Quando assisti a minissérie documental da Netflix "The Staircase" em 2018 o subgênero de "true crime" ainda estava se estabelecendo em um mercado de streaming que ainda engatinhava. A Netflix surfava no grande sucesso de "Making a Murderer" e a HBO no surpreendente final de "The Jinx", porém existia um grande diferencial nessa nova narrativa: 80% dos episódios focavam no julgamento e nas estratégias de defesa de Michael Peterson, escritor americano suspeito de assassinar sua mulher Kathleen. A história, naquele momento já era incrível, porém quatro anos depois a HBO lança uma visão, em formato de ficção, um pouco mais intima sobre o caso, ampliando nossa percepção sobre os personagens envolvidos e nos trazendo informações que o documentário não teve como explorar - e te garanto: funciona demais!
"A Escada" acompanha Michael Peterson (Colin Firth), um famoso escritor de suspense criminal acusado de assassinar brutalmente a própria esposa, Kathleen Peterson (Toni Collette). No ano de 2001, Peterson ligou para a polícia avisando que sua mulher havia sofrido um acidente, caindo da escada enquanto estava bêbada. Mas as investigações constataram que ela foi espancada até a morte e que ele mudou a cena do crime para criar a imagem de um acidente doméstico. Com a exposição na mídia, vários segredos de família foram desenterrados, incluindo a possibilidade de infidelidade, e a cada nova informação o público foi descobrindo que o casamento de Michael e Kathleen estava longe de ser perfeito. Rapidamente, Michael se tornou o único suspeito do crime e acabou sentenciado a vários anos de prisão. Ele lutou na justiça ferozmente por anos para provar sua inocência, mas todas as peças do crime apontava para sua culpa. Confira o trailer:
Criada e dirigida pelo americano Antonio Campos (de "The Sinner" e "O diabo de cada dia") a minissérie da HBO acerta ao contar essa história pela perspectiva de quem a tornou um sucesso - o diretor do documentário da Netflix, Jean-Xavier de Lestrade. Lançado originalmente em 2004 e ganhando novas imagens entre 2013 e 2018 quando o documentário saiu de 8 horas de material para mais de 13 horas, o registro feito por Lestrade foi além de um fator de admiração para Campos, como virou parte da história de Michael Peterson. O fascínio do diretor pelo caso fez com que ele usasse dessa fonte riquíssima para dramatizar toda a história, com uma abordagem mais imparcial e oferecendo um olhar inédito para a todas as dúvidas que o documentário não conseguiu responder.
A imparcialidade, aliás, é um dos trunfos de "A Escada", pois a cada dois episódios, sempre no seu final, assistimos o que aconteceu na noite do crime sob a perspectiva de uma versão específica. São basicamente 4 versões que ilustram todas as dúvidas e certezas dos envolvidos nos bastidores do julgamento de Michael Peterson. Essa dinâmica narrativa imposta por Campos é tão fascinante quanto viciante - nossa ânsia por respostas refletem exatamente a atmosfera de tensão e angústia de toda sociedade de Durham, na Carolina do Norte (onde o suposto crime aconteceu).
O elenco é primoroso: Colin Firth e Toni Collette, indicados ao Emmy de 2022 pelas performances, estão exemplares. Mas também não poderia deixar de destacar o trabalho de Vincent Vermignon (como o diretor Jean-Xavier), Juliette Binoche (como a montadora do documentário, Sophie Broussard) e Michael Stuhlbarg (como o advogado David Rudolf). Outro destaque, sem dúvida, diz respeito a reconstrução daqueles cenários - mérito de Michael Shaw (de "Billions"). A montagem e a trilha sonora também são primorosas. Graças a qualidade de todos esses elementos, em muitos momentos temos a exata impressão que as imagens saíram do documentário de Jean-Xavier com uma veracidade que a ficção seria incapaz de reproduzir!
Dito isso, fica fácil afirmar: essa é uma das melhores minisséries de 2022 e se você gosta de "American Crime Story", certamente vai se apaixonar por "A Escada", pois o conceito narrativo é basicamente o mesmo, porém com o selo adicional de qualidade HBO! Vale muito o seu play!
PS: a título de recomendação, assista a minissérie documental "The Staircase" da Neflix antes do play em "A Escada"!
Quando assisti a minissérie documental da Netflix "The Staircase" em 2018 o subgênero de "true crime" ainda estava se estabelecendo em um mercado de streaming que ainda engatinhava. A Netflix surfava no grande sucesso de "Making a Murderer" e a HBO no surpreendente final de "The Jinx", porém existia um grande diferencial nessa nova narrativa: 80% dos episódios focavam no julgamento e nas estratégias de defesa de Michael Peterson, escritor americano suspeito de assassinar sua mulher Kathleen. A história, naquele momento já era incrível, porém quatro anos depois a HBO lança uma visão, em formato de ficção, um pouco mais intima sobre o caso, ampliando nossa percepção sobre os personagens envolvidos e nos trazendo informações que o documentário não teve como explorar - e te garanto: funciona demais!
"A Escada" acompanha Michael Peterson (Colin Firth), um famoso escritor de suspense criminal acusado de assassinar brutalmente a própria esposa, Kathleen Peterson (Toni Collette). No ano de 2001, Peterson ligou para a polícia avisando que sua mulher havia sofrido um acidente, caindo da escada enquanto estava bêbada. Mas as investigações constataram que ela foi espancada até a morte e que ele mudou a cena do crime para criar a imagem de um acidente doméstico. Com a exposição na mídia, vários segredos de família foram desenterrados, incluindo a possibilidade de infidelidade, e a cada nova informação o público foi descobrindo que o casamento de Michael e Kathleen estava longe de ser perfeito. Rapidamente, Michael se tornou o único suspeito do crime e acabou sentenciado a vários anos de prisão. Ele lutou na justiça ferozmente por anos para provar sua inocência, mas todas as peças do crime apontava para sua culpa. Confira o trailer:
Criada e dirigida pelo americano Antonio Campos (de "The Sinner" e "O diabo de cada dia") a minissérie da HBO acerta ao contar essa história pela perspectiva de quem a tornou um sucesso - o diretor do documentário da Netflix, Jean-Xavier de Lestrade. Lançado originalmente em 2004 e ganhando novas imagens entre 2013 e 2018 quando o documentário saiu de 8 horas de material para mais de 13 horas, o registro feito por Lestrade foi além de um fator de admiração para Campos, como virou parte da história de Michael Peterson. O fascínio do diretor pelo caso fez com que ele usasse dessa fonte riquíssima para dramatizar toda a história, com uma abordagem mais imparcial e oferecendo um olhar inédito para a todas as dúvidas que o documentário não conseguiu responder.
A imparcialidade, aliás, é um dos trunfos de "A Escada", pois a cada dois episódios, sempre no seu final, assistimos o que aconteceu na noite do crime sob a perspectiva de uma versão específica. São basicamente 4 versões que ilustram todas as dúvidas e certezas dos envolvidos nos bastidores do julgamento de Michael Peterson. Essa dinâmica narrativa imposta por Campos é tão fascinante quanto viciante - nossa ânsia por respostas refletem exatamente a atmosfera de tensão e angústia de toda sociedade de Durham, na Carolina do Norte (onde o suposto crime aconteceu).
O elenco é primoroso: Colin Firth e Toni Collette, indicados ao Emmy de 2022 pelas performances, estão exemplares. Mas também não poderia deixar de destacar o trabalho de Vincent Vermignon (como o diretor Jean-Xavier), Juliette Binoche (como a montadora do documentário, Sophie Broussard) e Michael Stuhlbarg (como o advogado David Rudolf). Outro destaque, sem dúvida, diz respeito a reconstrução daqueles cenários - mérito de Michael Shaw (de "Billions"). A montagem e a trilha sonora também são primorosas. Graças a qualidade de todos esses elementos, em muitos momentos temos a exata impressão que as imagens saíram do documentário de Jean-Xavier com uma veracidade que a ficção seria incapaz de reproduzir!
Dito isso, fica fácil afirmar: essa é uma das melhores minisséries de 2022 e se você gosta de "American Crime Story", certamente vai se apaixonar por "A Escada", pois o conceito narrativo é basicamente o mesmo, porém com o selo adicional de qualidade HBO! Vale muito o seu play!
PS: a título de recomendação, assista a minissérie documental "The Staircase" da Neflix antes do play em "A Escada"!
Não é uma tarefa fácil analisar um documentário como esse - ele é forte, impactante, denso, provocador até! Dividido em duas partes, “Kevin Spacey – A História Não Contada”, posso adiantar, é ótimo, mas é impossível dizer que haja imparcialidade na sua narrativa. Embora o trabalho de pesquisa da Katherine Haywood (uma das produtoras de "Quem É Ghislaine Maxwell?") seja dos mais competentes, sua proposta narrativa como diretora, basicamente, se apoia em apenas um lado da história, colocando ainda mais lenha na fogueira. Ao trazer para os holofotes os depoimentos de 10 supostas vitimas do ator, sendo 9 novos casos, Haywood praticamente elimina qualquer chance de termos algum tipo de simpatia por Kevin Spacey que, diga-se de passagem, acabou de ser inocentado de todas as acusações de assédio e abuso sexual que tinham contra ele. Ao criar uma linha do tempo das mais interessantes, a diretora constrói um retrato do ator desde sua humilde infância em New Jersey até o auge de sua carreira em Hollywood, relativizando algumas passagens traumáticas para escancarar sua postura como abusador, onde o poder e a influência, reflexo do seu enorme sucesso, de fato, moldaram algumas de suas piores atitudes ao longo dos anos.
Sem nenhum corte, "A História Não Contada” impressiona demais pela honestidade de seus 10 depoentes. Ao acompanhar a trajetória de Spacey desde seus primeiros passos no teatro amador até se tornar um dos atores mais requisitados de Hollywood, temos um perfil dos mais curiosos sobre uma pessoa que parece ter perdido a noção do que é certo e errado em muitas oportunidades. Veja, são entrevistas com amigos, familiares, colegas de profissão e até mesmo com algumas das vítimas desses abusos, o que nos dá a exata noção do quão complexo e multifacetado é o ator, revelando tanto seu talento inegável quanto seus fantasmas mais íntimos. Confira o trailer:
Mais do que um mero relato de fatos, com inúmeras cenas de arquivo e gravações do próprio Kevin Spacey, essa produção da Discovery é um verdadeiro estudo psicológico sobre as motivações e os conflitos internos de um indivíduo talentoso, mas profundamente atormentado. Em dois episódios, a minissérie nos convida a questionar as nuances do comportamento humano, explorando temas como a insegurança, os traumas, a ambição, o poder, o vício e, principalmente, a sensação de invencibilidade. Ao revelar os bastidores da indústria do entretenimento e as consequências devastadoras do poder acima de tudo, "Kevin Spacey - A História Não Contada" se torna uma obra necessária e urgente - um lembrete de que nem tudo que reluz é ouro, e que por trás da máscara do sucesso podem se esconder histórias sombrias e dolorosas.
Mas nem tudo são elogios, se o documentário é eficaz ao mostrar como a fama pode ser uma ferramenta de manipulação, especialmente em um ambiente onde as estrelas têm um controle desproporcional sobre seus colegas de trabalho, ela falha ao não se aprofundar no contexto onde os supostos abusos foram realizados. Da forma como a história é contada, Kevin Spacey é claramente uma pessoa doente, então por qual razão ele não foi condenado em algum de seus supostos crimes? A resposta é simples: na vida real existiu uma dúvida, no documentário não existe!
"Kevin Spacey: A História Não Contada" é um documentário imperdível para quem busca ir além da superfície e tenta entender as complexas engrenagens da psique humana. Embora as resposta não estejam ali, a narrativa te convida ao julgamento - não existe uma saída que não seja condenar seu protagonista. Haywood entrega uma obra perigosa por sua parcialidade, mas ao olharmos por uma perspectiva um pouco mais ampla, seu propósito acaba sendo cumprido, provocando reflexões, despertando a consciência perante o poder e nos convidando a repensar nossos valores e crenças sobre fama e a justiça. Entender a complexidade das acusações contra o ator e o impacto de seu comportamento na vida de muitos homens, acredite, é só o começo dessa jornada bastante indigesta.
Vale seu play!
Não é uma tarefa fácil analisar um documentário como esse - ele é forte, impactante, denso, provocador até! Dividido em duas partes, “Kevin Spacey – A História Não Contada”, posso adiantar, é ótimo, mas é impossível dizer que haja imparcialidade na sua narrativa. Embora o trabalho de pesquisa da Katherine Haywood (uma das produtoras de "Quem É Ghislaine Maxwell?") seja dos mais competentes, sua proposta narrativa como diretora, basicamente, se apoia em apenas um lado da história, colocando ainda mais lenha na fogueira. Ao trazer para os holofotes os depoimentos de 10 supostas vitimas do ator, sendo 9 novos casos, Haywood praticamente elimina qualquer chance de termos algum tipo de simpatia por Kevin Spacey que, diga-se de passagem, acabou de ser inocentado de todas as acusações de assédio e abuso sexual que tinham contra ele. Ao criar uma linha do tempo das mais interessantes, a diretora constrói um retrato do ator desde sua humilde infância em New Jersey até o auge de sua carreira em Hollywood, relativizando algumas passagens traumáticas para escancarar sua postura como abusador, onde o poder e a influência, reflexo do seu enorme sucesso, de fato, moldaram algumas de suas piores atitudes ao longo dos anos.
Sem nenhum corte, "A História Não Contada” impressiona demais pela honestidade de seus 10 depoentes. Ao acompanhar a trajetória de Spacey desde seus primeiros passos no teatro amador até se tornar um dos atores mais requisitados de Hollywood, temos um perfil dos mais curiosos sobre uma pessoa que parece ter perdido a noção do que é certo e errado em muitas oportunidades. Veja, são entrevistas com amigos, familiares, colegas de profissão e até mesmo com algumas das vítimas desses abusos, o que nos dá a exata noção do quão complexo e multifacetado é o ator, revelando tanto seu talento inegável quanto seus fantasmas mais íntimos. Confira o trailer:
Mais do que um mero relato de fatos, com inúmeras cenas de arquivo e gravações do próprio Kevin Spacey, essa produção da Discovery é um verdadeiro estudo psicológico sobre as motivações e os conflitos internos de um indivíduo talentoso, mas profundamente atormentado. Em dois episódios, a minissérie nos convida a questionar as nuances do comportamento humano, explorando temas como a insegurança, os traumas, a ambição, o poder, o vício e, principalmente, a sensação de invencibilidade. Ao revelar os bastidores da indústria do entretenimento e as consequências devastadoras do poder acima de tudo, "Kevin Spacey - A História Não Contada" se torna uma obra necessária e urgente - um lembrete de que nem tudo que reluz é ouro, e que por trás da máscara do sucesso podem se esconder histórias sombrias e dolorosas.
Mas nem tudo são elogios, se o documentário é eficaz ao mostrar como a fama pode ser uma ferramenta de manipulação, especialmente em um ambiente onde as estrelas têm um controle desproporcional sobre seus colegas de trabalho, ela falha ao não se aprofundar no contexto onde os supostos abusos foram realizados. Da forma como a história é contada, Kevin Spacey é claramente uma pessoa doente, então por qual razão ele não foi condenado em algum de seus supostos crimes? A resposta é simples: na vida real existiu uma dúvida, no documentário não existe!
"Kevin Spacey: A História Não Contada" é um documentário imperdível para quem busca ir além da superfície e tenta entender as complexas engrenagens da psique humana. Embora as resposta não estejam ali, a narrativa te convida ao julgamento - não existe uma saída que não seja condenar seu protagonista. Haywood entrega uma obra perigosa por sua parcialidade, mas ao olharmos por uma perspectiva um pouco mais ampla, seu propósito acaba sendo cumprido, provocando reflexões, despertando a consciência perante o poder e nos convidando a repensar nossos valores e crenças sobre fama e a justiça. Entender a complexidade das acusações contra o ator e o impacto de seu comportamento na vida de muitos homens, acredite, é só o começo dessa jornada bastante indigesta.
Vale seu play!
"A Mente do Assassino: Aaron Hernandez" é mais um daqueles documentários que nos fazem refletir sobre a verdadeira condição humana como reflexo de uma sociedade doente, onde os valores são facilmente subvertidos e uma família desestruturada só colabora para essa quebra de confiança e afeto. Claro que existia uma patologia, a encefalopatia traumática crônica - uma doença que causa trauma cerebral em jogadores de futebol americano, resultado de concussões repetidas na cabeça e que merece nossa atenção; mas o fato é que alguns (ou a combinação) desses fatores transformaram um jovem jogador da NFL em um frio assassino! Aaron Hernandez já era uma realidade do esporte com pouco mais de 20 anos, jogava no New England Patriots com Tom Brady e ao lado de Rob Gronkowski, tinha acabado de jogar um Super Bowl onde, inclusive, marcou um Touchdown, tinha um contrato de 40 milhões de dólares garantidos, uma esposa e uma filha recém nascida! Tudo caminhava bem até que o corpo de Ortiz Lloyd é encontrado em North Attleboro, próximo a mansão de Aaron. Lloyd era namorado da irmã de sua esposa e foi só a investigação começar que o jogador já foi preso graças as inúmeras evidências que o colocavam como principal suspeito!
A série da Netflix, destrincha essas evidências ao mesmo tempo em que reconstrói a caminhada esportiva e social de Aaron Hernandez até o dia do seu suicídio. São três episódios de uma hora, com uma dinâmica bastante interessante que não se propõem em inocentar o atleta e sim tentar descobrir as razões que o levaram a cometer o crime! Olha, se você gostou de "O.J.: Made in America", não perca tempo, dê o play porque você não vai se arrepender! Confira o trailer:
O diretor de "A Mente do Assassino: Aaron Hernandez" é Geno McDermott, o produtor responsável por "The Murder Tapes". Ele foi muito inteligente em construir uma narrativa fácil de acompanhar, até para quem não conhece muito dos bastidores do futebol americano. Desde a infância de Aaron Hernandez em Connecticut, passando pela escolha de estudar (e jogar) na Universidade da Flórida, até seus últimos dias no melhor time da NFL, o New England Patriots; a série estabelece uma linha temporal que, embora não seja tão linear, equilibra muito bem vida pessoal e esportiva com depoimentos de fãs, colegas de trabalho, familiares, jornalistas e advogados, com imagens do julgamento, de reportagens da época e até uma ou outra cena dramatizada - o fato é que o documentário poderia ser um filme de ficção tranquilamente de tão potente que é a história - a dinâmica e o storytelling construído estão perfeitos! Algumas fotografias, vídeos, imagens de vigilância e até alguns telefonemas gravados enquanto Aaron Hernandez estava na prisão ajudam a construir um personagem extremamente complexo e uma história surreal, que nos convida ao julgamento a cada nova informação - muito na linha do que aprendemos a amar com "Making a Murderer".
"A Mente do Assassino:Aaron Hernandez" é uma série documental para quem gosta do gênero. Não é um projeto tão complexo como o já citado "Making a Murderer" que acompanha a investigação, o julgamento e busca pela inocência do protagonista; também não tem tantas reviravoltas e, poucas vezes, a história nos deixa alguma dúvida, mas, certamente, tem um valor enorme como o relato de uma vida que se perde dentro das suas próprias conquistas. Tomei muito cuidado durante minha escrita para não entrar em detalhes do caso e para não estragar a sua experiência de descobertas, mas quero deixar claro que existem pontos obscuros, versões nebulosas sobre certas passagens e até algumas especulações que seriam impossíveis de se comprovar nesse momento - o que torna a série da Netflix viciante como todas as outras desse mesmo estilo - para quem gosta, claro!
"A Mente do Assassino: Aaron Hernandez" é mais um daqueles documentários que nos fazem refletir sobre a verdadeira condição humana como reflexo de uma sociedade doente, onde os valores são facilmente subvertidos e uma família desestruturada só colabora para essa quebra de confiança e afeto. Claro que existia uma patologia, a encefalopatia traumática crônica - uma doença que causa trauma cerebral em jogadores de futebol americano, resultado de concussões repetidas na cabeça e que merece nossa atenção; mas o fato é que alguns (ou a combinação) desses fatores transformaram um jovem jogador da NFL em um frio assassino! Aaron Hernandez já era uma realidade do esporte com pouco mais de 20 anos, jogava no New England Patriots com Tom Brady e ao lado de Rob Gronkowski, tinha acabado de jogar um Super Bowl onde, inclusive, marcou um Touchdown, tinha um contrato de 40 milhões de dólares garantidos, uma esposa e uma filha recém nascida! Tudo caminhava bem até que o corpo de Ortiz Lloyd é encontrado em North Attleboro, próximo a mansão de Aaron. Lloyd era namorado da irmã de sua esposa e foi só a investigação começar que o jogador já foi preso graças as inúmeras evidências que o colocavam como principal suspeito!
A série da Netflix, destrincha essas evidências ao mesmo tempo em que reconstrói a caminhada esportiva e social de Aaron Hernandez até o dia do seu suicídio. São três episódios de uma hora, com uma dinâmica bastante interessante que não se propõem em inocentar o atleta e sim tentar descobrir as razões que o levaram a cometer o crime! Olha, se você gostou de "O.J.: Made in America", não perca tempo, dê o play porque você não vai se arrepender! Confira o trailer:
O diretor de "A Mente do Assassino: Aaron Hernandez" é Geno McDermott, o produtor responsável por "The Murder Tapes". Ele foi muito inteligente em construir uma narrativa fácil de acompanhar, até para quem não conhece muito dos bastidores do futebol americano. Desde a infância de Aaron Hernandez em Connecticut, passando pela escolha de estudar (e jogar) na Universidade da Flórida, até seus últimos dias no melhor time da NFL, o New England Patriots; a série estabelece uma linha temporal que, embora não seja tão linear, equilibra muito bem vida pessoal e esportiva com depoimentos de fãs, colegas de trabalho, familiares, jornalistas e advogados, com imagens do julgamento, de reportagens da época e até uma ou outra cena dramatizada - o fato é que o documentário poderia ser um filme de ficção tranquilamente de tão potente que é a história - a dinâmica e o storytelling construído estão perfeitos! Algumas fotografias, vídeos, imagens de vigilância e até alguns telefonemas gravados enquanto Aaron Hernandez estava na prisão ajudam a construir um personagem extremamente complexo e uma história surreal, que nos convida ao julgamento a cada nova informação - muito na linha do que aprendemos a amar com "Making a Murderer".
"A Mente do Assassino:Aaron Hernandez" é uma série documental para quem gosta do gênero. Não é um projeto tão complexo como o já citado "Making a Murderer" que acompanha a investigação, o julgamento e busca pela inocência do protagonista; também não tem tantas reviravoltas e, poucas vezes, a história nos deixa alguma dúvida, mas, certamente, tem um valor enorme como o relato de uma vida que se perde dentro das suas próprias conquistas. Tomei muito cuidado durante minha escrita para não entrar em detalhes do caso e para não estragar a sua experiência de descobertas, mas quero deixar claro que existem pontos obscuros, versões nebulosas sobre certas passagens e até algumas especulações que seriam impossíveis de se comprovar nesse momento - o que torna a série da Netflix viciante como todas as outras desse mesmo estilo - para quem gosta, claro!
Ao melhor estilo "quem matou?", esteja preparado para um entretenimento da melhor qualidade - talvez um dos mais elogiados de 2024. "Acima de Qualquer Suspeita", minissérie criada por David E. Kelley e lançada pela AppleTV+, é um suspense jurídico raiz, daqueles tensos, cheios de reviravoltas e com um final surpreendente. "Presumed Innocent" (no original) se baseia no aclamado romance homônimo de Scott Turow e se destaca pela exploração profunda e envolvente "das verdades e mentiras" a partir da perspectiva de uma acusação de assassinato. Veja, para os fãs de dramas como "Big Little Lies" ou "A Escada" (não por acaso ambos da HBO), "Acima de Qualquer Suspeita" oferece uma mistura semelhante de apreensão, intriga e drama emocional que vai te tirar da zona de conforto!
A trama gira em torno de Rusty Sabich (Jake Gyllenhaal), um promotor público que se vê no centro de uma investigação de assassinato quando sua colega Carolyn Polhemus (Renate Reinsve) é encontrada morta. À medida que as evidências começam a apontar para Rusty como o principal suspeito, ele passa lutar para provar sua inocência enquanto confronta segredos e traições que ameaçam destruir sua carreira e vida pessoal. Confira o trailer:
David E. Kelley, conhecido por seu trabalho em projetos de sucesso como "Big Little Lies" e "The Undoing", traz para Apple aquele "selo HBO" que tanto nos apaixonamos. A partir de sua marca registrada, com diálogos inteligentes e personagens bem desenvolvidos, "Acima de Qualquer Suspeita" surpreende pela qualidade narrativa e visual, entregando um resultado ainda melhor que o filme de 1990 com Harrison Ford,Brian Dennehy e Raúl Julia. Seguindo a premissa da obra literária, essa adaptação explora com muita competência as ramificações de um crime brutal e a busca pela verdade, nos provocando a questionar a confiabilidade da justiça e a natureza da culpa e da inocência.
O roteiro de Kelley é meticulosamente bem estruturado, com reviravoltas bem pontuadas e um ritmo que nos mantém engajados do inicio ao fim - "Acima de Qualquer Suspeita" realmente sabe sustentar seu mistério sem roubar no jogo. Ao se apoiar em temas como a corrupção no sistema judicial, a ambiguidade moral e os limites da lealdade, a minissérie não decepciona - especialmente pelos diálogos afiados e carregados de subtexto, refletindo a complexidade das relações entre os personagens e as tensões subjacentes à investigação. Com uma direção precisa, utilizando a cinematografia de uma Chicago sombria/chuvosa (quase tirada de um filme do Batman) e que captura a tensão e a incerteza do caso, Greg Yaitanes e Anne Sewitsky equilibram habilmente o suspense de um thriller jurídico com os aspectos emocionais e pessoais de um drama de relações, criando uma jornada cativante e profundamente humana. Aliás, reparem na trilha sonora composta por Danny Bensi e Saunder Jurriaans (ambos de "Tulsa King" e de "O Homem Duplicado") - é impressionante como ela complementa a atmosfera de angústia daquele cenário com composições que variam entre a tensão e o melancólico, intensificando o mistério e a carga emocional dos personagens.
Jake Gyllenhaal entrega uma performance poderosa - um misto de vulnerabilidade e de determinação que só um homem que se vê envolto em um pesadelo jurídico é capaz de sentir. Nesse sentido, é impossível não citar o ótimo Peter Sarsgaard como o "intragável" Tommy Molto e o sempre competente Bill Camp como o "carismático" Raymond Horgan. Os três colocam "Acima de Qualquer Suspeita" em uma prateleira que potencializa a exploração corajosa e intelectualmente estimulante dos dilemas morais e éticos dentro do sistema de justiça americano. Mais uma vez David E. Kelley oferece uma visão incisiva e emocionalmente ressonante da busca pela verdade em um mundo repleto de ambiguidades e incertezas. Um golaço da AppleTV+!
Vale muito o seu play!
Ao melhor estilo "quem matou?", esteja preparado para um entretenimento da melhor qualidade - talvez um dos mais elogiados de 2024. "Acima de Qualquer Suspeita", minissérie criada por David E. Kelley e lançada pela AppleTV+, é um suspense jurídico raiz, daqueles tensos, cheios de reviravoltas e com um final surpreendente. "Presumed Innocent" (no original) se baseia no aclamado romance homônimo de Scott Turow e se destaca pela exploração profunda e envolvente "das verdades e mentiras" a partir da perspectiva de uma acusação de assassinato. Veja, para os fãs de dramas como "Big Little Lies" ou "A Escada" (não por acaso ambos da HBO), "Acima de Qualquer Suspeita" oferece uma mistura semelhante de apreensão, intriga e drama emocional que vai te tirar da zona de conforto!
A trama gira em torno de Rusty Sabich (Jake Gyllenhaal), um promotor público que se vê no centro de uma investigação de assassinato quando sua colega Carolyn Polhemus (Renate Reinsve) é encontrada morta. À medida que as evidências começam a apontar para Rusty como o principal suspeito, ele passa lutar para provar sua inocência enquanto confronta segredos e traições que ameaçam destruir sua carreira e vida pessoal. Confira o trailer:
David E. Kelley, conhecido por seu trabalho em projetos de sucesso como "Big Little Lies" e "The Undoing", traz para Apple aquele "selo HBO" que tanto nos apaixonamos. A partir de sua marca registrada, com diálogos inteligentes e personagens bem desenvolvidos, "Acima de Qualquer Suspeita" surpreende pela qualidade narrativa e visual, entregando um resultado ainda melhor que o filme de 1990 com Harrison Ford,Brian Dennehy e Raúl Julia. Seguindo a premissa da obra literária, essa adaptação explora com muita competência as ramificações de um crime brutal e a busca pela verdade, nos provocando a questionar a confiabilidade da justiça e a natureza da culpa e da inocência.
O roteiro de Kelley é meticulosamente bem estruturado, com reviravoltas bem pontuadas e um ritmo que nos mantém engajados do inicio ao fim - "Acima de Qualquer Suspeita" realmente sabe sustentar seu mistério sem roubar no jogo. Ao se apoiar em temas como a corrupção no sistema judicial, a ambiguidade moral e os limites da lealdade, a minissérie não decepciona - especialmente pelos diálogos afiados e carregados de subtexto, refletindo a complexidade das relações entre os personagens e as tensões subjacentes à investigação. Com uma direção precisa, utilizando a cinematografia de uma Chicago sombria/chuvosa (quase tirada de um filme do Batman) e que captura a tensão e a incerteza do caso, Greg Yaitanes e Anne Sewitsky equilibram habilmente o suspense de um thriller jurídico com os aspectos emocionais e pessoais de um drama de relações, criando uma jornada cativante e profundamente humana. Aliás, reparem na trilha sonora composta por Danny Bensi e Saunder Jurriaans (ambos de "Tulsa King" e de "O Homem Duplicado") - é impressionante como ela complementa a atmosfera de angústia daquele cenário com composições que variam entre a tensão e o melancólico, intensificando o mistério e a carga emocional dos personagens.
Jake Gyllenhaal entrega uma performance poderosa - um misto de vulnerabilidade e de determinação que só um homem que se vê envolto em um pesadelo jurídico é capaz de sentir. Nesse sentido, é impossível não citar o ótimo Peter Sarsgaard como o "intragável" Tommy Molto e o sempre competente Bill Camp como o "carismático" Raymond Horgan. Os três colocam "Acima de Qualquer Suspeita" em uma prateleira que potencializa a exploração corajosa e intelectualmente estimulante dos dilemas morais e éticos dentro do sistema de justiça americano. Mais uma vez David E. Kelley oferece uma visão incisiva e emocionalmente ressonante da busca pela verdade em um mundo repleto de ambiguidades e incertezas. Um golaço da AppleTV+!
Vale muito o seu play!
O documentário "Amanda Knox" é aquele típico "True Crime" raiz que, fosse uma antologia, poderia tranquilamente ser a história de uma temporada de "Making a Murderer". Lançado em 2016, essa produção original da Netflix explora o infame caso envolvendo Amanda Knox, uma estudante americana acusada do assassinato de sua colega de quarto britânica, Meredith Kercher, na cidade italiana de Perugia, em 2007. O documentário, dirigido por Rod Blackhurst (de "Here Alone") e Brian McGinn (uma das mentes criativas por trás de "Chef's Table"), oferece uma visão abrangente do caso, apresentando diferentes perspectivas e evidências que cercaram o julgamento e a condenação inicial de Knox.
O filme utiliza uma abordagem bastante equilibrada para explorar os eventos em torno do crime e fornecer uma análise dos principais pontos de vista dos envolvidos. Ele apresenta entrevistas com a própria Amanda Knox, com seu ex-namorado, o italiano Raffaele Sollecito, jornalistas, advogados e familiares das vítimas. Essa variedade de perspectivas contribui para uma narrativa complexa e envolvente, porém dinâmica, permitindo que a audiência compreenda as várias camadas desse caso absurdo. Confira o trailer:
A estrutura narrativa de "Amanda Knox" é habilmente construída, alternando entre a cronologia dos eventos e as entrevistas atuais, proporcionando uma compreensão aprofundada dos personagens e das circunstâncias da época. As simulações dos acontecimentos são bem realizadas dentro desse contexto mais, digamos, "raiz" do projeto - o que funciona perfeitamente para transmitir a atmosfera tensa que cercou o caso em 2007.
É muito fácil perceber no entanto, que uma das principais forças do documentário é sua capacidade de questionar a investigação e o sistema judicial italiano. O roteiro foi muito feliz em levantar algumas dúvidas sobre a validade das evidências e a maneira como foram coletadas, destacando as falhas do processo legal que levaram à condenação inicial de Knox e Sollecito. Essa abordagem crítica provoca reflexões sobre a imparcialidade em casos de grande repercussão midiática - e aqui cabe um comentário: fosse eu professor de jornalismo, passaria esse documentário logo na primeira aula só para mostrar o que NÃO se deve fazer ao cobrir um evento como esse. Mais uma vez o jornalismo inglês virando case de imbecilidade!
Ao analisar o papel da mídia na construção da narrativa em torno do caso, o documentário destaca como a cobertura sensacionalista e as especulações da imprensa influenciaram a opinião pública e moldaram a percepção de Knox como uma figura polarizadora. Essa exploração da relação entre mídia e justiça fornece uma crítica importante ao sensacionalismo e à falta de objetividade na cobertura jornalística. O fato é que, independentemente das opiniões sobre a culpabilidade ou inocência de Amanda Knox, o filme proporciona uma experiência instigante para a audiência amante desse gênero, que na época de seu lançamento, apenas engatinhava.
Vale muito o play!
O documentário "Amanda Knox" é aquele típico "True Crime" raiz que, fosse uma antologia, poderia tranquilamente ser a história de uma temporada de "Making a Murderer". Lançado em 2016, essa produção original da Netflix explora o infame caso envolvendo Amanda Knox, uma estudante americana acusada do assassinato de sua colega de quarto britânica, Meredith Kercher, na cidade italiana de Perugia, em 2007. O documentário, dirigido por Rod Blackhurst (de "Here Alone") e Brian McGinn (uma das mentes criativas por trás de "Chef's Table"), oferece uma visão abrangente do caso, apresentando diferentes perspectivas e evidências que cercaram o julgamento e a condenação inicial de Knox.
O filme utiliza uma abordagem bastante equilibrada para explorar os eventos em torno do crime e fornecer uma análise dos principais pontos de vista dos envolvidos. Ele apresenta entrevistas com a própria Amanda Knox, com seu ex-namorado, o italiano Raffaele Sollecito, jornalistas, advogados e familiares das vítimas. Essa variedade de perspectivas contribui para uma narrativa complexa e envolvente, porém dinâmica, permitindo que a audiência compreenda as várias camadas desse caso absurdo. Confira o trailer:
A estrutura narrativa de "Amanda Knox" é habilmente construída, alternando entre a cronologia dos eventos e as entrevistas atuais, proporcionando uma compreensão aprofundada dos personagens e das circunstâncias da época. As simulações dos acontecimentos são bem realizadas dentro desse contexto mais, digamos, "raiz" do projeto - o que funciona perfeitamente para transmitir a atmosfera tensa que cercou o caso em 2007.
É muito fácil perceber no entanto, que uma das principais forças do documentário é sua capacidade de questionar a investigação e o sistema judicial italiano. O roteiro foi muito feliz em levantar algumas dúvidas sobre a validade das evidências e a maneira como foram coletadas, destacando as falhas do processo legal que levaram à condenação inicial de Knox e Sollecito. Essa abordagem crítica provoca reflexões sobre a imparcialidade em casos de grande repercussão midiática - e aqui cabe um comentário: fosse eu professor de jornalismo, passaria esse documentário logo na primeira aula só para mostrar o que NÃO se deve fazer ao cobrir um evento como esse. Mais uma vez o jornalismo inglês virando case de imbecilidade!
Ao analisar o papel da mídia na construção da narrativa em torno do caso, o documentário destaca como a cobertura sensacionalista e as especulações da imprensa influenciaram a opinião pública e moldaram a percepção de Knox como uma figura polarizadora. Essa exploração da relação entre mídia e justiça fornece uma crítica importante ao sensacionalismo e à falta de objetividade na cobertura jornalística. O fato é que, independentemente das opiniões sobre a culpabilidade ou inocência de Amanda Knox, o filme proporciona uma experiência instigante para a audiência amante desse gênero, que na época de seu lançamento, apenas engatinhava.
Vale muito o play!
“American Crime Story” é uma série antológica, onde a cada temporada uma história é contada (com começo, meio e fim como uma minissérie), que derivou do grande sucesso que foi “American Horror Story”, criada pelo badalado Ryan Murphy (de “Halston”) A diferença entre as duas, é que em "Crime Story”, como o próprio nome diz, cada temporada se baseia em um caso real, seja de assassinato ou não (tanto que o terceiro ano da série focou no escândalo envolvendo o ex presidente Bill Clinton e Mônica Lewinsky).
Nessa primeira temporada, acompanhamos o advogado Robert Shapiro (John Travolta) reunindo um time de estrelas para defender o ex-astro da NFL, OJ Simpson (Cuba Gooding Jr.). Os advogados foram chamados 13 dias depois dos assassinatos de Nicole Brown Simpson, ex-esposa de OJ e Ronald Lyle Goldman, um amigo que foi até a casa de Nicole para, supostamente, devolver um pertence da mãe dela. O interessante porém, é que depois do crime, todas as provas recolhidas pela policia não diziam outra coisa: OJ era culpado. Confira o trailer:
Embora fosse tão nítido a culpa do ex jogador de futebol americano, esse não era um caso comum - o envolvido era famoso, amado por todos e ainda era negro. A complexidade está em uma trama que conta uma história de maneira muito clara, não deixando dúvidas sobre quem foi o verdadeiro culpado, mas é na atuação de Cuba Gooding Jr., tão convincente, que por vezes você também pode ficar em dúvida se ele era realmente o assassino.
A trama frenética sempre está em movimento, afinal em um caso como esse não existiria tempo para respirar, tudo acontece muito rápido e toma proporções inimagináveis. É um turbilhão de emoções (e de discussões culturais) para todos os personagens envolvidos, e principalmente para nós como audiência. Para se ter uma ideia, uma revista foi capaz de "embranquecer" a figura de O.J. Simpson em uma capa de revista como se isso radicasse sua inocência - é quase surreal, mas acreditem, tudo isso realmente aconteceu.
A atriz Sarah Paulson, também foi uma escolha mais que certa para interpretar a promotora de justiça Marcia Clark - ela sempre foi muito assediada pela mídia, pelos seus companheiros de trabalho, especialmente porque nunca se preocupava com a aparência como outras mulheres, e para esses homens isso era quase de outro mundo. Ao dar vida para uma mulher que não tinha uma vida fácil, nem profissional e muito menos pessoal, Paulson brilhou, carregando nuances necessárias para transmitir todas as inseguranças da personagem com muita sensibilidade - esse performance, inclusive, lhe rendeu o Emmy de Melhor Atriz em 2016.
“American Crime Story: O Povo Contra O.J. Simpson” é exemplar! Essa primeira temporada, responsabilidade de Scott Alexander e Larry Karaszewski, acerta em todos os quesitos possíveis: seja na adaptação do livro em que se baseou, "The Run of His Life: The People v. O.J. Simpson" de Jeffrey Toobin; na direção do próprio Ryan Murphy; no casting maravilhoso que proporcionou atuações seguras e competentes e até mesmo no ritmo que proporciona uma maratona mais que bem vinda, afinal essa história vai te prender do inicio ao fim.
PS: O documentário "O.J. Simpson Made in America", grande vencedor do Oscar de 2017, faz com que tenhamos uma percepção da série um pouco diferente, mas não por isso menos interessante. A sensação de torcer para que tudo fosse mentira quando se assiste ao documentário, dado o carisma (e a história de superação) do O.J., praticamente some na ficção, já que fica impossível não torcer para os promotores - talvez por uma visão mais romântica dos fatos e por acabar se envolvendo mais com a narrativa proposta pelo roteiro, onde o backstage do processo está mais presente, a vida dos promotores mais exposta, etc. São experiências diferentes, mas complementares. Sugiro conhecer a história pelo documentário (que também está disponível no Star+) e depois partir para o entretenimento dessa série.
Escrito por Mark Hewes - uma parceria @indiqueipraver
“American Crime Story” é uma série antológica, onde a cada temporada uma história é contada (com começo, meio e fim como uma minissérie), que derivou do grande sucesso que foi “American Horror Story”, criada pelo badalado Ryan Murphy (de “Halston”) A diferença entre as duas, é que em "Crime Story”, como o próprio nome diz, cada temporada se baseia em um caso real, seja de assassinato ou não (tanto que o terceiro ano da série focou no escândalo envolvendo o ex presidente Bill Clinton e Mônica Lewinsky).
Nessa primeira temporada, acompanhamos o advogado Robert Shapiro (John Travolta) reunindo um time de estrelas para defender o ex-astro da NFL, OJ Simpson (Cuba Gooding Jr.). Os advogados foram chamados 13 dias depois dos assassinatos de Nicole Brown Simpson, ex-esposa de OJ e Ronald Lyle Goldman, um amigo que foi até a casa de Nicole para, supostamente, devolver um pertence da mãe dela. O interessante porém, é que depois do crime, todas as provas recolhidas pela policia não diziam outra coisa: OJ era culpado. Confira o trailer:
Embora fosse tão nítido a culpa do ex jogador de futebol americano, esse não era um caso comum - o envolvido era famoso, amado por todos e ainda era negro. A complexidade está em uma trama que conta uma história de maneira muito clara, não deixando dúvidas sobre quem foi o verdadeiro culpado, mas é na atuação de Cuba Gooding Jr., tão convincente, que por vezes você também pode ficar em dúvida se ele era realmente o assassino.
A trama frenética sempre está em movimento, afinal em um caso como esse não existiria tempo para respirar, tudo acontece muito rápido e toma proporções inimagináveis. É um turbilhão de emoções (e de discussões culturais) para todos os personagens envolvidos, e principalmente para nós como audiência. Para se ter uma ideia, uma revista foi capaz de "embranquecer" a figura de O.J. Simpson em uma capa de revista como se isso radicasse sua inocência - é quase surreal, mas acreditem, tudo isso realmente aconteceu.
A atriz Sarah Paulson, também foi uma escolha mais que certa para interpretar a promotora de justiça Marcia Clark - ela sempre foi muito assediada pela mídia, pelos seus companheiros de trabalho, especialmente porque nunca se preocupava com a aparência como outras mulheres, e para esses homens isso era quase de outro mundo. Ao dar vida para uma mulher que não tinha uma vida fácil, nem profissional e muito menos pessoal, Paulson brilhou, carregando nuances necessárias para transmitir todas as inseguranças da personagem com muita sensibilidade - esse performance, inclusive, lhe rendeu o Emmy de Melhor Atriz em 2016.
“American Crime Story: O Povo Contra O.J. Simpson” é exemplar! Essa primeira temporada, responsabilidade de Scott Alexander e Larry Karaszewski, acerta em todos os quesitos possíveis: seja na adaptação do livro em que se baseou, "The Run of His Life: The People v. O.J. Simpson" de Jeffrey Toobin; na direção do próprio Ryan Murphy; no casting maravilhoso que proporcionou atuações seguras e competentes e até mesmo no ritmo que proporciona uma maratona mais que bem vinda, afinal essa história vai te prender do inicio ao fim.
PS: O documentário "O.J. Simpson Made in America", grande vencedor do Oscar de 2017, faz com que tenhamos uma percepção da série um pouco diferente, mas não por isso menos interessante. A sensação de torcer para que tudo fosse mentira quando se assiste ao documentário, dado o carisma (e a história de superação) do O.J., praticamente some na ficção, já que fica impossível não torcer para os promotores - talvez por uma visão mais romântica dos fatos e por acabar se envolvendo mais com a narrativa proposta pelo roteiro, onde o backstage do processo está mais presente, a vida dos promotores mais exposta, etc. São experiências diferentes, mas complementares. Sugiro conhecer a história pelo documentário (que também está disponível no Star+) e depois partir para o entretenimento dessa série.
Escrito por Mark Hewes - uma parceria @indiqueipraver
A primeira temporada da nova série antológica do Disney+, "American Sports Story", é excelente - especialmente se você conhece de futebol americano e sabe quem foi Aaron Hernandez. Dito isso, o que você vai encontrar em 10 episódios é um verdadeiro manifesto de como fazer tudo errado, desde destruir uma carreira promissora até acabar na cadeia acusado de assassinato! E aqui eu deixo uma recomendação extra: independente se antes ou depois de terminar essa série, assista "A Mente do Assassino:Aaron Hernandez" da Netflix. Pois bem, criada por Stuart Zicherman (de "The Americans"), aqui temos um drama dos mais pesados que reconstitui os eventos marcantes da vida do ex-jogador do New England Patriots e fenômeno da NFL, Aaron Hernandez, mergulhando nos aspectos mais sombrios de sua carreira e nos atos que culminaram em sua condenação. Baseada no podcast "Gladiator: Aaron Hernandez and Football Inc"., produzido pelo The Boston Globe em parceria com a Wondery, a série examina a ascensão meteórica de Hernandez no esporte, sua queda dramática e os sistemas que contribuíram para seu trágico destino. Assim como "American Crime Story" a produção da FX oferece um estudo psicológico e social, mas agora com foco no impacto cultural e esportivo de sua história.
A primeira temporada da nova série antológica do Disney+, "American Sports Story", é excelente - especialmente se você conhece de futebol americano e sabe quem foi Aaron Hernandez. Dito isso, o que você vai encontrar em 10 episódios é um verdadeiro manifesto de como fazer tudo errado, desde destruir uma carreira promissora até acabar na cadeia acusado de assassinato! E aqui eu deixo uma recomendação extra: independente se antes ou depois de terminar essa série, assista "A Mente do Assassino:Aaron Hernandez" da Netflix. Pois bem, criada por Stuart Zicherman (de "The Americans"), aqui temos um drama dos mais pesados que reconstitui os eventos marcantes da vida do ex-jogador do New England Patriots e fenômeno da NFL, Aaron Hernandez, mergulhando nos aspectos mais sombrios de sua carreira e nos atos que culminaram em sua condenação. Baseada no podcast "Gladiator: Aaron Hernandez and Football Inc"., produzido pelo The Boston Globe em parceria com a Wondery, a série examina a ascensão meteórica de Hernandez no esporte, sua queda dramática e os sistemas que contribuíram para seu trágico destino. Assim como "American Crime Story" a produção da FX oferece um estudo psicológico e social, mas agora com foco no impacto cultural e esportivo de sua história.
"Amor e Morte" é a "versão HBO" da igualmente competente "Candy"- talvez um pouco menos estereotipada e sensivelmente mais profunda na construção das camadas dos personagens. Essa versão lançada em 2023, foi criada por David E. Kelley ("Acima de Qualquer Suspeita") e dirigida por Lesli Linka Glatter ("Homeland") e Clark Johnson (de "Seven Seconds"), ou seja, um time que definitivamente sabe o que está fazendo quando o assunto é construir tensão. Baseada em uma história real e adaptado do livro "Evidence of Love: A True Story of Passion and Death in the Suburbs", a minissérie mergulha nas profundezas da psique de Candy, explorando sua obsessão a partir de uma traição - eu diria que a trama faz um recorte muito interessante sobre escuridão que pode se esconder sob a superfície de vidas aparentemente comuns. Com uma narrativa que combina romance, investigação, suspense (psicológico) e até um toque de drama de tribunal, "Amor e Morte" oferece uma experiência, de fato, envolvente e emocionalmente complexa. Para os fãs de dramas criminais baseados em fatos reais, impossível não dar um play!
"Amor e Morte" é a "versão HBO" da igualmente competente "Candy"- talvez um pouco menos estereotipada e sensivelmente mais profunda na construção das camadas dos personagens. Essa versão lançada em 2023, foi criada por David E. Kelley ("Acima de Qualquer Suspeita") e dirigida por Lesli Linka Glatter ("Homeland") e Clark Johnson (de "Seven Seconds"), ou seja, um time que definitivamente sabe o que está fazendo quando o assunto é construir tensão. Baseada em uma história real e adaptado do livro "Evidence of Love: A True Story of Passion and Death in the Suburbs", a minissérie mergulha nas profundezas da psique de Candy, explorando sua obsessão a partir de uma traição - eu diria que a trama faz um recorte muito interessante sobre escuridão que pode se esconder sob a superfície de vidas aparentemente comuns. Com uma narrativa que combina romance, investigação, suspense (psicológico) e até um toque de drama de tribunal, "Amor e Morte" oferece uma experiência, de fato, envolvente e emocionalmente complexa. Para os fãs de dramas criminais baseados em fatos reais, impossível não dar um play!
"Anatomia de um Escândalo" é uma espécie de "The Undoing" da Netflix - e não por acaso também adaptado por David E. Kelley a partir do livro homônimo de Sarah Vaughan. Pois bem, mesmo tendo o DNA de Kelley é preciso deixar bem claro que a produção não carrega o "selo HBO" e isso pode ser sentido em sua forma, mas não no conteúdo, ou seja, se para você tudo que escrevi até aqui fez sentido, provavelmente você nem vai precisar ler a análise inteira para ter a certeza que seu entretenimento está garantido! "Anatomia de um Escândalo" foi lançada em 2022 trazendo o melhor do drama jurídico ao explorar as nuances de como o poder pode gerar privilégios nocivos a partir da sensação "natural" de impunidade nos bastidores da política - aqui, britânica. A minissérie de Kelly conta com a colaboração precisa de Melissa James Gibson (de "House of Cards") para traduzir as complexidades de um caso de abuso sexual envolvendo um político influente, expondo as fissuras nas instituições que frequentemente protegem os poderosos. Esteja preparado para uma narrativa envolvente, capaz de entregar uma experiência que equilibra perfeitamente o entretenimento com o drama pessoal e a crítica social.
James Whitehouse (Rupert Friend) é um político carismático e bem-sucedido que, após ser acusado de estuprar uma colega de trabalho, Olivia Lytton (Naomi Scott), se vê no centro de um escândalo midiático. Ao seu lado está sua esposa, Sophie (Sienna Miller), que enfrenta a difícil tarefa de reconciliar sua lealdade ao marido com as crescentes suspeitas sobre seu comportamento e integridade. Enquanto a narrativa se desenrola, vemos o caso sendo disputado no tribunal pela promotora Kate Woodcroft (Michelle Dockery), que busca justiça em meio ao que parece ser uma batalha desigual de um homem protegido por seu status contra uma mulher aparentemente desacreditada por muitos. Confira o trailer:
1 + 1 nem sempre é 2, pelo menos pela perspectiva de quem interpreta uma situação estando nela e "Anatomia de um Escândalo" é muito inteligente em criar essa atmosfera de dúvidas com muita sabedoria - através do seu roteiro, de sua montagem e de sua direção. Ao lado das montadoras Liana Del Giudice (de "Marcella") e Mary Finlay (de "A Cor do Poder"), a diretora S.J. Clarkson (de "Succession") trabalha os flashbacks e os cortes rápidos (e desconexos) para fortalecer o conceito de narrativa fragmentada que gradualmente revela os segredos e as motivações dos personagens ao mesmo tempo em que sugere um forte senso de desorientação. Repare como as cenas de tribunal são intensas, capturando a pressão e o drama de um julgamento onde as questões de consentimento são colocadas em primeiro plano, mas é no recorte pontual das situações, com o uso de ângulos e lentes que distorcem a percepção do espaço, que encontramos o colapso de verdades que antes pareciam absolutas - isso é muito bacana.
O roteiro, de fato, é eficiente em construir uma narrativa que se equilibra o suspense com o drama mais psicológico. Kelley e Gibson exploram de forma hábil os dilemas morais e as complexidades de um escândalo sexual no meio político, mostrando o privilégio de maneira crítica e como isso molda a percepção da verdade ao ponto de influenciar os desfechos judiciais, e mais do que isso, ainda destacam o impacto devastador não apenas sobre as vítimas, mas também sobre as pessoas que cercam o acusado. Sophie, por exemplo, é uma mulher que vê seu mundo desmoronar ao questionar tudo o que sabia sobre o marido e sobre seu casamento - a performance de Sienna Miller é cheia de camadas, capturando a dor e a confusão de uma esposa que é forçada a confrontar a realidade que sempre tentou ignorar. Sua evolução ao longo da minissérie é convincente, pois ela passa de uma figura passiva e protetora para alguém que precisa lidar com as duras verdades sobre o homem com quem escolheu compartilhar sua vida. Rupert Friend entrega uma atuação sólida, interpretando esse homem que, apesar de seu charme e aparente vulnerabilidade, carrega um tom de arrogância e frieza. E Michelle Dockery, o que dizer? Ela consegue equilibrar a frieza profissional e o envolvimento emocional, tornando sua performance um dos pilares da minissérie, mas saiba que o charme da sua personagem está mesmo é no subtexto - pontuado pela hipocrisia no primeiro momento e na dura auto-avaliação mais a frente!
Obviamente que "Anatomia de um Escândalo" sofre com os clichês típicos de dramas jurídicos e escândalos políticos, podendo se tornar até previsível, mas para os amantes do gênero eu posso garantir que a minissérie é bastante eficaz em proporcionar um ótimo e rápido entretenimento (são apenas 6 episódios) ao mesmo tempo que provoca boas discussões sobre os mecanismos que sustentam os privilégios de poucos e sobre a realidade por trás dos escândalos que frequentemente vemos na tv. Para pensar sem esquecer de se divertir!
Vale o seu play!
"Anatomia de um Escândalo" é uma espécie de "The Undoing" da Netflix - e não por acaso também adaptado por David E. Kelley a partir do livro homônimo de Sarah Vaughan. Pois bem, mesmo tendo o DNA de Kelley é preciso deixar bem claro que a produção não carrega o "selo HBO" e isso pode ser sentido em sua forma, mas não no conteúdo, ou seja, se para você tudo que escrevi até aqui fez sentido, provavelmente você nem vai precisar ler a análise inteira para ter a certeza que seu entretenimento está garantido! "Anatomia de um Escândalo" foi lançada em 2022 trazendo o melhor do drama jurídico ao explorar as nuances de como o poder pode gerar privilégios nocivos a partir da sensação "natural" de impunidade nos bastidores da política - aqui, britânica. A minissérie de Kelly conta com a colaboração precisa de Melissa James Gibson (de "House of Cards") para traduzir as complexidades de um caso de abuso sexual envolvendo um político influente, expondo as fissuras nas instituições que frequentemente protegem os poderosos. Esteja preparado para uma narrativa envolvente, capaz de entregar uma experiência que equilibra perfeitamente o entretenimento com o drama pessoal e a crítica social.
James Whitehouse (Rupert Friend) é um político carismático e bem-sucedido que, após ser acusado de estuprar uma colega de trabalho, Olivia Lytton (Naomi Scott), se vê no centro de um escândalo midiático. Ao seu lado está sua esposa, Sophie (Sienna Miller), que enfrenta a difícil tarefa de reconciliar sua lealdade ao marido com as crescentes suspeitas sobre seu comportamento e integridade. Enquanto a narrativa se desenrola, vemos o caso sendo disputado no tribunal pela promotora Kate Woodcroft (Michelle Dockery), que busca justiça em meio ao que parece ser uma batalha desigual de um homem protegido por seu status contra uma mulher aparentemente desacreditada por muitos. Confira o trailer:
1 + 1 nem sempre é 2, pelo menos pela perspectiva de quem interpreta uma situação estando nela e "Anatomia de um Escândalo" é muito inteligente em criar essa atmosfera de dúvidas com muita sabedoria - através do seu roteiro, de sua montagem e de sua direção. Ao lado das montadoras Liana Del Giudice (de "Marcella") e Mary Finlay (de "A Cor do Poder"), a diretora S.J. Clarkson (de "Succession") trabalha os flashbacks e os cortes rápidos (e desconexos) para fortalecer o conceito de narrativa fragmentada que gradualmente revela os segredos e as motivações dos personagens ao mesmo tempo em que sugere um forte senso de desorientação. Repare como as cenas de tribunal são intensas, capturando a pressão e o drama de um julgamento onde as questões de consentimento são colocadas em primeiro plano, mas é no recorte pontual das situações, com o uso de ângulos e lentes que distorcem a percepção do espaço, que encontramos o colapso de verdades que antes pareciam absolutas - isso é muito bacana.
O roteiro, de fato, é eficiente em construir uma narrativa que se equilibra o suspense com o drama mais psicológico. Kelley e Gibson exploram de forma hábil os dilemas morais e as complexidades de um escândalo sexual no meio político, mostrando o privilégio de maneira crítica e como isso molda a percepção da verdade ao ponto de influenciar os desfechos judiciais, e mais do que isso, ainda destacam o impacto devastador não apenas sobre as vítimas, mas também sobre as pessoas que cercam o acusado. Sophie, por exemplo, é uma mulher que vê seu mundo desmoronar ao questionar tudo o que sabia sobre o marido e sobre seu casamento - a performance de Sienna Miller é cheia de camadas, capturando a dor e a confusão de uma esposa que é forçada a confrontar a realidade que sempre tentou ignorar. Sua evolução ao longo da minissérie é convincente, pois ela passa de uma figura passiva e protetora para alguém que precisa lidar com as duras verdades sobre o homem com quem escolheu compartilhar sua vida. Rupert Friend entrega uma atuação sólida, interpretando esse homem que, apesar de seu charme e aparente vulnerabilidade, carrega um tom de arrogância e frieza. E Michelle Dockery, o que dizer? Ela consegue equilibrar a frieza profissional e o envolvimento emocional, tornando sua performance um dos pilares da minissérie, mas saiba que o charme da sua personagem está mesmo é no subtexto - pontuado pela hipocrisia no primeiro momento e na dura auto-avaliação mais a frente!
Obviamente que "Anatomia de um Escândalo" sofre com os clichês típicos de dramas jurídicos e escândalos políticos, podendo se tornar até previsível, mas para os amantes do gênero eu posso garantir que a minissérie é bastante eficaz em proporcionar um ótimo e rápido entretenimento (são apenas 6 episódios) ao mesmo tempo que provoca boas discussões sobre os mecanismos que sustentam os privilégios de poucos e sobre a realidade por trás dos escândalos que frequentemente vemos na tv. Para pensar sem esquecer de se divertir!
Vale o seu play!
Envolvente desde a primeira cena, "Anatomia de uma Queda" levanta os mesmos dilemas que encontramos na série "A Escada" da HBO, porém com o requinte narrativo e estético do melhor do cinema independente francês - não por acaso que o filme chegou no Oscar 2024 como um dos grandes favoritos, levando para casa o prêmio de "Melhor Roteiro Original", além de mais quatro indicações, inclusive a de "Melhor Filme do Ano". E aqui cabe um importante disclaimer: muito provavelmente, "Anatomia de uma Queda" seria o vencedor na categoria "Melhor Filme Internacional" fosse ele o representante da França na disputa, no entanto, por razões puramente politicas isso não aconteceu (a diretora Justine Triet criticou o programa de fomento do governo Macron publicamente, entendeu?). Para quem não sabe, o filme é uma espécie de drama de relações com fortes (e presentes) elementos de thriller psicológico que nos convida a desvendar os segredos de um casal em meio a um crime brutal. Vencedor da Palma de Ouro no Festival de Cannes, do César Awards, do Globo de Ouro e do Prêmio Goya, certamente você está diante de um dos melhores filmes de 2023!
O filme, basicamente, mostra os detalhes de uma investigação depois que um homem é encontrado morto na neve do lado de fora do chalé isolado onde morava com sua esposa Sandra (Sandra Hüller), uma escritora alemã, e seu filho de 11 anos com deficiência visual. Ao se tratar de uma "morte suspeita", é impossível saber ao certo se ele tirou a própria vida ou se existiam motivos para falarmos de assassinato. O fato é que a viúva é indiciada, o que coloca seu próprio filho no meio do conflito. Entre o julgamento e a vida familiar, as dúvidas pesam na relação mãe-filho, já que o jovem é a única testemunha do acontecido. Confira o trailer:
É impressionante como Triet é capaz de tecer uma narrativa tão intrigante e multifacetada, onde nada é o que parece. É sério, a diretora domina sua narrativa de uma forma onde, a cada cena, novas pistas e revelações vão surgindo, desafiando nossas percepções e nos levando a questionar se a culpa é realmente de Sandra. Sabiamente, ela utiliza, com maestria, elementos como flashbacks e muito simbolismo para construir um suspense psicológico envolvente e perturbador que se apoia em inúmeros gatilhos que costumamos a encontrar nos tão falados "true crimes".
A fotografia assinada pelo Simon Beaufils (de "À discrétion"), contribui demais na construção de uma atmosfera sombria e misteriosa - muito referenciado pelo cinema nórdico. Os cenários nevados e a casa isolada nos Alpes criam um clima de isolamento e claustrofobia angustiantes , ao mesmo tempo que os planos mais fechados dão a exata sensação do caos interno que aqueles personagens estão enfrentando. Reparem como a luz natural é utilizada de forma estratégica para destacar os momentos de tensão e de suspense dos flashbacks. As atuações de todo elenco são impecáveis, mas não tem como não destacar o trabalho de Sandra Hüller. Sandra é cirúrgica ao transmitir a ambiguidade dos sentimentos de sua personagem com a mesma capacidade com que explora a fragilidade de sua psique - digno de Oscar!
O fato é que "Anatomia de uma Queda" brinca de forma muito satisfatória com uma morbidez da situação que o próprio roteiro exalta. Se a investigação nos traz uma variedade de registros, sejam os áudios do casal brigando ou o vídeo da polícia reencenando os momentos antes e depois da queda, é possível perceber como a diretora sempre pontua as mais variadas percepções com o intuito de quebrar nossa expectativa e assim nos colocar na posição de julgamento. Veja, Triet sabe mudar de uma perspectiva para a outra com precisão e disposição, mas nunca com a intenção de entregar respostas e sim com o objetivo de nos fazer refletir sobre a natureza humana, sobre a culpa e sobre as fragilidades de uma relação destruída. Dito isso, se você procura um filme que te faça pensar (e muito), além de te deixar intrigado até o final, "Anatomia de uma Queda" é a escolha certa para hoje!
Envolvente desde a primeira cena, "Anatomia de uma Queda" levanta os mesmos dilemas que encontramos na série "A Escada" da HBO, porém com o requinte narrativo e estético do melhor do cinema independente francês - não por acaso que o filme chegou no Oscar 2024 como um dos grandes favoritos, levando para casa o prêmio de "Melhor Roteiro Original", além de mais quatro indicações, inclusive a de "Melhor Filme do Ano". E aqui cabe um importante disclaimer: muito provavelmente, "Anatomia de uma Queda" seria o vencedor na categoria "Melhor Filme Internacional" fosse ele o representante da França na disputa, no entanto, por razões puramente politicas isso não aconteceu (a diretora Justine Triet criticou o programa de fomento do governo Macron publicamente, entendeu?). Para quem não sabe, o filme é uma espécie de drama de relações com fortes (e presentes) elementos de thriller psicológico que nos convida a desvendar os segredos de um casal em meio a um crime brutal. Vencedor da Palma de Ouro no Festival de Cannes, do César Awards, do Globo de Ouro e do Prêmio Goya, certamente você está diante de um dos melhores filmes de 2023!
O filme, basicamente, mostra os detalhes de uma investigação depois que um homem é encontrado morto na neve do lado de fora do chalé isolado onde morava com sua esposa Sandra (Sandra Hüller), uma escritora alemã, e seu filho de 11 anos com deficiência visual. Ao se tratar de uma "morte suspeita", é impossível saber ao certo se ele tirou a própria vida ou se existiam motivos para falarmos de assassinato. O fato é que a viúva é indiciada, o que coloca seu próprio filho no meio do conflito. Entre o julgamento e a vida familiar, as dúvidas pesam na relação mãe-filho, já que o jovem é a única testemunha do acontecido. Confira o trailer:
É impressionante como Triet é capaz de tecer uma narrativa tão intrigante e multifacetada, onde nada é o que parece. É sério, a diretora domina sua narrativa de uma forma onde, a cada cena, novas pistas e revelações vão surgindo, desafiando nossas percepções e nos levando a questionar se a culpa é realmente de Sandra. Sabiamente, ela utiliza, com maestria, elementos como flashbacks e muito simbolismo para construir um suspense psicológico envolvente e perturbador que se apoia em inúmeros gatilhos que costumamos a encontrar nos tão falados "true crimes".
A fotografia assinada pelo Simon Beaufils (de "À discrétion"), contribui demais na construção de uma atmosfera sombria e misteriosa - muito referenciado pelo cinema nórdico. Os cenários nevados e a casa isolada nos Alpes criam um clima de isolamento e claustrofobia angustiantes , ao mesmo tempo que os planos mais fechados dão a exata sensação do caos interno que aqueles personagens estão enfrentando. Reparem como a luz natural é utilizada de forma estratégica para destacar os momentos de tensão e de suspense dos flashbacks. As atuações de todo elenco são impecáveis, mas não tem como não destacar o trabalho de Sandra Hüller. Sandra é cirúrgica ao transmitir a ambiguidade dos sentimentos de sua personagem com a mesma capacidade com que explora a fragilidade de sua psique - digno de Oscar!
O fato é que "Anatomia de uma Queda" brinca de forma muito satisfatória com uma morbidez da situação que o próprio roteiro exalta. Se a investigação nos traz uma variedade de registros, sejam os áudios do casal brigando ou o vídeo da polícia reencenando os momentos antes e depois da queda, é possível perceber como a diretora sempre pontua as mais variadas percepções com o intuito de quebrar nossa expectativa e assim nos colocar na posição de julgamento. Veja, Triet sabe mudar de uma perspectiva para a outra com precisão e disposição, mas nunca com a intenção de entregar respostas e sim com o objetivo de nos fazer refletir sobre a natureza humana, sobre a culpa e sobre as fragilidades de uma relação destruída. Dito isso, se você procura um filme que te faça pensar (e muito), além de te deixar intrigado até o final, "Anatomia de uma Queda" é a escolha certa para hoje!
Desde o primeiro trailer de "Areia Movediça" algo me chamou muito a atenção, embora o "mistério" desse o tom daquela narrativa. Uma minissérie original sueca, produzida pela Netflix, com 6 episódios de 40 minutos cada, baseada em um best-seller, certamente viria com muito potencial!!! O livro de autor Malin Persson Giolito foi publicado em mais de 20 países e foi eleito o melhor romance nórdico de crimes de 2016. Depois de tudo que eu vi e li sobre a minissérie, eu só precisava confirmar se minhas expectativas iriam se comprovar e, posso te garantir: de fato, a história é muito interessante, envolvente e misteriosa! Típico projeto que tem tudo para agradar, mas as pessoas ainda precisam descobrir a enorme qualidade da produção sueca e tudo que envolve essa história.
Então vamos lá: a história é contada em duas linhas temporais diferentes. No presente Maja Norberg, uma jovem e linda estudante pré-vestibular, é acusada de matar seus colegas de escola à tiros, em plena sala de aula. No passado recente, vemos a mesma personagem envolvida com os estudos, se relacionando com a família e com os amigos da melhor forma possível, até que conhece o jovem Sebastian Fagerman - um garoto educado, bem nascido e apaixonado por ela. A primeira dúvida que surge é: como uma jovem tão educada e amorosa foi capaz de matar seus colegas de classe com tanto sangue frio?
Olha, é impossível não se envolver com a história logo de cara, pois "Areia Movediça" trás elementos de dois outros grandes sucessos da Netflix "The Sinner" e "13 Reasons Why"!!! A minissérie transita muito bem no universo dos jovens ao mesmo tempo que trás o mistério da transformação humana e as razões que nos fariam cometer loucuras. Me lembrou quando assisti "Breaking Bad" pela primeira vez - não entendia como um cara como Walter White poderia se transformar em um assassino (ou um traficante) como Heisenberg. Se "Areia Movediça" não tem a genialidade (e profundidade) de "Breaking Bad", merece elogios pela coragem de tocar em assuntos delicados como tiroteio nas escolas, estupro, relacionamento abusivo em vários níveis e o uso de drogas. Tenha em mente que, como o bom cinema sueco exige, é preciso ter estômago!
A Produção é excelente. As locações na Suécia e na França são incríveis. A minissérie é muito bem fotografada, muito bem dirigida e os atores que interpretam a Maja Norberg e o Sebastian Fagerman, respectivamente Hanna Ardéhn e Felix Sandman, dão um verdadeiro show: a maneira como eles vão se desconstruindo durante os episódios vale o "ingresso"! Em muitos momentos o diretor Per-Olav Sørensen usa de técnicas documentais para humanizar ainda mais as situações. Com as câmeras mais soltas e um trabalho genial com o zoom, o diretor trás uma realidade muito interessante para essa ficção que nos faz refletir se aquilo tudo não foi baseado em fatos reais... Poderia!!!
"Areia Movediça" é um ótima surpresa que ainda não caiu nas graças da audiência por puro desconhecimento, pois é impossível não se relacionar com todas as situações que o roteiro propõe!!! Vale muito o play!!!!
Desde o primeiro trailer de "Areia Movediça" algo me chamou muito a atenção, embora o "mistério" desse o tom daquela narrativa. Uma minissérie original sueca, produzida pela Netflix, com 6 episódios de 40 minutos cada, baseada em um best-seller, certamente viria com muito potencial!!! O livro de autor Malin Persson Giolito foi publicado em mais de 20 países e foi eleito o melhor romance nórdico de crimes de 2016. Depois de tudo que eu vi e li sobre a minissérie, eu só precisava confirmar se minhas expectativas iriam se comprovar e, posso te garantir: de fato, a história é muito interessante, envolvente e misteriosa! Típico projeto que tem tudo para agradar, mas as pessoas ainda precisam descobrir a enorme qualidade da produção sueca e tudo que envolve essa história.
Então vamos lá: a história é contada em duas linhas temporais diferentes. No presente Maja Norberg, uma jovem e linda estudante pré-vestibular, é acusada de matar seus colegas de escola à tiros, em plena sala de aula. No passado recente, vemos a mesma personagem envolvida com os estudos, se relacionando com a família e com os amigos da melhor forma possível, até que conhece o jovem Sebastian Fagerman - um garoto educado, bem nascido e apaixonado por ela. A primeira dúvida que surge é: como uma jovem tão educada e amorosa foi capaz de matar seus colegas de classe com tanto sangue frio?
Olha, é impossível não se envolver com a história logo de cara, pois "Areia Movediça" trás elementos de dois outros grandes sucessos da Netflix "The Sinner" e "13 Reasons Why"!!! A minissérie transita muito bem no universo dos jovens ao mesmo tempo que trás o mistério da transformação humana e as razões que nos fariam cometer loucuras. Me lembrou quando assisti "Breaking Bad" pela primeira vez - não entendia como um cara como Walter White poderia se transformar em um assassino (ou um traficante) como Heisenberg. Se "Areia Movediça" não tem a genialidade (e profundidade) de "Breaking Bad", merece elogios pela coragem de tocar em assuntos delicados como tiroteio nas escolas, estupro, relacionamento abusivo em vários níveis e o uso de drogas. Tenha em mente que, como o bom cinema sueco exige, é preciso ter estômago!
A Produção é excelente. As locações na Suécia e na França são incríveis. A minissérie é muito bem fotografada, muito bem dirigida e os atores que interpretam a Maja Norberg e o Sebastian Fagerman, respectivamente Hanna Ardéhn e Felix Sandman, dão um verdadeiro show: a maneira como eles vão se desconstruindo durante os episódios vale o "ingresso"! Em muitos momentos o diretor Per-Olav Sørensen usa de técnicas documentais para humanizar ainda mais as situações. Com as câmeras mais soltas e um trabalho genial com o zoom, o diretor trás uma realidade muito interessante para essa ficção que nos faz refletir se aquilo tudo não foi baseado em fatos reais... Poderia!!!
"Areia Movediça" é um ótima surpresa que ainda não caiu nas graças da audiência por puro desconhecimento, pois é impossível não se relacionar com todas as situações que o roteiro propõe!!! Vale muito o play!!!!
"Argentina, 1985" é, essencialmente, mais um filme de tribunal, porém com dois elementos que fazem toda a diferença na forma como experienciamos a história: primeiro, Ricardo Darín é o protagonista (em uma das melhores performances da sua carreira) e depois, claro, por se basear em um fato histórico marcante, (de certa forma) recente, duro de digerir e impressionante, dentro de seu contexto sócio-político!
A trama acompanha Julio Strassera (Ricardo Darín), Luis Moreno Ocampo (Peter Lanzani) e sua equipe de jovens juristas, heróis improváveis que travaram uma batalha de Davi e Golias na qual, sob ameaças constantes e contra todas as possibilidades, ousaram processar pela via civil o alto-escalão das Forças Armadas da Argentina, fortemente atuante durante a ditadura, uma das mais sangrentas da América do Sul, em uma verdadeira corrida contra o tempo para fazer justiça a todas as vítimas dos militares. Confira o trailer (em espanhol):
Aposta da Argentina para o Oscar 2023, "Argentina, 1985" é uma produção da Amazon Studios com direção de Santiago Mitre (de "A Cordilheira") - o filme é um olhar profundo e emocionante sobre um regime militar que torturou, perseguiu e matou civis sob um discurso autolegitimado de estar enfrentando “insurgentes”, “populistas”, “comunistas”, “subvertidos” – pessoas que, a critério dos militares, seriam contra o progresso do país. O interessante porém, é que o roteiro se apoia no drama que foi responsabilizar os culpados por todos esses crimes em um julgamento na esfera civil e não militar como queriam os oficiais. Esse choque jurídico carrega os mesmos fantasmas de repressão do período que todos querem esquecer e é essa dinâmica que eleva a tensão narrativa e nos provoca uma reflexão muito em alta no nosso país: o quão frágil pode ser uma democracia se não respeitarmos alguns direitos individuais do ser humano.
O roteiro do Mariano Llinás e do próprio Mitre faz algumas escolhas que podem causar algum desconforto para quem procura se aprofundar no tema - ele se apoia muito mais nos depoimentos das vítimas (com um grau de emoção e veracidade impressionantes) do que na construção de uma tese de acusação (mesmo flertando com algumas passagens que sugerem essa investigação). Essa escolha em particular, para uma audiência que não é tão familiarizada com os nomes dos envolvidos nos crimes, nos afasta da verdadeira dimensão que representou o julgamento - embora a conexão com os protagonistas seja imediata, em nenhum momento somos impactados com embates calorosos entre acusação e defesa como em "Os 7 de Chicago", por exemplo.
"Argentina, 1985" se aproveita tanto da química entre Darín e Lanzani, que nem nos damos conta de todos esses deslizes do roteiro - que, aliás, precisa muito da montagem para encaixar uma quantidade enorme de informações essenciais para a construção da história. Nada que estrague a ótima experiência de assistir um filme que foi muito competente em recriar toda uma atmosfera de incertezas e de descobrimentos que funciona como uma espécie de "ajuste de contas" pós-ditadura e que acaba expondo uma história importante, essencial e motivo de orgulho para o povo argentino.
Vale muito o seu play!
"Argentina, 1985" é, essencialmente, mais um filme de tribunal, porém com dois elementos que fazem toda a diferença na forma como experienciamos a história: primeiro, Ricardo Darín é o protagonista (em uma das melhores performances da sua carreira) e depois, claro, por se basear em um fato histórico marcante, (de certa forma) recente, duro de digerir e impressionante, dentro de seu contexto sócio-político!
A trama acompanha Julio Strassera (Ricardo Darín), Luis Moreno Ocampo (Peter Lanzani) e sua equipe de jovens juristas, heróis improváveis que travaram uma batalha de Davi e Golias na qual, sob ameaças constantes e contra todas as possibilidades, ousaram processar pela via civil o alto-escalão das Forças Armadas da Argentina, fortemente atuante durante a ditadura, uma das mais sangrentas da América do Sul, em uma verdadeira corrida contra o tempo para fazer justiça a todas as vítimas dos militares. Confira o trailer (em espanhol):
Aposta da Argentina para o Oscar 2023, "Argentina, 1985" é uma produção da Amazon Studios com direção de Santiago Mitre (de "A Cordilheira") - o filme é um olhar profundo e emocionante sobre um regime militar que torturou, perseguiu e matou civis sob um discurso autolegitimado de estar enfrentando “insurgentes”, “populistas”, “comunistas”, “subvertidos” – pessoas que, a critério dos militares, seriam contra o progresso do país. O interessante porém, é que o roteiro se apoia no drama que foi responsabilizar os culpados por todos esses crimes em um julgamento na esfera civil e não militar como queriam os oficiais. Esse choque jurídico carrega os mesmos fantasmas de repressão do período que todos querem esquecer e é essa dinâmica que eleva a tensão narrativa e nos provoca uma reflexão muito em alta no nosso país: o quão frágil pode ser uma democracia se não respeitarmos alguns direitos individuais do ser humano.
O roteiro do Mariano Llinás e do próprio Mitre faz algumas escolhas que podem causar algum desconforto para quem procura se aprofundar no tema - ele se apoia muito mais nos depoimentos das vítimas (com um grau de emoção e veracidade impressionantes) do que na construção de uma tese de acusação (mesmo flertando com algumas passagens que sugerem essa investigação). Essa escolha em particular, para uma audiência que não é tão familiarizada com os nomes dos envolvidos nos crimes, nos afasta da verdadeira dimensão que representou o julgamento - embora a conexão com os protagonistas seja imediata, em nenhum momento somos impactados com embates calorosos entre acusação e defesa como em "Os 7 de Chicago", por exemplo.
"Argentina, 1985" se aproveita tanto da química entre Darín e Lanzani, que nem nos damos conta de todos esses deslizes do roteiro - que, aliás, precisa muito da montagem para encaixar uma quantidade enorme de informações essenciais para a construção da história. Nada que estrague a ótima experiência de assistir um filme que foi muito competente em recriar toda uma atmosfera de incertezas e de descobrimentos que funciona como uma espécie de "ajuste de contas" pós-ditadura e que acaba expondo uma história importante, essencial e motivo de orgulho para o povo argentino.
Vale muito o seu play!
"Atleta A" é um verdadeiro soco no estômago!
Esse documentário da Netflix, expõe o médico oficial da equipe de ginástica olímpica do EUA, Larry Nassar, que abusou das jovens atletas durante anos, sem que a Federação iniciasse, ao menos, uma investigação depois de denúncias que vinham desde 2015! Olha, além de emocionante, "Atleta A" é desconfortável como duas outras recentes produções: "Jeffrey Epstein: Poder e Perversão"da Netflix e "Deixando Neverland" da HBO. Confira o trailer (em inglês):
O grande mérito do documentário dirigido pela dupla Bonni Cohen e Jon Shenk e talvez a razão pela qual ele seja diferente dos outros dois títulos mencionados, é a forma direta e avassaladora como o roteiro vai ligando os fatos a partir da denúncia de uma potencial medalhista olímpica, Maggie Nichols, que teve seu sonho de disputar uma Olimpíada ceifado por uma Federação hipócrita, mais preocupada com uma medalha de ouro do que com o respeito por suas atletas, adolescentes de 13 anos que foram abusadas sistematicamente por Nassar. Para quem gosta de esporte e, no meu caso, pai de um menina, fica quase impossível não pausar o filme para recuperar o fôlego, dada a potência e coragem dos depoimentos que assistimos - é simplesmente sensacional a forma como uma história complexa foi bem explicada em apenas 1:40.
Não é difícil perceber a sensibilidade com que Cohen e Shenk desenvolveram as histórias de algumas peças importantes dessa denúncia que abalou o esporte americano em 2016 durante as Olimpíadas do Rio de Janeiro. Embora paralelas, seu encontro se transforma em um dos momentos mais emocionantes do filme, onde vemos algumas vítimas do médico lendo seus relatos sobre o trauma e a vergonha que sentiram após os abusos perante uma juíza incrédula. Foram 150 sobreviventes unidas para desmascarar Larry Nassar. O interessante, porém, é que o documentário é capaz de equilibrar perfeitamente a construção de uma investigação jornalística (e não policial) com a própria história do esporte, com alguns métodos (e personagens) que fizeram sucesso na Romênia de Nadia Comaneti e foram importados para transformar os EUA em uma potência do esporte!
"Atleta A", de fato, vale muito a pena, mas se prepare, pois não será um jornada das mais fáceis já que além das investigações sobre abuso de menores, nos deparamos com personagens movidos por poder, dinheiro, fama; elementos que nada tem a ver com os valores do esporte e com o sonho de criança de muitas dessas atletas que queriam representar o seu país nas competições internacionais - e aqui eu cito uma passagem que me marcou muito: existe uma linha muito tênue entre exigência e assédio moral, agora projete isso em uma criança de pouco mais de dez anos e fica fácil entender porquê o assunto mexe tanto com a gente!
Dê o play, mas esteja disposto a viver uma série de sensações, onde muitas delas não serão tão agradáveis!
"Atleta A" é um verdadeiro soco no estômago!
Esse documentário da Netflix, expõe o médico oficial da equipe de ginástica olímpica do EUA, Larry Nassar, que abusou das jovens atletas durante anos, sem que a Federação iniciasse, ao menos, uma investigação depois de denúncias que vinham desde 2015! Olha, além de emocionante, "Atleta A" é desconfortável como duas outras recentes produções: "Jeffrey Epstein: Poder e Perversão"da Netflix e "Deixando Neverland" da HBO. Confira o trailer (em inglês):
O grande mérito do documentário dirigido pela dupla Bonni Cohen e Jon Shenk e talvez a razão pela qual ele seja diferente dos outros dois títulos mencionados, é a forma direta e avassaladora como o roteiro vai ligando os fatos a partir da denúncia de uma potencial medalhista olímpica, Maggie Nichols, que teve seu sonho de disputar uma Olimpíada ceifado por uma Federação hipócrita, mais preocupada com uma medalha de ouro do que com o respeito por suas atletas, adolescentes de 13 anos que foram abusadas sistematicamente por Nassar. Para quem gosta de esporte e, no meu caso, pai de um menina, fica quase impossível não pausar o filme para recuperar o fôlego, dada a potência e coragem dos depoimentos que assistimos - é simplesmente sensacional a forma como uma história complexa foi bem explicada em apenas 1:40.
Não é difícil perceber a sensibilidade com que Cohen e Shenk desenvolveram as histórias de algumas peças importantes dessa denúncia que abalou o esporte americano em 2016 durante as Olimpíadas do Rio de Janeiro. Embora paralelas, seu encontro se transforma em um dos momentos mais emocionantes do filme, onde vemos algumas vítimas do médico lendo seus relatos sobre o trauma e a vergonha que sentiram após os abusos perante uma juíza incrédula. Foram 150 sobreviventes unidas para desmascarar Larry Nassar. O interessante, porém, é que o documentário é capaz de equilibrar perfeitamente a construção de uma investigação jornalística (e não policial) com a própria história do esporte, com alguns métodos (e personagens) que fizeram sucesso na Romênia de Nadia Comaneti e foram importados para transformar os EUA em uma potência do esporte!
"Atleta A", de fato, vale muito a pena, mas se prepare, pois não será um jornada das mais fáceis já que além das investigações sobre abuso de menores, nos deparamos com personagens movidos por poder, dinheiro, fama; elementos que nada tem a ver com os valores do esporte e com o sonho de criança de muitas dessas atletas que queriam representar o seu país nas competições internacionais - e aqui eu cito uma passagem que me marcou muito: existe uma linha muito tênue entre exigência e assédio moral, agora projete isso em uma criança de pouco mais de dez anos e fica fácil entender porquê o assunto mexe tanto com a gente!
Dê o play, mas esteja disposto a viver uma série de sensações, onde muitas delas não serão tão agradáveis!
"Brian Banks" (que no Brasil ganhou o expositivo subtítulo de "Um Sonho Interrompido") é o tipo do filme que desde a primeira cena temos a exata sensação de já conhecermos a história. Mesmo baseado em um caso real, de fato, a trama não tem nada de original, mas nem por isso deixa de ser uma jornada interessante - o filme dirigido pelo Tom Shadyac (do inesquecível "Patch Adams, o Amor é Contagioso") cumpre muito bem o seu papel como entretenimento, sua história é tão revoltante quanto envolvente, mas o tom é leve, gostoso de assistir.
Brian Banks (Aldis Hodge) é um astro de futebol americano universitário que vê seu sonho de jogar na NFL ser interrompido ao ser acusado por um crime que não cometeu. Mesmo com a ausência de provas, Banks é mal orientado e por isso acaba condenado a dez anos de prisão. Já em liberdade condicional, ele tenta retomar sua vida, provar sua inocência e, claro, ir atrás de seus sonhos como esportista. Confira o trailer (em inglês):
A escolha do roteiro escrito pelo Doug Atchison (de "Um Crime Racial") em retratar a triste realidade que um ex-presidiário enfrenta no dia a dia, especialmente sendo negro, funciona apenas como gatilho para nos conectarmos imediatamente ao protagonista. Aqui não temos dúvida que ele é mesmo inocente, que ele é mais uma vítima de racismo, de um sistema corrompido e de uma condenação absurda. O drama não está no crime, mas em como isso deixa marcas em quem foi injustiçado. É por isso que ao discutir esses temas, o filme não pesa na mão - o tom de esperança é tão latente que temos certeza que tudo vai dar certo no final. Isso pode até ser um problema para alguns, mas a ideia é justamente mostrar que a percepção do "copo meio cheio", muitas vezes é o que nos motiva a continuar enfrentando as dificuldades da vida.
Sim, o filme tem um pezinho no "espiritual" de "O Segredo - Ouse Sonhar"ao mesmo tempo em que traz elementos narrativos mais dramáticos dos filmes de tribunal como em "Luta por Justiça" - Morgan Freeman e Greg Kinnear são as personificações dessa dualidade narrativa. Tanto de um lado quanto de outro, você vai se deparar com uma série de clichês, mas a tendência é que isso não te incomode (pelo menos não muito). Veja, quando o protagonista está na pior, na solitária de uma prisão, e surge uma luz (literalmente) dando força para que ele continue acreditando que tudo vai melhorar, tendemos a desacreditar no poder transformador do ser humano como ferramenta de auto-superação, por outro lado nos faz refletir sobre aquelas passagens bem íntimas e solitárias que não podemos (ou sabemos) explicar com tanta exatidão - talvez nesse contexto, como linguagem cinematográfica, o filme até vacile um pouco na sua "forma", mas, sinceramente, no "conteúdo" em si, toda essa alegoria faz muito mais sentido.
"Brian Banks: Um Sonho Interrompido" tenta se equilibrar ao mostrar uma versão "pé no chão" da história com aquela leve inclinação para a "auto-ajuda", no entanto o resultado surpreende pela honestidade com que o roteiro expõe esses lados. Se a produção foge do embate filosófico, certamente ela defende sua versão dos fatos e com isso mergulhamos cada vez mais na dor do protagonista sem se sentir na obrigação de acreditar em tudo que vemos na tela - isso é entretenimento!
Em tempo, o filme tem o futebol americanos como pano bem de fundo - então não espere nenhuma relação mais próxima com o esporte que o fato do protagonista ter tido seu sonho de criança interrompido.
Vale seu play!
"Brian Banks" (que no Brasil ganhou o expositivo subtítulo de "Um Sonho Interrompido") é o tipo do filme que desde a primeira cena temos a exata sensação de já conhecermos a história. Mesmo baseado em um caso real, de fato, a trama não tem nada de original, mas nem por isso deixa de ser uma jornada interessante - o filme dirigido pelo Tom Shadyac (do inesquecível "Patch Adams, o Amor é Contagioso") cumpre muito bem o seu papel como entretenimento, sua história é tão revoltante quanto envolvente, mas o tom é leve, gostoso de assistir.
Brian Banks (Aldis Hodge) é um astro de futebol americano universitário que vê seu sonho de jogar na NFL ser interrompido ao ser acusado por um crime que não cometeu. Mesmo com a ausência de provas, Banks é mal orientado e por isso acaba condenado a dez anos de prisão. Já em liberdade condicional, ele tenta retomar sua vida, provar sua inocência e, claro, ir atrás de seus sonhos como esportista. Confira o trailer (em inglês):
A escolha do roteiro escrito pelo Doug Atchison (de "Um Crime Racial") em retratar a triste realidade que um ex-presidiário enfrenta no dia a dia, especialmente sendo negro, funciona apenas como gatilho para nos conectarmos imediatamente ao protagonista. Aqui não temos dúvida que ele é mesmo inocente, que ele é mais uma vítima de racismo, de um sistema corrompido e de uma condenação absurda. O drama não está no crime, mas em como isso deixa marcas em quem foi injustiçado. É por isso que ao discutir esses temas, o filme não pesa na mão - o tom de esperança é tão latente que temos certeza que tudo vai dar certo no final. Isso pode até ser um problema para alguns, mas a ideia é justamente mostrar que a percepção do "copo meio cheio", muitas vezes é o que nos motiva a continuar enfrentando as dificuldades da vida.
Sim, o filme tem um pezinho no "espiritual" de "O Segredo - Ouse Sonhar"ao mesmo tempo em que traz elementos narrativos mais dramáticos dos filmes de tribunal como em "Luta por Justiça" - Morgan Freeman e Greg Kinnear são as personificações dessa dualidade narrativa. Tanto de um lado quanto de outro, você vai se deparar com uma série de clichês, mas a tendência é que isso não te incomode (pelo menos não muito). Veja, quando o protagonista está na pior, na solitária de uma prisão, e surge uma luz (literalmente) dando força para que ele continue acreditando que tudo vai melhorar, tendemos a desacreditar no poder transformador do ser humano como ferramenta de auto-superação, por outro lado nos faz refletir sobre aquelas passagens bem íntimas e solitárias que não podemos (ou sabemos) explicar com tanta exatidão - talvez nesse contexto, como linguagem cinematográfica, o filme até vacile um pouco na sua "forma", mas, sinceramente, no "conteúdo" em si, toda essa alegoria faz muito mais sentido.
"Brian Banks: Um Sonho Interrompido" tenta se equilibrar ao mostrar uma versão "pé no chão" da história com aquela leve inclinação para a "auto-ajuda", no entanto o resultado surpreende pela honestidade com que o roteiro expõe esses lados. Se a produção foge do embate filosófico, certamente ela defende sua versão dos fatos e com isso mergulhamos cada vez mais na dor do protagonista sem se sentir na obrigação de acreditar em tudo que vemos na tela - isso é entretenimento!
Em tempo, o filme tem o futebol americanos como pano bem de fundo - então não espere nenhuma relação mais próxima com o esporte que o fato do protagonista ter tido seu sonho de criança interrompido.
Vale seu play!
Se Vince Gilligan (de "Breaking Bad") tivesse dirigido "The Sinner", o resultado fatalmente seria algo como o que encontramos em "Candy" (que no Brasil ganhou o sugestivo, para não dizer expositivo, subtítulo de "Uma História de Paixão e Crime"). Além de ter a mesma protagonista, Jessica Biel, a minissérie do Hulu mistura muitos conceitos (do visual ao narrativo) de Gilligan para contar a história real de uma dona de casa comum que certo dia cometeu um crime terrivelmente bárbaro nada condizente com sua personalidade.
Baseado no livro "Evidence of Love", escrito por Jim Atkinson, "Candy" acompanha Candy Montgomery (Jessica Biel), uma dona de casa do Texas que parecia ter a vida perfeita: um marido amoroso com um bom emprego, filhos lindos e uma casa maravilhosa no subúrbio. Mas então o que a teria levado a matar sua amiga da igreja, Betty Gore (Melanie Lynskey), com um machado? Confira o trailer:
Seguindo uma linha menos dramática, "Candy" talvez fique no exato meio termo entre "The Thing About Pam" (também do Star+) e "The Undoing" (da HBO). O fato da história se passar em uma cidade pacata do Texas, no inicio dos anos 80, naturalmente já cria uma atmosfera bastante estereotipada da sociedade interiorana americana - porém, esse elemento exterior mais colorido esconde uma complexidade bastante interessante sobre os personagens, cheio de camadas, atormentados por aquela vida cotidiana sem expectativas, que certamente nos remete ao monocromático, ao escuro até. Essa dualidade é o ponto alto da minissérie e claramente bebe na mesma fonte de "Breaking Bad" - o desenho de som, os enquadramentos criativos (quase sempre brincado com as distorções tanto nos planos abertos como nos fechados) e o estilo de montagem em retrospectiva, fazem parte da identidade de Gilligan e foram perfeitamente absorvidas pelos quatro diretores que comandam os 5 episódios.
Desde a belíssima abertura (indicada ao Emmy de 2022) já temos a exata noção do emaranhado de situações que vamos precisar desconstruir para entender as motivações de Candy. Se inicialmente tudo parece um pouco fora de propósito, rapidamente o roteiro (e a montagem) trata de ir colocando as peças nos devidos lugares (olha o estilo Gilligan aqui de novo). Em nenhum momento você terá a sensação de estar perdido ou terá dificuldade de entender os personagens envolvidos no crime, não é esse o propósito da série. Nós sabemos quem matou Betty logo de cara, só não sabemos a razão e o que de fato aconteceu. O roteiro trata esse mistério com inteligência, com a direção dando pistas a todo momento (e que lá na frente farão todo o sentido) - ninguém rouba no jogo, então repare em todas as reações dos personagens desde o primeiro episódio.
Jessica Biel, Melanie Lynskey, Pablo Schreiber (como Allan, marido de Betty) e Timothy Simons (como Pat, marido de Candy) estão simplesmente perfeitos - o tom da performance de cada um deles briga sim com o conceito visual da minissérie e isso causa um certo descompasso, um proposital incomodo. Chega a ser surpreendente ninguém do elenco ter sido lembrado no Emmy, especialmente Lynskey. Ao melhor estilo "true crime", "Candy" pode parecer cadenciado demais em sua narrativa, mas essa dinâmica se justifica pela necessidade de apresentação dos personagens e do ambiente em que estão inseridos para que tudo faça mais sentido ao final da história - essa escolha pode cansar alguns, mas eu posso atestar que faz parte da experiência que, na minha opinião, entra naquela lista das melhores de 2022 até aqui.
Vale muito a pena!
PS: A HBO lançará em 2022 sua versão para a mesma história - "Love and Death" também será inspirada no livro "Evidence of Love: A True Story of Passion and Death in the Suburbs", além de contar com os artigos do "Texas Monthly". O elenco também promete: Elizabeth Olsen será Candy Montgomery e para completar teremos Jesse Plemons, Lily Rabe, Patrick Fugit, Keir Gilchrist, Elizabeth Marvel, Tom Pelphrey e Krysten Ritter.
Se Vince Gilligan (de "Breaking Bad") tivesse dirigido "The Sinner", o resultado fatalmente seria algo como o que encontramos em "Candy" (que no Brasil ganhou o sugestivo, para não dizer expositivo, subtítulo de "Uma História de Paixão e Crime"). Além de ter a mesma protagonista, Jessica Biel, a minissérie do Hulu mistura muitos conceitos (do visual ao narrativo) de Gilligan para contar a história real de uma dona de casa comum que certo dia cometeu um crime terrivelmente bárbaro nada condizente com sua personalidade.
Baseado no livro "Evidence of Love", escrito por Jim Atkinson, "Candy" acompanha Candy Montgomery (Jessica Biel), uma dona de casa do Texas que parecia ter a vida perfeita: um marido amoroso com um bom emprego, filhos lindos e uma casa maravilhosa no subúrbio. Mas então o que a teria levado a matar sua amiga da igreja, Betty Gore (Melanie Lynskey), com um machado? Confira o trailer:
Seguindo uma linha menos dramática, "Candy" talvez fique no exato meio termo entre "The Thing About Pam" (também do Star+) e "The Undoing" (da HBO). O fato da história se passar em uma cidade pacata do Texas, no inicio dos anos 80, naturalmente já cria uma atmosfera bastante estereotipada da sociedade interiorana americana - porém, esse elemento exterior mais colorido esconde uma complexidade bastante interessante sobre os personagens, cheio de camadas, atormentados por aquela vida cotidiana sem expectativas, que certamente nos remete ao monocromático, ao escuro até. Essa dualidade é o ponto alto da minissérie e claramente bebe na mesma fonte de "Breaking Bad" - o desenho de som, os enquadramentos criativos (quase sempre brincado com as distorções tanto nos planos abertos como nos fechados) e o estilo de montagem em retrospectiva, fazem parte da identidade de Gilligan e foram perfeitamente absorvidas pelos quatro diretores que comandam os 5 episódios.
Desde a belíssima abertura (indicada ao Emmy de 2022) já temos a exata noção do emaranhado de situações que vamos precisar desconstruir para entender as motivações de Candy. Se inicialmente tudo parece um pouco fora de propósito, rapidamente o roteiro (e a montagem) trata de ir colocando as peças nos devidos lugares (olha o estilo Gilligan aqui de novo). Em nenhum momento você terá a sensação de estar perdido ou terá dificuldade de entender os personagens envolvidos no crime, não é esse o propósito da série. Nós sabemos quem matou Betty logo de cara, só não sabemos a razão e o que de fato aconteceu. O roteiro trata esse mistério com inteligência, com a direção dando pistas a todo momento (e que lá na frente farão todo o sentido) - ninguém rouba no jogo, então repare em todas as reações dos personagens desde o primeiro episódio.
Jessica Biel, Melanie Lynskey, Pablo Schreiber (como Allan, marido de Betty) e Timothy Simons (como Pat, marido de Candy) estão simplesmente perfeitos - o tom da performance de cada um deles briga sim com o conceito visual da minissérie e isso causa um certo descompasso, um proposital incomodo. Chega a ser surpreendente ninguém do elenco ter sido lembrado no Emmy, especialmente Lynskey. Ao melhor estilo "true crime", "Candy" pode parecer cadenciado demais em sua narrativa, mas essa dinâmica se justifica pela necessidade de apresentação dos personagens e do ambiente em que estão inseridos para que tudo faça mais sentido ao final da história - essa escolha pode cansar alguns, mas eu posso atestar que faz parte da experiência que, na minha opinião, entra naquela lista das melhores de 2022 até aqui.
Vale muito a pena!
PS: A HBO lançará em 2022 sua versão para a mesma história - "Love and Death" também será inspirada no livro "Evidence of Love: A True Story of Passion and Death in the Suburbs", além de contar com os artigos do "Texas Monthly". O elenco também promete: Elizabeth Olsen será Candy Montgomery e para completar teremos Jesse Plemons, Lily Rabe, Patrick Fugit, Keir Gilchrist, Elizabeth Marvel, Tom Pelphrey e Krysten Ritter.
"Cenas de um Homicídio" (ou "American Murder: The Family Next Door" - título original) é brutal! Não visualmente, pois nada do que assistimos na tela nos choca tanto quanto aquilo que não vemos - e esse talvez seja o maior mérito desse documentário que mais parece uma obra de ficção graças a uma construção narrativa impressionante (e marcante)!
O filme acompanha a investigação do desaparecimento de uma mulher grávida, Shanann Watts, e de suas duas filhas: Bella de 4 anos e Celeste de 3. O principal suspeito: o marido. O problema é que tudo levava a crer que o casal, mesmo com alguns problemas, tinham uma vida tranquila, eram felizes e pareciam construir laços familiares cada vez mais fortes. Porém, o documentário, pouco a pouco, vai nos colocando em uma delicada posição, já que a investigação passa a mostrar alguns indícios difíceis de acreditar, transformando uma relação aparentemente normal em uma trama cheia de mentiras, segredos e traições. confira o trailer:
Para quem gosta do estilo "True Crime", "Cenas de um Homicídio" é uma ótima opção, pois não tem enrolação, não se trata de um crime tão complicado (embora possa parecer), porém é extremamente chocante em vários aspectos - e aqui a diretora Jenny Popplewell merece todo mérito: ela "brinca" com nossa incredulidade durante os dois primeiros atos e no momento mais marcante de uma possível confissão, ela ainda nos coloca uma pulga atrás da orelha!
Olha, esse documentário é uma ótima pedida, mas vai te incomodar, pode acreditar!
A partir de cenas de arquivo, áudios gravados e vídeos (e fotos) postadas nas redes sociais, Popplewell reconstrói a linha temporal do desaparecimento de Shanann com uma precisão impressionante - é como se as câmeras estivessem lá desde o inicio do drama da família Watts e já soubesse exatamente o que captar e como nos provocar emocionalmente (por isso isso minha observação sobre parecer uma obra de ficção). A montagem do Simon Barker, um especialista do gênero, é incrível, já que é justamente ela que vai nos guiando e nos entregando as peças desse quebra-cabeça sem esconder nada (ou pelo menos, quase nada).
Agora, é preciso dizer que "Cenas de um Homicídio" não é daqueles documentários cheios de reviravoltas surpreendentes ou investigações profundas que sempre acham uma testemunha escondida em algum lugar - a dúvida está, unicamente, nas costas do marido de Shanann, Chris. Não que seja um problema, mas realmente a narrativa perde um pouco do elemento surpresa e o drama parece ir perdendo sustentação com tempo. Um detalhe interessante é que a conclusão do caso foi rápida: 3 ou 4 dias, só que durante a investigação vemos muitas gravações antigas da vida pessoal do casal, principalmente da esposa desaparecida, mostrando uma personalidade forte, muitas vezes controladora e não muito, digamos, educada com quem não concordasse com ela. Isso foi o suficiente para que Chris acabasse se tornando, aos olhos de muitos, uma "vítima" de Shanann e aqui eu sugiro uma reflexão: reparem como julgamos os outros sem saber de toda a história, seja pela aparência ou pela forma que uma pessoa lida com suas emoções!
Para finalizar, eu gostaria de dar outro conselho: não busque nenhuma informação sobre o caso antes de assistir o filme - essa escolha vai impactar diretamente na sua experiência perante todas as revelações que você vai encontrar no documentário! "Cenas de um Homicídio" se aproxima mais de "The Staircase" do que "O Desaparecimento de Madeleine McCann", mas como as duas referências, já pode ser considerável imperdível! Vale seu play!
"Cenas de um Homicídio" (ou "American Murder: The Family Next Door" - título original) é brutal! Não visualmente, pois nada do que assistimos na tela nos choca tanto quanto aquilo que não vemos - e esse talvez seja o maior mérito desse documentário que mais parece uma obra de ficção graças a uma construção narrativa impressionante (e marcante)!
O filme acompanha a investigação do desaparecimento de uma mulher grávida, Shanann Watts, e de suas duas filhas: Bella de 4 anos e Celeste de 3. O principal suspeito: o marido. O problema é que tudo levava a crer que o casal, mesmo com alguns problemas, tinham uma vida tranquila, eram felizes e pareciam construir laços familiares cada vez mais fortes. Porém, o documentário, pouco a pouco, vai nos colocando em uma delicada posição, já que a investigação passa a mostrar alguns indícios difíceis de acreditar, transformando uma relação aparentemente normal em uma trama cheia de mentiras, segredos e traições. confira o trailer:
Para quem gosta do estilo "True Crime", "Cenas de um Homicídio" é uma ótima opção, pois não tem enrolação, não se trata de um crime tão complicado (embora possa parecer), porém é extremamente chocante em vários aspectos - e aqui a diretora Jenny Popplewell merece todo mérito: ela "brinca" com nossa incredulidade durante os dois primeiros atos e no momento mais marcante de uma possível confissão, ela ainda nos coloca uma pulga atrás da orelha!
Olha, esse documentário é uma ótima pedida, mas vai te incomodar, pode acreditar!
A partir de cenas de arquivo, áudios gravados e vídeos (e fotos) postadas nas redes sociais, Popplewell reconstrói a linha temporal do desaparecimento de Shanann com uma precisão impressionante - é como se as câmeras estivessem lá desde o inicio do drama da família Watts e já soubesse exatamente o que captar e como nos provocar emocionalmente (por isso isso minha observação sobre parecer uma obra de ficção). A montagem do Simon Barker, um especialista do gênero, é incrível, já que é justamente ela que vai nos guiando e nos entregando as peças desse quebra-cabeça sem esconder nada (ou pelo menos, quase nada).
Agora, é preciso dizer que "Cenas de um Homicídio" não é daqueles documentários cheios de reviravoltas surpreendentes ou investigações profundas que sempre acham uma testemunha escondida em algum lugar - a dúvida está, unicamente, nas costas do marido de Shanann, Chris. Não que seja um problema, mas realmente a narrativa perde um pouco do elemento surpresa e o drama parece ir perdendo sustentação com tempo. Um detalhe interessante é que a conclusão do caso foi rápida: 3 ou 4 dias, só que durante a investigação vemos muitas gravações antigas da vida pessoal do casal, principalmente da esposa desaparecida, mostrando uma personalidade forte, muitas vezes controladora e não muito, digamos, educada com quem não concordasse com ela. Isso foi o suficiente para que Chris acabasse se tornando, aos olhos de muitos, uma "vítima" de Shanann e aqui eu sugiro uma reflexão: reparem como julgamos os outros sem saber de toda a história, seja pela aparência ou pela forma que uma pessoa lida com suas emoções!
Para finalizar, eu gostaria de dar outro conselho: não busque nenhuma informação sobre o caso antes de assistir o filme - essa escolha vai impactar diretamente na sua experiência perante todas as revelações que você vai encontrar no documentário! "Cenas de um Homicídio" se aproxima mais de "The Staircase" do que "O Desaparecimento de Madeleine McCann", mas como as duas referências, já pode ser considerável imperdível! Vale seu play!
"Clemência: A História de Cyntoia Brown" é mais uma empreitada da Netflix que segue a linha "Making a Murderer", mas que, embora seja um ótimo documentário, não surpreende com alguma reviravolta que nos faça perder o sentido, como ficou tão característico nesse tipo de produção que nos apresenta detalhes sobre personagens envolvidos em crimes reais. É claro que o fato de ser um filme e não uma série, ter pouco mais de 90 minutos, interfere demais na narrativa - não há tempo para um aprofundamento maior, mas cá entre nós: Cyntoia Brownnão me pareceu ter a "força" de um Steven Avery ou de um Robert Durst de "The Jinx" e isso fica muito claro durante os "saltos temporais" entre a sua prisão e as razões que levaram até sua tentativa de obter clemência do governador do Tennessee.
Veja bem: certa noite, Cyntoia, uma garota negra de 16 anos, conheceu um homem branco chamado Johnny Allen, no estacionamento de uma lanchonete, próximo a casa do seu então namorado: o traficante e cafetão, Kut-Throat. Depois de um bate-papo rápido, Allen perguntou se Cyntoia estava pronta para "ação". Ao responder afirmativamente, eles acertaram os valores e foram para a casa dele. Acontece que, em algum momento após a relação sexual, Cyntoia Brown pegou a arma que estava em sua bolsa e disparou contra Johnny Allen pelas costas. Ele morreu na hora e Cyntoia ainda levou 172 dólares da sua carteira, duas armas e a caminhonete do rapaz. Ao ser detida, Cyntoia confessou o crime, mas declarou ter agido em legítima defesa - o que, claro, não colou para ninguém! Confira o trailer (em inglês):
Quando vemos uma adolescente sendo julgada como adulta e depois condenada à prisão perpétua por homicídio (e mais 3 crimes), imediatamente criamos uma certa empatia pela personagem, como ser humano, porém nos afastamos desse sentimento quando refletimos sobre a versão que Cyntoia tanto defende e que não parece nada plausível dada as provas periciais - o fato dela nunca ter demonstrado arrependimento algum, certamente, também colabora para esse distanciamento. O interessante é que o roteiro do diretor Daniel H. Birman não se propõe a defender a versão de Cyntoia e sim apresentar a tese de que circunstâncias sociais e fisiológicas a levaram cometer o crime! É um documentário curioso nesse sentido, diferente do que estamos acostumados, e por isso me agradou tanto, mesmo sendo óbvio e pouco surpreendente, vale a pena conhecer essa história e os desdobramentos que Birman nos conta.
Em 2011, o diretor Daniel H. Birman já havia produzido um documentário sobre o caso, chamado: "Me Facing Life: Cyntoia's Story", até que 9 anos depois, ele retorna ao tema para nos apresentar alguns fatos inéditos, com várias imagens exclusivas e algumas informações que na época do julgamento pareciam improváveis, mas que agora tem uma força reveladora e passível de mudar o rumo do caso. Fica claro que o diretor defende a tese pessoal de que Cyntoia deveria ser libertada imediatamente e que sua condenação não existiria se o julgamento tivesse ocorrido nos tempos atuais. O roteiro não se preocupa em mostrar o outro lado da história, ele é um exercício escancarado de argumentação - inclusive se apoiando em uma campanha liderada por vários famosos, de 2017, a favor de Cyntoia.
Apesar de "Clemência: A História de Cyntoia Brown" ter se concentrando na dinâmica legal do caso e não nas investigações do assassinato, usando e abusando de cenas de audiências e de conversas entre advogados e especialistas, Burman nos convida para uma reflexão muito mais do ponto de vista moral do que pela discussão dos fatos em si. Quando ele explora que a garota possui alguma deficiência intelectual ou um transtorno de bipolaridade, que seu histórico familiar foi marcada pelo alcoolismo e pela violência, ele deixa de lado a razão pela qual Cyntoia Brown atirou em Johnny Allen, para defender que essa ação foi um reflexo natural da sua experiência como ser humano até ali - o advogado de Cyntoia chega a comentar: "Matar alguém é errado, e ninguém contesta isso. No entanto, o que leva uma menina de 16 anos a cometer um assassinato como esse?"
Sim, nos vemos refletindo sobre os pontos levantados em defesa de Cyntoia, mas em nenhum momento somos levados ao outro lado da história e isso incomoda um pouco. Em compensação somos convidados a ver a história de uma outra forma, que para alguns fará mais sentido do que para outros, mas o fato é que a construção narrativa do documentário trabalha como um quebra-cabeça de fácil resolução, basta nos fazer acreditar naquela tese! Para quem gosta do gênero, será mais um bom filme que merece ser assistido; só não espere o improvável porque o objetivo não é esse e desde o começo sabemos qual é!
"Clemência: A História de Cyntoia Brown" é mais uma empreitada da Netflix que segue a linha "Making a Murderer", mas que, embora seja um ótimo documentário, não surpreende com alguma reviravolta que nos faça perder o sentido, como ficou tão característico nesse tipo de produção que nos apresenta detalhes sobre personagens envolvidos em crimes reais. É claro que o fato de ser um filme e não uma série, ter pouco mais de 90 minutos, interfere demais na narrativa - não há tempo para um aprofundamento maior, mas cá entre nós: Cyntoia Brownnão me pareceu ter a "força" de um Steven Avery ou de um Robert Durst de "The Jinx" e isso fica muito claro durante os "saltos temporais" entre a sua prisão e as razões que levaram até sua tentativa de obter clemência do governador do Tennessee.
Veja bem: certa noite, Cyntoia, uma garota negra de 16 anos, conheceu um homem branco chamado Johnny Allen, no estacionamento de uma lanchonete, próximo a casa do seu então namorado: o traficante e cafetão, Kut-Throat. Depois de um bate-papo rápido, Allen perguntou se Cyntoia estava pronta para "ação". Ao responder afirmativamente, eles acertaram os valores e foram para a casa dele. Acontece que, em algum momento após a relação sexual, Cyntoia Brown pegou a arma que estava em sua bolsa e disparou contra Johnny Allen pelas costas. Ele morreu na hora e Cyntoia ainda levou 172 dólares da sua carteira, duas armas e a caminhonete do rapaz. Ao ser detida, Cyntoia confessou o crime, mas declarou ter agido em legítima defesa - o que, claro, não colou para ninguém! Confira o trailer (em inglês):
Quando vemos uma adolescente sendo julgada como adulta e depois condenada à prisão perpétua por homicídio (e mais 3 crimes), imediatamente criamos uma certa empatia pela personagem, como ser humano, porém nos afastamos desse sentimento quando refletimos sobre a versão que Cyntoia tanto defende e que não parece nada plausível dada as provas periciais - o fato dela nunca ter demonstrado arrependimento algum, certamente, também colabora para esse distanciamento. O interessante é que o roteiro do diretor Daniel H. Birman não se propõe a defender a versão de Cyntoia e sim apresentar a tese de que circunstâncias sociais e fisiológicas a levaram cometer o crime! É um documentário curioso nesse sentido, diferente do que estamos acostumados, e por isso me agradou tanto, mesmo sendo óbvio e pouco surpreendente, vale a pena conhecer essa história e os desdobramentos que Birman nos conta.
Em 2011, o diretor Daniel H. Birman já havia produzido um documentário sobre o caso, chamado: "Me Facing Life: Cyntoia's Story", até que 9 anos depois, ele retorna ao tema para nos apresentar alguns fatos inéditos, com várias imagens exclusivas e algumas informações que na época do julgamento pareciam improváveis, mas que agora tem uma força reveladora e passível de mudar o rumo do caso. Fica claro que o diretor defende a tese pessoal de que Cyntoia deveria ser libertada imediatamente e que sua condenação não existiria se o julgamento tivesse ocorrido nos tempos atuais. O roteiro não se preocupa em mostrar o outro lado da história, ele é um exercício escancarado de argumentação - inclusive se apoiando em uma campanha liderada por vários famosos, de 2017, a favor de Cyntoia.
Apesar de "Clemência: A História de Cyntoia Brown" ter se concentrando na dinâmica legal do caso e não nas investigações do assassinato, usando e abusando de cenas de audiências e de conversas entre advogados e especialistas, Burman nos convida para uma reflexão muito mais do ponto de vista moral do que pela discussão dos fatos em si. Quando ele explora que a garota possui alguma deficiência intelectual ou um transtorno de bipolaridade, que seu histórico familiar foi marcada pelo alcoolismo e pela violência, ele deixa de lado a razão pela qual Cyntoia Brown atirou em Johnny Allen, para defender que essa ação foi um reflexo natural da sua experiência como ser humano até ali - o advogado de Cyntoia chega a comentar: "Matar alguém é errado, e ninguém contesta isso. No entanto, o que leva uma menina de 16 anos a cometer um assassinato como esse?"
Sim, nos vemos refletindo sobre os pontos levantados em defesa de Cyntoia, mas em nenhum momento somos levados ao outro lado da história e isso incomoda um pouco. Em compensação somos convidados a ver a história de uma outra forma, que para alguns fará mais sentido do que para outros, mas o fato é que a construção narrativa do documentário trabalha como um quebra-cabeça de fácil resolução, basta nos fazer acreditar naquela tese! Para quem gosta do gênero, será mais um bom filme que merece ser assistido; só não espere o improvável porque o objetivo não é esse e desde o começo sabemos qual é!
Antes de mais nada é preciso dizer que a história de "Crimes de Família" é infinitamente mais potente do que o filme que vemos na tela - não que o filme seja ruim, mesmo porque ele não é, mas na minha opinião, sua previsibilidade pode prejudicar demais a experiência de quem assiste, já que as escolhas narrativas, tanto do roteiro quanto da direção, são falhas - eles fazem de tudo para criar uma expectativa por um "plot twist inesquecível" que na verdade nem precisava!
Talvez o fato do cinema argentino carregar o peso de nos ter apresentado muitos filmes surpreendentes, tenha interferido no trabalho do diretor (e co-roteirista) Sebastián Schindel. "Crimes de Família" conta a história real de dois crimes que aconteceram praticamente ao mesmo tempo, em uma mesma família de classe média/alta de Buenos Aires. Em um deles, o filho do casal Alícia (Cecília Roth) e Ignácio (Miguel Angel Sola) é acusado de estuprar e agredir sua ex-esposa. No outro, a empregada desse mesmo casal é presa acusada de cometer um homicídio e precisa enfrentar um difícil julgamento. Confira o trailer:
Embora contadas paralelamente, as duas histórias, obviamente, tem alguns elementos em comum que por si só já nos manteriam grudados no filme para que pudéssemos entender seu desdobramento, acontece que Schindel preferiu transformar uma história chocante, quase documental, em um thriller de mistério policial e para isso ele usou de uma gramática cinematográfica que notadamente funciona, só que a entrega final vai se enfraquecendo ao longo dos atos (de tão infantil que é)! Então, se você assumir que o "caminho" é muito mais interessante que o "fim" é bem provável que você vá amar o filme, mas se você cair na expectativa que o próprio diretor te sugere, a decepção pode ser grande, já que o elo entre esses dois crimes é "mais do mesmo"!
Certamente "Crimes de Família" não tem a força de narrativa e muito menos a elegância estética de "Em Defesa de Jacob", mas a produção da AppleTV+ vai servir como referência se você gosta desse estilo de trama. No final das contas eu gostei, mas nem de longe será um filme inesquecível. Vale como uma ótima "sessão da tarde" e por algumas passagens que vamos analisar abaixo!
Logo no inicio, mesmo nos causando uma certa estranheza, já percebemos que a quebra da linearidade da narrativa, vai nos criar aquela sensação incômoda do "o que aconteceu?" e esse mérito precisa ser valorizado. A questão é que o roteiro tem elementos mais críticos e que não precisava dessa dinâmica - o que eu quero dizer é que o drama existencial da mãe, Alícia, poderia ser um caminho muito mais eficiente do que o mistério investigativo escolhido. Repare: são dois crimes, um envolvendo o filho adulto, mimado e problemático do casal rico e o outro, uma empregada doméstica semi-analfabeta, pobre e introspectiva - a questão chave da trama é que a resposta da família à cada um dos "criminosos" é completamente diferente e tendenciosa! Ao discutir assuntos como: aborto, abuso sexual, drogas, alcoolismo, abandono, violência contra a mulher, racismo, preconceito, "Crimes de Família" cutuca feridas profundas da sociedade moderna, mas acaba transitando na superficialidade de cada tema por se preocupar muito mais com os crimes em si do que com os motivos e reflexos deles.
Cecília Roth poderia ser uma espécie de Isabelle Huppert de "Elle", não pela similaridade das personagens, mas pela profundidade das discussões e das decisões que ambas precisam tomar perante sua história, mas, mais uma vez, transita na inconstância da escolha do gênero. Quando provocada a mergulhar nas dores mais intimas, Roth dá um show: quando conversa com o marido sobre ajudar mais uma vez o filho problemático ou quando precisa tomar uma decisão que vai completamente contra o que acreditava ser o melhor para sua família, são dois ótimos exemplos. Outro destaque do elenco é a empregada Gladys, interpretada pela atriz Yanina Ávila - essa sim me impressionou durante os quase 100 minutos de filme. Benjamín Amadeo, o filho Daniel, é pouco aproveitado, mas o depoimento que faz no seu julgamento também merece reconhecimento!
Outro fator que o roteiro apresenta, mas que é pouco desenvolvido, diz respeito as várias formas de lidar com maternidade: se com Alícia vemos a incondicionalidade ou um predatório amor de mãe, até irracional, com Gladys temos um lado mais sombrio, marcado pelo passado e completamente inseguro, despreparado. Já a ex-esposa de Daniel, Marcela (Sofía Gala), encontramos a mulher em transformação, que encontra força para lutar e buscar uma vida melhor - tudo isso com o reflexo da convivência social entre filhos, parceiros e pais. Mais uma vez, quando Sebastián Schindel foca na ação e não na discussão entre essas diferenças, perdemos uma ótima oportunidade de ir um pouco além! Uma pena!
Fiz questão de exaltar tantos pontos positivos até para justificar o inicio dessa análise: "Crimes de Família" tem uma excelente história nas mãos e que vai tocar na alma feminina de uma forma mais cruel, mesmo com todas essas escolhas narrativas menos sensíveis. Poderia ser, de fato, um grande filme, mas acabou se tornando um bom entretenimento, com algum mistério, nada de suspense (como foi vendido pela Netflix) e com um drama mais forte do que será percebido!
Vale o play, mas não será uma unanimidade!
Antes de mais nada é preciso dizer que a história de "Crimes de Família" é infinitamente mais potente do que o filme que vemos na tela - não que o filme seja ruim, mesmo porque ele não é, mas na minha opinião, sua previsibilidade pode prejudicar demais a experiência de quem assiste, já que as escolhas narrativas, tanto do roteiro quanto da direção, são falhas - eles fazem de tudo para criar uma expectativa por um "plot twist inesquecível" que na verdade nem precisava!
Talvez o fato do cinema argentino carregar o peso de nos ter apresentado muitos filmes surpreendentes, tenha interferido no trabalho do diretor (e co-roteirista) Sebastián Schindel. "Crimes de Família" conta a história real de dois crimes que aconteceram praticamente ao mesmo tempo, em uma mesma família de classe média/alta de Buenos Aires. Em um deles, o filho do casal Alícia (Cecília Roth) e Ignácio (Miguel Angel Sola) é acusado de estuprar e agredir sua ex-esposa. No outro, a empregada desse mesmo casal é presa acusada de cometer um homicídio e precisa enfrentar um difícil julgamento. Confira o trailer:
Embora contadas paralelamente, as duas histórias, obviamente, tem alguns elementos em comum que por si só já nos manteriam grudados no filme para que pudéssemos entender seu desdobramento, acontece que Schindel preferiu transformar uma história chocante, quase documental, em um thriller de mistério policial e para isso ele usou de uma gramática cinematográfica que notadamente funciona, só que a entrega final vai se enfraquecendo ao longo dos atos (de tão infantil que é)! Então, se você assumir que o "caminho" é muito mais interessante que o "fim" é bem provável que você vá amar o filme, mas se você cair na expectativa que o próprio diretor te sugere, a decepção pode ser grande, já que o elo entre esses dois crimes é "mais do mesmo"!
Certamente "Crimes de Família" não tem a força de narrativa e muito menos a elegância estética de "Em Defesa de Jacob", mas a produção da AppleTV+ vai servir como referência se você gosta desse estilo de trama. No final das contas eu gostei, mas nem de longe será um filme inesquecível. Vale como uma ótima "sessão da tarde" e por algumas passagens que vamos analisar abaixo!
Logo no inicio, mesmo nos causando uma certa estranheza, já percebemos que a quebra da linearidade da narrativa, vai nos criar aquela sensação incômoda do "o que aconteceu?" e esse mérito precisa ser valorizado. A questão é que o roteiro tem elementos mais críticos e que não precisava dessa dinâmica - o que eu quero dizer é que o drama existencial da mãe, Alícia, poderia ser um caminho muito mais eficiente do que o mistério investigativo escolhido. Repare: são dois crimes, um envolvendo o filho adulto, mimado e problemático do casal rico e o outro, uma empregada doméstica semi-analfabeta, pobre e introspectiva - a questão chave da trama é que a resposta da família à cada um dos "criminosos" é completamente diferente e tendenciosa! Ao discutir assuntos como: aborto, abuso sexual, drogas, alcoolismo, abandono, violência contra a mulher, racismo, preconceito, "Crimes de Família" cutuca feridas profundas da sociedade moderna, mas acaba transitando na superficialidade de cada tema por se preocupar muito mais com os crimes em si do que com os motivos e reflexos deles.
Cecília Roth poderia ser uma espécie de Isabelle Huppert de "Elle", não pela similaridade das personagens, mas pela profundidade das discussões e das decisões que ambas precisam tomar perante sua história, mas, mais uma vez, transita na inconstância da escolha do gênero. Quando provocada a mergulhar nas dores mais intimas, Roth dá um show: quando conversa com o marido sobre ajudar mais uma vez o filho problemático ou quando precisa tomar uma decisão que vai completamente contra o que acreditava ser o melhor para sua família, são dois ótimos exemplos. Outro destaque do elenco é a empregada Gladys, interpretada pela atriz Yanina Ávila - essa sim me impressionou durante os quase 100 minutos de filme. Benjamín Amadeo, o filho Daniel, é pouco aproveitado, mas o depoimento que faz no seu julgamento também merece reconhecimento!
Outro fator que o roteiro apresenta, mas que é pouco desenvolvido, diz respeito as várias formas de lidar com maternidade: se com Alícia vemos a incondicionalidade ou um predatório amor de mãe, até irracional, com Gladys temos um lado mais sombrio, marcado pelo passado e completamente inseguro, despreparado. Já a ex-esposa de Daniel, Marcela (Sofía Gala), encontramos a mulher em transformação, que encontra força para lutar e buscar uma vida melhor - tudo isso com o reflexo da convivência social entre filhos, parceiros e pais. Mais uma vez, quando Sebastián Schindel foca na ação e não na discussão entre essas diferenças, perdemos uma ótima oportunidade de ir um pouco além! Uma pena!
Fiz questão de exaltar tantos pontos positivos até para justificar o inicio dessa análise: "Crimes de Família" tem uma excelente história nas mãos e que vai tocar na alma feminina de uma forma mais cruel, mesmo com todas essas escolhas narrativas menos sensíveis. Poderia ser, de fato, um grande filme, mas acabou se tornando um bom entretenimento, com algum mistério, nada de suspense (como foi vendido pela Netflix) e com um drama mais forte do que será percebido!
Vale o play, mas não será uma unanimidade!
Na linha de "Luta por Justiça" e de "Olhos que condenam", a história de "Crown Heights" é mais uma daquelas difíceis de digerir onde questionamos a racionalidade e os valores do ser humano sem o menor receio de ser injusto, afinal, o que vemos em pouco mais de 90 minutos é um retrato de uma sociedade racista e egocêntrica incapaz de olhar o outro através de suas próprias inseguranças e vulnerabilidades.
Quando Colin Warner (LaKeith Stanfield) é injustamente condenado por homicídio, seu melhor amigo, Carl King (Nnamdi Asomugha), dedica sua vida para provar a inocência de Colin. Adaptado de "This American Life", esta é a incrível história real sobre uma angustiante busca pela justiça por mais de 20 anos. Confira o trailer (em inglês):
Chancelado pelo prêmio de "Melhor Filme Dramático" pela audiência no Festival de Sundance em 2017, o filme dirigido pelo Matt Ruskin (muito conhecido por ter produzido o excelente "Conexão Escolbar") procura alinhar a vida de dois personagens na busca pela verdade. Se de uma lado temos o ponto de vista de quem foi condenado e sofre o dia a dia de uma prisão, do outro temos a resiliência de quem acredita que ainda é possível fazer justiça dentro de uma sociedade preconceituosa e elitista. E embora o roteiro do próprio Ruskin retrate a fragilidade do sistema penal e carcerário americano, é inegável que é a jornada dos protagonistas nos move, nos emociona e, principalmente, nos faz refletir!
Sem a preocupação de colocar em dúvida a inocência de Colin Warner, "Crown Heights" se esforça é para retratar a realidade, considerando que o acusado está longe de ser um modelo irretocável de caráter. Warner parece ser uma boa pessoa se analisado pelo âmbito familiar, porém suas atitudes (e cada um é convidado ao julgamento unicamente por elas) também expõem suas falhas - o interessante dessa construção cuidadosa do personagem, é que o roteiro vai nos apresentando diversas camadas, humanizando Warner, e provando que nem sempre existem respostas 100% seguras para muitos atos quando eles são fortemente provocados pelo meio em que seus atores estão inseridos.
Como o recorte da vida de Warner apresentado no filme é bastante extenso, é natural percebermos que a narrativa se apoia na edição bem realizada pelo, duas vezes vencedor do Oscar (das quatro indicações que recebeu), Joe Hutshing. Sim, Hutshing (de "JFK") fragmenta a jornada; mas é extremamente competente em unir duas histórias com a mesma precisão com que pontua os problemas sociais e as inúmeras falhas do sistema sem que um assunto atropele o outro. Nesse ponto, aliás, o diretor Matt Ruskin também brilha - é impressionante como ele conduz os personagens, como eles vão se transformando e ganhando (ou perdendo) vida durante a progressão da história.
"Crown Heights" é muito envolvente, mas pouco confortável. Olhando em retrospectiva, chega a ser surpreendente que o filme não tenha ganhado os holofotes na temporada de premiação daquele ano, seja pelo roteiro muito bem escrito, pela direção surpreendente de Ruskin, mas, principalmente, pelas performances de LaKeith Stanfield, de Nnamdi Asomugha e até de Natalie Paul (como a futura esposa de Warner, Antoinette).
Por tudo isso e muito mais, "Crown Heights" vale muito o seu play!
Na linha de "Luta por Justiça" e de "Olhos que condenam", a história de "Crown Heights" é mais uma daquelas difíceis de digerir onde questionamos a racionalidade e os valores do ser humano sem o menor receio de ser injusto, afinal, o que vemos em pouco mais de 90 minutos é um retrato de uma sociedade racista e egocêntrica incapaz de olhar o outro através de suas próprias inseguranças e vulnerabilidades.
Quando Colin Warner (LaKeith Stanfield) é injustamente condenado por homicídio, seu melhor amigo, Carl King (Nnamdi Asomugha), dedica sua vida para provar a inocência de Colin. Adaptado de "This American Life", esta é a incrível história real sobre uma angustiante busca pela justiça por mais de 20 anos. Confira o trailer (em inglês):
Chancelado pelo prêmio de "Melhor Filme Dramático" pela audiência no Festival de Sundance em 2017, o filme dirigido pelo Matt Ruskin (muito conhecido por ter produzido o excelente "Conexão Escolbar") procura alinhar a vida de dois personagens na busca pela verdade. Se de uma lado temos o ponto de vista de quem foi condenado e sofre o dia a dia de uma prisão, do outro temos a resiliência de quem acredita que ainda é possível fazer justiça dentro de uma sociedade preconceituosa e elitista. E embora o roteiro do próprio Ruskin retrate a fragilidade do sistema penal e carcerário americano, é inegável que é a jornada dos protagonistas nos move, nos emociona e, principalmente, nos faz refletir!
Sem a preocupação de colocar em dúvida a inocência de Colin Warner, "Crown Heights" se esforça é para retratar a realidade, considerando que o acusado está longe de ser um modelo irretocável de caráter. Warner parece ser uma boa pessoa se analisado pelo âmbito familiar, porém suas atitudes (e cada um é convidado ao julgamento unicamente por elas) também expõem suas falhas - o interessante dessa construção cuidadosa do personagem, é que o roteiro vai nos apresentando diversas camadas, humanizando Warner, e provando que nem sempre existem respostas 100% seguras para muitos atos quando eles são fortemente provocados pelo meio em que seus atores estão inseridos.
Como o recorte da vida de Warner apresentado no filme é bastante extenso, é natural percebermos que a narrativa se apoia na edição bem realizada pelo, duas vezes vencedor do Oscar (das quatro indicações que recebeu), Joe Hutshing. Sim, Hutshing (de "JFK") fragmenta a jornada; mas é extremamente competente em unir duas histórias com a mesma precisão com que pontua os problemas sociais e as inúmeras falhas do sistema sem que um assunto atropele o outro. Nesse ponto, aliás, o diretor Matt Ruskin também brilha - é impressionante como ele conduz os personagens, como eles vão se transformando e ganhando (ou perdendo) vida durante a progressão da história.
"Crown Heights" é muito envolvente, mas pouco confortável. Olhando em retrospectiva, chega a ser surpreendente que o filme não tenha ganhado os holofotes na temporada de premiação daquele ano, seja pelo roteiro muito bem escrito, pela direção surpreendente de Ruskin, mas, principalmente, pelas performances de LaKeith Stanfield, de Nnamdi Asomugha e até de Natalie Paul (como a futura esposa de Warner, Antoinette).
Por tudo isso e muito mais, "Crown Heights" vale muito o seu play!
Essa é mais uma comédia inglesa, daquelas gostosas de assistir, bem ao estilo de "Um Lugar Chamado Notting Hill" ou "Yesterday" - o diferencial aqui, é que a história de "David contra os Bancos" é baseada em fatos "quase" reais. No filme dirigido pelo Chris Foggin (de "Um Natal Improvável") entendemos a importância histórica de retratar a jornada de resiliência de um homem comum em face de desafios extraordinários, no caso o sistema econômico britânico, mas sem esquecer daquilo que nos mantém sorrindo durante os momentos de dificuldade: o amor! Sim, a receita "Notting Hill" está em cada detalhe do roteiro e mesmo supondo como será o final, fica impossível não se envolver com aqueles personagens!
O filme, basicamente, narra a trajetória do empresário idealista Dave Fishwick (Rory Kinnear), proprietário de uma empresa de vans na pequena cidade de Burnley na Inglaterra, que decide lutar contra um sistema financeiro secular para conseguir uma licença e assim abrir seu próprio banco com o intuito de ajudar sua comunidade, sem cobrar taxas abusivas, em um período pós-recessão. Para isso ele conta como a ajuda do jovem advogado de Londres, Huch (Joel Fry), que acredita estar perdendo seu tempo até que se vê envolvido com a sobrinha de Dave, Alexandra (Phoebe Dynevor). Confira o trailer:
Se em "O Próprio Enterro" acompanhamos uma complexa batalha “David x Golias corporativo" com um toque de "Erin Brockovich", aqui temos o mesmo principio, porém em um tom infinitamente mais leve.Veja, as críticas contra o sistema econômico e a política elitista dos bancos britânicos estão lá. O desafio pela busca de prosperidade em pequenas comunidades que se organizam independente das dificuldades geográficas ou de segregação também. Mas talvez o fato que mais nos conecta com a história é o de sabermos que existe um homem (podemos dizer, milionário) que quer criar um banco para simplesmente fomentar o progresso de sua comunidade sem pedir absolutamente nada em troca! Essa foi a escolha mais sábia de Foggin e de seu roteirista Piers Ashworth (de "Fisherman's Friends: One and All"): realizar um filme positivo e simples em todos os sentidos, que não busca grandes coisas além de uma história feliz que agrade todos os públicos.
Quando o enredo resolve acompanhar a vida desse visionário empreendedor, imediatamente criamos empatia por Dave e pela sua causa - praticamente partimos para a luta contra as barreiras confortáveis do Sistema em uma jornada emocional e cativante repleta de aprendizado e superação. Se o alívio emocional vem da relação "(im)provável" de seu advogado com sua sobrinha, pode ter certeza que é pela seu envolvimento com a música que encontramos o combustível para seguir em clima de "juntos vamos conseguir". Pelas mãos do produtor e compositor Christian Henson partimos de um pub/karaokê onde parte da comunidade se reune todas as noites até seu ápice narrativo do terceiro ato com um grande espetáculo ao som da banda "Def Leppard" que, inexplicavelmente, multiplica toda aaquela noção de comunidade que o filme construiu nos seus primeiros atos - mas tudo bem, faz parte do estilo "Notting Hill" de mover a história que, no final das contas, se amarra de forma coerente, mesmo que sobrem passagens sem muito sentido e que só ocorrem para nos levar ao ponto que Foggin deslumbrou - e até que funciona com certa competência!
O fato é que "Bank of Dave" (no original) traz o ingênuo e o inofensivo para sua narrativa maniqueísta, buscando puramente o entretenimento e a sensação de que, com resiliência e muita vontade, tudo é possível. Mesmo sabendo que a política, em suas diversas formas e ideologias, está sempre presente nos diálogos e em vários momentos da trama, posso te garantir que a experiência está longe de ser profunda ou crítica demais, deixando apenas nas entrelinhas um material interessante para discussão que, mal colocado, poderia ter acabado com o que o filme tem de melhor: sua leveza chancelada pelo fato de ser uma história real e que merecia ser contada.
Vale muito o seu play!
Essa é mais uma comédia inglesa, daquelas gostosas de assistir, bem ao estilo de "Um Lugar Chamado Notting Hill" ou "Yesterday" - o diferencial aqui, é que a história de "David contra os Bancos" é baseada em fatos "quase" reais. No filme dirigido pelo Chris Foggin (de "Um Natal Improvável") entendemos a importância histórica de retratar a jornada de resiliência de um homem comum em face de desafios extraordinários, no caso o sistema econômico britânico, mas sem esquecer daquilo que nos mantém sorrindo durante os momentos de dificuldade: o amor! Sim, a receita "Notting Hill" está em cada detalhe do roteiro e mesmo supondo como será o final, fica impossível não se envolver com aqueles personagens!
O filme, basicamente, narra a trajetória do empresário idealista Dave Fishwick (Rory Kinnear), proprietário de uma empresa de vans na pequena cidade de Burnley na Inglaterra, que decide lutar contra um sistema financeiro secular para conseguir uma licença e assim abrir seu próprio banco com o intuito de ajudar sua comunidade, sem cobrar taxas abusivas, em um período pós-recessão. Para isso ele conta como a ajuda do jovem advogado de Londres, Huch (Joel Fry), que acredita estar perdendo seu tempo até que se vê envolvido com a sobrinha de Dave, Alexandra (Phoebe Dynevor). Confira o trailer:
Se em "O Próprio Enterro" acompanhamos uma complexa batalha “David x Golias corporativo" com um toque de "Erin Brockovich", aqui temos o mesmo principio, porém em um tom infinitamente mais leve.Veja, as críticas contra o sistema econômico e a política elitista dos bancos britânicos estão lá. O desafio pela busca de prosperidade em pequenas comunidades que se organizam independente das dificuldades geográficas ou de segregação também. Mas talvez o fato que mais nos conecta com a história é o de sabermos que existe um homem (podemos dizer, milionário) que quer criar um banco para simplesmente fomentar o progresso de sua comunidade sem pedir absolutamente nada em troca! Essa foi a escolha mais sábia de Foggin e de seu roteirista Piers Ashworth (de "Fisherman's Friends: One and All"): realizar um filme positivo e simples em todos os sentidos, que não busca grandes coisas além de uma história feliz que agrade todos os públicos.
Quando o enredo resolve acompanhar a vida desse visionário empreendedor, imediatamente criamos empatia por Dave e pela sua causa - praticamente partimos para a luta contra as barreiras confortáveis do Sistema em uma jornada emocional e cativante repleta de aprendizado e superação. Se o alívio emocional vem da relação "(im)provável" de seu advogado com sua sobrinha, pode ter certeza que é pela seu envolvimento com a música que encontramos o combustível para seguir em clima de "juntos vamos conseguir". Pelas mãos do produtor e compositor Christian Henson partimos de um pub/karaokê onde parte da comunidade se reune todas as noites até seu ápice narrativo do terceiro ato com um grande espetáculo ao som da banda "Def Leppard" que, inexplicavelmente, multiplica toda aaquela noção de comunidade que o filme construiu nos seus primeiros atos - mas tudo bem, faz parte do estilo "Notting Hill" de mover a história que, no final das contas, se amarra de forma coerente, mesmo que sobrem passagens sem muito sentido e que só ocorrem para nos levar ao ponto que Foggin deslumbrou - e até que funciona com certa competência!
O fato é que "Bank of Dave" (no original) traz o ingênuo e o inofensivo para sua narrativa maniqueísta, buscando puramente o entretenimento e a sensação de que, com resiliência e muita vontade, tudo é possível. Mesmo sabendo que a política, em suas diversas formas e ideologias, está sempre presente nos diálogos e em vários momentos da trama, posso te garantir que a experiência está longe de ser profunda ou crítica demais, deixando apenas nas entrelinhas um material interessante para discussão que, mal colocado, poderia ter acabado com o que o filme tem de melhor: sua leveza chancelada pelo fato de ser uma história real e que merecia ser contada.
Vale muito o seu play!