- O episódio começou de uma forma muito promissora: foi realmente linda a sequência onde Tyrion caminha pelas cinzas de Porto Real. Os poucos diálogos que aconteceram durante esse trajeto foram 100% descartáveis - faltou sensibilidade dos diretores para assumir o silêncio como elemento dramático essencial para cena, porém não impediu que o trabalho de Peter Dinklage em canalizar todo sentimento de decepção por não ter conseguido impedir aquela carnificina e sua dor ao encontrar Jamie e Cersei no escombros da Fortaleza Vermelha, tenha sido genial! Foi impactante e sensível quando a câmera sobe e temos o plano geral do que restou dos Lannister's. - Aqui cabe meu primeiro comentário sobre a importância vital do Martin: Quando a bruxa Maggy revelou para Cersei que ela morreria pelas mãos de um jovem irmão e que seus três filhos também morreriam, David Benioff e D.B. Weiss já sabiam que a Cersei morreria no final (Martin havia contado isso para eles, como o próprio Weiss sugeriu na palestra que assisti no Rio em 2014) e foram muito felizes ao indicar isso ao estabelecer que ela estava grávida de um quarto filho. A forma como o irmão mais novo matou ela na série pode não ter agradado muito, mas não deixou de ser coerente em hipótese alguma. Pois bem, Martin começou a se a afastar da série no final da quarta, começo da quinta, temporada; ele havia indicado o caminho para Benioff e Weiss, mas eles escolheram eliminar uma informação muito importante dessa profecia (que também estava no livro) que impactou, e muito, no final dos personagens: "quando ela se afogasse em lágrimas, o valonqar (que significa “irmão mais novo”) colocaria as mãos em sua garganta e a estrangularia até a morte". Isso seria facilmente resolvido se Jamie, para evitar a dor de uma morte iminente (ou até por acesso de raiva ao descobrir que o filho não era dele) a matasse antes da Fortaleza desmoronar sobre eles - em cena, Jamie segurou no pescoço de Cersei, mas não a estrangulou, apenas a abraçou e essa atitude não refletiu o drama daquela profecia que Cersei tanto temia. Mesmo quando Tyrion, sem intenção, acaba levando os dois para morte quando sugere o plano de fuga para Jamie e Cersei e com isso o quarto filho também morre, o publico acaba se decepcionando pela falta de impacto, de força, de drama e de dor que a personagem merecia. Aqui, existia um caminho claro, mas não vimos esse "algo mais" esperado!
- Quando Daenerys retoma seu discurso transformador e comemora a vitória ao lado dos Dothrakis e dos Imaculados, os roteiristas (mais uma vez) jogam no lixo toda a expectativa que eles mesmo alimentaram, dela ter se tornado uma “Rainha Louca” como seu pai. Ela acabara de destruir Porto Real, de matar milhares de inocentes "do nada" e "do nada" ela volta a ter a postura que tinha quando se alto intitulava "salvadora da pátria"! A mudança de personalidade dela era latente, já falamos sobre isso na análise do episódio anterior, poderia fazer sentido, claro, mas faltou tempo para consolidar essa transformação interior, para criar os conflitos internos da personagem que justificassem suas atitudes mais extremas. Pareceu superficial! Pensa comigo: ela tinha ordenado que todos que não a seguisse morressem, o Verme Cinzento deixou isso claro para o Jon na cena anterior - e aqui o clima de tensão entre os dois valeu alguns segundos de apreensão, confesso! - e no momento em que Tyrion diz na cara dela que a traiu, ela vacila e só manda prender o anão???? - O Martin deu a receita lá atrás quando citou durante a série inteira trechos da complexa (e genial) saga do pai dela, Aerys II, mas que, de novo, os roteiristas não conseguiram sustentar e até fortalecer uma relação consistente da Daenerys com seu legado! Cá entre nós, esse papinho de "Dany" não colou - É triste dizer isso, mas no final ela pareceu uma criança mimada que teve um surto e que depois quis provar pra todo mundo que ela continuava legal!! Uma coisa que eu gostei muito dessa cena, foi aquele plano frontal onde a Daenerys caminha com o Dragão ao fundo e a sobreposição entre os dois cria a impressão de que as asas são dela, ao melhor estilo "Vingador" da "Caverna do Dragão"!!!...rs
- A conversa do Tyrion com o Jon, onde ele tenta convence-lo de matar Daenerys por um bem maior, não é ruim, mas é muito mal escrita porque os argumentos são rasos. Algumas citações soam até "bonitas", mas caíram no novelesco que eu duvido que o Martin escreveria daquela forma - quando Jon repete a frase que o Aemon lhe disse na quinta temporada: “O amor é a morte do dever” é um bom exemplo. A frase faz sentido, mas o dramalhão que cercou ela enfraqueceu uma ótima sacada, principalmente porque o próprio Aemon era um Targaryen. O fato é que a cena ficou longa pra caramba e não justificou o tempo que demorou para se chegar no único ponto que realmente move a história para frente: o fato de que a Sansa nunca se curvaria para Daenerys e que isso fatalmente destruiria Winterfell. O objetivo é claro, a solução é preguiçosa!
- Na cena onde a "Rainhas dos Dragões" se aproxima do "Trono de Ferro" vemos uma cena muito parecida em uma visão que a Daenerys teve na Casa dos Imortais durante a segunda temporada quando Martin ainda estava no projeto. A cena mostrava a personagem entrando na sala do Trono de Ferro em uma Porto Real completamente destruída e coberta de neve. O Interessante aqui foi descobrir que aquela neve, era, na verdade, cinzas. Naquele momento ela não chega a tocar no trono, enquanto no episodio final ela toca, mas não senta pois o Jon chega antes. - Eu achei essa construção coerente mais uma vez, com um desfecho surpreendente até. Achei que o Jon não teria coragem de fazer o que fez e que isso seria obra da Arya, mas aquele ruído da espada entrando no corpo da Rainha enquanto o plano mostrava apenas o rosto dos dois, ficou incrível!
- Muito interessante também foram as cenas do respeito que o Dragão tinha pelo Jon por se tratar de um Targaryen. Embora a série só pontue essa relação, os livros estabelecem que os dragões são seres extremamente inteligentes, capazes de reconhecer inimigos da mesma forma como percebem quais pessoas são confiáveis. Antes da cena da morte de Daenerys, inclusive, Jon encontra Drogon do lado de fora dos escombros e já ali o bichão não esboça nenhuma reação para atacar ele. Em nenhum momento eu achei que poderia ser diferente, mesmo quando ele mata a Daenerys e o Dragão vem para cima, mas a construção daquele momento específico ficou bem bacana - só os efeitos que achei fraco (aliás, fogo em plano fechado é sempre um problema)!
- Gostei do Dragão pegando o corpo e sumindo para sempre!!!
Até aqui, algumas coisas não tinham me agradado muito, outras tinham me convencido; eu diria que estava curtindo! Depois da cena da morte da Daenerys nada (ou pouca coisa) prestou na minha opinião. Faltou história, faltou uma linha condutora coerente até o desfecho da série. E não peço todas as respostas não, mas coerência! Muita gente reclamou do final de "Lost" eu eu sempre defendi a coerência da história, mesmo com as respostas mais horríveis de uma trama que parecia muito bem amarrada e que , na verdade, nunca esteve - vou dar um desconto por se tratar de TV aberta e de que, na época, cada temporada tinha 22 episódios! No caso de GoT a coisa é diferente. Enquanto o Martin esteve próximo tudo parecia mais claro, seguro, controlado e com o tempo tudo foi se perdendo. Olha esses pontos que levantei:
- Ficou claro que houve uma passagem de tempo entre a morte da Daenerys e o julgamento do Tyrion pelos Lordes de Westeros. Todos os Nobres mais poderosos dos 7 Reinos reunidos (o novo Príncipe de Dorne, Yara Greyjoy, Edmure Tully, Robin Arryn, Sansa, Brienne, etc) e o cara que sugere a formação de um novo reinado e quem seria o melhor Rei para comandar a coisa toda é o cara que seria julgado ali???? Poxa, precisa ser muito inocente para aceitar que aquela cena faz algum sentido na história. Desde o início todo mundo se matando para comandar Westeros e um prisioneiro resolve quem é a melhor opção e todo mundo aceita numa boa??? Calma aí!!! - Aqui, por incrível que pareça, a única que se salva e mantem uma coerência como personagem é a Sansa.
- Ah, outra pergunta: Os corvos que Varys enviou para todos os Reinos antes de morrer, não serviu para nada? Não seria aqui que noticia ganharia força ou traria a discussão (como na primeira temporada que estava escrito nos livros quem poderia ser o sucessor?!)
- O fato do Bran ser o novo Rei para mim já um problema, pois ele não teve relação nenhuma com aquela posição em nenhum momento da série. Muitas teorias se levantaram em torno do rapaz: que ele seria o novo Rei da Noite ou até o Rei da Luz, mas Rei de Westeros eu não encontrei nada que justificasse essa escolha sem ser aquele monte de baboseiras que o Tyrion falou. Para mim, plot twist sem o menor fundamento narrativo! - Eu sou capaz de apostar que esse não será o final nos livros que o George R.R. Martin precisa entregar (ainda mais agora que ele pôde sentir a temperatura dessa decisão na série).
- Brienne escrevendo no livro da Guarda Real a história de Jaime até o dia de sua morte foi patético. Acha que eu estou exagerando? Então tente colocar uma cena semelhante a essa na primeira temporada e veja se isso é GoT!
- Aquela cena do Bran com seus conselheiros, entre eles o Bronn, foi totalmente sem sentido também! Clima de final de novela que não tem nada a ver com o tom da série!
- O Sam entregando o livro "A Song of Ice and Fire" para o Tyrion foi claramente uma homenagem ao Martin, mas serviu para alguma coisa? Não!!!!
- Um ponto interessante foi aquela montagem que intercalava o caminhar dos Starks. Muito mais pelo seu conceito artístico do que pela profundidade narrativa: Sansa se tornando Rainha do Norte, ok. Jon retornando para a Patrulha da Noite, ok também, mas já exige um pouco mais de boa vontade. Arya indo para Oeste - aqui, mesmo com uma sacada visual legal - já que cena é exatamente igual ao final da quarta temporada, quando ela deixa Westeros e vai para Essos - o problema é que muito do que se esperava dela, não aconteceu. A "Lista" simplesmente foi ignorada, a profecia da Melisandre e a lenda do Azor Ahai também, ou seja, mais um exemplo de um desenvolvimento exemplar feito pelo Martin que não se sustentou nesse final da série.
- E para terminar aquela cena final de novela, digo de Game of Thrones, que remete à primeira cena da primeira temporada onde os "Patrulheiros da Noite" vão além da Muralha e encontram os mortos e agora mostra Jon Snow com o Povo Livre indo além da Muralha, foi uma maneira simplista de terminar algo que nasceu surpreendente e terminou "mais do mesmo"!!!
Valeu? Claro que valeu!!! GoT é um marco, não tenha a menor dúvida disso - como foi Lost inclusive. Mas seu final mostrou mais falhas do que adjetivos. Uma temporada muito inconstante, apressada, sem aquele Conceito que fez tanto sucesso no inicio da jornada. Martin fez muita falta ao se afastar do projeto. Me pareceu que faltou uma consultoria, mesmo existindo como David Benioff e D.B. Weiss insistem em afirmar. Perdeu-se o rumo, a coragem, o inusitado. Se manteve a grandiosidade, isso sim, mas como o próprio Tyrion disse "Não há nada no mundo mais poderoso que uma boa história" e foi justamente aí que a coisa desandou. Nos resta esperar os livros finais da saga, lá devemos encontrar essa história!!!