Talvez o mais curioso de assistir "Despertar Mortal" seja o de ter a nítida sensação de que as peças não estão se encaixando. A própria diretora Skye Borgman (de "A Garota da Foto") entende que esse é seu maior trunfo narrativo e é com base nele que ela vai costurando a trama sem a menor pretensão de nos entregar todas as respostas, mesmo que superficialmente essa pareça ser sua intenção. Veja, temos o corpo, temos a arma, temos até a confissão do assassino, mas em nenhum momento encontramos "o motivo" - e é aí que surge uma teoria tão "absurda" quanto a do caso Arne Johnson, que alegou ter tido uma possessão demoníaca no ato do crime (a história foi retratada no terceiro capitulo da franquia "Invocação do Mal").
"Dead Asleep" (no original) acompanha e compartilha imagens exclusivas do caso de Randy Herman Jr., um jovem condenado pelo assassinato de sua melhor amiga, Brooke Preaston, que ele diz ter cometido durante uma crise de sonambulismo quando ambos moravam juntos em West Palm Beach, na Flórida, em 2017. Confira o trailer (em inglês):
Randy Herman Jr. é de uma cidade rural chamada Laceyville. Ele morou a vida inteira com sua mãe e com sua irmã depois que os pais se divorciaram. Embora Randy tenha um histórico de, na época da faculdade, beber muito e usar drogas de forma recreativa, ele nunca se envolveu em maiores problemas - podemos afirmar ainda que ele era o tipo de garoto que todos gostavam pela sua forma educada e divertida com que tratava as pessoas. Dito isso, entramos em uma questão delicada para esse tipo de conteúdo e que Borgman soube equilibrar perfeitamente: quanto de holofote é aceitável dar ao assassino (confesso) para ele contar sua versão?
Nesse caso especifico, todos os pré-conceitos sobre o assunto parecem se perder quando Randy dá seu primeiro depoimento no documentário - e se você acha que eu posso estar exagerando, até a mãe da vitima, demorou a acreditar que ele pudesse ter sido o responsável pelamorte de sua filha. Para ela não fazia o menor sentido - e vários outros depoimentos só confirmam essa percepção amorosa sobre dele. É aí que o documentário começa a desconstruir o personagem, tentando entender o que poderia ter motivado o crime. Misturando cenas de depoimentos com pessoas ligadas a ele na época, como a irmã de Brooke e um amigo bem próximo dos dois, com análises dos mais diversos especialistas (de forenses à especialistas em sono), "Despertar Mortal" tenta cobrir todas as lacunas e validar (ou destruir) a tese de que o sonambulismo tenha sido a causa do surto que vitimou a jovem.
De fato, são muitas nuances sobre a personalidade de Randy - o que dá um aspecto mais complexo ao caso, no entanto é inegável que ao final da jornada, tenhamos a sensação de que ainda faltaram algumas explicações. Isso é proposital, faz parte da proposta conceitual de Borgman - é como se ela apostasse que a história possa ter mais desdobramentos no futuro e que aí sim, ao cobrir esses novos fatos, sua obra mudaria de patamar para um "true crime" surpreendente e cheio de reviravoltas. Aliás, não espere reviravoltas em "Despertar Mortal", mesmo com uma informação surpreendente no final do primeiro episódio, não é nada que possa impactar na experiência como um todo - aqui, como no júri, o que vale é se convencer se Randy seria capaz de ter cometido o crime e por qual motivo; nada mais!
Vale seu play!
Talvez o mais curioso de assistir "Despertar Mortal" seja o de ter a nítida sensação de que as peças não estão se encaixando. A própria diretora Skye Borgman (de "A Garota da Foto") entende que esse é seu maior trunfo narrativo e é com base nele que ela vai costurando a trama sem a menor pretensão de nos entregar todas as respostas, mesmo que superficialmente essa pareça ser sua intenção. Veja, temos o corpo, temos a arma, temos até a confissão do assassino, mas em nenhum momento encontramos "o motivo" - e é aí que surge uma teoria tão "absurda" quanto a do caso Arne Johnson, que alegou ter tido uma possessão demoníaca no ato do crime (a história foi retratada no terceiro capitulo da franquia "Invocação do Mal").
"Dead Asleep" (no original) acompanha e compartilha imagens exclusivas do caso de Randy Herman Jr., um jovem condenado pelo assassinato de sua melhor amiga, Brooke Preaston, que ele diz ter cometido durante uma crise de sonambulismo quando ambos moravam juntos em West Palm Beach, na Flórida, em 2017. Confira o trailer (em inglês):
Randy Herman Jr. é de uma cidade rural chamada Laceyville. Ele morou a vida inteira com sua mãe e com sua irmã depois que os pais se divorciaram. Embora Randy tenha um histórico de, na época da faculdade, beber muito e usar drogas de forma recreativa, ele nunca se envolveu em maiores problemas - podemos afirmar ainda que ele era o tipo de garoto que todos gostavam pela sua forma educada e divertida com que tratava as pessoas. Dito isso, entramos em uma questão delicada para esse tipo de conteúdo e que Borgman soube equilibrar perfeitamente: quanto de holofote é aceitável dar ao assassino (confesso) para ele contar sua versão?
Nesse caso especifico, todos os pré-conceitos sobre o assunto parecem se perder quando Randy dá seu primeiro depoimento no documentário - e se você acha que eu posso estar exagerando, até a mãe da vitima, demorou a acreditar que ele pudesse ter sido o responsável pelamorte de sua filha. Para ela não fazia o menor sentido - e vários outros depoimentos só confirmam essa percepção amorosa sobre dele. É aí que o documentário começa a desconstruir o personagem, tentando entender o que poderia ter motivado o crime. Misturando cenas de depoimentos com pessoas ligadas a ele na época, como a irmã de Brooke e um amigo bem próximo dos dois, com análises dos mais diversos especialistas (de forenses à especialistas em sono), "Despertar Mortal" tenta cobrir todas as lacunas e validar (ou destruir) a tese de que o sonambulismo tenha sido a causa do surto que vitimou a jovem.
De fato, são muitas nuances sobre a personalidade de Randy - o que dá um aspecto mais complexo ao caso, no entanto é inegável que ao final da jornada, tenhamos a sensação de que ainda faltaram algumas explicações. Isso é proposital, faz parte da proposta conceitual de Borgman - é como se ela apostasse que a história possa ter mais desdobramentos no futuro e que aí sim, ao cobrir esses novos fatos, sua obra mudaria de patamar para um "true crime" surpreendente e cheio de reviravoltas. Aliás, não espere reviravoltas em "Despertar Mortal", mesmo com uma informação surpreendente no final do primeiro episódio, não é nada que possa impactar na experiência como um todo - aqui, como no júri, o que vale é se convencer se Randy seria capaz de ter cometido o crime e por qual motivo; nada mais!
Vale seu play!
Essa minissérie vai mexer com suas emoções!
"Dopesick" é um termo usado para determinar que uma pessoa está "dopada", impossibilitada de continuar a ser quem ela era se não estiver sob efeito de um determinado "remédio" - que nesse caso foi a origem da maior epidemia de opioides que a sociedade americana já enfrentou. Aliás, antes de assistir essa minissérie de ficção do Star+ que é baseada em fatos reais, eu recomendo veemente que você assista um documentário em quatro partes da Netflix chamado "Prescrição Fatal" - ele vai servir como uma profunda e emocional introdução ao problema criado pela farmacêutica Purdue ao colocar o OxyContin nas farmácias, pelo olhar de um pai que perdeu o seu filho para o vício enquanto a família Sackler enriquecia loucamente.
Voltando à "Dopesick", em oito episódios você vai acompanhar o surgimento do OxyContin e como esse opioide analgésico extremamente potente afetou a vida de milhares de pessoas, em diferentes contextos familiares, profissionais e sociais. Desde os bastidores da Purdue Pharma onde as decisões corporativas e politicas ajudaram a disseminar "legalmente" uma droga com potencial de vício comparado ao da heroína, até uma comunidade da Virgínia que foi praticamente devastada pelo uso (e abuso) do remédio, passando pelos corredores do DEA e do sistema jurídico americano que travavam uma luta desleal para impedir que mais mortes acontecessem. Confira o trailer:
Antes de mais nada é preciso que se diga que "Dopesick" é um misto de ficção e realidade, ou seja, o pano de fundo é sim um recorte real, comovente e absurdo, do que aconteceu nos Estados Unidos, porém a grande maioria dos personagens (mesmo que inspirados em pessoais reais) são, de fato, apenas personagens de ficção. Essa escolha, obviamente, tem uma função dramática que precisa ser digerida com o tempo - inicialmente, a verdadeira dinâmica corporativa que assistimos de dentro da Purdue Pharma e os constrangedores embates entre os Sacklers, soam mais interessantes do que os dramas familiares e pessoais dos moradores da região dos Apalaches, na Virginia, onde vivem o Dr. Samuel Finnix (Michael Keaton) e Betsy Mallum (Kaitlyn Dever). Aliás, alguns plots desenvolvidos pelo criador e roteirista Danny Strong são até descartáveis - a relação homossexual de Betsy, embora faça sentido dentro de um determinado contexto, não empolga.
O roteiro, inclusive, consegue equilibrar muito bem um grande desafio que no livro "Dopesick: Dealers, Doctors, and the Drug Company that Addicted America" da autora Beth Macy, soa mais orgânico: a quebra temporal na construção da trama. Ao entender a dinâmica narrativa, onde a história passeia entre o presente, o passado e o futuro, temos a exata sensação sobre a complexidade dos fatos - o curioso (e genial) é que esse "vai e vem" nos permite experimentar emoções completamente distintas, mas que ao se complementarem, fortalece o convite para uma imersão extremamente profunda e empática pela jornada. Mesmo com um número enorme de personagens, nos importamos com muitos deles da mesma forma que execramos alguns outros.
Aliás, o elenco é um dos pontos mais altos de "Dopesick" - entre as categorias envolvendo atores e atrizes no Emmy 2022, foram 6 indicações, com Keaton saindo vencedor), Isso mostra o valor dos personagens secundários para a evolução da história - ainda que alguns tenham sido “sub aproveitados”, ter Rosario Dawson como agente da DEA, Bridget Meyer; Peter Sarsgaard e John Hoogenakker como os procuradores Rick Mountcastle e Randy Ramseyer, respectivamente; é um luxo. Will Poulter, que interpretou o jovem e sonhador vendedor, Billy Cutler, também merece elogios.
Com um visual belíssimo, uma trilha sonora incrível e um time de diretores muito competente, que contou até com Barry Levinson (de "O Mago das Mentiras"), "Dopesick" já pode ser considerada uma das melhores minisséries dos últimos anos, que não à toa recebeu 14 indicações ao Emmy 2002 e mais 40 em outras premiações importantes como do "Screen Actors Guild", "Globo de Ouro" e "Television Critics Association".
“Dopesick” tem tudo que uma minissérie precisa para ser inesquecível: uma produção irretocável, personagens muito bem construídos, um elenco acima da média e, claro, uma história impactante que nos faz refletir e olhar o ser humano de uma forma diferente (não necessariamente boa para todos).
Vale muito o seu play!
Essa minissérie vai mexer com suas emoções!
"Dopesick" é um termo usado para determinar que uma pessoa está "dopada", impossibilitada de continuar a ser quem ela era se não estiver sob efeito de um determinado "remédio" - que nesse caso foi a origem da maior epidemia de opioides que a sociedade americana já enfrentou. Aliás, antes de assistir essa minissérie de ficção do Star+ que é baseada em fatos reais, eu recomendo veemente que você assista um documentário em quatro partes da Netflix chamado "Prescrição Fatal" - ele vai servir como uma profunda e emocional introdução ao problema criado pela farmacêutica Purdue ao colocar o OxyContin nas farmácias, pelo olhar de um pai que perdeu o seu filho para o vício enquanto a família Sackler enriquecia loucamente.
Voltando à "Dopesick", em oito episódios você vai acompanhar o surgimento do OxyContin e como esse opioide analgésico extremamente potente afetou a vida de milhares de pessoas, em diferentes contextos familiares, profissionais e sociais. Desde os bastidores da Purdue Pharma onde as decisões corporativas e politicas ajudaram a disseminar "legalmente" uma droga com potencial de vício comparado ao da heroína, até uma comunidade da Virgínia que foi praticamente devastada pelo uso (e abuso) do remédio, passando pelos corredores do DEA e do sistema jurídico americano que travavam uma luta desleal para impedir que mais mortes acontecessem. Confira o trailer:
Antes de mais nada é preciso que se diga que "Dopesick" é um misto de ficção e realidade, ou seja, o pano de fundo é sim um recorte real, comovente e absurdo, do que aconteceu nos Estados Unidos, porém a grande maioria dos personagens (mesmo que inspirados em pessoais reais) são, de fato, apenas personagens de ficção. Essa escolha, obviamente, tem uma função dramática que precisa ser digerida com o tempo - inicialmente, a verdadeira dinâmica corporativa que assistimos de dentro da Purdue Pharma e os constrangedores embates entre os Sacklers, soam mais interessantes do que os dramas familiares e pessoais dos moradores da região dos Apalaches, na Virginia, onde vivem o Dr. Samuel Finnix (Michael Keaton) e Betsy Mallum (Kaitlyn Dever). Aliás, alguns plots desenvolvidos pelo criador e roteirista Danny Strong são até descartáveis - a relação homossexual de Betsy, embora faça sentido dentro de um determinado contexto, não empolga.
O roteiro, inclusive, consegue equilibrar muito bem um grande desafio que no livro "Dopesick: Dealers, Doctors, and the Drug Company that Addicted America" da autora Beth Macy, soa mais orgânico: a quebra temporal na construção da trama. Ao entender a dinâmica narrativa, onde a história passeia entre o presente, o passado e o futuro, temos a exata sensação sobre a complexidade dos fatos - o curioso (e genial) é que esse "vai e vem" nos permite experimentar emoções completamente distintas, mas que ao se complementarem, fortalece o convite para uma imersão extremamente profunda e empática pela jornada. Mesmo com um número enorme de personagens, nos importamos com muitos deles da mesma forma que execramos alguns outros.
Aliás, o elenco é um dos pontos mais altos de "Dopesick" - entre as categorias envolvendo atores e atrizes no Emmy 2022, foram 6 indicações, com Keaton saindo vencedor), Isso mostra o valor dos personagens secundários para a evolução da história - ainda que alguns tenham sido “sub aproveitados”, ter Rosario Dawson como agente da DEA, Bridget Meyer; Peter Sarsgaard e John Hoogenakker como os procuradores Rick Mountcastle e Randy Ramseyer, respectivamente; é um luxo. Will Poulter, que interpretou o jovem e sonhador vendedor, Billy Cutler, também merece elogios.
Com um visual belíssimo, uma trilha sonora incrível e um time de diretores muito competente, que contou até com Barry Levinson (de "O Mago das Mentiras"), "Dopesick" já pode ser considerada uma das melhores minisséries dos últimos anos, que não à toa recebeu 14 indicações ao Emmy 2002 e mais 40 em outras premiações importantes como do "Screen Actors Guild", "Globo de Ouro" e "Television Critics Association".
“Dopesick” tem tudo que uma minissérie precisa para ser inesquecível: uma produção irretocável, personagens muito bem construídos, um elenco acima da média e, claro, uma história impactante que nos faz refletir e olhar o ser humano de uma forma diferente (não necessariamente boa para todos).
Vale muito o seu play!
Você vai se surpreender com a qualidade narrativa e visual de "Doze Jurados"! Se em um primeiro momento a série da Één, emissora pública belga (mas que ganhou notoriedade ao ser distribuída mundialmente pela Netflix), soa como mais um drama jurídico, em poucos episódios você vai entender que além de uma crítica contundente sobre o sistema judicial da Bélgica, a história ainda expõe um elemento crucial que vai te provocar muitas reflexões: a parcialidade de um ser humano despreparado para uma determinada função. "De Twaalf" (no original) se diferencia pela forma como apresenta um estudo profundo do impacto emocional e psicológico de um julgamento de grande repercussão, tanto sobre os envolvidos diretamente no caso quanto (e especialmente) sobre os jurados. Criada por Sanne Nuyens, Bert Van Dael e Roel Mondelaers, a série traz uma abordagem até certo ponto inovadora, deixando os aspectos legais do julgamento apenas como complemento da narrativa para priorizar a vida pessoal dos jurados, cujas histórias individuais acabam influenciando suas percepções e decisões. "Doze Jurados" é uma trama complexa que vai além dos estereótipos das séries jurídicas tradicionais, oferecendo uma experiência realmente densa e emocionalmente impactante.
A premissa gira em torno de um julgamento que atrai grande atenção da mídia na Bélgica: Frie Palmers (Maaike Cafmeyer) é uma mulher divorciada acusada de dois assassinatos - da filha pequena e de sua melhor amiga. A série acompanha o desenrolar do processo do ponto de vista dos doze jurados que precisam decidir o destino de Frie. No entanto, enquanto o caso é exposto no tribunal, cada jurado traz para a corte suas próprias bagagens emocionais e questões pessoais, que acabam moldando a forma como cada um interpreta as evidências e os depoimentos das testemunhas, criando assim uma dinâmica capaz de destruir o que mais deveria importar: a busca pela verdade! Confira o trailer (com legendas em inglês):
Produzido pelaEyeworks Film, "Doze Jurados" brilha ao construir uma narrativa realmente envolvente que dá voz aos jurados, provocando um desconforto de fato angustiante ao expor que um julgamento não é apenas sobre a culpa ou a inocência, mas também sobre como a vida de cada um é afetada ao longo do processo. A série destaca o impacto que é ter que decidir o futuro de outra pessoa, mostrando como a vida dos jurados começam a se entrelaçar com o julgamento, trazendo para os holofotes dilemas pessoais, traumas e segredos que, intercaladas com o drama jurídico em si, cria uma jornada verdadeiramente rica em nuances como dificilmente encontramos no gênero. Veja, a roteiro mistura com sabedoria a tensão das cenas de tribunal com o desenvolvimento profundo dos personagens - especialmente nos flashbacks dos personagens. Essa proposta conceitual é eficaz em manter o ritmo da narrativa e entregar um certo tom de mistério em torno de todos os envolvidos no caso.
A direção de Wouter Bouvijn (de "1985") é precisa, com uma estética fria e claustrofóbica ao ponto de refletir o peso do julgamento com a mesma força que as tensões internas dos personagens - a câmera de Bouvijn tem um movimento quase documental, um identidade do cinema independente europeu e um timinig perfeito na construção do drama. Repare também como a fotografia utiliza bem o contraste entre os ambientes do tribunal, austeros e impessoais, com os momentos de intimidade dos jurados fora da corte, onde suas emoções ganham destaque quase sempre com uma lente fechada e um desfoque belíssimo do segundo plano. Essa proposta em criar o contrate visual entre o ambiente controlado do tribunal e a turbulência emocional do cotidiano ajuda demais a potencializar a atmosfera de crescente tensão - é impressionante como sentimos esse mood! As performances do elenco também merecem destaque, especialmente de Maaike Cafmeyer - ela traz uma intensidade contida que alimenta a ambiguidade da narrativa. Frie é retratada como uma mulher que oscila entre a dor e a frieza, o que nos mantém em dúvida sobre sua culpa ou inocência até o fim da temporada. Cafmeyer consegue transmitir essa ambiguidade com uma atuação sutil, sem exageros, o que torna seu personagem ainda mais intrigante. Outro nome que merece destaque é o de Maaike Neuville, a Delphine Spijkers - belíssimo trabalho.
"Doze Jurados" é um retrato realista do sistema de justiça e um recorte dos mais inteligente sobre a falibilidade humana. A série não oferece respostas fáceis; ao contrário, ela nos desafia a confrontar a complexidade de um julgamento pelos olhos da imperfeição humana, mostrando como nossas decisões são moldadas por nossas experiências pessoais e emoções. O roteiro, premiado no Cannes International Series Festival (ou para os mais íntimos, CannesSeries) sabe equilibrar diferentes narrativas de seus personagens, sem perder o foco no julgamento em si. eu diria que o golaço da série está na sua capacidade de escancarar a fragilidade e a subjetividade ao humanizar quem julga sem a propriedade de julgar!
Vale muito o seu play!
Você vai se surpreender com a qualidade narrativa e visual de "Doze Jurados"! Se em um primeiro momento a série da Één, emissora pública belga (mas que ganhou notoriedade ao ser distribuída mundialmente pela Netflix), soa como mais um drama jurídico, em poucos episódios você vai entender que além de uma crítica contundente sobre o sistema judicial da Bélgica, a história ainda expõe um elemento crucial que vai te provocar muitas reflexões: a parcialidade de um ser humano despreparado para uma determinada função. "De Twaalf" (no original) se diferencia pela forma como apresenta um estudo profundo do impacto emocional e psicológico de um julgamento de grande repercussão, tanto sobre os envolvidos diretamente no caso quanto (e especialmente) sobre os jurados. Criada por Sanne Nuyens, Bert Van Dael e Roel Mondelaers, a série traz uma abordagem até certo ponto inovadora, deixando os aspectos legais do julgamento apenas como complemento da narrativa para priorizar a vida pessoal dos jurados, cujas histórias individuais acabam influenciando suas percepções e decisões. "Doze Jurados" é uma trama complexa que vai além dos estereótipos das séries jurídicas tradicionais, oferecendo uma experiência realmente densa e emocionalmente impactante.
A premissa gira em torno de um julgamento que atrai grande atenção da mídia na Bélgica: Frie Palmers (Maaike Cafmeyer) é uma mulher divorciada acusada de dois assassinatos - da filha pequena e de sua melhor amiga. A série acompanha o desenrolar do processo do ponto de vista dos doze jurados que precisam decidir o destino de Frie. No entanto, enquanto o caso é exposto no tribunal, cada jurado traz para a corte suas próprias bagagens emocionais e questões pessoais, que acabam moldando a forma como cada um interpreta as evidências e os depoimentos das testemunhas, criando assim uma dinâmica capaz de destruir o que mais deveria importar: a busca pela verdade! Confira o trailer (com legendas em inglês):
Produzido pelaEyeworks Film, "Doze Jurados" brilha ao construir uma narrativa realmente envolvente que dá voz aos jurados, provocando um desconforto de fato angustiante ao expor que um julgamento não é apenas sobre a culpa ou a inocência, mas também sobre como a vida de cada um é afetada ao longo do processo. A série destaca o impacto que é ter que decidir o futuro de outra pessoa, mostrando como a vida dos jurados começam a se entrelaçar com o julgamento, trazendo para os holofotes dilemas pessoais, traumas e segredos que, intercaladas com o drama jurídico em si, cria uma jornada verdadeiramente rica em nuances como dificilmente encontramos no gênero. Veja, a roteiro mistura com sabedoria a tensão das cenas de tribunal com o desenvolvimento profundo dos personagens - especialmente nos flashbacks dos personagens. Essa proposta conceitual é eficaz em manter o ritmo da narrativa e entregar um certo tom de mistério em torno de todos os envolvidos no caso.
A direção de Wouter Bouvijn (de "1985") é precisa, com uma estética fria e claustrofóbica ao ponto de refletir o peso do julgamento com a mesma força que as tensões internas dos personagens - a câmera de Bouvijn tem um movimento quase documental, um identidade do cinema independente europeu e um timinig perfeito na construção do drama. Repare também como a fotografia utiliza bem o contraste entre os ambientes do tribunal, austeros e impessoais, com os momentos de intimidade dos jurados fora da corte, onde suas emoções ganham destaque quase sempre com uma lente fechada e um desfoque belíssimo do segundo plano. Essa proposta em criar o contrate visual entre o ambiente controlado do tribunal e a turbulência emocional do cotidiano ajuda demais a potencializar a atmosfera de crescente tensão - é impressionante como sentimos esse mood! As performances do elenco também merecem destaque, especialmente de Maaike Cafmeyer - ela traz uma intensidade contida que alimenta a ambiguidade da narrativa. Frie é retratada como uma mulher que oscila entre a dor e a frieza, o que nos mantém em dúvida sobre sua culpa ou inocência até o fim da temporada. Cafmeyer consegue transmitir essa ambiguidade com uma atuação sutil, sem exageros, o que torna seu personagem ainda mais intrigante. Outro nome que merece destaque é o de Maaike Neuville, a Delphine Spijkers - belíssimo trabalho.
"Doze Jurados" é um retrato realista do sistema de justiça e um recorte dos mais inteligente sobre a falibilidade humana. A série não oferece respostas fáceis; ao contrário, ela nos desafia a confrontar a complexidade de um julgamento pelos olhos da imperfeição humana, mostrando como nossas decisões são moldadas por nossas experiências pessoais e emoções. O roteiro, premiado no Cannes International Series Festival (ou para os mais íntimos, CannesSeries) sabe equilibrar diferentes narrativas de seus personagens, sem perder o foco no julgamento em si. eu diria que o golaço da série está na sua capacidade de escancarar a fragilidade e a subjetividade ao humanizar quem julga sem a propriedade de julgar!
Vale muito o seu play!
Quanto menos você souber sobre o caso Elize Matsunaga, mais você vai se surpreender com a minissérie documental da Netflix que decupa, ponto a ponto, o crime que abalou o Brasil em 2012 por sua brutalidade e pela relevância social de sua vitima, o empresário e herdeiro do grupo Yoki, Marcos Matsunaga.
"Elize Matsunaga: Era Uma Vez Um Crime" revisita o assassinato e o esquartejamento de Marcos Matsunaga, pelos olhos de sua esposa Elize - a autora confessa do crime. Da infância em Chopinzinho, pequena cidade do Paraná, até o conturbado relacionamento com o empresário antes do assassinato, a minissérie de quatro episódios se aprofunda nos detalhes que sucederam o fato, desde as tentativas de acobertamento do crime, passando pela confissão, prisão até o julgamento em 2016. Confira o trailer:
Sem a menor dúvida, o maior mérito da minissérie documental dirigida de forma muito competente pela Eliza Capai, é o de poder contar com a própria assassina dando sua versão da história. Ter Elize Matsunaga dando seu depoimento, no mínimo, nos provoca estranheza e curiosidade. Assassina confessa de seu marido, Eliza parece estar em outra dimensão. Suas palavras soam tão superficiais quanto sua tentativa de explicar algo que não tem explicação - a razão pela qual matou Marcos! Ao relatar os casos de infidelidades do marido, as brigas intensas entre eles (quase sempre baseadas no ciúme de ambos), além de uma convivência marcada por excentricidades que vão de ter uma cobra como animal de estimação ao arsenal bélico que tinham em casa, Elize tenta associar suas decisões infelizes (definição dada por ela) àquela tragédia que ela mesma provocou.
Embora a diretora tente equilibrar os dois lados da história, é inegável que a presença de Elize tenha uma força quase irreparável perante a necessidade (ou tentativa) de se manter neutra. Capai de fato se propõe a conduzir a linha narrativa, brilhantemente construída por uma edição extremamente competente, sem impor uma verdade absoluta, mas ao dar tanto holofote para uma criminosa (psicopata), a nossa experiência levanta inúmeros julgamentos a cada nova descoberta revelada pelo roteiro. Escrito pela Diana Golts (de "The Last Defense"), a minissérie se apropria da complexidade e da passionalidade da história para criar "ganchos" que praticamente nos impedem de parar de assistir os episódios - por isso comentei: quanto menos você souber, melhor.
A produção, claro, não está interessada em inocentar Elize, apenas se propõe a compreender suas motivações de uma forma até elegante - e isso, sinceramente, pode incomodar parte da audiência. Em alguns momentos temos a impressão que falta uma certa vontade em relatar certas nuances da investigação e o interesse em cobrir lacunas abertas durante o julgamento - a possibilidade de existir uma terceira pessoa que possa ter ajudado Elize a cometer o crime é só um dos exemplos dessa superficialidade narrativa. Por outro lado, ter acesso aos bastidores de um crime tão marcante, pela voz de quem cometeu a atrocidade, praticamente nos coloca dentro daquele universo sem o olhar sensacionalista que a imprensa vendeu na época. Desconstruir alguns dos personagens, anos depois do crime, valida "Elize Matsunaga: Era Uma Vez Um Crime" como um dos melhores documentários de "true crime" produzidos no Brasil até aqui e, mesmo com suas falhas (quase que retóricas), soa ter cumprido o seu papel de se tornar um verdadeiro registro histórico do crime.
Vale seu play!
Quanto menos você souber sobre o caso Elize Matsunaga, mais você vai se surpreender com a minissérie documental da Netflix que decupa, ponto a ponto, o crime que abalou o Brasil em 2012 por sua brutalidade e pela relevância social de sua vitima, o empresário e herdeiro do grupo Yoki, Marcos Matsunaga.
"Elize Matsunaga: Era Uma Vez Um Crime" revisita o assassinato e o esquartejamento de Marcos Matsunaga, pelos olhos de sua esposa Elize - a autora confessa do crime. Da infância em Chopinzinho, pequena cidade do Paraná, até o conturbado relacionamento com o empresário antes do assassinato, a minissérie de quatro episódios se aprofunda nos detalhes que sucederam o fato, desde as tentativas de acobertamento do crime, passando pela confissão, prisão até o julgamento em 2016. Confira o trailer:
Sem a menor dúvida, o maior mérito da minissérie documental dirigida de forma muito competente pela Eliza Capai, é o de poder contar com a própria assassina dando sua versão da história. Ter Elize Matsunaga dando seu depoimento, no mínimo, nos provoca estranheza e curiosidade. Assassina confessa de seu marido, Eliza parece estar em outra dimensão. Suas palavras soam tão superficiais quanto sua tentativa de explicar algo que não tem explicação - a razão pela qual matou Marcos! Ao relatar os casos de infidelidades do marido, as brigas intensas entre eles (quase sempre baseadas no ciúme de ambos), além de uma convivência marcada por excentricidades que vão de ter uma cobra como animal de estimação ao arsenal bélico que tinham em casa, Elize tenta associar suas decisões infelizes (definição dada por ela) àquela tragédia que ela mesma provocou.
Embora a diretora tente equilibrar os dois lados da história, é inegável que a presença de Elize tenha uma força quase irreparável perante a necessidade (ou tentativa) de se manter neutra. Capai de fato se propõe a conduzir a linha narrativa, brilhantemente construída por uma edição extremamente competente, sem impor uma verdade absoluta, mas ao dar tanto holofote para uma criminosa (psicopata), a nossa experiência levanta inúmeros julgamentos a cada nova descoberta revelada pelo roteiro. Escrito pela Diana Golts (de "The Last Defense"), a minissérie se apropria da complexidade e da passionalidade da história para criar "ganchos" que praticamente nos impedem de parar de assistir os episódios - por isso comentei: quanto menos você souber, melhor.
A produção, claro, não está interessada em inocentar Elize, apenas se propõe a compreender suas motivações de uma forma até elegante - e isso, sinceramente, pode incomodar parte da audiência. Em alguns momentos temos a impressão que falta uma certa vontade em relatar certas nuances da investigação e o interesse em cobrir lacunas abertas durante o julgamento - a possibilidade de existir uma terceira pessoa que possa ter ajudado Elize a cometer o crime é só um dos exemplos dessa superficialidade narrativa. Por outro lado, ter acesso aos bastidores de um crime tão marcante, pela voz de quem cometeu a atrocidade, praticamente nos coloca dentro daquele universo sem o olhar sensacionalista que a imprensa vendeu na época. Desconstruir alguns dos personagens, anos depois do crime, valida "Elize Matsunaga: Era Uma Vez Um Crime" como um dos melhores documentários de "true crime" produzidos no Brasil até aqui e, mesmo com suas falhas (quase que retóricas), soa ter cumprido o seu papel de se tornar um verdadeiro registro histórico do crime.
Vale seu play!
É preciso entender que a AppleTV+ está apenas no começo da sua jornada e talvez por isso eu fique muito tranquilo em afirmar: de tudo que assisti até agora no serviço de streaming da Apple, "Em defesa de Jacob" é disparado o melhor titulo - não que os outros sejam ruins, mas essa minissérie é impecável, no seu roteiro, na sua produção e no seu elenco!
Baseada no livro de 2012 do americano William Landay, "Em Defesa de Jacob" conta a história do promotor Andy Barber (Chris Evans), um homem que acreditava ter uma vida perfeita ao lado de sua esposa Laurie (Michelle Dockery) e do filho Jacob (Jaeden Martell). Porém quando Barber é escalado para investigar o assassinato de um adolescente de 14 anos que foi encontrado esfaqueado em um parque da pequena cidade de Massachusetts onde moram, ele começa a enfrentar um verdadeiro pesadelo. O garoto estudava com seu filho que, pouco tempo depois, passa a ser apontado como o principal suspeito de ter cometido o crime. A partir daí, a vida da família Barber vira de ponta-cabeça, sua intimidade é completamente exposta, a repercussão da acusação destrói seu convívio social e a dúvida sobre o que realmente aconteceu transforma a relação entre eles em um verdadeiro jogo de verdades e mentiras! Confira o trailer:
Antes de seguir, eu preciso dizer que "Em Defesa de Jacob" já começa genial pelo duplo sentido do seu título - isso só ficará claro no último episódio, porém o que você vai assistir nos outros sete que compõem a minissérie, é uma história dinâmica que, mesmo com algumas escolhas óbvias, nos mantém envolvidos e cheio de dúvidas sobre os fatos que levaram o crime ser cometido e sobre quem cometeu! É um verdadeiro exercício de adivinhação constante, mas que o roteiro insiste em nos afastar da solução a cada nova descoberta! Olha, vale muito a pena mesmo, entretenimento de primeira linha, nível HBO, mas na AppleTV+!
"Em Defesa de Jacob" foi criada por Mark Bomback, roteirista de "Planeta dos Macacos" e "Wolverine - Imortal". Seu roteiro traz muitas referências do excelente "Precisamos falar sobre Kevin" de 2011, mas com o frescor de se tratar de uma minissérie e de poder explorar uma história complexa, com personagens profundos, com muito mais tempo de desenvolvimento que as duas horas do filme. Toda a trama envolvendo o assassinato, a investigação criminal e o julgamento é equilibrada com momentos bastante particulares da relação familiar dos Barber. Aquela família perfeita de fato não existe, personagens impecáveis, acima do bem e do mal, muito menos, com isso, a todo momento, o roteiro nos coloca uma pulga atrás da orelha com diálogos inteligentes e, principalmente, atuações acima da média, principalmente de Jaeden Martell - o ator consegue entregar uma performance incrível, extremamente contido, trabalhando o silêncio de um forma sombria em alguns momentos e frágil em outros - reparem! Michelle Dockery também surpreende como Laurie e o contraponto da dúvida é tão bem trabalhado pela personagem que o ótimo trabalho do Chris Evans acaba ganhando ainda mais força - embora ele tenha um tendência absurda a trabalhar um tom acima, sua certeza sobre a inocência do filho é de emocionar!
A edição também é um ponto que merece ser comentado: ela é a responsável pela dinâmica narrativa que o premiadíssimo diretor Morten Tyldum (Jogo da Imitação) impõe à história. A quebra da linha temporal parece mais confundir do que explicar e , propositalmente, os cortes nos criam a sensação de insegurança que vai progredindo até chegarmos nos episódios 7 e 8, quando nossa angústia já está quase insuportável. O fato do diretor ser norueguês, certamente, contribuiu para a escolha do look gélido que a minissérie tem - se "Garota Exemplar" trazia uma dominância mais esverdeada, "Em Defesa de Jacob" usa do azul para retratar a frieza e a solidão dos momentos de dúvida e de introspecção que acompanham cada um dos personagens, ao seu modo, em toda história!
"Em Defesa de Jacob" vem forte para a temporada de premiações, com aquele empurrãozinho de sucessos como "Big Little Lies" ou "Em Prantos", mas com a coragem de um roteiro que nos tira da zona de conforto e nos provoca ao não responder a questão principal da trama, mas de expor as imperfeições dos relacionamentos familiares em várias camadas e situações até o seu limite!
Vale o seu play!
É preciso entender que a AppleTV+ está apenas no começo da sua jornada e talvez por isso eu fique muito tranquilo em afirmar: de tudo que assisti até agora no serviço de streaming da Apple, "Em defesa de Jacob" é disparado o melhor titulo - não que os outros sejam ruins, mas essa minissérie é impecável, no seu roteiro, na sua produção e no seu elenco!
Baseada no livro de 2012 do americano William Landay, "Em Defesa de Jacob" conta a história do promotor Andy Barber (Chris Evans), um homem que acreditava ter uma vida perfeita ao lado de sua esposa Laurie (Michelle Dockery) e do filho Jacob (Jaeden Martell). Porém quando Barber é escalado para investigar o assassinato de um adolescente de 14 anos que foi encontrado esfaqueado em um parque da pequena cidade de Massachusetts onde moram, ele começa a enfrentar um verdadeiro pesadelo. O garoto estudava com seu filho que, pouco tempo depois, passa a ser apontado como o principal suspeito de ter cometido o crime. A partir daí, a vida da família Barber vira de ponta-cabeça, sua intimidade é completamente exposta, a repercussão da acusação destrói seu convívio social e a dúvida sobre o que realmente aconteceu transforma a relação entre eles em um verdadeiro jogo de verdades e mentiras! Confira o trailer:
Antes de seguir, eu preciso dizer que "Em Defesa de Jacob" já começa genial pelo duplo sentido do seu título - isso só ficará claro no último episódio, porém o que você vai assistir nos outros sete que compõem a minissérie, é uma história dinâmica que, mesmo com algumas escolhas óbvias, nos mantém envolvidos e cheio de dúvidas sobre os fatos que levaram o crime ser cometido e sobre quem cometeu! É um verdadeiro exercício de adivinhação constante, mas que o roteiro insiste em nos afastar da solução a cada nova descoberta! Olha, vale muito a pena mesmo, entretenimento de primeira linha, nível HBO, mas na AppleTV+!
"Em Defesa de Jacob" foi criada por Mark Bomback, roteirista de "Planeta dos Macacos" e "Wolverine - Imortal". Seu roteiro traz muitas referências do excelente "Precisamos falar sobre Kevin" de 2011, mas com o frescor de se tratar de uma minissérie e de poder explorar uma história complexa, com personagens profundos, com muito mais tempo de desenvolvimento que as duas horas do filme. Toda a trama envolvendo o assassinato, a investigação criminal e o julgamento é equilibrada com momentos bastante particulares da relação familiar dos Barber. Aquela família perfeita de fato não existe, personagens impecáveis, acima do bem e do mal, muito menos, com isso, a todo momento, o roteiro nos coloca uma pulga atrás da orelha com diálogos inteligentes e, principalmente, atuações acima da média, principalmente de Jaeden Martell - o ator consegue entregar uma performance incrível, extremamente contido, trabalhando o silêncio de um forma sombria em alguns momentos e frágil em outros - reparem! Michelle Dockery também surpreende como Laurie e o contraponto da dúvida é tão bem trabalhado pela personagem que o ótimo trabalho do Chris Evans acaba ganhando ainda mais força - embora ele tenha um tendência absurda a trabalhar um tom acima, sua certeza sobre a inocência do filho é de emocionar!
A edição também é um ponto que merece ser comentado: ela é a responsável pela dinâmica narrativa que o premiadíssimo diretor Morten Tyldum (Jogo da Imitação) impõe à história. A quebra da linha temporal parece mais confundir do que explicar e , propositalmente, os cortes nos criam a sensação de insegurança que vai progredindo até chegarmos nos episódios 7 e 8, quando nossa angústia já está quase insuportável. O fato do diretor ser norueguês, certamente, contribuiu para a escolha do look gélido que a minissérie tem - se "Garota Exemplar" trazia uma dominância mais esverdeada, "Em Defesa de Jacob" usa do azul para retratar a frieza e a solidão dos momentos de dúvida e de introspecção que acompanham cada um dos personagens, ao seu modo, em toda história!
"Em Defesa de Jacob" vem forte para a temporada de premiações, com aquele empurrãozinho de sucessos como "Big Little Lies" ou "Em Prantos", mas com a coragem de um roteiro que nos tira da zona de conforto e nos provoca ao não responder a questão principal da trama, mas de expor as imperfeições dos relacionamentos familiares em várias camadas e situações até o seu limite!
Vale o seu play!
Dividido em 2 partes de 1 hora, em média, essa minissérie documental da HBO mostra o julgamento de Michelle Carter, uma jovem de 17 anos que foi acusada de incentivar o namorado, Conrad Roy, de 18 anos, a se suicidar. O curioso dessa história é que eles sempre estiveram a mais de 60 km de distância um do outro. Todo relacionamento era baseado em mensagens de celular (60.000 pra ser exato)! Por mais maluca que possa parecer essa história, a diretora Erin Lee Carr (Mommy Dead and Dearest) foi muito inteligente em humanizar o caso sem levantar nenhuma bandeira e por mais que sejamos convidados a fazer nossos próprios julgamentos, a cada nova informação nossa cabeça dá um nó!
No dia 14 de julho de 2014, Conrad Roy foi encontrado morto depois de respirar uma enorme quantidade de monóxido de carbono dentro da sua caminhonete, no estacionamento de um supermercado. O que parecia mais um caso de suicídio logo se transformou em uma acusação de homicídio culposo quando, junto ao corpo, foi encontrado um celular sem bateria. Já com o inicio das investigações, foi descoberto uma série de mensagens que, aparentemente, incentivaram Roy a se matar. A responsável por essas mensagens era Michelle Carter, sua namorada. Roy e Michelle namoraram cerca de 2 anos e nesse período se encontraram apenas 5 vezes. A distância e o tempo não afastou o casal, pelo contrário, só fortaleceu a relação: as várias de mensagens que eles trocavam diariamente, só comprovam a enorme sintonia que existia entre os dois - e a minissérie usa muito bem esse material como conceito narrativo, o que dá um tom de proximidade com nossa realidade impressionante. O fato é que eles realmente pareciam se amar e se apoiar em todas as situações, porém Roy sofria de uma depressão severa e Michelle apresentava fortes sinais de sociopatia, ou seja, essa relação era uma bomba prestes a explodir!
É nesse cenário que o documentário ganha força. Com depoimentos da família Roy, dos investigadores, de um jornalista, do advogado de Michelle e de um psiquiatra, "Eu Te Amo, Agora Morra" mostra toda a cronologia do caso: da preparação do suicídio até o veredito do juiz, usando as trocas de mensagens entre o casal como uma espécie de "narrador" (o som das mensagem saindo e chegando são angustiantes) e as cenas do julgamento e das reportagens da época como "fechamentos de bloco", extremamente bem montados, diga-se de passagem. Esse é o tipo de documentário, aliás, que você não consegue tirar o olho da tela - ele é dinâmico, envolvente, interessante e até o último segundo fica impossível cravar qual será o resultado dessa trama tão complexa e mesmo assim a grande discussão moral da história fica martelando na nossa cabeça por algum tempo! Olha, vale o play!!!!
PS: A abertura da minissérie é de um bom gosto incrível!!!!
Dividido em 2 partes de 1 hora, em média, essa minissérie documental da HBO mostra o julgamento de Michelle Carter, uma jovem de 17 anos que foi acusada de incentivar o namorado, Conrad Roy, de 18 anos, a se suicidar. O curioso dessa história é que eles sempre estiveram a mais de 60 km de distância um do outro. Todo relacionamento era baseado em mensagens de celular (60.000 pra ser exato)! Por mais maluca que possa parecer essa história, a diretora Erin Lee Carr (Mommy Dead and Dearest) foi muito inteligente em humanizar o caso sem levantar nenhuma bandeira e por mais que sejamos convidados a fazer nossos próprios julgamentos, a cada nova informação nossa cabeça dá um nó!
No dia 14 de julho de 2014, Conrad Roy foi encontrado morto depois de respirar uma enorme quantidade de monóxido de carbono dentro da sua caminhonete, no estacionamento de um supermercado. O que parecia mais um caso de suicídio logo se transformou em uma acusação de homicídio culposo quando, junto ao corpo, foi encontrado um celular sem bateria. Já com o inicio das investigações, foi descoberto uma série de mensagens que, aparentemente, incentivaram Roy a se matar. A responsável por essas mensagens era Michelle Carter, sua namorada. Roy e Michelle namoraram cerca de 2 anos e nesse período se encontraram apenas 5 vezes. A distância e o tempo não afastou o casal, pelo contrário, só fortaleceu a relação: as várias de mensagens que eles trocavam diariamente, só comprovam a enorme sintonia que existia entre os dois - e a minissérie usa muito bem esse material como conceito narrativo, o que dá um tom de proximidade com nossa realidade impressionante. O fato é que eles realmente pareciam se amar e se apoiar em todas as situações, porém Roy sofria de uma depressão severa e Michelle apresentava fortes sinais de sociopatia, ou seja, essa relação era uma bomba prestes a explodir!
É nesse cenário que o documentário ganha força. Com depoimentos da família Roy, dos investigadores, de um jornalista, do advogado de Michelle e de um psiquiatra, "Eu Te Amo, Agora Morra" mostra toda a cronologia do caso: da preparação do suicídio até o veredito do juiz, usando as trocas de mensagens entre o casal como uma espécie de "narrador" (o som das mensagem saindo e chegando são angustiantes) e as cenas do julgamento e das reportagens da época como "fechamentos de bloco", extremamente bem montados, diga-se de passagem. Esse é o tipo de documentário, aliás, que você não consegue tirar o olho da tela - ele é dinâmico, envolvente, interessante e até o último segundo fica impossível cravar qual será o resultado dessa trama tão complexa e mesmo assim a grande discussão moral da história fica martelando na nossa cabeça por algum tempo! Olha, vale o play!!!!
PS: A abertura da minissérie é de um bom gosto incrível!!!!
O documentário "Ghislaine Maxwell: Poder e Perversão" é praticamente uma escolha obrigatória para quem assistiu (e gostou) de "Jeffrey Epstein: Poder e Perversão". Embora sem o mesmo brilhantismo narrativo da minissérie de 4 episódios que nos apresentou os detalhes mais secretos do esquema de pirâmide sexual com menores de Epstein, que envolvia poderosos políticos, empresários, acadêmicos e até celebridades; o filme sobre sua parceira Ghislaine serve, basicamente, como um epílogo de uma história que embrulha o estômago por todo contexto que envolveu suas vítimas.
Este documentário parte dos pontos que ficaram abertos depois dos acontecimentos da minissérie. Os detalhes sobre o caso de tráfico sexual pelo prisma do envolvimento de Ghislaine Maxwell, socialite e cúmplice de Jeffrey Epstein, ganha ainda mais força com os depoimentos das próprias vítimas e do recente julgamento pelo qual ela passou. Confira o trailer (em inglês):
Se "Ghislaine Maxwell: Poder e Perversão" fosse o quinto episódio de "Jeffrey Epstein: Poder e Perversão" tudo faria mais sentido - porém há dois anos atrás Ghislaine sequer tinha sido indiciada, o que, claro, impactou na escolha da diretora Lisa Bryant em fechar o primeiro ciclo com o rico material que ela tinha na época. E aqui cabe uma observação relevante: a minissérie foi baseada no ivro de James Patterson “Filthy Rich: The Shocking True Story of Jeffrey Epstein”, o que permitiu a Lisa se aprofundar em diversos detalhes que, infelizmente, não se repetiu no filme de Ghislaine. Em muitos momentos, inclusive, a narrativa se torna até repetitiva e incrivelmente superficial com o claro intuito de tentar relembrar o caso Epstein sem tirar o foco da nova protagonista.
Isso prejudica a experiência? Absolutamente não, porém cria um vinculo tão grande com a obra anterior que seria desrespeitoso da minha parte dizer que a história de "Ghislaine Maxwell: Poder e Perversão" se conta sozinha - não, ela não se conta e isolada perde completamente sua força! Com a ajuda de Maiken Baird (produtora de sucessos como "Ícaro" e "Allen contra Farrow") Lisa revisita alguns elementos que conectados ao caso, nos ajudam a entender um pouco mais da relação entre Ghislaine e Epstein - o ponto alto, no entanto, se dá na construção do perfil de Ghislaine e como sua relação com o pai, o milionário da mídia Robert Maxwell, definiu traços da sua personalidade marcante (e doentia).
"Ghislaine Maxwell: Poder e Perversão" basicamente repete a fragilidade de “Who is Ghislaine Maxwell?”, da HBO, que bebeu da fonte de "Jeffrey Epstein: Poder e Perversão", mas que trouxe poucas novidades para o entendimento do caso como um todo (inclusive de sua investigação e julgamento). Eu diria que esse documentário é até dinâmico, bem produzido, bem dirigido e que funciona muito bem como encerramento de um assunto que passou de novidade (e até surpreendente pelos nomes envolvidos e pelo fim trágico de Epstein) para um tema que dominou os noticiários por muito tempo e que me pareceu ter se desgastado demais.
Repetindo: vale seu play, apenas se você já assistiu "Jeffrey Epstein: Poder e Perversão"!
O documentário "Ghislaine Maxwell: Poder e Perversão" é praticamente uma escolha obrigatória para quem assistiu (e gostou) de "Jeffrey Epstein: Poder e Perversão". Embora sem o mesmo brilhantismo narrativo da minissérie de 4 episódios que nos apresentou os detalhes mais secretos do esquema de pirâmide sexual com menores de Epstein, que envolvia poderosos políticos, empresários, acadêmicos e até celebridades; o filme sobre sua parceira Ghislaine serve, basicamente, como um epílogo de uma história que embrulha o estômago por todo contexto que envolveu suas vítimas.
Este documentário parte dos pontos que ficaram abertos depois dos acontecimentos da minissérie. Os detalhes sobre o caso de tráfico sexual pelo prisma do envolvimento de Ghislaine Maxwell, socialite e cúmplice de Jeffrey Epstein, ganha ainda mais força com os depoimentos das próprias vítimas e do recente julgamento pelo qual ela passou. Confira o trailer (em inglês):
Se "Ghislaine Maxwell: Poder e Perversão" fosse o quinto episódio de "Jeffrey Epstein: Poder e Perversão" tudo faria mais sentido - porém há dois anos atrás Ghislaine sequer tinha sido indiciada, o que, claro, impactou na escolha da diretora Lisa Bryant em fechar o primeiro ciclo com o rico material que ela tinha na época. E aqui cabe uma observação relevante: a minissérie foi baseada no ivro de James Patterson “Filthy Rich: The Shocking True Story of Jeffrey Epstein”, o que permitiu a Lisa se aprofundar em diversos detalhes que, infelizmente, não se repetiu no filme de Ghislaine. Em muitos momentos, inclusive, a narrativa se torna até repetitiva e incrivelmente superficial com o claro intuito de tentar relembrar o caso Epstein sem tirar o foco da nova protagonista.
Isso prejudica a experiência? Absolutamente não, porém cria um vinculo tão grande com a obra anterior que seria desrespeitoso da minha parte dizer que a história de "Ghislaine Maxwell: Poder e Perversão" se conta sozinha - não, ela não se conta e isolada perde completamente sua força! Com a ajuda de Maiken Baird (produtora de sucessos como "Ícaro" e "Allen contra Farrow") Lisa revisita alguns elementos que conectados ao caso, nos ajudam a entender um pouco mais da relação entre Ghislaine e Epstein - o ponto alto, no entanto, se dá na construção do perfil de Ghislaine e como sua relação com o pai, o milionário da mídia Robert Maxwell, definiu traços da sua personalidade marcante (e doentia).
"Ghislaine Maxwell: Poder e Perversão" basicamente repete a fragilidade de “Who is Ghislaine Maxwell?”, da HBO, que bebeu da fonte de "Jeffrey Epstein: Poder e Perversão", mas que trouxe poucas novidades para o entendimento do caso como um todo (inclusive de sua investigação e julgamento). Eu diria que esse documentário é até dinâmico, bem produzido, bem dirigido e que funciona muito bem como encerramento de um assunto que passou de novidade (e até surpreendente pelos nomes envolvidos e pelo fim trágico de Epstein) para um tema que dominou os noticiários por muito tempo e que me pareceu ter se desgastado demais.
Repetindo: vale seu play, apenas se você já assistiu "Jeffrey Epstein: Poder e Perversão"!
"House of Cards", criada por Beau Willimon e baseada no romance homônimo de Michael Dobbs, é uma série que redefiniu o drama político na televisão. Lançada em 2013 pela Netflix, a série rapidamente se tornou um fenômeno cultural, destacando-se por sua narrativa intricada, personagens complexos e uma visão cínica e implacável do mundo da política americana. Ao longo de suas seis temporadas, "House of Cards" ofereceu um mergulho profundo no poder e na corrupção, capturando a atenção e a imaginação dos espectadores em todo o mundo.
A trama de "House of Cards" segue Francis "Frank" Underwood (Kevin Spacey), um político ambicioso e implacável que, após ser preterido para o cargo de Secretário de Estado, embarca em uma jornada de vingança e manipulação para conquistar a presidência dos Estados Unidos. Ao seu lado está sua igualmente ambiciosa esposa, Claire Underwood (Robin Wright), cuja busca por poder e influência é tão implacável quanto a de Frank. Juntos, eles formam uma das duplas mais formidáveis e temíveis da televisão.
O maior trunfo de "House of Cards" está em suas performances soberbas, especialmente as de Kevin Spacey e Robin Wright. Spacey traz uma intensidade magnética a Frank Underwood, quebrando a quarta parede com seus monólogos cínicos e perspicazes, que revelam as profundezas de sua mente maquiavélica. Robin Wright, por sua vez, entrega uma atuação igualmente poderosa como Claire Underwood, evoluindo de uma parceira silenciosa para uma figura de poder autônoma e dominante. Sua química é palpável e sua dinâmica, fascinante, sustentando a série mesmo nos momentos mais sombrios.
A direção de David Fincher no piloto estabelece o tom visual da série: elegante, sombrio e imbuído de uma sensação constante de tensão. A cinematografia de Igor Martinovic e a trilha sonora de Jeff Beal complementam perfeitamente a narrativa, criando uma atmosfera opressiva que espelha o mundo moralmente ambíguo que os personagens habitam. As escolhas estéticas e a atenção aos detalhes visuais reforçam a sensação de decadência e corrupção que permeia a série. A narrativa de "House of Cards" é intricada e cheia de reviravoltas, explorando os mecanismos sombrios da política e do poder. A série é habilidosa em desenvolver arcos complexos e personagens multifacetados, onde cada ação tem consequências profundas e muitas vezes devastadoras. A escrita de Beau Willimon e sua equipe é afiada, com diálogos mordazes e uma trama que mantém os espectadores na ponta da cadeira.
No entanto, "House of Cards" não está isenta de controvérsias e desafios. As alegações de má conduta contra Kevin Spacey resultaram em sua saída abrupta após a quinta temporada, obrigando a série a reformular sua narrativa para a temporada final. Robin Wright assumiu o papel principal, e embora sua performance tenha sido amplamente elogiada, a série lutou para manter a mesma intensidade e coesão sem a presença de Spacey. Além disso, alguns críticos apontaram que as temporadas posteriores não conseguiram capturar a mesma magia das primeiras, com tramas que, por vezes, se tornaram excessivamente enroladas e menos impactantes.
Ainda assim, "House of Cards" permanece uma série marcante e influente, que ofereceu uma visão corajosa e muitas vezes perturbadora do mundo da política. Seu impacto na cultura pop é inegável, inspirando inúmeras discussões e análises sobre poder, ética e corrupção. A série é um testemunho da capacidade da televisão de explorar temas complexos e de desafiar os espectadores a refletir sobre a natureza do poder e da ambição.
Em resumo, temos uma obra imperdível para os amantes de dramas políticos que vale muito o seu play!
"House of Cards", criada por Beau Willimon e baseada no romance homônimo de Michael Dobbs, é uma série que redefiniu o drama político na televisão. Lançada em 2013 pela Netflix, a série rapidamente se tornou um fenômeno cultural, destacando-se por sua narrativa intricada, personagens complexos e uma visão cínica e implacável do mundo da política americana. Ao longo de suas seis temporadas, "House of Cards" ofereceu um mergulho profundo no poder e na corrupção, capturando a atenção e a imaginação dos espectadores em todo o mundo.
A trama de "House of Cards" segue Francis "Frank" Underwood (Kevin Spacey), um político ambicioso e implacável que, após ser preterido para o cargo de Secretário de Estado, embarca em uma jornada de vingança e manipulação para conquistar a presidência dos Estados Unidos. Ao seu lado está sua igualmente ambiciosa esposa, Claire Underwood (Robin Wright), cuja busca por poder e influência é tão implacável quanto a de Frank. Juntos, eles formam uma das duplas mais formidáveis e temíveis da televisão.
O maior trunfo de "House of Cards" está em suas performances soberbas, especialmente as de Kevin Spacey e Robin Wright. Spacey traz uma intensidade magnética a Frank Underwood, quebrando a quarta parede com seus monólogos cínicos e perspicazes, que revelam as profundezas de sua mente maquiavélica. Robin Wright, por sua vez, entrega uma atuação igualmente poderosa como Claire Underwood, evoluindo de uma parceira silenciosa para uma figura de poder autônoma e dominante. Sua química é palpável e sua dinâmica, fascinante, sustentando a série mesmo nos momentos mais sombrios.
A direção de David Fincher no piloto estabelece o tom visual da série: elegante, sombrio e imbuído de uma sensação constante de tensão. A cinematografia de Igor Martinovic e a trilha sonora de Jeff Beal complementam perfeitamente a narrativa, criando uma atmosfera opressiva que espelha o mundo moralmente ambíguo que os personagens habitam. As escolhas estéticas e a atenção aos detalhes visuais reforçam a sensação de decadência e corrupção que permeia a série. A narrativa de "House of Cards" é intricada e cheia de reviravoltas, explorando os mecanismos sombrios da política e do poder. A série é habilidosa em desenvolver arcos complexos e personagens multifacetados, onde cada ação tem consequências profundas e muitas vezes devastadoras. A escrita de Beau Willimon e sua equipe é afiada, com diálogos mordazes e uma trama que mantém os espectadores na ponta da cadeira.
No entanto, "House of Cards" não está isenta de controvérsias e desafios. As alegações de má conduta contra Kevin Spacey resultaram em sua saída abrupta após a quinta temporada, obrigando a série a reformular sua narrativa para a temporada final. Robin Wright assumiu o papel principal, e embora sua performance tenha sido amplamente elogiada, a série lutou para manter a mesma intensidade e coesão sem a presença de Spacey. Além disso, alguns críticos apontaram que as temporadas posteriores não conseguiram capturar a mesma magia das primeiras, com tramas que, por vezes, se tornaram excessivamente enroladas e menos impactantes.
Ainda assim, "House of Cards" permanece uma série marcante e influente, que ofereceu uma visão corajosa e muitas vezes perturbadora do mundo da política. Seu impacto na cultura pop é inegável, inspirando inúmeras discussões e análises sobre poder, ética e corrupção. A série é um testemunho da capacidade da televisão de explorar temas complexos e de desafiar os espectadores a refletir sobre a natureza do poder e da ambição.
Em resumo, temos uma obra imperdível para os amantes de dramas políticos que vale muito o seu play!
A epidemia de opioides é uma das crises de saúde pública mais devastadoras da nossa era e dois livros notáveis, "Pain Killer", de Barry Meier, e "Dopesick", de Beth Macy, mergulharam fundo nesse assunto tão complexo com um propósito claro: apresentar as várias perspectivas do problema - do médico, do representante comercial, do paciente, da polícia, dos viciados e suas relações familiares, e, claro, da lei. A premiada minissérie de ficção do Star+, dirigida pelos talentosos Danny Strong e Barry Levinson, baseada no livro de Macy, sem dúvida alguma já tinha cumprido o seu papel nesse sentido, no entanto a Netflix achou que ainda tinha uma história interessante para contar e assim surgiu "Império da Dor" - baseado na obra de Meier e no artigo "The Family That Built an Empire of Pain", de Patrick Radden Keefe. Obviamente que em um primeiro olhar a trama soa familiar, e de fato é, no entanto a minissérie do diretor Peter Berg (de "Friday Night Lights") deixa um pouco da densidade dramática de "Dopesick" de lado para apresentar o problema de uma forma (arriscada) com um conceito mais acessível e algum senso de humor - não que não tenha drama, mas o tom é infinitamente menos impactante. E te falo, na minha opinião, como entrada no assunto, funciona perfeitamente - mas a obra-prima é a outra!
Aqui, basicamente, acompanhamos todo o drama sobre as causas e consequências da epidemia de opioides nos Estados Unidos pelo olhar critico de Edie Flowers (Uzo Aduba), uma investigadora do Gabinete do Procurador dos EUA em Roanoke, que cuida de fraudes médicas. Ao perceber que o OxyContin passou a ser prescrito de forma generalizada, gerando inúmeros pacientes com dependência e milhares de mortes, Flowers começa uma luta intensa para tirar o medicamento das farmácias e ainda punir os executivos da Purdue que mentiram sobre os reais efeitos do Oxy. Confira o trailer:
Mesmo que a personagem Edie Flowers tenha sido criada pelos roteiristas Micah Fitzerman-Blue e Noah Harpster (ambos de "Transparent" e de "Um Lindo Dia na Vizinhança") com o único propósito de ser a voz que amarra cada um dos eventos de "Império da Dor", é de se elogiar a forma como Uzo Aduba nos apresenta sua jornada de maneira tão humana e visceral - seu sofrimento é, de fato, muito real. Digna de prêmios! É impressionante como ela dá o tom da minissérie e serve de equilíbrio para que os floreios gráficos e narrativos de Berg não diminuam o tamanho do drama que foi essa epidemia. É claro que o impacto dos prólogos de cada um dos seis episódios, onde famílias reais relembram seus dramas, nos diz exatamente onde vamos entrar, mas, sem dúvida alguma, é com a investigadora Flowers que caminhamos pela história!
Em "Império da Dor" os roteiristas transformam informações densas em histórias mais envolventes, nos mantendo cativados ao longo dos episódios - se de um lado a realidade nos embrulha o estômago, é perceptível a escolha pelo entretenimento para aliviar a tensão e evitar o churn. A construção cuidadosa de personagens, bem menos profundos que em "Dopesick", gera conexões ou julgamentos mais imediatos - é o caso do plot da família de Glenn (Taylor Kitsch) ou da trama de Shannon (West Duchovny), ambos mais estereotipados. O que eu quero dizer é que a dinâmica flui bem, intercalando contextos históricos com o dinamismo de um estilo mais pop - sim, isso deixa a narrativa tão coesa quanto acessível, mas não mexe tanto com nossas emoções. Para citar um exemplo, eu nunca odiei o Richard Sackler do Matthew Broderick de "Império da Dor"como odiei o do Michael Stuhlbarg de "Dopesick".
"Império da Dor" oferece perspectivas vívidas e inquietantes sobre a crise dos opioides, mas sem nos machucar tanto. Através de uma investigação meticulosa, de uma narrativa habilidosa e da exploração das emoções de quem viveu o drama, a minissérie consegue transcender o mero relato de fatos para se tornar um ótimo e fácil entretenimento. A produção da Netflix tem o grande mérito de contribuir para a compreensão do problema, para o entendimento da dinâmica entre os personagens reais e para pontuar o contexto histórico, mas saiba que o mergulho emocional mesmo, aquele mais profundo, bem, esse não está aqui, está na plataforma ao lado.
Aqui vale o play, mas se você gostar do assunto, não pare por aqui!
A epidemia de opioides é uma das crises de saúde pública mais devastadoras da nossa era e dois livros notáveis, "Pain Killer", de Barry Meier, e "Dopesick", de Beth Macy, mergulharam fundo nesse assunto tão complexo com um propósito claro: apresentar as várias perspectivas do problema - do médico, do representante comercial, do paciente, da polícia, dos viciados e suas relações familiares, e, claro, da lei. A premiada minissérie de ficção do Star+, dirigida pelos talentosos Danny Strong e Barry Levinson, baseada no livro de Macy, sem dúvida alguma já tinha cumprido o seu papel nesse sentido, no entanto a Netflix achou que ainda tinha uma história interessante para contar e assim surgiu "Império da Dor" - baseado na obra de Meier e no artigo "The Family That Built an Empire of Pain", de Patrick Radden Keefe. Obviamente que em um primeiro olhar a trama soa familiar, e de fato é, no entanto a minissérie do diretor Peter Berg (de "Friday Night Lights") deixa um pouco da densidade dramática de "Dopesick" de lado para apresentar o problema de uma forma (arriscada) com um conceito mais acessível e algum senso de humor - não que não tenha drama, mas o tom é infinitamente menos impactante. E te falo, na minha opinião, como entrada no assunto, funciona perfeitamente - mas a obra-prima é a outra!
Aqui, basicamente, acompanhamos todo o drama sobre as causas e consequências da epidemia de opioides nos Estados Unidos pelo olhar critico de Edie Flowers (Uzo Aduba), uma investigadora do Gabinete do Procurador dos EUA em Roanoke, que cuida de fraudes médicas. Ao perceber que o OxyContin passou a ser prescrito de forma generalizada, gerando inúmeros pacientes com dependência e milhares de mortes, Flowers começa uma luta intensa para tirar o medicamento das farmácias e ainda punir os executivos da Purdue que mentiram sobre os reais efeitos do Oxy. Confira o trailer:
Mesmo que a personagem Edie Flowers tenha sido criada pelos roteiristas Micah Fitzerman-Blue e Noah Harpster (ambos de "Transparent" e de "Um Lindo Dia na Vizinhança") com o único propósito de ser a voz que amarra cada um dos eventos de "Império da Dor", é de se elogiar a forma como Uzo Aduba nos apresenta sua jornada de maneira tão humana e visceral - seu sofrimento é, de fato, muito real. Digna de prêmios! É impressionante como ela dá o tom da minissérie e serve de equilíbrio para que os floreios gráficos e narrativos de Berg não diminuam o tamanho do drama que foi essa epidemia. É claro que o impacto dos prólogos de cada um dos seis episódios, onde famílias reais relembram seus dramas, nos diz exatamente onde vamos entrar, mas, sem dúvida alguma, é com a investigadora Flowers que caminhamos pela história!
Em "Império da Dor" os roteiristas transformam informações densas em histórias mais envolventes, nos mantendo cativados ao longo dos episódios - se de um lado a realidade nos embrulha o estômago, é perceptível a escolha pelo entretenimento para aliviar a tensão e evitar o churn. A construção cuidadosa de personagens, bem menos profundos que em "Dopesick", gera conexões ou julgamentos mais imediatos - é o caso do plot da família de Glenn (Taylor Kitsch) ou da trama de Shannon (West Duchovny), ambos mais estereotipados. O que eu quero dizer é que a dinâmica flui bem, intercalando contextos históricos com o dinamismo de um estilo mais pop - sim, isso deixa a narrativa tão coesa quanto acessível, mas não mexe tanto com nossas emoções. Para citar um exemplo, eu nunca odiei o Richard Sackler do Matthew Broderick de "Império da Dor"como odiei o do Michael Stuhlbarg de "Dopesick".
"Império da Dor" oferece perspectivas vívidas e inquietantes sobre a crise dos opioides, mas sem nos machucar tanto. Através de uma investigação meticulosa, de uma narrativa habilidosa e da exploração das emoções de quem viveu o drama, a minissérie consegue transcender o mero relato de fatos para se tornar um ótimo e fácil entretenimento. A produção da Netflix tem o grande mérito de contribuir para a compreensão do problema, para o entendimento da dinâmica entre os personagens reais e para pontuar o contexto histórico, mas saiba que o mergulho emocional mesmo, aquele mais profundo, bem, esse não está aqui, está na plataforma ao lado.
Aqui vale o play, mas se você gostar do assunto, não pare por aqui!
No cenário dos crimes que chocaram o Brasil, sem a menor dúvida, o caso da morte da menina Isabella Nardoni se destaca como um dos mais intrigantes e emocionalmente carregados da nossa história. O documentário "Isabella: O Caso Nardoni" oferece uma oportunidade única de explorar não apenas os aspectos investigativos do caso, mas também a profundidade das emoções humanas de quem, de fato, sofreu com o crime - e te falo: você não vai precisar mais do que dez minutos para sentir o coração completamente dilacerado! Embora a produção da Netflix não acrescente absolutamente nenhuma informação nova sobre o caso, inclusive, inexplicavelmente, deixe de lado elementos importantes da perícia, posso afirmar que se trata de um ótimo entretenimento para quem gosta do gênero "true crime".
Passados 15 anos, a Netflix retoma o assunto em "Isabella: O Caso Nardoni" - um filme que explora, em detalhes, os eventos em torno do assassinato de 2008, quando o pai Alexandre e a madrasta Anna Carolina Jatobá, asfixiaram a criança e depois a jogaram do sexto andar. Mostrando como foi o trabalho da polícia, da perícia e dos advogados, em meio ao sofrimento da mãe biológica, do circo midiático em torno do caso e das calorosas cobranças da população que, indignada, desejava uma rápida resolução para esse violento homicídio, os diretores Micael Langer e Cláudio Manoel praticamente reconstroem o dia do crime e exploram, passo a passo, os reflexos dessa tragédia. Confira o trailer:
Sem a menor dúvida, um dos pontos fortes do documentário está na discussão sobre os detalhes técnicos da investigação policial e do processo judicial que se seguiram ao crime. Desde a reconstituição dos fatos até a análise forense, a narrativa é muito feliz em explorar os desafios enfrentados pelas autoridades para reconstruir os eventos da noite fatídica, dando voz a quem realmente esteve lá. Mesmo que o filme soe superficial em alguns momentos, a história é recheada de curiosidades e passagens que ao mesmo tempo que indignam, nos envolvem. Misturando depoimentos atuais e um rico material de pesquisa, essencialmente imagens de arquivo, "Isabella: O Caso Nardoni" praticamente nos impede de tirar os olhos da tela até que os créditos subam.
Agora, é preciso que se diga, o roteiro explora a tragédia da morte de Isabella evocando uma gama complexa de emoções: tristeza, raiva, empatia e indignação; permitindo que a audiência compreenda não apenas a dor da família, mas também os desafios emocionais enfrentados pelas equipes de investigação e de advogados. As entrevistas com a delegada, com uma especialista criminal, com a responsável pela perícia e com o promotor, são tão reveladoras quanto a dos familiares, no entanto os insights emocionais mais poderosos, que enriquecem a narrativa, são mesmo da mãe, Ana, e da avó, Rosa.
"Isabella: O Caso Nardoni" não se limita aos fatos frios do caso, já que o filme, naturalmente, cria uma conexão emocional com a audiência - principalmente pornos transportar de volta no tempo, proporcionando uma visão mais vívida sobre os eventos. Esse olhar em retrospectiva faz toda a diferença na maneira como interpretamos os detalhes do caso e, essencialmente, cada comportamento dos envolvidos. Sim, existe uma leve sensação de que algo diferente poderia ter sido mostrado, mas essa cereja do bolo nunca chega - então não crie tantas expectativas, apenas mergulhe na proposta dos diretores e revisite a história com um pouco mais de maturidade, mesmo que ainda pareça um certo oportunismo.
No cenário dos crimes que chocaram o Brasil, sem a menor dúvida, o caso da morte da menina Isabella Nardoni se destaca como um dos mais intrigantes e emocionalmente carregados da nossa história. O documentário "Isabella: O Caso Nardoni" oferece uma oportunidade única de explorar não apenas os aspectos investigativos do caso, mas também a profundidade das emoções humanas de quem, de fato, sofreu com o crime - e te falo: você não vai precisar mais do que dez minutos para sentir o coração completamente dilacerado! Embora a produção da Netflix não acrescente absolutamente nenhuma informação nova sobre o caso, inclusive, inexplicavelmente, deixe de lado elementos importantes da perícia, posso afirmar que se trata de um ótimo entretenimento para quem gosta do gênero "true crime".
Passados 15 anos, a Netflix retoma o assunto em "Isabella: O Caso Nardoni" - um filme que explora, em detalhes, os eventos em torno do assassinato de 2008, quando o pai Alexandre e a madrasta Anna Carolina Jatobá, asfixiaram a criança e depois a jogaram do sexto andar. Mostrando como foi o trabalho da polícia, da perícia e dos advogados, em meio ao sofrimento da mãe biológica, do circo midiático em torno do caso e das calorosas cobranças da população que, indignada, desejava uma rápida resolução para esse violento homicídio, os diretores Micael Langer e Cláudio Manoel praticamente reconstroem o dia do crime e exploram, passo a passo, os reflexos dessa tragédia. Confira o trailer:
Sem a menor dúvida, um dos pontos fortes do documentário está na discussão sobre os detalhes técnicos da investigação policial e do processo judicial que se seguiram ao crime. Desde a reconstituição dos fatos até a análise forense, a narrativa é muito feliz em explorar os desafios enfrentados pelas autoridades para reconstruir os eventos da noite fatídica, dando voz a quem realmente esteve lá. Mesmo que o filme soe superficial em alguns momentos, a história é recheada de curiosidades e passagens que ao mesmo tempo que indignam, nos envolvem. Misturando depoimentos atuais e um rico material de pesquisa, essencialmente imagens de arquivo, "Isabella: O Caso Nardoni" praticamente nos impede de tirar os olhos da tela até que os créditos subam.
Agora, é preciso que se diga, o roteiro explora a tragédia da morte de Isabella evocando uma gama complexa de emoções: tristeza, raiva, empatia e indignação; permitindo que a audiência compreenda não apenas a dor da família, mas também os desafios emocionais enfrentados pelas equipes de investigação e de advogados. As entrevistas com a delegada, com uma especialista criminal, com a responsável pela perícia e com o promotor, são tão reveladoras quanto a dos familiares, no entanto os insights emocionais mais poderosos, que enriquecem a narrativa, são mesmo da mãe, Ana, e da avó, Rosa.
"Isabella: O Caso Nardoni" não se limita aos fatos frios do caso, já que o filme, naturalmente, cria uma conexão emocional com a audiência - principalmente pornos transportar de volta no tempo, proporcionando uma visão mais vívida sobre os eventos. Esse olhar em retrospectiva faz toda a diferença na maneira como interpretamos os detalhes do caso e, essencialmente, cada comportamento dos envolvidos. Sim, existe uma leve sensação de que algo diferente poderia ter sido mostrado, mas essa cereja do bolo nunca chega - então não crie tantas expectativas, apenas mergulhe na proposta dos diretores e revisite a história com um pouco mais de maturidade, mesmo que ainda pareça um certo oportunismo.
"Jeffrey Epstein: Poder e Perversão" é mais uma daquelas histórias, como a que vimos em "Deixando Neverland" (da HBO), que nos embrulha o estômago a cada minuto ou a cada descoberta. Como comentamos em um artigo no nosso blog no começo de 2020, chamado: "Jeffrey Epstein, guardem esse nome", a Netflix seguiu a tendência e resolveu produzir um documentário dividido em quatro episódios sobre os detalhes mais secretos do esquema de pirâmide sexual com menores de Epstein, que envolviam poderosos políticos, empresários, acadêmicos e até celebridades. O livro de James Patterson “Filthy Rich: The Shocking True Story of Jeffrey Epstein” serviu como base para o desenvolvimento da minissérie onde nos deparamos com o lado mais sombrio de um ser humano que acreditava que, com sua fortuna, sairia ileso de qualquer situação que o comprometesse (e ele não era o único!). Confira o trailer:
Se no documentário da HBO o incômodo vinha dos depoimentos impressionantes dos jovens abusados por uma celebridade tão importante como Michael Jackson, já em "Jeffrey Epstein: Poder e Perversão", vemos claramente o mindset de impunidade que o dinheiro, o poder e a influência causam no ser humano e as marcas que deixam nas suas vítimas. O mais interessante desse roteiro da dupla John Connolly e Tom Malloy, é a forma como a história vai se construindo através de uma narrativa não linear - um conceito que vimos recentemente em outra produção da Netflix: "Arremesso Final" e que funcionou muito bem em uma jornada tão carregada de drama como essa. O "vai e volta" dos fatos vai nos situando em uma linha do tempo cheia de recortes e fatos isolados que, juntos, vão nos corroendo com uma força absurda - são tantos detalhes que fica impossível não reconstruir as cenas de abuso e perversão mentalmente - e isso é extremamente cruel. Imaginar crianças de 12, 14 anos, compradas com duzentos dólares, sendo abusadas por Epstein com tanta recorrência, chega parecer mentira. E não era!
Não contente, a sequência de depoimentos chocantes sobre a época em que eram abusadas, contadas pelas próprias vítimas, com um nível de clareza e sinceridade absurdas (muitas vezes admitindo os próprios erros e excessos), o documentários ainda desvenda a forma maquiavélica como tudo era arquitetado, como as garotas eram aliciadas e a razão pela qual Epstein não temia ser pego. Se nos três primeiros episódios temos a impressão que se tratava de um fetiche doentio de Epstein, no último descobrimos que o problema era muito maior, amplo e tão sério que deve ter tirado o sono de muita gente grande! A exposição dessa história impressionante envolve desde presidentes americanos até um membro da realeza britânica - e além de deixar claro (mas sem tantas provas, isso é um fato) que a perversão não era exclusividade de Epstein, muito do poder que ele tinha se baseava em uma moeda de troca muito peculiar!
O documentário é muito cuidadoso ao mostrar (ou pelo menos tentar mostrar) todos os lados da história, mesmo que muitos deles apenas por legendas, mas é preciso elogiar o poder que a edição trouxe para o projeto: com muitas cenas de noticiários e inúmeras entrevistas com personagens envolvidos na investigação, dando voz até para defesa de Epstein, cria-se uma dinâmica tão envolvente que vai nos provocando, nos mal-tratando, mas que nos mantém ligados até o final e com aquele desejo insuportável que justiça seja feita!
"Jeffrey Epstein: Poder e Perversão" é uma minissérie que vale muito a pena, mas que não é tão fácil de digerir ou suportar (principalmente para aqueles que já tem filhos).
"Jeffrey Epstein: Poder e Perversão" é mais uma daquelas histórias, como a que vimos em "Deixando Neverland" (da HBO), que nos embrulha o estômago a cada minuto ou a cada descoberta. Como comentamos em um artigo no nosso blog no começo de 2020, chamado: "Jeffrey Epstein, guardem esse nome", a Netflix seguiu a tendência e resolveu produzir um documentário dividido em quatro episódios sobre os detalhes mais secretos do esquema de pirâmide sexual com menores de Epstein, que envolviam poderosos políticos, empresários, acadêmicos e até celebridades. O livro de James Patterson “Filthy Rich: The Shocking True Story of Jeffrey Epstein” serviu como base para o desenvolvimento da minissérie onde nos deparamos com o lado mais sombrio de um ser humano que acreditava que, com sua fortuna, sairia ileso de qualquer situação que o comprometesse (e ele não era o único!). Confira o trailer:
Se no documentário da HBO o incômodo vinha dos depoimentos impressionantes dos jovens abusados por uma celebridade tão importante como Michael Jackson, já em "Jeffrey Epstein: Poder e Perversão", vemos claramente o mindset de impunidade que o dinheiro, o poder e a influência causam no ser humano e as marcas que deixam nas suas vítimas. O mais interessante desse roteiro da dupla John Connolly e Tom Malloy, é a forma como a história vai se construindo através de uma narrativa não linear - um conceito que vimos recentemente em outra produção da Netflix: "Arremesso Final" e que funcionou muito bem em uma jornada tão carregada de drama como essa. O "vai e volta" dos fatos vai nos situando em uma linha do tempo cheia de recortes e fatos isolados que, juntos, vão nos corroendo com uma força absurda - são tantos detalhes que fica impossível não reconstruir as cenas de abuso e perversão mentalmente - e isso é extremamente cruel. Imaginar crianças de 12, 14 anos, compradas com duzentos dólares, sendo abusadas por Epstein com tanta recorrência, chega parecer mentira. E não era!
Não contente, a sequência de depoimentos chocantes sobre a época em que eram abusadas, contadas pelas próprias vítimas, com um nível de clareza e sinceridade absurdas (muitas vezes admitindo os próprios erros e excessos), o documentários ainda desvenda a forma maquiavélica como tudo era arquitetado, como as garotas eram aliciadas e a razão pela qual Epstein não temia ser pego. Se nos três primeiros episódios temos a impressão que se tratava de um fetiche doentio de Epstein, no último descobrimos que o problema era muito maior, amplo e tão sério que deve ter tirado o sono de muita gente grande! A exposição dessa história impressionante envolve desde presidentes americanos até um membro da realeza britânica - e além de deixar claro (mas sem tantas provas, isso é um fato) que a perversão não era exclusividade de Epstein, muito do poder que ele tinha se baseava em uma moeda de troca muito peculiar!
O documentário é muito cuidadoso ao mostrar (ou pelo menos tentar mostrar) todos os lados da história, mesmo que muitos deles apenas por legendas, mas é preciso elogiar o poder que a edição trouxe para o projeto: com muitas cenas de noticiários e inúmeras entrevistas com personagens envolvidos na investigação, dando voz até para defesa de Epstein, cria-se uma dinâmica tão envolvente que vai nos provocando, nos mal-tratando, mas que nos mantém ligados até o final e com aquele desejo insuportável que justiça seja feita!
"Jeffrey Epstein: Poder e Perversão" é uma minissérie que vale muito a pena, mas que não é tão fácil de digerir ou suportar (principalmente para aqueles que já tem filhos).
Se você gostou da série "Small Axe"e se identificou com a trama de "Os 7 de Chicago" ou de "Seberg", pode dar o play em "Judas e o Messias Negro" sem o menor medo de errar. Primeiro por se tratar do mesmo tema - a luta dos Panteras Negras e sua relação com o movimento dos direitos civis; e segundo por ser um filme simplesmente sensacional, um dos melhores do ano - inclusive indicado ao Oscar em 6 categorias.
Fred Hampton (Daniel Kaluuya) foi um ativista norte-americano taxado como uma grande ameaça pelo governo e pelo FBI. Presidente do Partido dos Panteras Negras em Chicago, dono de uma excelente oratória e de forte presença, o jovem foi considerado um dos responsáveis (ao lado de Bobby Seale e Huey P. Newton) pela luta dos direitos dos negros nos EUA pós-Martin Luther King. É quando William O’Neal (LaKeith Stanfield) acaba sendo obrigado pelo agente Roy Mitchell (Jesse Plemons) a se tornar um informante do FBI e se infiltrar no Partido com a tarefa de vigiar seu carismático líder em troca de liberdade por um crime que havia cometido. Acontece que a ligação entre eles vai se tornando cada vez mais especial, e o que parecia um missão relativamente tranquila, se torna um fantasma cada vez mais presente. Confira o trailer:
Muito bem dirigido por Shaka King, narrar a história real de uma figura tão particular como Fred Hampton, em um momento onde o tema "direitos civis" era facilmente encontrado em tantas produções de qualidade, por si só já trazia um enorme desafio para o Diretor. Não transformar "Judas e o Messias Negro" em uma outra versão de uma história que já havia sido contada, fez com que King mergulhasse nos questionamentos sobre os conflitos mais internos de um homem que não tinha para onde fugir - e é aqui que o elenco começa a se destacar, pois além de um Daniel Kaluuya impecável, LaKeith Stanfield direciona a narrativa para camadas muito mais interessantes que simplesmente o sentimento da raiva que temos ao ver a intensa brutalidade policial que se instaurou em solo norte-americano na década de 60.
A tensão de "Judas e o Messias Negro" é constante e incrivelmente amplificada por uma eletrizante trilha sonora de Mark Isham e Craig Harris. O plano-sequência inicial é um bom exemplo do que o filme vai nos provocar: nele acompanhamos o roubo de um carro logo depois de uma falsa apreensão feita por O’Neal em um bar frequentado exclusivamente por negros. O diretor usa de enquadramentos que ocultam o rosto do personagem para demonstrar como o simbolismo está presente em muitas passagens do roteiro: ali os desejos materiais simplesmente distorcem a essência do personagem e nos prepara para o que virá a seguir, mas sem precisar explicar demais.
Tecnicamente perfeito, o filme equilibra perfeitamente a luta diária dos Panteras Negras com as imperfeições de seus integrantes sem estereotipar nenhum personagem. O que vemos na tela é uma versão humana, quase documental, de todos os envolvidos naquela atmosfera de terror de Chicago. Veja, quando somos incapazes de julgar algumas atitudes depois de entender suas motivações, fica claro que a história tem muito mais a nos contar do que um pré-conceito estabelecido por posicionamento social ou politico. "Judas e o Messias Negro" é isso: uma aula de cinema, mas também de sensibilidade narrativa onde todo o elenco soube aproveitar muito bem esse presente de King.
Vale muito a pena!
Up-date: "Judas e o Messias Negro" ganhou em duas das seis categorias que disputou no Oscar 2021: Melhor Ator e Melhor Canção!
Se você gostou da série "Small Axe"e se identificou com a trama de "Os 7 de Chicago" ou de "Seberg", pode dar o play em "Judas e o Messias Negro" sem o menor medo de errar. Primeiro por se tratar do mesmo tema - a luta dos Panteras Negras e sua relação com o movimento dos direitos civis; e segundo por ser um filme simplesmente sensacional, um dos melhores do ano - inclusive indicado ao Oscar em 6 categorias.
Fred Hampton (Daniel Kaluuya) foi um ativista norte-americano taxado como uma grande ameaça pelo governo e pelo FBI. Presidente do Partido dos Panteras Negras em Chicago, dono de uma excelente oratória e de forte presença, o jovem foi considerado um dos responsáveis (ao lado de Bobby Seale e Huey P. Newton) pela luta dos direitos dos negros nos EUA pós-Martin Luther King. É quando William O’Neal (LaKeith Stanfield) acaba sendo obrigado pelo agente Roy Mitchell (Jesse Plemons) a se tornar um informante do FBI e se infiltrar no Partido com a tarefa de vigiar seu carismático líder em troca de liberdade por um crime que havia cometido. Acontece que a ligação entre eles vai se tornando cada vez mais especial, e o que parecia um missão relativamente tranquila, se torna um fantasma cada vez mais presente. Confira o trailer:
Muito bem dirigido por Shaka King, narrar a história real de uma figura tão particular como Fred Hampton, em um momento onde o tema "direitos civis" era facilmente encontrado em tantas produções de qualidade, por si só já trazia um enorme desafio para o Diretor. Não transformar "Judas e o Messias Negro" em uma outra versão de uma história que já havia sido contada, fez com que King mergulhasse nos questionamentos sobre os conflitos mais internos de um homem que não tinha para onde fugir - e é aqui que o elenco começa a se destacar, pois além de um Daniel Kaluuya impecável, LaKeith Stanfield direciona a narrativa para camadas muito mais interessantes que simplesmente o sentimento da raiva que temos ao ver a intensa brutalidade policial que se instaurou em solo norte-americano na década de 60.
A tensão de "Judas e o Messias Negro" é constante e incrivelmente amplificada por uma eletrizante trilha sonora de Mark Isham e Craig Harris. O plano-sequência inicial é um bom exemplo do que o filme vai nos provocar: nele acompanhamos o roubo de um carro logo depois de uma falsa apreensão feita por O’Neal em um bar frequentado exclusivamente por negros. O diretor usa de enquadramentos que ocultam o rosto do personagem para demonstrar como o simbolismo está presente em muitas passagens do roteiro: ali os desejos materiais simplesmente distorcem a essência do personagem e nos prepara para o que virá a seguir, mas sem precisar explicar demais.
Tecnicamente perfeito, o filme equilibra perfeitamente a luta diária dos Panteras Negras com as imperfeições de seus integrantes sem estereotipar nenhum personagem. O que vemos na tela é uma versão humana, quase documental, de todos os envolvidos naquela atmosfera de terror de Chicago. Veja, quando somos incapazes de julgar algumas atitudes depois de entender suas motivações, fica claro que a história tem muito mais a nos contar do que um pré-conceito estabelecido por posicionamento social ou politico. "Judas e o Messias Negro" é isso: uma aula de cinema, mas também de sensibilidade narrativa onde todo o elenco soube aproveitar muito bem esse presente de King.
Vale muito a pena!
Up-date: "Judas e o Messias Negro" ganhou em duas das seis categorias que disputou no Oscar 2021: Melhor Ator e Melhor Canção!
"Jury Duty" é uma daquelas séries que se destaca muito mais pela sua originalidade do que propriamente pelo seu roteiro bem amarradinho, no entanto, posso te garantir que se você gosta do estilo "The Office" de narrativa, certamente você vai se apaixonar por esse projeto experimental criado pelo Lee Eisenberg (de "WeCrashed") e pelo Gene Stupnitsky (de "Hello Ladies"), ambos de "The Office", que surpreendeu os críticos (e o público) ao receber 4 indicações no Emmy de 2023, inclusive o de "Melhor Série de Comédia". Após 6 episódios de cerca de 30 minutos cada, o que eu posso adiantar sem prejudicar sua experiência, é que aqui temos um olhar divertido que vai muito além das curiosidades do sistema judicial americano durante um julgamento - na verdade encontramos mesmo é um ótimo recorte do comportamento humano sob a perspectiva de quem acredita que pode fazer a diferença para a sociedade e, principalmente, para o seu semelhante.
"Na Mira do Júri" (título que recebeu por aqui) acompanha o desenrolar de um julgamento nos Estados Unidos pela perspectiva de Ronald Gladden, um jovem que acredita estar participando de um documentário sobre os bastidores do caso enquanto atua como júri. No entanto, o que ele realmente não sabe é que todo esse julgamento é, na verdade, falso e encenado só por atores. Confira o teaser e sinta o clima:
A grande verdade é que "Jury Duty" não passa de uma grande e hilária pegadinha com o "coitado" do Ronald, no entanto o seu diferencial está na forma como a montagem contextualiza e conta essa história - e é aí que entra o estilo "The Office" que comentei acima. Extremamente fragmentada, toda essa complexa dinâmica narrativa é mostrada seguindo uma estrutura ficcional de tal maneira a nos prender tanto pela trama quanto pelo experimento que o próprio roteiro deixa claro existir a cada inicio de episódio. Se o julgamento soa propositalmente surreal demais, é de se elogiar como o diretor Jake Szymanski (de "Brooklyn Nine-Nine") conduz a série para normalizar isso - reparem como ele usa e abusa dos close-ups das reações de Ronald a cada absurdo que acontece no tribunal ou nas situações envolvendo seus companheiros de júri.
Outro ponto que nos ajuda a acreditar que de fato Ronald não percebe que tudo é falso é a forma inteligente com que Szymanski insere o fator documental na série - ter uma equipe de filmagem próxima aos atores, colhendo os depoimentos dos personagens como se fosse reais, se alinha perfeitamente com a proposta de criar uma sensação de intimidade e veracidade que justifica tantos microfones e câmeras pelo ambiente. Agora, o fator essencial, e que realmente merece o Emmy, sem qualquer receio de cravar a vitória, diz respeito ao trabalho da produtora de elenco Susie Farris (de "Mr. Robot"). O sucesso de "Jury Duty" está na capacidade do elenco em acreditar que mesmo dentro daquela atmosfera surreal, tudo não passa de uma extensão estereotipada do jeito com que cada um se relaciona com aquela história e isso é muito difícil de conseguir - então, palmas para Farris! Como diz a própria atriz Cassandra Blair que interpreta a desconfiada e sem paciência Vanessa Jenkins: "90% somos nós, 10% nossos personagens".
Com inúmeras câmeras escondidas, habilmente reveladas pela produção no último episódio (um gran finale belíssimo) que serve para atestar que o planejamento realmente se sobrepôs às possíveis dúvidas sobre a veracidade do resultado da experiência, eu diria que "Jury Duty", definitivamente, não é sobre o fato de Ronald estar sendo enganado ou eventualmente parecer fazer papel de bobo, é sim sobre a absurdidade dos eventos e como, presenciando tudo aquilo, uma pessoa comum reagiria a eles - e aqui cabe um comentário: a presença do ator James Marsden (de "X-Men"), como ele mesmo, e a relação dele com Ronald são as cerejas do bolo dessa maluquice toda. Olha, um golaço da Amazon!
Vale muito o seu play!
"Jury Duty" é uma daquelas séries que se destaca muito mais pela sua originalidade do que propriamente pelo seu roteiro bem amarradinho, no entanto, posso te garantir que se você gosta do estilo "The Office" de narrativa, certamente você vai se apaixonar por esse projeto experimental criado pelo Lee Eisenberg (de "WeCrashed") e pelo Gene Stupnitsky (de "Hello Ladies"), ambos de "The Office", que surpreendeu os críticos (e o público) ao receber 4 indicações no Emmy de 2023, inclusive o de "Melhor Série de Comédia". Após 6 episódios de cerca de 30 minutos cada, o que eu posso adiantar sem prejudicar sua experiência, é que aqui temos um olhar divertido que vai muito além das curiosidades do sistema judicial americano durante um julgamento - na verdade encontramos mesmo é um ótimo recorte do comportamento humano sob a perspectiva de quem acredita que pode fazer a diferença para a sociedade e, principalmente, para o seu semelhante.
"Na Mira do Júri" (título que recebeu por aqui) acompanha o desenrolar de um julgamento nos Estados Unidos pela perspectiva de Ronald Gladden, um jovem que acredita estar participando de um documentário sobre os bastidores do caso enquanto atua como júri. No entanto, o que ele realmente não sabe é que todo esse julgamento é, na verdade, falso e encenado só por atores. Confira o teaser e sinta o clima:
A grande verdade é que "Jury Duty" não passa de uma grande e hilária pegadinha com o "coitado" do Ronald, no entanto o seu diferencial está na forma como a montagem contextualiza e conta essa história - e é aí que entra o estilo "The Office" que comentei acima. Extremamente fragmentada, toda essa complexa dinâmica narrativa é mostrada seguindo uma estrutura ficcional de tal maneira a nos prender tanto pela trama quanto pelo experimento que o próprio roteiro deixa claro existir a cada inicio de episódio. Se o julgamento soa propositalmente surreal demais, é de se elogiar como o diretor Jake Szymanski (de "Brooklyn Nine-Nine") conduz a série para normalizar isso - reparem como ele usa e abusa dos close-ups das reações de Ronald a cada absurdo que acontece no tribunal ou nas situações envolvendo seus companheiros de júri.
Outro ponto que nos ajuda a acreditar que de fato Ronald não percebe que tudo é falso é a forma inteligente com que Szymanski insere o fator documental na série - ter uma equipe de filmagem próxima aos atores, colhendo os depoimentos dos personagens como se fosse reais, se alinha perfeitamente com a proposta de criar uma sensação de intimidade e veracidade que justifica tantos microfones e câmeras pelo ambiente. Agora, o fator essencial, e que realmente merece o Emmy, sem qualquer receio de cravar a vitória, diz respeito ao trabalho da produtora de elenco Susie Farris (de "Mr. Robot"). O sucesso de "Jury Duty" está na capacidade do elenco em acreditar que mesmo dentro daquela atmosfera surreal, tudo não passa de uma extensão estereotipada do jeito com que cada um se relaciona com aquela história e isso é muito difícil de conseguir - então, palmas para Farris! Como diz a própria atriz Cassandra Blair que interpreta a desconfiada e sem paciência Vanessa Jenkins: "90% somos nós, 10% nossos personagens".
Com inúmeras câmeras escondidas, habilmente reveladas pela produção no último episódio (um gran finale belíssimo) que serve para atestar que o planejamento realmente se sobrepôs às possíveis dúvidas sobre a veracidade do resultado da experiência, eu diria que "Jury Duty", definitivamente, não é sobre o fato de Ronald estar sendo enganado ou eventualmente parecer fazer papel de bobo, é sim sobre a absurdidade dos eventos e como, presenciando tudo aquilo, uma pessoa comum reagiria a eles - e aqui cabe um comentário: a presença do ator James Marsden (de "X-Men"), como ele mesmo, e a relação dele com Ronald são as cerejas do bolo dessa maluquice toda. Olha, um golaço da Amazon!
Vale muito o seu play!
Talvez "Leviathan" tenha sofrido pela falta de um marketing mais potente em uma época onde as plataformas de streaming apenas engatinhavam. O fato é que esse filme foi o representante russo na disputa o Oscar de Melhor Filme Internacional de 2015 e que, embora não tenha levado a Palme d'Or em 2014, ganhou como "Melhor Roteiro" em Cannes, o Golden Globe nos EUA e teve mais de 35 vitórias e 52 indicações em festivais importantes ao redor do planeta! Dirigido pelo Andrey Zvyagintsev (de "Sem Amor"), esse é o tipo do filme que não deve ser ignorado por nenhum cinéfilo que tem no cinema independente sua jornada de descobertas. Eu diria, inclusive, que esse drama russo é uma obra-prima que soube combinar como poucos, uma narrativa poderosa com uma crítica social atemporal extremamente contundente e necessária, criando um retrato visceral e devastador da corrupção e da injustiça que assolam a sociedade desde sempre. Aclamado internacionalmente, "Leviathan" foi comparado a obras inesquecíveis como "A Separação" de Asghar Farhadi e "A Caça" de Thomas Vinterberg, pela sua habilidade única em abordar temas universais através de uma lente profundamente pessoal e culturalmente marcante.
Sua trama gira em torno de Kolya (Aleksey Serebryakov) um homem que vive em uma pequena cidade da Península de Kola, no norte da Rússia. Sua vida é virada de cabeça para baixo quando o prefeito corrupto decide tomar posse de sua casa e do terreno onde vive com sua jovem esposa Lilya (Elena Lyadova) e seu filho Romka (Sergey Pokhodaev). Desesperado, Kolya pede ajuda a Dmitriy (Vladimir Vdovichenkov), um velho amigo e advogado de Moscou, para lutar contra essa injustiça. No entanto, a chegada de advogado não traz a salvação esperada, mas sim uma série de tragédias que afundam Kolya e sua família em um abismo de desespero. Confira o trailer (com legendas em inglês):
Todos sabemos como as coisas são resolvidas na Rússia e isso, por si só, já seria o suficiente para nos dilacerar o coração ao nos conectarmos com a luta de Kolya e de sua família pelo que lhe é de direito, no entanto, inserido nesse elemento realmente dramático, existe uma sensação de abandono que é lindamente dissecada no roteiro do próprio Zvyagintsev com seu parceiro Oleg Negin - primeiro na briga com o prefeito, depois com os magistrados, com a polícia, e então, com os amigos. Veja, ao mesmo tempo que temos um filme de caráter extremamente simbólico, estamos diante da história "real" de uma vida "como tantas outras na Rússia" que é destruída em todos os aspectos pela ganância (e poder).
A direção de Zvyagintsev é magistral ao trabalhar esses aspectos de uma forma muito sensorial, utilizando a vastidão gelada da paisagem russa para refletir o vazio e a implacabilidade do sistema corrupto contra o qual Kolya luta, luta e luta - é dolorido demais, machuca de verdade. A fotografia de Mikhail Krichman (também parceiro de longa data do diretor) tem um papel fundamental na construção dessa atmosfera - eu diria até que ela é uma das jóias do filme! Repare como os planos longos e contemplativos capturam a beleza e a desolação da natureza, criando um contraste com o embate moral dos personagens que ocupam essa paisagem. Aqui, a fotografia não só estabelece o tom melancólico do filme, como também reforça a sensação angustiante de isolamento e impotência que permeia a vida de Kolya - a impressão de que algo ruim está para acontecer a cada nova cena, um medo igualmente alimentado pela sombria trilha de Philip Glass, vai te acompanhar por toda essa jornada e vai te tirar do conforto.
Tudo em "Leviathan" é provocador - de seus personagens odiosos ao ritmo deliberadamente lento que nos permite absorver a gravidade das situações enfrentadas pelo protagonista. Sim, estamos diante de um filme difícil, mas ao mesmo tempo poderoso, que combina uma crítica social contundente com uma jornada pessoal profundamente comovente. É uma obra que nos desafia a confrontar as realidades brutais da injustiça e da corrupção, enquanto oferece uma experiência absurdamente envolvente - e aqui cabe um disclaimer: "Leviathan" era minha aposta para o Oscar de 2015, um ano que tivemos "Relatos Selvagens" e a vencedora, "Ida".
Para aqueles que apreciam filmes que exploram a condição humana com uma abordagem artística e introspectiva, "Leviathan" é uma escolha indispensável, contudo já adianto: sua intensidade e crueza podem não ser tão fácil de digerir. Vale muito o seu play!
Talvez "Leviathan" tenha sofrido pela falta de um marketing mais potente em uma época onde as plataformas de streaming apenas engatinhavam. O fato é que esse filme foi o representante russo na disputa o Oscar de Melhor Filme Internacional de 2015 e que, embora não tenha levado a Palme d'Or em 2014, ganhou como "Melhor Roteiro" em Cannes, o Golden Globe nos EUA e teve mais de 35 vitórias e 52 indicações em festivais importantes ao redor do planeta! Dirigido pelo Andrey Zvyagintsev (de "Sem Amor"), esse é o tipo do filme que não deve ser ignorado por nenhum cinéfilo que tem no cinema independente sua jornada de descobertas. Eu diria, inclusive, que esse drama russo é uma obra-prima que soube combinar como poucos, uma narrativa poderosa com uma crítica social atemporal extremamente contundente e necessária, criando um retrato visceral e devastador da corrupção e da injustiça que assolam a sociedade desde sempre. Aclamado internacionalmente, "Leviathan" foi comparado a obras inesquecíveis como "A Separação" de Asghar Farhadi e "A Caça" de Thomas Vinterberg, pela sua habilidade única em abordar temas universais através de uma lente profundamente pessoal e culturalmente marcante.
Sua trama gira em torno de Kolya (Aleksey Serebryakov) um homem que vive em uma pequena cidade da Península de Kola, no norte da Rússia. Sua vida é virada de cabeça para baixo quando o prefeito corrupto decide tomar posse de sua casa e do terreno onde vive com sua jovem esposa Lilya (Elena Lyadova) e seu filho Romka (Sergey Pokhodaev). Desesperado, Kolya pede ajuda a Dmitriy (Vladimir Vdovichenkov), um velho amigo e advogado de Moscou, para lutar contra essa injustiça. No entanto, a chegada de advogado não traz a salvação esperada, mas sim uma série de tragédias que afundam Kolya e sua família em um abismo de desespero. Confira o trailer (com legendas em inglês):
Todos sabemos como as coisas são resolvidas na Rússia e isso, por si só, já seria o suficiente para nos dilacerar o coração ao nos conectarmos com a luta de Kolya e de sua família pelo que lhe é de direito, no entanto, inserido nesse elemento realmente dramático, existe uma sensação de abandono que é lindamente dissecada no roteiro do próprio Zvyagintsev com seu parceiro Oleg Negin - primeiro na briga com o prefeito, depois com os magistrados, com a polícia, e então, com os amigos. Veja, ao mesmo tempo que temos um filme de caráter extremamente simbólico, estamos diante da história "real" de uma vida "como tantas outras na Rússia" que é destruída em todos os aspectos pela ganância (e poder).
A direção de Zvyagintsev é magistral ao trabalhar esses aspectos de uma forma muito sensorial, utilizando a vastidão gelada da paisagem russa para refletir o vazio e a implacabilidade do sistema corrupto contra o qual Kolya luta, luta e luta - é dolorido demais, machuca de verdade. A fotografia de Mikhail Krichman (também parceiro de longa data do diretor) tem um papel fundamental na construção dessa atmosfera - eu diria até que ela é uma das jóias do filme! Repare como os planos longos e contemplativos capturam a beleza e a desolação da natureza, criando um contraste com o embate moral dos personagens que ocupam essa paisagem. Aqui, a fotografia não só estabelece o tom melancólico do filme, como também reforça a sensação angustiante de isolamento e impotência que permeia a vida de Kolya - a impressão de que algo ruim está para acontecer a cada nova cena, um medo igualmente alimentado pela sombria trilha de Philip Glass, vai te acompanhar por toda essa jornada e vai te tirar do conforto.
Tudo em "Leviathan" é provocador - de seus personagens odiosos ao ritmo deliberadamente lento que nos permite absorver a gravidade das situações enfrentadas pelo protagonista. Sim, estamos diante de um filme difícil, mas ao mesmo tempo poderoso, que combina uma crítica social contundente com uma jornada pessoal profundamente comovente. É uma obra que nos desafia a confrontar as realidades brutais da injustiça e da corrupção, enquanto oferece uma experiência absurdamente envolvente - e aqui cabe um disclaimer: "Leviathan" era minha aposta para o Oscar de 2015, um ano que tivemos "Relatos Selvagens" e a vencedora, "Ida".
Para aqueles que apreciam filmes que exploram a condição humana com uma abordagem artística e introspectiva, "Leviathan" é uma escolha indispensável, contudo já adianto: sua intensidade e crueza podem não ser tão fácil de digerir. Vale muito o seu play!
"Lorena" é uma minissérie documental da Prime Vídeo das mais curiosas - primeiro por se tratar de uma história incomum e segundo por ser um recorte infeliz de parte de uma sociedade americana que merece (ou não) ser estudada. Desde o inicio do documentário já nos deparamos com o circo que foi criado em cima de um fato muito sério, que teve como causa episódios de violência doméstica e como resultado uma lesão corporal das mais graves. O grande problema, no entanto, foi a espetacularização do caso e graças a isso, as consequências foram as mais cruéis para todos os envolvidos.
Em 1993, as manchetes de todo mundo divulgavam, vorazmente, a história da jovem imigrante Lorena Bobbitt que cortou o órgão genital de seu marido, John Wayne Bobbitt, um ex-fuzileiro da marinha americana. O assunto, que dominou a imprensa ao longo de todo o ano, e que virou motivo piada por muito tempo, trazia o "bizarro" como seu fator mais instigante, mas escondia uma dolorosa experiência de sofrimento fisico e psicológico contínuo ao longo de quatro anos de uma relação completamente abusiva. Confira o trailer (em inglês):
Dividida em quatro episódios de uma hora, a minissérie produzida por Jordan Peele (vencedor do Oscar por "Corra!") tenta corrigir os erros cometidos pela mídia nos anos 90, entender as motivações de Lorena para atacar John Wayne e ainda posicionar os dois lados da história de uma forma que a própria audiência tire suas conclusões - e te garanto: é impossível não julgar as atitudes dos dois personagens a cada nova informação! Obviamente, o documentário traça uma linha do tempo baseada não apenas em como o crime se tornou alvo de tabloides mundiais (com um significado cultural bem mais forte nos Estados Unidos), mas de como essa narrativa foi contada de uma forma completamente unilateral. Mesmo respeitando as limitações da época do crime, "Lorena" busca outros olhares, interpretações e acaba pontuando, da sua forma, como a sociedade lidou com tudo isso da pior maneira possível. Vale lembrar que quando o caso veio à tona, todos lembravam do membro decepado do rapaz, mas poucos comentavam sobre a moça que foi agredida e estuprada.
A minissérie é muito competente em montar um denso e complexo mapa de conexões onde nomes, locais, circunstâncias e contextos são interligados de maneira muito simples e inteligente, nos dando uma percepção bastante clara e completa sobre o caso. São depoimentos de médicos, cirurgiões, enfermeiros, socorristas, advogados, familiares, amigos e até de membros do júri, que se conectam com uma quantidade enorme (e relevante) de imagens de arquivo - aliás, em um dos episódios temos acesso aos trechos mais importantes do testemunho da própria Lorena em seu julgamento, que na época foi transmitido ao vivo pela "Court TV", e olha, são impressionantes! Sem cortes, sem trilha, apenas as palavras de uma mulher que mal consegue se comunicar, relatando como foi violentada e estuprada pelo marido - é de embrulhar o estômago e muito difícil de assistir.
Dirigida pelo talentoso Joshua Rofé, a minissérie acerta em cheio ao mostrar diversos olhares de uma mesma história sem ter a pretensão (pelo menos descaradamente) de nomear um vilão ou um mocinho. O fato é que "Lorena" explica como o senso comum preferiu se apegar ao que existe de mais superficial sobre o assunto, buscando um debate ignorante sobre violência em troca de uma audiência alta, enquanto as consequências desse silêncio serviram apenas para dar continuidade a um problema que está longe de ser extinto!
Vale muito o seu play!
"Lorena" é uma minissérie documental da Prime Vídeo das mais curiosas - primeiro por se tratar de uma história incomum e segundo por ser um recorte infeliz de parte de uma sociedade americana que merece (ou não) ser estudada. Desde o inicio do documentário já nos deparamos com o circo que foi criado em cima de um fato muito sério, que teve como causa episódios de violência doméstica e como resultado uma lesão corporal das mais graves. O grande problema, no entanto, foi a espetacularização do caso e graças a isso, as consequências foram as mais cruéis para todos os envolvidos.
Em 1993, as manchetes de todo mundo divulgavam, vorazmente, a história da jovem imigrante Lorena Bobbitt que cortou o órgão genital de seu marido, John Wayne Bobbitt, um ex-fuzileiro da marinha americana. O assunto, que dominou a imprensa ao longo de todo o ano, e que virou motivo piada por muito tempo, trazia o "bizarro" como seu fator mais instigante, mas escondia uma dolorosa experiência de sofrimento fisico e psicológico contínuo ao longo de quatro anos de uma relação completamente abusiva. Confira o trailer (em inglês):
Dividida em quatro episódios de uma hora, a minissérie produzida por Jordan Peele (vencedor do Oscar por "Corra!") tenta corrigir os erros cometidos pela mídia nos anos 90, entender as motivações de Lorena para atacar John Wayne e ainda posicionar os dois lados da história de uma forma que a própria audiência tire suas conclusões - e te garanto: é impossível não julgar as atitudes dos dois personagens a cada nova informação! Obviamente, o documentário traça uma linha do tempo baseada não apenas em como o crime se tornou alvo de tabloides mundiais (com um significado cultural bem mais forte nos Estados Unidos), mas de como essa narrativa foi contada de uma forma completamente unilateral. Mesmo respeitando as limitações da época do crime, "Lorena" busca outros olhares, interpretações e acaba pontuando, da sua forma, como a sociedade lidou com tudo isso da pior maneira possível. Vale lembrar que quando o caso veio à tona, todos lembravam do membro decepado do rapaz, mas poucos comentavam sobre a moça que foi agredida e estuprada.
A minissérie é muito competente em montar um denso e complexo mapa de conexões onde nomes, locais, circunstâncias e contextos são interligados de maneira muito simples e inteligente, nos dando uma percepção bastante clara e completa sobre o caso. São depoimentos de médicos, cirurgiões, enfermeiros, socorristas, advogados, familiares, amigos e até de membros do júri, que se conectam com uma quantidade enorme (e relevante) de imagens de arquivo - aliás, em um dos episódios temos acesso aos trechos mais importantes do testemunho da própria Lorena em seu julgamento, que na época foi transmitido ao vivo pela "Court TV", e olha, são impressionantes! Sem cortes, sem trilha, apenas as palavras de uma mulher que mal consegue se comunicar, relatando como foi violentada e estuprada pelo marido - é de embrulhar o estômago e muito difícil de assistir.
Dirigida pelo talentoso Joshua Rofé, a minissérie acerta em cheio ao mostrar diversos olhares de uma mesma história sem ter a pretensão (pelo menos descaradamente) de nomear um vilão ou um mocinho. O fato é que "Lorena" explica como o senso comum preferiu se apegar ao que existe de mais superficial sobre o assunto, buscando um debate ignorante sobre violência em troca de uma audiência alta, enquanto as consequências desse silêncio serviram apenas para dar continuidade a um problema que está longe de ser extinto!
Vale muito o seu play!
"Somos todos iguais aos olhos da lei", mas como bem completou o personagem Jake Tyler Brigance (Matthew McConaughey) em "Tempo de Matar": "o problema é que os olhos da lei são humanos!" - partindo dessa premissa, "Luta por Justiça" trás para os dias de hoje muito do que vimos na obra de John Grisham e dirigida por Joel Schumacher em 1996.
Baseada em fatos reais, o filme acompanha o jovem advogado Bryan Stevenson (Michael B. Jordan) que, após se formar em Harvard, vai para o Alabama com o propósito de defender pessoas que não contaram com uma representação adequada e foram condenadas, na sua grande maioria injustamente, pelo simples fato de serem negros. Com o apoio da advogada local Eva Ansley (Brie Larson), Stevenson assume o caso de Walter McMillian (Jammie Foxx) que, em 1987, foi condenado à morte pelo assassinato brutal de uma jovem de 18 anos. Apesar de inúmeras evidências que apontavam sua inocência (e o fato de que o único depoimento contra ele ser de um criminoso com muitos motivos para mentir), Bryan Stevenson precisa se envolver em um enorme emaranhado de manobras legais e políticas, além de enfrentar uma comunidade extremamente racista, para tentar reverter a pena de McMillian e tirá-lo definitivamente do corredor da morte!
Olha, é um grande filme, tão difícil de digerir quanto "Olhos que Condenam"(Netflix), mas vale muito a pena - agora, é preciso assistir preparado, pois o que vemos é um recorte do que existe de mais repugnante dentro de uma sociedade que se diz desenvolvida e inclusiva!
Monroeville é a cidade onde foi escrito um dos maiores clássicos da literatura americana: "O Sol é para todos"! O livro, que virou museu por lá, discute dois elementos muito bem aproveitados pelo diretor Destin Daniel Cretton (do premiadíssimo "Temporário 12"): racismo e injustiça! Por mais paradoxal que possa parecer, o maior orgulho da cidade está enraizado na história de um advogado que defende um homem negro acusado de estuprar uma mulher branca nos Estados Unidos dos anos 30 e que enfrenta enormes represálias da comunidade racista. Pois bem, a citações de "O Sol é para todos" vão além da coincidência geográfica com o caso de Walter McMillian, pois o roteiro aproveita de pequenas passagens para escancarar a hiprocrisia local - reparem na cena em que o advogado Bryan Stevenson vai visitar o promotor Tommy Chapman (Rafe Spall ) em seu gabinete. É de embrulhar o estômago!
O filme é tecnicamente muito bem realizado, tem uma dinâmica narrativa interessante - embora muitas vezes professoral demais, mas completamente justificável graças a necessidade de estabelecer os pontos jurídicos mais delicados do caso McMillian. É fato que a escolha pelo filme vai depender da sua identificação com o tema, ou seja, você só vai reclamar dessa característica mais didática, se não gostar do assunto! Fora isso, o diretor Destin Daniel Cretton foi muito inteligente em nos colocar dentro da trama ao nos apresentar um personagem simples mas carismático, brilhantemente interpretado pelo Jammie Foxx - e aqui cabe uma observação: não fosse uma das categorias mais disputadas do Oscar 2020, fatalmente Foxx seria indicado como ator coadjuvante (tanto que esteve entre os melhores no "Screen Actors Guild Awards"). Ele está impecável! Michael B. Jordan também entrega um personagem interessante e um respeitável trabalho - eu diria que é uma versão mais introspectiva de Jake Tyler Brigance, mas sem uma cena forte e impactante como nas considerações finais em "Tempo de Matar" onde Matthew McConaughey se consagrou - isso fez muita falta para Jordan brilhar como deveria! Já a presença de Brie Larson é muito mais em decorrência do seu ativismo pela causa do que por sua importância na trama - aqui Sandra Bullock deixa Brie no chinelo com sua personagem no mesmo "Tempo de Matar".
"Luta por Justiça" é o tipo do filme que, mesmo não sendo grandioso, nos faz refletir por algumas horas após sua exibição! Não é um filme inesquecível, nem original, mas extremamente importante e relevante como causa e entretenimento. É uma história que precisava ser contada e que pega carona nas séries documentais de investigação e tribunal que ganharam muitos fãs depois de "Making a Murderer", "The Jinx" e "The Staircase" - apenas para citar alguns dos recentes sucessos do streaming!
Indico de olhos fechados!
"Somos todos iguais aos olhos da lei", mas como bem completou o personagem Jake Tyler Brigance (Matthew McConaughey) em "Tempo de Matar": "o problema é que os olhos da lei são humanos!" - partindo dessa premissa, "Luta por Justiça" trás para os dias de hoje muito do que vimos na obra de John Grisham e dirigida por Joel Schumacher em 1996.
Baseada em fatos reais, o filme acompanha o jovem advogado Bryan Stevenson (Michael B. Jordan) que, após se formar em Harvard, vai para o Alabama com o propósito de defender pessoas que não contaram com uma representação adequada e foram condenadas, na sua grande maioria injustamente, pelo simples fato de serem negros. Com o apoio da advogada local Eva Ansley (Brie Larson), Stevenson assume o caso de Walter McMillian (Jammie Foxx) que, em 1987, foi condenado à morte pelo assassinato brutal de uma jovem de 18 anos. Apesar de inúmeras evidências que apontavam sua inocência (e o fato de que o único depoimento contra ele ser de um criminoso com muitos motivos para mentir), Bryan Stevenson precisa se envolver em um enorme emaranhado de manobras legais e políticas, além de enfrentar uma comunidade extremamente racista, para tentar reverter a pena de McMillian e tirá-lo definitivamente do corredor da morte!
Olha, é um grande filme, tão difícil de digerir quanto "Olhos que Condenam"(Netflix), mas vale muito a pena - agora, é preciso assistir preparado, pois o que vemos é um recorte do que existe de mais repugnante dentro de uma sociedade que se diz desenvolvida e inclusiva!
Monroeville é a cidade onde foi escrito um dos maiores clássicos da literatura americana: "O Sol é para todos"! O livro, que virou museu por lá, discute dois elementos muito bem aproveitados pelo diretor Destin Daniel Cretton (do premiadíssimo "Temporário 12"): racismo e injustiça! Por mais paradoxal que possa parecer, o maior orgulho da cidade está enraizado na história de um advogado que defende um homem negro acusado de estuprar uma mulher branca nos Estados Unidos dos anos 30 e que enfrenta enormes represálias da comunidade racista. Pois bem, a citações de "O Sol é para todos" vão além da coincidência geográfica com o caso de Walter McMillian, pois o roteiro aproveita de pequenas passagens para escancarar a hiprocrisia local - reparem na cena em que o advogado Bryan Stevenson vai visitar o promotor Tommy Chapman (Rafe Spall ) em seu gabinete. É de embrulhar o estômago!
O filme é tecnicamente muito bem realizado, tem uma dinâmica narrativa interessante - embora muitas vezes professoral demais, mas completamente justificável graças a necessidade de estabelecer os pontos jurídicos mais delicados do caso McMillian. É fato que a escolha pelo filme vai depender da sua identificação com o tema, ou seja, você só vai reclamar dessa característica mais didática, se não gostar do assunto! Fora isso, o diretor Destin Daniel Cretton foi muito inteligente em nos colocar dentro da trama ao nos apresentar um personagem simples mas carismático, brilhantemente interpretado pelo Jammie Foxx - e aqui cabe uma observação: não fosse uma das categorias mais disputadas do Oscar 2020, fatalmente Foxx seria indicado como ator coadjuvante (tanto que esteve entre os melhores no "Screen Actors Guild Awards"). Ele está impecável! Michael B. Jordan também entrega um personagem interessante e um respeitável trabalho - eu diria que é uma versão mais introspectiva de Jake Tyler Brigance, mas sem uma cena forte e impactante como nas considerações finais em "Tempo de Matar" onde Matthew McConaughey se consagrou - isso fez muita falta para Jordan brilhar como deveria! Já a presença de Brie Larson é muito mais em decorrência do seu ativismo pela causa do que por sua importância na trama - aqui Sandra Bullock deixa Brie no chinelo com sua personagem no mesmo "Tempo de Matar".
"Luta por Justiça" é o tipo do filme que, mesmo não sendo grandioso, nos faz refletir por algumas horas após sua exibição! Não é um filme inesquecível, nem original, mas extremamente importante e relevante como causa e entretenimento. É uma história que precisava ser contada e que pega carona nas séries documentais de investigação e tribunal que ganharam muitos fãs depois de "Making a Murderer", "The Jinx" e "The Staircase" - apenas para citar alguns dos recentes sucessos do streaming!
Indico de olhos fechados!
Por mais paradoxal que meu comentário possa parecer, "Making a Murderer" é uma aula de roteiro, de direção, mas, principalmente, de atuação! Que história sensacional e o quanto ela é capaz de gerar sensações tão intensas!
"Making a Murderer" é uma série documental da Netflix que conta a história deSteven Averyque, após ter passado 18 anos preso por um crime que "supostamente" não cometeu, consegue a liberdade devido a um exame de DNA que provaria sua inocência. O caso vira notícia, claro, afinal a fragilidade do sistema penal americano é completamente exposta, e quando Avery está prestes a ganhar uma gigantesca indenização do Estado, ele se torna o principal suspeito de um outro assassinato: o da fotógrafa e jornalista Teresa Halbach. Confira o trailer:
A série foi pioneira em construir uma narrativa quase ficcional para contara essa história - por isso meu comentário no inicio desse review. Com episódios de uma hora, "Making a Murderer" acompanha a investigação, o julgamento e todas as contradições que giram em torno dos dois casos envolvendo Avery.Muito bem dirigido pelas diretoras Laura Ricciardi e Moira Demos, além de incrivelmente bem editado pela própria Demos, a série é um case de storytelling! As duas trabalharam durante dez anos em cima dessa história, entrevistando pessoas próximas ao Steven Avery e até alguns dos investigadores envolvidos nos casos, mas o ponto alto da série é a forma como elas vão juntando as peças e decifrando cada um dos acontecimentos em uma linha do tempo quase imaginária, ao mesmo tempo em que continuam apurando outros fatos e juntando documentos e gravações para uma segunda temporada!
A frase de um dos advogados de Avery define exatamente o conceito da série: "você pode até ter certeza de que nunca vai cometer um crime, mas não pode ter certeza de que nunca vai ser acusado de um. Caso você seja, é isso que pode te acontecer. E é aterrorizante." - de fato não sabemos se Steven cometeu ou não um crime ou o que realmente aconteceu com Teresa Halback, mas as pessoas envolvidas são tão singulares e estão dentro de um universo tão sem noção que somos imediatamente sugados para dentro da história e ela vai nos consumindo pouco a pouco!
"Making a Murderer" ganhou quatro Emmys em 2016 e se tonou uma experiência imperdível para quem gosta de séries de investigação e mistério! Vale muito a pena no nível mais elevado que um review pode oferecer!
Por mais paradoxal que meu comentário possa parecer, "Making a Murderer" é uma aula de roteiro, de direção, mas, principalmente, de atuação! Que história sensacional e o quanto ela é capaz de gerar sensações tão intensas!
"Making a Murderer" é uma série documental da Netflix que conta a história deSteven Averyque, após ter passado 18 anos preso por um crime que "supostamente" não cometeu, consegue a liberdade devido a um exame de DNA que provaria sua inocência. O caso vira notícia, claro, afinal a fragilidade do sistema penal americano é completamente exposta, e quando Avery está prestes a ganhar uma gigantesca indenização do Estado, ele se torna o principal suspeito de um outro assassinato: o da fotógrafa e jornalista Teresa Halbach. Confira o trailer:
A série foi pioneira em construir uma narrativa quase ficcional para contara essa história - por isso meu comentário no inicio desse review. Com episódios de uma hora, "Making a Murderer" acompanha a investigação, o julgamento e todas as contradições que giram em torno dos dois casos envolvendo Avery.Muito bem dirigido pelas diretoras Laura Ricciardi e Moira Demos, além de incrivelmente bem editado pela própria Demos, a série é um case de storytelling! As duas trabalharam durante dez anos em cima dessa história, entrevistando pessoas próximas ao Steven Avery e até alguns dos investigadores envolvidos nos casos, mas o ponto alto da série é a forma como elas vão juntando as peças e decifrando cada um dos acontecimentos em uma linha do tempo quase imaginária, ao mesmo tempo em que continuam apurando outros fatos e juntando documentos e gravações para uma segunda temporada!
A frase de um dos advogados de Avery define exatamente o conceito da série: "você pode até ter certeza de que nunca vai cometer um crime, mas não pode ter certeza de que nunca vai ser acusado de um. Caso você seja, é isso que pode te acontecer. E é aterrorizante." - de fato não sabemos se Steven cometeu ou não um crime ou o que realmente aconteceu com Teresa Halback, mas as pessoas envolvidas são tão singulares e estão dentro de um universo tão sem noção que somos imediatamente sugados para dentro da história e ela vai nos consumindo pouco a pouco!
"Making a Murderer" ganhou quatro Emmys em 2016 e se tonou uma experiência imperdível para quem gosta de séries de investigação e mistério! Vale muito a pena no nível mais elevado que um review pode oferecer!
Desde o lançamento do primeiro trailer ou dos primeiros episódios que assistimos comentamos, já dava para se ter uma ideia do que seria "Mare of Easttown", mas admito: a minissérie de 7 episódios da HBO conseguiu me surpreender, ela foi além das minhas expectativas - e isso é sensacional!!!
Na história, somos apresentados a uma pequena e bucólica cidade da Pensilvânia chamada Easttown. Kate Winslet é Mare Sheehan, uma detetive de personalidade forte e muito conhecida, que trabalha diariamente para manter a ordem na sua comunidade. Outrora uma famosa jogadora de basquete no colégio local, Mare é respeitada por todos, mas parece não ter mais forças para enfrentar os inúmeros problemas pessoais no seu dia a dia: de um divórcio não digerido ao misterioso suicídio do filho mais velho. Profissionalmente, a detetive ainda precisa lidar com um importante caso não resolvido: o desaparecimento de uma jovem, filha de uma de suas amigas e companheira de time desde os tempos de escola. Porém, quando a jovem Erin McMenamin, uma mãe solteira de 17 anos, que vive às custas de um pai bêbado e de um ex-namorado imaturo; aparece morta no riacho que cruza a cidade, Mare se vê mais uma vez no olho do furacão, sendo pressionada por todos os lados, obrigada a lidar com um possível assassinato e com muitos suspeitos próximos ao seu convívio. Confira o trailer:
O mais interessante nessa minissérie criada pelo Brad Ingelsby (de "Uma Mulher Americana") é que a história vai muito além de ótimas referências do mesmo gênero já produzidas pela HBO, como "Big Little Lies"ou "Sharp Objects" - para citar apenas duas. Com um roteiro criativo, bem amarrado e extremamente original, "Mare of Easttown" é um exemplo de como uma trama bem desenvolvida pode ir além de um arco narrativo principal consistente, no caso a investigação de um crime em uma cidade pequena dos EUA, para se transformar em um primoroso estudo de personagens - e aqui eu não falo apenas de Mare (Kate Winslet); Lori (Julianne Nicholson), Helen (Jean Smart), Dawn (Enid Graham), Beth (Chinasa Ogbuagu), John (Joe Tippett), Colin (Evan Peters) são incríveis. Olha que interessante, essa quantidade de personagens, que a primeira vista pode parecer grande demais, existe justamente para criar um contexto bastante particular de Easttown e uma atmosfera tão realista que muitas vezes nos perdemos nos dramas pessoais e complexos dos coadjuvantes com a mesma força com que acompanhamos todas as camadas que Mare vai nos mostrando enquanto tenta desvendar o grande mistério e lidar com sua vida caótica.
Muito bem dirigida pelo Craig Zobel (de "Compliance" e "The Leftovers"), "Mare of Easttown" é tecnicamente perfeita, mesmo nos episódios onde foi necessário construir a complexidade daquela dinâmica ente os personagens para poder entregar um final que superasse nossa expectativa - tanto pelo lado mais humano quanto pela surpreendente narrativa cheia de reviravoltas. Se os mistérios vão sendo resolvidos um a um, os fantasmas dos personagens não - e a forma como o diretor conseguiu nos guiar por essas duas linhas conceituais que vão se completando e, óbvio, nos provocando emocionalmente é simplesmente fantástica. Os dois últimos episódios, por exemplo, são incríveis - especialmente no que diz respeito ao último interrogatório que Mare lidera. É uma facada no peito que vem se construindo desde o primeiro ato do episódio - reparem no tom, no jeito de falar, na forma como Mare tem que enfrentar aquela situação; é lindo!
"Mare of Easttown" deve ganhar tudo que disputar na próxima temporada de premiação: Kate Winslet será barbada, Julianne Nicholson e Jean Smart chegam fortes como coadjuvantes, Brad Ingelsby deve faturar em roteiro e, para mim, a minissérie é a melhor de 2021 até aqui e será difícil superá-la. Dito isso, não perca tempo, dê o play e tenha o melhor entretenimento que podemos te recomendar!
Desde o lançamento do primeiro trailer ou dos primeiros episódios que assistimos comentamos, já dava para se ter uma ideia do que seria "Mare of Easttown", mas admito: a minissérie de 7 episódios da HBO conseguiu me surpreender, ela foi além das minhas expectativas - e isso é sensacional!!!
Na história, somos apresentados a uma pequena e bucólica cidade da Pensilvânia chamada Easttown. Kate Winslet é Mare Sheehan, uma detetive de personalidade forte e muito conhecida, que trabalha diariamente para manter a ordem na sua comunidade. Outrora uma famosa jogadora de basquete no colégio local, Mare é respeitada por todos, mas parece não ter mais forças para enfrentar os inúmeros problemas pessoais no seu dia a dia: de um divórcio não digerido ao misterioso suicídio do filho mais velho. Profissionalmente, a detetive ainda precisa lidar com um importante caso não resolvido: o desaparecimento de uma jovem, filha de uma de suas amigas e companheira de time desde os tempos de escola. Porém, quando a jovem Erin McMenamin, uma mãe solteira de 17 anos, que vive às custas de um pai bêbado e de um ex-namorado imaturo; aparece morta no riacho que cruza a cidade, Mare se vê mais uma vez no olho do furacão, sendo pressionada por todos os lados, obrigada a lidar com um possível assassinato e com muitos suspeitos próximos ao seu convívio. Confira o trailer:
O mais interessante nessa minissérie criada pelo Brad Ingelsby (de "Uma Mulher Americana") é que a história vai muito além de ótimas referências do mesmo gênero já produzidas pela HBO, como "Big Little Lies"ou "Sharp Objects" - para citar apenas duas. Com um roteiro criativo, bem amarrado e extremamente original, "Mare of Easttown" é um exemplo de como uma trama bem desenvolvida pode ir além de um arco narrativo principal consistente, no caso a investigação de um crime em uma cidade pequena dos EUA, para se transformar em um primoroso estudo de personagens - e aqui eu não falo apenas de Mare (Kate Winslet); Lori (Julianne Nicholson), Helen (Jean Smart), Dawn (Enid Graham), Beth (Chinasa Ogbuagu), John (Joe Tippett), Colin (Evan Peters) são incríveis. Olha que interessante, essa quantidade de personagens, que a primeira vista pode parecer grande demais, existe justamente para criar um contexto bastante particular de Easttown e uma atmosfera tão realista que muitas vezes nos perdemos nos dramas pessoais e complexos dos coadjuvantes com a mesma força com que acompanhamos todas as camadas que Mare vai nos mostrando enquanto tenta desvendar o grande mistério e lidar com sua vida caótica.
Muito bem dirigida pelo Craig Zobel (de "Compliance" e "The Leftovers"), "Mare of Easttown" é tecnicamente perfeita, mesmo nos episódios onde foi necessário construir a complexidade daquela dinâmica ente os personagens para poder entregar um final que superasse nossa expectativa - tanto pelo lado mais humano quanto pela surpreendente narrativa cheia de reviravoltas. Se os mistérios vão sendo resolvidos um a um, os fantasmas dos personagens não - e a forma como o diretor conseguiu nos guiar por essas duas linhas conceituais que vão se completando e, óbvio, nos provocando emocionalmente é simplesmente fantástica. Os dois últimos episódios, por exemplo, são incríveis - especialmente no que diz respeito ao último interrogatório que Mare lidera. É uma facada no peito que vem se construindo desde o primeiro ato do episódio - reparem no tom, no jeito de falar, na forma como Mare tem que enfrentar aquela situação; é lindo!
"Mare of Easttown" deve ganhar tudo que disputar na próxima temporada de premiação: Kate Winslet será barbada, Julianne Nicholson e Jean Smart chegam fortes como coadjuvantes, Brad Ingelsby deve faturar em roteiro e, para mim, a minissérie é a melhor de 2021 até aqui e será difícil superá-la. Dito isso, não perca tempo, dê o play e tenha o melhor entretenimento que podemos te recomendar!
Se "Em Defesa de Jacob" o promotor Andy Barber (Chris Evans) e sua esposa Laurie (Michelle Dockery) estão cheio de dúvidas e questionamentos sobre a participação do filho, Jacob (Jaeden Martell), no assassinato do seu amigo de 14 anos; em "Mentira Incondicional" só existe uma certeza para os pais, Jay (Peter Saarsgad) e Rebecca (Mireille Enos): sua filha adolescente, Kayla (Joey King), matou sua melhor amiga!
Como na série da AppleTV+, a produção da Blumhouse para a Prime Vídeo, discute as imperfeições dos relacionamentos familiares e expõe as situações limite que alguns pais estariam dispostos a passar para proteger seus filhos, mesmo que isso possa deixar marcas para sempre e impactar no caráter de todos os envolvidos! Porém, é preciso dizer que "Mentira Incondicional" não tem um roteiro tão redondo quanto "Em Defesa de Jacob" - longe disso! Seu plot twist é bastante previsível e a justificativa extremamente superficial - quase infantil!
Então estamos falando de um filme ruim? Não acho, mas vai entrar naquela prateleira de bom entretenimento, sem grandes expectativas ou pretenções de se tornar inesquecível!
"The Lie" (título original) acompanha o drama de uma garota adolescente que confessa ter matado impulsivamente sua melhor amiga e de seus pais que, desesperados, tentam encobrir o crime, levando-os a uma complicada teia de mentiras e enganos. Confira o trailer:
Dirigido e roteirizado por Veena Sud, o filme é uma refilmagem da produção alemã "Wir Monster" (de 2015) do diretor Sebatian Ko. Se "Mentira Incondicional" tem uma interessante premissa, e isso é um fato; sua execução é rodeada de estereótipos e superficialidade para aqueles adeptos ao gênero de suspense policial. Justamente por isso, essa recomendação precisa ser relativizada de acordo com sua disposição de se abster de um desenvolvimento de personagens mais profundo e de uma história que possa surpreender ou, pelo menos, nos provocar alguma dúvida! Eu diria que o filme pode agradar, mas não será uma unanimidade!
"Mentira Incondicional" é muito bem realizado, isso é inegável, principalmente por ter um primeiro ato muito bom, com uma proposta documental (e emocional) na apresentação dos personagens que te prende logo de cara! Com o elo emocional estabelecido, a construção do drama nos dá a impressão que não vamos conseguir escapar da tensão e angústia do "quanto mais eu faço, mais eu me complico" - tão comum nesse tipo de narrativa. Acontece que o segundo ato cria uma "barriga" muito grande, não nos levando a lugar algum e, pior, nos afasta do sentimento de desconfiança, pelo simples fato dos diálogos parecerem um conjunto de desculpas superficiais que não engana ninguém. A falta de uma investigação de verdade, e aqui a escolha do elenco prejudicou muito o filme, nos tira o beneficio da dúvida, do julgamento ou da identificação com a situação e com os personagens - em nenhum momento deixamos de saber para quem devemos torce ou nos perguntamos quem é o verdadeiro bandidor!
Agora, alguns pontos merecem destaque: gosto muito do trabalho da Mireille Enos - ela consegue passar o desespero que aquela família está vivendo. Se Peter Saarsgad não tem o mesmo talento, pelo menos não compromete. A fotografia do canadense, Peter Wunstorf, que inclusive esteve no sensacional "The Killing"; é muito interessante - principalmente por estar completamente alinhada ao conceito narrativo que Veena Sud imprime na história. A forma como ela enquadra os personagens, com planos extremamente fechados, justificam os objetivos da cena, criando lampejos de emoção.
A verdade é que não dá para comparar "Mentira Incondicional" com "Em Defesa de Jacob", mas também seria injusto colocá-los em lados tão opostos de qualidade. A produção da Blumhouse talvez tenha se limitado ao potencial da história e seu resultado tenha ficado apenas no mediano diante da expectativa, mas reafirmo: como "sessão da tarde" vai cumprir sua função e se dormir, dormiu!
Se "Em Defesa de Jacob" o promotor Andy Barber (Chris Evans) e sua esposa Laurie (Michelle Dockery) estão cheio de dúvidas e questionamentos sobre a participação do filho, Jacob (Jaeden Martell), no assassinato do seu amigo de 14 anos; em "Mentira Incondicional" só existe uma certeza para os pais, Jay (Peter Saarsgad) e Rebecca (Mireille Enos): sua filha adolescente, Kayla (Joey King), matou sua melhor amiga!
Como na série da AppleTV+, a produção da Blumhouse para a Prime Vídeo, discute as imperfeições dos relacionamentos familiares e expõe as situações limite que alguns pais estariam dispostos a passar para proteger seus filhos, mesmo que isso possa deixar marcas para sempre e impactar no caráter de todos os envolvidos! Porém, é preciso dizer que "Mentira Incondicional" não tem um roteiro tão redondo quanto "Em Defesa de Jacob" - longe disso! Seu plot twist é bastante previsível e a justificativa extremamente superficial - quase infantil!
Então estamos falando de um filme ruim? Não acho, mas vai entrar naquela prateleira de bom entretenimento, sem grandes expectativas ou pretenções de se tornar inesquecível!
"The Lie" (título original) acompanha o drama de uma garota adolescente que confessa ter matado impulsivamente sua melhor amiga e de seus pais que, desesperados, tentam encobrir o crime, levando-os a uma complicada teia de mentiras e enganos. Confira o trailer:
Dirigido e roteirizado por Veena Sud, o filme é uma refilmagem da produção alemã "Wir Monster" (de 2015) do diretor Sebatian Ko. Se "Mentira Incondicional" tem uma interessante premissa, e isso é um fato; sua execução é rodeada de estereótipos e superficialidade para aqueles adeptos ao gênero de suspense policial. Justamente por isso, essa recomendação precisa ser relativizada de acordo com sua disposição de se abster de um desenvolvimento de personagens mais profundo e de uma história que possa surpreender ou, pelo menos, nos provocar alguma dúvida! Eu diria que o filme pode agradar, mas não será uma unanimidade!
"Mentira Incondicional" é muito bem realizado, isso é inegável, principalmente por ter um primeiro ato muito bom, com uma proposta documental (e emocional) na apresentação dos personagens que te prende logo de cara! Com o elo emocional estabelecido, a construção do drama nos dá a impressão que não vamos conseguir escapar da tensão e angústia do "quanto mais eu faço, mais eu me complico" - tão comum nesse tipo de narrativa. Acontece que o segundo ato cria uma "barriga" muito grande, não nos levando a lugar algum e, pior, nos afasta do sentimento de desconfiança, pelo simples fato dos diálogos parecerem um conjunto de desculpas superficiais que não engana ninguém. A falta de uma investigação de verdade, e aqui a escolha do elenco prejudicou muito o filme, nos tira o beneficio da dúvida, do julgamento ou da identificação com a situação e com os personagens - em nenhum momento deixamos de saber para quem devemos torce ou nos perguntamos quem é o verdadeiro bandidor!
Agora, alguns pontos merecem destaque: gosto muito do trabalho da Mireille Enos - ela consegue passar o desespero que aquela família está vivendo. Se Peter Saarsgad não tem o mesmo talento, pelo menos não compromete. A fotografia do canadense, Peter Wunstorf, que inclusive esteve no sensacional "The Killing"; é muito interessante - principalmente por estar completamente alinhada ao conceito narrativo que Veena Sud imprime na história. A forma como ela enquadra os personagens, com planos extremamente fechados, justificam os objetivos da cena, criando lampejos de emoção.
A verdade é que não dá para comparar "Mentira Incondicional" com "Em Defesa de Jacob", mas também seria injusto colocá-los em lados tão opostos de qualidade. A produção da Blumhouse talvez tenha se limitado ao potencial da história e seu resultado tenha ficado apenas no mediano diante da expectativa, mas reafirmo: como "sessão da tarde" vai cumprir sua função e se dormir, dormiu!
Olha, assistir "Mergulho" não será uma jornada das mais tranquilas - e se você conhece o documentário da Netflix, "Atleta A", você vai entender exatamente onde quero chegar. Embora essa co-produção Argentina/México, dirigida pela premiada Lucía Puenzo (de "XXY" e "Wakolda"), seja apenas um recorte de uma história real de abuso entre um treinador e suas atletas olímpicas, é impressionante como ela vai além do óbvio para pontuar, com muita sensibilidade, todas as marcas deixadas na protagonista - e, claro, como essa mesma protagonista revisita suas angustias do passado para tentar lidar com as dores do presente.
Na trama conhecemos Mariel (Karla Souza), uma atleta mexicana dos saltos ornamentais que tem sua última chance de conquistar uma medalha olímpica, dessa vez em Athenas, na Grécia. Só que às vésperas da competição, um escândalo envolvendo seu treinador (que comanda a vitoriosa equipe há mais de duas décadas) e uma jovem revelação da modalidade, acaba gerando lembranças terríveis do seu passado. Confira o trailer (em espanhol):
"La Caída" (no original) traz para discussão o caso verídico de um famoso escândalo na Federação Mexicana de Natação, quando os pais da atleta Luara Sánchez, então com 15 anos, denunciaram que o técnico Francisco Rueda estava abusando de sua filha. O interessante porém, é que no filme o foco não está em Luara (que recebeu o nome de Nadia e foi interpretada pela Dèja Ebergenyi), mas sim em uma personagem fictícia que engloba uma série de atletas reais que, infelizmente, também sofreram abusos durante as respectivas carreiras.
O roteiro foi muito inteligente ao equilibrar os fatos relacionados à Nadia com os fantasmas mais profundos e mais íntimos de inúmeras atletas personificadas em Mariel. Isso trouxe certa liberdade narrativa, já que fica claro que existe o trauma da protagonista, mas que na história priorizar o conflito constante com a verdade parece ser o melhor caminho: seja expondo as preocupações de uma mãe de uma adolescente, seja na luta de uma mulher para lidar com seu passado, mesmo que se sabotando e fazendo inúmeras besteiras no presente. Ao adicionarmos na trama a pressão de uma grande competição que se aproxima, ainda entra em cena um período de "medo" potencializado pelas lembranças escondidas, pelo descontrole emocional e pelo abuso psicológico de quem quer controlar a narrativa sempre, ou seja, a sensação é de que acionamos uma bomba relógio e estamos esperando ela explodir - "quando" é o que nos faz não tirar os olhos da tela.
Como na história de Maggie Nichols, que teve seu sonho de disputar uma Olimpíada ceifado por uma Federação Americana hipócrita, mais preocupada com uma medalha de ouro do que com o respeito por suas ginastas, de 13 anos, que foram abusadas sistematicamente por Larry Nassar; "Mergulho" investiga, explora e expõe os fatos sem julgar a vitima - pelo olhar de quem se reconhece na dor e não necessariamente de quem está vivendo e acredita que aquilo tudo faz parte do seu amadurecimento como mulher. Aliás, a linha tênue entre duas percepções diferentes ganha ainda mais força quando descobrimos que, na vida real, Franciso Rueda foi mesmo banido do esporte, mas mesmo assim ainda se casou com Luara Sánchez anos depois do escândalo.
Vale muito o seu play!
Olha, assistir "Mergulho" não será uma jornada das mais tranquilas - e se você conhece o documentário da Netflix, "Atleta A", você vai entender exatamente onde quero chegar. Embora essa co-produção Argentina/México, dirigida pela premiada Lucía Puenzo (de "XXY" e "Wakolda"), seja apenas um recorte de uma história real de abuso entre um treinador e suas atletas olímpicas, é impressionante como ela vai além do óbvio para pontuar, com muita sensibilidade, todas as marcas deixadas na protagonista - e, claro, como essa mesma protagonista revisita suas angustias do passado para tentar lidar com as dores do presente.
Na trama conhecemos Mariel (Karla Souza), uma atleta mexicana dos saltos ornamentais que tem sua última chance de conquistar uma medalha olímpica, dessa vez em Athenas, na Grécia. Só que às vésperas da competição, um escândalo envolvendo seu treinador (que comanda a vitoriosa equipe há mais de duas décadas) e uma jovem revelação da modalidade, acaba gerando lembranças terríveis do seu passado. Confira o trailer (em espanhol):
"La Caída" (no original) traz para discussão o caso verídico de um famoso escândalo na Federação Mexicana de Natação, quando os pais da atleta Luara Sánchez, então com 15 anos, denunciaram que o técnico Francisco Rueda estava abusando de sua filha. O interessante porém, é que no filme o foco não está em Luara (que recebeu o nome de Nadia e foi interpretada pela Dèja Ebergenyi), mas sim em uma personagem fictícia que engloba uma série de atletas reais que, infelizmente, também sofreram abusos durante as respectivas carreiras.
O roteiro foi muito inteligente ao equilibrar os fatos relacionados à Nadia com os fantasmas mais profundos e mais íntimos de inúmeras atletas personificadas em Mariel. Isso trouxe certa liberdade narrativa, já que fica claro que existe o trauma da protagonista, mas que na história priorizar o conflito constante com a verdade parece ser o melhor caminho: seja expondo as preocupações de uma mãe de uma adolescente, seja na luta de uma mulher para lidar com seu passado, mesmo que se sabotando e fazendo inúmeras besteiras no presente. Ao adicionarmos na trama a pressão de uma grande competição que se aproxima, ainda entra em cena um período de "medo" potencializado pelas lembranças escondidas, pelo descontrole emocional e pelo abuso psicológico de quem quer controlar a narrativa sempre, ou seja, a sensação é de que acionamos uma bomba relógio e estamos esperando ela explodir - "quando" é o que nos faz não tirar os olhos da tela.
Como na história de Maggie Nichols, que teve seu sonho de disputar uma Olimpíada ceifado por uma Federação Americana hipócrita, mais preocupada com uma medalha de ouro do que com o respeito por suas ginastas, de 13 anos, que foram abusadas sistematicamente por Larry Nassar; "Mergulho" investiga, explora e expõe os fatos sem julgar a vitima - pelo olhar de quem se reconhece na dor e não necessariamente de quem está vivendo e acredita que aquilo tudo faz parte do seu amadurecimento como mulher. Aliás, a linha tênue entre duas percepções diferentes ganha ainda mais força quando descobrimos que, na vida real, Franciso Rueda foi mesmo banido do esporte, mas mesmo assim ainda se casou com Luara Sánchez anos depois do escândalo.
Vale muito o seu play!