"Um Pesadelo Americano" é um típico true crime de três episódios que além de intenso em sua proposta narrativa, é profundamente intrigante pela forma como a história é desconstruída. Chancelada por ser um projeto da mesma equipe criativa que produziu "O Golpista do Tinder", essa minissérie nos conduz por um caso absurdo pela perspectiva de quem investiga, mesmo que a narrativa seja feita por quem, de fato, foi vítima. É isso mesmo, essa quebra de expectativa entre o que vemos na tela e o que de fato aconteceu, nos provoca inúmeros julgamentos que diz muito sobre a maneira com que somos influenciados. Eu diria, inclusive, que essa produção original da Netflix é uma verdadeira imersão no obscuro labirinto da pseudo justiça e da hipocrisia da mídia americana, sem o receio de nos expor como parte desse circo - e aqui, ao surgir a comparação com "Garota Exemplar", entendemos exatamente onde a direção de Felicity Morris queria chegar.
"American Nightmare" (no original) foca na história do casal Denise Huskins e Aaron Quinn. Os dois são surpreendidos quando um grupo de pessoas em roupas de mergulho invadem sua casa e fazem os dois de reféns. Após serem supostamente drogados, Denise é levada pelos criminosos e Aaron só consegue fazer contato com a polícia no dia seguinte - é aí que o pesadelo começa, já que depois de um depoimento cheio de brechas, o jovem se torna o principal suspeito do desaparecimento misterioso da namorada. Confira o trailer:
Em um primeiro olhar, encontramos em "Um Pesadelo Americano" uma maestria técnica e artística empregada na sua realização que realmente chama atenção pela similaridade com uma obra de ficção. A forma como Morris explora cada nuance da história, capturando a intensidade emocional dos fatos e toda dinâmica da investigação, realmente nos faz lembrar de filmes do gênero, mais especificamente do próprio "Garota Exemplar" do grande David Fincher - que por curiosidade havia sido lançado um ano antes do crime. Obviamente que essa comparação extrapola o conceito narrativo para se transformar, por incrível que possa parecer, no ponto de partida da investigação diante dos depoimentos de Aaron Quinn e depois de Denise Huskins.
Apresentando as versões sobre o caso a partir de três personagens chave e em episódios "independentes", a direção não só propõe a construção de um quebra-cabeça como também controla quais as peças quer nos entregar. Veja, o roteiro é muito bem amarrado, o que potencializa o trabalho do montador que se delicia com inúmeros depoimentos (inclusive do casal), imagens de câmeras e áudios de policiais e dos suspeitos durante as investigações, gravações de celulares, reportagens de tv da época, e-mails, fotos, enfim, uma quantidade enorme de material que ajudam a compor a linha do tempo de maneira clara e dinâmica, mesmo que de certa forma fragmentada. Veja, até quando a direção propõe algumas reconstituições, o que vemos é uma gramática visual simplesmente cinematográfica e muito envolvente.
Existe uma certa genialidade na minissérie ao desconstruir pré-conceitos e oferecer uma nova perspectiva sobre o caso a cada informação, interpretação ou dúvida levantada por alguém. Essa quebra de expectativa funciona perfeitamente nos dois primeiro episódios, criando uma atmosfera de mistério. No entanto, já o terceiro episódio parece perder um pouco dessa unidade narrativa - elementos aparentemente insignificantes ganham relevância, questionando a veracidade das acusações e provocando uma análise crítica sobre a responsabilidade da mídia e da polícia durante a investigação. Aqui não se trata mais sobre o que aconteceu com Denise e sim sobre como o caso foi tratado. Dito isso, "Pesadelo Americano" não conta apenas com uma história intrigante, mas também nos convida a desafiar a forma como percebemos a verdade e a justiça com um toque de crítica social ao levantar discussões relevantes, especialmente, sobre a misoginia institucionalizada.
Vale seu play!
"Um Pesadelo Americano" é um típico true crime de três episódios que além de intenso em sua proposta narrativa, é profundamente intrigante pela forma como a história é desconstruída. Chancelada por ser um projeto da mesma equipe criativa que produziu "O Golpista do Tinder", essa minissérie nos conduz por um caso absurdo pela perspectiva de quem investiga, mesmo que a narrativa seja feita por quem, de fato, foi vítima. É isso mesmo, essa quebra de expectativa entre o que vemos na tela e o que de fato aconteceu, nos provoca inúmeros julgamentos que diz muito sobre a maneira com que somos influenciados. Eu diria, inclusive, que essa produção original da Netflix é uma verdadeira imersão no obscuro labirinto da pseudo justiça e da hipocrisia da mídia americana, sem o receio de nos expor como parte desse circo - e aqui, ao surgir a comparação com "Garota Exemplar", entendemos exatamente onde a direção de Felicity Morris queria chegar.
"American Nightmare" (no original) foca na história do casal Denise Huskins e Aaron Quinn. Os dois são surpreendidos quando um grupo de pessoas em roupas de mergulho invadem sua casa e fazem os dois de reféns. Após serem supostamente drogados, Denise é levada pelos criminosos e Aaron só consegue fazer contato com a polícia no dia seguinte - é aí que o pesadelo começa, já que depois de um depoimento cheio de brechas, o jovem se torna o principal suspeito do desaparecimento misterioso da namorada. Confira o trailer:
Em um primeiro olhar, encontramos em "Um Pesadelo Americano" uma maestria técnica e artística empregada na sua realização que realmente chama atenção pela similaridade com uma obra de ficção. A forma como Morris explora cada nuance da história, capturando a intensidade emocional dos fatos e toda dinâmica da investigação, realmente nos faz lembrar de filmes do gênero, mais especificamente do próprio "Garota Exemplar" do grande David Fincher - que por curiosidade havia sido lançado um ano antes do crime. Obviamente que essa comparação extrapola o conceito narrativo para se transformar, por incrível que possa parecer, no ponto de partida da investigação diante dos depoimentos de Aaron Quinn e depois de Denise Huskins.
Apresentando as versões sobre o caso a partir de três personagens chave e em episódios "independentes", a direção não só propõe a construção de um quebra-cabeça como também controla quais as peças quer nos entregar. Veja, o roteiro é muito bem amarrado, o que potencializa o trabalho do montador que se delicia com inúmeros depoimentos (inclusive do casal), imagens de câmeras e áudios de policiais e dos suspeitos durante as investigações, gravações de celulares, reportagens de tv da época, e-mails, fotos, enfim, uma quantidade enorme de material que ajudam a compor a linha do tempo de maneira clara e dinâmica, mesmo que de certa forma fragmentada. Veja, até quando a direção propõe algumas reconstituições, o que vemos é uma gramática visual simplesmente cinematográfica e muito envolvente.
Existe uma certa genialidade na minissérie ao desconstruir pré-conceitos e oferecer uma nova perspectiva sobre o caso a cada informação, interpretação ou dúvida levantada por alguém. Essa quebra de expectativa funciona perfeitamente nos dois primeiro episódios, criando uma atmosfera de mistério. No entanto, já o terceiro episódio parece perder um pouco dessa unidade narrativa - elementos aparentemente insignificantes ganham relevância, questionando a veracidade das acusações e provocando uma análise crítica sobre a responsabilidade da mídia e da polícia durante a investigação. Aqui não se trata mais sobre o que aconteceu com Denise e sim sobre como o caso foi tratado. Dito isso, "Pesadelo Americano" não conta apenas com uma história intrigante, mas também nos convida a desafiar a forma como percebemos a verdade e a justiça com um toque de crítica social ao levantar discussões relevantes, especialmente, sobre a misoginia institucionalizada.
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