"Somos o que Somos" é um suspense surpreendente em muitos aspectos, mas talvez o que mais me chamou atenção tenha sido a maneira como o diretor Jim Mickle construiu a tensão em cima do drama familiar pelo ponto de vista de uma das filhas e sem precisar entregar tudo tão mastigado - mesmo que para alguns possa parecer que o roteiro tenha sido preguiçoso ao não criar as conexões ideais para aquele final que, de fato, eu não esperava! Ah, e me parece que o filme segue aquela tendência muito particular das produções recentes do gênero: ou você vai amar, ou você vai odiar - eu amei e vou explicar em detalhes a razão!
Em uma cidade do interior dos EUA, mora a família Parker. Frank (Bill Sage), o pai, é um homem bastante reservado, mas que insiste em manter as tradições familiares e religiosas, mesmo depois da morte prematura de sua esposa. Com isso, a filha mais velha do casal, Iris (Ambyr Childers) passa a ser responsável por alguns rituais bastante peculiares, mesmo contra a vontade da irmã mais nova, Rose (Julia Garner). Acontece, que após o desaparecimento de mais uma jovem estudante local, se inicia uma investigação e uma série de circunstâncias passam a revelar importantes segredos dos Parker, mudando completamente a maneira como a familia se relaciona entre si e com aquela comunidade. Confira o trailer (em inglês):
"Somos o que Somos" é a versão americana do filme mexicano "Somos Lo que Hay" de 2010, em que Mickle repete sua parceria de sucesso com o roteirista Nick Damici para entregar uma adaptação simples, mas bastante fluida. Dividindo toda história em apenas quatro dias, o roteiro levanta questões importantes como o fundamentalismo religioso e seu reflexo nas gerações mais novas ao mesmo tempo que consegue transmitir um certo suspense que funciona muito bem como ponto de equilíbrio entre a melancolia dos personagens e a tensão cinematográfica do gênero.
É um ótimo entretenimento e vai agradar quem gostou de "Midsommar" do Ari Aster ou "O Chalé" da dupla Severin Fiala e Veronika Franz.
Com um orçamento bem abaixo dos padrões americanos, Mickle optou por investir menos em perfurarias e mais no trabalho íntimo dos atores, criando assim um ritmo diferenciado, que pode até parecer arrastado no começo, mas que vai crescendo, até culminar em um final, digamos, empolgante! Dois elementos ajudam muito nessa dinâmica narrativa. O primeiro, sem dúvida, é a bela fotografia do diretor Ryan Samul. Os belos enquadramentos, tendo um pano de fundo bastante gélido, se encaixam perfeitamente com os movimentos de câmera precisos para criar, de forma bastante orgânica, a tensão que o filme pede. Alinhado a esse trabalho, está o segundo elemento de destaque: a mixagem! Com um desenho de som excelente e uma trilha sonora melancólica, a mixagem constrói o retrato definitivo de uma vida pacata ao mesmo tempo em que mascara a loucura e a angustia das situações que aqueles personagens estão passando. Reparem!
No elenco é preciso destacar o trabalho das talentosas Ambyr Childers e, principalmente, Julia Garner - elas estão perfeitas, no tom exato, mesmo com uma maquiagem que, na minha opinião, tirou a naturalidade de algumas ações das personagens. Michael Parks como o Doutor Barrow também está ótimo. Apenas Bill Sage que me pareceu um pouco perdido entre a loucura e a crença cega - em muitos momentos esses traços de personalidade se confundem e mais atrapalha do que nos provoca (soa fake). Ainda no assunto interpretação, vale comentar sobre ótimo trabalho do Jim Mickle com os atores - todos bem alinhados ao tom que ele escolheu para o filme, muito pautado no silêncio, no receio do próximo passo, na respiração e no medo particular de cada uma dos personagens. Tenho a certeza que esse alinhamento conceitual foi fundamental para a experiência que o filme oferece!
De fato o roteiro tem algumas inconsistências, mas em nada atrapalha na jornada. Algumas passagens ficam sem maiores explicações, alguns personagens simplesmente aparecem ou somem sem muita coerência e até algumas motivações soam muito superficiais, mas como comentei: se focarmos no drama das irmãs Parker, tudo que não foi devidamente esclarecido ou que pareça fora dos trilhos, passam a servir de gatilho para criamos nossa própria versão dos fatos, já que não interferem ativamente em nada no resultado final do filme - ajudaria se tudo se encaixasse? Sim, mas digamos que as peças soltas servem apenas para compor o cenário e não a trama!
"Somos o que Somos" começa morno, mas vai esquentando até entrar em completa ebulição no terceiro ato, com os 5 minutos finais justificando a indicação de 18 anos que o filme recebeu quando estreou nos cinemas em 2013. Se você gosta de um suspense, mais próximo do drama do que do terror, eu não perderia esse filme por nada! Vale seu play!
"Somos o que Somos" é um suspense surpreendente em muitos aspectos, mas talvez o que mais me chamou atenção tenha sido a maneira como o diretor Jim Mickle construiu a tensão em cima do drama familiar pelo ponto de vista de uma das filhas e sem precisar entregar tudo tão mastigado - mesmo que para alguns possa parecer que o roteiro tenha sido preguiçoso ao não criar as conexões ideais para aquele final que, de fato, eu não esperava! Ah, e me parece que o filme segue aquela tendência muito particular das produções recentes do gênero: ou você vai amar, ou você vai odiar - eu amei e vou explicar em detalhes a razão!
Em uma cidade do interior dos EUA, mora a família Parker. Frank (Bill Sage), o pai, é um homem bastante reservado, mas que insiste em manter as tradições familiares e religiosas, mesmo depois da morte prematura de sua esposa. Com isso, a filha mais velha do casal, Iris (Ambyr Childers) passa a ser responsável por alguns rituais bastante peculiares, mesmo contra a vontade da irmã mais nova, Rose (Julia Garner). Acontece, que após o desaparecimento de mais uma jovem estudante local, se inicia uma investigação e uma série de circunstâncias passam a revelar importantes segredos dos Parker, mudando completamente a maneira como a familia se relaciona entre si e com aquela comunidade. Confira o trailer (em inglês):
"Somos o que Somos" é a versão americana do filme mexicano "Somos Lo que Hay" de 2010, em que Mickle repete sua parceria de sucesso com o roteirista Nick Damici para entregar uma adaptação simples, mas bastante fluida. Dividindo toda história em apenas quatro dias, o roteiro levanta questões importantes como o fundamentalismo religioso e seu reflexo nas gerações mais novas ao mesmo tempo que consegue transmitir um certo suspense que funciona muito bem como ponto de equilíbrio entre a melancolia dos personagens e a tensão cinematográfica do gênero.
É um ótimo entretenimento e vai agradar quem gostou de "Midsommar" do Ari Aster ou "O Chalé" da dupla Severin Fiala e Veronika Franz.
Com um orçamento bem abaixo dos padrões americanos, Mickle optou por investir menos em perfurarias e mais no trabalho íntimo dos atores, criando assim um ritmo diferenciado, que pode até parecer arrastado no começo, mas que vai crescendo, até culminar em um final, digamos, empolgante! Dois elementos ajudam muito nessa dinâmica narrativa. O primeiro, sem dúvida, é a bela fotografia do diretor Ryan Samul. Os belos enquadramentos, tendo um pano de fundo bastante gélido, se encaixam perfeitamente com os movimentos de câmera precisos para criar, de forma bastante orgânica, a tensão que o filme pede. Alinhado a esse trabalho, está o segundo elemento de destaque: a mixagem! Com um desenho de som excelente e uma trilha sonora melancólica, a mixagem constrói o retrato definitivo de uma vida pacata ao mesmo tempo em que mascara a loucura e a angustia das situações que aqueles personagens estão passando. Reparem!
No elenco é preciso destacar o trabalho das talentosas Ambyr Childers e, principalmente, Julia Garner - elas estão perfeitas, no tom exato, mesmo com uma maquiagem que, na minha opinião, tirou a naturalidade de algumas ações das personagens. Michael Parks como o Doutor Barrow também está ótimo. Apenas Bill Sage que me pareceu um pouco perdido entre a loucura e a crença cega - em muitos momentos esses traços de personalidade se confundem e mais atrapalha do que nos provoca (soa fake). Ainda no assunto interpretação, vale comentar sobre ótimo trabalho do Jim Mickle com os atores - todos bem alinhados ao tom que ele escolheu para o filme, muito pautado no silêncio, no receio do próximo passo, na respiração e no medo particular de cada uma dos personagens. Tenho a certeza que esse alinhamento conceitual foi fundamental para a experiência que o filme oferece!
De fato o roteiro tem algumas inconsistências, mas em nada atrapalha na jornada. Algumas passagens ficam sem maiores explicações, alguns personagens simplesmente aparecem ou somem sem muita coerência e até algumas motivações soam muito superficiais, mas como comentei: se focarmos no drama das irmãs Parker, tudo que não foi devidamente esclarecido ou que pareça fora dos trilhos, passam a servir de gatilho para criamos nossa própria versão dos fatos, já que não interferem ativamente em nada no resultado final do filme - ajudaria se tudo se encaixasse? Sim, mas digamos que as peças soltas servem apenas para compor o cenário e não a trama!
"Somos o que Somos" começa morno, mas vai esquentando até entrar em completa ebulição no terceiro ato, com os 5 minutos finais justificando a indicação de 18 anos que o filme recebeu quando estreou nos cinemas em 2013. Se você gosta de um suspense, mais próximo do drama do que do terror, eu não perderia esse filme por nada! Vale seu play!
Se você procura uma narrativa convencional, mesmo gostando de filmes independentes, "Synonymes" não é para você!
O filme chega ao streaming com a chancela de ter vencido um dos festivais mais importantes e respeitados do mundo, o Festival de Berlin. Porém, se limitar em posicionar a obra como a escolha certa apenas pelo prêmio recebido chega a ser ingenuidade, já que seu caráter independente vem acompanhado de uma proposta bastante provocadora e, em muitas cenas, chocante. Assistir "Synonymes" não será uma jornada tranquila para quem não se adapta a uma linguagem mais conceitual, anos luz do cinema comercial, mas, por outro lado, é impossível não atestar que essa produção francesa realmente consegue alcançar todos os seus objetivos - desde que você se proponha chegar ao final!
Yoav (Tom Mercier), um jovem israelense, chega a Paris esperando que a França e os franceses o salvem da loucura de seu país. Determinado a extinguir suas origens e se tornar francês, ele abandona a língua hebraica e se esforça de todas as maneiras para encontrar uma nova identidade. No entanto, ele percebe que o extremismo religioso e a violência política ocorrem igualmente no país europeu, sendo praticados tanto pelos locais quanto por seus conterrâneos em solo francês. Confira o trailer:
O mais interessante de "Synonymes" é a sensação de solidão que o filme nos provoca - na verdade, "provocação" talvez não seja a palavra correta para definir esse sentimento e isso fica muito claro já na primeira sequência do filme. O diretor israelense Nadav Lapid eleva a máxima potência a percepção de incômodo perante o novo, a quebra de expectativa e a submissão que nossas escolhas nos cobram para não assumirmos uma dura realidade que é o dia a dia longe de casa, completamente fora da nossa zona de conforto - quem teve a oportunidade de morar em outro país, certamente, vai se conectar com esses pontos, mesmo que em diferentes níveis. O fato é que o conceito de incômodo está em toda narrativa e ele nos atinge com muita força graças ao total alinhamento com o conceito visual da obra.
Existe uma certa liberdade narrativa e estética que remete à Nouvelle Vague (movimento artístico do cinema francês que se insere no período contestatório dos anos sessenta), isso é inegável. A fotografia do premiado diretor Shai Goldman enquadra uma Paris cheia de contrastes, com uma câmera nervosa, criando uma estética turbulenta, pontuando perfeitamente a confusão Yoav. Mesmo quando ele se junta com Émile (Quentin Dolmaire) e Caroline (Louise Chevillotte), e aí temos uma câmera mais fixa, para discutir o amor, o futuro, a música e até as experiências literárias de cada um, o filme nos passa uma clara impressão de que, mesmo cultos, pedantes e livres em sua sexualidade, os personagens estão presos em uma condição burguesa completamente oposta. Se Yoav ostenta um orgulho de querer ser francês, seus amigos franceses sequer possuem essa pretensão. Reparem na cena do hino nacional, quando Yoav "percebe" que o orgulho francês está igualmente baseado na quantidade de sangue derramado em sua história - tudo naturalmente impresso na letra da Marselhesa.
"Synonymes" é um filme cheio de símbolos: do amigo compatriota que só quer arranjar confusão e fomenta o racismo estrutural na França ao "bico" de ator pornô fantasiado de trabalho de modelo no berço da industria da moda. E olha, eu nem vou me atrever a dizer que o filme vai dividir opiniões, pois ele será completamente indigesto para qualquer pessoa que insista em descobrir o cinema independente por "Synonyms" - não aconselho!
O vencedor de Urso de Ouro de 2019 é para poucos - ele faz "The Square"parecer um episódio da Galinha Pintadinha (se é que você me entende)!
Se você procura uma narrativa convencional, mesmo gostando de filmes independentes, "Synonymes" não é para você!
O filme chega ao streaming com a chancela de ter vencido um dos festivais mais importantes e respeitados do mundo, o Festival de Berlin. Porém, se limitar em posicionar a obra como a escolha certa apenas pelo prêmio recebido chega a ser ingenuidade, já que seu caráter independente vem acompanhado de uma proposta bastante provocadora e, em muitas cenas, chocante. Assistir "Synonymes" não será uma jornada tranquila para quem não se adapta a uma linguagem mais conceitual, anos luz do cinema comercial, mas, por outro lado, é impossível não atestar que essa produção francesa realmente consegue alcançar todos os seus objetivos - desde que você se proponha chegar ao final!
Yoav (Tom Mercier), um jovem israelense, chega a Paris esperando que a França e os franceses o salvem da loucura de seu país. Determinado a extinguir suas origens e se tornar francês, ele abandona a língua hebraica e se esforça de todas as maneiras para encontrar uma nova identidade. No entanto, ele percebe que o extremismo religioso e a violência política ocorrem igualmente no país europeu, sendo praticados tanto pelos locais quanto por seus conterrâneos em solo francês. Confira o trailer:
O mais interessante de "Synonymes" é a sensação de solidão que o filme nos provoca - na verdade, "provocação" talvez não seja a palavra correta para definir esse sentimento e isso fica muito claro já na primeira sequência do filme. O diretor israelense Nadav Lapid eleva a máxima potência a percepção de incômodo perante o novo, a quebra de expectativa e a submissão que nossas escolhas nos cobram para não assumirmos uma dura realidade que é o dia a dia longe de casa, completamente fora da nossa zona de conforto - quem teve a oportunidade de morar em outro país, certamente, vai se conectar com esses pontos, mesmo que em diferentes níveis. O fato é que o conceito de incômodo está em toda narrativa e ele nos atinge com muita força graças ao total alinhamento com o conceito visual da obra.
Existe uma certa liberdade narrativa e estética que remete à Nouvelle Vague (movimento artístico do cinema francês que se insere no período contestatório dos anos sessenta), isso é inegável. A fotografia do premiado diretor Shai Goldman enquadra uma Paris cheia de contrastes, com uma câmera nervosa, criando uma estética turbulenta, pontuando perfeitamente a confusão Yoav. Mesmo quando ele se junta com Émile (Quentin Dolmaire) e Caroline (Louise Chevillotte), e aí temos uma câmera mais fixa, para discutir o amor, o futuro, a música e até as experiências literárias de cada um, o filme nos passa uma clara impressão de que, mesmo cultos, pedantes e livres em sua sexualidade, os personagens estão presos em uma condição burguesa completamente oposta. Se Yoav ostenta um orgulho de querer ser francês, seus amigos franceses sequer possuem essa pretensão. Reparem na cena do hino nacional, quando Yoav "percebe" que o orgulho francês está igualmente baseado na quantidade de sangue derramado em sua história - tudo naturalmente impresso na letra da Marselhesa.
"Synonymes" é um filme cheio de símbolos: do amigo compatriota que só quer arranjar confusão e fomenta o racismo estrutural na França ao "bico" de ator pornô fantasiado de trabalho de modelo no berço da industria da moda. E olha, eu nem vou me atrever a dizer que o filme vai dividir opiniões, pois ele será completamente indigesto para qualquer pessoa que insista em descobrir o cinema independente por "Synonyms" - não aconselho!
O vencedor de Urso de Ouro de 2019 é para poucos - ele faz "The Square"parecer um episódio da Galinha Pintadinha (se é que você me entende)!
Nem de longe "Tár" é um filme fácil - e complemento: sua complexidade está em sua forma e em seu conteúdo. Dirigido brilhantemente por Todd Field (de "Pecados Íntimos"), o filme é uma uma espécie de drama psicológico, daqueles densos e envolventes, que explora as nuances do poder e da genialidade dentro de um contexto artístico muito particular. Assim como "Cisne Negro" de Darren Aronofsky ou "O Mestre" de Paul Thomas Anderson, "Tár" mergulha na psique de uma protagonista ambígua, revelando tanto seu talento quanto suas falhas mais palpáveis, através de uma narrativa que examina com muita inteligência a relação entre a arte e o ego, sempre questionando os limites da ambição em um universo onde a genialidade frequentemente é usada para justificar comportamentos tóxicos.
Lydia Tár (Cate Blanchett) é uma maestra renomada e diretora de uma importante orquestra sinfônica, cuja vida pessoal e carreira começam a se desintegrar em meio a acusações de abuso de poder e manipulação. A narrativa acompanha Lydia enquanto ela lida com a pressão de manter sua posição em um ambiente artístico altamente competitivo onde é lavada a enfrentar as consequências de suas próprias ações. A queda de Tár é retratada como uma exploração lenta e introspectiva dos reflexos psicológicos e sociais de seu comportamento, fazendo com que a audiência questione a linha tênue entre a genialidade e a tirania. Confira o belíssimo trailer aqui:
É impossível começar qualquer análise sobre "Tár" sem citar Cate Blanchett. É impressionante como ela é capaz de entregar uma atuação impecável atrás da outra - para mim, essa uma das mais marcantes da carreira, capturando com muita profundidade toda a complexidade de Lydia Tár através de uma performance poderosa e cheia de sensibilidade. Blanchett consegue transmitir tanto a genialidade quanto a arrogância da protagonista ao mesmo tempo que transita por uma área de vulnerabilidade oculta dificílima de alcançar como atriz. A forma como ela expressa o controle obsessivo de Tár sobre sua música, enquanto retrata a sua incapacidade de controlar sua vida pessoal, é hipnotizante. Sem dúvida que essa performance é essencial para a construção estética e narrativa do filme, já que o diretor se ancora, sem medo de errar, em uma personagem fascinante e imperfeita. A direção de Todd Field é precisa e contida nesse sentido, permitindo que a história se desenvolva de uma maneira deliberadamente imersiva. Obviamente que o filme evita julgamentos fáceis, optando por uma abordagem mais ambígua, que deixa espaço para diferentes interpretações sobre a protagonista e suas motivações. Repare como Field utiliza planos mais longos e uma estética bastante minimalista, capturando momentos de silêncio e criando uma tensão não-verbal para enriquecer o impacto emocional da trama. A atmosfera elegante e fria do filme reflete a sofisticação do mundo da música clássica, ao mesmo tempo que amplifica a sensação de isolamento que permeia a jornada de Tár.
A cinematografia do fotógrafo alemão Florian Hoffmeister (de "A Casa de Saddam") complementa a narrativa com uma estética extremamente precisa no sentido mais conceitual da palavra - ele pontua a cenas utilizando uma iluminação sutil com cores frias, para criar essa atmosfera opressiva e introspectiva proposta por Field. A câmera segue Tár em seus momentos mais íntimos, capturando a dualidade entre a figura pública brilhante e a mulher solitária e atormentada em sua vida pessoal. A escolha de filmar performances musicais em sequências mais longas e imersivas reflete tanto a beleza quanto o peso da criação artística - ao melhor estilo Darren Aronofsky (de "Cisne Negro"). Outro ponto que merece sua atenção é a montagem da indicada ao Oscar, Monika Willi (de "Amor") - seu trabalho intensifica a estrutura mais emocional do filme, refletindo a tensão crescente na vida de Tár como um elemento narrativo capaz de revelar os conflitos internos da protagonista a partir do ritmo, criando uma conexão contagiante com a música clássica.
Ao explorar questões relevantes sobre poder e abuso, pela perspectiva critica da responsabilidade pessoal em um mundo que muitas vezes idolatra o talento em detrimento da ética, "Tár" levanta muito mais perguntas incômodas do que respostas superficiais, especialmente sobre as consequências de um comportamento arbitrário e da forma como a sociedade lida com figuras poderosas, especialmente nesse universo das artes. Dito isso, antecipo: não espere nada muito usual com esse filme, já que o objetivo aqui é provocar reflexões sobre a ambiguidade moral e as circunstâncias fascinantes do seu redor.
Para aqueles que apreciam narrativas densas, "Tár" é de fato uma experiência cinematográfica que vale cada segundo.
Up-date: "Tár" recebeu seis indicações no Oscar 2023, inclusive de Melhor Filme.
Nem de longe "Tár" é um filme fácil - e complemento: sua complexidade está em sua forma e em seu conteúdo. Dirigido brilhantemente por Todd Field (de "Pecados Íntimos"), o filme é uma uma espécie de drama psicológico, daqueles densos e envolventes, que explora as nuances do poder e da genialidade dentro de um contexto artístico muito particular. Assim como "Cisne Negro" de Darren Aronofsky ou "O Mestre" de Paul Thomas Anderson, "Tár" mergulha na psique de uma protagonista ambígua, revelando tanto seu talento quanto suas falhas mais palpáveis, através de uma narrativa que examina com muita inteligência a relação entre a arte e o ego, sempre questionando os limites da ambição em um universo onde a genialidade frequentemente é usada para justificar comportamentos tóxicos.
Lydia Tár (Cate Blanchett) é uma maestra renomada e diretora de uma importante orquestra sinfônica, cuja vida pessoal e carreira começam a se desintegrar em meio a acusações de abuso de poder e manipulação. A narrativa acompanha Lydia enquanto ela lida com a pressão de manter sua posição em um ambiente artístico altamente competitivo onde é lavada a enfrentar as consequências de suas próprias ações. A queda de Tár é retratada como uma exploração lenta e introspectiva dos reflexos psicológicos e sociais de seu comportamento, fazendo com que a audiência questione a linha tênue entre a genialidade e a tirania. Confira o belíssimo trailer aqui:
É impossível começar qualquer análise sobre "Tár" sem citar Cate Blanchett. É impressionante como ela é capaz de entregar uma atuação impecável atrás da outra - para mim, essa uma das mais marcantes da carreira, capturando com muita profundidade toda a complexidade de Lydia Tár através de uma performance poderosa e cheia de sensibilidade. Blanchett consegue transmitir tanto a genialidade quanto a arrogância da protagonista ao mesmo tempo que transita por uma área de vulnerabilidade oculta dificílima de alcançar como atriz. A forma como ela expressa o controle obsessivo de Tár sobre sua música, enquanto retrata a sua incapacidade de controlar sua vida pessoal, é hipnotizante. Sem dúvida que essa performance é essencial para a construção estética e narrativa do filme, já que o diretor se ancora, sem medo de errar, em uma personagem fascinante e imperfeita. A direção de Todd Field é precisa e contida nesse sentido, permitindo que a história se desenvolva de uma maneira deliberadamente imersiva. Obviamente que o filme evita julgamentos fáceis, optando por uma abordagem mais ambígua, que deixa espaço para diferentes interpretações sobre a protagonista e suas motivações. Repare como Field utiliza planos mais longos e uma estética bastante minimalista, capturando momentos de silêncio e criando uma tensão não-verbal para enriquecer o impacto emocional da trama. A atmosfera elegante e fria do filme reflete a sofisticação do mundo da música clássica, ao mesmo tempo que amplifica a sensação de isolamento que permeia a jornada de Tár.
A cinematografia do fotógrafo alemão Florian Hoffmeister (de "A Casa de Saddam") complementa a narrativa com uma estética extremamente precisa no sentido mais conceitual da palavra - ele pontua a cenas utilizando uma iluminação sutil com cores frias, para criar essa atmosfera opressiva e introspectiva proposta por Field. A câmera segue Tár em seus momentos mais íntimos, capturando a dualidade entre a figura pública brilhante e a mulher solitária e atormentada em sua vida pessoal. A escolha de filmar performances musicais em sequências mais longas e imersivas reflete tanto a beleza quanto o peso da criação artística - ao melhor estilo Darren Aronofsky (de "Cisne Negro"). Outro ponto que merece sua atenção é a montagem da indicada ao Oscar, Monika Willi (de "Amor") - seu trabalho intensifica a estrutura mais emocional do filme, refletindo a tensão crescente na vida de Tár como um elemento narrativo capaz de revelar os conflitos internos da protagonista a partir do ritmo, criando uma conexão contagiante com a música clássica.
Ao explorar questões relevantes sobre poder e abuso, pela perspectiva critica da responsabilidade pessoal em um mundo que muitas vezes idolatra o talento em detrimento da ética, "Tár" levanta muito mais perguntas incômodas do que respostas superficiais, especialmente sobre as consequências de um comportamento arbitrário e da forma como a sociedade lida com figuras poderosas, especialmente nesse universo das artes. Dito isso, antecipo: não espere nada muito usual com esse filme, já que o objetivo aqui é provocar reflexões sobre a ambiguidade moral e as circunstâncias fascinantes do seu redor.
Para aqueles que apreciam narrativas densas, "Tár" é de fato uma experiência cinematográfica que vale cada segundo.
Up-date: "Tár" recebeu seis indicações no Oscar 2023, inclusive de Melhor Filme.
"Tese sobre um Homicídio" é mais um daqueles filmes como o também argentino "O segredo dos seus olhos" do diretor Juan José Campanella ou, mais recentemente, como o espanhol "Um Contratempo" do Oriol Paulo. Todos os três filmes partem do mesmo conceito narrativo: construir uma trama envolvente, cheio de peças aparentemente perdidas, mas que aos poucos vão sendo encaixadas de uma forma menos conveniente e que no final nos surpreende de alguma forma - mas sem roubar no jogo!
Nesse filme do diretor argentino Hernán Goldfrid, acompanhamos Roberto Bermudez (Ricardo Darín), um especialista em Direito Criminal que ministra um curso bastante concorrido na universidade local. Seco e um tanto quanto arrogante, Roberto já não vê as coisas com o idealismo da juventude por saber como tudo funciona na prática. Apesar disto, ele sente-se incomodado com o jovem Gonzalo (Alberto Ammann), filho de um velho conhecido, que está matriculado em seu curso, simplesmente por ser seu fã. Quando um brutal assassinato acontece perto da universidade, o professor logo se interessa pelo caso e passa a investigá-lo, por mera curiosidade e graças aos anos de profissão na área criminal. Uma pista leva a outra e, pouco a pouco, Roberto passa a desconfiar que Gonzalo esteja por trás do crime. Confira o trailer:
Um elemento que me chamou muito atenção em "Tese sobre um Homicídio" é justamente como o roteiro do Patricio Vega consegue criar um clima misterioso e bastante envolvente em torno de uma possível paranoia de Roberto - principalmente a partir de seu relacionamento com Gonzalo. Cria-se aí uma espécie de confronto psicológico dos mais interessantes onde cada um dos personagens se desafiam a todo instante. O curioso é que, por mais que os indícios apresentados por Roberto, sejam nítidos e até óbvios se olharmos pela perspectiva de quem conhece o gênero, o filme jamais os assume o fato de que ele possa estar certo. Reparem.
Ricardo Darín, claro, dá outro show. Seu personagem sente a progressão da história fisicamente, mas é mentalmente que ele vai ganhando camadas profundas: se ele bebe e fuma cada vez mais, é com seu descontrole que ele parece se preocupar e isso ajuda a expor uma complexidade que poucos estão dispostos a encarar. A direção de fotografia de Rolo Pulpeiro está completamente alinhada com um conceito de direção bastante estiloso de Hernán Goldfrid - como se os atores estivessem livres para brilhar em cima de uma história maravilhosamente bem contada em imagens e diálogos - e como disse inicialmente: sem inventar ou encontrar uma solução mirabolante para justificar suas escolhas. Como diz o protagonista: o segredo está no detalhe!
Baseado no livro deDiego Paszkowski, "Tese sobre um Homicídio" não se propõe a fechar uma questão sem nos colocar para pensar (daí a força do seu título) - isso é preciso ficar claro! O que não deixa a narrativa didática demais, porém pode decepcionar quem prefere algo mais mastigado como em outros filmes do gênero, porém a jornada é tão interessante quanto o final e vale muito a pena pelo entretenimento de excelente qualidade!
"Tese sobre um Homicídio" é mais um daqueles filmes como o também argentino "O segredo dos seus olhos" do diretor Juan José Campanella ou, mais recentemente, como o espanhol "Um Contratempo" do Oriol Paulo. Todos os três filmes partem do mesmo conceito narrativo: construir uma trama envolvente, cheio de peças aparentemente perdidas, mas que aos poucos vão sendo encaixadas de uma forma menos conveniente e que no final nos surpreende de alguma forma - mas sem roubar no jogo!
Nesse filme do diretor argentino Hernán Goldfrid, acompanhamos Roberto Bermudez (Ricardo Darín), um especialista em Direito Criminal que ministra um curso bastante concorrido na universidade local. Seco e um tanto quanto arrogante, Roberto já não vê as coisas com o idealismo da juventude por saber como tudo funciona na prática. Apesar disto, ele sente-se incomodado com o jovem Gonzalo (Alberto Ammann), filho de um velho conhecido, que está matriculado em seu curso, simplesmente por ser seu fã. Quando um brutal assassinato acontece perto da universidade, o professor logo se interessa pelo caso e passa a investigá-lo, por mera curiosidade e graças aos anos de profissão na área criminal. Uma pista leva a outra e, pouco a pouco, Roberto passa a desconfiar que Gonzalo esteja por trás do crime. Confira o trailer:
Um elemento que me chamou muito atenção em "Tese sobre um Homicídio" é justamente como o roteiro do Patricio Vega consegue criar um clima misterioso e bastante envolvente em torno de uma possível paranoia de Roberto - principalmente a partir de seu relacionamento com Gonzalo. Cria-se aí uma espécie de confronto psicológico dos mais interessantes onde cada um dos personagens se desafiam a todo instante. O curioso é que, por mais que os indícios apresentados por Roberto, sejam nítidos e até óbvios se olharmos pela perspectiva de quem conhece o gênero, o filme jamais os assume o fato de que ele possa estar certo. Reparem.
Ricardo Darín, claro, dá outro show. Seu personagem sente a progressão da história fisicamente, mas é mentalmente que ele vai ganhando camadas profundas: se ele bebe e fuma cada vez mais, é com seu descontrole que ele parece se preocupar e isso ajuda a expor uma complexidade que poucos estão dispostos a encarar. A direção de fotografia de Rolo Pulpeiro está completamente alinhada com um conceito de direção bastante estiloso de Hernán Goldfrid - como se os atores estivessem livres para brilhar em cima de uma história maravilhosamente bem contada em imagens e diálogos - e como disse inicialmente: sem inventar ou encontrar uma solução mirabolante para justificar suas escolhas. Como diz o protagonista: o segredo está no detalhe!
Baseado no livro deDiego Paszkowski, "Tese sobre um Homicídio" não se propõe a fechar uma questão sem nos colocar para pensar (daí a força do seu título) - isso é preciso ficar claro! O que não deixa a narrativa didática demais, porém pode decepcionar quem prefere algo mais mastigado como em outros filmes do gênero, porém a jornada é tão interessante quanto o final e vale muito a pena pelo entretenimento de excelente qualidade!
Um barril de pólvora prestes a explodir - é essa a sensação que vai te acompanhar durante os 90 minutos de "The Royal Hotel". Como não poderia deixar de ser, o filme dirigido pela talentosa cineasta australiana Kitty Green, dividiu opiniões ao brincar com a percepção de perigo de forma homeopática. Green se apropria do mesmo conceito narrativo de seu filme anterior, "A Assistente", para provar novamente que muitas vezes o que fica subentendido tem muito mais força dramática do que se explorado visualmente - é impressionante como o domínio dessa gramática é capaz de gerar ansiedade, angustia e até medo, já que as situações que assistimos na tela, infelizmente, são mais "normais" do que podemos imaginar. Perturbador na sua essência, "The Royal Hotel" é na verdade um drama psicológico cheio de nuances sobre a que ponto a hostilidade masculina pode chegar e como o machismo tóxico em um ambiente inóspito e decadente pode ser perigoso.
Na trama acompanhamos duas mochileiras canadenses, Hanna (Julia Garnere) e Liv (Jessica Henwick), que aceitam um emprego no remoto pub Royal Hotel para ganhar um dinheiro extra e depois seguirem em uma viagem de intercâmbio pela Austrália. Quando o comportamento dos habitantes locais, em sua maioria formado por mineradores alcoólatras e violentos, começa a ultrapassar os limites, as meninas ficam presas em uma situação que rapidamente foge de seu controle. Confira o trailer (em inglês):
No roteiro escrito pela própria Green ao lado do novato Oscar Redding, a princípio, o The Royal Hotel parece ser apenas mais um bar decadente no interior árido de qualquer país. Obviamente que à medida que a noite avança, Hanna e Liv se veem cada vez mais cercada pelo perigo - que se estivéssemos falando de "Um Drink no Inverno" seriam vampiros sedentos por sangue, mas aqui não! Aqui é pior! O que as protagonistas precisam enfrentar amedronta pela proximidade com a realidade, o horror está nos olhares lascivos, nos comentários maldosos e no comportamento abusivo por parte dos homens que frequentam o local. Green sabe como o tema é sensível e com muita inteligência ela eleva o clima de tensão gradativamente, transformando o que poderia ser uma simples passagem em um pesadelo realmente claustrofóbico e sufocante.
Como um recorte visceral da cultura do machismo e da violência, Green tenta não levantar bandeiras, mas deixa claro que existe uma situação normalizada pela sociedade (e aqui incluo as próprias mulheres) que tende a ser cada vez mais perigosa. Utilizando enquadramentos belíssimos para criar uma atmosfera sufocante, a fotografia do Michael Latham (de "Pelé'") transforma os tons desérticos da natureza australiana em uma extensão decadente com uma temperatura infernal que pontua o comportamento dentro do pub. Eu diria que o trabalho de Latham é tão bem realizado que é possível sentir o calor, o cheiro do álcool e a textura dos móveis empoeirados que compõem aquele cenário. Outro ponto que merece sua atenção diz respeito ao trabalho de desenho de som e mixagem - é impressionante como tudo contribui para potencializar essa sensação constante de desconforto.
Tanto Julia Garner quanto Jessica Henwick estão impecáveis - elas conseguem transmitir com maestria o medo e a vulnerabilidade de suas personagens apenas com o olhar, com as pausas, com a respiração. Daniel Henshall (como Dolly) e Ursula Yovich (como Carol) também entregam performances sólidas e críveis - o primeiro captura a essência da brutalidade masculina e da misoginia enraizada na cultura local e a segunda, a desesperança, a introspecção e um estado de negação dos mais incômodos.
"The Royal Hotel" não é apenas um excelente drama psicológico, é também um estudo contundente da cultura do machismo e da violência contra a mulher. Kitty Green não se furta em mostrar a crueza da realidade enfrentada por muitas mulheres, especialmente em locais remotos e patriarcais - o que nos provoca boas reflexões sobre a objetificação do corpo feminino e os perigos da cultura do estupro. Desconfortável, o filme escolhe não impactar visualmente, no entanto tudo é tão bem construído tecnicamente e soa tão palpável que a urgência que encontramos na narrativa, de fato, vai dialogar com todos - não apenas aqueles(as) mais sensíveis ao tema.
Vale muito o seu play!
Um barril de pólvora prestes a explodir - é essa a sensação que vai te acompanhar durante os 90 minutos de "The Royal Hotel". Como não poderia deixar de ser, o filme dirigido pela talentosa cineasta australiana Kitty Green, dividiu opiniões ao brincar com a percepção de perigo de forma homeopática. Green se apropria do mesmo conceito narrativo de seu filme anterior, "A Assistente", para provar novamente que muitas vezes o que fica subentendido tem muito mais força dramática do que se explorado visualmente - é impressionante como o domínio dessa gramática é capaz de gerar ansiedade, angustia e até medo, já que as situações que assistimos na tela, infelizmente, são mais "normais" do que podemos imaginar. Perturbador na sua essência, "The Royal Hotel" é na verdade um drama psicológico cheio de nuances sobre a que ponto a hostilidade masculina pode chegar e como o machismo tóxico em um ambiente inóspito e decadente pode ser perigoso.
Na trama acompanhamos duas mochileiras canadenses, Hanna (Julia Garnere) e Liv (Jessica Henwick), que aceitam um emprego no remoto pub Royal Hotel para ganhar um dinheiro extra e depois seguirem em uma viagem de intercâmbio pela Austrália. Quando o comportamento dos habitantes locais, em sua maioria formado por mineradores alcoólatras e violentos, começa a ultrapassar os limites, as meninas ficam presas em uma situação que rapidamente foge de seu controle. Confira o trailer (em inglês):
No roteiro escrito pela própria Green ao lado do novato Oscar Redding, a princípio, o The Royal Hotel parece ser apenas mais um bar decadente no interior árido de qualquer país. Obviamente que à medida que a noite avança, Hanna e Liv se veem cada vez mais cercada pelo perigo - que se estivéssemos falando de "Um Drink no Inverno" seriam vampiros sedentos por sangue, mas aqui não! Aqui é pior! O que as protagonistas precisam enfrentar amedronta pela proximidade com a realidade, o horror está nos olhares lascivos, nos comentários maldosos e no comportamento abusivo por parte dos homens que frequentam o local. Green sabe como o tema é sensível e com muita inteligência ela eleva o clima de tensão gradativamente, transformando o que poderia ser uma simples passagem em um pesadelo realmente claustrofóbico e sufocante.
Como um recorte visceral da cultura do machismo e da violência, Green tenta não levantar bandeiras, mas deixa claro que existe uma situação normalizada pela sociedade (e aqui incluo as próprias mulheres) que tende a ser cada vez mais perigosa. Utilizando enquadramentos belíssimos para criar uma atmosfera sufocante, a fotografia do Michael Latham (de "Pelé'") transforma os tons desérticos da natureza australiana em uma extensão decadente com uma temperatura infernal que pontua o comportamento dentro do pub. Eu diria que o trabalho de Latham é tão bem realizado que é possível sentir o calor, o cheiro do álcool e a textura dos móveis empoeirados que compõem aquele cenário. Outro ponto que merece sua atenção diz respeito ao trabalho de desenho de som e mixagem - é impressionante como tudo contribui para potencializar essa sensação constante de desconforto.
Tanto Julia Garner quanto Jessica Henwick estão impecáveis - elas conseguem transmitir com maestria o medo e a vulnerabilidade de suas personagens apenas com o olhar, com as pausas, com a respiração. Daniel Henshall (como Dolly) e Ursula Yovich (como Carol) também entregam performances sólidas e críveis - o primeiro captura a essência da brutalidade masculina e da misoginia enraizada na cultura local e a segunda, a desesperança, a introspecção e um estado de negação dos mais incômodos.
"The Royal Hotel" não é apenas um excelente drama psicológico, é também um estudo contundente da cultura do machismo e da violência contra a mulher. Kitty Green não se furta em mostrar a crueza da realidade enfrentada por muitas mulheres, especialmente em locais remotos e patriarcais - o que nos provoca boas reflexões sobre a objetificação do corpo feminino e os perigos da cultura do estupro. Desconfortável, o filme escolhe não impactar visualmente, no entanto tudo é tão bem construído tecnicamente e soa tão palpável que a urgência que encontramos na narrativa, de fato, vai dialogar com todos - não apenas aqueles(as) mais sensíveis ao tema.
Vale muito o seu play!
Talvez o maior mérito do "The Square", filme sueco e um dos favoritos para levar o Oscar de filme estrangeiro em 2018, tenha sido retratar com muita maestria o momento que vivemos hoje. O momento que se discute essencialmente "limites", mas também opiniões, posturas e, por quê não, caráter (só que dos outros) com o escudo do individualismo baseado na superficialidade de uma posição de especialista em "manchetes". O filme mostra o outro lado de vários assuntos que dominaram a timeline do facebook em 2017 e que, certamente, vão nos acompanhar enquanto nos apegarmos aquelas três palavras que "definem" um pensamento e, por consequência, uma pessoa. É patético, mas é real!!!!
Grande vencedor do Festival de Cannes em 2017, "The Square: A Arte da Discórdia" acompanha um gerente de museu de arte contemporânea de Estocolmo que está usando de todas as armas possíveis para promover o sucesso de uma nova instalação e por isso decide contratar uma empresa de relações públicas. Acontece que após ter seu celular roubado, ele perde o controle do seu trabalho, da sua vida, e acaba provocando situações drásticas capazes de colocar em jogo os seus próprios princípios e sua carreira! Confira o trailer:
"The Square" é um grande filme, com um grande roteiro e muito bem dirigido. Ruben Östlund, o diretor, já tinha ganhado o Festival de Berlin em 2010 com um curta "Incident by a Bank" rodado todo em plano sequência e com planos bem abertos, pontuando um ou outro momento com um preciso movimento de câmera lateral ou frontal. Em "The Square", ele trás essa assinatura, se não nos planos-sequência, nos enquadramentos mais abertos, mostrando (e comprovando) que nem sempre existe a necessidade de uma lente mais fechada para provocar uma sensação de certo impacto. É uma aula de cinematografia (em parceria com Fredrik Wenzel) e de direção de atores.
O roteiro é genial - ele traz um constrangimento que é difícil lidar! Sinceramente, eu não me surpreenderia se tivesse sido indicado como "Melhor Roteiro Original". Filme que mostra elementos novos na sua gramática e, principalmente, na genialidade da condução de história. Coincidentemente, uma frase do final que repito muito: "Ser bonzinho é fácil, difícil é ser justo" define muito bem o que é esse filme e onde ele quer nos provocar!
Se prepare, pois com "The Square" vale muito as 2:30 de filme!
Talvez o maior mérito do "The Square", filme sueco e um dos favoritos para levar o Oscar de filme estrangeiro em 2018, tenha sido retratar com muita maestria o momento que vivemos hoje. O momento que se discute essencialmente "limites", mas também opiniões, posturas e, por quê não, caráter (só que dos outros) com o escudo do individualismo baseado na superficialidade de uma posição de especialista em "manchetes". O filme mostra o outro lado de vários assuntos que dominaram a timeline do facebook em 2017 e que, certamente, vão nos acompanhar enquanto nos apegarmos aquelas três palavras que "definem" um pensamento e, por consequência, uma pessoa. É patético, mas é real!!!!
Grande vencedor do Festival de Cannes em 2017, "The Square: A Arte da Discórdia" acompanha um gerente de museu de arte contemporânea de Estocolmo que está usando de todas as armas possíveis para promover o sucesso de uma nova instalação e por isso decide contratar uma empresa de relações públicas. Acontece que após ter seu celular roubado, ele perde o controle do seu trabalho, da sua vida, e acaba provocando situações drásticas capazes de colocar em jogo os seus próprios princípios e sua carreira! Confira o trailer:
"The Square" é um grande filme, com um grande roteiro e muito bem dirigido. Ruben Östlund, o diretor, já tinha ganhado o Festival de Berlin em 2010 com um curta "Incident by a Bank" rodado todo em plano sequência e com planos bem abertos, pontuando um ou outro momento com um preciso movimento de câmera lateral ou frontal. Em "The Square", ele trás essa assinatura, se não nos planos-sequência, nos enquadramentos mais abertos, mostrando (e comprovando) que nem sempre existe a necessidade de uma lente mais fechada para provocar uma sensação de certo impacto. É uma aula de cinematografia (em parceria com Fredrik Wenzel) e de direção de atores.
O roteiro é genial - ele traz um constrangimento que é difícil lidar! Sinceramente, eu não me surpreenderia se tivesse sido indicado como "Melhor Roteiro Original". Filme que mostra elementos novos na sua gramática e, principalmente, na genialidade da condução de história. Coincidentemente, uma frase do final que repito muito: "Ser bonzinho é fácil, difícil é ser justo" define muito bem o que é esse filme e onde ele quer nos provocar!
Se prepare, pois com "The Square" vale muito as 2:30 de filme!
"The third day" surgiu como uma aposta da HBO, um novo modelo narrativo, uma experiência audiovisual: a minissérie foi criada com duas fases de três de episódios, cada uma delas focada em um protagonista, Sam (Jude Law) e Helen (Naomie Harris), respectivamente, e que seriam conectadas por uma espécie de livestream nas redes sociais com duração de 12 horas ininterruptas, em apenas um plano sequência e com os mesmos atores. Esse projeto do Dennis Kelly (Utopia) em parceria com Felix Barrett, da companhia teatral "Punchdrunk", pode ser analisado de duas formas: como uma ótima estratégia de marketing em tempos de pandemia e pela qualidade do produto que está disponível no streaming da HBO - vou focar na segunda opção e com o máximo de cuidado para não soltar nenhum spoiler!
Na história, após sofrer uma tragédia familiar, Sam está fazendo uma viagem pela costa da Inglaterra, sozinho, quando encontra uma jovem em perigo. Ao salvar a vida de Epona (Jessie Ross), ele resolve acompanha-la até sua casa - mesmo contra a vontade da garota. O grande problema é que Epona mora em um lugar bastante peculiar: uma ilha chamada Osea, um pedaço de terra que está ligado ao continente apenas por uma sinuosa e estreita estradinha, que só aparece poucos minutos por dia, quando a maré está baixa. Ao chegar em Osea, Sam percebe que se trata de uma comunidade extremamente religiosa, aparentemente amigável, que está se preparando para um tradicional festival. Pouco a pouco, porém, ele entende que alguns costumes dos habitantes da ilha são assustadores, mas Sam precisa manter a calma, lidar com suas incertezas (e fantasmas) até que a estrada esteja disponível novamente para que ele possa voltar ao continente sem causar problemas. Confira o trailer:
Se você gostou de "Midsommar" do Ari Aster pode dar um play sem medo - a história é bem semelhante e o conceito narrativo também. Se eu pudesse definir, eu diria que a primeira parte é mais autoral, uma aula de construção visual alinhada com uma narrativa interessante (e moderna) comandada pelo premiado diretor Marc Munden (O Jardim Secreto). Já na segunda parte, encontramos um conceito mais tradicional, mas não por isso mal executado pela diretora Philippa Lowthorpe (The Crown). Interessante que mesmo com um visual que não se conecta, cada uma das partes tem um identidade e uma razão para tal, o que nos dá a impressão que estamos assistindo produtos completamente independentes - mas não é o caso: tudo vai se conectar (vamos falar sobre isso mais a frente)!
Caso queira parar por aqui, "The third day" é um suspense psicológico com toques sobrenaturais que vai te entreter e entregar muitas respostas, mas tudo no seu tempo e, acredite, tudo que não for respondido só servirá para colocar a história em um patamar ainda mais interessante!
Quando terminamos de assistir a primeira parte da minissérie, temos a impressão de que tudo está resolvido e que podemos seguir para a segunda sem nos preocupar em fazer conexões que vão além do cenário que se passa a história: Osea. A própria dinâmica narrativa e visual nos motivam a pensar assim, mas quando Helen (Naomie Harris) e suas duas filhas, Ellie (Nico Parker) e Talulah (Charlotte Gairdner-Mihell) chegam na ilha percebemos uma total decadência, estabelecendo imediatamente uma atmosfera muito mais pesada, opressora, antipática - um mood totalmente oposto de quando Sam chegou. Ao nos depararmos com os mesmos personagens, automaticamente entendemos que não só o cenário é igual, mas que, mesmo sem uma indicação temporal exata, a história continuou. Mais uma vez, Paddy Considine e Emily Watson, como Sr. e Sra. Martin, são os anfitriões, mas será só no final do episódio 4 que tudo fará sentido e te prenderá até o final!
Um ponto interessante e que merece elogios é a maneira como Dennis Kelly foi amarrando todos detalhes mesmo respeitando as diferenças entre as partes: o que era mais introspectivo com Sam, onde a tensão estava dentro do protagonista, agora ganha um tom mais próximo do horror visual, com os habitantes da ilha praticamente transformados em entidades do mal. Helen, que chega na ilha com a desculpa de comemorar o aniversário de Ellie, sua filha mais velha, não entende muito bem o que está acontecendo ao seu redor e é por isso que somos convidados à se relacionar com as consequências do que aconteceu na primeira parte, quase como se soubéssemos todas as respostas - e, claro, não sabemos de nada! Ao nos induzir a acreditar que os protagonistas são Sam e Helen e que suas histórias são completamente independentes, o roteiro ganha em qualidade sem roubar no jogo!
Como o já citado "Midsommar", "The third day"não agradará a todos e não será um entretenimento dos mais fáceis de assistir, mas é um fato que Dennis Kelly aproveita a tendência de narrativas menos convencionais, apoiadas em um movimento que enaltecesse o terror psicológico onde o visual que choca é cirurgicamente pontuado apenas para servir como apoio, para entregar uma minissérie de altíssima qualidade técnica e artística, e que nos provoca a cada episódio.
Série com o carimbo HBO, experimentando sempre!
Curiosidade: A premissa é baseada em fatos reais, já que a Ilha de Osea, localizada no estuário do rio Blackwater, em Essex, no leste da Inglaterra, realmente existe e ela realmente é conectada à margem por uma estrada sinuosa que só aparece em maré baixa. Além disso, ela foi de propriedade de Frederick Nicholas Charrington, herdeiro de uma família cervejeira milionária que abriu mão da fortuna para criar uma clínica de tratamento de vícios na ilha, resultando em uma espécie de culto. E, como se isso não bastasse, Charrington foi mesmo um dos investigados pela Scotland Yard por suspeita de ser Jack, o Estripador. (Fonte: Plano Crítico)
"The third day" surgiu como uma aposta da HBO, um novo modelo narrativo, uma experiência audiovisual: a minissérie foi criada com duas fases de três de episódios, cada uma delas focada em um protagonista, Sam (Jude Law) e Helen (Naomie Harris), respectivamente, e que seriam conectadas por uma espécie de livestream nas redes sociais com duração de 12 horas ininterruptas, em apenas um plano sequência e com os mesmos atores. Esse projeto do Dennis Kelly (Utopia) em parceria com Felix Barrett, da companhia teatral "Punchdrunk", pode ser analisado de duas formas: como uma ótima estratégia de marketing em tempos de pandemia e pela qualidade do produto que está disponível no streaming da HBO - vou focar na segunda opção e com o máximo de cuidado para não soltar nenhum spoiler!
Na história, após sofrer uma tragédia familiar, Sam está fazendo uma viagem pela costa da Inglaterra, sozinho, quando encontra uma jovem em perigo. Ao salvar a vida de Epona (Jessie Ross), ele resolve acompanha-la até sua casa - mesmo contra a vontade da garota. O grande problema é que Epona mora em um lugar bastante peculiar: uma ilha chamada Osea, um pedaço de terra que está ligado ao continente apenas por uma sinuosa e estreita estradinha, que só aparece poucos minutos por dia, quando a maré está baixa. Ao chegar em Osea, Sam percebe que se trata de uma comunidade extremamente religiosa, aparentemente amigável, que está se preparando para um tradicional festival. Pouco a pouco, porém, ele entende que alguns costumes dos habitantes da ilha são assustadores, mas Sam precisa manter a calma, lidar com suas incertezas (e fantasmas) até que a estrada esteja disponível novamente para que ele possa voltar ao continente sem causar problemas. Confira o trailer:
Se você gostou de "Midsommar" do Ari Aster pode dar um play sem medo - a história é bem semelhante e o conceito narrativo também. Se eu pudesse definir, eu diria que a primeira parte é mais autoral, uma aula de construção visual alinhada com uma narrativa interessante (e moderna) comandada pelo premiado diretor Marc Munden (O Jardim Secreto). Já na segunda parte, encontramos um conceito mais tradicional, mas não por isso mal executado pela diretora Philippa Lowthorpe (The Crown). Interessante que mesmo com um visual que não se conecta, cada uma das partes tem um identidade e uma razão para tal, o que nos dá a impressão que estamos assistindo produtos completamente independentes - mas não é o caso: tudo vai se conectar (vamos falar sobre isso mais a frente)!
Caso queira parar por aqui, "The third day" é um suspense psicológico com toques sobrenaturais que vai te entreter e entregar muitas respostas, mas tudo no seu tempo e, acredite, tudo que não for respondido só servirá para colocar a história em um patamar ainda mais interessante!
Quando terminamos de assistir a primeira parte da minissérie, temos a impressão de que tudo está resolvido e que podemos seguir para a segunda sem nos preocupar em fazer conexões que vão além do cenário que se passa a história: Osea. A própria dinâmica narrativa e visual nos motivam a pensar assim, mas quando Helen (Naomie Harris) e suas duas filhas, Ellie (Nico Parker) e Talulah (Charlotte Gairdner-Mihell) chegam na ilha percebemos uma total decadência, estabelecendo imediatamente uma atmosfera muito mais pesada, opressora, antipática - um mood totalmente oposto de quando Sam chegou. Ao nos depararmos com os mesmos personagens, automaticamente entendemos que não só o cenário é igual, mas que, mesmo sem uma indicação temporal exata, a história continuou. Mais uma vez, Paddy Considine e Emily Watson, como Sr. e Sra. Martin, são os anfitriões, mas será só no final do episódio 4 que tudo fará sentido e te prenderá até o final!
Um ponto interessante e que merece elogios é a maneira como Dennis Kelly foi amarrando todos detalhes mesmo respeitando as diferenças entre as partes: o que era mais introspectivo com Sam, onde a tensão estava dentro do protagonista, agora ganha um tom mais próximo do horror visual, com os habitantes da ilha praticamente transformados em entidades do mal. Helen, que chega na ilha com a desculpa de comemorar o aniversário de Ellie, sua filha mais velha, não entende muito bem o que está acontecendo ao seu redor e é por isso que somos convidados à se relacionar com as consequências do que aconteceu na primeira parte, quase como se soubéssemos todas as respostas - e, claro, não sabemos de nada! Ao nos induzir a acreditar que os protagonistas são Sam e Helen e que suas histórias são completamente independentes, o roteiro ganha em qualidade sem roubar no jogo!
Como o já citado "Midsommar", "The third day"não agradará a todos e não será um entretenimento dos mais fáceis de assistir, mas é um fato que Dennis Kelly aproveita a tendência de narrativas menos convencionais, apoiadas em um movimento que enaltecesse o terror psicológico onde o visual que choca é cirurgicamente pontuado apenas para servir como apoio, para entregar uma minissérie de altíssima qualidade técnica e artística, e que nos provoca a cada episódio.
Série com o carimbo HBO, experimentando sempre!
Curiosidade: A premissa é baseada em fatos reais, já que a Ilha de Osea, localizada no estuário do rio Blackwater, em Essex, no leste da Inglaterra, realmente existe e ela realmente é conectada à margem por uma estrada sinuosa que só aparece em maré baixa. Além disso, ela foi de propriedade de Frederick Nicholas Charrington, herdeiro de uma família cervejeira milionária que abriu mão da fortuna para criar uma clínica de tratamento de vícios na ilha, resultando em uma espécie de culto. E, como se isso não bastasse, Charrington foi mesmo um dos investigados pela Scotland Yard por suspeita de ser Jack, o Estripador. (Fonte: Plano Crítico)
Como "A Mulher na Janela", com Amy Adams e Julianne Moor, "The Voyeurs" (ou "Observadores") é um filme datado, típico dos anos 90, em uma época onde nossas referências eram infinitamente mais limitadas do que são hoje - digo isso, pois será necessário uma enorme dose de suspensão da realidade para embarcar no plot twist que o roteirista e diretor Michael Mohan no oferece no final do segundo ato - e aqui cabe um comentário: a solução não é ruim, chega a ser até surpreendente, mas não é nada palpável tendo como base os inúmeros outros filmes ou séries do gênero que já assistimos com tantas ofertas por aí!
Pippa (Sydney Sweeney) e Thomas (Justice Smith) são um casal muito apaixonado que acabam de se mudar para um lindo apartamento, onde vão morar juntos pela primeira vez. Tudo é um mar de rosas para o casal até eles perceberem que, pela janela, conseguem acompanhar absolutamente tudo que se passa no apartamento de um vizinho do prédio em frente. Curiosos, os dois começam um excitante passatempo de observar a rotina do casal vizinho: o fotógrafo Seb (Ben Hardy) e a esposa Julia (Natasha Liu Bordizzo). Aos poucos, o que parecia uma mera diversão vai se tornando uma verdadeira obsessão para Pippa, e o enorme interesse que ela constrói sobre a vida de seus vizinhos começa a ameaçar o seu próprio relacionamento com Thomas. Confira o trailer:
É inegável que "The Voyeurs" toca em um assunto que soa fascinante para quase todo ser humano: a curiosidade de saber o que acontece atrás da parede ao lado (no caso, no prédio da frente). Com isso, nos conectamos rapidamente com o casal de protagonistas e entendemos aquela incontrolável sensação, muitas vezes excitante, de observar a vida alheia. Muito bem dirigido pelo Michael Mohan, a angustia de estarmos sendo observados acompanha a própria Pippa em muitos momentos do filme e a forma como Sweeney lida com essa "tensão" é quase tão provocadora quanto nos momentos em que ela mesmo passa a ser a observadora - e tudo isso não é por acaso, reparem. O trabalho da atriz (e não é o primeiro, basta lembrar de "The White Lotus") é sensacional, pois ela transita naquela linha tênue entre a curiosidade e a invasão de privacidade, deixando claro que sempre existe espaço para arriscar um pouco mais.
O grande problema do filme, na nossa opinião, não está na forma, mas sim no conteúdo. Os dois primeiros atos nos direcionam para um drama muito mais profundo, sensual e até provocador do que necessariamente para um suspense psicológico - o envolvimento entre os personagens cria um clima onde o medo de ser descoberto é até maior do que saber o que aconteceria se, de fato, fossemos descobertos! Acontece que a força dessa tensão vai se enfraquecendo durante o filme, pois a história parece não encontrar caminhos para manter esse mood, com isso assistimos somos apresentados para soluções pouco interessantes e quase sempre absurdas, que impactam na veracidade daquele bom drama e, claro, na relação entre os personagens com um conflito menos potente.
Ao som de uma ótima versão de “Eyes without a face” na voz de Angel Olsen, "The Voyeurs" brinca com a melancolia do ser humano ao mesmo tempo em que provoca o fetiche da invasão de privacidade, mas sem se aprofundar em nenhum dos temas - e é isso que pode incomodar alguns. Ao estabelecer que o universo dos personagens-chave está em observar, no caso de Pippa em lidar com a visão das pessoas (ela trabalha em um consultório oftalmológico) e no caso de Seb em fotografar modelos maravilhosas, o roteiro força a barra em ter que provar que tudo faz sentido sempre. O que eu quero dizer é que se você não se apegar aos detalhes, "The Voyeurs" será um ótimo entretenimento. Se você também não se apegar ao realismo no pé da letra, o filme pode ser um entretenimento melhor ainda. Mas se você quiser algo inteligente, bem construído e cheio de camadas, esquece, esse filme pode não ser para você e nem foi feito para ser.
Vale a pena? Sim, nessa condições! Então só dê o play se estiver disposto embarcar em uma ótima diversão!
Como "A Mulher na Janela", com Amy Adams e Julianne Moor, "The Voyeurs" (ou "Observadores") é um filme datado, típico dos anos 90, em uma época onde nossas referências eram infinitamente mais limitadas do que são hoje - digo isso, pois será necessário uma enorme dose de suspensão da realidade para embarcar no plot twist que o roteirista e diretor Michael Mohan no oferece no final do segundo ato - e aqui cabe um comentário: a solução não é ruim, chega a ser até surpreendente, mas não é nada palpável tendo como base os inúmeros outros filmes ou séries do gênero que já assistimos com tantas ofertas por aí!
Pippa (Sydney Sweeney) e Thomas (Justice Smith) são um casal muito apaixonado que acabam de se mudar para um lindo apartamento, onde vão morar juntos pela primeira vez. Tudo é um mar de rosas para o casal até eles perceberem que, pela janela, conseguem acompanhar absolutamente tudo que se passa no apartamento de um vizinho do prédio em frente. Curiosos, os dois começam um excitante passatempo de observar a rotina do casal vizinho: o fotógrafo Seb (Ben Hardy) e a esposa Julia (Natasha Liu Bordizzo). Aos poucos, o que parecia uma mera diversão vai se tornando uma verdadeira obsessão para Pippa, e o enorme interesse que ela constrói sobre a vida de seus vizinhos começa a ameaçar o seu próprio relacionamento com Thomas. Confira o trailer:
É inegável que "The Voyeurs" toca em um assunto que soa fascinante para quase todo ser humano: a curiosidade de saber o que acontece atrás da parede ao lado (no caso, no prédio da frente). Com isso, nos conectamos rapidamente com o casal de protagonistas e entendemos aquela incontrolável sensação, muitas vezes excitante, de observar a vida alheia. Muito bem dirigido pelo Michael Mohan, a angustia de estarmos sendo observados acompanha a própria Pippa em muitos momentos do filme e a forma como Sweeney lida com essa "tensão" é quase tão provocadora quanto nos momentos em que ela mesmo passa a ser a observadora - e tudo isso não é por acaso, reparem. O trabalho da atriz (e não é o primeiro, basta lembrar de "The White Lotus") é sensacional, pois ela transita naquela linha tênue entre a curiosidade e a invasão de privacidade, deixando claro que sempre existe espaço para arriscar um pouco mais.
O grande problema do filme, na nossa opinião, não está na forma, mas sim no conteúdo. Os dois primeiros atos nos direcionam para um drama muito mais profundo, sensual e até provocador do que necessariamente para um suspense psicológico - o envolvimento entre os personagens cria um clima onde o medo de ser descoberto é até maior do que saber o que aconteceria se, de fato, fossemos descobertos! Acontece que a força dessa tensão vai se enfraquecendo durante o filme, pois a história parece não encontrar caminhos para manter esse mood, com isso assistimos somos apresentados para soluções pouco interessantes e quase sempre absurdas, que impactam na veracidade daquele bom drama e, claro, na relação entre os personagens com um conflito menos potente.
Ao som de uma ótima versão de “Eyes without a face” na voz de Angel Olsen, "The Voyeurs" brinca com a melancolia do ser humano ao mesmo tempo em que provoca o fetiche da invasão de privacidade, mas sem se aprofundar em nenhum dos temas - e é isso que pode incomodar alguns. Ao estabelecer que o universo dos personagens-chave está em observar, no caso de Pippa em lidar com a visão das pessoas (ela trabalha em um consultório oftalmológico) e no caso de Seb em fotografar modelos maravilhosas, o roteiro força a barra em ter que provar que tudo faz sentido sempre. O que eu quero dizer é que se você não se apegar aos detalhes, "The Voyeurs" será um ótimo entretenimento. Se você também não se apegar ao realismo no pé da letra, o filme pode ser um entretenimento melhor ainda. Mas se você quiser algo inteligente, bem construído e cheio de camadas, esquece, esse filme pode não ser para você e nem foi feito para ser.
Vale a pena? Sim, nessa condições! Então só dê o play se estiver disposto embarcar em uma ótima diversão!
"Them" consegue ser ambígua e polêmica desde o título: a série tem sido traduzida por "Eles" e "Outros" nas diferentes plataformas e sites. Nessa série antológica de época, uma família afro-americana se muda para um bairro caucasiano e racista. Acompanhamos seus 10 primeiros dias no novo lar. Confira o trailer:
A qualidade técnica é indiscutível e a ambientação do subúrbio americano dos anos 50 é simplesmente impecável, dos carros à trilha sonora. O contexto histórico também é retratado: na primeira metade do século 20, cerca de 6 milhões de afro-americanos deixaram o sul – rural e ainda segregacionista – em direção a centros urbanos, noutras regiões do país, no movimento conhecido como Grande Migração.
Os elementos de tensão e horror são diversos e muito bem trabalhados: traumas do passado, vizinhança hostil, sociedade racista, pesadelos, entidades ameaçadoras... A realidade é dúbia e a dúvida é sustentada, pelo menos, até o ousado penúltimo episódio – um flashback em preto e branco, focado em um personagem que até então mal havia dado as caras.
Em vários momentos, porém, a ousadia se transforma num flerte com o sadismo: além do horror psicológico, há uma dezena de cenas de violência explícita e até tortura. Isso não seria um problema se a direção não cruzasse a linha da “violência que serve à história”.
A partir do polêmico 5º episódio – onde avisos de gatilho, não à toa, aparecem antes do início – a crítica social sucumbe em detrimento ao horror onde o propósito parece ser chocar a audiência. Basta ver como as recentes produções "Lovecraft Country", "Nós" e "Corra!" trabalham o mesmo tema (racismo), dentro do mesmo gênero (terror), de forma mais equilibrada.
O casal protagonista convence tanto nos momentos dramáticos quanto nos explosivos, o que não é fácil. Interpretações num tom acima ou abaixo, somadas à violência desviada da mensagem central, comprometeriam o resultado final. A principal "vilã" também se destaca: ela ganha camadas e se vê forçada a flexibilizar convicções durante a jornada, sempre com um sorriso amarelo acompanhado de iminentes lágrimas.
Usando alegorias sádicas e excessos narrativos para falar sobre luto, culpa e racismo, "Them" te desafia a assisti-la sem revirar os olhos (ou o estômago) pelo menos uma vez. Uma experiência intensa e perturbadora, que vale mais pela jornada!
Escrito por Ricelli Ribeiro com Edição de André Siqueira - uma parceria@dicastreaming
"Them" consegue ser ambígua e polêmica desde o título: a série tem sido traduzida por "Eles" e "Outros" nas diferentes plataformas e sites. Nessa série antológica de época, uma família afro-americana se muda para um bairro caucasiano e racista. Acompanhamos seus 10 primeiros dias no novo lar. Confira o trailer:
A qualidade técnica é indiscutível e a ambientação do subúrbio americano dos anos 50 é simplesmente impecável, dos carros à trilha sonora. O contexto histórico também é retratado: na primeira metade do século 20, cerca de 6 milhões de afro-americanos deixaram o sul – rural e ainda segregacionista – em direção a centros urbanos, noutras regiões do país, no movimento conhecido como Grande Migração.
Os elementos de tensão e horror são diversos e muito bem trabalhados: traumas do passado, vizinhança hostil, sociedade racista, pesadelos, entidades ameaçadoras... A realidade é dúbia e a dúvida é sustentada, pelo menos, até o ousado penúltimo episódio – um flashback em preto e branco, focado em um personagem que até então mal havia dado as caras.
Em vários momentos, porém, a ousadia se transforma num flerte com o sadismo: além do horror psicológico, há uma dezena de cenas de violência explícita e até tortura. Isso não seria um problema se a direção não cruzasse a linha da “violência que serve à história”.
A partir do polêmico 5º episódio – onde avisos de gatilho, não à toa, aparecem antes do início – a crítica social sucumbe em detrimento ao horror onde o propósito parece ser chocar a audiência. Basta ver como as recentes produções "Lovecraft Country", "Nós" e "Corra!" trabalham o mesmo tema (racismo), dentro do mesmo gênero (terror), de forma mais equilibrada.
O casal protagonista convence tanto nos momentos dramáticos quanto nos explosivos, o que não é fácil. Interpretações num tom acima ou abaixo, somadas à violência desviada da mensagem central, comprometeriam o resultado final. A principal "vilã" também se destaca: ela ganha camadas e se vê forçada a flexibilizar convicções durante a jornada, sempre com um sorriso amarelo acompanhado de iminentes lágrimas.
Usando alegorias sádicas e excessos narrativos para falar sobre luto, culpa e racismo, "Them" te desafia a assisti-la sem revirar os olhos (ou o estômago) pelo menos uma vez. Uma experiência intensa e perturbadora, que vale mais pela jornada!
Escrito por Ricelli Ribeiro com Edição de André Siqueira - uma parceria@dicastreaming
"Top Model" (ou "The Model") é um filme dinamarquês de 2016 pouco original, mas não digo isso com demérito e sim com certa preocupação. É mais uma história sobre o universo predatório da moda que serve de aviso para milhões de adolescentes que sonham em sair de uma cidade pequena e estampar as mais cobiçadas capas de revistas e desfilar para as mais importantes grifes - o diferencial aqui, é justamente a forma realista e provocadora como o diretor Mads Matthiesen (de "Equinox") retrata essa atmosfera tentadora e pouco ficcional.
Emma (Maria Palm) é uma modelo emergente no meio artístico que está lutando para conseguir um espaço no cenário da moda parisiense depois de sair de uma pequena cidade do interior da Dinamarca. Em meio a sua batalha por espaço, ela desenvolve uma certa obsessão por um famoso fotógrafo de moda, Shane White (Ed Skrein), depois que uma rápida relação se estabelece entre os dois. Confira o trailer:
Talvez o ponto a ser observado de imediato, são os sinais de uma jornada que parece tão comum à tantas modelos em inicio de carreira. Obviamente sem generalizar e respeitando inúmeros profissionais que transitam nesse universo, é mais uma história que se encaixa na receita de um estereótipo criado depois de inúmeras repetições: a rotina de uma jovem, no caso dinamarquesa, que se aventura em Paris, sob a desconfiança da sua família pouco presente e da crença de um namorado de colégio, a quem promete amor eterno. Porém, o amor é frágil demais diante da possibilidade de tantas realizações de uma profissão tão glamorosa - e Matthiesen equilibra perfeitamente o perrengue do dia a dia com as oportunidades sociais que a profissão facilmente impõe.
O contraste entre a Dinamarca, e a história construída por lá e que fica para trás rapidamente, e a Paris que surge iluminada como a oportunidade de uma vida, fazem com que os enquadramentos retratem exatamente essa dicotomia - reparem como o filme trabalha a beleza do silêncio em planos da cidade como se estivessem nos preparando para o caos que o dia vai se tornar, se estendendo até a altas horas da noite, afinal estamos falando da "metrópole da moda". Esse e outros detalhes que podem passar despercebidos, criam inúmeras camadas na personagem Emma - aliás, a atriz que interpreta a protagonista, Maria Palm, é modelo profissional e se aproveita perfeitamente da familiaridade com o universo da profissão para representar algum encantamento dentro do competitivo, mas deslumbrante, mundo da moda pelos olhos de quem sonhou mais do que viveu. Ela merece nosso elogio, pela neutralidade e ao mesmo tempo pela profundidade com que interioriza tantos sentimentos, tão comuns para a idade (ela tem 16 anos na história).
"Top Model" é mais provocador do que surpreendente. Tudo é muito claro e vai se encaixando quase que automaticamente sem a menor intenção de criar um plot twist matador (desculpem o trocadilho). Sua dinâmica é bem construída e nos leva para dentro de uma jovem em transformação e sem a menor capacidade intelectual de sobreviver a tantos predadores - sucesso, homens, oportunidades, mulheres, dinheiro, competição! Filme vencedor Göteborg Film Festival em 2016, com uma levada conceitual bem independente, mas fácil de acompanhar e de se entreter!
Pode te surpreender!
"Top Model" (ou "The Model") é um filme dinamarquês de 2016 pouco original, mas não digo isso com demérito e sim com certa preocupação. É mais uma história sobre o universo predatório da moda que serve de aviso para milhões de adolescentes que sonham em sair de uma cidade pequena e estampar as mais cobiçadas capas de revistas e desfilar para as mais importantes grifes - o diferencial aqui, é justamente a forma realista e provocadora como o diretor Mads Matthiesen (de "Equinox") retrata essa atmosfera tentadora e pouco ficcional.
Emma (Maria Palm) é uma modelo emergente no meio artístico que está lutando para conseguir um espaço no cenário da moda parisiense depois de sair de uma pequena cidade do interior da Dinamarca. Em meio a sua batalha por espaço, ela desenvolve uma certa obsessão por um famoso fotógrafo de moda, Shane White (Ed Skrein), depois que uma rápida relação se estabelece entre os dois. Confira o trailer:
Talvez o ponto a ser observado de imediato, são os sinais de uma jornada que parece tão comum à tantas modelos em inicio de carreira. Obviamente sem generalizar e respeitando inúmeros profissionais que transitam nesse universo, é mais uma história que se encaixa na receita de um estereótipo criado depois de inúmeras repetições: a rotina de uma jovem, no caso dinamarquesa, que se aventura em Paris, sob a desconfiança da sua família pouco presente e da crença de um namorado de colégio, a quem promete amor eterno. Porém, o amor é frágil demais diante da possibilidade de tantas realizações de uma profissão tão glamorosa - e Matthiesen equilibra perfeitamente o perrengue do dia a dia com as oportunidades sociais que a profissão facilmente impõe.
O contraste entre a Dinamarca, e a história construída por lá e que fica para trás rapidamente, e a Paris que surge iluminada como a oportunidade de uma vida, fazem com que os enquadramentos retratem exatamente essa dicotomia - reparem como o filme trabalha a beleza do silêncio em planos da cidade como se estivessem nos preparando para o caos que o dia vai se tornar, se estendendo até a altas horas da noite, afinal estamos falando da "metrópole da moda". Esse e outros detalhes que podem passar despercebidos, criam inúmeras camadas na personagem Emma - aliás, a atriz que interpreta a protagonista, Maria Palm, é modelo profissional e se aproveita perfeitamente da familiaridade com o universo da profissão para representar algum encantamento dentro do competitivo, mas deslumbrante, mundo da moda pelos olhos de quem sonhou mais do que viveu. Ela merece nosso elogio, pela neutralidade e ao mesmo tempo pela profundidade com que interioriza tantos sentimentos, tão comuns para a idade (ela tem 16 anos na história).
"Top Model" é mais provocador do que surpreendente. Tudo é muito claro e vai se encaixando quase que automaticamente sem a menor intenção de criar um plot twist matador (desculpem o trocadilho). Sua dinâmica é bem construída e nos leva para dentro de uma jovem em transformação e sem a menor capacidade intelectual de sobreviver a tantos predadores - sucesso, homens, oportunidades, mulheres, dinheiro, competição! Filme vencedor Göteborg Film Festival em 2016, com uma levada conceitual bem independente, mas fácil de acompanhar e de se entreter!
Pode te surpreender!
Se você assistir 2 episódios de "Treta", sua percepção será uma. Se você assistir 7, será outra. Se você assistir toda minissérie você vai entender perfeitamente a razão pela qual ela ganhou a maioria (para não dizer os principais) dos prêmios que disputou no Emmy 2023 e no Globo de Ouro 2024. Criada pelo sul-coreano Lee Sung Jin (um dos roteiristas de "Silicon Valley"), essa minissérie pode ser considerada uma das melhores produções da Netflix em todos os tempos - mas já te adiando: essa opinião não será uma unanimidade já que a trama, para alguns, pode parecer esquisita demais, um pouco maçante em alguns episódios e com um final, digamos, fora do usual, ao ponto de exigir muita reflexão para embarcar na proposta do seu criador. Veja, acompanhar a história de dois estranhos que se envolvem em uma briga de trânsito, passam a se perseguir e provocar um ao outro, não é algo tão criativo assim, mas a forma como isso se transforma em uma verdadeira provocação, inteligente eu pontuaria, sobre "causa e consequência", isso sim é! Além, obviamente, de ser um olhar dos mais interessantes sobre a raiva e suas implicações nas relações humanas no mundo moderno - algo que encontramos nas camadas mais profundas de "Parasita", por exemplo.
Danny Cho (Steven Yeun) é um empreiteiro frustrado com sérios problemas financeiros e de auto-estima. Amy Lau (Ali Wong) é uma empresária bem-sucedida, casada e com uma realidade muito diferente de Danny, mas nem por isso mais fácil. O caminho desses dois mundos acaba se cruzando inesperadamente após um desentendimento no trânsito. A raiva causada pelo incidente e o desejo de vingança que toma conta dos dois vão, pouco a pouco, consumindo suas mentes e trazendo consequências caóticas às suas vidas. Confira o trailer:
A partir de um olhar mais cuidadoso, é possível afirmar que a minissérie pode ser considerada imperdível por vários motivos e provavelmente o primeiro que vai te chamar atenção será o roteiro. Original e instigante, o roteiro do próprio Jin oferece uma visão diferente sobre um tema tão comum: a raiva. O texto é bem escrito, é inteligente, e sabe explorar com sensibilidade as nuances psicológicas dos personagens quando tomados por esse sentimento. Aqui não se trata apenas dos atos, mas também dos gatilhos que impulsionam um ser humano a agir de forma irracional em pleno século XXI.
Em segundo lugar, as performances dos premiados Steven Yeun e Ali Wong são simplesmente impecáveis. Yeun, que já havia se destacado em produções como "Minari" (quando foi, inclusive, indicado ao Oscar), mostra mais uma vez seu talento, interpretando um homem ressentido e violento que busca desesperadamente ser amado - sua capacidade de construir um personagem complexo na sua intimidade e simples na sua postura cotidiana, é de se aplaudir de pé. Já Wong entrega uma performance visceral, dando vida para uma mulher forte e impulsiva, mas ao mesmo tempo carente e que luta para ser aceita como mãe, trazendo do seu passado uma série de fantasmas que pontualmente impactam demais nas suas escolhas como ser humano.
A direção de Sung Jin é o terceiro pilar de "Treta". O diretor consegue criar uma atmosfera claustrofóbica e tensa, que reflete o estado emocional dos seus personagens a cada sequência que ele se propõe a construir com uma capacidade artística que me lembrou muito Bong Joon-ho. Ao alinhar uma fotografia elegante e o uso de uma trilha sonoro especialmente eficaz, Jin entrega um verdadeiro tratado crítico e mordaz sobre a sociedade contemporânea que alimenta a raiva e a intolerância a cada "mão na buzina". Saiba que "Beef" (no original) vai ficar na sua cabeça por muito tempo, te fazendo pensar ao ponto de transformar algumas de suas atitudes dependendo da sua sensibilidade e disposição!
Um drama com toques de humor non-sense para dar o play e esquecer (ou lembrar demais) da vida!
Se você assistir 2 episódios de "Treta", sua percepção será uma. Se você assistir 7, será outra. Se você assistir toda minissérie você vai entender perfeitamente a razão pela qual ela ganhou a maioria (para não dizer os principais) dos prêmios que disputou no Emmy 2023 e no Globo de Ouro 2024. Criada pelo sul-coreano Lee Sung Jin (um dos roteiristas de "Silicon Valley"), essa minissérie pode ser considerada uma das melhores produções da Netflix em todos os tempos - mas já te adiando: essa opinião não será uma unanimidade já que a trama, para alguns, pode parecer esquisita demais, um pouco maçante em alguns episódios e com um final, digamos, fora do usual, ao ponto de exigir muita reflexão para embarcar na proposta do seu criador. Veja, acompanhar a história de dois estranhos que se envolvem em uma briga de trânsito, passam a se perseguir e provocar um ao outro, não é algo tão criativo assim, mas a forma como isso se transforma em uma verdadeira provocação, inteligente eu pontuaria, sobre "causa e consequência", isso sim é! Além, obviamente, de ser um olhar dos mais interessantes sobre a raiva e suas implicações nas relações humanas no mundo moderno - algo que encontramos nas camadas mais profundas de "Parasita", por exemplo.
Danny Cho (Steven Yeun) é um empreiteiro frustrado com sérios problemas financeiros e de auto-estima. Amy Lau (Ali Wong) é uma empresária bem-sucedida, casada e com uma realidade muito diferente de Danny, mas nem por isso mais fácil. O caminho desses dois mundos acaba se cruzando inesperadamente após um desentendimento no trânsito. A raiva causada pelo incidente e o desejo de vingança que toma conta dos dois vão, pouco a pouco, consumindo suas mentes e trazendo consequências caóticas às suas vidas. Confira o trailer:
A partir de um olhar mais cuidadoso, é possível afirmar que a minissérie pode ser considerada imperdível por vários motivos e provavelmente o primeiro que vai te chamar atenção será o roteiro. Original e instigante, o roteiro do próprio Jin oferece uma visão diferente sobre um tema tão comum: a raiva. O texto é bem escrito, é inteligente, e sabe explorar com sensibilidade as nuances psicológicas dos personagens quando tomados por esse sentimento. Aqui não se trata apenas dos atos, mas também dos gatilhos que impulsionam um ser humano a agir de forma irracional em pleno século XXI.
Em segundo lugar, as performances dos premiados Steven Yeun e Ali Wong são simplesmente impecáveis. Yeun, que já havia se destacado em produções como "Minari" (quando foi, inclusive, indicado ao Oscar), mostra mais uma vez seu talento, interpretando um homem ressentido e violento que busca desesperadamente ser amado - sua capacidade de construir um personagem complexo na sua intimidade e simples na sua postura cotidiana, é de se aplaudir de pé. Já Wong entrega uma performance visceral, dando vida para uma mulher forte e impulsiva, mas ao mesmo tempo carente e que luta para ser aceita como mãe, trazendo do seu passado uma série de fantasmas que pontualmente impactam demais nas suas escolhas como ser humano.
A direção de Sung Jin é o terceiro pilar de "Treta". O diretor consegue criar uma atmosfera claustrofóbica e tensa, que reflete o estado emocional dos seus personagens a cada sequência que ele se propõe a construir com uma capacidade artística que me lembrou muito Bong Joon-ho. Ao alinhar uma fotografia elegante e o uso de uma trilha sonoro especialmente eficaz, Jin entrega um verdadeiro tratado crítico e mordaz sobre a sociedade contemporânea que alimenta a raiva e a intolerância a cada "mão na buzina". Saiba que "Beef" (no original) vai ficar na sua cabeça por muito tempo, te fazendo pensar ao ponto de transformar algumas de suas atitudes dependendo da sua sensibilidade e disposição!
Um drama com toques de humor non-sense para dar o play e esquecer (ou lembrar demais) da vida!
Assisti "Vidro" (Glass), filme que "teoricamente" fecha a trilogia de "Corpo Fechado" e "Fragmentado", e "ok"! Na verdade talvez eu tenha me decepcionado mais do que não gostado o filme. Minha expectativa era alta, pois eu tinha a esperança que a trilogia havia sido planejada desde o começo e muito bem desenvolvida para ter um grande final ou até mesmo para fomentar o início de mais uma ótima franquia de heróis! Ilusão!!!!
Conhecendo o negócio, eu tenho absoluta certeza que o M. Night Shyamalan aproveitou a provocação de colocar o David Dunn em uma aparição rápida no filme anterior (e que funcionou para muita gente) para inventar essa trilogia! Eu digo isso tranquilamente porque "Vidro" comete um erro clássico de arco narrativo: tem uma quantidade absurda de diálogos explicativos - o que coloca o roteiro do filme em um nível muito medíocre (principalmente tendo um cara tão criativo como o Shyamalan no comando). Desde do inicio do filme a impressão que fica é a de uma necessidade enorme em unir a história dos outros dois filmes com a trama de "Vidro" - e não funciona, fica forçado, nada surpreende e, na boa, muito superficial!!!!
Eu sou um fã do M. Night Shyamalan, defendo o cara até quando o filme é ruim porque acho ele um excelente cineasta. Ele tem um domínio impressionante da gramatica cinematográfica, principalmente quando o assunto é criar tensão e por isso, me decepcionei. Ele estava irreconhecível, mesmo tendo escolhido a "ação" para vender seu filme e não o "suspense". Teve lapsos de genialidade, uma ou outra sequência bem filmada - como a cena em que a câmera está dentro do furgão enquanto Dunn e a Fera brigam do lado de fora - ali ele nos coloca dentro do filme de verdade, mas não durou muito!!! Ele abusou das câmeras em primeira pessoa e não ficou bacana. Eu sempre digo: se você não é o Spielberg, evite esse plano. Talvez em dois momentos tenha até funcionado, mas não mais que isso!
Outro momento de pouca inspiração foi na escolha de trabalhar com planos fechados demais, normalmente no rosto do ator, em algumas cenas de ação ou quando a câmera acompanhava os movimentos do ator por estar presa a ele - aqui cabe uma observação: juro que só vi essa técnica funcionar nas mãos do Vince Gilligan em Breaking Bad e porque tinha tudo a ver com a escolha conceitual da série. "Vidro" não tem unidade narrativa ou estética que lembre os outros filmes, da mesma forma como Fragmentado não tinha com o Corpo Fechado - são filmes tão diferentes que poderiam se completar tão genialmente, que chega a dar raiva esse terceiro ato!
Talvez quem leia esse Review tenha a certeza que eu odiei o filme. Não foi o caso, de verdade! Eu me diverti em alguns momentos. O filme tem sacadas excelentes como a do plano que antecede o prólogo de Corpo Fechado que o Shyamalan trouxe de volta ou até mesmo as cenas em que James McAvoy vai trocando de personalidade em sequência - o cara realmente é muito bom! Em compensação a participação dos personagens Casey Cooke (Fragmentado), Joseph Dunn e da Mrs. Price (Corpo Fechado) chega a ser constrangedora!
O fato é que a tentativa de criar uma franquia de heróis não deu certo na minha opinião - a solução que ele encontrou para uma possível sequência lembra os piores anos de "Heroes" - que aliás era tão genial na primeira temporada que se tornou case de como destruir uma idéia com tanto potencial - e acho que "Vidro" deixa o mesmo gosto amargo!!!
Shyamalan vinha bem, fez dois filmes ótimos, quando trouxe para tela o que mais domina - a tensão e o foco no diálogo! "Vidro" para mim, não funciona porque não tem nenhum desses pilares. A minha torcida é para que ele volte a fazer filme sem muito orçamento onde a sua criatividade realmente aparece e que, no gênero certo, faz toda a diferença! Já para "Vidro", eu sugiro: assista e depois me diga se eu fui duro demais; porque juro que eu queria mesmo era poder fazer um review mais bacana sobre o filme, mas não deu!!
Vale como entretenimento e só!
Assisti "Vidro" (Glass), filme que "teoricamente" fecha a trilogia de "Corpo Fechado" e "Fragmentado", e "ok"! Na verdade talvez eu tenha me decepcionado mais do que não gostado o filme. Minha expectativa era alta, pois eu tinha a esperança que a trilogia havia sido planejada desde o começo e muito bem desenvolvida para ter um grande final ou até mesmo para fomentar o início de mais uma ótima franquia de heróis! Ilusão!!!!
Conhecendo o negócio, eu tenho absoluta certeza que o M. Night Shyamalan aproveitou a provocação de colocar o David Dunn em uma aparição rápida no filme anterior (e que funcionou para muita gente) para inventar essa trilogia! Eu digo isso tranquilamente porque "Vidro" comete um erro clássico de arco narrativo: tem uma quantidade absurda de diálogos explicativos - o que coloca o roteiro do filme em um nível muito medíocre (principalmente tendo um cara tão criativo como o Shyamalan no comando). Desde do inicio do filme a impressão que fica é a de uma necessidade enorme em unir a história dos outros dois filmes com a trama de "Vidro" - e não funciona, fica forçado, nada surpreende e, na boa, muito superficial!!!!
Eu sou um fã do M. Night Shyamalan, defendo o cara até quando o filme é ruim porque acho ele um excelente cineasta. Ele tem um domínio impressionante da gramatica cinematográfica, principalmente quando o assunto é criar tensão e por isso, me decepcionei. Ele estava irreconhecível, mesmo tendo escolhido a "ação" para vender seu filme e não o "suspense". Teve lapsos de genialidade, uma ou outra sequência bem filmada - como a cena em que a câmera está dentro do furgão enquanto Dunn e a Fera brigam do lado de fora - ali ele nos coloca dentro do filme de verdade, mas não durou muito!!! Ele abusou das câmeras em primeira pessoa e não ficou bacana. Eu sempre digo: se você não é o Spielberg, evite esse plano. Talvez em dois momentos tenha até funcionado, mas não mais que isso!
Outro momento de pouca inspiração foi na escolha de trabalhar com planos fechados demais, normalmente no rosto do ator, em algumas cenas de ação ou quando a câmera acompanhava os movimentos do ator por estar presa a ele - aqui cabe uma observação: juro que só vi essa técnica funcionar nas mãos do Vince Gilligan em Breaking Bad e porque tinha tudo a ver com a escolha conceitual da série. "Vidro" não tem unidade narrativa ou estética que lembre os outros filmes, da mesma forma como Fragmentado não tinha com o Corpo Fechado - são filmes tão diferentes que poderiam se completar tão genialmente, que chega a dar raiva esse terceiro ato!
Talvez quem leia esse Review tenha a certeza que eu odiei o filme. Não foi o caso, de verdade! Eu me diverti em alguns momentos. O filme tem sacadas excelentes como a do plano que antecede o prólogo de Corpo Fechado que o Shyamalan trouxe de volta ou até mesmo as cenas em que James McAvoy vai trocando de personalidade em sequência - o cara realmente é muito bom! Em compensação a participação dos personagens Casey Cooke (Fragmentado), Joseph Dunn e da Mrs. Price (Corpo Fechado) chega a ser constrangedora!
O fato é que a tentativa de criar uma franquia de heróis não deu certo na minha opinião - a solução que ele encontrou para uma possível sequência lembra os piores anos de "Heroes" - que aliás era tão genial na primeira temporada que se tornou case de como destruir uma idéia com tanto potencial - e acho que "Vidro" deixa o mesmo gosto amargo!!!
Shyamalan vinha bem, fez dois filmes ótimos, quando trouxe para tela o que mais domina - a tensão e o foco no diálogo! "Vidro" para mim, não funciona porque não tem nenhum desses pilares. A minha torcida é para que ele volte a fazer filme sem muito orçamento onde a sua criatividade realmente aparece e que, no gênero certo, faz toda a diferença! Já para "Vidro", eu sugiro: assista e depois me diga se eu fui duro demais; porque juro que eu queria mesmo era poder fazer um review mais bacana sobre o filme, mas não deu!!
Vale como entretenimento e só!
"Você", série do "Lifetime" que a Netflix distribui globalmente é boa, divertida, mas desde que você não a leve muito a sério. Digo isso depois de assistir a primeira temporada inteira e, por mais de uma vez, adiar o momento de escrever esse review. E por uma razão simples: eu estava tentando entender onde aquela história queria me levar!
O trailer indica uma linha narrativa muito interessante, com um conceito bastante particular, mas que não se encontra inicialmente na série: a história de um vendedor de livros que se apaixona por uma jovem escritora e imediatamente começa a destrinchar a vida dela pelas redes sociais sugere um suspense psicológico, mas eu não via isso em nada da série!!! Assim que assisti o primeiro episódio, e embora tenha gostado bastante, me senti "enganado" por causa dessa falta de coerência entre o trailer e a obra! Os episódios foram passando e, lentamente, fui me envolvendo com a história - traços da personalidade do protagonista vão aparecendo, se tornando mais interessante. O problema é que isso não se sustenta por muito tempo e ficamos com a sensação que aquilo tudo não faz muito sentido - algumas soluções do roteiro são, inclusive, infantis demais!!! Teve um momento que "You" me pareceu muito mais uma comédia romântica adolescente, com lapsos de suspense, do que algo que pudesse justificar os ótimos comentários que havia lido até ali.
Continuando: com o passar dos episódios eu fui entendendo (mesmo com um pé atrás) que aquela era a história, aquele era o arco do protagonista e aquele cenário "Gossip Girl" faziam parte de um quebra-cabeça que poderia me surpreender. Admito que demorou para eu entender, mas no final justificou a construção da trama principal!! A premissa é realmente boa, mas o tom escolhido para a série foi muito inconstante durante a temporada (na minha opinião) - alguém com um pouco menos de paciência e fora do público-alvo teria desistido. Até me lembrou "Gipsy" - outra série que usou da mesma estratégia e depois não se sustentou!!! No caso de "Você" essa característica da série acaba jogando a favor quando se chega nos episódios finais! As situações criadas para o protagonista stalkear a personagem Guinevere Beck são absurdas, completamente fora da realidade e muito forçadas - mas são divertidas, por isso funciona muito bem. Os offs narrativos se sobrepõem as ações com sentimentos e indagações muito inteligentes, quase como se estivéssemos lendo um livro - isso acaba cativando!!! A série vai nos surpreendendo e aquela cadeia de eventos que parecia bobo se torna interessante (mas, por favor, não esperem algo como "The Night of" da HBO)!!! Embora a série seja bem produzida e tenha sua identidade, os episódio 2 e 3 tem problemas sérios de falta de continuidade na fotografia, sem a menor unidade de cor entre alguns planos e contra-planos - imperdoável para esse nível de projeto (reparem na cena em que os personagens principais conversam na cama no ep.2). Fica a observação!
A Netflix já avisou que vai assumir a produção da segunda temporada dado o sucesso da primeira, o que colabora com a minha primeira afirmação: "You" é boa, ótima para uma maratona no final de semana, basta não levar muito a sério as situações absurdas dos personagens e a diversão está garantida!!! Penn Badgley (Joe) está no elenco e isso nos leva a ter sensação de que a série é um spin-off obscuro de "Gossip Girl" - até o cenário parece o mesmo!!!! Elizabeth Lail está ótima, sua personagem é complexa, mas palpável, verdadeira - isso ajuda a equilibrar aquele universo estereotipado que ela faz parte. Alguns personagens, algumas das amigas da Bec, por exemplo, são completamente dispensáveis.
No geral, se você assistir até o final, a série passa a ser um ótimo entretenimento e até surpreendente. "You" vale a pena, parece não ter pressa, isso é muito bacana quando existe um rumo certo. Vale a diversão!!!
"Você", série do "Lifetime" que a Netflix distribui globalmente é boa, divertida, mas desde que você não a leve muito a sério. Digo isso depois de assistir a primeira temporada inteira e, por mais de uma vez, adiar o momento de escrever esse review. E por uma razão simples: eu estava tentando entender onde aquela história queria me levar!
O trailer indica uma linha narrativa muito interessante, com um conceito bastante particular, mas que não se encontra inicialmente na série: a história de um vendedor de livros que se apaixona por uma jovem escritora e imediatamente começa a destrinchar a vida dela pelas redes sociais sugere um suspense psicológico, mas eu não via isso em nada da série!!! Assim que assisti o primeiro episódio, e embora tenha gostado bastante, me senti "enganado" por causa dessa falta de coerência entre o trailer e a obra! Os episódios foram passando e, lentamente, fui me envolvendo com a história - traços da personalidade do protagonista vão aparecendo, se tornando mais interessante. O problema é que isso não se sustenta por muito tempo e ficamos com a sensação que aquilo tudo não faz muito sentido - algumas soluções do roteiro são, inclusive, infantis demais!!! Teve um momento que "You" me pareceu muito mais uma comédia romântica adolescente, com lapsos de suspense, do que algo que pudesse justificar os ótimos comentários que havia lido até ali.
Continuando: com o passar dos episódios eu fui entendendo (mesmo com um pé atrás) que aquela era a história, aquele era o arco do protagonista e aquele cenário "Gossip Girl" faziam parte de um quebra-cabeça que poderia me surpreender. Admito que demorou para eu entender, mas no final justificou a construção da trama principal!! A premissa é realmente boa, mas o tom escolhido para a série foi muito inconstante durante a temporada (na minha opinião) - alguém com um pouco menos de paciência e fora do público-alvo teria desistido. Até me lembrou "Gipsy" - outra série que usou da mesma estratégia e depois não se sustentou!!! No caso de "Você" essa característica da série acaba jogando a favor quando se chega nos episódios finais! As situações criadas para o protagonista stalkear a personagem Guinevere Beck são absurdas, completamente fora da realidade e muito forçadas - mas são divertidas, por isso funciona muito bem. Os offs narrativos se sobrepõem as ações com sentimentos e indagações muito inteligentes, quase como se estivéssemos lendo um livro - isso acaba cativando!!! A série vai nos surpreendendo e aquela cadeia de eventos que parecia bobo se torna interessante (mas, por favor, não esperem algo como "The Night of" da HBO)!!! Embora a série seja bem produzida e tenha sua identidade, os episódio 2 e 3 tem problemas sérios de falta de continuidade na fotografia, sem a menor unidade de cor entre alguns planos e contra-planos - imperdoável para esse nível de projeto (reparem na cena em que os personagens principais conversam na cama no ep.2). Fica a observação!
A Netflix já avisou que vai assumir a produção da segunda temporada dado o sucesso da primeira, o que colabora com a minha primeira afirmação: "You" é boa, ótima para uma maratona no final de semana, basta não levar muito a sério as situações absurdas dos personagens e a diversão está garantida!!! Penn Badgley (Joe) está no elenco e isso nos leva a ter sensação de que a série é um spin-off obscuro de "Gossip Girl" - até o cenário parece o mesmo!!!! Elizabeth Lail está ótima, sua personagem é complexa, mas palpável, verdadeira - isso ajuda a equilibrar aquele universo estereotipado que ela faz parte. Alguns personagens, algumas das amigas da Bec, por exemplo, são completamente dispensáveis.
No geral, se você assistir até o final, a série passa a ser um ótimo entretenimento e até surpreendente. "You" vale a pena, parece não ter pressa, isso é muito bacana quando existe um rumo certo. Vale a diversão!!!
Existem três tipos de filmes que me cativam, as obras-primas, os ótimos e os despretensiosos - que garantem um bom entretenimento para desligar o cérebro.“Voo Noturno” se enquadra nesse terceiro tipo de filme, que me pega pela mão e me convence aceitar uma jornada cheia de absurdos e clichês. Para que isso aconteça não só comigo, um roteiro precisa estar nas mãos de um diretor competente, que faz um trabalho com tanto entusiasmo que você acaba relevando alguns exageros - ou rindo deles -, sem comprometer a sua experiência.
Na trama, Lisa Reisert (Rachel McAdams) é uma gerente de hotel que detesta voar, mas precisa realizar uma viagem quando sua avó morre. No retorno para casa, ela conhece o charmoso Jackson Rippner (Cillian Murphy) no embarque, e fica feliz quando descobre que ele vai sentar ao seu lado no avião. Tudo se transforma em um pesadelo quando, após a decolagem, Jackson diz a Lisa que precisa de sua ajuda para matar um político que se hospedará no hotel em que ela trabalha, ou então ele manda assassinarem o pai dela com uma simples ligação. Confira o trailer (em inglês):
A direção de Wes Craven é frenética e faz com que uma hora e meia de filme termine num piscar de olhos. Você fica tão conectado nesse suspense que reserva diversos desdobramentos, que você mal tem tempo para se incomodar com as situações inverossímeis. O elenco também é um prato cheio, Rachel McAdams (a eterna Regina George de "Meninas Malvads") convence como a mocinha durona. Assim como o ator Cillian Murphy (o gângster de “Peaky Blinders”). Observem a sequência final, esse teria sido um ator perfeito como o Ghostface em um dos filmes da franquia “Pânico” - as semelhanças com “Scream” (título original) também está presente na trilha sonora que foi composta por Marco Beltrami (de "Loga" e "Amor e Monstros").
O fato é que “Voo Noturno” (ou "Red Eye" no original) é um thriller semelhante ao filme “Por Um Fio” (aquele onde Colin Farrell não pode desligar a ligação ou deixar a cabine telefônica, senão um homem será morto) e te prende da mesma forma numa trama envolvente do inicio ao fim.
Se você gosta de um pouco de tensão e está disposto a encarar alguma suspensão da realidade, vale muito o seu play!
Escrito por Mark Hewes - uma parceria @indiqueipraver
Existem três tipos de filmes que me cativam, as obras-primas, os ótimos e os despretensiosos - que garantem um bom entretenimento para desligar o cérebro.“Voo Noturno” se enquadra nesse terceiro tipo de filme, que me pega pela mão e me convence aceitar uma jornada cheia de absurdos e clichês. Para que isso aconteça não só comigo, um roteiro precisa estar nas mãos de um diretor competente, que faz um trabalho com tanto entusiasmo que você acaba relevando alguns exageros - ou rindo deles -, sem comprometer a sua experiência.
Na trama, Lisa Reisert (Rachel McAdams) é uma gerente de hotel que detesta voar, mas precisa realizar uma viagem quando sua avó morre. No retorno para casa, ela conhece o charmoso Jackson Rippner (Cillian Murphy) no embarque, e fica feliz quando descobre que ele vai sentar ao seu lado no avião. Tudo se transforma em um pesadelo quando, após a decolagem, Jackson diz a Lisa que precisa de sua ajuda para matar um político que se hospedará no hotel em que ela trabalha, ou então ele manda assassinarem o pai dela com uma simples ligação. Confira o trailer (em inglês):
A direção de Wes Craven é frenética e faz com que uma hora e meia de filme termine num piscar de olhos. Você fica tão conectado nesse suspense que reserva diversos desdobramentos, que você mal tem tempo para se incomodar com as situações inverossímeis. O elenco também é um prato cheio, Rachel McAdams (a eterna Regina George de "Meninas Malvads") convence como a mocinha durona. Assim como o ator Cillian Murphy (o gângster de “Peaky Blinders”). Observem a sequência final, esse teria sido um ator perfeito como o Ghostface em um dos filmes da franquia “Pânico” - as semelhanças com “Scream” (título original) também está presente na trilha sonora que foi composta por Marco Beltrami (de "Loga" e "Amor e Monstros").
O fato é que “Voo Noturno” (ou "Red Eye" no original) é um thriller semelhante ao filme “Por Um Fio” (aquele onde Colin Farrell não pode desligar a ligação ou deixar a cabine telefônica, senão um homem será morto) e te prende da mesma forma numa trama envolvente do inicio ao fim.
Se você gosta de um pouco de tensão e está disposto a encarar alguma suspensão da realidade, vale muito o seu play!
Escrito por Mark Hewes - uma parceria @indiqueipraver
Antes de ler essa análise, acho que vale a pena uma rápida sugestão: quanto menos você souber sobre "X - A Marca da Morte", melhor!
Pensando nisso, vou tomar o máximo de cuidado para evitar qualquer tipo de spoiler que possa impactar diretamente na sua experiência, mas já te adiando que estamos falando de um filme muito bom (muito mesmo) - um slasherde respeito, com aquela atmosfera setentista na forma (que carrega um conceito visual muito particular, com movimentos de câmera extremamente alinhados à uma época onde o "susto" era até mais importante que uma boa história) e no conteúdo (que respeita uma gramática cinematográfica envolvente e nostálgica, além de contar com uma trama muito bem construída, inteligente e com a clara proposta de se perpetuar)!
Em 1979, Maxine (Mia Goth), uma jovem cheia de sonhos, Wayne (Martin Henderson), seu namorado, e mais um grupo de amigos vão passar um final de semana em uma fazenda em algum lugar do Texas - a ideia é aproveitar o cenário para gravar um filme pornográfico chamado "The Farmer's Daughters". Ao chegar na propriedade, o grupo é recebido pelo casal Howard e Pearl que nem imagina o real motivo da estadia, porém situações estranhas começam acontecer e passam a impactar diretamente na vida de cada uma dessas pessoas. Confira o trailer:
Embora possa ser classificado com um terror "clássico", existe um certo suspense psicológico que envolve a história e que só fortalece a narrativa desde o primeiro plano do filme - é muito interessante como as relações entre os personagens vão sendo construídas e como elas são muito bem estabelecidas no presente, mesmo carregando algumas marcas do passado. Conforme o filme vai se desenrolando, a atmosfera vai ganhando aquele ar denso de mistério e ao adentramos no cenário onde 100% da trama se desenrola (a fazenda de Howard e Pearl) temos a certeza de que não estamos diante um filme onde a violência será gratuita ou que ela será inserida com o simples objetivo de chocar. Eu diria que existe uma certa honestidade narrativa em "X - A Marca da Morte", pois até o momento do clímax, onde o conflito inevitável acontece, tudo é pacientemente desenvolvido.
Obviamente que essa escolha conceitual vai agradar muitas pessoas, mas também irritar muitas outras pela "demora" dos acontecimentos, então esteja preparado para ir se conectando com o mistério sem a pressão de ver a ação explodir logo cedo - faz parte do jogo. Os personagens são cheios de camadas - Maxine, obviamente justifica essa percepção de complexidade íntima, mas Wayne, Bobby-Lynne (Brittany Snow), Lorraine (Jenna Ortega) e Jackson (Kid Cudi) não ficam muito distantes. A montagem também é um show - a forma com que David Kashevaroff e o diretor Ti West (de "Them") conectam situações que estão em foco com elementos narrativos que estariam no segundo plano gratuitamente, é simplesmente genial. E aqui cabe outro comentário: nada é gratuito no filme, então preste bem atenção!
O fato é que "X - A Marca da Morte" pode ser considerada uma das melhores surpresas de 2022, com sua releitura clássica de um gênero por muito tempo esquecido (ou menosprezado) e que agora com um toque de modernidade e sem esquecer a força do cinema independente, voltou a brilhar! Ti West, aliás, mais uma vez surpreende e deixa claro sua capacidade de mexer com nossas sensações e emoções sem perder a mão - como muitas vezes vimos diretores mais experientes no gênero, como James Wan, perder. Olho nele!
Vale muito o seu play!
Antes de ler essa análise, acho que vale a pena uma rápida sugestão: quanto menos você souber sobre "X - A Marca da Morte", melhor!
Pensando nisso, vou tomar o máximo de cuidado para evitar qualquer tipo de spoiler que possa impactar diretamente na sua experiência, mas já te adiando que estamos falando de um filme muito bom (muito mesmo) - um slasherde respeito, com aquela atmosfera setentista na forma (que carrega um conceito visual muito particular, com movimentos de câmera extremamente alinhados à uma época onde o "susto" era até mais importante que uma boa história) e no conteúdo (que respeita uma gramática cinematográfica envolvente e nostálgica, além de contar com uma trama muito bem construída, inteligente e com a clara proposta de se perpetuar)!
Em 1979, Maxine (Mia Goth), uma jovem cheia de sonhos, Wayne (Martin Henderson), seu namorado, e mais um grupo de amigos vão passar um final de semana em uma fazenda em algum lugar do Texas - a ideia é aproveitar o cenário para gravar um filme pornográfico chamado "The Farmer's Daughters". Ao chegar na propriedade, o grupo é recebido pelo casal Howard e Pearl que nem imagina o real motivo da estadia, porém situações estranhas começam acontecer e passam a impactar diretamente na vida de cada uma dessas pessoas. Confira o trailer:
Embora possa ser classificado com um terror "clássico", existe um certo suspense psicológico que envolve a história e que só fortalece a narrativa desde o primeiro plano do filme - é muito interessante como as relações entre os personagens vão sendo construídas e como elas são muito bem estabelecidas no presente, mesmo carregando algumas marcas do passado. Conforme o filme vai se desenrolando, a atmosfera vai ganhando aquele ar denso de mistério e ao adentramos no cenário onde 100% da trama se desenrola (a fazenda de Howard e Pearl) temos a certeza de que não estamos diante um filme onde a violência será gratuita ou que ela será inserida com o simples objetivo de chocar. Eu diria que existe uma certa honestidade narrativa em "X - A Marca da Morte", pois até o momento do clímax, onde o conflito inevitável acontece, tudo é pacientemente desenvolvido.
Obviamente que essa escolha conceitual vai agradar muitas pessoas, mas também irritar muitas outras pela "demora" dos acontecimentos, então esteja preparado para ir se conectando com o mistério sem a pressão de ver a ação explodir logo cedo - faz parte do jogo. Os personagens são cheios de camadas - Maxine, obviamente justifica essa percepção de complexidade íntima, mas Wayne, Bobby-Lynne (Brittany Snow), Lorraine (Jenna Ortega) e Jackson (Kid Cudi) não ficam muito distantes. A montagem também é um show - a forma com que David Kashevaroff e o diretor Ti West (de "Them") conectam situações que estão em foco com elementos narrativos que estariam no segundo plano gratuitamente, é simplesmente genial. E aqui cabe outro comentário: nada é gratuito no filme, então preste bem atenção!
O fato é que "X - A Marca da Morte" pode ser considerada uma das melhores surpresas de 2022, com sua releitura clássica de um gênero por muito tempo esquecido (ou menosprezado) e que agora com um toque de modernidade e sem esquecer a força do cinema independente, voltou a brilhar! Ti West, aliás, mais uma vez surpreende e deixa claro sua capacidade de mexer com nossas sensações e emoções sem perder a mão - como muitas vezes vimos diretores mais experientes no gênero, como James Wan, perder. Olho nele!
Vale muito o seu play!
"Yellowjackets" é, sem dúvida, um ótimo entretenimento - talvez uma mistura equilibrada (e obviamente dadas as devidas proporções) de "Big Little Lies" e "Lost", com um leve toque de "Midsommar". Criada por Ashley Lyle e Bart Nickerson (ambos de "Narcos") e indicada para mais de 10 Emmys, essa série de suspense psicológico e drama trabalha muito bem os elementos de mistério, de sobrevivência e de horror. A narrativa é contada em duas linhas do tempo principais: uma que se passa em 1996, logo após um acidente aéreo, enquanto as meninas tentam sobreviver em condições extremas; e outra no presente, onde as sobreviventes, agora adultas, lutam para seguir em frente com suas vidas, enquanto o passado retorna para assombrá-las. E olha, é a partir dessa uma atmosfera tensa e sinistra que a série, de fato, oferece uma experiência tão perturbadora quanto cativante.
Um time de futebol feminino escolar sofre um acidente de avião enquanto viajava para jogar um campeonato. Presas em um local selvagem, as garotas, aos poucos, percebem que as chances de um resgate se torna cada vez mais remotas - é quando a dinâmica do grupo começa a se deteriorar. Já na fase adulta, décadas após serem encontradas, quatro dessas sobreviventes passam a ser sentir chantageadas quando alguém misterioso começa a enviar mensagens para elas ameaçando contar tudo o que aconteceu durante os 19 meses em que estiveram isoladas. Confira o trailer:
Talvez o mais interessante e original de "Yellowjackets" seja justamente o que mais faltou durante aqueles inesquecíveis anos de "Lost" - em uma época pré-streaming, é preciso ressaltar. A estrutura narrativa não linear apresentada por Lyle e Nickerson é um pouco diferente da proposta de J.J. Abrams, pois aqui a série explora tanto os mistérios do que aconteceu na floresta após o acidente quanto o impacto psicológico dessas experiências traumáticas nas vidas adultas das personagens - sempre em paralelo. O roteiro consegue construir uma história que combina o mistério central, "o que realmente aconteceu na floresta e quem sobreviveu?", com o desenvolvimento de alguns personagens profundamente ricos e complexos já na sua essência. Veja, as múltiplas camadas da série permitem que a audiência se envolva não apenas com o plot de sobrevivência, mas também com os dramas pessoais e emocionais das personagens de uma forma bastante palpável. Agora é preciso que se diga: embora a série lide com temas como trauma, culpa, vingança e até pontue sobre os limites da moralidade, "Yellowjackets" é mesmo entretenimento!
O time de diretores se apoia na tensão constante das consequências de ações passadas, mas também é eficaz em capturar o drama crescente e o isolamento íntimo das protagonistas. As cenas que se passam na floresta, por exemplo, são filmadas de maneira claustrofóbica, com um tom sombrio que reflete a deterioração física e mental das sobreviventes. Já contrastando com o presente, onde as sobreviventes tentam reconstruir suas vidas em meio aos segredos e algumas mentiras, os enquadramentos são mais limpos, mas chamam atenção por carregar a mesma sensação de perigo iminente - é muito bacana como esse conceito destaca o peso emocional de uma história que parece nunca ter fim! Repare no trabalho de Melanie Lynskey, a versão adulta de Shauna - ela é particularmente notável, trazendo uma complexidade que equilibra a frieza exterior com a turbulência interna de sua personagem. Já Juliette Lewis, como Natalie, também oferece uma performance intensa, capturando o comportamento autodestrutivo de uma mulher que não consegue escapar dos fantasmas do passado. Christina Ricci, como Misty, oferece uma mistura de excentricidade e psicopatia que é assustadora.
"Yellowjackets"explora dinâmicas de grupo nada simples, onde as tensões entre amizade em diferentes situações e tempos, deixam suas marcas - à medida que essas situações se tornam mais desesperadoras, as personagens são forçadas a tomar decisões cada vez mais extremas, levando questões sobre moralidade e lealdade ao limite. Pouco a pouco a audiência entende que a sobrevivência na floresta foi apenas o começo de uma luta onde as consequências psicológicas, de certa forma, são ainda mais devastadoras - essa sensação de nostalgia e desconforto faz toda diferença na nossa experiência. É como se pegássemos o recorte da cena de "Lost" em que "Jack encontra Kate e diz que eles precisam voltar para a ilha" e fizéssemos uma série mais "jovem e, por incrível que pareça, mais pé no chão"!
Vale muito o seu play!
"Yellowjackets" é, sem dúvida, um ótimo entretenimento - talvez uma mistura equilibrada (e obviamente dadas as devidas proporções) de "Big Little Lies" e "Lost", com um leve toque de "Midsommar". Criada por Ashley Lyle e Bart Nickerson (ambos de "Narcos") e indicada para mais de 10 Emmys, essa série de suspense psicológico e drama trabalha muito bem os elementos de mistério, de sobrevivência e de horror. A narrativa é contada em duas linhas do tempo principais: uma que se passa em 1996, logo após um acidente aéreo, enquanto as meninas tentam sobreviver em condições extremas; e outra no presente, onde as sobreviventes, agora adultas, lutam para seguir em frente com suas vidas, enquanto o passado retorna para assombrá-las. E olha, é a partir dessa uma atmosfera tensa e sinistra que a série, de fato, oferece uma experiência tão perturbadora quanto cativante.
Um time de futebol feminino escolar sofre um acidente de avião enquanto viajava para jogar um campeonato. Presas em um local selvagem, as garotas, aos poucos, percebem que as chances de um resgate se torna cada vez mais remotas - é quando a dinâmica do grupo começa a se deteriorar. Já na fase adulta, décadas após serem encontradas, quatro dessas sobreviventes passam a ser sentir chantageadas quando alguém misterioso começa a enviar mensagens para elas ameaçando contar tudo o que aconteceu durante os 19 meses em que estiveram isoladas. Confira o trailer:
Talvez o mais interessante e original de "Yellowjackets" seja justamente o que mais faltou durante aqueles inesquecíveis anos de "Lost" - em uma época pré-streaming, é preciso ressaltar. A estrutura narrativa não linear apresentada por Lyle e Nickerson é um pouco diferente da proposta de J.J. Abrams, pois aqui a série explora tanto os mistérios do que aconteceu na floresta após o acidente quanto o impacto psicológico dessas experiências traumáticas nas vidas adultas das personagens - sempre em paralelo. O roteiro consegue construir uma história que combina o mistério central, "o que realmente aconteceu na floresta e quem sobreviveu?", com o desenvolvimento de alguns personagens profundamente ricos e complexos já na sua essência. Veja, as múltiplas camadas da série permitem que a audiência se envolva não apenas com o plot de sobrevivência, mas também com os dramas pessoais e emocionais das personagens de uma forma bastante palpável. Agora é preciso que se diga: embora a série lide com temas como trauma, culpa, vingança e até pontue sobre os limites da moralidade, "Yellowjackets" é mesmo entretenimento!
O time de diretores se apoia na tensão constante das consequências de ações passadas, mas também é eficaz em capturar o drama crescente e o isolamento íntimo das protagonistas. As cenas que se passam na floresta, por exemplo, são filmadas de maneira claustrofóbica, com um tom sombrio que reflete a deterioração física e mental das sobreviventes. Já contrastando com o presente, onde as sobreviventes tentam reconstruir suas vidas em meio aos segredos e algumas mentiras, os enquadramentos são mais limpos, mas chamam atenção por carregar a mesma sensação de perigo iminente - é muito bacana como esse conceito destaca o peso emocional de uma história que parece nunca ter fim! Repare no trabalho de Melanie Lynskey, a versão adulta de Shauna - ela é particularmente notável, trazendo uma complexidade que equilibra a frieza exterior com a turbulência interna de sua personagem. Já Juliette Lewis, como Natalie, também oferece uma performance intensa, capturando o comportamento autodestrutivo de uma mulher que não consegue escapar dos fantasmas do passado. Christina Ricci, como Misty, oferece uma mistura de excentricidade e psicopatia que é assustadora.
"Yellowjackets"explora dinâmicas de grupo nada simples, onde as tensões entre amizade em diferentes situações e tempos, deixam suas marcas - à medida que essas situações se tornam mais desesperadoras, as personagens são forçadas a tomar decisões cada vez mais extremas, levando questões sobre moralidade e lealdade ao limite. Pouco a pouco a audiência entende que a sobrevivência na floresta foi apenas o começo de uma luta onde as consequências psicológicas, de certa forma, são ainda mais devastadoras - essa sensação de nostalgia e desconforto faz toda diferença na nossa experiência. É como se pegássemos o recorte da cena de "Lost" em que "Jack encontra Kate e diz que eles precisam voltar para a ilha" e fizéssemos uma série mais "jovem e, por incrível que pareça, mais pé no chão"!
Vale muito o seu play!