Poucos filmes me incomodaram tanto pela realidade brutal quanto "Depois de Lucia". Essa produção mexicana que recebeu o prêmio “Un Certain Regard”, no Festival de Cannes de 2012, discute o bullying de uma forma tão visceral que é quase insuportável assistir as quase duas horas de filme - ele é tão provocador e profundo na sua proposta que gostaríamos que a história durasse pelo menos mais trinta minutos para que todos os "pontos nos is" fossem colocados. De fato a sensação não é agradável, ou seja, não estamos falando de entretenimento, por outro lado, a mensagem que mais vinha na minha cabeça de pai (de menina) era: precisamos olhar pelos nossos filhos, sempre!
Quando a esposa de Roberto (Gonzalo Vega Jr.) morre em um acidente de carro, a relação dele com sua filha Alejandra (Tessa Ia), de 15 anos, fica abalada. Para escapar da tristeza que toma conta da rotina dos dois, pai e filha deixam a cidade de Vallarda e rumam para a Cidade do México em busca de uma nova vida. Alejandra ingressa em um novo colégio, e passa a sentir toda a dificuldade de começar de novo quando, gratuitamente, começa sofrer abusos físicos e emocionais dos colegas. Envergonhada, a menina não conta nada para o pai, e à medida que a violência toma conta da vida dos dois, eles vão se afastando cada vez mais. Confira o trailer:
Se é preciso falar sobre bullying, assistir "Depois de Lucia" é um bom começo - embora a jornada seja das mais penosas e não porquê o filme seja ruim, muito pelo contrário, mas porquê ele é muito bom! As sensações que o diretor Michel Franco consegue nos provocar são doloridas, reflexivas, revoltantes até. Aqui, é impossível não se conectar com Ale e, claro, entender as dores de Roberto - e o filme não se apropria de diálogos expositivos ou de qualquer tipo de verborragia, são as ações, muitas vezes em silêncio, que nos tocam a alma.
Se em "13 Reasons Why" o conceito narrativo se apropriou de uma linguagem mais jovem para equilibrar a seriedade do assunto com uma certa leveza visual para expor a influência dos personagens (e do meio) no destino da protagonista, em "Depois de Lucia" o tom é praticamente o inverso - o drama é pesado e o terror psicológico é quase o ponto de partida do segundo ato. Veja, Franco não economiza nos planos mais longos, cirurgicamente ensaiados e extremamente bem dirigidos em um mise-en-scène tão bem executado que chega a soar que os diálogos são improvisados dado o poder da naturalidade dos jovens atores - de todos. A câmera está sempre no lugar certo para contar a história, muitas vezes estática e abdicando da gramática usual do "plano e contra-plano", tudo isso para nos colocar na raiz do problema, no olho do furacão, com a terrível função de apenas observar, tornando o filme (e a experiência) bastante desconfortável.
Tecnicamente o bullying é um mecanismo grupal através de onde um bode expiatório, objeto de projeções maciças do grupo, é escolhido e sacrificado. É uma forma patológica de manejar as tensões do grupo, descarregando sobre um de seus membros, geralmente o mais frágil e indefeso, a agressividade de todos. Dito isso, não se pode fechar os olhos para o problema, já que muitas das atitudes do grupo se apoiam na desculpa da imaturidade para se safar das responsabilidades. O filme explora perfeitamente essa dinâmica e, mais uma vez, mesmo indigesto, consegue nos fazer refletir e, principalmente, abrir os olhos para um problema que só vem piorando, de geração para geração.
Se você já for pai, assista. Se ainda não for, esteja preparado.
Vale muito o seu play!
Poucos filmes me incomodaram tanto pela realidade brutal quanto "Depois de Lucia". Essa produção mexicana que recebeu o prêmio “Un Certain Regard”, no Festival de Cannes de 2012, discute o bullying de uma forma tão visceral que é quase insuportável assistir as quase duas horas de filme - ele é tão provocador e profundo na sua proposta que gostaríamos que a história durasse pelo menos mais trinta minutos para que todos os "pontos nos is" fossem colocados. De fato a sensação não é agradável, ou seja, não estamos falando de entretenimento, por outro lado, a mensagem que mais vinha na minha cabeça de pai (de menina) era: precisamos olhar pelos nossos filhos, sempre!
Quando a esposa de Roberto (Gonzalo Vega Jr.) morre em um acidente de carro, a relação dele com sua filha Alejandra (Tessa Ia), de 15 anos, fica abalada. Para escapar da tristeza que toma conta da rotina dos dois, pai e filha deixam a cidade de Vallarda e rumam para a Cidade do México em busca de uma nova vida. Alejandra ingressa em um novo colégio, e passa a sentir toda a dificuldade de começar de novo quando, gratuitamente, começa sofrer abusos físicos e emocionais dos colegas. Envergonhada, a menina não conta nada para o pai, e à medida que a violência toma conta da vida dos dois, eles vão se afastando cada vez mais. Confira o trailer:
Se é preciso falar sobre bullying, assistir "Depois de Lucia" é um bom começo - embora a jornada seja das mais penosas e não porquê o filme seja ruim, muito pelo contrário, mas porquê ele é muito bom! As sensações que o diretor Michel Franco consegue nos provocar são doloridas, reflexivas, revoltantes até. Aqui, é impossível não se conectar com Ale e, claro, entender as dores de Roberto - e o filme não se apropria de diálogos expositivos ou de qualquer tipo de verborragia, são as ações, muitas vezes em silêncio, que nos tocam a alma.
Se em "13 Reasons Why" o conceito narrativo se apropriou de uma linguagem mais jovem para equilibrar a seriedade do assunto com uma certa leveza visual para expor a influência dos personagens (e do meio) no destino da protagonista, em "Depois de Lucia" o tom é praticamente o inverso - o drama é pesado e o terror psicológico é quase o ponto de partida do segundo ato. Veja, Franco não economiza nos planos mais longos, cirurgicamente ensaiados e extremamente bem dirigidos em um mise-en-scène tão bem executado que chega a soar que os diálogos são improvisados dado o poder da naturalidade dos jovens atores - de todos. A câmera está sempre no lugar certo para contar a história, muitas vezes estática e abdicando da gramática usual do "plano e contra-plano", tudo isso para nos colocar na raiz do problema, no olho do furacão, com a terrível função de apenas observar, tornando o filme (e a experiência) bastante desconfortável.
Tecnicamente o bullying é um mecanismo grupal através de onde um bode expiatório, objeto de projeções maciças do grupo, é escolhido e sacrificado. É uma forma patológica de manejar as tensões do grupo, descarregando sobre um de seus membros, geralmente o mais frágil e indefeso, a agressividade de todos. Dito isso, não se pode fechar os olhos para o problema, já que muitas das atitudes do grupo se apoiam na desculpa da imaturidade para se safar das responsabilidades. O filme explora perfeitamente essa dinâmica e, mais uma vez, mesmo indigesto, consegue nos fazer refletir e, principalmente, abrir os olhos para um problema que só vem piorando, de geração para geração.
Se você já for pai, assista. Se ainda não for, esteja preparado.
Vale muito o seu play!
Se "O Céu da Meia-Noite" da Netflix trouxe alguns elementos do cinema catástrofe que esteve tão em evidência em 1998, e estamos falando mais especificamente de "Armageddon", "Destruição Final" da Amazon Prime Vídeo segue exatamente a mesma receita, mas buscando referências de outro filme lançado no mesmo ano e igualmente reconhecido: "Impacto Profundo"! Ou seja, se dois desses três filmes significaram um bom entretenimento para você, pode dar o play sem o menor receio porque a diversão está garantida!
"Destruição Final" (que tem "O Último Refúgio"como sub-título) acompanha aquela trama padrão de filmes catástrofe: um cometa está passando pela órbita da Terra e o que inicialmente parecia apenas curiosidade logo se transforma em terror quando o corpo celeste começa a se partir e seus fragmentos passam a causar uma devastação global sem precedentes. Ao longo da história, porém, acompanhamos a jornada da família de John Garrity (Gerard Butler) que, sorteados pelo governo, buscam chegar a um local seguro, uma espécie de bunker construído na Groenlândia. Confira o trailer:
O filme de Ric Roman Waugh (deInvasão ao Serviço Secreto) bebe da fonte de clássicos como o já citado "Impacto Profundo" (de Mimi Leder), mas também trás muitos elementos de "2012" (de Roland Emmerich) e, especialmente, de "Guerra dos Mundos", filme dirigido porSteven Spielberg, que se apega a luta de um homem pela vida de sua família em um momento de reconstrução da relação. Dito isso fica muito fácil afirmar que o roteiro de Chris Sparling segue a receita do gênero, mas peca em um único detalhe: você não vai encontrar uma cena marcante da destruição causada pelo cometa e isso, para mim, é um ponto bem sensível do filme - culpa do orçamento! Não que faça falta, mas estamos falando de entretenimento de gênero, a expectativa sempre vai existir quando escolhemos um filme como esse e aqui o impacto catastrófico é solucionado por reportagens da imprensa ao redor do mundo que misturam planos bem fechado e montagens que usam de pontos turísticos ou construções simbólicas para localizar a destruição, mas com um detalhe muito interessante: essas estruturas construídas pelo homem sobrevivem, já o próprio homem... Reparem!
Com total controle de suas limitações orçamentárias, o diretor Ric Roman Waugh usa e abusa da criatividade para nos entregar ótimos momentos de ação e planos bem impactantes onde o horror nos olhos de quem vê é mais importante do que, de fato, a destruição que ele está testemunhando. A angústia dos personagens em busca de sobrevivência é a principal linha narrativa, o resto é perfumaria - superficial, mas divertida!
"Destruição Final" (ou "Greenland", título original) é uma ótima sessão da tarde, sem pretensões de ser inesquecível, mas que traz para o sofá um entretenimento raiz, sem teorizações e alívios poéticos - é pura, e simplesmente, diversão! Vale o play!
Se "O Céu da Meia-Noite" da Netflix trouxe alguns elementos do cinema catástrofe que esteve tão em evidência em 1998, e estamos falando mais especificamente de "Armageddon", "Destruição Final" da Amazon Prime Vídeo segue exatamente a mesma receita, mas buscando referências de outro filme lançado no mesmo ano e igualmente reconhecido: "Impacto Profundo"! Ou seja, se dois desses três filmes significaram um bom entretenimento para você, pode dar o play sem o menor receio porque a diversão está garantida!
"Destruição Final" (que tem "O Último Refúgio"como sub-título) acompanha aquela trama padrão de filmes catástrofe: um cometa está passando pela órbita da Terra e o que inicialmente parecia apenas curiosidade logo se transforma em terror quando o corpo celeste começa a se partir e seus fragmentos passam a causar uma devastação global sem precedentes. Ao longo da história, porém, acompanhamos a jornada da família de John Garrity (Gerard Butler) que, sorteados pelo governo, buscam chegar a um local seguro, uma espécie de bunker construído na Groenlândia. Confira o trailer:
O filme de Ric Roman Waugh (deInvasão ao Serviço Secreto) bebe da fonte de clássicos como o já citado "Impacto Profundo" (de Mimi Leder), mas também trás muitos elementos de "2012" (de Roland Emmerich) e, especialmente, de "Guerra dos Mundos", filme dirigido porSteven Spielberg, que se apega a luta de um homem pela vida de sua família em um momento de reconstrução da relação. Dito isso fica muito fácil afirmar que o roteiro de Chris Sparling segue a receita do gênero, mas peca em um único detalhe: você não vai encontrar uma cena marcante da destruição causada pelo cometa e isso, para mim, é um ponto bem sensível do filme - culpa do orçamento! Não que faça falta, mas estamos falando de entretenimento de gênero, a expectativa sempre vai existir quando escolhemos um filme como esse e aqui o impacto catastrófico é solucionado por reportagens da imprensa ao redor do mundo que misturam planos bem fechado e montagens que usam de pontos turísticos ou construções simbólicas para localizar a destruição, mas com um detalhe muito interessante: essas estruturas construídas pelo homem sobrevivem, já o próprio homem... Reparem!
Com total controle de suas limitações orçamentárias, o diretor Ric Roman Waugh usa e abusa da criatividade para nos entregar ótimos momentos de ação e planos bem impactantes onde o horror nos olhos de quem vê é mais importante do que, de fato, a destruição que ele está testemunhando. A angústia dos personagens em busca de sobrevivência é a principal linha narrativa, o resto é perfumaria - superficial, mas divertida!
"Destruição Final" (ou "Greenland", título original) é uma ótima sessão da tarde, sem pretensões de ser inesquecível, mas que traz para o sofá um entretenimento raiz, sem teorizações e alívios poéticos - é pura, e simplesmente, diversão! Vale o play!
"Diana", filme que erroneamente foi vendido como uma cinebiografia, é uma espécie de "Um Lugar Chamado Notting Hill" da vida real - e não falo isso com demérito algum, mas é preciso alinhar as expectativas para que você não se decepcione com o recorte (e o caminho) escolhido para contar como foram os dois últimos anos de vida da princesa Diana, entre sua chocante entrevista para e jornalista Martin Bashir do programaPanorama, da BBC, em novembro de 1995 até sua morte em 31 de agosto de 1997, em Paris.
O filme mostra, basicamente, a princesa Diana (Naomi Watts), a mulher mais famosa do mundo na época, embarcando em um caso de amor complicado com um homem simples e reservado, o cirurgião cardíaco paquistanês Hasnat Khan (Naveen Andrews). Confira o trailer (em inglês):
Dirigido por Oliver Hirschbiegel (de "A Queda! As Últimas Horas de Hitler"), "Diana" é um filme agradável de assistir, mas funciona muito mais como curiosidade do que por sua narrativa dramática e cheia de camadas de uma protagonista complexa que todos conhecem seu destino. "Diana" é um sopro do que poderia representar uma cinebiografia de uma personalidade com esse tamanho, embora o roteiro Stephen Jeffreys, inspirado no livro de Kate Snell, "Diana Her Last Love'", deixe claro isso desde o seu início, ou seja, em hipótese nenhuma, depois do play, pode-se dizer que a audiência foi enganada. Tirando algumas passagens como quando Diana cruza o olhar com o médico Hasnat Khan e na cena seguinte ela já está sonhando com a cabeça no travesseiro, toda apaixonada; Hirschbiegel e Jeffreys foram muito felizes em expor alguns detalhes da intimidade da princesa sem precisar coloca-la em um pedestal. Se sua fama destruiu sua privacidade, afastou o que seria seu grande amor e a separou de seus filhos, seu ativismo em causas nobres e a forma como ela manipulava a imprensa também ajudou a transformar sua vida - a passagem que mostra sua relação com o repórter do "The Sun" para vazar as famosas fotos dela com Dodi Fayed (Cas Anvar) em seu iate, é um bom exemplo disso.
Muito bem fotografado pelo suíço Rainer Klausmann (do excelente "Em Pedaços"), "Diana" não compromete em absolutamente nenhum elemento técnico ou artístico. Naomi Watts fez um excelente trabalho - uma construção de personagem que merece elogios e, principalmente, com uma consciência corporal bastante competente, trazendo para tela vários trejeitos da Diana que, ao lado da maquiagem, facilmente nos transportam para o passado.
O farto é que "Diana" deixa um gostinho de "quero mais" por imaginarmos que sua vida seria muito mais interessante do que a que foi retratada no filme - mas repito, isso não diminui o valor da historia já que esse não era o objetivo e ponto final! Talvez em "The Crown" ou em "Spencer", filme dirigido por Pablo Larraín e com Kristen Stewart como protagonista, tenhamos isso. A questão do desejo das pessoas em viver uma vida através das atitudes de seus ídolos e o papel da mídia sensacionalista inglesa nisso tudo é até mencionada, mas sem muita força. Então lembre-se: "Diana" é "Um Lugar Chamado Notting Hill" da vida real e mais nada!
Dito isso, vale o play tranquilamente!
"Diana", filme que erroneamente foi vendido como uma cinebiografia, é uma espécie de "Um Lugar Chamado Notting Hill" da vida real - e não falo isso com demérito algum, mas é preciso alinhar as expectativas para que você não se decepcione com o recorte (e o caminho) escolhido para contar como foram os dois últimos anos de vida da princesa Diana, entre sua chocante entrevista para e jornalista Martin Bashir do programaPanorama, da BBC, em novembro de 1995 até sua morte em 31 de agosto de 1997, em Paris.
O filme mostra, basicamente, a princesa Diana (Naomi Watts), a mulher mais famosa do mundo na época, embarcando em um caso de amor complicado com um homem simples e reservado, o cirurgião cardíaco paquistanês Hasnat Khan (Naveen Andrews). Confira o trailer (em inglês):
Dirigido por Oliver Hirschbiegel (de "A Queda! As Últimas Horas de Hitler"), "Diana" é um filme agradável de assistir, mas funciona muito mais como curiosidade do que por sua narrativa dramática e cheia de camadas de uma protagonista complexa que todos conhecem seu destino. "Diana" é um sopro do que poderia representar uma cinebiografia de uma personalidade com esse tamanho, embora o roteiro Stephen Jeffreys, inspirado no livro de Kate Snell, "Diana Her Last Love'", deixe claro isso desde o seu início, ou seja, em hipótese nenhuma, depois do play, pode-se dizer que a audiência foi enganada. Tirando algumas passagens como quando Diana cruza o olhar com o médico Hasnat Khan e na cena seguinte ela já está sonhando com a cabeça no travesseiro, toda apaixonada; Hirschbiegel e Jeffreys foram muito felizes em expor alguns detalhes da intimidade da princesa sem precisar coloca-la em um pedestal. Se sua fama destruiu sua privacidade, afastou o que seria seu grande amor e a separou de seus filhos, seu ativismo em causas nobres e a forma como ela manipulava a imprensa também ajudou a transformar sua vida - a passagem que mostra sua relação com o repórter do "The Sun" para vazar as famosas fotos dela com Dodi Fayed (Cas Anvar) em seu iate, é um bom exemplo disso.
Muito bem fotografado pelo suíço Rainer Klausmann (do excelente "Em Pedaços"), "Diana" não compromete em absolutamente nenhum elemento técnico ou artístico. Naomi Watts fez um excelente trabalho - uma construção de personagem que merece elogios e, principalmente, com uma consciência corporal bastante competente, trazendo para tela vários trejeitos da Diana que, ao lado da maquiagem, facilmente nos transportam para o passado.
O farto é que "Diana" deixa um gostinho de "quero mais" por imaginarmos que sua vida seria muito mais interessante do que a que foi retratada no filme - mas repito, isso não diminui o valor da historia já que esse não era o objetivo e ponto final! Talvez em "The Crown" ou em "Spencer", filme dirigido por Pablo Larraín e com Kristen Stewart como protagonista, tenhamos isso. A questão do desejo das pessoas em viver uma vida através das atitudes de seus ídolos e o papel da mídia sensacionalista inglesa nisso tudo é até mencionada, mas sem muita força. Então lembre-se: "Diana" é "Um Lugar Chamado Notting Hill" da vida real e mais nada!
Dito isso, vale o play tranquilamente!
E se toda memória que te assombrou a vida inteira pudesse ser apagada? E se algo realmente horrível tivesse acontecido na sua infância e a pessoa que você mais ama pudesse tirar isso da sua mente?
Com essa premissa, qualquer filme ou série de ficção já chamaria a atenção de muita gente, certo? A grande questão é que "Diga quem sou" é um documentário! Um excelente documentário, eu diria! O filme mostra o dilema ético que Marcus Lewis, na época com 18 anos, enfrentou quando seu irmão gêmeo, Alex, despertou do coma após um acidente de moto, completamente sem memória. Marcus foi a única pessoa que ele reconheceu. Alex, então, confiou inteiramente em seu irmão para que pudesse reconstruir o seu passado a partir das lembranças que o irmão descrevia, porém nem tudo precisava ser dito e é aí que o documentário começa ganhar força, pois a todo momento nos colocamos na pele de Marcus e, mesmo sem entender a razão exata das suas escolhas, iniciamos um processo natural de julgamento: qual o preço que devemos pagar por nem sempre falarmos a verdade?
Se prepare, pois essa discussão moral de "Diga quem sou" é surpreendente, principalmente por tudo que vamos descobrindo durante o filme. Agora, nem de longe é um documentário fácil de digerir ou de aceitar, mas certamente te fará refletir muito!
"Diga quem sou" é dividido em três partes muito bem definidas: Primeiro acompanhamos o ponto de vista de Alex e como ele lidou com sua nova condição, sua relação com a família, amigos, namorada e, claro, com o apoio do irmão no processo de reaprendizado. Depois é a vez de Marcus e como ele se relacionou com o irmão logo após o acidente, como ele ajudou o irmão a reconstruir suas memórias a partir dos relatos das suas próprias "lembranças" e depois como ele enfrentou o peso de suas escolhas durante anos. Então, para finalizar, vemos em um terceiro momento, os dois irmãos sendo colocados frente a frente, olho no olho, ouvindo um ao outro e entendendo os motivos pelas quais os fizeram agir da forma com que eles mesmos relataram nos dois atos anteriores. É pesado!!!
O interessante do documentário é que o diretor Ed Perkins (indicado ao Oscar, ano passado, pelo seu curta-metragem documental "Black Sheep") foi capaz de estabelecer uma narrativa muito bem definida, respeitando o ponto de vista de cada um dos irmãos a partir de depoimentos e de dramatizações extremamente conceituais e lindamente filmadas. É perceptível o talento do diretor em nos colocar dentro da história, de uma forma muito envolvente e a cada nova informação, nos provocando, nos tirando de uma zona de conforto e, principalmente, nos mostrando que as histórias possuem sempre um outro lado - ele não faz isso apenas com um roteiro muito bem amarrado, mas com as imagens que se repetem e são interpretadas de um outro ponto de vista! É incrível! Outro detalhe de enorme sensibilidade do diretor, são os enquadramentos perfeitos. Nos dois primeiros atos, nos vemos dentro da sala, como co-protagonistas daqueles depoimentos, quase como entrevistadores; enquanto no terceiro ato, somos apenas observadores, constrangidos e receosos pelo que virá logo a frente - as pausas, o silêncio, são ensurdecedores e você vai entender na pele o que eu quero dizer assim que estiver assistindo!
"Diga quem sou" é uma surpresa "agradável", lançada sem muito marketing pela Netflix, mas com uma enorme qualidade artística! Um trabalho muito bem realizado a partir de uma autobiografia dos irmãos Lewis, onde Perkins cria um poderoso relato que ajuda o público a explorar essa incrível história e sua notável jornada de 35 anos após aquele "libertador" acidente. E como disse um crítico no Festival de Cinema de Londres: "é um exame profundamente comovente da memória e do trauma, da responsabilidade pessoal e, finalmente, do amor". Mas é preciso dizer também que não se trata de um entretenimento leve, muito pelo contrário, é uma história pesada, cheia de magoas, de mentiras, de desculpas, de dramas íntimos! É um documentário de pouco mais de uma hora que nos tira do sério, nos faz sentir medo do que vamos escutar, descobrir, e isso é raro; por isso indico de olhos fechados, mas esteja preparado para lidar com o lado mais sombrio que um ser humano pode suportar!
E se toda memória que te assombrou a vida inteira pudesse ser apagada? E se algo realmente horrível tivesse acontecido na sua infância e a pessoa que você mais ama pudesse tirar isso da sua mente?
Com essa premissa, qualquer filme ou série de ficção já chamaria a atenção de muita gente, certo? A grande questão é que "Diga quem sou" é um documentário! Um excelente documentário, eu diria! O filme mostra o dilema ético que Marcus Lewis, na época com 18 anos, enfrentou quando seu irmão gêmeo, Alex, despertou do coma após um acidente de moto, completamente sem memória. Marcus foi a única pessoa que ele reconheceu. Alex, então, confiou inteiramente em seu irmão para que pudesse reconstruir o seu passado a partir das lembranças que o irmão descrevia, porém nem tudo precisava ser dito e é aí que o documentário começa ganhar força, pois a todo momento nos colocamos na pele de Marcus e, mesmo sem entender a razão exata das suas escolhas, iniciamos um processo natural de julgamento: qual o preço que devemos pagar por nem sempre falarmos a verdade?
Se prepare, pois essa discussão moral de "Diga quem sou" é surpreendente, principalmente por tudo que vamos descobrindo durante o filme. Agora, nem de longe é um documentário fácil de digerir ou de aceitar, mas certamente te fará refletir muito!
"Diga quem sou" é dividido em três partes muito bem definidas: Primeiro acompanhamos o ponto de vista de Alex e como ele lidou com sua nova condição, sua relação com a família, amigos, namorada e, claro, com o apoio do irmão no processo de reaprendizado. Depois é a vez de Marcus e como ele se relacionou com o irmão logo após o acidente, como ele ajudou o irmão a reconstruir suas memórias a partir dos relatos das suas próprias "lembranças" e depois como ele enfrentou o peso de suas escolhas durante anos. Então, para finalizar, vemos em um terceiro momento, os dois irmãos sendo colocados frente a frente, olho no olho, ouvindo um ao outro e entendendo os motivos pelas quais os fizeram agir da forma com que eles mesmos relataram nos dois atos anteriores. É pesado!!!
O interessante do documentário é que o diretor Ed Perkins (indicado ao Oscar, ano passado, pelo seu curta-metragem documental "Black Sheep") foi capaz de estabelecer uma narrativa muito bem definida, respeitando o ponto de vista de cada um dos irmãos a partir de depoimentos e de dramatizações extremamente conceituais e lindamente filmadas. É perceptível o talento do diretor em nos colocar dentro da história, de uma forma muito envolvente e a cada nova informação, nos provocando, nos tirando de uma zona de conforto e, principalmente, nos mostrando que as histórias possuem sempre um outro lado - ele não faz isso apenas com um roteiro muito bem amarrado, mas com as imagens que se repetem e são interpretadas de um outro ponto de vista! É incrível! Outro detalhe de enorme sensibilidade do diretor, são os enquadramentos perfeitos. Nos dois primeiros atos, nos vemos dentro da sala, como co-protagonistas daqueles depoimentos, quase como entrevistadores; enquanto no terceiro ato, somos apenas observadores, constrangidos e receosos pelo que virá logo a frente - as pausas, o silêncio, são ensurdecedores e você vai entender na pele o que eu quero dizer assim que estiver assistindo!
"Diga quem sou" é uma surpresa "agradável", lançada sem muito marketing pela Netflix, mas com uma enorme qualidade artística! Um trabalho muito bem realizado a partir de uma autobiografia dos irmãos Lewis, onde Perkins cria um poderoso relato que ajuda o público a explorar essa incrível história e sua notável jornada de 35 anos após aquele "libertador" acidente. E como disse um crítico no Festival de Cinema de Londres: "é um exame profundamente comovente da memória e do trauma, da responsabilidade pessoal e, finalmente, do amor". Mas é preciso dizer também que não se trata de um entretenimento leve, muito pelo contrário, é uma história pesada, cheia de magoas, de mentiras, de desculpas, de dramas íntimos! É um documentário de pouco mais de uma hora que nos tira do sério, nos faz sentir medo do que vamos escutar, descobrir, e isso é raro; por isso indico de olhos fechados, mas esteja preparado para lidar com o lado mais sombrio que um ser humano pode suportar!
Simplesmente imperdível - pela trama e pelo selo do multi-premiado Alfonso Cuarón (vencedor de 4 Oscars com "Roma" e "Gravidade"). Certamente, "Disclaimer" já surge como forte candidata para "Melhor Minissérie de 2024" - e não é nenhum exagero. Essa minissérie da AppleTV+, criada e dirigida por Cuarón, adapta o thriller psicológico homônimo de Renée Knight, com muita competência. Ao explorar as consequências dos segredos e traumas enterrados no passado, o diretor mexicano traz o esmero de sua visão cinematográfica para criar uma narrativa impactante e cheia de tensão. Assim como em obras como "O Segredo dos Seus Olhos" e "Big Little Lies", "Disclaimer" vai revelando camadas de uma história complexa, que envolve a audiência desde os primeiros minutos em uma trama carregada de mistérios, de memórias reprimidas e de conflitos íntimos e pessoais que ameaçam não só desestabilizar a vida dos protagonistas como também transformar seu futuro.
A trama, basicamente, segue Catherine Ravenscroft (Cate Blanchett), uma jornalista investigativa renomada, cuja vida aparentemente estável começa a desmoronar quando ela recebe um livro misterioso que parece revelar segredos obscuros do seu passado. O livro expõe detalhes de um evento traumático e de uma relação extra-conjugal que ela acreditava estar enterrada há 20 anos, obrigando-a a confrontar memórias dolorosas e a lidar com ameaças à sua vida pessoal e profissional. Paralelamente, o autor do livro, Stephen Brigstocke (Kevin Kline), uma figura enigmática e perturbadora, parece ter um interesse mais do que pessoal em Catherine e em sua história, o que gera uma crescente tensão entre os dois, impactando diretamente no casamento e na relação da jornalista com seu filho. Confira o trailer:
Alfonso Cuarón, em sua estreia dirigindo uma minissérie, traz para o streaming sua assinatura visual incontestável - com planos longos, lindos enquadramentos, movimentos de câmera fluidos e um trabalho focado no elenco, pontuando a introspecção como ninguém, Cuarón constrói um drama profundo que se desenrola lentamente, permitindo que o mistério e as nuances dos personagens se revelem de forma gradual. Seu trabalho minucioso cria uma atmosfera de paranoia constante, onde a linha entre verdade e ilusão é frequentemente questionada pela audiência, refletindo como a fragilidade da memória e os efeitos devastadores do trauma podem ser devastadores mesmo tantos anos depois. O roteiro, também de Cuarón, adapta a obra de Knight com muita fidelidade, mas não deixa de incorporar elementos visuais e simbólicos que adicionam camadas muito interessantes para a narrativa. Veja, "Disclaimer" não se limita a ser um thriller psicológico com forte apelo sexual ao melhor estilo "Instinto Selvagem", ela também discute temas mais dramáticos como o peso da culpa ou a busca por perdão, sempre explorando o verdadeiro impacto das escolhas do passado.
Com um roteiro que utiliza a dualidade de uma obra literária como um símbolo de confronto interno, onde Catherine precisa lidar com suas memórias mais sombrias, e a relação com o autor como um reflexo de tensão entre o desejo de esconder algo e a necessidade de enfrentá-lo, Cate Blanchett surge com uma atuação poderosa, transmitindo a complexidade de uma mulher que, ao mesmo tempo que tenta se proteger, precisa enfrentar algumas verdades que ameaçam destruir tudo o que ela construiu. Blanchett domina a cena com um misto de intensidade e vulnerabilidade, mostrando o desgaste emocional da personagem enquanto lida com a pressão do arrependimento (ou da falta dele). Kevin Kline, por outro lado, também entrega uma performance inquietante, nesse caso oscilando entre a fragilidade e a ameaça, criando uma dinâmica intrigante e perigosa com a protagonista que vale o aplauso.
"Disclaimer" é mais um acerto da AppleTV+ e mesmo que alguns possam considerar lenta demais, te garanto: vale muito pela forma como Cuarón brinca com nossa percepção de "certo e errado" em uma narrativa que se concentra mais no desenvolvimento psicológico dos personagens do que em reviravoltas que tendem a surpreender a audiência. Essa escolha é tão intencional quanto acertada, afinal é ela que reforça o tom introspectivo da história e que potencializa as ambiguidades de uma conclusão que deixa espaço para múltiplas interpretações, ou seja, não espere respostas fáceis e sim uma jornada empolgante que vai te tirar da zona de conforto e te provocar muitas discussões (e teorias)!
Vale demais o seu play!
Simplesmente imperdível - pela trama e pelo selo do multi-premiado Alfonso Cuarón (vencedor de 4 Oscars com "Roma" e "Gravidade"). Certamente, "Disclaimer" já surge como forte candidata para "Melhor Minissérie de 2024" - e não é nenhum exagero. Essa minissérie da AppleTV+, criada e dirigida por Cuarón, adapta o thriller psicológico homônimo de Renée Knight, com muita competência. Ao explorar as consequências dos segredos e traumas enterrados no passado, o diretor mexicano traz o esmero de sua visão cinematográfica para criar uma narrativa impactante e cheia de tensão. Assim como em obras como "O Segredo dos Seus Olhos" e "Big Little Lies", "Disclaimer" vai revelando camadas de uma história complexa, que envolve a audiência desde os primeiros minutos em uma trama carregada de mistérios, de memórias reprimidas e de conflitos íntimos e pessoais que ameaçam não só desestabilizar a vida dos protagonistas como também transformar seu futuro.
A trama, basicamente, segue Catherine Ravenscroft (Cate Blanchett), uma jornalista investigativa renomada, cuja vida aparentemente estável começa a desmoronar quando ela recebe um livro misterioso que parece revelar segredos obscuros do seu passado. O livro expõe detalhes de um evento traumático e de uma relação extra-conjugal que ela acreditava estar enterrada há 20 anos, obrigando-a a confrontar memórias dolorosas e a lidar com ameaças à sua vida pessoal e profissional. Paralelamente, o autor do livro, Stephen Brigstocke (Kevin Kline), uma figura enigmática e perturbadora, parece ter um interesse mais do que pessoal em Catherine e em sua história, o que gera uma crescente tensão entre os dois, impactando diretamente no casamento e na relação da jornalista com seu filho. Confira o trailer:
Alfonso Cuarón, em sua estreia dirigindo uma minissérie, traz para o streaming sua assinatura visual incontestável - com planos longos, lindos enquadramentos, movimentos de câmera fluidos e um trabalho focado no elenco, pontuando a introspecção como ninguém, Cuarón constrói um drama profundo que se desenrola lentamente, permitindo que o mistério e as nuances dos personagens se revelem de forma gradual. Seu trabalho minucioso cria uma atmosfera de paranoia constante, onde a linha entre verdade e ilusão é frequentemente questionada pela audiência, refletindo como a fragilidade da memória e os efeitos devastadores do trauma podem ser devastadores mesmo tantos anos depois. O roteiro, também de Cuarón, adapta a obra de Knight com muita fidelidade, mas não deixa de incorporar elementos visuais e simbólicos que adicionam camadas muito interessantes para a narrativa. Veja, "Disclaimer" não se limita a ser um thriller psicológico com forte apelo sexual ao melhor estilo "Instinto Selvagem", ela também discute temas mais dramáticos como o peso da culpa ou a busca por perdão, sempre explorando o verdadeiro impacto das escolhas do passado.
Com um roteiro que utiliza a dualidade de uma obra literária como um símbolo de confronto interno, onde Catherine precisa lidar com suas memórias mais sombrias, e a relação com o autor como um reflexo de tensão entre o desejo de esconder algo e a necessidade de enfrentá-lo, Cate Blanchett surge com uma atuação poderosa, transmitindo a complexidade de uma mulher que, ao mesmo tempo que tenta se proteger, precisa enfrentar algumas verdades que ameaçam destruir tudo o que ela construiu. Blanchett domina a cena com um misto de intensidade e vulnerabilidade, mostrando o desgaste emocional da personagem enquanto lida com a pressão do arrependimento (ou da falta dele). Kevin Kline, por outro lado, também entrega uma performance inquietante, nesse caso oscilando entre a fragilidade e a ameaça, criando uma dinâmica intrigante e perigosa com a protagonista que vale o aplauso.
"Disclaimer" é mais um acerto da AppleTV+ e mesmo que alguns possam considerar lenta demais, te garanto: vale muito pela forma como Cuarón brinca com nossa percepção de "certo e errado" em uma narrativa que se concentra mais no desenvolvimento psicológico dos personagens do que em reviravoltas que tendem a surpreender a audiência. Essa escolha é tão intencional quanto acertada, afinal é ela que reforça o tom introspectivo da história e que potencializa as ambiguidades de uma conclusão que deixa espaço para múltiplas interpretações, ou seja, não espere respostas fáceis e sim uma jornada empolgante que vai te tirar da zona de conforto e te provocar muitas discussões (e teorias)!
Vale demais o seu play!
"Disque Jane" vai te surpreender! Primeiro por ser uma história baseada em fatos reais e segundo por ser uma jornada tão envolvente capaz de provocar, além de muitas reflexões, inúmeros questionamentos sobre o aborto. Agora é preciso dizer: é inegável o tom ativista do filme, por outro lado, o filme de estreia da até então roteirista Phyllis Nagy (indicada ao Oscar por "Carol" em 2015), consegue equilibrar muito bem uma trama pautada no processo de transformação da protagonista (na linha de "Breaking Bad"), com todo contexto politico e social da mulher na Chicago do final dos anos 60.
A vida feliz de Joy (Elizabeth Banks), junto de sua família, se desestabiliza quando a tão desejada gravidez passa a ser um risco para a sua vida. Temendo pelo pior, ela busca ajuda médica, que se recusa a ajuda-la pelas leis da época. Sua jornada para encontrar uma solução acaba a levando até o grupo chamado "Janes" (The Jane Collective), uma organização clandestina de mulheres que lhe dará uma alternativa mais segura para seu problema, em um processo que mudará sua vida para sempre. Confira o trailer (em inglês):
"Disque Jane" foi apresentado no Festival de Berlin em 2022 com potencial de levar o Urso de Ouro (que acabou ficando com o espanhol "Alcarrás" de Carla Simon) e sem dúvida que isso chancela o interesse da audiência em conhecer a história de Joy. No entanto, alguns elementos do roteiro escrito pela Hayley Schore e pelo Roshan Sethi parecem não se conectar com a proposta inicial de Nagy de apenas contar um boa história de empoderamento - existem alguns diálogos que saem um pouco do tom por justamente parecer lacrar demais. Isso não é um problema, eu diria, mas é inegável que incomoda, principalmente por deixar de lado embates muito mais interessantes sobre ética e, por consequência, conflitos morais que colocariam camadas mais profundas no amadurecimento da personagem. No final, a impressão que fica, é que fosse uma série, os roteiristas teriam um material maravilhoso para trabalhar - Kate Mara (como Lana) que o diga.
Chama atenção, sem a menor dúvida, a performance de Elizabeth Banks (fique atento ao trabalho dessa atriz, em breve ela estará no Oscar, pode apostar) - seu trabalho é muito consistente e, aqui, provavelmente o melhor de sua carreira. Banks tem a capacidade de despertar empatia mesmo quando notavelmente está cometendo um crime - reparem como ao longo do filme, em alguns momentos realmente dramáticos, ela equilibra tão bem o silêncio com o texto mais expositivo, que temos a exata noção do tamanho de sua dor (ou de suas dúvidas como mulher). Sigourney Weaver como a manda-chuva, Virginia, e Cory Michael Smith, como o jovem médico, Dean, também merecem elogios.
Mesmo que "Call Jane" (no original) passe essa sensação de pressa ou de superficialidade ao tentar fechar rapidamente todas as pontas que ficariam abertas, ainda assim considero o filme um ótimo drama, bem estruturado, bem dirigido (sem grandes destaques conceituais, é verdade) e com ótimas performances, capaz de colocar o dedo em alguns temas delicados que ainda hoje merecem o debate em todas as esferas da sociedade e que vão dialogar com grande parte da audiência feminina.
Pode dar o play sem medo que as conversas pós-créditos estão garantidas.
"Disque Jane" vai te surpreender! Primeiro por ser uma história baseada em fatos reais e segundo por ser uma jornada tão envolvente capaz de provocar, além de muitas reflexões, inúmeros questionamentos sobre o aborto. Agora é preciso dizer: é inegável o tom ativista do filme, por outro lado, o filme de estreia da até então roteirista Phyllis Nagy (indicada ao Oscar por "Carol" em 2015), consegue equilibrar muito bem uma trama pautada no processo de transformação da protagonista (na linha de "Breaking Bad"), com todo contexto politico e social da mulher na Chicago do final dos anos 60.
A vida feliz de Joy (Elizabeth Banks), junto de sua família, se desestabiliza quando a tão desejada gravidez passa a ser um risco para a sua vida. Temendo pelo pior, ela busca ajuda médica, que se recusa a ajuda-la pelas leis da época. Sua jornada para encontrar uma solução acaba a levando até o grupo chamado "Janes" (The Jane Collective), uma organização clandestina de mulheres que lhe dará uma alternativa mais segura para seu problema, em um processo que mudará sua vida para sempre. Confira o trailer (em inglês):
"Disque Jane" foi apresentado no Festival de Berlin em 2022 com potencial de levar o Urso de Ouro (que acabou ficando com o espanhol "Alcarrás" de Carla Simon) e sem dúvida que isso chancela o interesse da audiência em conhecer a história de Joy. No entanto, alguns elementos do roteiro escrito pela Hayley Schore e pelo Roshan Sethi parecem não se conectar com a proposta inicial de Nagy de apenas contar um boa história de empoderamento - existem alguns diálogos que saem um pouco do tom por justamente parecer lacrar demais. Isso não é um problema, eu diria, mas é inegável que incomoda, principalmente por deixar de lado embates muito mais interessantes sobre ética e, por consequência, conflitos morais que colocariam camadas mais profundas no amadurecimento da personagem. No final, a impressão que fica, é que fosse uma série, os roteiristas teriam um material maravilhoso para trabalhar - Kate Mara (como Lana) que o diga.
Chama atenção, sem a menor dúvida, a performance de Elizabeth Banks (fique atento ao trabalho dessa atriz, em breve ela estará no Oscar, pode apostar) - seu trabalho é muito consistente e, aqui, provavelmente o melhor de sua carreira. Banks tem a capacidade de despertar empatia mesmo quando notavelmente está cometendo um crime - reparem como ao longo do filme, em alguns momentos realmente dramáticos, ela equilibra tão bem o silêncio com o texto mais expositivo, que temos a exata noção do tamanho de sua dor (ou de suas dúvidas como mulher). Sigourney Weaver como a manda-chuva, Virginia, e Cory Michael Smith, como o jovem médico, Dean, também merecem elogios.
Mesmo que "Call Jane" (no original) passe essa sensação de pressa ou de superficialidade ao tentar fechar rapidamente todas as pontas que ficariam abertas, ainda assim considero o filme um ótimo drama, bem estruturado, bem dirigido (sem grandes destaques conceituais, é verdade) e com ótimas performances, capaz de colocar o dedo em alguns temas delicados que ainda hoje merecem o debate em todas as esferas da sociedade e que vão dialogar com grande parte da audiência feminina.
Pode dar o play sem medo que as conversas pós-créditos estão garantidas.
Se você ainda não assistiu "Distrito 9", assista! Visualmente impactante e repleto de críticas sociais afiadíssimas, essa produção de 2009, dirigida por Neill Blomkamp, se destaca não só pela sua abordagem inovadora da ficção científica (para época), mas também pela sua profunda reflexão sobre a humanidade e sobre a segregação. Para quem não sabe, "Distrito 9" é baseado no curta-metragem de Blomkamp, "Alive in Joburg", e expande suas ideias para criar uma narrativa que é ao mesmo tempo perturbadora e provocativa. Vale citar que, assumindo essa identidade critica, Blomkamp também veio a dirigir outros filmes que abordam temas similares como exclusão e discriminação, sempre com o mesmo toque de ficção científica, são eles: "Elysium" e "Chappie".
A trama se passa em um mundo onde uma enorme nave alienígena paira sobre Joanesburgo, África do Sul, desde 1982. Dentro dela, milhões de alienígenas – chamados de "camarões" devido à sua aparência – são encontrados malnutridos e em estado deplorável. As autoridades decidem confiná-los em uma área militarizada chamada Distrito 9, transformando-os em refugiados segregados. A história se concentra em Wikus van de Merwe (Sharlto Copley), um funcionário de uma corporação privada encarregada de realocar os alienígenas para um campo ainda mais distante. No entanto, durante a operação, Wikus é exposto a um fluido alienígena que começa a transformá-lo em um dos "camarões". Confira o trailer:
Neill Blomkamp, em sua estreia como diretor de longa-metragem, demonstra uma habilidade notável ao criar um universo visualmente coeso e com uma temática para lá de densa. O diretor utiliza uma estética de documentário, com câmeras de mão e entrevistas simuladas, que adicionam uma camada de realismo e urgência para uma narrativa que não se perde no tempo - parece, de fato, que tudo aquilo é muito real (e não é?). A direção de fotografia de Trent Opaloch (o cara por trás de "Vingadores: Ultimato") é extremamente eficaz, utilizando uma conceito visual, digamos "desbotado" e um estilo de enquadramento que enfatiza toda aquela degradação e a brutalidade do ambiente - somos realmente jogados naquela atmosfera de uma maneira bastante imersiva. Já o roteiro, escrito por Blomkamp e pela Terri Tatchell (sua esposa), equilibra perfeitamente a ação visceral com uma crítica social incisiva, focando em temas sensíveis como racismo, xenofobia e segregação, usando a situação dos alienígenas como uma metáfora para a condição dos refugiados e das minorias marginalizadas. A real: a narrativa não apenas entretém, mas também nos convida a refletir sobre questões éticas e sociais bem contemporâneas.
Sharlto Copley (o Wikus) captura muito bem a transformação gradual de um burocrata arrogante e insensível para uma figura mais empática. Copley, com seu carisma, nos leva a sentir a dor, a luta e a desesperança de Wikus à medida que ele enfrenta a alienação e a perseguição. Sua atuação é um dos pilares que sustentam a narrativa, tornando-o um personagem complexo e cheio de nuances. Os efeitos visuais, especialmente para um filme de orçamento relativamente modesto como o de "Distrito 9" são impressionantes- foram gastos meros 30 milhões de dólares. Os alienígenas são renderizados com um nível de detalhe e realismo que facilita a suspensão da descrença, deixando as interações com os personagens humanos incrivelmente convincentes. A combinação de CGI e a performance do elenco é muito harmoniosa, criando um mundo que é estranho, mas familiar - mérito total de Blomkamp.
Indicado a 4 Oscars, inclusive de Melhor Filme de 2009, "Distrito 9" muda na sua segunda metade quando a ênfase passa a ser a ação e os efeitos especiais, perdendo um pouco do foco nas questões sociais que tornaram a primeira metade tão poderosa. No entanto, esse fato não diminui em nada a importância e o impacto de "Distrito 9" como critica e como entretenimento. O filme pode (e deve) ser considerado um marco dentro do gênero de ficção científica pela relação "orçamento x resultado", e que oferece uma exploração rica e provocativa de temas sociais tão atuais através de uma narrativa envolvente e visualmente deslumbrante.
Para fãs de ficção científica, "Distrito 9" é essencial!
Se você ainda não assistiu "Distrito 9", assista! Visualmente impactante e repleto de críticas sociais afiadíssimas, essa produção de 2009, dirigida por Neill Blomkamp, se destaca não só pela sua abordagem inovadora da ficção científica (para época), mas também pela sua profunda reflexão sobre a humanidade e sobre a segregação. Para quem não sabe, "Distrito 9" é baseado no curta-metragem de Blomkamp, "Alive in Joburg", e expande suas ideias para criar uma narrativa que é ao mesmo tempo perturbadora e provocativa. Vale citar que, assumindo essa identidade critica, Blomkamp também veio a dirigir outros filmes que abordam temas similares como exclusão e discriminação, sempre com o mesmo toque de ficção científica, são eles: "Elysium" e "Chappie".
A trama se passa em um mundo onde uma enorme nave alienígena paira sobre Joanesburgo, África do Sul, desde 1982. Dentro dela, milhões de alienígenas – chamados de "camarões" devido à sua aparência – são encontrados malnutridos e em estado deplorável. As autoridades decidem confiná-los em uma área militarizada chamada Distrito 9, transformando-os em refugiados segregados. A história se concentra em Wikus van de Merwe (Sharlto Copley), um funcionário de uma corporação privada encarregada de realocar os alienígenas para um campo ainda mais distante. No entanto, durante a operação, Wikus é exposto a um fluido alienígena que começa a transformá-lo em um dos "camarões". Confira o trailer:
Neill Blomkamp, em sua estreia como diretor de longa-metragem, demonstra uma habilidade notável ao criar um universo visualmente coeso e com uma temática para lá de densa. O diretor utiliza uma estética de documentário, com câmeras de mão e entrevistas simuladas, que adicionam uma camada de realismo e urgência para uma narrativa que não se perde no tempo - parece, de fato, que tudo aquilo é muito real (e não é?). A direção de fotografia de Trent Opaloch (o cara por trás de "Vingadores: Ultimato") é extremamente eficaz, utilizando uma conceito visual, digamos "desbotado" e um estilo de enquadramento que enfatiza toda aquela degradação e a brutalidade do ambiente - somos realmente jogados naquela atmosfera de uma maneira bastante imersiva. Já o roteiro, escrito por Blomkamp e pela Terri Tatchell (sua esposa), equilibra perfeitamente a ação visceral com uma crítica social incisiva, focando em temas sensíveis como racismo, xenofobia e segregação, usando a situação dos alienígenas como uma metáfora para a condição dos refugiados e das minorias marginalizadas. A real: a narrativa não apenas entretém, mas também nos convida a refletir sobre questões éticas e sociais bem contemporâneas.
Sharlto Copley (o Wikus) captura muito bem a transformação gradual de um burocrata arrogante e insensível para uma figura mais empática. Copley, com seu carisma, nos leva a sentir a dor, a luta e a desesperança de Wikus à medida que ele enfrenta a alienação e a perseguição. Sua atuação é um dos pilares que sustentam a narrativa, tornando-o um personagem complexo e cheio de nuances. Os efeitos visuais, especialmente para um filme de orçamento relativamente modesto como o de "Distrito 9" são impressionantes- foram gastos meros 30 milhões de dólares. Os alienígenas são renderizados com um nível de detalhe e realismo que facilita a suspensão da descrença, deixando as interações com os personagens humanos incrivelmente convincentes. A combinação de CGI e a performance do elenco é muito harmoniosa, criando um mundo que é estranho, mas familiar - mérito total de Blomkamp.
Indicado a 4 Oscars, inclusive de Melhor Filme de 2009, "Distrito 9" muda na sua segunda metade quando a ênfase passa a ser a ação e os efeitos especiais, perdendo um pouco do foco nas questões sociais que tornaram a primeira metade tão poderosa. No entanto, esse fato não diminui em nada a importância e o impacto de "Distrito 9" como critica e como entretenimento. O filme pode (e deve) ser considerado um marco dentro do gênero de ficção científica pela relação "orçamento x resultado", e que oferece uma exploração rica e provocativa de temas sociais tão atuais através de uma narrativa envolvente e visualmente deslumbrante.
Para fãs de ficção científica, "Distrito 9" é essencial!
Não por acaso gosto de afirmar que a maravilha do streaming está na possibilidade de ter contato com filmes como "Divertimento"! Sim, essa é uma história improvável que merecia ser contada e mesmo com um roteiro que deixa algumas pontas soltas, eu te adianto: é impossível não se apaixonar pela história de Zahia Ziouali. Não se preocupe, eu sei que você nem imagina quem seja Zahia Ziouali, natural (eu também nunca tinha ouvido falar); e é justamente por isso que esse filme é tão bacana e merece ser visto - ele vai deixar o seu coração bem quentinho e será difícil tirar o sorriso do rosto por alguns minutos após os créditos! Dirigido por Marie-Castille Mention-Schaar (de "Os Herdeiros"), "Divertimento" é um drama francês inspirado em eventos reais que celebra a paixão pela música e a luta pela igualdade e diversidade no mundo das artes. Através da história de Ziouani, conhecemos uma jovem maestrina de origem argelina que, contra todas as adversidades, luta para realizar seu sonho de liderar uma orquestra sinfônica. Saiba que o filme é mais do que um simples relato sobre superação; é uma reflexão sobre a importância da resiliência e a força transformadora da arte perante a sociedade.
A trama se passa em 1995 e segue Zahia Ziouani (Oulaya Amamra), uma jovem talentosa e ambiciosa de apenas 17 anos que deseja se tornar regente em um universo predominantemente masculino e elitista. Vinda de um subúrbio parisiense, ela enfrenta todo tipo de preconceito enquanto tenta abrir seu próprio caminho no mundo da música clássica. Para alcançar esse objetivo, Zahia decide fundar sua própria orquestra, a Divertimento, onde busca não apenas realizar seus sonhos, mas também oferecer oportunidades para jovens talentos que, como ela e sua irmã Fettouma (Lina El Arabi), foram historicamente excluídos dos palcos tradicionais. Confira o trailer:
"Divertimento" usa da força e do talento da sua protagonista para abordar a questão da representatividade e da inclusão na música clássica, um campo frequentemente associado a uma elite cultural e econômica. O filme não se esquiva de retratar os obstáculos enfrentados por Zahia, desde o preconceito racial até a resistência do establishment musical em aceitar uma jovem mulher de origem árabe como líder de uma orquestra na França dos anos 90. A diretora Marie-Castille Mention-Schaar constrói uma narrativa que é uma homenagem ao talento e a paixão pela música, mas também uma crítica social que questiona as barreiras impostas por uma sociedade inegavelmente machista. A direção de Mention-Schaar é sensível e cuidadosa ao tocar em temas tão sensíveis, evitando o melodrama gratuito e focando muito mais na autenticidade da história de Zahia do que no vitimismo. O filme, nesse sentido, se destaca por seu realismo, utilizando a música como um elemento narrativo que transcende palavras e emoções, servindo como um meio de expressão e, principalmente, de resistência - as cenas em que Zahia conduz a orquestra são particularmente emocionantes, transmitindo a beleza e a intensidade da música clássica de uma forma que captura a audiência, mesmo para aqueles que não são tão familiarizados com esse tipo de arte.
Oulaya Amamra entrega uma atuação poderosa como Zahia, capturando a determinação da personagem, mas também a vulnerabilidade e a insegurança de uma garota de 17 anos. Amamra transmite com autenticidade o peso das expectativas e dos desafios que Zahia enfrenta, ao mesmo tempo que mostra sua paixão ardente pela música que a impulsiona. A forma como Amamra conduz sua personagem é magnética, com uma presença carismática e nuances emocionais primorosas - novamente: é impossível não se conectar com sua jornada. Outro ponto que merece ser observado é a forma como o roteiro sabe lidar com a relação entre a música e a identidade cultural, no entanto Clara Bourreau, que co-escreve com Mention-Schaar, vacila ao querer discutir tantos polis ao ponto de ficar sem tempo de tela para entregar o que ficou apenas sugerido como conflito.
Aproveitando dos contrastes visuais entre os cenários do subúrbio parisiense e os espaços clássicos e imponentes das salas de concerto, "Divertimento" usa da dicotomia entre a origem humilde de Zahia e o mundo elitista da música que ela deseja conquistar, para reforçar o caráter transformador da arte. Emocionante e inspirador, o filme combina a beleza da música com uma mensagem poderosa e atual sobre igualdade. Até por se tratar de um recorte biográfico, é possível afirmar que o filme não é apenas um tributo ao poder da música, mas também à força de uma mulher que, apesar de todas as adversidades, lutou para fazer da sua paixão uma realidade e um exemplo!
Imperdível!
Não por acaso gosto de afirmar que a maravilha do streaming está na possibilidade de ter contato com filmes como "Divertimento"! Sim, essa é uma história improvável que merecia ser contada e mesmo com um roteiro que deixa algumas pontas soltas, eu te adianto: é impossível não se apaixonar pela história de Zahia Ziouali. Não se preocupe, eu sei que você nem imagina quem seja Zahia Ziouali, natural (eu também nunca tinha ouvido falar); e é justamente por isso que esse filme é tão bacana e merece ser visto - ele vai deixar o seu coração bem quentinho e será difícil tirar o sorriso do rosto por alguns minutos após os créditos! Dirigido por Marie-Castille Mention-Schaar (de "Os Herdeiros"), "Divertimento" é um drama francês inspirado em eventos reais que celebra a paixão pela música e a luta pela igualdade e diversidade no mundo das artes. Através da história de Ziouani, conhecemos uma jovem maestrina de origem argelina que, contra todas as adversidades, luta para realizar seu sonho de liderar uma orquestra sinfônica. Saiba que o filme é mais do que um simples relato sobre superação; é uma reflexão sobre a importância da resiliência e a força transformadora da arte perante a sociedade.
A trama se passa em 1995 e segue Zahia Ziouani (Oulaya Amamra), uma jovem talentosa e ambiciosa de apenas 17 anos que deseja se tornar regente em um universo predominantemente masculino e elitista. Vinda de um subúrbio parisiense, ela enfrenta todo tipo de preconceito enquanto tenta abrir seu próprio caminho no mundo da música clássica. Para alcançar esse objetivo, Zahia decide fundar sua própria orquestra, a Divertimento, onde busca não apenas realizar seus sonhos, mas também oferecer oportunidades para jovens talentos que, como ela e sua irmã Fettouma (Lina El Arabi), foram historicamente excluídos dos palcos tradicionais. Confira o trailer:
"Divertimento" usa da força e do talento da sua protagonista para abordar a questão da representatividade e da inclusão na música clássica, um campo frequentemente associado a uma elite cultural e econômica. O filme não se esquiva de retratar os obstáculos enfrentados por Zahia, desde o preconceito racial até a resistência do establishment musical em aceitar uma jovem mulher de origem árabe como líder de uma orquestra na França dos anos 90. A diretora Marie-Castille Mention-Schaar constrói uma narrativa que é uma homenagem ao talento e a paixão pela música, mas também uma crítica social que questiona as barreiras impostas por uma sociedade inegavelmente machista. A direção de Mention-Schaar é sensível e cuidadosa ao tocar em temas tão sensíveis, evitando o melodrama gratuito e focando muito mais na autenticidade da história de Zahia do que no vitimismo. O filme, nesse sentido, se destaca por seu realismo, utilizando a música como um elemento narrativo que transcende palavras e emoções, servindo como um meio de expressão e, principalmente, de resistência - as cenas em que Zahia conduz a orquestra são particularmente emocionantes, transmitindo a beleza e a intensidade da música clássica de uma forma que captura a audiência, mesmo para aqueles que não são tão familiarizados com esse tipo de arte.
Oulaya Amamra entrega uma atuação poderosa como Zahia, capturando a determinação da personagem, mas também a vulnerabilidade e a insegurança de uma garota de 17 anos. Amamra transmite com autenticidade o peso das expectativas e dos desafios que Zahia enfrenta, ao mesmo tempo que mostra sua paixão ardente pela música que a impulsiona. A forma como Amamra conduz sua personagem é magnética, com uma presença carismática e nuances emocionais primorosas - novamente: é impossível não se conectar com sua jornada. Outro ponto que merece ser observado é a forma como o roteiro sabe lidar com a relação entre a música e a identidade cultural, no entanto Clara Bourreau, que co-escreve com Mention-Schaar, vacila ao querer discutir tantos polis ao ponto de ficar sem tempo de tela para entregar o que ficou apenas sugerido como conflito.
Aproveitando dos contrastes visuais entre os cenários do subúrbio parisiense e os espaços clássicos e imponentes das salas de concerto, "Divertimento" usa da dicotomia entre a origem humilde de Zahia e o mundo elitista da música que ela deseja conquistar, para reforçar o caráter transformador da arte. Emocionante e inspirador, o filme combina a beleza da música com uma mensagem poderosa e atual sobre igualdade. Até por se tratar de um recorte biográfico, é possível afirmar que o filme não é apenas um tributo ao poder da música, mas também à força de uma mulher que, apesar de todas as adversidades, lutou para fazer da sua paixão uma realidade e um exemplo!
Imperdível!
Você aceitaria mil euros se soubesse que esse bônus resultaria no desligamento de uma colega de trabalho, que precisa do salário para ajudar sua família? Sim, eu sei que a resposta pode até parecer simples se olharmos pela perspectiva do "politicamente correto", no entanto a vida não é "politicamente correta"! "Dois Dias, Uma Noite", filme que levou sua protagonista, Marion Cotillard, para a disputa do Oscar de "Melhor Atriz" em 2015 e que ganhou mais de quarenta e um prêmios em festivais ao redor do globo, é um verdadeiro mergulho pela complexidade das relações humanas. Dirigido pelos mestres belgas Jean-Pierre e Luc Dardenne (de "A Garota Desconhecida"), este filme transcende as fronteiras do drama social, adentrando profundamente na alma de quem luta por alguma dignidade quando o único caminho disponível para a sobrevivência é o trabalho. Indicado à Palma de Ouro no Festival de Cannes e aclamado pela crítica, essa é uma narrativa que ecoa na consciência da audiência, despertando reflexões interessantes sobre solidariedade, ética e o poder da resiliência. Se você busca um filme com uma identidade mais autoral, envolvente (mesmo dentro de uma certa cadência) e capaz explorar os cantos mais sombrios da condição humana, eu diria que esse play é fundamental!
Em "Deux Jours, Une Nuit" (no original) conhecemos Sandra (Marion Cotillard), uma operária de fábrica que ao retornar de uma licença médica descobre que seus colegas optaram por receber um bônus de mil euros em troca de sua demissão. Desesperada, Sandra tem apenas dois dias e uma noite para convencer seus colegas a desistirem do bônus para que ela mantenha seu emprego e assim consiga sustentar sua família com dignidade. Confira o trailer:
Com essa premissa aparentemente simples, a narrativa constrói um cenário perfeito para uma jornada emocional e ética muito provocativa. O mérito disso está na maneira habilidosa como os Dardenne desafiam nossas noções preconcebidas de certo e errado, nos deixando um questionamento legítimo sobre nossas possíveis escolhas e compromissos perante uma situação tão delicada. Veja, a câmera nunca se afasta de Sandra em sua odisseia, capturando cada nuance de sua luta interior e o como ela precisa lidar, olho no olho, com seus colegas de trabalho - embora em um primeiro olhar possa parecer repetitiva, essa estratégia narrativa nada mais é que um inteligente recorte social das relações humanas sob diferentes níveis de entendimento.
A escolha por uma abordagem mais realista, minimalista talvez, só amplifica a autenticidade da história, criando conexão imediata com a protagonista de uma forma visceral - os dilemas enfrentados por ela realmente nos machucam, ou seja, acompanhar Sandra lidando com aquela dor não é uma jornada das mais tranquilas. É aí que entra a performance magistral de Cotillard - ela adiciona uma série de camadas, com uma profundidade emocional impressionante, tornando sua personagem uma figura universalmente reconhecível tanto em sua vulnerabilidade quanto em sua determinação. Nesse sentido, a cinematografia de Alain Marcoen (de "Rosetta") soa até despojada, enquanto a trilha sonora complementa perfeitamente a atmosfera emocional do filme - repare como essa combinação cria sensações tão particulares perante o cotidiano implacável de Sandra e nos mantém interessados em saber como tudo vai acabar.
Sem julgamentos morais simplistas, "Dois Dias, Uma Noite" é um testemunho poderoso sobre a resiliência e a capacidade (ou a falta) de compaixão. É uma jornada cinematográfica que ressoa muito além da tela, deixando uma discussão pertinente sobre a estrutura moral e ética do ser humano, onde uma situação de medo (que certamente já tomou conta de todo trabalhador ao menos uma vez na vida, especialmente se ele tem uma família para sustentar) se transforma em um lembrete comovente sobre a fragilidade e a falta de responsabilidade que temos como sociedade "saudável".
Vale muito o seu play!
Você aceitaria mil euros se soubesse que esse bônus resultaria no desligamento de uma colega de trabalho, que precisa do salário para ajudar sua família? Sim, eu sei que a resposta pode até parecer simples se olharmos pela perspectiva do "politicamente correto", no entanto a vida não é "politicamente correta"! "Dois Dias, Uma Noite", filme que levou sua protagonista, Marion Cotillard, para a disputa do Oscar de "Melhor Atriz" em 2015 e que ganhou mais de quarenta e um prêmios em festivais ao redor do globo, é um verdadeiro mergulho pela complexidade das relações humanas. Dirigido pelos mestres belgas Jean-Pierre e Luc Dardenne (de "A Garota Desconhecida"), este filme transcende as fronteiras do drama social, adentrando profundamente na alma de quem luta por alguma dignidade quando o único caminho disponível para a sobrevivência é o trabalho. Indicado à Palma de Ouro no Festival de Cannes e aclamado pela crítica, essa é uma narrativa que ecoa na consciência da audiência, despertando reflexões interessantes sobre solidariedade, ética e o poder da resiliência. Se você busca um filme com uma identidade mais autoral, envolvente (mesmo dentro de uma certa cadência) e capaz explorar os cantos mais sombrios da condição humana, eu diria que esse play é fundamental!
Em "Deux Jours, Une Nuit" (no original) conhecemos Sandra (Marion Cotillard), uma operária de fábrica que ao retornar de uma licença médica descobre que seus colegas optaram por receber um bônus de mil euros em troca de sua demissão. Desesperada, Sandra tem apenas dois dias e uma noite para convencer seus colegas a desistirem do bônus para que ela mantenha seu emprego e assim consiga sustentar sua família com dignidade. Confira o trailer:
Com essa premissa aparentemente simples, a narrativa constrói um cenário perfeito para uma jornada emocional e ética muito provocativa. O mérito disso está na maneira habilidosa como os Dardenne desafiam nossas noções preconcebidas de certo e errado, nos deixando um questionamento legítimo sobre nossas possíveis escolhas e compromissos perante uma situação tão delicada. Veja, a câmera nunca se afasta de Sandra em sua odisseia, capturando cada nuance de sua luta interior e o como ela precisa lidar, olho no olho, com seus colegas de trabalho - embora em um primeiro olhar possa parecer repetitiva, essa estratégia narrativa nada mais é que um inteligente recorte social das relações humanas sob diferentes níveis de entendimento.
A escolha por uma abordagem mais realista, minimalista talvez, só amplifica a autenticidade da história, criando conexão imediata com a protagonista de uma forma visceral - os dilemas enfrentados por ela realmente nos machucam, ou seja, acompanhar Sandra lidando com aquela dor não é uma jornada das mais tranquilas. É aí que entra a performance magistral de Cotillard - ela adiciona uma série de camadas, com uma profundidade emocional impressionante, tornando sua personagem uma figura universalmente reconhecível tanto em sua vulnerabilidade quanto em sua determinação. Nesse sentido, a cinematografia de Alain Marcoen (de "Rosetta") soa até despojada, enquanto a trilha sonora complementa perfeitamente a atmosfera emocional do filme - repare como essa combinação cria sensações tão particulares perante o cotidiano implacável de Sandra e nos mantém interessados em saber como tudo vai acabar.
Sem julgamentos morais simplistas, "Dois Dias, Uma Noite" é um testemunho poderoso sobre a resiliência e a capacidade (ou a falta) de compaixão. É uma jornada cinematográfica que ressoa muito além da tela, deixando uma discussão pertinente sobre a estrutura moral e ética do ser humano, onde uma situação de medo (que certamente já tomou conta de todo trabalhador ao menos uma vez na vida, especialmente se ele tem uma família para sustentar) se transforma em um lembrete comovente sobre a fragilidade e a falta de responsabilidade que temos como sociedade "saudável".
Vale muito o seu play!
"DOM" é surpreendentemente boa - e digo isso com a tranquilidade de quem sabe as dificuldades que é produzir uma série desse tamanho aqui no Brasil. Embora algumas decisões conceituais sejam impactados diretamente pela limitação do orçamento de sua produção, o resultado final é de extrema qualidade narrativa e visual. "DOM" é um recorte social do Rio de Janeiro dos anos 2000 na sua essência, construído a partir de uma base histórica de 30 anos, justamente quando as drogas começaram a invadir os morros cariocas e se transformar em um cruel negócio dos mais lucrativos.
Na série acompanhamos duas histórias reais que se completam: a de Pedro Dom, um belo rapaz da classe média carioca que foi apresentado à cocaína na adolescência e que acabou colocando ele frente a frente com o crime, onde se transformou no líder de uma gangue criminosa que dominou os tabloides cariocas no início dos anos 2000. E a de seu pai, Victor Dantas, ex-mergulhador, que quando jovem fez uma descoberta no fundo do mar que logo o direcionou para o serviço de inteligência da polícia para combater, justamente, o inicio do tráfico de drogas no país. Confira o trailer:
A série é baseada nas obras "O Beijo da Bruxa", de Luiz Victor Lomba, e "DOM", de Tony Bellotto. Produzido e dirigido pelo sempre impecável Breno Silveira (de "Dois Filhos de Francisco"), o roteiro é bastante competente em cobrir os eventos em duas linhas temporais que a principio parece ter "apenas" a droga como conexão, mas que, posso garantir, vai muito além disso. As marcas do passado de Victor impactam diretamente no seu relacionamento com a família e principalmente com seu filho Pedro - então é preciso que se diga: não se trata da história de mais um criminoso ou da romantização da construção de um mito, muito pelo contrário, "DOM" traz para a discussão um problema social sério, o tráfico de drogas e o impacto dele nas famílias.
Como já é de costume nos projetos de Breno Silveira, tecnicamente, "DOM" é um espetáculo. A fotografa do argentino Adrian Teijido (Capitu) mostra um contraste maravilhoso da cidade do Rio de Janeiro, criando uma dinâmica visual entre o morro, a praia e o asfalto, impressionante! A direção de Silveira, ao lado de Vicente Kubrusly, é precisa na construção do drama e das relações do núcleo central - só peca no trabalho com os atores do elenco de apoio. O trabalho do Claudio Amaral Peixoto na direção de arte também me chamou a atenção - o realismo quase minimalista compõe o cenário de uma forma completamente orgânica nas duas linhas temporais e ajuda demais na construção do mood da série.
Gabriel Leone é um dos melhores atores da sua geração - absolutamente tudo que assisti dele, me convenceu! Eu não gosto da sua versão adolescente na série, mas entendo a demanda. Sua postura como o jovem de classe média carioca, loiro e de olhos azuis, que aproveitava do racismo estrutural para entrar nos condomínios de luxo sem levantar suspeitas, é perfeito - me lembrou muito "The Bling Ring" de Sofia Coppola, mas com uma pegada mais "Cidade de Deus".
"DOM" tem visual de minissérie da Globo e isso é um baita elogio, tudo funciona perfeitamente e nos proporciona um experiência bastante visceral. Não se deixe enganar por qualquer tipo de glamourização ou pelos apelidos de Pedro Dom - essa coisa de "bandido fashion" ou "bandido gato" é marketing para vender jornal de terceira. A série é muito mais profunda, pesada até - ela mostra o uso excessivo de drogas sem se preocupar com os extremos e, por isso, é bem provável que você precise de um tempo para se conectar com a história. Mas vale a pena, mesmo que a jornada exija uma pausa entre um episódio e outro para recuperar o fôlego!
"DOM" é surpreendentemente boa - e digo isso com a tranquilidade de quem sabe as dificuldades que é produzir uma série desse tamanho aqui no Brasil. Embora algumas decisões conceituais sejam impactados diretamente pela limitação do orçamento de sua produção, o resultado final é de extrema qualidade narrativa e visual. "DOM" é um recorte social do Rio de Janeiro dos anos 2000 na sua essência, construído a partir de uma base histórica de 30 anos, justamente quando as drogas começaram a invadir os morros cariocas e se transformar em um cruel negócio dos mais lucrativos.
Na série acompanhamos duas histórias reais que se completam: a de Pedro Dom, um belo rapaz da classe média carioca que foi apresentado à cocaína na adolescência e que acabou colocando ele frente a frente com o crime, onde se transformou no líder de uma gangue criminosa que dominou os tabloides cariocas no início dos anos 2000. E a de seu pai, Victor Dantas, ex-mergulhador, que quando jovem fez uma descoberta no fundo do mar que logo o direcionou para o serviço de inteligência da polícia para combater, justamente, o inicio do tráfico de drogas no país. Confira o trailer:
A série é baseada nas obras "O Beijo da Bruxa", de Luiz Victor Lomba, e "DOM", de Tony Bellotto. Produzido e dirigido pelo sempre impecável Breno Silveira (de "Dois Filhos de Francisco"), o roteiro é bastante competente em cobrir os eventos em duas linhas temporais que a principio parece ter "apenas" a droga como conexão, mas que, posso garantir, vai muito além disso. As marcas do passado de Victor impactam diretamente no seu relacionamento com a família e principalmente com seu filho Pedro - então é preciso que se diga: não se trata da história de mais um criminoso ou da romantização da construção de um mito, muito pelo contrário, "DOM" traz para a discussão um problema social sério, o tráfico de drogas e o impacto dele nas famílias.
Como já é de costume nos projetos de Breno Silveira, tecnicamente, "DOM" é um espetáculo. A fotografa do argentino Adrian Teijido (Capitu) mostra um contraste maravilhoso da cidade do Rio de Janeiro, criando uma dinâmica visual entre o morro, a praia e o asfalto, impressionante! A direção de Silveira, ao lado de Vicente Kubrusly, é precisa na construção do drama e das relações do núcleo central - só peca no trabalho com os atores do elenco de apoio. O trabalho do Claudio Amaral Peixoto na direção de arte também me chamou a atenção - o realismo quase minimalista compõe o cenário de uma forma completamente orgânica nas duas linhas temporais e ajuda demais na construção do mood da série.
Gabriel Leone é um dos melhores atores da sua geração - absolutamente tudo que assisti dele, me convenceu! Eu não gosto da sua versão adolescente na série, mas entendo a demanda. Sua postura como o jovem de classe média carioca, loiro e de olhos azuis, que aproveitava do racismo estrutural para entrar nos condomínios de luxo sem levantar suspeitas, é perfeito - me lembrou muito "The Bling Ring" de Sofia Coppola, mas com uma pegada mais "Cidade de Deus".
"DOM" tem visual de minissérie da Globo e isso é um baita elogio, tudo funciona perfeitamente e nos proporciona um experiência bastante visceral. Não se deixe enganar por qualquer tipo de glamourização ou pelos apelidos de Pedro Dom - essa coisa de "bandido fashion" ou "bandido gato" é marketing para vender jornal de terceira. A série é muito mais profunda, pesada até - ela mostra o uso excessivo de drogas sem se preocupar com os extremos e, por isso, é bem provável que você precise de um tempo para se conectar com a história. Mas vale a pena, mesmo que a jornada exija uma pausa entre um episódio e outro para recuperar o fôlego!
Antes de mais nada é preciso deixar claro que "Dor e Glória" é um filme do Almodóvar na sua forma e no seu conteúdo!
Primeiro vamos falar do conteúdo: o filme conta a história do diretor de cinema Salvador Mallo (Antonio Banderas) que vive mergulhado em uma amarga melancolia graças à fortes dores no seu corpo, principalmente nas costas, impossibilitando-o, inclusive, de amarrar seu tênis. Essa condição acaba impedindo Salvador de trabalhar normalmente, já que ele mesmo defende que a dinâmica de um set de filmagem requer muita energia, dedicação e saúde - elementos que ele não encontra mais em si! Conformado com sua nova condição, o cineasta é provocado a passar por um dolorido processo de auto-análise, se obrigando a revisitar o passado na busca de um único objetivo: encontrar o caminho para continuar sua vida, em paz!
Sim, "Dor e Glória" é um filme de enorme reflexão, saudosista e até egocêntrico (no melhor sentido da palavra), já que Salvador Mallo é o alter-ego do próprio Pedro Almodóvar, mas a forma (e é claro que vamos falar mais dela logo abaixo) como ele conduz sua história mexe com a gente, pois é impossível não pensar na nossa própria vida. Essa dinâmica é tão inteligente que projetamos um filme a cada assunto (ou momento) em que ele precisa enfrentar seus "demônios" e a entrega que ele faz no final é só mais um belíssimo detalhe para um fechamento com chave de ouro!
Olha, vale muito a pena se você estiver disposto a enfrentar um filme mais cadenciado, sem uma dinâmica narrativa que possa empolgar, mas que tem no texto e, principalmente, no subtexto, uma espécie de imersão emocional muito genuína e reflexiva! É preciso gostar de Almodóvar para não se decepcionar!
Quando partimos do princípio que Salvador já teve seus momentos de glória e que agora ele só consegue enxergar (ou sentir) a dor, física e emocional, facilmente nos conectamos com o belíssimo trabalho do Antonio Banderas - indicado ao Oscar por esse trabalho. Ele está impecável como Salvador Mallo e é preciso dar muito mérito ao Almodóvar por isso - ele é um exímio diretor de atores e foi capaz de tirar o melhor de um Banderas completamente mergulhado na psiquê do seu mentor e amigo. É muito interessante o contraste que o ator conseguiu imprimir no seu personagem: se por um lado ele está rodeado de cores vivas, arte e conforto, por outro lado ele está sozinho e é incapaz de se conectar com a forma com que ele via (e vivia) a vida - o fato do apartamento de Salvador ser do próprio Almodóvar, só fortalece essa sensação de conflito interno! Um detalhe interessante do roteiro (e que nos faz pensar em várias passagens do filme) é como a vida não nos permite "jogar a sujeira para baixo do tapete"; em algum momento ela vai trabalhar para que a gente possa, finalmente, resolver essas pendências. É muito inteligente como os "nós" vão sendo desatados sem precisar forçar a barra e quando achamos que existe um certo exagero (o que até seria perdoável pelo estilo do diretor) ele nos explica com um único movimento de câmera, exatamente na última cena - e tudo faz mais sentido! Genial! O roteiro toca em pontos delicados como a percepção sobre o homossexualismo logo na infância, a relação com a religião, com as drogas, com a mãe, com os parceiros de trabalho e de vida; enfim, tudo está lá e muito bem amarrado - eu não teria ficado surpreso se fosse indicado para o Oscar de melhor roteiro original!
A fotografia do seu parceiro de longa data (mais um), Jose Luis Alcaine, segue sua gramática visual: das cores vivas, do contraste, dos planos abertos e da câmera fixa em 90% do filme - enquadramentos que parecem uma pintura estão lá também! Outro elemento que precisa ser destacado é o elenco que, além de Bandeiras, conta com um Asier Etxeandia (Por siempre Jamón e Velvet) como o ator Alberto Crespo que ficou 30 anos brigado com Salvador por desentendimentos criativos (e de comportamento) e pela participação cirúrgica de Penélope Cruz (Volver) eJulieta Serrano (Cuando vuelvas a mi lado) como a mãe de Salvador, Jacinta: a primeira na juventude e a segunda pouco antes de sua morte - aliás o diálogo entre Jacinta e Salvador no final do filme é algo digno de muitos prêmios, de roteiro e de atuação!
"Dor e Glória" é um filme que teria mais chances no Oscar não fosse o fenômeno "Parasita". Sua história é profunda, baseada em um roteiro inteligente e em um personagem muito bem construído pelo Antonio Banderas. A direção do Pedro Almodóvar é tecnicamente perfeita e cheia de detalhes quase imperceptíveis, mas que fazem a diferença. Reparem como ele trabalha o silêncio dos atores e mesmo assim somos capazes de sentir exatamente o drama que eles estão passando - a cena onde Salvador se despede de Frederico na porta do seu apartamento é um ótimo exemplo de como o subtexto do filme é importante: ele diz uma coisa, mas seu olhar diz outra! É demais! Vale muito o seu play e se o estilo Almodóvar te agradar, você vai se divertir muito!
Antes de mais nada é preciso deixar claro que "Dor e Glória" é um filme do Almodóvar na sua forma e no seu conteúdo!
Primeiro vamos falar do conteúdo: o filme conta a história do diretor de cinema Salvador Mallo (Antonio Banderas) que vive mergulhado em uma amarga melancolia graças à fortes dores no seu corpo, principalmente nas costas, impossibilitando-o, inclusive, de amarrar seu tênis. Essa condição acaba impedindo Salvador de trabalhar normalmente, já que ele mesmo defende que a dinâmica de um set de filmagem requer muita energia, dedicação e saúde - elementos que ele não encontra mais em si! Conformado com sua nova condição, o cineasta é provocado a passar por um dolorido processo de auto-análise, se obrigando a revisitar o passado na busca de um único objetivo: encontrar o caminho para continuar sua vida, em paz!
Sim, "Dor e Glória" é um filme de enorme reflexão, saudosista e até egocêntrico (no melhor sentido da palavra), já que Salvador Mallo é o alter-ego do próprio Pedro Almodóvar, mas a forma (e é claro que vamos falar mais dela logo abaixo) como ele conduz sua história mexe com a gente, pois é impossível não pensar na nossa própria vida. Essa dinâmica é tão inteligente que projetamos um filme a cada assunto (ou momento) em que ele precisa enfrentar seus "demônios" e a entrega que ele faz no final é só mais um belíssimo detalhe para um fechamento com chave de ouro!
Olha, vale muito a pena se você estiver disposto a enfrentar um filme mais cadenciado, sem uma dinâmica narrativa que possa empolgar, mas que tem no texto e, principalmente, no subtexto, uma espécie de imersão emocional muito genuína e reflexiva! É preciso gostar de Almodóvar para não se decepcionar!
Quando partimos do princípio que Salvador já teve seus momentos de glória e que agora ele só consegue enxergar (ou sentir) a dor, física e emocional, facilmente nos conectamos com o belíssimo trabalho do Antonio Banderas - indicado ao Oscar por esse trabalho. Ele está impecável como Salvador Mallo e é preciso dar muito mérito ao Almodóvar por isso - ele é um exímio diretor de atores e foi capaz de tirar o melhor de um Banderas completamente mergulhado na psiquê do seu mentor e amigo. É muito interessante o contraste que o ator conseguiu imprimir no seu personagem: se por um lado ele está rodeado de cores vivas, arte e conforto, por outro lado ele está sozinho e é incapaz de se conectar com a forma com que ele via (e vivia) a vida - o fato do apartamento de Salvador ser do próprio Almodóvar, só fortalece essa sensação de conflito interno! Um detalhe interessante do roteiro (e que nos faz pensar em várias passagens do filme) é como a vida não nos permite "jogar a sujeira para baixo do tapete"; em algum momento ela vai trabalhar para que a gente possa, finalmente, resolver essas pendências. É muito inteligente como os "nós" vão sendo desatados sem precisar forçar a barra e quando achamos que existe um certo exagero (o que até seria perdoável pelo estilo do diretor) ele nos explica com um único movimento de câmera, exatamente na última cena - e tudo faz mais sentido! Genial! O roteiro toca em pontos delicados como a percepção sobre o homossexualismo logo na infância, a relação com a religião, com as drogas, com a mãe, com os parceiros de trabalho e de vida; enfim, tudo está lá e muito bem amarrado - eu não teria ficado surpreso se fosse indicado para o Oscar de melhor roteiro original!
A fotografia do seu parceiro de longa data (mais um), Jose Luis Alcaine, segue sua gramática visual: das cores vivas, do contraste, dos planos abertos e da câmera fixa em 90% do filme - enquadramentos que parecem uma pintura estão lá também! Outro elemento que precisa ser destacado é o elenco que, além de Bandeiras, conta com um Asier Etxeandia (Por siempre Jamón e Velvet) como o ator Alberto Crespo que ficou 30 anos brigado com Salvador por desentendimentos criativos (e de comportamento) e pela participação cirúrgica de Penélope Cruz (Volver) eJulieta Serrano (Cuando vuelvas a mi lado) como a mãe de Salvador, Jacinta: a primeira na juventude e a segunda pouco antes de sua morte - aliás o diálogo entre Jacinta e Salvador no final do filme é algo digno de muitos prêmios, de roteiro e de atuação!
"Dor e Glória" é um filme que teria mais chances no Oscar não fosse o fenômeno "Parasita". Sua história é profunda, baseada em um roteiro inteligente e em um personagem muito bem construído pelo Antonio Banderas. A direção do Pedro Almodóvar é tecnicamente perfeita e cheia de detalhes quase imperceptíveis, mas que fazem a diferença. Reparem como ele trabalha o silêncio dos atores e mesmo assim somos capazes de sentir exatamente o drama que eles estão passando - a cena onde Salvador se despede de Frederico na porta do seu apartamento é um ótimo exemplo de como o subtexto do filme é importante: ele diz uma coisa, mas seu olhar diz outra! É demais! Vale muito o seu play e se o estilo Almodóvar te agradar, você vai se divertir muito!
Você vai se surpreender com a qualidade narrativa e visual de "Doze Jurados"! Se em um primeiro momento a série da Één, emissora pública belga (mas que ganhou notoriedade ao ser distribuída mundialmente pela Netflix), soa como mais um drama jurídico, em poucos episódios você vai entender que além de uma crítica contundente sobre o sistema judicial da Bélgica, a história ainda expõe um elemento crucial que vai te provocar muitas reflexões: a parcialidade de um ser humano despreparado para uma determinada função. "De Twaalf" (no original) se diferencia pela forma como apresenta um estudo profundo do impacto emocional e psicológico de um julgamento de grande repercussão, tanto sobre os envolvidos diretamente no caso quanto (e especialmente) sobre os jurados. Criada por Sanne Nuyens, Bert Van Dael e Roel Mondelaers, a série traz uma abordagem até certo ponto inovadora, deixando os aspectos legais do julgamento apenas como complemento da narrativa para priorizar a vida pessoal dos jurados, cujas histórias individuais acabam influenciando suas percepções e decisões. "Doze Jurados" é uma trama complexa que vai além dos estereótipos das séries jurídicas tradicionais, oferecendo uma experiência realmente densa e emocionalmente impactante.
A premissa gira em torno de um julgamento que atrai grande atenção da mídia na Bélgica: Frie Palmers (Maaike Cafmeyer) é uma mulher divorciada acusada de dois assassinatos - da filha pequena e de sua melhor amiga. A série acompanha o desenrolar do processo do ponto de vista dos doze jurados que precisam decidir o destino de Frie. No entanto, enquanto o caso é exposto no tribunal, cada jurado traz para a corte suas próprias bagagens emocionais e questões pessoais, que acabam moldando a forma como cada um interpreta as evidências e os depoimentos das testemunhas, criando assim uma dinâmica capaz de destruir o que mais deveria importar: a busca pela verdade! Confira o trailer (com legendas em inglês):
Produzido pelaEyeworks Film, "Doze Jurados" brilha ao construir uma narrativa realmente envolvente que dá voz aos jurados, provocando um desconforto de fato angustiante ao expor que um julgamento não é apenas sobre a culpa ou a inocência, mas também sobre como a vida de cada um é afetada ao longo do processo. A série destaca o impacto que é ter que decidir o futuro de outra pessoa, mostrando como a vida dos jurados começam a se entrelaçar com o julgamento, trazendo para os holofotes dilemas pessoais, traumas e segredos que, intercaladas com o drama jurídico em si, cria uma jornada verdadeiramente rica em nuances como dificilmente encontramos no gênero. Veja, a roteiro mistura com sabedoria a tensão das cenas de tribunal com o desenvolvimento profundo dos personagens - especialmente nos flashbacks dos personagens. Essa proposta conceitual é eficaz em manter o ritmo da narrativa e entregar um certo tom de mistério em torno de todos os envolvidos no caso.
A direção de Wouter Bouvijn (de "1985") é precisa, com uma estética fria e claustrofóbica ao ponto de refletir o peso do julgamento com a mesma força que as tensões internas dos personagens - a câmera de Bouvijn tem um movimento quase documental, um identidade do cinema independente europeu e um timinig perfeito na construção do drama. Repare também como a fotografia utiliza bem o contraste entre os ambientes do tribunal, austeros e impessoais, com os momentos de intimidade dos jurados fora da corte, onde suas emoções ganham destaque quase sempre com uma lente fechada e um desfoque belíssimo do segundo plano. Essa proposta em criar o contrate visual entre o ambiente controlado do tribunal e a turbulência emocional do cotidiano ajuda demais a potencializar a atmosfera de crescente tensão - é impressionante como sentimos esse mood! As performances do elenco também merecem destaque, especialmente de Maaike Cafmeyer - ela traz uma intensidade contida que alimenta a ambiguidade da narrativa. Frie é retratada como uma mulher que oscila entre a dor e a frieza, o que nos mantém em dúvida sobre sua culpa ou inocência até o fim da temporada. Cafmeyer consegue transmitir essa ambiguidade com uma atuação sutil, sem exageros, o que torna seu personagem ainda mais intrigante. Outro nome que merece destaque é o de Maaike Neuville, a Delphine Spijkers - belíssimo trabalho.
"Doze Jurados" é um retrato realista do sistema de justiça e um recorte dos mais inteligente sobre a falibilidade humana. A série não oferece respostas fáceis; ao contrário, ela nos desafia a confrontar a complexidade de um julgamento pelos olhos da imperfeição humana, mostrando como nossas decisões são moldadas por nossas experiências pessoais e emoções. O roteiro, premiado no Cannes International Series Festival (ou para os mais íntimos, CannesSeries) sabe equilibrar diferentes narrativas de seus personagens, sem perder o foco no julgamento em si. eu diria que o golaço da série está na sua capacidade de escancarar a fragilidade e a subjetividade ao humanizar quem julga sem a propriedade de julgar!
Vale muito o seu play!
Você vai se surpreender com a qualidade narrativa e visual de "Doze Jurados"! Se em um primeiro momento a série da Één, emissora pública belga (mas que ganhou notoriedade ao ser distribuída mundialmente pela Netflix), soa como mais um drama jurídico, em poucos episódios você vai entender que além de uma crítica contundente sobre o sistema judicial da Bélgica, a história ainda expõe um elemento crucial que vai te provocar muitas reflexões: a parcialidade de um ser humano despreparado para uma determinada função. "De Twaalf" (no original) se diferencia pela forma como apresenta um estudo profundo do impacto emocional e psicológico de um julgamento de grande repercussão, tanto sobre os envolvidos diretamente no caso quanto (e especialmente) sobre os jurados. Criada por Sanne Nuyens, Bert Van Dael e Roel Mondelaers, a série traz uma abordagem até certo ponto inovadora, deixando os aspectos legais do julgamento apenas como complemento da narrativa para priorizar a vida pessoal dos jurados, cujas histórias individuais acabam influenciando suas percepções e decisões. "Doze Jurados" é uma trama complexa que vai além dos estereótipos das séries jurídicas tradicionais, oferecendo uma experiência realmente densa e emocionalmente impactante.
A premissa gira em torno de um julgamento que atrai grande atenção da mídia na Bélgica: Frie Palmers (Maaike Cafmeyer) é uma mulher divorciada acusada de dois assassinatos - da filha pequena e de sua melhor amiga. A série acompanha o desenrolar do processo do ponto de vista dos doze jurados que precisam decidir o destino de Frie. No entanto, enquanto o caso é exposto no tribunal, cada jurado traz para a corte suas próprias bagagens emocionais e questões pessoais, que acabam moldando a forma como cada um interpreta as evidências e os depoimentos das testemunhas, criando assim uma dinâmica capaz de destruir o que mais deveria importar: a busca pela verdade! Confira o trailer (com legendas em inglês):
Produzido pelaEyeworks Film, "Doze Jurados" brilha ao construir uma narrativa realmente envolvente que dá voz aos jurados, provocando um desconforto de fato angustiante ao expor que um julgamento não é apenas sobre a culpa ou a inocência, mas também sobre como a vida de cada um é afetada ao longo do processo. A série destaca o impacto que é ter que decidir o futuro de outra pessoa, mostrando como a vida dos jurados começam a se entrelaçar com o julgamento, trazendo para os holofotes dilemas pessoais, traumas e segredos que, intercaladas com o drama jurídico em si, cria uma jornada verdadeiramente rica em nuances como dificilmente encontramos no gênero. Veja, a roteiro mistura com sabedoria a tensão das cenas de tribunal com o desenvolvimento profundo dos personagens - especialmente nos flashbacks dos personagens. Essa proposta conceitual é eficaz em manter o ritmo da narrativa e entregar um certo tom de mistério em torno de todos os envolvidos no caso.
A direção de Wouter Bouvijn (de "1985") é precisa, com uma estética fria e claustrofóbica ao ponto de refletir o peso do julgamento com a mesma força que as tensões internas dos personagens - a câmera de Bouvijn tem um movimento quase documental, um identidade do cinema independente europeu e um timinig perfeito na construção do drama. Repare também como a fotografia utiliza bem o contraste entre os ambientes do tribunal, austeros e impessoais, com os momentos de intimidade dos jurados fora da corte, onde suas emoções ganham destaque quase sempre com uma lente fechada e um desfoque belíssimo do segundo plano. Essa proposta em criar o contrate visual entre o ambiente controlado do tribunal e a turbulência emocional do cotidiano ajuda demais a potencializar a atmosfera de crescente tensão - é impressionante como sentimos esse mood! As performances do elenco também merecem destaque, especialmente de Maaike Cafmeyer - ela traz uma intensidade contida que alimenta a ambiguidade da narrativa. Frie é retratada como uma mulher que oscila entre a dor e a frieza, o que nos mantém em dúvida sobre sua culpa ou inocência até o fim da temporada. Cafmeyer consegue transmitir essa ambiguidade com uma atuação sutil, sem exageros, o que torna seu personagem ainda mais intrigante. Outro nome que merece destaque é o de Maaike Neuville, a Delphine Spijkers - belíssimo trabalho.
"Doze Jurados" é um retrato realista do sistema de justiça e um recorte dos mais inteligente sobre a falibilidade humana. A série não oferece respostas fáceis; ao contrário, ela nos desafia a confrontar a complexidade de um julgamento pelos olhos da imperfeição humana, mostrando como nossas decisões são moldadas por nossas experiências pessoais e emoções. O roteiro, premiado no Cannes International Series Festival (ou para os mais íntimos, CannesSeries) sabe equilibrar diferentes narrativas de seus personagens, sem perder o foco no julgamento em si. eu diria que o golaço da série está na sua capacidade de escancarar a fragilidade e a subjetividade ao humanizar quem julga sem a propriedade de julgar!
Vale muito o seu play!
"Dreamgirls" (que no Brasil ganhou o subtítulo de "Em Busca de um Sonho") é uma verdadeira viagem pela "Black Music" através dos anos 60, 70 e 80, com suas releituras e o seu movimento (politico, social e cultural). Visualmente impecável, o filme é um musical bem construído e potente, que carrega em seus personagens o ritmo e o drama com a mesma importância, e mesmo que falte um aprofundamento maior nas histórias isoladas, o conjunto é praticamente impecável, realista e emocionante - um verdadeiro show!
Baseado no musical homônimo, que estreou na Broadway em 1981, "Dreamgirls" acompanha a jornada de Effie White (Jennifer Hudson), Deena Jones (Beyoncé) e Lorrell Robinson (Anika Noni Rose) que formam um grupo musical e começam a fazer sucesso com a ajuda de um empresário extremamente manipulador, Curtis Taylor Jr. (Jamie Foxx). Não demora para surgir tensões inconciliáveis entre as talentosas jovens quando Curtis resolve mudar a dinâmica do grupo para se ajustar a uma demanda do mercado. Confira o trailer (em inglês):
O roteiro do excelente Bill Condon (de "Deuses e Monstros" e "Chicago") adapta com muita qualidade o espetáculo de Tom Eyen e nos apresenta um trio fictício livremente inspirado na história de Diana Ross e as Supremes. O caminho entre a realidade e a ficção é praticamente o mesmo: três garotas de Detroit são descobertas pela recém-inagurada gravadora Motown ao fazerem muito sucesso com um ingênuo, mas envolvente, doo-wopda época. Logo depois, a líder, daquele estilo "Diva", com a voz mais potente, mas esteticamente menos atraente, é trocada pela integrante mais bonita, tudo isso para que o grupo emplaque nas paradas de sucesso. Daí vem a necessidade de se reinventar, custe o que custar, com o trio se moldando à moda musical de cada época, do soul ao disco music das décadas de 70 e 80.
O interessante porém, é que essa jornada de sucesso, conflitos, decadência e reinvenção é até melhor trabalhado pelo diretor do que pelo roteiro - não que a história seja ruim, mas o recorte temporal é muito extenso e com isso fica impossível se aprofundar nas peculiaridades de cada momento com o a mesma qualidade que vemos no prólogo. Condon que também dirige o filme, aplica um conceito estético muito particular, que equilibra perfeitamente a tradição dos musicais da Broadway com a modernidade das superproduções dos vídeo clipes para criar uma atmosfera cinematográfica bem alinhada com o mood da disrupção do cenário musical - mesmo respeitando as características mais marcantes de cada período.
"Dreamgirls" é belíssimo como musical e muito competente como drama. Se Beyoncé não pode ser considerada uma atriz de primeira linha, certamente ela também não decepciona ao encarnar, com muita propriedade, aquele perfil de cantora que se adapta a um novo momento da música negra. Por outro lado, a novata Jennifer Hudson rouba a cena assim que abre a boca - todos os seus solos são verdadeiros monólogos cantados, de se aplaudir de pé. Eddie Murphy como James 'Thunder' Early, uma mistura de James Brown com Marvin Gaye, alcança o grande papel dramático da sua carreira - ele está sensacional!
Entretenimento de primeira qualidade artística e técnica, com ritmo, cor, drama e muita emoção!
Pode dar o play sem o menor receio!
Up-date: "Dreamgirls" ganhou em duas categorias no Oscar 2007: Melhor Atriz Coadjuvante e Melhor Mixagem, mas esteve indicado em mais 4 categorias, sendo que em "Melhor Música" tinha três composições na disputa.
"Dreamgirls" (que no Brasil ganhou o subtítulo de "Em Busca de um Sonho") é uma verdadeira viagem pela "Black Music" através dos anos 60, 70 e 80, com suas releituras e o seu movimento (politico, social e cultural). Visualmente impecável, o filme é um musical bem construído e potente, que carrega em seus personagens o ritmo e o drama com a mesma importância, e mesmo que falte um aprofundamento maior nas histórias isoladas, o conjunto é praticamente impecável, realista e emocionante - um verdadeiro show!
Baseado no musical homônimo, que estreou na Broadway em 1981, "Dreamgirls" acompanha a jornada de Effie White (Jennifer Hudson), Deena Jones (Beyoncé) e Lorrell Robinson (Anika Noni Rose) que formam um grupo musical e começam a fazer sucesso com a ajuda de um empresário extremamente manipulador, Curtis Taylor Jr. (Jamie Foxx). Não demora para surgir tensões inconciliáveis entre as talentosas jovens quando Curtis resolve mudar a dinâmica do grupo para se ajustar a uma demanda do mercado. Confira o trailer (em inglês):
O roteiro do excelente Bill Condon (de "Deuses e Monstros" e "Chicago") adapta com muita qualidade o espetáculo de Tom Eyen e nos apresenta um trio fictício livremente inspirado na história de Diana Ross e as Supremes. O caminho entre a realidade e a ficção é praticamente o mesmo: três garotas de Detroit são descobertas pela recém-inagurada gravadora Motown ao fazerem muito sucesso com um ingênuo, mas envolvente, doo-wopda época. Logo depois, a líder, daquele estilo "Diva", com a voz mais potente, mas esteticamente menos atraente, é trocada pela integrante mais bonita, tudo isso para que o grupo emplaque nas paradas de sucesso. Daí vem a necessidade de se reinventar, custe o que custar, com o trio se moldando à moda musical de cada época, do soul ao disco music das décadas de 70 e 80.
O interessante porém, é que essa jornada de sucesso, conflitos, decadência e reinvenção é até melhor trabalhado pelo diretor do que pelo roteiro - não que a história seja ruim, mas o recorte temporal é muito extenso e com isso fica impossível se aprofundar nas peculiaridades de cada momento com o a mesma qualidade que vemos no prólogo. Condon que também dirige o filme, aplica um conceito estético muito particular, que equilibra perfeitamente a tradição dos musicais da Broadway com a modernidade das superproduções dos vídeo clipes para criar uma atmosfera cinematográfica bem alinhada com o mood da disrupção do cenário musical - mesmo respeitando as características mais marcantes de cada período.
"Dreamgirls" é belíssimo como musical e muito competente como drama. Se Beyoncé não pode ser considerada uma atriz de primeira linha, certamente ela também não decepciona ao encarnar, com muita propriedade, aquele perfil de cantora que se adapta a um novo momento da música negra. Por outro lado, a novata Jennifer Hudson rouba a cena assim que abre a boca - todos os seus solos são verdadeiros monólogos cantados, de se aplaudir de pé. Eddie Murphy como James 'Thunder' Early, uma mistura de James Brown com Marvin Gaye, alcança o grande papel dramático da sua carreira - ele está sensacional!
Entretenimento de primeira qualidade artística e técnica, com ritmo, cor, drama e muita emoção!
Pode dar o play sem o menor receio!
Up-date: "Dreamgirls" ganhou em duas categorias no Oscar 2007: Melhor Atriz Coadjuvante e Melhor Mixagem, mas esteve indicado em mais 4 categorias, sendo que em "Melhor Música" tinha três composições na disputa.
Se há um filme que merece ser destacado como uma obra imperdível do cinema contemporâneo, esse é "Drive My Car" (2021), dirigido magistralmente por Ryûsuke Hamaguchi (de "Roda do Destino"). Esta produção japonesa, vencedora do Oscar de Melhor Filme Internacional em 2022, não apenas cativa a audiência com uma narrativa emocionante como mas também eleva o cinema a novos patamares de excelência técnica e artística - mais uma vez quebrando as barreiras do idioma em diversas formas (eu diria, inclusive, de uma maneira bem metalinguística)! Vencedor de inúmeros prêmios em festivais ao redor do mundo, "Drive My Car" é uma jornada que transcende as fronteiras culturais, deixando uma marca profunda na alma e na mente de quem o assiste ao discutir temas como a morte, o arrependimento, a perseverança e a redenção, sempre chancelado pelo texto do indiscutível dramaturgo russo Anton Tchekhov e de seu "Tio Vanya" (de 1897). Olha, para os apreciadores de um cinema independente que busca uma experiência tão intensa quanto reflexiva, mas sem perder a sensibilidade, esse filme é um verdadeiro achado!
Na trama, conhecemos Yusuke Kafuku (Hidetoshi Nishijima), um renomado ator e diretor de teatro que se vê confrontado com uma devastadora perda pessoal. Quando ele recebe uma oferta para dirigir uma produção de "Tio Vanya" em Hiroshima, Yusuke mergulha em uma jornada de autoconhecimento e cura. Ao longo do caminho, ele desenvolve uma conexão improvável com a jovem motorista Misaki (Tôko Miura), que, embora inicialmente tensa, se transforma em uma relação de confiança e afeto, permitindo que ambos explorem seus traumas e encontrem uma redenção definitiva. Confira o trailer:
Um fato: "Drive My Car" é impressionante em vários sentidos. A maneira como Hamaguchi cadencia sua narrativa em troca de tecer camadas complexas de emoção e cheias de significado, onde cada cena funciona como uma espécie de quebra-cabeça íntimo, sem dúvida, é o ponto alto do filme. Nada está ali por acaso. A fotografia do Hidetoshi Shinomiya (de "O Grito"), por exemplo, captura a beleza melancólica daquela paisagem marcante de Hiroshima, enquanto a trilha sonora sutilmente evoca uma gama de sentimentos, desde a nostalgia até a esperança - tudo isso 100% alinhado com o conceito do diretor, mas sem precisar aparecer demais.
A direção de Hamaguchi é verdadeiramente inspiradora, permitindo que os momentos silenciosos e introspectivos da narrativa ressoem com um poder emocional como poucas vezes vemos. A cena de "Tio Vanya" e sua mensagem final, faz tudo fazer sentido sem uma única palavra precisar sem dita - é um espetáculo inesquecível! E aqui cabe mais alguns elogios: a montagem meticulosa do Azusa Yamazaki cria um ritmo hipnótico, nos convidando para uma jornada interior de uma forma visceral e envolvente, enquanto Nishijima entrega uma performance monumental, transmitindo a angústia de seu personagem com uma capacidade técnica exemplar - reparem como a dor e a fragilidade estão nos seus olhos a cada interação.
O fato é que "Drive My Car" não é nada fácil - daqueles filmes que apenas contam uma história e tudo bem. Aqui temos uma incrível experiência sensorial e emocional que fica gravada na memória muito depois que os créditos finais rolam. Com sua narrativa profundamente comovente, performances excepcionais e uma direção habilidosa, esse filme é daquelas obras que nos faz refletir sobre o luto, sobre a memória e sobre o poder da arte como ferramenta de cura e transformação!
Imperdível!
Up-date: "Drive My Car" ganhou em uma categoria no Oscar 2022 (como adiantamos), mas foi indicado em mais três: Direção, Roteiro Adaptado e até Melhor Filme do Ano!
Se há um filme que merece ser destacado como uma obra imperdível do cinema contemporâneo, esse é "Drive My Car" (2021), dirigido magistralmente por Ryûsuke Hamaguchi (de "Roda do Destino"). Esta produção japonesa, vencedora do Oscar de Melhor Filme Internacional em 2022, não apenas cativa a audiência com uma narrativa emocionante como mas também eleva o cinema a novos patamares de excelência técnica e artística - mais uma vez quebrando as barreiras do idioma em diversas formas (eu diria, inclusive, de uma maneira bem metalinguística)! Vencedor de inúmeros prêmios em festivais ao redor do mundo, "Drive My Car" é uma jornada que transcende as fronteiras culturais, deixando uma marca profunda na alma e na mente de quem o assiste ao discutir temas como a morte, o arrependimento, a perseverança e a redenção, sempre chancelado pelo texto do indiscutível dramaturgo russo Anton Tchekhov e de seu "Tio Vanya" (de 1897). Olha, para os apreciadores de um cinema independente que busca uma experiência tão intensa quanto reflexiva, mas sem perder a sensibilidade, esse filme é um verdadeiro achado!
Na trama, conhecemos Yusuke Kafuku (Hidetoshi Nishijima), um renomado ator e diretor de teatro que se vê confrontado com uma devastadora perda pessoal. Quando ele recebe uma oferta para dirigir uma produção de "Tio Vanya" em Hiroshima, Yusuke mergulha em uma jornada de autoconhecimento e cura. Ao longo do caminho, ele desenvolve uma conexão improvável com a jovem motorista Misaki (Tôko Miura), que, embora inicialmente tensa, se transforma em uma relação de confiança e afeto, permitindo que ambos explorem seus traumas e encontrem uma redenção definitiva. Confira o trailer:
Um fato: "Drive My Car" é impressionante em vários sentidos. A maneira como Hamaguchi cadencia sua narrativa em troca de tecer camadas complexas de emoção e cheias de significado, onde cada cena funciona como uma espécie de quebra-cabeça íntimo, sem dúvida, é o ponto alto do filme. Nada está ali por acaso. A fotografia do Hidetoshi Shinomiya (de "O Grito"), por exemplo, captura a beleza melancólica daquela paisagem marcante de Hiroshima, enquanto a trilha sonora sutilmente evoca uma gama de sentimentos, desde a nostalgia até a esperança - tudo isso 100% alinhado com o conceito do diretor, mas sem precisar aparecer demais.
A direção de Hamaguchi é verdadeiramente inspiradora, permitindo que os momentos silenciosos e introspectivos da narrativa ressoem com um poder emocional como poucas vezes vemos. A cena de "Tio Vanya" e sua mensagem final, faz tudo fazer sentido sem uma única palavra precisar sem dita - é um espetáculo inesquecível! E aqui cabe mais alguns elogios: a montagem meticulosa do Azusa Yamazaki cria um ritmo hipnótico, nos convidando para uma jornada interior de uma forma visceral e envolvente, enquanto Nishijima entrega uma performance monumental, transmitindo a angústia de seu personagem com uma capacidade técnica exemplar - reparem como a dor e a fragilidade estão nos seus olhos a cada interação.
O fato é que "Drive My Car" não é nada fácil - daqueles filmes que apenas contam uma história e tudo bem. Aqui temos uma incrível experiência sensorial e emocional que fica gravada na memória muito depois que os créditos finais rolam. Com sua narrativa profundamente comovente, performances excepcionais e uma direção habilidosa, esse filme é daquelas obras que nos faz refletir sobre o luto, sobre a memória e sobre o poder da arte como ferramenta de cura e transformação!
Imperdível!
Up-date: "Drive My Car" ganhou em uma categoria no Oscar 2022 (como adiantamos), mas foi indicado em mais três: Direção, Roteiro Adaptado e até Melhor Filme do Ano!
É praticamente impossível iniciar qualquer conversa sobre o excelente "Druk - mais uma rodada", sem pontuar que ele foi o grande vencedor da categoria "Filme Internacional" no Oscar de 2021 - isso sem falar nas mais de 60 vitórias que colecionou ao redor do mundo em festivais e premiações como Goya, César e Bafta, para citar só os "fora dos EUA". Dito isso, fica fácil atestar que o filme dirigido pelo "pra lá de talentoso", Thomas Vinterberg (do imperdível "A Caça"), é uma experiência cinematográfica universal que cativa a audiência desde os primeiros minutos até um emocionante desfecho. Essa obra, que explora a relação entre álcool e a vida cotidiana de maneira única, é uma verdadeira pérola do cinema contemporâneo que merece muito a sua atenção. Aliás, o que torna "Druk" tão especial assim é justamente a profundidade da narrativa e como a impecável performance do elenco, liderado por Mads Mikkelsen, estão tão bem alinhados ao ponto de abordar temas tão complexos com um toque impressionante de humanidade.
Em "Another Round" (no original) acompanhamos a história de quatro amigos, professores de meia-idade, interpretados por Mads Mikkelsen (Martin), Thomas Bo Larsen (Tommy), Magnus Millang (Nikolaj) e Lars Ranthe (Peter), que decidem embarcar em um experimento, no mínimo, ousado: manter um nível constante de álcool no sangue para melhorar suas vidas pessoais e profissionais. No início, essa aventura os leva a redescobrir o prazer da vida, mas, à medida que o experimento avança, eles se veem confrontando as consequências e desafios inesperados. Confira o trailer:
Não é preciso ser um especialista para perceber como Vinterberg (também indicado ao Oscar como "Melhor Diretor") e sua equipe técnica alcançam uma harmonia excepcional entre a direção, o texto, a fotografia e a trilha sonora. A cinematografia de Sturla Brandth Grovlen (de "Victoria") capta brilhantemente a transformação gradual dos personagens e sua crescente euforia à medida que seus níveis de álcool vão subindo e subindo. Essa "dança visual" espelha as oscilações emocionais dos protagonistas - o que deixa claro que tudo aquilo não passa de uma “ideia estúpida” pela óbvia possibilidade de se transformar em alcoolismo, no entanto existe um ponto a ser levado em conta: o olhar sobre as necessidades de cada um em termos de relações interpessoais. Reparem como a montagem de Janus Billeskov Jansen e a trilha sonoracomplementam de maneira sutil e eficaz os momentos de intensidade emocional, ressaltando toda aquela atmosfera envolvente do filme.
Mads Mikkelsen entrega uma das melhores performances de sua carreira - chega a ser impressionante o carisma tão raro para um ator escandinavo capaz de trazer complexidade e autenticidade ao personagem sem soar expositivo demais. Sua jornada de transformação como Martin, do professor desanimado até o homem redescobrindo sua paixão pela vida, é convincente e comovente ao mesmo tempo - o que na minha opinião justificaria sua indicação (já tardia) para o Oscar de Melhor Ator. Aliás, todo o elenco se destaca, cada qual com suas dores e alegrias, proporcionando um equilíbrio perfeito entre humor e drama como poucas vezes encontramos.
"Druk" é de fato uma obra que nos faz refletir sobre a nossa relação com o álcool, sobre a busca pela autenticidade na vida adulta e a importância de viver plenamente - esse contexto de crise de meia idade é bastante linear na sua previsibilidade, no entanto é envolvente e de fácil identificação. Com isso Vinterberg nos entrega uma verdadeira experiência emocional, que desafia expectativas, oferecendo uma certa crítica à hipocrisia social - se existe uma "moral da história" muito simples em favor da alegria de viver, não se deve deixar de discutir como uma sociedade é capaz de reconhecer sua patológica sensação de tédio e de fadiga espiritual tão "facilmente".Ao final, claro, o filme se propõe a deixar uma mensagem emocionalmente impactante sobre a importância de encontrar um equilíbrio na vida, no entanto saiba que aqui o interessante é mesmo a jornada, não o seu fim!
Vale muito o seu play!
É praticamente impossível iniciar qualquer conversa sobre o excelente "Druk - mais uma rodada", sem pontuar que ele foi o grande vencedor da categoria "Filme Internacional" no Oscar de 2021 - isso sem falar nas mais de 60 vitórias que colecionou ao redor do mundo em festivais e premiações como Goya, César e Bafta, para citar só os "fora dos EUA". Dito isso, fica fácil atestar que o filme dirigido pelo "pra lá de talentoso", Thomas Vinterberg (do imperdível "A Caça"), é uma experiência cinematográfica universal que cativa a audiência desde os primeiros minutos até um emocionante desfecho. Essa obra, que explora a relação entre álcool e a vida cotidiana de maneira única, é uma verdadeira pérola do cinema contemporâneo que merece muito a sua atenção. Aliás, o que torna "Druk" tão especial assim é justamente a profundidade da narrativa e como a impecável performance do elenco, liderado por Mads Mikkelsen, estão tão bem alinhados ao ponto de abordar temas tão complexos com um toque impressionante de humanidade.
Em "Another Round" (no original) acompanhamos a história de quatro amigos, professores de meia-idade, interpretados por Mads Mikkelsen (Martin), Thomas Bo Larsen (Tommy), Magnus Millang (Nikolaj) e Lars Ranthe (Peter), que decidem embarcar em um experimento, no mínimo, ousado: manter um nível constante de álcool no sangue para melhorar suas vidas pessoais e profissionais. No início, essa aventura os leva a redescobrir o prazer da vida, mas, à medida que o experimento avança, eles se veem confrontando as consequências e desafios inesperados. Confira o trailer:
Não é preciso ser um especialista para perceber como Vinterberg (também indicado ao Oscar como "Melhor Diretor") e sua equipe técnica alcançam uma harmonia excepcional entre a direção, o texto, a fotografia e a trilha sonora. A cinematografia de Sturla Brandth Grovlen (de "Victoria") capta brilhantemente a transformação gradual dos personagens e sua crescente euforia à medida que seus níveis de álcool vão subindo e subindo. Essa "dança visual" espelha as oscilações emocionais dos protagonistas - o que deixa claro que tudo aquilo não passa de uma “ideia estúpida” pela óbvia possibilidade de se transformar em alcoolismo, no entanto existe um ponto a ser levado em conta: o olhar sobre as necessidades de cada um em termos de relações interpessoais. Reparem como a montagem de Janus Billeskov Jansen e a trilha sonoracomplementam de maneira sutil e eficaz os momentos de intensidade emocional, ressaltando toda aquela atmosfera envolvente do filme.
Mads Mikkelsen entrega uma das melhores performances de sua carreira - chega a ser impressionante o carisma tão raro para um ator escandinavo capaz de trazer complexidade e autenticidade ao personagem sem soar expositivo demais. Sua jornada de transformação como Martin, do professor desanimado até o homem redescobrindo sua paixão pela vida, é convincente e comovente ao mesmo tempo - o que na minha opinião justificaria sua indicação (já tardia) para o Oscar de Melhor Ator. Aliás, todo o elenco se destaca, cada qual com suas dores e alegrias, proporcionando um equilíbrio perfeito entre humor e drama como poucas vezes encontramos.
"Druk" é de fato uma obra que nos faz refletir sobre a nossa relação com o álcool, sobre a busca pela autenticidade na vida adulta e a importância de viver plenamente - esse contexto de crise de meia idade é bastante linear na sua previsibilidade, no entanto é envolvente e de fácil identificação. Com isso Vinterberg nos entrega uma verdadeira experiência emocional, que desafia expectativas, oferecendo uma certa crítica à hipocrisia social - se existe uma "moral da história" muito simples em favor da alegria de viver, não se deve deixar de discutir como uma sociedade é capaz de reconhecer sua patológica sensação de tédio e de fadiga espiritual tão "facilmente".Ao final, claro, o filme se propõe a deixar uma mensagem emocionalmente impactante sobre a importância de encontrar um equilíbrio na vida, no entanto saiba que aqui o interessante é mesmo a jornada, não o seu fim!
Vale muito o seu play!
Definitivamente "Duck Butter" não é um filme fácil, mas dentro da sua proposta é um filme que me atraiu, principalmente por ser muito bem dirigido pelo Porto-riquenho Miguel Arteta - diretor que veio da TV e que fez um belo trabalho de direção de atores nesse filme. "Duck Butter" bebe na fonte do francês "La vie d'Adèle" (Azul é a cor mais quente), mas sem a mesma força, na minha opinião.
O filme trata da relação entre duas jovens completamente diferentes que, por circunstâncias de vida, acabam se aproximando e vivendo uma intensa relação de 24 horas que vai minguando de acordo com a aproximação da realidade que é a vida e que é estar em uma relação! É preciso dizer que o filme é intenso no conteúdo e na maneira de expor essas "imperfeições" do ser humano. É um filme que discute até quanto "mandar tudo a m..." é um caminho a se considerar.
Miguel Arteta tem sensibilidade e aplica isso nas escolhas que faz com sua diretora de fotografia Hillary Spera. O filme foi finalista no Tribeca Film Festival de 2018 e tem como grande nome a Laia Costa uma jovem e talentosa atriz que merece atenção pelo seu trabalho - é o segundo filme que assisto dela (o primeiro foi "Newness") e em ambos ela mandou muito bem!
Filme complicado, mas para quem gosta de filmes independentes com ótima carreira em Festivais, é imperdível!!!
Definitivamente "Duck Butter" não é um filme fácil, mas dentro da sua proposta é um filme que me atraiu, principalmente por ser muito bem dirigido pelo Porto-riquenho Miguel Arteta - diretor que veio da TV e que fez um belo trabalho de direção de atores nesse filme. "Duck Butter" bebe na fonte do francês "La vie d'Adèle" (Azul é a cor mais quente), mas sem a mesma força, na minha opinião.
O filme trata da relação entre duas jovens completamente diferentes que, por circunstâncias de vida, acabam se aproximando e vivendo uma intensa relação de 24 horas que vai minguando de acordo com a aproximação da realidade que é a vida e que é estar em uma relação! É preciso dizer que o filme é intenso no conteúdo e na maneira de expor essas "imperfeições" do ser humano. É um filme que discute até quanto "mandar tudo a m..." é um caminho a se considerar.
Miguel Arteta tem sensibilidade e aplica isso nas escolhas que faz com sua diretora de fotografia Hillary Spera. O filme foi finalista no Tribeca Film Festival de 2018 e tem como grande nome a Laia Costa uma jovem e talentosa atriz que merece atenção pelo seu trabalho - é o segundo filme que assisto dela (o primeiro foi "Newness") e em ambos ela mandou muito bem!
Filme complicado, mas para quem gosta de filmes independentes com ótima carreira em Festivais, é imperdível!!!
"É apenas o Fim do Mundo" é um filme difícil, não por uma narrativa complicada ou por um conceito visual ou estético que nos provoque muito mais do que nos mostre; mas pela forma como o jovem diretor canadense Xavier Dolan constrói um espetáculo onde os personagens são profundos, machucados, amargurados e inconsequentes em seus atos e, pricipalmente, em suas palavras. É perceptível a dor enrustida em cada um deles, com motivos, claro, mas sem nenhum controle ou respiro para reflexão. É um "misancene" tão real, palpável e comum, que chega a ferir quem assiste - pelo simples fato de entender que toda história tem dois lados e mesmo sem a coragem de encarar os fatos, todos preferem em alimentar a dor, do que ter que enfrentá-la.
Baseado na peça homônima de Jean-Luc Lagarce de 1990, "É apenas o Fim do Mundo" acompanha um jovem e renomado dramaturgo, Louis (Gaspard Ulliel), que resolve visitar sua família após 12 anos de ausência. Seu objetivo, no entanto, é revelar sua iminente morte para sua mãe (Nathalie Baye), para sua irmã mais nova (Léa Seydoux) com quem praticamente não se relacionou, para o ressentido irmão mais velho (Vincent Cassel) e sua submissa esposa (Marion Cottilard). Confira o trailer:
Xavier Dolan praticamente dirige o filme com uma lente 85mm, ou seja, com planos extremamente fechado ele parece querer que as almas dos personagens sejam lidas, e vou te dizer: funciona! As relações estabelecidas assim que Louis entra na casa de sua família já nos indica exatamente onde estamos nos enfiando - no caos emocional! Ao acompanhar essa dinâmica, o roteiro nos dá o primeiro gatilho: é compreensível que Louis tenha se mantido afastado de sua família por tanto tempo, limitando-se a enviar cartões em datas comemorativas. Mas com o passar do tempo, vem o segundo e poderoso gatilho: mas e o outro lado? E o sentimento de inferioridade e inadequação do irmão mais velho? E a ansiedade de Suzanne para impressionar o irmão famoso que pouco conhece? E a tentativa da mãe em transformar tantas mágoas e recuperar essas relações completamente fragmentadas? Até Catherine, a cunhada, sofre com os reflexos de tudo isso ao ter que lidar com um marido ignorante que a transformou em uma mulher insegura que mal pode se expressar - e aqui cabe um comentário que merece sua atenção: Marion Cottilard é uma grande atriz e todos sabemos disso, mas a capacidade que ela tem de expressar seus sentimentos apenas com o olhar, é de cair o queixo! Reparem!
O filme brilha ao expor a capacidade de interpretação dos atores. "É apenas o Fim do Mundo" é um filme de diálogos, de confrontos, de atuação! Nenhuma discussão é por acaso e tudo ajuda a construir (ou desvendar) as inúmeras camadas de cada um dos personagens - estamos falando de um obra independente, autoral, de relação, com uma referência teatral enorme, cheio de poesia, metáforas, símbolos, sensibilidade - inclusive na fotografia que pontua a troca de atmosferas e a distância entre o que é dito e o que é pensado - a mudança de luz no terceiro ato, entre a chuva e o sol que surge é incrível! Isso é lindo e muito difícil de equilibrar com o realismo que o cinema pede nesse tipo de filme.
O fato é que se você gostou dos também franceses "Até a Eternidade" (ou Les Petits Mouchoirs) ou "Frankie" é muito provável que você vai se identificar com "É apenas o Fim do Mundo", mas se prepare: vai doer na alma!
"É apenas o Fim do Mundo" é um filme difícil, não por uma narrativa complicada ou por um conceito visual ou estético que nos provoque muito mais do que nos mostre; mas pela forma como o jovem diretor canadense Xavier Dolan constrói um espetáculo onde os personagens são profundos, machucados, amargurados e inconsequentes em seus atos e, pricipalmente, em suas palavras. É perceptível a dor enrustida em cada um deles, com motivos, claro, mas sem nenhum controle ou respiro para reflexão. É um "misancene" tão real, palpável e comum, que chega a ferir quem assiste - pelo simples fato de entender que toda história tem dois lados e mesmo sem a coragem de encarar os fatos, todos preferem em alimentar a dor, do que ter que enfrentá-la.
Baseado na peça homônima de Jean-Luc Lagarce de 1990, "É apenas o Fim do Mundo" acompanha um jovem e renomado dramaturgo, Louis (Gaspard Ulliel), que resolve visitar sua família após 12 anos de ausência. Seu objetivo, no entanto, é revelar sua iminente morte para sua mãe (Nathalie Baye), para sua irmã mais nova (Léa Seydoux) com quem praticamente não se relacionou, para o ressentido irmão mais velho (Vincent Cassel) e sua submissa esposa (Marion Cottilard). Confira o trailer:
Xavier Dolan praticamente dirige o filme com uma lente 85mm, ou seja, com planos extremamente fechado ele parece querer que as almas dos personagens sejam lidas, e vou te dizer: funciona! As relações estabelecidas assim que Louis entra na casa de sua família já nos indica exatamente onde estamos nos enfiando - no caos emocional! Ao acompanhar essa dinâmica, o roteiro nos dá o primeiro gatilho: é compreensível que Louis tenha se mantido afastado de sua família por tanto tempo, limitando-se a enviar cartões em datas comemorativas. Mas com o passar do tempo, vem o segundo e poderoso gatilho: mas e o outro lado? E o sentimento de inferioridade e inadequação do irmão mais velho? E a ansiedade de Suzanne para impressionar o irmão famoso que pouco conhece? E a tentativa da mãe em transformar tantas mágoas e recuperar essas relações completamente fragmentadas? Até Catherine, a cunhada, sofre com os reflexos de tudo isso ao ter que lidar com um marido ignorante que a transformou em uma mulher insegura que mal pode se expressar - e aqui cabe um comentário que merece sua atenção: Marion Cottilard é uma grande atriz e todos sabemos disso, mas a capacidade que ela tem de expressar seus sentimentos apenas com o olhar, é de cair o queixo! Reparem!
O filme brilha ao expor a capacidade de interpretação dos atores. "É apenas o Fim do Mundo" é um filme de diálogos, de confrontos, de atuação! Nenhuma discussão é por acaso e tudo ajuda a construir (ou desvendar) as inúmeras camadas de cada um dos personagens - estamos falando de um obra independente, autoral, de relação, com uma referência teatral enorme, cheio de poesia, metáforas, símbolos, sensibilidade - inclusive na fotografia que pontua a troca de atmosferas e a distância entre o que é dito e o que é pensado - a mudança de luz no terceiro ato, entre a chuva e o sol que surge é incrível! Isso é lindo e muito difícil de equilibrar com o realismo que o cinema pede nesse tipo de filme.
O fato é que se você gostou dos também franceses "Até a Eternidade" (ou Les Petits Mouchoirs) ou "Frankie" é muito provável que você vai se identificar com "É apenas o Fim do Mundo", mas se prepare: vai doer na alma!
"E então nós dançamos" é um belíssimo e sensível filme sobre a aceitação da homossexualidade em diversas esferas da sociedade, bem na linha de "Me chame pelo seu nome" - obviamente que respeitando suas particularidades culturais e talvez esteja aí o grande trunfo do roteiro, já que a história se passa na Geórgia, país extremamente preconceituoso, onde a figura do homem é exaltada e onde até o seu tradicional ballet se baseia em "movimentos masculinizados e de força impositiva".
O jovem Merab (Levan Gelbakhiani) faz parte de uma companhia georgiana de dança folclórica, seguindo os passos do pai. Descontente com a vida de precariedade financeira e o baixo reconhecimento artístico, ele tem sua vida transformada pela chegada de Irakli (Bachi Valishvili), dançarino novato que disputa com ele a mesma vaga em uma importante audição que pode coloca-lo no elenco principal do National Georgian Ensemble. Porém Merab descobre, pela primeira vez, sua paixão por outro rapaz, dentro de um contexto homofóbico e, não surpreendente, violento. Confira o trailer:
Como no já referenciado "Me chame pelo seu nome", esse premiado filme vindo da Geórgia deixa claro, já nos seus primeiros minutos, qual é o seu objetivo: assim que o novato Irakli entra na sala de dança onde se encontra com Merab, sabemos que os dois ficarão juntos em algum momento do filme, mesmo que o diretor sueco Levan Akin (de "O Círculo") sugira que a disputa será pelo protagonismo da companhia de dança. A grande questão, no entanto, ganha mais profundidade quando o comentário sobre um colega gay que foi agredido e expulso da companhia vem à tona - é a partir desse gatilho que Akin começa a construir as angústias e euforias das descobertas de Merab e até de Irakli.
Veja, ao mesmo tempo que Merab descobre uma nova paixão, é o seu amor pela dança que pode afasta-lo da felicidade - e mais uma vez o roteiro se aprofunda em questionar: onde está a felicidade? Essas nuances vão e voltam a cada aproximação entre os personagens em seus diversos ambientes sociais - essa dinâmica faz com que tenhamos a sensação de que, em outro país, o protagonista faria parte um grupo e encontraria seu caminho com mais tranquilidade, mas a barreira está na tradição cultural, na mente fechada da sociedade georgiana. Seja no ambiente familiar, caótico por sinal, no grupo de dança e até nas reuniões com os amigos, a história deixa claro que o homem precisa se relacionar com a mulher. Uma das cenas mais emblemáticas, na minha opinião, é quando Mary (Ana Javakishvili), parceira de dança e amiga intima de Merab, mostra uma camisinha, convidando ele para uma relação sexual casual que, obviamente, ele se esquiva.
"E então nós dançamos" é uma drama de relação onde o pano de fundo é a dança. Dito isso é de se esperar cenas bem coreografadas e culturalmente relevantes para nós que assistimos a produção do outro lado do planeta. Destaco as passagens ao som de ‘Take a Chance on Me’ do ABBA, e ‘Honey’, de Robyn; além da excelente cena final ao melhor estilo "Cisne Negro" / "Flashdance". Muito bem dirigido por Akin (reparem no complexo plano-sequência durante o casamento do irmão do protagonista), o cinema georgiano debuta com classe por aqui e por isso a recomendação - mesmo sabendo que apenas um pequeno nicho dos nosso usuários vão se relacionar bem com a história. Uma pena, já que o filme tem muita qualidade e mereceria maior atenção!
Vale seu play!
"E então nós dançamos" é um belíssimo e sensível filme sobre a aceitação da homossexualidade em diversas esferas da sociedade, bem na linha de "Me chame pelo seu nome" - obviamente que respeitando suas particularidades culturais e talvez esteja aí o grande trunfo do roteiro, já que a história se passa na Geórgia, país extremamente preconceituoso, onde a figura do homem é exaltada e onde até o seu tradicional ballet se baseia em "movimentos masculinizados e de força impositiva".
O jovem Merab (Levan Gelbakhiani) faz parte de uma companhia georgiana de dança folclórica, seguindo os passos do pai. Descontente com a vida de precariedade financeira e o baixo reconhecimento artístico, ele tem sua vida transformada pela chegada de Irakli (Bachi Valishvili), dançarino novato que disputa com ele a mesma vaga em uma importante audição que pode coloca-lo no elenco principal do National Georgian Ensemble. Porém Merab descobre, pela primeira vez, sua paixão por outro rapaz, dentro de um contexto homofóbico e, não surpreendente, violento. Confira o trailer:
Como no já referenciado "Me chame pelo seu nome", esse premiado filme vindo da Geórgia deixa claro, já nos seus primeiros minutos, qual é o seu objetivo: assim que o novato Irakli entra na sala de dança onde se encontra com Merab, sabemos que os dois ficarão juntos em algum momento do filme, mesmo que o diretor sueco Levan Akin (de "O Círculo") sugira que a disputa será pelo protagonismo da companhia de dança. A grande questão, no entanto, ganha mais profundidade quando o comentário sobre um colega gay que foi agredido e expulso da companhia vem à tona - é a partir desse gatilho que Akin começa a construir as angústias e euforias das descobertas de Merab e até de Irakli.
Veja, ao mesmo tempo que Merab descobre uma nova paixão, é o seu amor pela dança que pode afasta-lo da felicidade - e mais uma vez o roteiro se aprofunda em questionar: onde está a felicidade? Essas nuances vão e voltam a cada aproximação entre os personagens em seus diversos ambientes sociais - essa dinâmica faz com que tenhamos a sensação de que, em outro país, o protagonista faria parte um grupo e encontraria seu caminho com mais tranquilidade, mas a barreira está na tradição cultural, na mente fechada da sociedade georgiana. Seja no ambiente familiar, caótico por sinal, no grupo de dança e até nas reuniões com os amigos, a história deixa claro que o homem precisa se relacionar com a mulher. Uma das cenas mais emblemáticas, na minha opinião, é quando Mary (Ana Javakishvili), parceira de dança e amiga intima de Merab, mostra uma camisinha, convidando ele para uma relação sexual casual que, obviamente, ele se esquiva.
"E então nós dançamos" é uma drama de relação onde o pano de fundo é a dança. Dito isso é de se esperar cenas bem coreografadas e culturalmente relevantes para nós que assistimos a produção do outro lado do planeta. Destaco as passagens ao som de ‘Take a Chance on Me’ do ABBA, e ‘Honey’, de Robyn; além da excelente cena final ao melhor estilo "Cisne Negro" / "Flashdance". Muito bem dirigido por Akin (reparem no complexo plano-sequência durante o casamento do irmão do protagonista), o cinema georgiano debuta com classe por aqui e por isso a recomendação - mesmo sabendo que apenas um pequeno nicho dos nosso usuários vão se relacionar bem com a história. Uma pena, já que o filme tem muita qualidade e mereceria maior atenção!
Vale seu play!
Como "Modern Love" da Prime Vídeo, "Easy", produção original da Netflix, é uma série deliciosa de assistir e que usa de um conceito narrativo muito inteligente para falar "basicamente" de relacionamentos - em diferentes pontos, perspectivas, gêneros, etc. O interessante é que o talento do diretor Joe Swanberg (de "Love") traz para o projeto um tom extremamente realista, com personagens tão complexos quanto palpáveis, onde as situações se apoiam muito mais nas consequências das decisões tomadas por eles do que apenas na aparente superficialidade do que causou determinada situação - e é por isso que nos identificamos com esses dramas.
A história é simples, mas nem por isso simplista - em 8 episódios, "Easy" acompanha um grupo de jovens que moram em Chicago e que acabam se atrapalhando com o moderno labirinto do amor. Cada qual da sua maneira, os personagens precisam lidar com as dificuldades de suas relações, seja no sexo, pela tecnologia ou até enfrentando as novas perspectivas de uma cultura que passou a ser tão presente em nossas decisões cotidianas. Confira o trailer:
Saber tratar de forma tão honesta (e original) vários tipos de conflitos pessoais, de casais tão diferentes, mas que se encontram em algum buraco de suas vidas, faz de "Easy" uma das séries mais interessantes desse gênero - o equilíbrio entre o drama e a comédia é cirúrgico. Swanberg, aliás, se apropria do estilo mumblecore para impactar a audiência com uma realidade quase que visceral. Para quem não sabe, esse é um movimento cinematográfico que funciona como uma espécie de sub-gênero do cinema independente, onde a atmosfera da narrativa é a mais natural possível, sendo comum ver improvisos entre os atores em cena, muitos deles amadores ou desconhecidos em um ambiente completamente naturalista que chega a dispensar a iluminação artificial e onde a câmera documental funciona como uma espécie de observador onipresente.
É claro que os próprios roteiros sustentam essa escolha conceitual - eles são excelentes e como os atores são ótimos, até mesmo quando os planos são mais longos (e têm vários) os diálogos não se perdem em futilidades ou esteriótipos de gênero. Aqui cabe um comentário: alguns anos atrás assisti duas séries inglesas com o mesmo conceito e seguindo o mesmo gênero: "Dates" e "True Love". Para quem sabe do que estou falando, "Easy" traz um pouco dessas duas produções, talvez com um pouco menos de sutileza no texto e de uma fotografia mais autoral, mas com um resultado igualmente elogiável.
Uma grande vantagem das séries que possuem o formato de antologia é o de poder contar histórias que não precisem necessariamente se conectar uma nas outras - essa estrutura de fato se repete em sete episódios, porém no oitavo revisitamos alguns personagens e entendemos que tudo que foi visto até ali poderá ter suas consequências - e de fato se provou assim na segunda e terceira temporadas. Embora seja uma série mais de nicho, ou menos ritmada (como preferir), sua trama chega carregada de profundas discussões, com tantas camadas e assuntos que temos a exata sensação de que conhecemos alguém que vive (ou viveu) algo parecido com os dramas dos protagonistas.
"Easy" é mais uma daquelas que indico de olhos fechados para quem gosta desse tipo de série, ainda mais sabendo que a Netflix se planejou e produziu um final já na terceira temporada! Vale muito o seu play!
Como "Modern Love" da Prime Vídeo, "Easy", produção original da Netflix, é uma série deliciosa de assistir e que usa de um conceito narrativo muito inteligente para falar "basicamente" de relacionamentos - em diferentes pontos, perspectivas, gêneros, etc. O interessante é que o talento do diretor Joe Swanberg (de "Love") traz para o projeto um tom extremamente realista, com personagens tão complexos quanto palpáveis, onde as situações se apoiam muito mais nas consequências das decisões tomadas por eles do que apenas na aparente superficialidade do que causou determinada situação - e é por isso que nos identificamos com esses dramas.
A história é simples, mas nem por isso simplista - em 8 episódios, "Easy" acompanha um grupo de jovens que moram em Chicago e que acabam se atrapalhando com o moderno labirinto do amor. Cada qual da sua maneira, os personagens precisam lidar com as dificuldades de suas relações, seja no sexo, pela tecnologia ou até enfrentando as novas perspectivas de uma cultura que passou a ser tão presente em nossas decisões cotidianas. Confira o trailer:
Saber tratar de forma tão honesta (e original) vários tipos de conflitos pessoais, de casais tão diferentes, mas que se encontram em algum buraco de suas vidas, faz de "Easy" uma das séries mais interessantes desse gênero - o equilíbrio entre o drama e a comédia é cirúrgico. Swanberg, aliás, se apropria do estilo mumblecore para impactar a audiência com uma realidade quase que visceral. Para quem não sabe, esse é um movimento cinematográfico que funciona como uma espécie de sub-gênero do cinema independente, onde a atmosfera da narrativa é a mais natural possível, sendo comum ver improvisos entre os atores em cena, muitos deles amadores ou desconhecidos em um ambiente completamente naturalista que chega a dispensar a iluminação artificial e onde a câmera documental funciona como uma espécie de observador onipresente.
É claro que os próprios roteiros sustentam essa escolha conceitual - eles são excelentes e como os atores são ótimos, até mesmo quando os planos são mais longos (e têm vários) os diálogos não se perdem em futilidades ou esteriótipos de gênero. Aqui cabe um comentário: alguns anos atrás assisti duas séries inglesas com o mesmo conceito e seguindo o mesmo gênero: "Dates" e "True Love". Para quem sabe do que estou falando, "Easy" traz um pouco dessas duas produções, talvez com um pouco menos de sutileza no texto e de uma fotografia mais autoral, mas com um resultado igualmente elogiável.
Uma grande vantagem das séries que possuem o formato de antologia é o de poder contar histórias que não precisem necessariamente se conectar uma nas outras - essa estrutura de fato se repete em sete episódios, porém no oitavo revisitamos alguns personagens e entendemos que tudo que foi visto até ali poderá ter suas consequências - e de fato se provou assim na segunda e terceira temporadas. Embora seja uma série mais de nicho, ou menos ritmada (como preferir), sua trama chega carregada de profundas discussões, com tantas camadas e assuntos que temos a exata sensação de que conhecemos alguém que vive (ou viveu) algo parecido com os dramas dos protagonistas.
"Easy" é mais uma daquelas que indico de olhos fechados para quem gosta desse tipo de série, ainda mais sabendo que a Netflix se planejou e produziu um final já na terceira temporada! Vale muito o seu play!
Um mosaico das complexidades românticas - talvez seja essa a melhor forma de definir o surpreendente "Ele Não Está Tão a Fim de Você"! Na verdade esse é um filme que transcenda aquele clichê das comédias românticas que estamos acostumados ao defender o difícil propósito de oferecer uma análise perspicaz, e muitas vezes dolorosamente realista, das relações amorosas. Dirigido pelo Ken Kwapis (de "O Grande Milagre") o filme não apenas diverte, mas também nos provoca ótimas reflexões sobre a intricada dinâmica dos relacionamentos modernos. Inspirado no best-seller homônimo de Greg Behrendt e Liz Tuccillo (consultor e roteirista de alguns episódios do seriado "Sex and the City", respectivamente), sua narrativa multifacetada explora uma gama de comportamentos e mal-entendidos que costumam complicar a vida amorosa de homens e mulheres através dos tempos, combinando um humor afiado com momentos de introspecção dos mais interessantes.
Na trama, "Ele Não Está Tão a Fim de Você" segue um grupo de amigos em Baltimore enquanto navegam pelas turbulentas águas dos relacionamentos. Gigi (Ginnifer Goodwin) é uma jovem romântica e idealista que está à procura do amor verdadeiro, mas tem dificuldades em interpretar os sinais dos homens. Ela se apoia em Alex (Justin Long), um barman que se torna seu guru relacional. Enquanto isso, Beth (Jennifer Aniston) está frustrada com o namorado Neil (Ben Affleck), que reluta em propor casamento, e Janine (Jennifer Connelly) enfrenta a infidelidade de seu marido Ben (Bradley Cooper), que está envolvido com a aspirante a cantora Anna (Scarlett Johansson). O filme também explora as histórias de Mary (Drew Barrymore), uma publicitária que luta com a realidade do namoro online, e Connor (Kevin Connolly), um corretor de imóveis obcecado por Anna. Essa teia de histórias entrelaçadas pinta um quadro complexo, porém familiar, dos altos e baixos do amor. Confira o trailer:
Um filme muito gostoso de assistir e o grande mérito, além do elenco, é de Ken Kwapis - sua direção sustenta a narrativa de "Ele Não Está Tão a Fim de Você" e habilmente orquestra as múltiplas histórias que o roteiro propõe sem perder o ritmo ou sua coesão. A habilidade de Kwapis em equilibrar humor e seriedade cria um tom que ressoa com a audiência já que em vez de cair na armadilha das fórmulas previsíveis, ele proporciona uma experiência de fácil identificação e ao mesmo tempo bastante provocante. A montagem de Cara Silverman é outra peça crucial dessa engrenagem, permitindo que as transições entre as narrativas fluam naturalmente, nos mantendo engajados e emocionalmente mergulhadas em como as histórias são entrelaçadas.
Outro ponto que vale ser citado é a fotografia de John Bailey (de "O Verão da Minha Vida")" - ele utiliza uma paleta de cores vibrantes para refletir as emoções e o estado de espírito dos personagens. Bailey, com sua vasta experiência em "filmes de relação" faz uso de enquadramentos inteligentes e uma iluminação sutil para destacar as nuances das interações - sempre com Baltimore servindo como um pano de fundo vivo que adiciona uma camada extra de autenticidade às histórias. Ao ver uma cidade sendo capturada em uma mistura de cenários urbanos e locais mais íntimos, espelhando com muita habilidade as complexidades e contradições da vida amorosa dos personagens, a química entre os atores soa mais palpável e contribui significativamente para o impacto emocional que o filme oferece.
"Ele Não Está Tão a Fim de Você", no final das contas, realmente oferece uma exploração autêntica dos desafios de um relacionamento. Com uma direção competente, uma fotografia bem estruturada e performances divertidas, o filme entrega o que promete: uma análise crítica e muitas vezes comovente sobre como interpretamos (ou falhamos em interpretar) os sinais no jogo do amor. Então, se você aprecia narrativas que combinam humor com reflexão e está interessado em personagens que refletem as dores da vida real, algo como "Modern Love", esse filme é uma escolha certeira.
Vale muito o seu play!
Um mosaico das complexidades românticas - talvez seja essa a melhor forma de definir o surpreendente "Ele Não Está Tão a Fim de Você"! Na verdade esse é um filme que transcenda aquele clichê das comédias românticas que estamos acostumados ao defender o difícil propósito de oferecer uma análise perspicaz, e muitas vezes dolorosamente realista, das relações amorosas. Dirigido pelo Ken Kwapis (de "O Grande Milagre") o filme não apenas diverte, mas também nos provoca ótimas reflexões sobre a intricada dinâmica dos relacionamentos modernos. Inspirado no best-seller homônimo de Greg Behrendt e Liz Tuccillo (consultor e roteirista de alguns episódios do seriado "Sex and the City", respectivamente), sua narrativa multifacetada explora uma gama de comportamentos e mal-entendidos que costumam complicar a vida amorosa de homens e mulheres através dos tempos, combinando um humor afiado com momentos de introspecção dos mais interessantes.
Na trama, "Ele Não Está Tão a Fim de Você" segue um grupo de amigos em Baltimore enquanto navegam pelas turbulentas águas dos relacionamentos. Gigi (Ginnifer Goodwin) é uma jovem romântica e idealista que está à procura do amor verdadeiro, mas tem dificuldades em interpretar os sinais dos homens. Ela se apoia em Alex (Justin Long), um barman que se torna seu guru relacional. Enquanto isso, Beth (Jennifer Aniston) está frustrada com o namorado Neil (Ben Affleck), que reluta em propor casamento, e Janine (Jennifer Connelly) enfrenta a infidelidade de seu marido Ben (Bradley Cooper), que está envolvido com a aspirante a cantora Anna (Scarlett Johansson). O filme também explora as histórias de Mary (Drew Barrymore), uma publicitária que luta com a realidade do namoro online, e Connor (Kevin Connolly), um corretor de imóveis obcecado por Anna. Essa teia de histórias entrelaçadas pinta um quadro complexo, porém familiar, dos altos e baixos do amor. Confira o trailer:
Um filme muito gostoso de assistir e o grande mérito, além do elenco, é de Ken Kwapis - sua direção sustenta a narrativa de "Ele Não Está Tão a Fim de Você" e habilmente orquestra as múltiplas histórias que o roteiro propõe sem perder o ritmo ou sua coesão. A habilidade de Kwapis em equilibrar humor e seriedade cria um tom que ressoa com a audiência já que em vez de cair na armadilha das fórmulas previsíveis, ele proporciona uma experiência de fácil identificação e ao mesmo tempo bastante provocante. A montagem de Cara Silverman é outra peça crucial dessa engrenagem, permitindo que as transições entre as narrativas fluam naturalmente, nos mantendo engajados e emocionalmente mergulhadas em como as histórias são entrelaçadas.
Outro ponto que vale ser citado é a fotografia de John Bailey (de "O Verão da Minha Vida")" - ele utiliza uma paleta de cores vibrantes para refletir as emoções e o estado de espírito dos personagens. Bailey, com sua vasta experiência em "filmes de relação" faz uso de enquadramentos inteligentes e uma iluminação sutil para destacar as nuances das interações - sempre com Baltimore servindo como um pano de fundo vivo que adiciona uma camada extra de autenticidade às histórias. Ao ver uma cidade sendo capturada em uma mistura de cenários urbanos e locais mais íntimos, espelhando com muita habilidade as complexidades e contradições da vida amorosa dos personagens, a química entre os atores soa mais palpável e contribui significativamente para o impacto emocional que o filme oferece.
"Ele Não Está Tão a Fim de Você", no final das contas, realmente oferece uma exploração autêntica dos desafios de um relacionamento. Com uma direção competente, uma fotografia bem estruturada e performances divertidas, o filme entrega o que promete: uma análise crítica e muitas vezes comovente sobre como interpretamos (ou falhamos em interpretar) os sinais no jogo do amor. Então, se você aprecia narrativas que combinam humor com reflexão e está interessado em personagens que refletem as dores da vida real, algo como "Modern Love", esse filme é uma escolha certeira.
Vale muito o seu play!