90 minutos, onde através da jornada interna de seu protagonista, somos provocados a refletir sobre o real significado da vida e o impacto de nossas escolhas em nós e nos que estão ao nosso redor.
Vale muito o seu play!
Se você gostou de "Breaking Bad", pode dar o play com a mais absoluta certeza, pois você vai amar "Nobody" (título original de "Anônimo" e que, cá entre nós, faz muito mais sentido que o título nacional). Seguindo a cartilha narrativa (e não visual) do Vince Gilligan, o filme é uma mistura perfeita de gêneros, cirurgicamente equilibrados entre as excelentes sequências de ação (bastante intensas, eu diria), aquele toque de humor quase sádico, além, é claro, de um drama de personagem cheio de camadas que, por incrível que pareça, colocam o filme em outro patamar - aliás aqui, de fato, temos uma experiência cinematográfica completa e que certamente agradará muita gente!
O roteiro, escrito por Derek Kolstad, o mesmo criador de "John Wick", acompanha a história de Hutch Mansell (Bob Odenkirk), um pacato pai e marido que sempre arca com as injustiças da vida, sem revidar. Quando dois ladrões invadem sua casa, Hutch se recusa a defender a si mesmo e sua família na esperança de evitar qualquer violência - o que acaba desapontando seu filho por sua passividade e, para ele, covardia. As consequências do incidente, no entanto, acabam despertando uma raiva latente em Hutch, desencadeando instintos adormecidos e impulsionando-o em um caminho brutal que irá trazer à tona segredos sombrios e habilidades letais de seu passado. Confira o trailer:
Obviamente que as referências de Gilligan vão além do processo de redenção e da transformação de seu personagem em algo muito maior do que a própria sociedade (daquele universo) estaria disposta a reconhecer - o filme traz o rosto conhecido de Odenkirk (o eterno Jimmy McGill) que oferece uma performance impressionante, mostrando uma versatilidade surpreendente. Ele é capaz de transitar habilmente entre os momentos de ação explosiva com as passagens mais introspectivas, que expõem sua vulnerabilidade emocional, adicionando profundidade ao personagem e fazendo com que nos importemos com sua jornada logo de cara. Além de Odenkirk, o elenco de apoio também merece elogios - o destaque, para mim, fica com Christopher Lloyd, o pai de Hutch, um personagem carismático e cheio de camadas que vai te surpreender..
A direção de Ilya Naishuller é outro ponto que merece muitos elogios - e se aqui ele não mostra a mesma capacidade criativa de Gilligan, certamente ele impõe sua identidade com uma tocada ágil e precisa, garantindo que as cenas de ação sejam realizadas de forma magistral. As sequências de luta são coreografadas de uma maneira quase realista, porém muito brutal, ou seja, Naishuller não se apoia em exageros desnecessários, porém nos mantém envolvidos visualmente com aquele toque "filme de herói" das cenas. A fotografia de Pawel Pogorzelski (de "Fresh") e a trilha sonora de David Buckley (de "Destruição Final") merecem sua atenção - reparem como tudo contribui para a construção de uma atmosfera tensa, potencializando nossa imersão de uma forma impressionante..
Veja, embora priorize a ação, "Anônimo" não é apenas um festival de pancadarias. Ele aborda temas mais profundos e sensíveis, como o valor que a identidade pode ter para um ser humano mesmo com as marcas do arrependimento e a necessidade da redenção para encontrar seu lugar de paz. Tudo isso sem soar pretensioso demais para um filme de pouco mais de 90 minutos, onde através da jornada interna de seu protagonista, somos provocados a refletir sobre o real significado da vida e o impacto de nossas escolhas em nós e nos que estão ao nosso redor.
Vale muito o seu play!
Uma série criminal nórdica raiz e simplesmente viciante, assim é "Aqueles que Matam"! "Den som Dræber" (um original Viaplay) mergulha fundo nas complexidades da mente humana, trazendo uma abordagem sombria e visceral ao universo das investigações criminais. Criada por Ina Bruhn, essa série dinamarquesa se diferencia pelo formato antológico, onde cada temporada apresenta um novo caso, novos personagens e uma narrativa que vai muito além da tradicional caçada policial. Aqui, o crime é apenas o ponto de partida para uma jornada que confronta tanto o passado dos criminosos quanto os limites éticos e emocionais dos investigadores que os perseguem - nesse sentido, aliás, a série traz muitos dos conceitos narrativos de "The Killing" e de "True Detective", ou seja, se você gostou das referências, nem perca seu tempo lendo toda essa análise, vá direto para o play! Com uma atmosfera pesada e realista, a série está em sintonia com o que há de mais denso no suspense criminal nórdico,onde a tensão recorrente e a construção de personagens são tão protagonistas quanto o próprio mistério.
A trama de cada temporada é centrada em investigações complexas, onde os crimes e suas motivações são explorados de maneira quase cirúrgica, revelando nuances que deixam claro o quanto a mente humana pode ser um campo de batalha brutal e enigmático. No primeiro ano, por exemplo, acompanhamos o dedicado, mas complicado, detetive Jan Michelsen (Kenneth M. Christensen) investigando o desaparecimento de uma jovem que ele acredita estar relacionado a um caso semelhante de dez anos atrás. Quando o corpo de uma das jovens é encontrado, ele recorre à especialista em assassinos em série, Louise Bergstein (Natalie Madueño), para ajuda-lo na busca pela solução do mistério. Confira o trailer original:
O mais interessante de "Aqueles que Matam" é que em vez de se contentar com o “quem matou”, a série está mais interessada no “por que” e no “como”, usando o crime como um espelho para temas mais profundos como culpa e trauma, sempre pela perspectiva da linha tênue entre a sanidade e a obsessão. O foco na psicologia dos personagens, principalmente dos assassinos e dos próprios investigadores, adiciona uma camada de desconforto e introspecção que desafia a audiência a acompanhar de perto os conflitos que surgem ao longo dos episódios. O roteiro é extremamente preciso ao construir essas camadas emocionais, entregando diálogos que revelam e questionam ao mesmo tempo, mantendo um ritmo que oscila entre o suspenso e o reflexivo sem perder força.
A direção de fotografia modulada na primeira temporada pelo Eric Kress (de "Halo") merece destaque por sua capacidade de intensificar a tensão da trama com um visual pautado nos tons frios e nos ambientes cheios de desolação. Os enquadramentos das paisagens urbanas e rurais, quase sempre opressivas, se apropriam desse conceito para criar um clima de isolamento e de melancolia que é essencial na experiência da série. A escolha dos contrastes, das luzes e sombras, é cuidadosa, reforçando a sensação de que não há escapismo ali – apenas o confronto constante com as zonas mais sombrias da alma humana. Cada protagonista, seja detetive, psicólogo criminal ou consultor, traz consigo ao longo das temporadas um peso emocional que não é facilmente desvendado. As atuações são contidas, mas impactantes, explorando as reações silenciosas e o desgaste que os casos impõem a esses profissionais. Natalie Madueño e Simon Sears, por exemplo, entregam performances marcantes, construindo personagens humanos que carregam suas próprias feridas, tornando-os críveis e cativantes.
A estrutura introspectiva de "Aqueles que Matam", com foco no desenvolvimento psicológico e na tensão moral, pode parecer lenta em certos momentos, exigindo certa paciência e atenção, mas te garanto: vale a pena embarcar na proposta da série. E sim, existe uma certa densidade que impacta de verdade, especialmente nas temporadas que abordam temas mais sombrios como abuso, traumas de infância e violência doméstica, no entanto, é essa mesma intensidade que dá à série um caráter único. O fato é que "Aqueles que Matam" entrega uma narrativa que desafia e desconstrói o gênero criminal, mostrando que o verdadeiro horror nem sempre está no ato violento, mas nas motivações e nas consequências que ele carrega para todos os envolvidos. Para quem busca uma série que vai além do mistério e se aventura no território da psique humana, você está a um play de muitas horas de um excelente entretenimento!
Vale demais!
Uma série criminal nórdica raiz e simplesmente viciante, assim é "Aqueles que Matam"! "Den som Dræber" (um original Viaplay) mergulha fundo nas complexidades da mente humana, trazendo uma abordagem sombria e visceral ao universo das investigações criminais. Criada por Ina Bruhn, essa série dinamarquesa se diferencia pelo formato antológico, onde cada temporada apresenta um novo caso, novos personagens e uma narrativa que vai muito além da tradicional caçada policial. Aqui, o crime é apenas o ponto de partida para uma jornada que confronta tanto o passado dos criminosos quanto os limites éticos e emocionais dos investigadores que os perseguem - nesse sentido, aliás, a série traz muitos dos conceitos narrativos de "The Killing" e de "True Detective", ou seja, se você gostou das referências, nem perca seu tempo lendo toda essa análise, vá direto para o play! Com uma atmosfera pesada e realista, a série está em sintonia com o que há de mais denso no suspense criminal nórdico,onde a tensão recorrente e a construção de personagens são tão protagonistas quanto o próprio mistério.
A trama de cada temporada é centrada em investigações complexas, onde os crimes e suas motivações são explorados de maneira quase cirúrgica, revelando nuances que deixam claro o quanto a mente humana pode ser um campo de batalha brutal e enigmático. No primeiro ano, por exemplo, acompanhamos o dedicado, mas complicado, detetive Jan Michelsen (Kenneth M. Christensen) investigando o desaparecimento de uma jovem que ele acredita estar relacionado a um caso semelhante de dez anos atrás. Quando o corpo de uma das jovens é encontrado, ele recorre à especialista em assassinos em série, Louise Bergstein (Natalie Madueño), para ajuda-lo na busca pela solução do mistério. Confira o trailer original:
O mais interessante de "Aqueles que Matam" é que em vez de se contentar com o “quem matou”, a série está mais interessada no “por que” e no “como”, usando o crime como um espelho para temas mais profundos como culpa e trauma, sempre pela perspectiva da linha tênue entre a sanidade e a obsessão. O foco na psicologia dos personagens, principalmente dos assassinos e dos próprios investigadores, adiciona uma camada de desconforto e introspecção que desafia a audiência a acompanhar de perto os conflitos que surgem ao longo dos episódios. O roteiro é extremamente preciso ao construir essas camadas emocionais, entregando diálogos que revelam e questionam ao mesmo tempo, mantendo um ritmo que oscila entre o suspenso e o reflexivo sem perder força.
A direção de fotografia modulada na primeira temporada pelo Eric Kress (de "Halo") merece destaque por sua capacidade de intensificar a tensão da trama com um visual pautado nos tons frios e nos ambientes cheios de desolação. Os enquadramentos das paisagens urbanas e rurais, quase sempre opressivas, se apropriam desse conceito para criar um clima de isolamento e de melancolia que é essencial na experiência da série. A escolha dos contrastes, das luzes e sombras, é cuidadosa, reforçando a sensação de que não há escapismo ali – apenas o confronto constante com as zonas mais sombrias da alma humana. Cada protagonista, seja detetive, psicólogo criminal ou consultor, traz consigo ao longo das temporadas um peso emocional que não é facilmente desvendado. As atuações são contidas, mas impactantes, explorando as reações silenciosas e o desgaste que os casos impõem a esses profissionais. Natalie Madueño e Simon Sears, por exemplo, entregam performances marcantes, construindo personagens humanos que carregam suas próprias feridas, tornando-os críveis e cativantes.
A estrutura introspectiva de "Aqueles que Matam", com foco no desenvolvimento psicológico e na tensão moral, pode parecer lenta em certos momentos, exigindo certa paciência e atenção, mas te garanto: vale a pena embarcar na proposta da série. E sim, existe uma certa densidade que impacta de verdade, especialmente nas temporadas que abordam temas mais sombrios como abuso, traumas de infância e violência doméstica, no entanto, é essa mesma intensidade que dá à série um caráter único. O fato é que "Aqueles que Matam" entrega uma narrativa que desafia e desconstrói o gênero criminal, mostrando que o verdadeiro horror nem sempre está no ato violento, mas nas motivações e nas consequências que ele carrega para todos os envolvidos. Para quem busca uma série que vai além do mistério e se aventura no território da psique humana, você está a um play de muitas horas de um excelente entretenimento!
Vale demais!
Desde o primeiro trailer de "Areia Movediça" algo me chamou muito a atenção, embora o "mistério" desse o tom daquela narrativa. Uma minissérie original sueca, produzida pela Netflix, com 6 episódios de 40 minutos cada, baseada em um best-seller, certamente viria com muito potencial!!! O livro de autor Malin Persson Giolito foi publicado em mais de 20 países e foi eleito o melhor romance nórdico de crimes de 2016. Depois de tudo que eu vi e li sobre a minissérie, eu só precisava confirmar se minhas expectativas iriam se comprovar e, posso te garantir: de fato, a história é muito interessante, envolvente e misteriosa! Típico projeto que tem tudo para agradar, mas as pessoas ainda precisam descobrir a enorme qualidade da produção sueca e tudo que envolve essa história.
Então vamos lá: a história é contada em duas linhas temporais diferentes. No presente Maja Norberg, uma jovem e linda estudante pré-vestibular, é acusada de matar seus colegas de escola à tiros, em plena sala de aula. No passado recente, vemos a mesma personagem envolvida com os estudos, se relacionando com a família e com os amigos da melhor forma possível, até que conhece o jovem Sebastian Fagerman - um garoto educado, bem nascido e apaixonado por ela. A primeira dúvida que surge é: como uma jovem tão educada e amorosa foi capaz de matar seus colegas de classe com tanto sangue frio?
Olha, é impossível não se envolver com a história logo de cara, pois "Areia Movediça" trás elementos de dois outros grandes sucessos da Netflix "The Sinner" e "13 Reasons Why"!!! A minissérie transita muito bem no universo dos jovens ao mesmo tempo que trás o mistério da transformação humana e as razões que nos fariam cometer loucuras. Me lembrou quando assisti "Breaking Bad" pela primeira vez - não entendia como um cara como Walter White poderia se transformar em um assassino (ou um traficante) como Heisenberg. Se "Areia Movediça" não tem a genialidade (e profundidade) de "Breaking Bad", merece elogios pela coragem de tocar em assuntos delicados como tiroteio nas escolas, estupro, relacionamento abusivo em vários níveis e o uso de drogas. Tenha em mente que, como o bom cinema sueco exige, é preciso ter estômago!
A Produção é excelente. As locações na Suécia e na França são incríveis. A minissérie é muito bem fotografada, muito bem dirigida e os atores que interpretam a Maja Norberg e o Sebastian Fagerman, respectivamente Hanna Ardéhn e Felix Sandman, dão um verdadeiro show: a maneira como eles vão se desconstruindo durante os episódios vale o "ingresso"! Em muitos momentos o diretor Per-Olav Sørensen usa de técnicas documentais para humanizar ainda mais as situações. Com as câmeras mais soltas e um trabalho genial com o zoom, o diretor trás uma realidade muito interessante para essa ficção que nos faz refletir se aquilo tudo não foi baseado em fatos reais... Poderia!!!
"Areia Movediça" é um ótima surpresa que ainda não caiu nas graças da audiência por puro desconhecimento, pois é impossível não se relacionar com todas as situações que o roteiro propõe!!! Vale muito o play!!!!
Desde o primeiro trailer de "Areia Movediça" algo me chamou muito a atenção, embora o "mistério" desse o tom daquela narrativa. Uma minissérie original sueca, produzida pela Netflix, com 6 episódios de 40 minutos cada, baseada em um best-seller, certamente viria com muito potencial!!! O livro de autor Malin Persson Giolito foi publicado em mais de 20 países e foi eleito o melhor romance nórdico de crimes de 2016. Depois de tudo que eu vi e li sobre a minissérie, eu só precisava confirmar se minhas expectativas iriam se comprovar e, posso te garantir: de fato, a história é muito interessante, envolvente e misteriosa! Típico projeto que tem tudo para agradar, mas as pessoas ainda precisam descobrir a enorme qualidade da produção sueca e tudo que envolve essa história.
Então vamos lá: a história é contada em duas linhas temporais diferentes. No presente Maja Norberg, uma jovem e linda estudante pré-vestibular, é acusada de matar seus colegas de escola à tiros, em plena sala de aula. No passado recente, vemos a mesma personagem envolvida com os estudos, se relacionando com a família e com os amigos da melhor forma possível, até que conhece o jovem Sebastian Fagerman - um garoto educado, bem nascido e apaixonado por ela. A primeira dúvida que surge é: como uma jovem tão educada e amorosa foi capaz de matar seus colegas de classe com tanto sangue frio?
Olha, é impossível não se envolver com a história logo de cara, pois "Areia Movediça" trás elementos de dois outros grandes sucessos da Netflix "The Sinner" e "13 Reasons Why"!!! A minissérie transita muito bem no universo dos jovens ao mesmo tempo que trás o mistério da transformação humana e as razões que nos fariam cometer loucuras. Me lembrou quando assisti "Breaking Bad" pela primeira vez - não entendia como um cara como Walter White poderia se transformar em um assassino (ou um traficante) como Heisenberg. Se "Areia Movediça" não tem a genialidade (e profundidade) de "Breaking Bad", merece elogios pela coragem de tocar em assuntos delicados como tiroteio nas escolas, estupro, relacionamento abusivo em vários níveis e o uso de drogas. Tenha em mente que, como o bom cinema sueco exige, é preciso ter estômago!
A Produção é excelente. As locações na Suécia e na França são incríveis. A minissérie é muito bem fotografada, muito bem dirigida e os atores que interpretam a Maja Norberg e o Sebastian Fagerman, respectivamente Hanna Ardéhn e Felix Sandman, dão um verdadeiro show: a maneira como eles vão se desconstruindo durante os episódios vale o "ingresso"! Em muitos momentos o diretor Per-Olav Sørensen usa de técnicas documentais para humanizar ainda mais as situações. Com as câmeras mais soltas e um trabalho genial com o zoom, o diretor trás uma realidade muito interessante para essa ficção que nos faz refletir se aquilo tudo não foi baseado em fatos reais... Poderia!!!
"Areia Movediça" é um ótima surpresa que ainda não caiu nas graças da audiência por puro desconhecimento, pois é impossível não se relacionar com todas as situações que o roteiro propõe!!! Vale muito o play!!!!
Se você não conhece o empresário dinamarquês Peter Madsen, eu vou tentar defini-lo antes de comentar sobre essa história impressionante que a Netflix transformou em um documentário de cerca de 90 minutos: ele é uma espécie de "padre do balão" que queria ser um "Elon Musk"! Muito reconhecido no seu país pela sua excentricidade e por mostrar muita confiança ao embarcar em projetos independentes curiosos que envolviam a construção de foguetes e submarinos, mas que na verdade mais pareciam enormes sucatas desenvolvidas com relevantes quantias vindo de doações, Madsen viu sua vida virar de ponta cabeça quando uma jornalista sueca simplesmente desapareceu após embarcar em uma de suas criações, o submarino UC3 Nautilus, para um entrevista.
“Into the Deep: The Submarine Murder Case” (no original) conta pelo ponto de vista dos estagiários de Madsen, a história do misterioso desaparecimento deKim Wall. Com uma narrativa envolvente, o documentário procura traçar um paralelo entre (para alguns) o homem brilhante e adorado por todos e (para muitos) o suspeito de um dos crimes mais brutais da história da Dinamarca. Confira o trailer (em inglês):
É inegável que a jovem diretora Emma Sullivan se beneficiou da "sorte" de, na época do crime, estar filmando um documentário que buscava retratar o entusiasmo de Peter Madsen e de seus jovens assistentes voluntários que orgulhosamente mostravam suas recentes invenções (e projetos futuros) durante a intimidade dos dias de trabalho duro nos galpões de Copenhague, onde aparentemente a "magia" acontecia. Aliás essa dinâmica narrativa mais intimista causa um certo desconforto inicialmente, já que somos jogados no drama de acompanhar em "tempo real", e sem muita explicação, o dia em que Madsen não apareceu para trabalhar - acompanhar os estagiários buscando as notícias sobre o chefe e descobrindo que o UC3 Nautilus havia afundado na Baía de Køge, próximo da divisa com a Suécia, até soa falso pela imprevisibilidade da situação; mas o fato é que tudo aquilo era real.
Diferente do genial "Icarus" onde uma situação "semelhante" acontece com o diretor, Sullivan parece não saber aproveitar todo o potencial do material que tem em suas mãos e acaba vacilando ao seguir um roteiro que tira o impacto midiático do momento ao escolher construir um perfil definitivo que comprovasse que Madsen poderia ser diferente daquele personagem que todos admiravam, em vez de se aprofundar na investigação sobre o misterioso desaparecimento de Wall. Isso não prejudica nossa experiência, pois a história é realmente muito impressionante, mas a sensação de que aquilo poderia ser algo muito mais profundo, existe.
Os depoimentos de quem viveu ao lado de Madsen antes dos fatos mostrados no filme são muito interessantes, pois refletem um misto de sentimentos e sensações únicas - passam da preocupação, para a dúvida até chegar na incredulidade, na decepção e na raiva. Nesse ponto, Sullivan acerta ao amarrar diversos depoimentos com arquivos do próprio Madsen e com matérias da imprensa local. Dito isso, minha conclusão é que "Assassinato nas Profundezas" é muito melhor como história do que como obra audiovisual, porém como é impossível dissociar as duas, não recomendar esse documentário que, inclusive, já rendeu um outro projeto, dessa vez na HBO, chamado "Submersa: O Desaparecimento de Kim Wall" dirigido pela mais experiente Erin Lee Carr de "Eu Te Amo, Agora Morra - O Caso de Michelle Carter", soa até injustiça - porque, sim, você vai se surpreender (e se revoltar) com o que assistirá na tela!
Vale seu play!
Se você não conhece o empresário dinamarquês Peter Madsen, eu vou tentar defini-lo antes de comentar sobre essa história impressionante que a Netflix transformou em um documentário de cerca de 90 minutos: ele é uma espécie de "padre do balão" que queria ser um "Elon Musk"! Muito reconhecido no seu país pela sua excentricidade e por mostrar muita confiança ao embarcar em projetos independentes curiosos que envolviam a construção de foguetes e submarinos, mas que na verdade mais pareciam enormes sucatas desenvolvidas com relevantes quantias vindo de doações, Madsen viu sua vida virar de ponta cabeça quando uma jornalista sueca simplesmente desapareceu após embarcar em uma de suas criações, o submarino UC3 Nautilus, para um entrevista.
“Into the Deep: The Submarine Murder Case” (no original) conta pelo ponto de vista dos estagiários de Madsen, a história do misterioso desaparecimento deKim Wall. Com uma narrativa envolvente, o documentário procura traçar um paralelo entre (para alguns) o homem brilhante e adorado por todos e (para muitos) o suspeito de um dos crimes mais brutais da história da Dinamarca. Confira o trailer (em inglês):
É inegável que a jovem diretora Emma Sullivan se beneficiou da "sorte" de, na época do crime, estar filmando um documentário que buscava retratar o entusiasmo de Peter Madsen e de seus jovens assistentes voluntários que orgulhosamente mostravam suas recentes invenções (e projetos futuros) durante a intimidade dos dias de trabalho duro nos galpões de Copenhague, onde aparentemente a "magia" acontecia. Aliás essa dinâmica narrativa mais intimista causa um certo desconforto inicialmente, já que somos jogados no drama de acompanhar em "tempo real", e sem muita explicação, o dia em que Madsen não apareceu para trabalhar - acompanhar os estagiários buscando as notícias sobre o chefe e descobrindo que o UC3 Nautilus havia afundado na Baía de Køge, próximo da divisa com a Suécia, até soa falso pela imprevisibilidade da situação; mas o fato é que tudo aquilo era real.
Diferente do genial "Icarus" onde uma situação "semelhante" acontece com o diretor, Sullivan parece não saber aproveitar todo o potencial do material que tem em suas mãos e acaba vacilando ao seguir um roteiro que tira o impacto midiático do momento ao escolher construir um perfil definitivo que comprovasse que Madsen poderia ser diferente daquele personagem que todos admiravam, em vez de se aprofundar na investigação sobre o misterioso desaparecimento de Wall. Isso não prejudica nossa experiência, pois a história é realmente muito impressionante, mas a sensação de que aquilo poderia ser algo muito mais profundo, existe.
Os depoimentos de quem viveu ao lado de Madsen antes dos fatos mostrados no filme são muito interessantes, pois refletem um misto de sentimentos e sensações únicas - passam da preocupação, para a dúvida até chegar na incredulidade, na decepção e na raiva. Nesse ponto, Sullivan acerta ao amarrar diversos depoimentos com arquivos do próprio Madsen e com matérias da imprensa local. Dito isso, minha conclusão é que "Assassinato nas Profundezas" é muito melhor como história do que como obra audiovisual, porém como é impossível dissociar as duas, não recomendar esse documentário que, inclusive, já rendeu um outro projeto, dessa vez na HBO, chamado "Submersa: O Desaparecimento de Kim Wall" dirigido pela mais experiente Erin Lee Carr de "Eu Te Amo, Agora Morra - O Caso de Michelle Carter", soa até injustiça - porque, sim, você vai se surpreender (e se revoltar) com o que assistirá na tela!
Vale seu play!
"Atleta A" é um verdadeiro soco no estômago!
Esse documentário da Netflix, expõe o médico oficial da equipe de ginástica olímpica do EUA, Larry Nassar, que abusou das jovens atletas durante anos, sem que a Federação iniciasse, ao menos, uma investigação depois de denúncias que vinham desde 2015! Olha, além de emocionante, "Atleta A" é desconfortável como duas outras recentes produções: "Jeffrey Epstein: Poder e Perversão"da Netflix e "Deixando Neverland" da HBO. Confira o trailer (em inglês):
O grande mérito do documentário dirigido pela dupla Bonni Cohen e Jon Shenk e talvez a razão pela qual ele seja diferente dos outros dois títulos mencionados, é a forma direta e avassaladora como o roteiro vai ligando os fatos a partir da denúncia de uma potencial medalhista olímpica, Maggie Nichols, que teve seu sonho de disputar uma Olimpíada ceifado por uma Federação hipócrita, mais preocupada com uma medalha de ouro do que com o respeito por suas atletas, adolescentes de 13 anos que foram abusadas sistematicamente por Nassar. Para quem gosta de esporte e, no meu caso, pai de um menina, fica quase impossível não pausar o filme para recuperar o fôlego, dada a potência e coragem dos depoimentos que assistimos - é simplesmente sensacional a forma como uma história complexa foi bem explicada em apenas 1:40.
Não é difícil perceber a sensibilidade com que Cohen e Shenk desenvolveram as histórias de algumas peças importantes dessa denúncia que abalou o esporte americano em 2016 durante as Olimpíadas do Rio de Janeiro. Embora paralelas, seu encontro se transforma em um dos momentos mais emocionantes do filme, onde vemos algumas vítimas do médico lendo seus relatos sobre o trauma e a vergonha que sentiram após os abusos perante uma juíza incrédula. Foram 150 sobreviventes unidas para desmascarar Larry Nassar. O interessante, porém, é que o documentário é capaz de equilibrar perfeitamente a construção de uma investigação jornalística (e não policial) com a própria história do esporte, com alguns métodos (e personagens) que fizeram sucesso na Romênia de Nadia Comaneti e foram importados para transformar os EUA em uma potência do esporte!
"Atleta A", de fato, vale muito a pena, mas se prepare, pois não será um jornada das mais fáceis já que além das investigações sobre abuso de menores, nos deparamos com personagens movidos por poder, dinheiro, fama; elementos que nada tem a ver com os valores do esporte e com o sonho de criança de muitas dessas atletas que queriam representar o seu país nas competições internacionais - e aqui eu cito uma passagem que me marcou muito: existe uma linha muito tênue entre exigência e assédio moral, agora projete isso em uma criança de pouco mais de dez anos e fica fácil entender porquê o assunto mexe tanto com a gente!
Dê o play, mas esteja disposto a viver uma série de sensações, onde muitas delas não serão tão agradáveis!
"Atleta A" é um verdadeiro soco no estômago!
Esse documentário da Netflix, expõe o médico oficial da equipe de ginástica olímpica do EUA, Larry Nassar, que abusou das jovens atletas durante anos, sem que a Federação iniciasse, ao menos, uma investigação depois de denúncias que vinham desde 2015! Olha, além de emocionante, "Atleta A" é desconfortável como duas outras recentes produções: "Jeffrey Epstein: Poder e Perversão"da Netflix e "Deixando Neverland" da HBO. Confira o trailer (em inglês):
O grande mérito do documentário dirigido pela dupla Bonni Cohen e Jon Shenk e talvez a razão pela qual ele seja diferente dos outros dois títulos mencionados, é a forma direta e avassaladora como o roteiro vai ligando os fatos a partir da denúncia de uma potencial medalhista olímpica, Maggie Nichols, que teve seu sonho de disputar uma Olimpíada ceifado por uma Federação hipócrita, mais preocupada com uma medalha de ouro do que com o respeito por suas atletas, adolescentes de 13 anos que foram abusadas sistematicamente por Nassar. Para quem gosta de esporte e, no meu caso, pai de um menina, fica quase impossível não pausar o filme para recuperar o fôlego, dada a potência e coragem dos depoimentos que assistimos - é simplesmente sensacional a forma como uma história complexa foi bem explicada em apenas 1:40.
Não é difícil perceber a sensibilidade com que Cohen e Shenk desenvolveram as histórias de algumas peças importantes dessa denúncia que abalou o esporte americano em 2016 durante as Olimpíadas do Rio de Janeiro. Embora paralelas, seu encontro se transforma em um dos momentos mais emocionantes do filme, onde vemos algumas vítimas do médico lendo seus relatos sobre o trauma e a vergonha que sentiram após os abusos perante uma juíza incrédula. Foram 150 sobreviventes unidas para desmascarar Larry Nassar. O interessante, porém, é que o documentário é capaz de equilibrar perfeitamente a construção de uma investigação jornalística (e não policial) com a própria história do esporte, com alguns métodos (e personagens) que fizeram sucesso na Romênia de Nadia Comaneti e foram importados para transformar os EUA em uma potência do esporte!
"Atleta A", de fato, vale muito a pena, mas se prepare, pois não será um jornada das mais fáceis já que além das investigações sobre abuso de menores, nos deparamos com personagens movidos por poder, dinheiro, fama; elementos que nada tem a ver com os valores do esporte e com o sonho de criança de muitas dessas atletas que queriam representar o seu país nas competições internacionais - e aqui eu cito uma passagem que me marcou muito: existe uma linha muito tênue entre exigência e assédio moral, agora projete isso em uma criança de pouco mais de dez anos e fica fácil entender porquê o assunto mexe tanto com a gente!
Dê o play, mas esteja disposto a viver uma série de sensações, onde muitas delas não serão tão agradáveis!
Provavelmente "Bacurau" não seja o tipo de filme que você está pensando que é - eu diria que ele está muito mais para "Cidade de Deus" do que para "Abril Despedaçado", portanto se você tinha qualquer tipo de receio, pode confiar: "Bacurau" é um grande filme e vai te surpreender!
No sertão de Pernambuco, existe uma cidade chamada Bacurau. Quando uma moradora respeitada por todos, dona Carmelita, morre, estranhos episódios começam acontecer. É quando Lunga (Silvero Pereira) é chamado para ajudar seus conterrâneos, mas o perigo vai muito além do que todos poderiam imaginar.
Antes de assistir o trailer eu preciso te dar mais um aviso: quanto menos você souber sobre o filme, mais impactante será sua experiência! Agora é com você:
Não é por acaso que o filme começa com ares de ficção científica, onde vemos a Terra pela perspectiva de quem está no espaço. Conforme a câmera vai se movimentando para estabelecer o cenário onde a ação que assistiremos nas próximas duas horas vai desenrolar, percebemos que o destino não é o hemisfério norte ou o Estados Unidos, como de costume. O destino é o hemisfério sul, a América do Sul, mais precisamente em um país, vejam só, chamado Brasil. Acontece que o mergulho dramático ainda vai além até chegarmos em Bacurau - e como a placa que indica a proximidade da cidade, em meio a uma estrada cheia de buracos e um calor de matar, sugere: se for para Bacurau, vá em paz!
Não existem forma melhor de começar um filme como a partir do roteiro escrito por Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornelles (que também dirigem a obra) - sem dizer uma única palavra, já entendemos a importância que aquele cenário trará para trama. E não digo isso pela necessidade regionalista de exaltar um Brasil que muitos de nós não conhecemos e que sofre com a miséria e com a corrupção daqueles que deveriam defender os interesses de um povo sofrido - e eu disse um povo sofrido, não infeliz! Se você leu até aqui, já pode estar imaginando: mais um filme sobre o sertão, briga de famílias, dificuldades sociais, seca, calor e mosquitos. Embora "Bacurau" tenha tudo isso, ele é muito mais, já que não se trata de um drama e sim de um filme de ação - por mais que ele seja construído em cima de camadas bem profundas e sutilmente referenciadas em um texto inteligente e, principalmente, provocativo.
"Bacurau" é uma viagem emocional, o nosso "Casamento Vermelho"! Tecnicamente muito bem realizado, com uma fotografia belíssima do Pedro Sotero, não é por acaso que o filme venceu o Prêmio do Juri no Festival de Cannes em 2019 e esteve concorrendo em mais de 70 eventos ao redor do globo, tendo levado mais de 50 prêmios em todos eles. Ao dar o play, tenha em mente que nada que os diretores colocam em cena está ali por acaso - desde uma explicação sobre a real localização da cidade no Google Earth ao tosco disco voador com aspecto de anos 70 que aparece misteriosamente - é muito interessante como o roteiro brinca com a dicotomia entre tecnologia e tradição cultural ou até entre violência e tranquilidade.
Quando me propus a escrever um review sobre "Bacurau" meu único propósito era: preciso dizer para as pessoas assistirem a esse filme, mas não posso prejudicar sua experiência, para que elas tenham a exata sensação que sinto agora: a de ter assistido um filme realmente incrível! Diferente de outros reviews, não me aprofundei na trama e nem critiquei alguns elementos artísticos justamente para não quebrar sua expectativa - então se você buscou algo assim, você pode até estar irritado comigo, mas assista o filme porque tenho certeza que essa irritação vai ser tornar agradecimento.
Vale muito a pena!
Provavelmente "Bacurau" não seja o tipo de filme que você está pensando que é - eu diria que ele está muito mais para "Cidade de Deus" do que para "Abril Despedaçado", portanto se você tinha qualquer tipo de receio, pode confiar: "Bacurau" é um grande filme e vai te surpreender!
No sertão de Pernambuco, existe uma cidade chamada Bacurau. Quando uma moradora respeitada por todos, dona Carmelita, morre, estranhos episódios começam acontecer. É quando Lunga (Silvero Pereira) é chamado para ajudar seus conterrâneos, mas o perigo vai muito além do que todos poderiam imaginar.
Antes de assistir o trailer eu preciso te dar mais um aviso: quanto menos você souber sobre o filme, mais impactante será sua experiência! Agora é com você:
Não é por acaso que o filme começa com ares de ficção científica, onde vemos a Terra pela perspectiva de quem está no espaço. Conforme a câmera vai se movimentando para estabelecer o cenário onde a ação que assistiremos nas próximas duas horas vai desenrolar, percebemos que o destino não é o hemisfério norte ou o Estados Unidos, como de costume. O destino é o hemisfério sul, a América do Sul, mais precisamente em um país, vejam só, chamado Brasil. Acontece que o mergulho dramático ainda vai além até chegarmos em Bacurau - e como a placa que indica a proximidade da cidade, em meio a uma estrada cheia de buracos e um calor de matar, sugere: se for para Bacurau, vá em paz!
Não existem forma melhor de começar um filme como a partir do roteiro escrito por Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornelles (que também dirigem a obra) - sem dizer uma única palavra, já entendemos a importância que aquele cenário trará para trama. E não digo isso pela necessidade regionalista de exaltar um Brasil que muitos de nós não conhecemos e que sofre com a miséria e com a corrupção daqueles que deveriam defender os interesses de um povo sofrido - e eu disse um povo sofrido, não infeliz! Se você leu até aqui, já pode estar imaginando: mais um filme sobre o sertão, briga de famílias, dificuldades sociais, seca, calor e mosquitos. Embora "Bacurau" tenha tudo isso, ele é muito mais, já que não se trata de um drama e sim de um filme de ação - por mais que ele seja construído em cima de camadas bem profundas e sutilmente referenciadas em um texto inteligente e, principalmente, provocativo.
"Bacurau" é uma viagem emocional, o nosso "Casamento Vermelho"! Tecnicamente muito bem realizado, com uma fotografia belíssima do Pedro Sotero, não é por acaso que o filme venceu o Prêmio do Juri no Festival de Cannes em 2019 e esteve concorrendo em mais de 70 eventos ao redor do globo, tendo levado mais de 50 prêmios em todos eles. Ao dar o play, tenha em mente que nada que os diretores colocam em cena está ali por acaso - desde uma explicação sobre a real localização da cidade no Google Earth ao tosco disco voador com aspecto de anos 70 que aparece misteriosamente - é muito interessante como o roteiro brinca com a dicotomia entre tecnologia e tradição cultural ou até entre violência e tranquilidade.
Quando me propus a escrever um review sobre "Bacurau" meu único propósito era: preciso dizer para as pessoas assistirem a esse filme, mas não posso prejudicar sua experiência, para que elas tenham a exata sensação que sinto agora: a de ter assistido um filme realmente incrível! Diferente de outros reviews, não me aprofundei na trama e nem critiquei alguns elementos artísticos justamente para não quebrar sua expectativa - então se você buscou algo assim, você pode até estar irritado comigo, mas assista o filme porque tenho certeza que essa irritação vai ser tornar agradecimento.
Vale muito a pena!
"Bad Monkey" não tem o escracho de "Only Murders in the Building", muito menos a seriedade de "True Detective", no entanto essa série da AppleTV+ transita muito bem entre o conceito narrativo das duas - talvez mais para o lado dramático, eu diria. A verdade é que "Bad Monkey" chegou chancelada pela a assinatura de Bill Lawrence, responsável por nada menos que "Ted Lasso", "Scrubs" e "Falando a Real", ou seja, um dos showrunners mais bem-sucedidos da comédia contemporânea. Baseada no livro homônimo de Carl Hiaasen, a série combina um elegante (quase britânico) humor ácido com um drama policial mais tradicional, além de uma leve pitada de sátira social, para criar uma narrativa realmente envolvente ambientada na Flórida - um território já naturalmente caótico e propício para histórias que bebem na fonte do absurdo e do realismo mais cínico. O interessante aqui é que a série equilibra o mistério e a comicidade com uma trama que vai além do convencional, explorando o submundo dos golpes imobiliários e da corrupção em um dos estados mais pitorescos dos EUA.
"Bad Monkey" acompanha Andrew Yancy (Vince Vaughn), um ex-detetive rebaixado a inspetor de saúde pública após um incidente desastroso na polícia de Miami. Cansado de inspecionar restaurantes e determinado a recuperar sua posição, ele encontra a oportunidade perfeita quando um braço humano aparece misteriosamente na costa da Flórida. Convencido de que o caso esconde algo muito maior, Yancy inicia uma investigação informal que o leva para um labirinto de esquemas fraudulentos, corrupção, magnatas inescrupulosos e, claro, para o macaco travesso que dá nome à série. Confira o trailer (em inglês):
Sem dúvida que o tom leve da série é um de seus maiores trunfos. "Bad Monkey" captura perfeitamente a essência do romance de Carl Hiaasen, conhecido por seu humor afiado e personagens bem excêntricos. Bill Lawrence se aproveita dessa excelente matéria-prima para imprimir sua identidade narrativa, transformando um enredo policial envolvente em uma jornada cheia de diálogos rápidos, situações absurdas e reviravoltas inteligentes - mesmo exigindo uma certa abstração da realidade, é verdade. O roteiro não apenas mantém a audiência intrigada com o mistério central, como também cria ótimas camadas ao se aprofundar nos personagens secundários, cada um contribuindo para a construção de um universo insano e de certa forma satírico. Reparem como o narrador faz toda a diferença - ele pontua o tom da trama de forma esplendorosa.
Vince Vaughn lidera o elenco com um carisma natural e um timing cômico preciso - para muitos, esse é seu melhor trabalho em muito tempo. Seu Andrew Yancy é um protagonista típico de histórias noir contemporâneas: falho, persistente e irresistivelmente sarcástico - quase um Hank Moody da Costa Leste. Ao seu redor, encontramos um elenco de apoio que brilha com performances de fato marcantes - e aqui eu incluo o "bad monkey", que, apesar de ser um coadjuvante bastante peculiar, se torna uma peça fundamental para a trama. A série também conta com participações de atores renomados como John Ortiz e Tom Nowicki, o que reforça a qualidade da produção e a capacidade de Lawrence em atrair talentos para seus projetos, digamos, pouco convencionais.
Visualmente, Bad Monkey faz um ótimo trabalho ao capturar o lado ensolarado da Flórida, mas também aquela perspectiva mais sombria. A fotografia destaca as paisagens exuberantes e a decadência daquele universo com a mesma competência - e é impressionante como essa dicotomia cria uma atmosfera nostálgica e provocadora. O desenho de produção reforça e mood mais excêntrico, com cenários que transitam entre o kitsch e o luxuoso, refletindo bem os contrastes que a história tanto explora. A realidade é que "Bad Monkey" se destaca por sua habilidade de misturar gêneros sem perder o ritmo. A série não se limita a ser apenas uma comédia pastelão ou um angustiante drama policial, mas sim um híbrido bem dosado que alterna entre momentos de tensão, críticas sociais afiadas e cenas muito divertidas. Bill Lawrence demonstra, mais uma vez, seu talento para criar narrativas cativantes, construídas sobre personagens profundos e situações imprevisíveis que nos impedem de parar de assistir.
Vale muito o seu play!
"Bad Monkey" não tem o escracho de "Only Murders in the Building", muito menos a seriedade de "True Detective", no entanto essa série da AppleTV+ transita muito bem entre o conceito narrativo das duas - talvez mais para o lado dramático, eu diria. A verdade é que "Bad Monkey" chegou chancelada pela a assinatura de Bill Lawrence, responsável por nada menos que "Ted Lasso", "Scrubs" e "Falando a Real", ou seja, um dos showrunners mais bem-sucedidos da comédia contemporânea. Baseada no livro homônimo de Carl Hiaasen, a série combina um elegante (quase britânico) humor ácido com um drama policial mais tradicional, além de uma leve pitada de sátira social, para criar uma narrativa realmente envolvente ambientada na Flórida - um território já naturalmente caótico e propício para histórias que bebem na fonte do absurdo e do realismo mais cínico. O interessante aqui é que a série equilibra o mistério e a comicidade com uma trama que vai além do convencional, explorando o submundo dos golpes imobiliários e da corrupção em um dos estados mais pitorescos dos EUA.
"Bad Monkey" acompanha Andrew Yancy (Vince Vaughn), um ex-detetive rebaixado a inspetor de saúde pública após um incidente desastroso na polícia de Miami. Cansado de inspecionar restaurantes e determinado a recuperar sua posição, ele encontra a oportunidade perfeita quando um braço humano aparece misteriosamente na costa da Flórida. Convencido de que o caso esconde algo muito maior, Yancy inicia uma investigação informal que o leva para um labirinto de esquemas fraudulentos, corrupção, magnatas inescrupulosos e, claro, para o macaco travesso que dá nome à série. Confira o trailer (em inglês):
Sem dúvida que o tom leve da série é um de seus maiores trunfos. "Bad Monkey" captura perfeitamente a essência do romance de Carl Hiaasen, conhecido por seu humor afiado e personagens bem excêntricos. Bill Lawrence se aproveita dessa excelente matéria-prima para imprimir sua identidade narrativa, transformando um enredo policial envolvente em uma jornada cheia de diálogos rápidos, situações absurdas e reviravoltas inteligentes - mesmo exigindo uma certa abstração da realidade, é verdade. O roteiro não apenas mantém a audiência intrigada com o mistério central, como também cria ótimas camadas ao se aprofundar nos personagens secundários, cada um contribuindo para a construção de um universo insano e de certa forma satírico. Reparem como o narrador faz toda a diferença - ele pontua o tom da trama de forma esplendorosa.
Vince Vaughn lidera o elenco com um carisma natural e um timing cômico preciso - para muitos, esse é seu melhor trabalho em muito tempo. Seu Andrew Yancy é um protagonista típico de histórias noir contemporâneas: falho, persistente e irresistivelmente sarcástico - quase um Hank Moody da Costa Leste. Ao seu redor, encontramos um elenco de apoio que brilha com performances de fato marcantes - e aqui eu incluo o "bad monkey", que, apesar de ser um coadjuvante bastante peculiar, se torna uma peça fundamental para a trama. A série também conta com participações de atores renomados como John Ortiz e Tom Nowicki, o que reforça a qualidade da produção e a capacidade de Lawrence em atrair talentos para seus projetos, digamos, pouco convencionais.
Visualmente, Bad Monkey faz um ótimo trabalho ao capturar o lado ensolarado da Flórida, mas também aquela perspectiva mais sombria. A fotografia destaca as paisagens exuberantes e a decadência daquele universo com a mesma competência - e é impressionante como essa dicotomia cria uma atmosfera nostálgica e provocadora. O desenho de produção reforça e mood mais excêntrico, com cenários que transitam entre o kitsch e o luxuoso, refletindo bem os contrastes que a história tanto explora. A realidade é que "Bad Monkey" se destaca por sua habilidade de misturar gêneros sem perder o ritmo. A série não se limita a ser apenas uma comédia pastelão ou um angustiante drama policial, mas sim um híbrido bem dosado que alterna entre momentos de tensão, críticas sociais afiadas e cenas muito divertidas. Bill Lawrence demonstra, mais uma vez, seu talento para criar narrativas cativantes, construídas sobre personagens profundos e situações imprevisíveis que nos impedem de parar de assistir.
Vale muito o seu play!
Entretenimento puro - divertido e cheio de referências. Genial? Longe disso, mas bastante honesto pelo que se propõe! Veja, Jaume Collet-Serra construiu sua carreira equilibrando o suspense e a ação com uma eficiência rara. Desde "Águas Rasas" até "O Passageiro", o diretor espanhol se especializou em transformar premissas aparentemente simples em experiências carregadas de tensão, apostando no dinamismo da narrativa e no uso inteligente do espaço cênico. Em "Bagagem de Risco", sua estreia na Netflix, ele retoma essas características dentro de um thriller ambientado inteiramente em um aeroporto durante a véspera de Natal. Com um elenco liderado por Taron Egerton e Jason Bateman, o filme busca recriar a sensação claustrofóbica de clássicos do gênero, como "Plano de Voo" e "Código de Conduta", mas com um toque contemporâneo e um subtexto moral que adiciona mais camadas à trama.
A história gira em torno de Ethan Kopek (Egerton), um jovem agente do TSA (Administração de Segurança de Transporte) que, em um dia de trabalho aparentemente normal no aeroporto de Los Angeles, recebe uma missão impossível de recusar: um estranho enigmático (Bateman) ameaça eliminar sua esposa grávida caso Kopek não consiga deixar passar uma bagagem pela segurança, especificamente pelo seu raio-x, que irá detonar uma bomba durante um voo doméstico. Confira o trailer (em inglês):
Talvez o mais bacana de "Bagagem de Risco" esteja justamente em seu primeiro ato onde, ao melhor estilo "Culpa", o dilema ético é colocado à prova. Dentro de um contexto narrativo bem construído onde o personagem Kopek, que tem um histórico problemático, se vê em um jogo psicológico que qualquer decisão errada que tome, pode resultar em centenas de mortes. Com essa premissa estabelecida, Collet-Serra, como de costume, dosa bem o ritmo e entrega uma atmosfera de tensão, deixando a audiência imersa em uma sufocante sequência de ações dentro de um aeroporto lotado - que, aliás, se torna um personagem tão importante quanto os protagonistas. Lembram de John McClane em "Duro de Matar"?
Repare como a fotografia de Lyle Vincent (de "A Escada" e "Má Educação") trabalha com os tons frios e uma iluminação artificial agressiva (natural de aeroportos mais tradicionais), criando um ambiente quase inóspito, onde a impessoalidade do espaço reflete a angústia crescente de Kopek. É aí que a câmera de Collet-Serra (que está sempre em movimento, alternando entre planos fechados mais sufocantes e composições que exploram a vastidão do aeroporto) destaca como o protagonista, mesmo cercado por milhares de pessoas, está completamente sozinho diante de uma ameaça invisível. Esse jogo visual reforça a sensação de paranoia, lembrando o que o diretor fez em "Sem Escalas".
Taron Egerton entrega uma performance sólida, sustentando a carga dramática do filme com uma presença física e emocional que lembra seu trabalho em "Black Bird". Seu Kopek é um homem pressionado por traumas do passado e pela exigência de um sistema que não perdoa erros. Jason Bateman, por sua vez, assume um papel que destoa de seus personagens mais conhecidos. Seu antagonista não é exatamente ameaçador no sentido físico, mas exerce um domínio psicológico que mantém a tensão elevada na narrativa. A escolha de Bateman para o papel pode parecer inusitada, mas funciona dentro da proposta do filme já que a dinâmica entre os dois personagens, um dos pontos altos da narrativa, se apoia em diálogos carregados de subtexto e de manipulação. O roteiro de TJ Fixman (com longa carreira escrevendo bons jogos de video-game) aposta em uma dinâmica mais cerebral do que explosiva, evitando as tradicionais sequências grandiosas de ação. Isso não significa que "Bagagem de Risco" careça de adrenalina - a tensão aqui está em cada movimento de Kopek, nas escolhas que ele precisa fazer e na dúvida sobre até que ponto ele está disposto a ceder para garantir a segurança das pessoas ao seu redor.
O uso do tempo real na narrativa é um acerto de Collet-Serra - isso notavelmente amplifica a imersão. À medida que o relógio avança, a urgência se torna mais palpável, e o diretor utiliza isso com maestria a seu favor. No entanto o terceiro ato acaba tropeçando na sua pretensão - muito ao tentar entregar uma resolução impactante sem necessariamente justificar algumas das decisões tomadas no caminho. O fato é que têm momentos em que o roteiro se apoia em tantas conveniências narrativas para conduzir a trama ao clímax, que certamente vai frustrar aqueles mais exigentes. O que eu quero dizer é que o filme se abstém de explorar mais profundamente algumas das questões morais que ele mesmo levantou, optando por um desfecho que privilegia a ação e não a reflexão inteligente. Mesmo assim, posso dizer que "Bagagem de Risco" cumpre seu papel com um thriller eficiente e bem conduzido, que reforça a habilidade de Jaume Collet-Serra em transformar cenários cotidianos em palcos de alta tensão capaz de mexer com nossas sensações - e é isso que importa!
Vale seu play!
Entretenimento puro - divertido e cheio de referências. Genial? Longe disso, mas bastante honesto pelo que se propõe! Veja, Jaume Collet-Serra construiu sua carreira equilibrando o suspense e a ação com uma eficiência rara. Desde "Águas Rasas" até "O Passageiro", o diretor espanhol se especializou em transformar premissas aparentemente simples em experiências carregadas de tensão, apostando no dinamismo da narrativa e no uso inteligente do espaço cênico. Em "Bagagem de Risco", sua estreia na Netflix, ele retoma essas características dentro de um thriller ambientado inteiramente em um aeroporto durante a véspera de Natal. Com um elenco liderado por Taron Egerton e Jason Bateman, o filme busca recriar a sensação claustrofóbica de clássicos do gênero, como "Plano de Voo" e "Código de Conduta", mas com um toque contemporâneo e um subtexto moral que adiciona mais camadas à trama.
A história gira em torno de Ethan Kopek (Egerton), um jovem agente do TSA (Administração de Segurança de Transporte) que, em um dia de trabalho aparentemente normal no aeroporto de Los Angeles, recebe uma missão impossível de recusar: um estranho enigmático (Bateman) ameaça eliminar sua esposa grávida caso Kopek não consiga deixar passar uma bagagem pela segurança, especificamente pelo seu raio-x, que irá detonar uma bomba durante um voo doméstico. Confira o trailer (em inglês):
Talvez o mais bacana de "Bagagem de Risco" esteja justamente em seu primeiro ato onde, ao melhor estilo "Culpa", o dilema ético é colocado à prova. Dentro de um contexto narrativo bem construído onde o personagem Kopek, que tem um histórico problemático, se vê em um jogo psicológico que qualquer decisão errada que tome, pode resultar em centenas de mortes. Com essa premissa estabelecida, Collet-Serra, como de costume, dosa bem o ritmo e entrega uma atmosfera de tensão, deixando a audiência imersa em uma sufocante sequência de ações dentro de um aeroporto lotado - que, aliás, se torna um personagem tão importante quanto os protagonistas. Lembram de John McClane em "Duro de Matar"?
Repare como a fotografia de Lyle Vincent (de "A Escada" e "Má Educação") trabalha com os tons frios e uma iluminação artificial agressiva (natural de aeroportos mais tradicionais), criando um ambiente quase inóspito, onde a impessoalidade do espaço reflete a angústia crescente de Kopek. É aí que a câmera de Collet-Serra (que está sempre em movimento, alternando entre planos fechados mais sufocantes e composições que exploram a vastidão do aeroporto) destaca como o protagonista, mesmo cercado por milhares de pessoas, está completamente sozinho diante de uma ameaça invisível. Esse jogo visual reforça a sensação de paranoia, lembrando o que o diretor fez em "Sem Escalas".
Taron Egerton entrega uma performance sólida, sustentando a carga dramática do filme com uma presença física e emocional que lembra seu trabalho em "Black Bird". Seu Kopek é um homem pressionado por traumas do passado e pela exigência de um sistema que não perdoa erros. Jason Bateman, por sua vez, assume um papel que destoa de seus personagens mais conhecidos. Seu antagonista não é exatamente ameaçador no sentido físico, mas exerce um domínio psicológico que mantém a tensão elevada na narrativa. A escolha de Bateman para o papel pode parecer inusitada, mas funciona dentro da proposta do filme já que a dinâmica entre os dois personagens, um dos pontos altos da narrativa, se apoia em diálogos carregados de subtexto e de manipulação. O roteiro de TJ Fixman (com longa carreira escrevendo bons jogos de video-game) aposta em uma dinâmica mais cerebral do que explosiva, evitando as tradicionais sequências grandiosas de ação. Isso não significa que "Bagagem de Risco" careça de adrenalina - a tensão aqui está em cada movimento de Kopek, nas escolhas que ele precisa fazer e na dúvida sobre até que ponto ele está disposto a ceder para garantir a segurança das pessoas ao seu redor.
O uso do tempo real na narrativa é um acerto de Collet-Serra - isso notavelmente amplifica a imersão. À medida que o relógio avança, a urgência se torna mais palpável, e o diretor utiliza isso com maestria a seu favor. No entanto o terceiro ato acaba tropeçando na sua pretensão - muito ao tentar entregar uma resolução impactante sem necessariamente justificar algumas das decisões tomadas no caminho. O fato é que têm momentos em que o roteiro se apoia em tantas conveniências narrativas para conduzir a trama ao clímax, que certamente vai frustrar aqueles mais exigentes. O que eu quero dizer é que o filme se abstém de explorar mais profundamente algumas das questões morais que ele mesmo levantou, optando por um desfecho que privilegia a ação e não a reflexão inteligente. Mesmo assim, posso dizer que "Bagagem de Risco" cumpre seu papel com um thriller eficiente e bem conduzido, que reforça a habilidade de Jaume Collet-Serra em transformar cenários cotidianos em palcos de alta tensão capaz de mexer com nossas sensações - e é isso que importa!
Vale seu play!
"Banco Central Sob Ataque" é muito interessante, mas é preciso alinhar as expectativas: não espere muita ação - aqui, é o drama (e um perturbador recorte histórico) que vai te mover durante a jornada. Lançada em 2024 pela Netflix, essa minissérie espanhola narra, com uma boa dose de tensão e algum dinamismo, um dos assaltos mais ousados e emblemáticos da história recente da Espanha. Escrita por Patxi Amezcua e dirigida por Daniel Calparsoro, ambos de "O Aviso", a produção foca no olhar crítico sobre as motivações e consequências de um crime que desafiou o sistema financeiro e a ordem social em um período marcado pelo golpe de Estado frustrado que ocorreu na Espanha em 23 de fevereiro de 1981. Assim como "La Casa de Papel", "Asalto al Banco Central" (no original) também explora o fascínio e o impacto dos grandes assaltos na mídia, mas com uma abordagem realista e ancorada em fatos históricos impressionantes - eu diria que por isso, tudo fica ainda mais envolvente.
Em cinco episódios, acompanhamos um grupo de criminosos altamente organizados que planeja e executa um roubo audacioso ao Banco Central da Espanha. À medida que o plano se desenrola, a audiência é levada a conhecer não apenas os detalhes históricos sobre o assalto, mas também os conflitos internos do grupo e os desafios enfrentados pelas autoridades para evitar um desastre midiático - já que cerca de 200 pessoas eram mantidas como reféns. A minissérie alterna entre a perspectiva dos assaltantes e dos investigadores ao mesmo tempo que conhecemos a história de Maider (María Pedraza), uma jornalista que desafia as autoridades para descobrir a verdadeira motivação do assalto, criando assim uma narrativa multifacetada que nos mantém envolvidos do início ao fim. Confira o trailer:
Patxi Amezcua entrega um roteiro que sabe misturar elementos documentais com um drama de diálogos ágeis e bastante incisivos na sua essência. Obviamente que para nós, brasileiros, a dinâmica politica da Espanha pós-ditadura não é um assunto dos mais dominantes, mas é preciso que se diga que a narrativa proposta por Amezcua é eficaz ao explorar a psicologia dos personagens, especialmente no que diz respeito às relações do grupo de assaltantes com suas ideologias e perante as tensões partidárias entre esquerda e extrema direita que ameaçavam a recente democracia do país. A minissérie também é inteligente em abordar os eventos históricos com elementos de ficção que estão 100% alinhados com a proposta de transformar em entretenimento um fato marcante para a sociedade da época. Temas como ganância, corrupção e os limites da moralidade, que questionam as linhas tênues entre certo e errado em um contexto onde todos os envolvidos parecem ter algo a esconder, são muito bem desenvolvidos tanto nos personagens principais quando nos coadjuvantes.
Nesse sentido a direção de Daniel Calparsoro é marcada não só por sua habilidade em criar cenas de alta tensão, mas também por nunca perder o foco na construção desses personagens. Calparsoro equilibra momentos de adrenalina com sequências mais introspectivas, permitindo que a audiência se conecte com as motivações e vulnerabilidades de ambos os lados da história, provocando julgamentos que, de fato, confundem nossa persepção ao ponto de não sabermos muito bem para quem devemos torcer. O diretor utiliza uma cinematografia sombria e dinâmica, com enquadramentos que intensificam o clima claustrofóbico e a sensação de urgência dentro do banco, enquanto nas cenas externas captura a pressão pública e midiática que se desenrola paralelamente ao assalto - inclusive estabelecendo sua condição histórica inserindo imagens reais de arquivos jornalísticos.
Mesmo contando com seu grande elenco como um dos trunfos da minissérie, eu destaco três nomes conhecidos do público da Netflix que merecem sua atenção: Miguel Herrán como o líder do grupo de assaltantes, José Juan Martínez Gómez, o "El Rubio" - ele entrega mais uma performance magnética e cheia de nuances, mostrando a dualidade de um homem que combina inteligência estratégica com uma fragilidade emocional oculta com muita precisão dramática. Ao lado dele, María Pedraza e Isak Férriz, o policial Paco López, contribuem demais para a autenticidade dos conflitos e das relações quase sempre dúbias entre uma jovem jornalista e o responsável pelas investigações - repare como o apelo moral daquela sociedade ainda machucada pela ditadura traz para esses personagens um contraponto sólido e humano.
"Banco Central Sob Ataque", embora tenha seus momentos previsíveis, é uma minissérie que compensa por ter uma narrativa envolvente e personagens que capturam a complexidade de um conflito real entre o anarquismo e a politica da época sem soar didática demais. Tanto para os fãs de dramas criminais históricos e intensos quanto para aqueles que buscam só o entretenimento, eu diria que esse é o tipo de obra que tende a agradar a todos!
Vale seu play!
"Banco Central Sob Ataque" é muito interessante, mas é preciso alinhar as expectativas: não espere muita ação - aqui, é o drama (e um perturbador recorte histórico) que vai te mover durante a jornada. Lançada em 2024 pela Netflix, essa minissérie espanhola narra, com uma boa dose de tensão e algum dinamismo, um dos assaltos mais ousados e emblemáticos da história recente da Espanha. Escrita por Patxi Amezcua e dirigida por Daniel Calparsoro, ambos de "O Aviso", a produção foca no olhar crítico sobre as motivações e consequências de um crime que desafiou o sistema financeiro e a ordem social em um período marcado pelo golpe de Estado frustrado que ocorreu na Espanha em 23 de fevereiro de 1981. Assim como "La Casa de Papel", "Asalto al Banco Central" (no original) também explora o fascínio e o impacto dos grandes assaltos na mídia, mas com uma abordagem realista e ancorada em fatos históricos impressionantes - eu diria que por isso, tudo fica ainda mais envolvente.
Em cinco episódios, acompanhamos um grupo de criminosos altamente organizados que planeja e executa um roubo audacioso ao Banco Central da Espanha. À medida que o plano se desenrola, a audiência é levada a conhecer não apenas os detalhes históricos sobre o assalto, mas também os conflitos internos do grupo e os desafios enfrentados pelas autoridades para evitar um desastre midiático - já que cerca de 200 pessoas eram mantidas como reféns. A minissérie alterna entre a perspectiva dos assaltantes e dos investigadores ao mesmo tempo que conhecemos a história de Maider (María Pedraza), uma jornalista que desafia as autoridades para descobrir a verdadeira motivação do assalto, criando assim uma narrativa multifacetada que nos mantém envolvidos do início ao fim. Confira o trailer:
Patxi Amezcua entrega um roteiro que sabe misturar elementos documentais com um drama de diálogos ágeis e bastante incisivos na sua essência. Obviamente que para nós, brasileiros, a dinâmica politica da Espanha pós-ditadura não é um assunto dos mais dominantes, mas é preciso que se diga que a narrativa proposta por Amezcua é eficaz ao explorar a psicologia dos personagens, especialmente no que diz respeito às relações do grupo de assaltantes com suas ideologias e perante as tensões partidárias entre esquerda e extrema direita que ameaçavam a recente democracia do país. A minissérie também é inteligente em abordar os eventos históricos com elementos de ficção que estão 100% alinhados com a proposta de transformar em entretenimento um fato marcante para a sociedade da época. Temas como ganância, corrupção e os limites da moralidade, que questionam as linhas tênues entre certo e errado em um contexto onde todos os envolvidos parecem ter algo a esconder, são muito bem desenvolvidos tanto nos personagens principais quando nos coadjuvantes.
Nesse sentido a direção de Daniel Calparsoro é marcada não só por sua habilidade em criar cenas de alta tensão, mas também por nunca perder o foco na construção desses personagens. Calparsoro equilibra momentos de adrenalina com sequências mais introspectivas, permitindo que a audiência se conecte com as motivações e vulnerabilidades de ambos os lados da história, provocando julgamentos que, de fato, confundem nossa persepção ao ponto de não sabermos muito bem para quem devemos torcer. O diretor utiliza uma cinematografia sombria e dinâmica, com enquadramentos que intensificam o clima claustrofóbico e a sensação de urgência dentro do banco, enquanto nas cenas externas captura a pressão pública e midiática que se desenrola paralelamente ao assalto - inclusive estabelecendo sua condição histórica inserindo imagens reais de arquivos jornalísticos.
Mesmo contando com seu grande elenco como um dos trunfos da minissérie, eu destaco três nomes conhecidos do público da Netflix que merecem sua atenção: Miguel Herrán como o líder do grupo de assaltantes, José Juan Martínez Gómez, o "El Rubio" - ele entrega mais uma performance magnética e cheia de nuances, mostrando a dualidade de um homem que combina inteligência estratégica com uma fragilidade emocional oculta com muita precisão dramática. Ao lado dele, María Pedraza e Isak Férriz, o policial Paco López, contribuem demais para a autenticidade dos conflitos e das relações quase sempre dúbias entre uma jovem jornalista e o responsável pelas investigações - repare como o apelo moral daquela sociedade ainda machucada pela ditadura traz para esses personagens um contraponto sólido e humano.
"Banco Central Sob Ataque", embora tenha seus momentos previsíveis, é uma minissérie que compensa por ter uma narrativa envolvente e personagens que capturam a complexidade de um conflito real entre o anarquismo e a politica da época sem soar didática demais. Tanto para os fãs de dramas criminais históricos e intensos quanto para aqueles que buscam só o entretenimento, eu diria que esse é o tipo de obra que tende a agradar a todos!
Vale seu play!
Eu não teria me surpreendido se soubesse que "Barry" tivesse sido criado por Vince Gilligan - e se você sabe exatamente do que estou falando, você também já sabe o que vai encontrar nessa série sensacional (e que já foi finalizada) da HBO. Criada por Alec Berg (showrunner de "Silicon Valley") e Bill Hader (que também é o protagonista da série, mas foi redator por muitos anos em "Saturday Night Live"), "Barry" é daquelas séries que surpreendem pela forma única como mistura gêneros, aparentemente opostos, com maestria - aqui temos uma comédia mais ácida (e sombria) com um drama existencial profundo e, em muitos momentos, perturbador. Com um estilo narrativo que lembra (e muito) "Breaking Bad", a série brilha pela sua abordagem honesta perante o anti-herói ao ponto de ser considerada uma das produções mais ousadas e inteligentes da HBO nos últimos anos - não por acaso considerada o "Breaking Bad" da HBO.
A trama, basicamente, gira em torno de Barry Berkman (Bill Hader), um ex-fuzileiro naval que trabalha como assassino profissional, profundamente deprimido e buscando algum sentido para sua existência vazia. Ao ser enviado para Los Angeles em mais uma missão, ele acidentalmente acaba se interessando por um curso de atuação ministrado pelo excêntrico professor Gene Cousineau (Henry Winkler). Fascinado pela possibilidade de recomeçar e talvez até mesmo abandonar sua violenta vida passada, Barry decide se tornar ator, algo que claramente não combina com seu perfil introvertido, rígido e perturbado. Esse conflito entre suas duas vidas, uma brutal e a outra artística, é o coração pulsante da série e a razão que vai te fazer ficar grudado na tela por quatro temporadas. Confira o trailer (em inglês):
"Barry" sabe brincar com nossa percepção e, principalmente, quebrar nossas expectativas - isso é raro e maravilhoso de assistir. A forma como Berg e Hader transitam entre momentos hilários e sequências profundamente inquietantes é primorosa - não por acaso a série já recebeu mais de 50 indicações ao Emmy (ganhando 10). O roteiro é extremamente afiado, daqueles que jamais subestimam a audiência, entregando diálogos inteligentes, cheios de sarcasmo e ironia. Hader, aliás, não apenas co-escreve e protagoniza, como também dirige vários dos episódios mais emblemáticos, destacando-se por sua capacidade notável de equilibrar o tom da narrativa sempre carregado de reflexões em várias camadas.
Um dos maiores trunfos da série é justamente o desempenho de Bill Hader como Barry - ele entrega a atuação mais memorável de sua carreira. Famoso por seu trabalho cômico no "Saturday Night Live", ele surpreende ao revelar uma capacidade dramática poderosa, conferindo a Barry nuances bastante complexas e, claro, provocativas. Através de sua performance minimalista e quase sempre silenciosa, Hader consegue mostrar toda a profundidade de um personagem que tinha tudo para cair no caricato. Repare como ele é capaz de transmitir, constantemente, aquela sensação de perigo iminente, tensão e culpa - bem na linha das que também assombraram o inesquecível Walter White de Bryan Cranston. Outro nome que merece sua atenção é o de Henry Winkler - ele rouba muitas cenas como o professor de atuação narcisista e sem noção. Winkler, que foi indicado ao Emmy em todos os anos que a série esteve no ar (ganhando em 2018), traz carisma e humor ao personagem, proporcionando momentos de leveza tão necessários em meio à densidade emocional que muitas vezes a trama cria. Outro grande destaque, claro, é Anthony Carrigan como NoHo Hank - um mafioso checheno cuja simpatia, ingenuidade e senso de humor absurdo o transformaram em um dos personagens favoritos da audiência, funcionando também como um alívio cômico constante em meio ao caos violento que cerca Barry.
Do ponto de vista técnico, "Barry" é excepcional. A fotografia é precisa, muitas vezes crua, algo que contribui para amplificar a atmosfera emocional e ameaçadora da série - talvez aqui esteja sua grande sacada ao se distanciar do calor contrastado e potente da Albuquerque de "Breaking Bad". A direção dos episódios, por outro lado, repete o ritmo quase cinematográfico, especialmente nas sequências de ação, da série de Gilligan - tudo é filmado com uma elegância surpreendente. É muito interessante como a dinâmica narrativa imposta pela direção e montagem nos deixa em um estado constante de tensão, angustia e expectativa! Mas calma, a série também brilha em suas reflexões mais profundas - Barry não é apenas sobre um assassino tentando mudar de vida: é uma análise muito mais complexa sobre a identidade de um ex-combatente, sobre o trauma do passado, sobre a culpa de algumas escolhas e, principalmente, sobre a possibilidade (ou impossibilidade) de uma redenção. Ao explorar essas camadas morais, "Barry" frequentemente subverte expectativas narrativas, levando a audiência a discutir sobre os limites éticos e as consequências de nossas escolhas.
Enfim, "Barry" é uma das produções mais originais, instigantes e inteligentes disponíveis nos catálogos do streaming - se eu fosse você não deixaria de dar o play!
Eu não teria me surpreendido se soubesse que "Barry" tivesse sido criado por Vince Gilligan - e se você sabe exatamente do que estou falando, você também já sabe o que vai encontrar nessa série sensacional (e que já foi finalizada) da HBO. Criada por Alec Berg (showrunner de "Silicon Valley") e Bill Hader (que também é o protagonista da série, mas foi redator por muitos anos em "Saturday Night Live"), "Barry" é daquelas séries que surpreendem pela forma única como mistura gêneros, aparentemente opostos, com maestria - aqui temos uma comédia mais ácida (e sombria) com um drama existencial profundo e, em muitos momentos, perturbador. Com um estilo narrativo que lembra (e muito) "Breaking Bad", a série brilha pela sua abordagem honesta perante o anti-herói ao ponto de ser considerada uma das produções mais ousadas e inteligentes da HBO nos últimos anos - não por acaso considerada o "Breaking Bad" da HBO.
A trama, basicamente, gira em torno de Barry Berkman (Bill Hader), um ex-fuzileiro naval que trabalha como assassino profissional, profundamente deprimido e buscando algum sentido para sua existência vazia. Ao ser enviado para Los Angeles em mais uma missão, ele acidentalmente acaba se interessando por um curso de atuação ministrado pelo excêntrico professor Gene Cousineau (Henry Winkler). Fascinado pela possibilidade de recomeçar e talvez até mesmo abandonar sua violenta vida passada, Barry decide se tornar ator, algo que claramente não combina com seu perfil introvertido, rígido e perturbado. Esse conflito entre suas duas vidas, uma brutal e a outra artística, é o coração pulsante da série e a razão que vai te fazer ficar grudado na tela por quatro temporadas. Confira o trailer (em inglês):
"Barry" sabe brincar com nossa percepção e, principalmente, quebrar nossas expectativas - isso é raro e maravilhoso de assistir. A forma como Berg e Hader transitam entre momentos hilários e sequências profundamente inquietantes é primorosa - não por acaso a série já recebeu mais de 50 indicações ao Emmy (ganhando 10). O roteiro é extremamente afiado, daqueles que jamais subestimam a audiência, entregando diálogos inteligentes, cheios de sarcasmo e ironia. Hader, aliás, não apenas co-escreve e protagoniza, como também dirige vários dos episódios mais emblemáticos, destacando-se por sua capacidade notável de equilibrar o tom da narrativa sempre carregado de reflexões em várias camadas.
Um dos maiores trunfos da série é justamente o desempenho de Bill Hader como Barry - ele entrega a atuação mais memorável de sua carreira. Famoso por seu trabalho cômico no "Saturday Night Live", ele surpreende ao revelar uma capacidade dramática poderosa, conferindo a Barry nuances bastante complexas e, claro, provocativas. Através de sua performance minimalista e quase sempre silenciosa, Hader consegue mostrar toda a profundidade de um personagem que tinha tudo para cair no caricato. Repare como ele é capaz de transmitir, constantemente, aquela sensação de perigo iminente, tensão e culpa - bem na linha das que também assombraram o inesquecível Walter White de Bryan Cranston. Outro nome que merece sua atenção é o de Henry Winkler - ele rouba muitas cenas como o professor de atuação narcisista e sem noção. Winkler, que foi indicado ao Emmy em todos os anos que a série esteve no ar (ganhando em 2018), traz carisma e humor ao personagem, proporcionando momentos de leveza tão necessários em meio à densidade emocional que muitas vezes a trama cria. Outro grande destaque, claro, é Anthony Carrigan como NoHo Hank - um mafioso checheno cuja simpatia, ingenuidade e senso de humor absurdo o transformaram em um dos personagens favoritos da audiência, funcionando também como um alívio cômico constante em meio ao caos violento que cerca Barry.
Do ponto de vista técnico, "Barry" é excepcional. A fotografia é precisa, muitas vezes crua, algo que contribui para amplificar a atmosfera emocional e ameaçadora da série - talvez aqui esteja sua grande sacada ao se distanciar do calor contrastado e potente da Albuquerque de "Breaking Bad". A direção dos episódios, por outro lado, repete o ritmo quase cinematográfico, especialmente nas sequências de ação, da série de Gilligan - tudo é filmado com uma elegância surpreendente. É muito interessante como a dinâmica narrativa imposta pela direção e montagem nos deixa em um estado constante de tensão, angustia e expectativa! Mas calma, a série também brilha em suas reflexões mais profundas - Barry não é apenas sobre um assassino tentando mudar de vida: é uma análise muito mais complexa sobre a identidade de um ex-combatente, sobre o trauma do passado, sobre a culpa de algumas escolhas e, principalmente, sobre a possibilidade (ou impossibilidade) de uma redenção. Ao explorar essas camadas morais, "Barry" frequentemente subverte expectativas narrativas, levando a audiência a discutir sobre os limites éticos e as consequências de nossas escolhas.
Enfim, "Barry" é uma das produções mais originais, instigantes e inteligentes disponíveis nos catálogos do streaming - se eu fosse você não deixaria de dar o play!