"Oxigênio" segue o conceito narrativo de "Náufrago", filme lançado em 2000 com Tom Hanks. Mas calma, os ajustes entre gênero e modernidade, na minha opinião, funcionam muito melhor nessa ficção científica francesa da Netflix do diretor Alexandre Aja do que no filme do Robert Zemeckis . Veja, em pouco mais de 90 minutos acompanhamos uma única atriz, em um único cenário, atuando com uma voz sintetizada, ou seja, troque o ótimo trabalho de Tom Hanks pela igualmente competente Mélanie Laurent, uma ilha deserta por uma claustrofóbica câmara criogênica e o Wilson pela inteligência artificial, MILO (com um ótimo trabalho de voz de Mathieu Amalric) - e não acabou, adicione uma ambientação marcante cheia de mistério e incertezas, e a angústia da corrida contra o tempo na busca pela sobrevivência!
"Oxygène" (no original) conta a história de Elisabeth Hansen (Laurent), que acorda envolta de uma espécie de casulo em uma câmara criogênica. Ela retoma a consciência com dificuldade para lembrar o seu passado, sem entender como funciona a cápsula que se encontra trancada e ainda precisa correr contra o tempo para viver, afinal um monitor apresenta um limite de 35% de oxigênio disponível. A sensação de claustrofobia e o desespero a deixam confusa, sem saber o que é realidade e o que é uma memória falsa. No limite da sua sanidade, ela tenta entender o que está acontecendo, mas, principalmente, encontrar uma saída com vida. Confira o trailer:
Obviamente que dois elementos saltam aos olhos de cara: a capacidade de Mélanie Laurent carregar o filme praticamente sozinha sem contracenar com ninguém (nem com uma bola) e o roteiro inteligente e dinâmico da estreante Christie LeBlanc. É impressionante como não sentimos o tempo passar e como todos os melhores recursos de suspense e mistério funcionam em torno da história, conforme Elisabeth vai descobrindo cada novo dispositivo na câmara e como as pistas sobre como ela foi parar ali vão sendo apresentadas - aqui cabem duas ótimas referências: "Calls" e "A Chegada".
O trabalho do diretor Alexandre Aja merece elogios, afinal, mesmo preso em suas próprias limitações cênicas, ele consegue desenvolver uma movimentação de câmera bastante criativa, flutuando pelo espaço reduzido e criando momentos de alívios narrativos - que acaba trazendo uma sensação de "respiro", mas que imediatamente é diluída com a tensão limitadora da falta de oxigênio - aí ele usa e abusa das lentes mais fechadas, focando no rosto da protagonista para demonstrar suas reações perante essa situação. Reparem como a câmera, de fato, está ali para contar a história apoiada apenas em sensações que o diretor quer nos provocar! A fotografia, a base de leds e cirurgicamente azulada, do diretor Maxime Alexandre lembra muito o genial trabalho do Dion Beebe e do Paul Cameron em "Colateral".
“Oxigênio” transita entre o surpreendente e o óbvio, mas é inegável como tantos "pontos de virada" entregam um excelente ritmo ao filme. Veja, ele pode até começar com pegada claramente minimalista, mas não necessariamente terminará assim - na forma e no conteúdo. Minha única crítica diz respeito a última cena: completamente dispensável, mas aqui é uma opinião muito pessoal - sem impacto algum na ótima experiência que é assistir “Oxigênio”.
Embora seja uma ficção científica de qualidade, seus elementos de suspense psicológico só colaboram para que o roteiro e a performance da protagonista brilhem! Vale muito seu play por todos esses motivos e se você gostar do gênero!
"Oxigênio" segue o conceito narrativo de "Náufrago", filme lançado em 2000 com Tom Hanks. Mas calma, os ajustes entre gênero e modernidade, na minha opinião, funcionam muito melhor nessa ficção científica francesa da Netflix do diretor Alexandre Aja do que no filme do Robert Zemeckis . Veja, em pouco mais de 90 minutos acompanhamos uma única atriz, em um único cenário, atuando com uma voz sintetizada, ou seja, troque o ótimo trabalho de Tom Hanks pela igualmente competente Mélanie Laurent, uma ilha deserta por uma claustrofóbica câmara criogênica e o Wilson pela inteligência artificial, MILO (com um ótimo trabalho de voz de Mathieu Amalric) - e não acabou, adicione uma ambientação marcante cheia de mistério e incertezas, e a angústia da corrida contra o tempo na busca pela sobrevivência!
"Oxygène" (no original) conta a história de Elisabeth Hansen (Laurent), que acorda envolta de uma espécie de casulo em uma câmara criogênica. Ela retoma a consciência com dificuldade para lembrar o seu passado, sem entender como funciona a cápsula que se encontra trancada e ainda precisa correr contra o tempo para viver, afinal um monitor apresenta um limite de 35% de oxigênio disponível. A sensação de claustrofobia e o desespero a deixam confusa, sem saber o que é realidade e o que é uma memória falsa. No limite da sua sanidade, ela tenta entender o que está acontecendo, mas, principalmente, encontrar uma saída com vida. Confira o trailer:
Obviamente que dois elementos saltam aos olhos de cara: a capacidade de Mélanie Laurent carregar o filme praticamente sozinha sem contracenar com ninguém (nem com uma bola) e o roteiro inteligente e dinâmico da estreante Christie LeBlanc. É impressionante como não sentimos o tempo passar e como todos os melhores recursos de suspense e mistério funcionam em torno da história, conforme Elisabeth vai descobrindo cada novo dispositivo na câmara e como as pistas sobre como ela foi parar ali vão sendo apresentadas - aqui cabem duas ótimas referências: "Calls" e "A Chegada".
O trabalho do diretor Alexandre Aja merece elogios, afinal, mesmo preso em suas próprias limitações cênicas, ele consegue desenvolver uma movimentação de câmera bastante criativa, flutuando pelo espaço reduzido e criando momentos de alívios narrativos - que acaba trazendo uma sensação de "respiro", mas que imediatamente é diluída com a tensão limitadora da falta de oxigênio - aí ele usa e abusa das lentes mais fechadas, focando no rosto da protagonista para demonstrar suas reações perante essa situação. Reparem como a câmera, de fato, está ali para contar a história apoiada apenas em sensações que o diretor quer nos provocar! A fotografia, a base de leds e cirurgicamente azulada, do diretor Maxime Alexandre lembra muito o genial trabalho do Dion Beebe e do Paul Cameron em "Colateral".
“Oxigênio” transita entre o surpreendente e o óbvio, mas é inegável como tantos "pontos de virada" entregam um excelente ritmo ao filme. Veja, ele pode até começar com pegada claramente minimalista, mas não necessariamente terminará assim - na forma e no conteúdo. Minha única crítica diz respeito a última cena: completamente dispensável, mas aqui é uma opinião muito pessoal - sem impacto algum na ótima experiência que é assistir “Oxigênio”.
Embora seja uma ficção científica de qualidade, seus elementos de suspense psicológico só colaboram para que o roteiro e a performance da protagonista brilhem! Vale muito seu play por todos esses motivos e se você gostar do gênero!
Não é por acaso que "Parasita" é considerado um dos melhores filmes de 2019! Embora seja uma produção sul-coreana, que para muitos pode causar um certo estranhamento devido ao idioma, o filme de Bong Joon Ho (Okja) tem elementos narrativos (e até conceituais) que nos lembram "Era uma vez em Hollywood" do Tarantino e "Nós" de Jordan Peele. É preciso deixar claro que "Parasita" é um filme de metáforas e faz do seu roteiro uma das coisas mais bacanas que assisti recentemente. Então vamos partir do principio: parasita é um organismo que vive às custas de outro organismo, obtendo dele alimento e causando danos - agora aplique isso em uma crítica muito bem embasada sobre a sociedade moderna e a diferenciação de classes. Importante: a genialidade do filme está em tocar em assuntos extremamente delicados sem precisar impor qualquer tipo de discussão filosófica ou política (por mais que ele saiba perfeitamente onde quer chegar)!
"Parasita" conta a história de como duas famílias completamente distintas socialmente que acabam se relacionando: Os "Kim", representam uma família mais pobre, que sobrevive dobrando caixas de papelão. Eles vivem em uma espécie de sótão, bem na periferia, e que mal conseguem dinheiro para comer. Os "Park", já representam um família mais rica, com um homem bem sucedido no comando e uma mulher que cuida da casa cercada de empregados e cheia de neuroses sobre a educação dos filhos. Eles vivem em uma casa maravilhosa, com muito conforto e espaço! O mundo dessas duas famílias se encontram quando, depois de uma indicação, o jovem Ki-woo (Woo-sik Choi), da família "Kin", se torna tutor de inglês da filha mais velha dos "Park", Da-hye (Ji-so Jung). Ki-woo, ao perceber que se trata de uma família bastante ingênua e completamente fora da realidade, vê a oportunidade de colocar os outros membros da família para também trabalhar com os "Park" - mesmo que para isso seja necessário trapacear e tirar quem já trabalhava lá. O interessante é que essa dinâmica dos "Kin" não carrega o peso da desonestidade e isso é discutido durante o filme sem a obrigação de se fazer julgamentos, afinal, eles "só" queriam ganhar mais dinheiro e viver com mais dignidade, embora, como parasitas, para se obter o alimento, certamente, algum dano precisaria ser causado!
Um dos elementos que mais me impressionou enquanto assistia "Parasita" foi a facilidade de como o roteiro (do próprio Bong Joon Ho e do novato Jin Won Han) traduzia cada um dos extremos sociais dessa história sem efetivamente transformar nenhum dos lados em um vilão, mesmo que apontando seus defeitos e fraquezas. O roteiro deixa muito fácil de se entender que não se tratam de pessoas más, mas de pessoas aprisionadas em mundos completamente opostos e que por isso pagam o preço das oportunidades.
Reparem como o diretor enquadra a janela principal da casa dos "Kin" - é como se eles estivem dentro de um bueiro e depois insiste em mostrar a importância (e a imponência) das escadas na casa dos "Park". Ou quando Ki-woo diz que não estava enganando ninguém ao falsificar um diploma para conseguir o emprego, apenas imprimiu ele antes de fazer a faculdade! E quando Park comenta com a esposa sobre o cheiro dos empregados e que isso lembrava muito o cheiro do metro. Ela logo responde que fazia anos que não andava de metro e mesmo assim Park retruca dizendo que as pessoas no metro tinham um cheiro bem peculiar! - é muito interessante não enxergar a maldade que os diálogos sugerem, graças a uma apresentação de personagens incrível! Outro detalhe bem interessante é a forma como os atores se movimentam em cena: os "Kin" são como baratas, esperam o momento certo para ir de um lado para o outro, enquanto os "Park" não olham para baixo em momento algum, sendo assim não percebem nem os "insetos" que os rodeiam! O filme é cheio dessas metáforas. São só exemplos e acreditem: existe muito mais profundidade nos diálogos que podemos imaginar!
A fotografia é algo interessante também, além dos já citados enquadramentos e movimentos de câmera, Kyung-pyo Hong faz um trabalho incrível ao lado do departamento de arte: a casa dos "Kim", por exemplo, é apertada, com muita coisa amontoada, sem padrão de cor para criar a sensação de caos, mas com uma certa escuridão - chega a ser angustiante, sujo. Já na casa dos "Park" vemos um estilo totalmente "clean" com tudo hermeticamente organizado ao mesmo tempo que o tom mais "pastel" e a iluminação amarelada traduz um certo aconchego. Já caminhando para o final, tem uma sequência linda, onde chove muito e sentimos exatamente o que representa as dores de tanta diferença social - o diálogo de Park Yeon-kyo no dia seguinte, só fortalece a maneira como essas realidades lidam com cada detalhe da história - é muito bom!!! Vale ressaltar que o Desenho de Produção de "Parasita" foi indicado ao Oscar 2020 e não vou me surpreender se levar! Reparem em cada detalhe, porque é muito fácil perceber a mensagem que Bong Joon Ho quer passar. O elenco está incrível: todos, sem exceção! Me surpreende nenhum dos atores ter sido indicado ao Oscar, mas a recente vitória no SAG Awards, o prêmio do Sindicato de Atores de Hollywood, corrige esse conservadorismo da Academia - e vale ressaltar que o elenco do filme coreano foi aplaudido de pé durante a premiação!
Com um orçamento de US$ 11 milhões, "Parasita" arrecadou mais que dez vezes esse valor pelo mundo inteiro, chegando a US$ 140 milhões. Ganhou mais de 150 prêmios em Festivais Internacionais (inclusive Cannes) e foi indicado para outros 150. Teve papel importante em premiações de peso como Globo de Ouro e SAG Awards. É o grande favorito (eu diria que barbada) para levar o Oscar de Filme Estrangeiro e deve beliscar pelo menos mais uma ou duas categorias das seis em que foi indicado. "Parasita" é um fenômeno do mesmo nível (ou maior) que "A vida é bela" - acredito, inclusive, que se o filme fosse americano, seria o vencedor do ano! É fato que a Academia reconhece a obra, claro, mas não sei se teria coragem de coloca-la na frente de nomes como Tarantino ou Scorsese e de filmes como 1917 ou Coringa - por merecimento, seria o campeão da noite; por intuição o páreo ainda está aberto! Não deixe de assistir!
Up-date: "Parasita" ganhou em quatro categorias no Oscar 2020: Melhor Filme, Melhor Filme Internacional, Melhor Diretor e Melhor Roteiro Original!
Não é por acaso que "Parasita" é considerado um dos melhores filmes de 2019! Embora seja uma produção sul-coreana, que para muitos pode causar um certo estranhamento devido ao idioma, o filme de Bong Joon Ho (Okja) tem elementos narrativos (e até conceituais) que nos lembram "Era uma vez em Hollywood" do Tarantino e "Nós" de Jordan Peele. É preciso deixar claro que "Parasita" é um filme de metáforas e faz do seu roteiro uma das coisas mais bacanas que assisti recentemente. Então vamos partir do principio: parasita é um organismo que vive às custas de outro organismo, obtendo dele alimento e causando danos - agora aplique isso em uma crítica muito bem embasada sobre a sociedade moderna e a diferenciação de classes. Importante: a genialidade do filme está em tocar em assuntos extremamente delicados sem precisar impor qualquer tipo de discussão filosófica ou política (por mais que ele saiba perfeitamente onde quer chegar)!
"Parasita" conta a história de como duas famílias completamente distintas socialmente que acabam se relacionando: Os "Kim", representam uma família mais pobre, que sobrevive dobrando caixas de papelão. Eles vivem em uma espécie de sótão, bem na periferia, e que mal conseguem dinheiro para comer. Os "Park", já representam um família mais rica, com um homem bem sucedido no comando e uma mulher que cuida da casa cercada de empregados e cheia de neuroses sobre a educação dos filhos. Eles vivem em uma casa maravilhosa, com muito conforto e espaço! O mundo dessas duas famílias se encontram quando, depois de uma indicação, o jovem Ki-woo (Woo-sik Choi), da família "Kin", se torna tutor de inglês da filha mais velha dos "Park", Da-hye (Ji-so Jung). Ki-woo, ao perceber que se trata de uma família bastante ingênua e completamente fora da realidade, vê a oportunidade de colocar os outros membros da família para também trabalhar com os "Park" - mesmo que para isso seja necessário trapacear e tirar quem já trabalhava lá. O interessante é que essa dinâmica dos "Kin" não carrega o peso da desonestidade e isso é discutido durante o filme sem a obrigação de se fazer julgamentos, afinal, eles "só" queriam ganhar mais dinheiro e viver com mais dignidade, embora, como parasitas, para se obter o alimento, certamente, algum dano precisaria ser causado!
Um dos elementos que mais me impressionou enquanto assistia "Parasita" foi a facilidade de como o roteiro (do próprio Bong Joon Ho e do novato Jin Won Han) traduzia cada um dos extremos sociais dessa história sem efetivamente transformar nenhum dos lados em um vilão, mesmo que apontando seus defeitos e fraquezas. O roteiro deixa muito fácil de se entender que não se tratam de pessoas más, mas de pessoas aprisionadas em mundos completamente opostos e que por isso pagam o preço das oportunidades.
Reparem como o diretor enquadra a janela principal da casa dos "Kin" - é como se eles estivem dentro de um bueiro e depois insiste em mostrar a importância (e a imponência) das escadas na casa dos "Park". Ou quando Ki-woo diz que não estava enganando ninguém ao falsificar um diploma para conseguir o emprego, apenas imprimiu ele antes de fazer a faculdade! E quando Park comenta com a esposa sobre o cheiro dos empregados e que isso lembrava muito o cheiro do metro. Ela logo responde que fazia anos que não andava de metro e mesmo assim Park retruca dizendo que as pessoas no metro tinham um cheiro bem peculiar! - é muito interessante não enxergar a maldade que os diálogos sugerem, graças a uma apresentação de personagens incrível! Outro detalhe bem interessante é a forma como os atores se movimentam em cena: os "Kin" são como baratas, esperam o momento certo para ir de um lado para o outro, enquanto os "Park" não olham para baixo em momento algum, sendo assim não percebem nem os "insetos" que os rodeiam! O filme é cheio dessas metáforas. São só exemplos e acreditem: existe muito mais profundidade nos diálogos que podemos imaginar!
A fotografia é algo interessante também, além dos já citados enquadramentos e movimentos de câmera, Kyung-pyo Hong faz um trabalho incrível ao lado do departamento de arte: a casa dos "Kim", por exemplo, é apertada, com muita coisa amontoada, sem padrão de cor para criar a sensação de caos, mas com uma certa escuridão - chega a ser angustiante, sujo. Já na casa dos "Park" vemos um estilo totalmente "clean" com tudo hermeticamente organizado ao mesmo tempo que o tom mais "pastel" e a iluminação amarelada traduz um certo aconchego. Já caminhando para o final, tem uma sequência linda, onde chove muito e sentimos exatamente o que representa as dores de tanta diferença social - o diálogo de Park Yeon-kyo no dia seguinte, só fortalece a maneira como essas realidades lidam com cada detalhe da história - é muito bom!!! Vale ressaltar que o Desenho de Produção de "Parasita" foi indicado ao Oscar 2020 e não vou me surpreender se levar! Reparem em cada detalhe, porque é muito fácil perceber a mensagem que Bong Joon Ho quer passar. O elenco está incrível: todos, sem exceção! Me surpreende nenhum dos atores ter sido indicado ao Oscar, mas a recente vitória no SAG Awards, o prêmio do Sindicato de Atores de Hollywood, corrige esse conservadorismo da Academia - e vale ressaltar que o elenco do filme coreano foi aplaudido de pé durante a premiação!
Com um orçamento de US$ 11 milhões, "Parasita" arrecadou mais que dez vezes esse valor pelo mundo inteiro, chegando a US$ 140 milhões. Ganhou mais de 150 prêmios em Festivais Internacionais (inclusive Cannes) e foi indicado para outros 150. Teve papel importante em premiações de peso como Globo de Ouro e SAG Awards. É o grande favorito (eu diria que barbada) para levar o Oscar de Filme Estrangeiro e deve beliscar pelo menos mais uma ou duas categorias das seis em que foi indicado. "Parasita" é um fenômeno do mesmo nível (ou maior) que "A vida é bela" - acredito, inclusive, que se o filme fosse americano, seria o vencedor do ano! É fato que a Academia reconhece a obra, claro, mas não sei se teria coragem de coloca-la na frente de nomes como Tarantino ou Scorsese e de filmes como 1917 ou Coringa - por merecimento, seria o campeão da noite; por intuição o páreo ainda está aberto! Não deixe de assistir!
Up-date: "Parasita" ganhou em quatro categorias no Oscar 2020: Melhor Filme, Melhor Filme Internacional, Melhor Diretor e Melhor Roteiro Original!
"Pássaro do Oriente" é mais um filme que trás muito da linguagem cinematográfica dos anos 80/90, porém me pareceu muito melhor construído que a recente "A Grande Mentira". Sua linha narrativa claramente se referencia em filmes de sucesso como "Atração Fatal" ou "Instinto Selvagem" ao mesmo tempo em que trás elementos psicológicos de "Cisne Negro" e de sua enorme complexidade no desenvolvimento de personagens, no caso a protagonista Lucy Fly (Alicia Vikander, vencedora do Oscar por "A Garota Dinamarquesa"). Fly é uma jovem sueca que resolve se mudar para o Japão a fim de esquecer um passado marcado por algumas coincidências. Embora ainda carregue esse peso, ela se esforça para levar uma vida normal até se apaixonar por Teiji (Naoki Kobayashi). Reservado e misterioso, Teiji possui uma espécie de fetiche: tirar fotos de mulheres em diferentes ângulos e situações - mesmo estando mortas. Quando Lily Bridges (Riley Keough), uma jovem americana recém chegada ao Japão desaparece, Lucy Fly passa a ser a principal suspeita; já que ela e Bridges criaram uma relação extremamente ambígua tendo Teiji como catalizador desses sentimentos. De fato o filme cria uma dinâmica interessante, pois ao mesmo tempo em que parece economizar na ação, o roteiro aproveita para mergulhar em diálogos inteligentes, trazendo uma certa complexidade - e aquela subjetividade que nos faz querer discutir sobre o filme quando ele termina! Olha, não é um filme inesquecível, muito menos fácil de entender, mas para quem gosta do gênero, posso dizer que é uma ótima opção de entretenimento e um bom exercício de interpretação! Vale o play!
"Pássaro do Oriente" é uma adaptação do romance homônimo da escritora britânica Susanna Jones e se passa em 1989, em Tóquio - e essa informação é vital para a experiência ao assistir o filme, pois o diretor Wash Westmoreland ("Para sempre Alice") faz questão de nos colocar em situações onde o choque de culturas interfere ativamente na dinâmica emocional dos personagens, tanto que o filme é falado em inglês e em japonês (muitas vezes na mesma cena, inclusive). Essa atmosfera desconfortável que é estar em um país tão diferente, com pessoas desconhecidas e com costumes tão particulares, criam uma espécie de solidão e de vazio, tanto em Lucy Fly como em Lily Bridges e isso ajuda a justificar a enorme necessidade de se apegar a alguém que possa lhes dar algum tipo de segurança; eu diria que é quase uma necessidade de pertencimento, um prato cheio para criação dos conflitos!
Confira o trailer:
A fotografia do coreano Chung-hoon Chung (de "It") cai como uma luva nesse conceito narrativo de Westmoreland. Chung trás um Japão belíssimo nos planos abertos, ao mesmo tempo em que é opressor nos planos fechados. A sensação de angustia é mérito dessa linguagem alternada e de uma interpretação cirúrgica de Vikander (como é boa essa atriz!) - a cena final é uma aula de roteiro e de interpretação, vale o filme! Pessoalmente eu não gostei do trabalho do Naoki Kobayashi, achei estereotipado demais, mas entendo a escolha do tom para comunicar essa cisão de culturas. Riley Keough está ótima como Lily, trás uma sensualidade "inocente" muito interessante para personagem que nos proporciona ótimas cenas - destaco a cena na boate em que ela dança com Teiji sob o olhar ameaçador de Fly!
Um outro detalhe interessante e que merece ser citado é a qualidade técnica na direção de Wash Westmoreland - ela é tão boa que até alguns clichês que o roteiro propõe passam quase despercebidos - me lembrou muito o trabalho de Darren Aronofsky (Cisne Negro). "Pássaro do Oriente" é um filme cheio de "entre linhas" que vale a pena experimentar. Embora soe previsível, em nenhum momento somos enganados ou surpreendidos por uma informação que não foi apresentada em algum momento - está tudo lá, basta encontrá-la. O fato do roteiro ser bastante econômico, nos permite criar nossas próprias teses e explicações - isso é um grande elogio para o filme. Aproveitar a jornada de descobertas sem nos darmos conta que o filme está passando também merece elogio - mesmo tendo uma certa lentidão narrativa, ele é dinâmico e intenso! Pode embarcar tranquilamente pois será um bom entretenimento!
"Pássaro do Oriente" é mais um filme que trás muito da linguagem cinematográfica dos anos 80/90, porém me pareceu muito melhor construído que a recente "A Grande Mentira". Sua linha narrativa claramente se referencia em filmes de sucesso como "Atração Fatal" ou "Instinto Selvagem" ao mesmo tempo em que trás elementos psicológicos de "Cisne Negro" e de sua enorme complexidade no desenvolvimento de personagens, no caso a protagonista Lucy Fly (Alicia Vikander, vencedora do Oscar por "A Garota Dinamarquesa"). Fly é uma jovem sueca que resolve se mudar para o Japão a fim de esquecer um passado marcado por algumas coincidências. Embora ainda carregue esse peso, ela se esforça para levar uma vida normal até se apaixonar por Teiji (Naoki Kobayashi). Reservado e misterioso, Teiji possui uma espécie de fetiche: tirar fotos de mulheres em diferentes ângulos e situações - mesmo estando mortas. Quando Lily Bridges (Riley Keough), uma jovem americana recém chegada ao Japão desaparece, Lucy Fly passa a ser a principal suspeita; já que ela e Bridges criaram uma relação extremamente ambígua tendo Teiji como catalizador desses sentimentos. De fato o filme cria uma dinâmica interessante, pois ao mesmo tempo em que parece economizar na ação, o roteiro aproveita para mergulhar em diálogos inteligentes, trazendo uma certa complexidade - e aquela subjetividade que nos faz querer discutir sobre o filme quando ele termina! Olha, não é um filme inesquecível, muito menos fácil de entender, mas para quem gosta do gênero, posso dizer que é uma ótima opção de entretenimento e um bom exercício de interpretação! Vale o play!
"Pássaro do Oriente" é uma adaptação do romance homônimo da escritora britânica Susanna Jones e se passa em 1989, em Tóquio - e essa informação é vital para a experiência ao assistir o filme, pois o diretor Wash Westmoreland ("Para sempre Alice") faz questão de nos colocar em situações onde o choque de culturas interfere ativamente na dinâmica emocional dos personagens, tanto que o filme é falado em inglês e em japonês (muitas vezes na mesma cena, inclusive). Essa atmosfera desconfortável que é estar em um país tão diferente, com pessoas desconhecidas e com costumes tão particulares, criam uma espécie de solidão e de vazio, tanto em Lucy Fly como em Lily Bridges e isso ajuda a justificar a enorme necessidade de se apegar a alguém que possa lhes dar algum tipo de segurança; eu diria que é quase uma necessidade de pertencimento, um prato cheio para criação dos conflitos!
Confira o trailer:
A fotografia do coreano Chung-hoon Chung (de "It") cai como uma luva nesse conceito narrativo de Westmoreland. Chung trás um Japão belíssimo nos planos abertos, ao mesmo tempo em que é opressor nos planos fechados. A sensação de angustia é mérito dessa linguagem alternada e de uma interpretação cirúrgica de Vikander (como é boa essa atriz!) - a cena final é uma aula de roteiro e de interpretação, vale o filme! Pessoalmente eu não gostei do trabalho do Naoki Kobayashi, achei estereotipado demais, mas entendo a escolha do tom para comunicar essa cisão de culturas. Riley Keough está ótima como Lily, trás uma sensualidade "inocente" muito interessante para personagem que nos proporciona ótimas cenas - destaco a cena na boate em que ela dança com Teiji sob o olhar ameaçador de Fly!
Um outro detalhe interessante e que merece ser citado é a qualidade técnica na direção de Wash Westmoreland - ela é tão boa que até alguns clichês que o roteiro propõe passam quase despercebidos - me lembrou muito o trabalho de Darren Aronofsky (Cisne Negro). "Pássaro do Oriente" é um filme cheio de "entre linhas" que vale a pena experimentar. Embora soe previsível, em nenhum momento somos enganados ou surpreendidos por uma informação que não foi apresentada em algum momento - está tudo lá, basta encontrá-la. O fato do roteiro ser bastante econômico, nos permite criar nossas próprias teses e explicações - isso é um grande elogio para o filme. Aproveitar a jornada de descobertas sem nos darmos conta que o filme está passando também merece elogio - mesmo tendo uma certa lentidão narrativa, ele é dinâmico e intenso! Pode embarcar tranquilamente pois será um bom entretenimento!
Certamente "Pinguim" é uma das melhores produções de 2024 - e se você também considera "Batman" como uma das melhores de 2022, pare tudo e dê o play porque você está prestes a entrar em uma jornada das mais envolventes, eu diria até que essa produção da HBO é o spin-off perfeito e que deixa o terreno prontinho para "Batman 2" brilhar ainda mais! Desenvolvida pela Lauren LeFranc (de "Impulse"), a série expande o universo sombrio e criminoso de Gotham City apresentado por Matt Reeves, trazendo para o centro das atenções um dos personagens mais enigmáticos e implacáveis do submundo da cidade: Oswald Cobblepot. Com Colin Farrell reprisando o papel título (muito elogiado no filme, aliás), a série é um mergulho profundo nas intrigas, jogos de poder e brutalidade que definem aquela mesma Gotham de Reeves. Assim como outras produções do dark universe da DC, como "Coringa", "Pinguim" busca ir além e assim explorar a complexidade moral de seu protagonista e as consequências que é viver em um ambiente corroído pelo crime.
Como não poderia deixar de ser, a trama segue Oswald Cobblepot uma semana após os eventos de "Batman", enquanto ele aproveita o vácuo de poder deixado pela queda de Carmine Falcone para consolidar seu domínio sobre Gotham. A narrativa se concentra em sua busca pela ascensão ao poder, detalhando suas alianças instáveis, traições e ambições. No centro da história está a transformação de Cobblepot em um dos maiores chefões do crime organizado de Gotham, mostrando tanto sua inteligência estratégica quanto a brutalidade necessária para sobreviver em um mundo repleto de violência e corrupção. Confira o trailer:
Seguindo a mesma unidade de comunicação gráfica, a proposta narrativa e o belíssimo conceito visual de "Batman", Lauren LeFranc conduz a série com um equilíbrio impressionante, especialmente por se tratar de um drama de máfia, onde a ação (violenta) tem o mesmo valor que o desenvolvimento de personagens. Aqui, o roteiro dá uma aula ao expor a psique de Cobblepot, revelando as nuances de suas motivações, de seus traumas mais íntimos e, claro, das suas ambições, ao mesmo em que cria um retrato rico e multifacetado de um anti-herói que é fascinante, mas realmente perturbador. Como a narrativa apresentada por Reeves, LeFranc não se limita a glorificar um personagem violento, mas explorar suas escolhas morais questionáveis e as consequências de suas ações, tornando a jornada emocionalmente ressonante e moralmente ambígua - e, sim, você vai se pegar torcendo pelo bandido da história!
A direção da série, comandada pelo craque Craig Zobel (de "Mare of Easttown") complementa a atmosfera sombria e opressiva dessa Gotham, com cenários decadentes, iluminação em tons de néon e uma paleta de cores quentes e frias, mas sempre melancólicas, que refletem exatamente o caos e a desolação da cidade após os evento de "Batman". A fotografia, mais uma vez, destaca o contraste entre os momentos em que Cobblepot vai se transformando em um personagem central daquela dinâmica criminal e as cenas de ação intensas propriamente ditas, criando uma experiência visual estilizada e imersiva capaz de nos deixar de queixo caído - o fotógrafo Darran Tiernan parece ter Greig Fraser ao seu lado, dada a habilidade de replicar a relação luz e sombra que fizeram das ruas de Gotham um personagem vivo e pulsante em "Batman". Repare como essa proposta visual reforça a sensação de que a cidade é tanto um campo de batalha caótico quanto um prêmio final para aqueles que ousam controlá-la.
Colin Farrell mais uma vez entrega uma atuação impressionante como Pinguim, encarnando o personagem com um equilíbrio impecável entre carisma e ameaça. Sua transformação física e emocional é tão convincente quanto no filme, mas aqui ele tem mais espaço para explorar a profundidade de Cobblepot. Farrell captura a astúcia e ambição de um homem marcado pela vida, potencializando os seus momentos de vulnerabilidade e tornando-o um protagonista irresistivelmente complexo. O elenco de apoio também se destaca, com performances que enriquecem a dinâmica de poder e lealdade entre os personagens secundários, sejam aliados ou inimigos de Cobblepot - e aqui destaco a excelenteCristin Milioti (e sua Sofia Falcone) e Rhenzy Feliz, o Victor Aguilar.
Ao som da trilha sonora composta por Michael Giacchino (de "Skeleton Crew"), que mantém o mood sombrio e ameaçador estabelecido em "The Batman" (no original), com temas que intensificam a tensão (e refletem o estado emocional de Cobblepot) e um design de som notável, utilizando os efeitos caóticos que adicionam peso às cenas de ação e imersão aos ambientes urbanos de Gotham, "The Penguin" (também no original) entrega não só ritmo, mas também densidade à narrativa - uma experiência única, com um tom meticuloso e deliberadamente cartunesco (no melhor sentido da palavra), que foca nas dinâmicas de poder e nos dilemas internos do personagem, sem esquecer daquele jogo de gato e rato, alucinante e apaixonante, do submundo do crime.
Imperdível!
Certamente "Pinguim" é uma das melhores produções de 2024 - e se você também considera "Batman" como uma das melhores de 2022, pare tudo e dê o play porque você está prestes a entrar em uma jornada das mais envolventes, eu diria até que essa produção da HBO é o spin-off perfeito e que deixa o terreno prontinho para "Batman 2" brilhar ainda mais! Desenvolvida pela Lauren LeFranc (de "Impulse"), a série expande o universo sombrio e criminoso de Gotham City apresentado por Matt Reeves, trazendo para o centro das atenções um dos personagens mais enigmáticos e implacáveis do submundo da cidade: Oswald Cobblepot. Com Colin Farrell reprisando o papel título (muito elogiado no filme, aliás), a série é um mergulho profundo nas intrigas, jogos de poder e brutalidade que definem aquela mesma Gotham de Reeves. Assim como outras produções do dark universe da DC, como "Coringa", "Pinguim" busca ir além e assim explorar a complexidade moral de seu protagonista e as consequências que é viver em um ambiente corroído pelo crime.
Como não poderia deixar de ser, a trama segue Oswald Cobblepot uma semana após os eventos de "Batman", enquanto ele aproveita o vácuo de poder deixado pela queda de Carmine Falcone para consolidar seu domínio sobre Gotham. A narrativa se concentra em sua busca pela ascensão ao poder, detalhando suas alianças instáveis, traições e ambições. No centro da história está a transformação de Cobblepot em um dos maiores chefões do crime organizado de Gotham, mostrando tanto sua inteligência estratégica quanto a brutalidade necessária para sobreviver em um mundo repleto de violência e corrupção. Confira o trailer:
Seguindo a mesma unidade de comunicação gráfica, a proposta narrativa e o belíssimo conceito visual de "Batman", Lauren LeFranc conduz a série com um equilíbrio impressionante, especialmente por se tratar de um drama de máfia, onde a ação (violenta) tem o mesmo valor que o desenvolvimento de personagens. Aqui, o roteiro dá uma aula ao expor a psique de Cobblepot, revelando as nuances de suas motivações, de seus traumas mais íntimos e, claro, das suas ambições, ao mesmo em que cria um retrato rico e multifacetado de um anti-herói que é fascinante, mas realmente perturbador. Como a narrativa apresentada por Reeves, LeFranc não se limita a glorificar um personagem violento, mas explorar suas escolhas morais questionáveis e as consequências de suas ações, tornando a jornada emocionalmente ressonante e moralmente ambígua - e, sim, você vai se pegar torcendo pelo bandido da história!
A direção da série, comandada pelo craque Craig Zobel (de "Mare of Easttown") complementa a atmosfera sombria e opressiva dessa Gotham, com cenários decadentes, iluminação em tons de néon e uma paleta de cores quentes e frias, mas sempre melancólicas, que refletem exatamente o caos e a desolação da cidade após os evento de "Batman". A fotografia, mais uma vez, destaca o contraste entre os momentos em que Cobblepot vai se transformando em um personagem central daquela dinâmica criminal e as cenas de ação intensas propriamente ditas, criando uma experiência visual estilizada e imersiva capaz de nos deixar de queixo caído - o fotógrafo Darran Tiernan parece ter Greig Fraser ao seu lado, dada a habilidade de replicar a relação luz e sombra que fizeram das ruas de Gotham um personagem vivo e pulsante em "Batman". Repare como essa proposta visual reforça a sensação de que a cidade é tanto um campo de batalha caótico quanto um prêmio final para aqueles que ousam controlá-la.
Colin Farrell mais uma vez entrega uma atuação impressionante como Pinguim, encarnando o personagem com um equilíbrio impecável entre carisma e ameaça. Sua transformação física e emocional é tão convincente quanto no filme, mas aqui ele tem mais espaço para explorar a profundidade de Cobblepot. Farrell captura a astúcia e ambição de um homem marcado pela vida, potencializando os seus momentos de vulnerabilidade e tornando-o um protagonista irresistivelmente complexo. O elenco de apoio também se destaca, com performances que enriquecem a dinâmica de poder e lealdade entre os personagens secundários, sejam aliados ou inimigos de Cobblepot - e aqui destaco a excelenteCristin Milioti (e sua Sofia Falcone) e Rhenzy Feliz, o Victor Aguilar.
Ao som da trilha sonora composta por Michael Giacchino (de "Skeleton Crew"), que mantém o mood sombrio e ameaçador estabelecido em "The Batman" (no original), com temas que intensificam a tensão (e refletem o estado emocional de Cobblepot) e um design de som notável, utilizando os efeitos caóticos que adicionam peso às cenas de ação e imersão aos ambientes urbanos de Gotham, "The Penguin" (também no original) entrega não só ritmo, mas também densidade à narrativa - uma experiência única, com um tom meticuloso e deliberadamente cartunesco (no melhor sentido da palavra), que foca nas dinâmicas de poder e nos dilemas internos do personagem, sem esquecer daquele jogo de gato e rato, alucinante e apaixonante, do submundo do crime.
Imperdível!
"Pobres Criaturas" é realmente excelente, mas não se deixe levar por tantos elogios da critica e do público - e muito menos pelos quatro Oscars que o filme abocanhou em 2024. Sim, nem todos vão gostar do filme, mas saiba que quem gostar, na verdade vai amar! Escrevo isso com a mais absoluta tranquilidade, pois o filme é uma experiência cinematográfica única, que te fará rir, pensar e questionar a própria natureza humana de uma forma bastante particular. Por essa perspectiva, o filme é imperdível. Dirigido pelo aclamado Yorgos Lanthimos (de "A Favorita"), "Poor Things" (no original) tem uma dinâmica visual impressionante e uma narrativa pouco usual, orbitando entre uma comédia mais ácida e o drama totalmente existencialista - daqueles que desafiam as convenções sociais e exploram temas como identidade, gênero, sexualidade e morte, tudo junto e misturado. Profundo, não? Sim, muito, no entanto só dê o play se estiver disposto a mergulhar na proposta mais conceitual do diretor com seu estilo mais teatral, criativo e muito inventivo.
Baseado no livro homônimo de Alasdair Grey e referenciando o clássico "Frankenstein", a história se passa em uma atmosfera vitoriana atemporal e acompanha Bella Baxter (Emma Stone), trazida de volta à vida após se jogar de uma ponte. O experimento realizado pelo doutor Godwin Baxter (Willem Dafoe), um cientista brilhante, porém nada ortodoxo, é um sucesso, no entanto Bella, querendo conhecer mais do mundo, foge com um advogado e graças a maturidade que vai adquirindo passa exigir igualdade e liberdade. Confira o trailer:
Todos sabemos que o grego Yorgos Lanthimos é conhecido por seu estilo peculiar, que combina o humor negro com temas mais sérios em uma abordagem quase sempre perturbadora. Pois bem, aqui ele utiliza da sua assinatura como cineasta para recriar, com muita simbologia e sensibilidade, o cabo de guerra intenso entre o desejo e a razão - claro, com aquele toque de monstruosidade que tende a penalizar, com a mesma força, mas de modos distintos, os homens e as mulheres. Reparem como, em cinco "capítulos", o desenvolvimento da mente de Bella vai se transformando e a experiência de conhecer o mundo (e sair daquilo que a limitava) faz com que ela se aproxime cada vez mais do seu corpo amadurecido. É lindo de perceber esses detalhes a partir de planos simétricos e lentes completamente anguladas, criando uma atmosfera surreal e desconcertante, perfeita para os diálogos secos e sarcásticos do roteiro de Tony McNamara (duas vezes indicado ao Oscar) que coloca frente a frente modos tão diferentes de pensar e agir.
Obviamente que o elenco de "Pobres Criaturas" é a cereja do bolo dessa overdose visual de cor e estilo. Impecável em todas as camadas, eu diria que esse é o melhor trabalho (até aqui) da atriz Emma Stone - ela é capaz de entregar uma performance multifacetada e complexa, mesmo mergulhada no esteriótipo que vai se desconstruindo de acordo com o seu ganho de maturidade. Stone captura perfeitamente a confusão, a frustração e a resiliência de Bella perante suas descobertas, em todas as suas fases. Willem Dafoe, meu Deus, também está excelente como o Dr. Baxter - um personagem excêntrico e enigmático, sempre com aquele toque de sadismo tão sutil e ao mesmo tempo tão potente. Outro que merece destaque, claro, é Mark Ruffalo - simplesmente impecável, mais uma vez!
"Pobres Criaturas" é um filme que não se encaixa em nenhuma dessas prateleiras mais tradicionais do cinema atual. Ele é uma comédia, um drama e um filme de terror clássico, tudo ao mesmo tempo - uma mistura de "A Tragédia de Macbeth" com "A Invenção de Hugo Cabret" e aquele toque final de "Irma Vep" ou de "Hereditário". Veja, Lanthimos não tem, e nunca terá, medo de abordar temas ou tabus e ainda assim desafiar as expectativas da audiência com textos e cenas de fato impactantes, então esteja preparado para se chocar. Para aqueles mais tradicionais, sugiro passar longe dessa recomendação. Já para aqueles que vão se aventurar nesse mundo estranho e fascinante do diretor, muito possivelmente, serão recompensados com uma obra de arte singular e memorável.
Vale muito o seu play!
Up-date: "Pobres Criaturas" ganhou em quatro categorias no Oscar 2024, inclusive de Melhor Atriz!
"Pobres Criaturas" é realmente excelente, mas não se deixe levar por tantos elogios da critica e do público - e muito menos pelos quatro Oscars que o filme abocanhou em 2024. Sim, nem todos vão gostar do filme, mas saiba que quem gostar, na verdade vai amar! Escrevo isso com a mais absoluta tranquilidade, pois o filme é uma experiência cinematográfica única, que te fará rir, pensar e questionar a própria natureza humana de uma forma bastante particular. Por essa perspectiva, o filme é imperdível. Dirigido pelo aclamado Yorgos Lanthimos (de "A Favorita"), "Poor Things" (no original) tem uma dinâmica visual impressionante e uma narrativa pouco usual, orbitando entre uma comédia mais ácida e o drama totalmente existencialista - daqueles que desafiam as convenções sociais e exploram temas como identidade, gênero, sexualidade e morte, tudo junto e misturado. Profundo, não? Sim, muito, no entanto só dê o play se estiver disposto a mergulhar na proposta mais conceitual do diretor com seu estilo mais teatral, criativo e muito inventivo.
Baseado no livro homônimo de Alasdair Grey e referenciando o clássico "Frankenstein", a história se passa em uma atmosfera vitoriana atemporal e acompanha Bella Baxter (Emma Stone), trazida de volta à vida após se jogar de uma ponte. O experimento realizado pelo doutor Godwin Baxter (Willem Dafoe), um cientista brilhante, porém nada ortodoxo, é um sucesso, no entanto Bella, querendo conhecer mais do mundo, foge com um advogado e graças a maturidade que vai adquirindo passa exigir igualdade e liberdade. Confira o trailer:
Todos sabemos que o grego Yorgos Lanthimos é conhecido por seu estilo peculiar, que combina o humor negro com temas mais sérios em uma abordagem quase sempre perturbadora. Pois bem, aqui ele utiliza da sua assinatura como cineasta para recriar, com muita simbologia e sensibilidade, o cabo de guerra intenso entre o desejo e a razão - claro, com aquele toque de monstruosidade que tende a penalizar, com a mesma força, mas de modos distintos, os homens e as mulheres. Reparem como, em cinco "capítulos", o desenvolvimento da mente de Bella vai se transformando e a experiência de conhecer o mundo (e sair daquilo que a limitava) faz com que ela se aproxime cada vez mais do seu corpo amadurecido. É lindo de perceber esses detalhes a partir de planos simétricos e lentes completamente anguladas, criando uma atmosfera surreal e desconcertante, perfeita para os diálogos secos e sarcásticos do roteiro de Tony McNamara (duas vezes indicado ao Oscar) que coloca frente a frente modos tão diferentes de pensar e agir.
Obviamente que o elenco de "Pobres Criaturas" é a cereja do bolo dessa overdose visual de cor e estilo. Impecável em todas as camadas, eu diria que esse é o melhor trabalho (até aqui) da atriz Emma Stone - ela é capaz de entregar uma performance multifacetada e complexa, mesmo mergulhada no esteriótipo que vai se desconstruindo de acordo com o seu ganho de maturidade. Stone captura perfeitamente a confusão, a frustração e a resiliência de Bella perante suas descobertas, em todas as suas fases. Willem Dafoe, meu Deus, também está excelente como o Dr. Baxter - um personagem excêntrico e enigmático, sempre com aquele toque de sadismo tão sutil e ao mesmo tempo tão potente. Outro que merece destaque, claro, é Mark Ruffalo - simplesmente impecável, mais uma vez!
"Pobres Criaturas" é um filme que não se encaixa em nenhuma dessas prateleiras mais tradicionais do cinema atual. Ele é uma comédia, um drama e um filme de terror clássico, tudo ao mesmo tempo - uma mistura de "A Tragédia de Macbeth" com "A Invenção de Hugo Cabret" e aquele toque final de "Irma Vep" ou de "Hereditário". Veja, Lanthimos não tem, e nunca terá, medo de abordar temas ou tabus e ainda assim desafiar as expectativas da audiência com textos e cenas de fato impactantes, então esteja preparado para se chocar. Para aqueles mais tradicionais, sugiro passar longe dessa recomendação. Já para aqueles que vão se aventurar nesse mundo estranho e fascinante do diretor, muito possivelmente, serão recompensados com uma obra de arte singular e memorável.
Vale muito o seu play!
Up-date: "Pobres Criaturas" ganhou em quatro categorias no Oscar 2024, inclusive de Melhor Atriz!
"Ponto Vermelho" é uma produção sueca da Netflix comandada pelo diretor Alain Darborg. Bem na linha do suspense psicológico onde em grande parte do filme o inimigo é completamente desconhecido, posso dizer que a experiência não decepciona. Existem muitos elementos narrativos que misturam filmes como "Mar Aberto" de 2003 e "Louca Obsessão" de 1990 - o que acaba criando uma dinâmica angustiante e até certo ponto bastante corajosa. Aliás, temos um final bem corajoso, eu diria!
David (Anastasios Soulis) acaba de se formar em engenharia e aproveita a felicidade do momento para pedir a namorada, Nadja (Nanna Blondell) em casamento. Um ano e meio se passa e o casal feliz agora está tão feliz assim - o que faz Nadja esconder que está grávida do marido. Após uma discussão, David resolve convidar a mulher para passar um final de semana acampando num lugar remoto ao norte da Suécia - a idéia era aproveitar o momento para tentar salvar a relação, se reconectarem. Acontece que um desentendimento bobo no caminho, com dois irmãos racistas, passa a ameaçar a paz do casal, e, o que era para ser um final de semana de reconciliação acaba se tornando um verdadeiro pesadelo. Confira o trailer (legendado em inglês):
Embora o prólogo seja superficial demais, é possível ter a real percepção de como a dinâmica do casal vai influenciar na história. Talvez um pouco deslocado e até apressado, o roteiro dePer Dickson e do diretor Alain Darborg vai se equilibrando com o passar do tempo e inserindo muitos gatilhos visuais e narrativos de medo e angústia - o primeiro contato com os irmãos racistas é um bom exemplo. Ao se apropriar do estilo “o perigo pode estar em qualquer lugar”, o filme ganha muita força e acaba potencializando o cenário escolhido: uma inóspita região de gelo, como vimos recentemente em "O Céu da Meia-Noite". A noite, com tempestade, sem iluminação, apenas os dois personagens no meio de uma situação sem controle, faz o suspense natural de "Mar Aberto" vir na nossa lembrança.
Porém esse mesmo roteiro que cria essa atmosfera de terror tão sensível, começa trapacear a audiência quando a "caça ao rato" termina já no inicio do terceiro ato, pois ele passa a usar alguns artifícios que não são apresentados em nenhum momento da trama e isso incomoda um pouco. Mesmo impactando a imaginação, já que as cenas de maus-tratos aos animais são apenas sugeridas e acabam servindo de preparação para as de tortura que virão adiante - daí a forte referência de "Louca Obsessão"; "Ponto Vermelho" oscila demais até sua conclusão.
Anastasios Soulis e Nanna Blondell estão ótimos e carregam o filme nas costas, junto com uma direção competente de Darborg, mas faltou um pouco mais de violência para tornar o filme inesquecível e marcante - e aqui é uma opinião bem pessoal, já que fiquei satisfeito com o final e como o drama foi se construindo. Digamos que seria a cereja do bolo, mesmo com tudo fazendo sentido como fez! Em todo caso, "Ponto Vermelho" é um bom suspense psicológico com toques de ação e perseguição que vai entreter e provocar sensações interessantes.
Não é um filme inesquecível, ok? Mas cumpre muito bem o seu papel na discussão sobre até que ponto a vingança vale a pena!
"Ponto Vermelho" é uma produção sueca da Netflix comandada pelo diretor Alain Darborg. Bem na linha do suspense psicológico onde em grande parte do filme o inimigo é completamente desconhecido, posso dizer que a experiência não decepciona. Existem muitos elementos narrativos que misturam filmes como "Mar Aberto" de 2003 e "Louca Obsessão" de 1990 - o que acaba criando uma dinâmica angustiante e até certo ponto bastante corajosa. Aliás, temos um final bem corajoso, eu diria!
David (Anastasios Soulis) acaba de se formar em engenharia e aproveita a felicidade do momento para pedir a namorada, Nadja (Nanna Blondell) em casamento. Um ano e meio se passa e o casal feliz agora está tão feliz assim - o que faz Nadja esconder que está grávida do marido. Após uma discussão, David resolve convidar a mulher para passar um final de semana acampando num lugar remoto ao norte da Suécia - a idéia era aproveitar o momento para tentar salvar a relação, se reconectarem. Acontece que um desentendimento bobo no caminho, com dois irmãos racistas, passa a ameaçar a paz do casal, e, o que era para ser um final de semana de reconciliação acaba se tornando um verdadeiro pesadelo. Confira o trailer (legendado em inglês):
Embora o prólogo seja superficial demais, é possível ter a real percepção de como a dinâmica do casal vai influenciar na história. Talvez um pouco deslocado e até apressado, o roteiro dePer Dickson e do diretor Alain Darborg vai se equilibrando com o passar do tempo e inserindo muitos gatilhos visuais e narrativos de medo e angústia - o primeiro contato com os irmãos racistas é um bom exemplo. Ao se apropriar do estilo “o perigo pode estar em qualquer lugar”, o filme ganha muita força e acaba potencializando o cenário escolhido: uma inóspita região de gelo, como vimos recentemente em "O Céu da Meia-Noite". A noite, com tempestade, sem iluminação, apenas os dois personagens no meio de uma situação sem controle, faz o suspense natural de "Mar Aberto" vir na nossa lembrança.
Porém esse mesmo roteiro que cria essa atmosfera de terror tão sensível, começa trapacear a audiência quando a "caça ao rato" termina já no inicio do terceiro ato, pois ele passa a usar alguns artifícios que não são apresentados em nenhum momento da trama e isso incomoda um pouco. Mesmo impactando a imaginação, já que as cenas de maus-tratos aos animais são apenas sugeridas e acabam servindo de preparação para as de tortura que virão adiante - daí a forte referência de "Louca Obsessão"; "Ponto Vermelho" oscila demais até sua conclusão.
Anastasios Soulis e Nanna Blondell estão ótimos e carregam o filme nas costas, junto com uma direção competente de Darborg, mas faltou um pouco mais de violência para tornar o filme inesquecível e marcante - e aqui é uma opinião bem pessoal, já que fiquei satisfeito com o final e como o drama foi se construindo. Digamos que seria a cereja do bolo, mesmo com tudo fazendo sentido como fez! Em todo caso, "Ponto Vermelho" é um bom suspense psicológico com toques de ação e perseguição que vai entreter e provocar sensações interessantes.
Não é um filme inesquecível, ok? Mas cumpre muito bem o seu papel na discussão sobre até que ponto a vingança vale a pena!
Antes de mais nada, eu preciso admitir que eu quase desisti de "Por trás dos seus olhos" algumas vezes e assim que terminou, senti aquela sensação de alívio por ter ido até o final! Veja, esse comentário em hipótese nenhuma deve te impedir de assistir a minissérie da Netflix, mas em vários momentos você vai achar algumas situações uma grande bobagem, ou algumas atuações completamente estereotipadas e acima do tom, mas acredite NADA que acontece durante os 5 primeiros episódios é por acaso e tudo vai ficar muito bem explicado no sexto e último ato! Pode confiar!
Baseado no livro de sucesso de Sarah Pinborough, a minissérie acompanha a história de Louise (Simona Brown), uma mãe recém divorciada que teve um affair casual com um homem casado e que descobre no dia seguinte ser seu novo chefe, o psiquiatra David (Tom Bateman). Porém tudo começa a mudar de rumo quando Louise, acidentalmente, conhece a esposa dele, Adele (Eve Hewson) e a partir daí passam a construir uma amizade repleta de confissões e segredos. Confira o trailer:
É de se elogiar a estratégia quase suicida da Netflix em não se aprofundar na sinopse e focar no marketing de "Por trás dos seus olhos" como um suspense psicológico cheio de romance, drama, mistérios e relações extraconjugais - apoiando-se, inclusive, em um conceito narrativo bem anos 90. Ao se apegar nessa premissa, já mergulhamos na história logo de cara e os quatro primeiros episódios, embora com algumas escorregadas conceituais (que depois descobrimos serem propositais), nos prendem e nos provocam uma enorme curiosidade! Aqui cabe um rápido disclaimer: não estamos falando de uma super produção, com um super orçamento, com rostos famosos e um diretor extremamente criativo; talvez por isso eu tenha ficado tão desconfiado ao perceber que a história vai se enrolando sozinha e encontrando atalhos não tão conectados com a realidade que estávamos acompanhando até ali - e isso fica muito claro a partir do quinto episódio! Mas não desista!
Ao nos aproximarmos do final, aquela trama, aparentemente bem construída, vai trazendo elementos de fantasia e nos afastando da realidade dramática que chega a desanimar - até pela forma pouco criativa que o diretor usou para contar uma ou outra passagem, digamos "extra-corporal". Tá, eu sei que o texto pode estar ficando confuso, mas eu estou tomando o máximo de cuidado para não te dar nenhum spoiler e ao mesmo tempo tentando te convencer a ir até o final, mesmo com um monte de "bobagens" que você vai encontrar nos episódios. Então vou te pedir novamente: não desista!
Ao longo dos episódios, a série vai nos dando dicas que a história não se trata apenas de mais um dramalhão como "Não fale com estranhos", por exemplo. O fato é que o roteiro nos engana muito bem, pois a estrutura narrativa é muito realista, não envolvem situações fora do ceticismo e isso se subverte de tal maneira que nos surpreende demais, desde que você embarque na proposta e assuma uma certa suspensão da realidade - tipo "Sexto Sentido", sabe? Aliás, "Por trás dos seus olhos" traz uma referência muito inteligente e completamente coerente de um filme de 1998, chamado "Fallen" (deixe para pesquisar sobre esse filme depois que você assistir o último episódio).
"Por trás dos seus olhos" vale a pena, vai por mim!
Antes de mais nada, eu preciso admitir que eu quase desisti de "Por trás dos seus olhos" algumas vezes e assim que terminou, senti aquela sensação de alívio por ter ido até o final! Veja, esse comentário em hipótese nenhuma deve te impedir de assistir a minissérie da Netflix, mas em vários momentos você vai achar algumas situações uma grande bobagem, ou algumas atuações completamente estereotipadas e acima do tom, mas acredite NADA que acontece durante os 5 primeiros episódios é por acaso e tudo vai ficar muito bem explicado no sexto e último ato! Pode confiar!
Baseado no livro de sucesso de Sarah Pinborough, a minissérie acompanha a história de Louise (Simona Brown), uma mãe recém divorciada que teve um affair casual com um homem casado e que descobre no dia seguinte ser seu novo chefe, o psiquiatra David (Tom Bateman). Porém tudo começa a mudar de rumo quando Louise, acidentalmente, conhece a esposa dele, Adele (Eve Hewson) e a partir daí passam a construir uma amizade repleta de confissões e segredos. Confira o trailer:
É de se elogiar a estratégia quase suicida da Netflix em não se aprofundar na sinopse e focar no marketing de "Por trás dos seus olhos" como um suspense psicológico cheio de romance, drama, mistérios e relações extraconjugais - apoiando-se, inclusive, em um conceito narrativo bem anos 90. Ao se apegar nessa premissa, já mergulhamos na história logo de cara e os quatro primeiros episódios, embora com algumas escorregadas conceituais (que depois descobrimos serem propositais), nos prendem e nos provocam uma enorme curiosidade! Aqui cabe um rápido disclaimer: não estamos falando de uma super produção, com um super orçamento, com rostos famosos e um diretor extremamente criativo; talvez por isso eu tenha ficado tão desconfiado ao perceber que a história vai se enrolando sozinha e encontrando atalhos não tão conectados com a realidade que estávamos acompanhando até ali - e isso fica muito claro a partir do quinto episódio! Mas não desista!
Ao nos aproximarmos do final, aquela trama, aparentemente bem construída, vai trazendo elementos de fantasia e nos afastando da realidade dramática que chega a desanimar - até pela forma pouco criativa que o diretor usou para contar uma ou outra passagem, digamos "extra-corporal". Tá, eu sei que o texto pode estar ficando confuso, mas eu estou tomando o máximo de cuidado para não te dar nenhum spoiler e ao mesmo tempo tentando te convencer a ir até o final, mesmo com um monte de "bobagens" que você vai encontrar nos episódios. Então vou te pedir novamente: não desista!
Ao longo dos episódios, a série vai nos dando dicas que a história não se trata apenas de mais um dramalhão como "Não fale com estranhos", por exemplo. O fato é que o roteiro nos engana muito bem, pois a estrutura narrativa é muito realista, não envolvem situações fora do ceticismo e isso se subverte de tal maneira que nos surpreende demais, desde que você embarque na proposta e assuma uma certa suspensão da realidade - tipo "Sexto Sentido", sabe? Aliás, "Por trás dos seus olhos" traz uma referência muito inteligente e completamente coerente de um filme de 1998, chamado "Fallen" (deixe para pesquisar sobre esse filme depois que você assistir o último episódio).
"Por trás dos seus olhos" vale a pena, vai por mim!
"Vanilla Sky" está, sem dúvida, entre meus filmes preferidos! Muito bem conduzido pelo Cameron Crowe, "Vanilla Sky", produção de 2001, foi o primeiro filme que lembro ter me desafiado intelectualmente. Pois bem, após assistir a versão original "Preso na Escuridão" (ou "Abre Los Ojos" no original), tenho que admitir: ela é ainda melhor! O filme é infinitamente mais humano que seu remake americano, seu roteiro é ainda mais sensível e aquele conceito visual mais independente do genial diretor chileno, Alejandro Amenábar (de "Os Outros"), é muito mais bonito. Olha, esse filme é uma obra-prima por si só - ele apresenta uma narrativa complexa, com performances verdadeiramente cativantes, além de uma exploração profunda do valor da identidade de uma forma muito sensorial, eu diria, inclusive, única! Que experiência que o streaming nos proporciona! Assista!
A história acompanha a vida de César (Eduardo Noriega), um jovem carismático que tem tudo: beleza, riqueza e sucesso. No entanto, sua vida muda drasticamente após um acidente de carro, que o deixa desfigurado e com cicatrizes graves. À medida que ele tenta lidar com sua nova aparência e reconstruir sua vida, César mergulha em um mundo de sonhos e pesadelos interconectados, onde a linha entre a realidade e a fantasia se torna cada vez mais obscura.
É impressionante como "Preso na Escuridão" nos entrega uma atmosfera intensamente envolvente, provocadora e, claro, perturbadora. Amenábar, ao lado de seu fotógrafo Hans Burmann (de "Amnésia"), trabalha o conceito estético do filme de uma forma meticulosa, aproveitando de uma trilha sonora arrebatadora para transmitir a sensação de paranoia que permeia a mente do protagonista. Reparem nas sequências de sonhos e alucinações - elas são especialmente marcantes, com imagens surreais que desafiam nossas expectativas e nos levam a questionar o que é real e o que é fruto da imaginação.
O desempenho de Eduardo Noriega é brilhante e complexo - ele é capaz de capturar perfeitamente a transformação de um homem confiante e sedutor em um ser atormentado e desesperado - e aqui sem os trejeitos de uma figura já consagrada como Tom Cruise. A química entre Noriega e Penélope Cruz, que interpreta a enigmática Sofia, traz uma camada adicional de profundidade emocional à trama que chega a ser desconfortável. Veja, não será uma única que vez que você vai ser colocar no lugar de César e também de Sofia. O roteiro do próprio Amenábar trabalha essas sensações com reviravoltas surpreendentes - mas surpreendentes mesmo!
"Preso na Escuridão" é inteligente, criativo e potente, capaz de explorar questões filosóficas profundas, como a natureza da identidade, a influência da percepção na construção da realidade e os limites da nossa compreensão sobre mundo, sobre o amor e sobre nossa capacidade de se redimir, com a mesma competência com que nos provoca simples reflexões. De uma forma intrigante, o filme nos desafiado a cada cena, exigindo o máximo da nossa atenção e concentração - como um convite intelectualmente estimulante.
Pode acreditar "Preso na Escuridão" certamente merece um lugar na sua lista de filmes imperdíveis.
PS: O filme recebeu 10 indicações ao prêmio Goya de 1999, além de vencer
"Vanilla Sky" está, sem dúvida, entre meus filmes preferidos! Muito bem conduzido pelo Cameron Crowe, "Vanilla Sky", produção de 2001, foi o primeiro filme que lembro ter me desafiado intelectualmente. Pois bem, após assistir a versão original "Preso na Escuridão" (ou "Abre Los Ojos" no original), tenho que admitir: ela é ainda melhor! O filme é infinitamente mais humano que seu remake americano, seu roteiro é ainda mais sensível e aquele conceito visual mais independente do genial diretor chileno, Alejandro Amenábar (de "Os Outros"), é muito mais bonito. Olha, esse filme é uma obra-prima por si só - ele apresenta uma narrativa complexa, com performances verdadeiramente cativantes, além de uma exploração profunda do valor da identidade de uma forma muito sensorial, eu diria, inclusive, única! Que experiência que o streaming nos proporciona! Assista!
A história acompanha a vida de César (Eduardo Noriega), um jovem carismático que tem tudo: beleza, riqueza e sucesso. No entanto, sua vida muda drasticamente após um acidente de carro, que o deixa desfigurado e com cicatrizes graves. À medida que ele tenta lidar com sua nova aparência e reconstruir sua vida, César mergulha em um mundo de sonhos e pesadelos interconectados, onde a linha entre a realidade e a fantasia se torna cada vez mais obscura.
É impressionante como "Preso na Escuridão" nos entrega uma atmosfera intensamente envolvente, provocadora e, claro, perturbadora. Amenábar, ao lado de seu fotógrafo Hans Burmann (de "Amnésia"), trabalha o conceito estético do filme de uma forma meticulosa, aproveitando de uma trilha sonora arrebatadora para transmitir a sensação de paranoia que permeia a mente do protagonista. Reparem nas sequências de sonhos e alucinações - elas são especialmente marcantes, com imagens surreais que desafiam nossas expectativas e nos levam a questionar o que é real e o que é fruto da imaginação.
O desempenho de Eduardo Noriega é brilhante e complexo - ele é capaz de capturar perfeitamente a transformação de um homem confiante e sedutor em um ser atormentado e desesperado - e aqui sem os trejeitos de uma figura já consagrada como Tom Cruise. A química entre Noriega e Penélope Cruz, que interpreta a enigmática Sofia, traz uma camada adicional de profundidade emocional à trama que chega a ser desconfortável. Veja, não será uma única que vez que você vai ser colocar no lugar de César e também de Sofia. O roteiro do próprio Amenábar trabalha essas sensações com reviravoltas surpreendentes - mas surpreendentes mesmo!
"Preso na Escuridão" é inteligente, criativo e potente, capaz de explorar questões filosóficas profundas, como a natureza da identidade, a influência da percepção na construção da realidade e os limites da nossa compreensão sobre mundo, sobre o amor e sobre nossa capacidade de se redimir, com a mesma competência com que nos provoca simples reflexões. De uma forma intrigante, o filme nos desafiado a cada cena, exigindo o máximo da nossa atenção e concentração - como um convite intelectualmente estimulante.
Pode acreditar "Preso na Escuridão" certamente merece um lugar na sua lista de filmes imperdíveis.
PS: O filme recebeu 10 indicações ao prêmio Goya de 1999, além de vencer
Se você gostou de "A Casa" certamente você vai gostar de "Quem com ferro fere"! Esse filme espanhol que está na Netflix segue o mesmo conceito narrativo do seu compatriota, porém com um mérito que faz toda a diferença ao assistirmos: ele é muito corajoso! O filme acompanha o dia a dia do enfermeiro de um asilo chamado Mario (Luis Tosar). Após a morte do seu irmão Sergio, ele se prepara para um novo capítulo da sua vida com a chegada de seu primeiro filho, porém algo inusitado acontece: o um chefe do tráfico de drogas local, Antonio Padín (Xan Cejudo), é enviado para asilo e fica sob seus cuidados. A partir daí, Mario começa a se questionar se seu dever como profissional é mais importante do que as vidas que este homem destruiu, inclusive a do seu irmão. Confira o trailer dublado:
O diretor do filme, o espanhol Paco Plaza, passou a ser reconhecido com seu filme de terror "REC" e com o ótimo "Verônica". Premiadíssimo na Europa e indicado como Melhor Diretor no Prêmio Goya em 2017, Plaza domina a gramática cinematográfica do suspense, o horror e também do drama, como poucos da sua geração. Com muita maestria ela é capaz de misturar todos esses gêneros de uma forma bastante natural e com um único objetivo: criar o máximo de tensão possível - mesmo que em situações onde a realidade parece se distanciar, mas o realismo não!
O filme tem uma história envolvente, porém o roteiro tem um pequeno deslize no segundo ato, mas que é completamente esquecido quando assistimos o final. Na verdade, o roteiro do novato Juan Galiñanes e do experiente Jorge Guerricaechevarría, dos ótimos "O Bar", "Perfeitos Desconhecidos"e o "O Aviso", tem um primeiro ato excelente, um segundo arrastado e com algumas soluções dramáticas um pouco incoerentes com tudo o que nos foi apresentado até ali, e um terceiro ato surpreendente e muito, mas muito corajoso. O bacana é que mesmo a história apresentando essa "barriga", o diretor Paco Plaza segura nossa atenção da mesma forma e com a mesma habilidade que apresentou em "Verônica". É claro que o trabalho do ator Luis Tosar contribui muito para isso, mas é inegável a qualidade do diretor em nos colocar dentro do drama - e aqui cabe uma observação importante: Tosar recebeu sua oitava indicação ao Goya (ele ganhou três) justamente por esse personagem, o que comprova a força interior que seu ótimo trabalho deu ao filme.
O fato é que "Quem com ferro fere" é mais um suspense psicológico de alto nível que chega da Europa e com ele toda essa tendência de experimentarmos, cada vez mais, escolas diferentes de Cinema que, além de nos proporcionar um ótimo entretenimento, consegue nos deixar muito angustiados - vide o que aconteceu recentemente com "Parasita"!
Olha, vale muito a pena para quem gosta de um suspense psicológico estruturado e muito bem realizado sem parecer piegas! Gostei muito e indico com tranquilidade!
Se você gostou de "A Casa" certamente você vai gostar de "Quem com ferro fere"! Esse filme espanhol que está na Netflix segue o mesmo conceito narrativo do seu compatriota, porém com um mérito que faz toda a diferença ao assistirmos: ele é muito corajoso! O filme acompanha o dia a dia do enfermeiro de um asilo chamado Mario (Luis Tosar). Após a morte do seu irmão Sergio, ele se prepara para um novo capítulo da sua vida com a chegada de seu primeiro filho, porém algo inusitado acontece: o um chefe do tráfico de drogas local, Antonio Padín (Xan Cejudo), é enviado para asilo e fica sob seus cuidados. A partir daí, Mario começa a se questionar se seu dever como profissional é mais importante do que as vidas que este homem destruiu, inclusive a do seu irmão. Confira o trailer dublado:
O diretor do filme, o espanhol Paco Plaza, passou a ser reconhecido com seu filme de terror "REC" e com o ótimo "Verônica". Premiadíssimo na Europa e indicado como Melhor Diretor no Prêmio Goya em 2017, Plaza domina a gramática cinematográfica do suspense, o horror e também do drama, como poucos da sua geração. Com muita maestria ela é capaz de misturar todos esses gêneros de uma forma bastante natural e com um único objetivo: criar o máximo de tensão possível - mesmo que em situações onde a realidade parece se distanciar, mas o realismo não!
O filme tem uma história envolvente, porém o roteiro tem um pequeno deslize no segundo ato, mas que é completamente esquecido quando assistimos o final. Na verdade, o roteiro do novato Juan Galiñanes e do experiente Jorge Guerricaechevarría, dos ótimos "O Bar", "Perfeitos Desconhecidos"e o "O Aviso", tem um primeiro ato excelente, um segundo arrastado e com algumas soluções dramáticas um pouco incoerentes com tudo o que nos foi apresentado até ali, e um terceiro ato surpreendente e muito, mas muito corajoso. O bacana é que mesmo a história apresentando essa "barriga", o diretor Paco Plaza segura nossa atenção da mesma forma e com a mesma habilidade que apresentou em "Verônica". É claro que o trabalho do ator Luis Tosar contribui muito para isso, mas é inegável a qualidade do diretor em nos colocar dentro do drama - e aqui cabe uma observação importante: Tosar recebeu sua oitava indicação ao Goya (ele ganhou três) justamente por esse personagem, o que comprova a força interior que seu ótimo trabalho deu ao filme.
O fato é que "Quem com ferro fere" é mais um suspense psicológico de alto nível que chega da Europa e com ele toda essa tendência de experimentarmos, cada vez mais, escolas diferentes de Cinema que, além de nos proporcionar um ótimo entretenimento, consegue nos deixar muito angustiados - vide o que aconteceu recentemente com "Parasita"!
Olha, vale muito a pena para quem gosta de um suspense psicológico estruturado e muito bem realizado sem parecer piegas! Gostei muito e indico com tranquilidade!
Sob um primeiro olhar, "Querida Alice" pode dar a impressão de se tratar de um thriller psicológico anos 90 bem ao estilo "Dormindo com o Inimigo" ou "Atração Fatal", no entanto o filme de estreia da diretora inglesa Mary Nighy (de "Industry") vai muito além - ele traz para tela uma jornada íntima, realista e brutal sobre as dores de um relacionamento tóxico sem precisar impactar a audiência com imagens fortes para manter aquele impressionante clima de tensão que nos acompanha durante toda a jornada da protagonista. Veja, o filme não se preocupa em mostrar o abuso em si, ele apenas deixa subentendido, no entanto, a perspectiva de Alice para o seu drama é visceral!
Na trama acompanhamos a história da Alice do título (interpretada por Anna Kendrick), uma mulher cuja identidade foi se fragilizando com o tempo e com isso se desconectando das amizades graças a seu namorado, Ross (Charlie Carrick), um jovem artista psicologicamente abusivo. É quando Alice se junta com Tess (Kaniehtiio Horn) e Sophie (Wunmi Mosaku) para uma viagem entre amigas, que ela entende o quanto precisa encontrar forças para se libertar desse relacionamento que vem acabando com sua auto-estima pouco am pouco. Confira o trailer (em inglês):
"Querida Alice" estreou no Festival de Cinema de Toronto em setembro de 2022 e acabou sendo aclamado pela crítica especializada, o que gerou a expectativa de algumas indicações ao Oscar do ano seguinte - expectativas essas que não se confirmaram e, para mim, de maneira até injusta. Mesmo com uma aprovação de 86% no Rotten Tomatoes e uma atuação primorosa de Kendrick (tranquilamente a melhor de sua carreira), o filme não emplacou e continuou dividindo opiniões até hoje. Para muitos, ele é cadenciado demais - existe uma linha de comentários que defende que a história não evolui e quando ela finalmente encontra seu clímax, é solucionada rapidamente. Eu discordo, porém entendo essa resistência, já que o filme, de fato, se apoia muito mais nos fantasmas de Alice do que em cenas visualmente impactantes (por sua crueldade e brutalidade) que encontramos em outros filmes com o mesmo tema.
Nighy deliberadamente escolhe o caminho mais difícil para contar essa história que exige uma certa conexão com a protagonista para entender o sofrimento que ela está passando - por isso afirmo tranquilamente que as mulheres vão se relacionar melhor com o filme. A diretora esbanja sensibilidade e mostra dominar a gramática cinematográfica do suspense psicológico - guardem esse nome: Mary Nighy. Já conceitualmente, os roteiristas Alanna Francis e Mark Van de Ven (ambos do excelente "The Rest of Us") se apropriam muito mais das sensações de medo e angustia do que do embate psicológico expositivo - mesmo que a ótima montagem do talentoso Gareth C. Scales (de "O Espião Inglês") sugira um confronto iminente (mais ou menos como em "A Assistente").
"Querida Alice" tem uma atmosfera tão realista que podemos nem nos dar conta que estamos falando de uma ficção. Embora o roteiro use uma subtrama frágil sobre o desaparecimento de uma jovem para criar um clima de suspense que nunca se concretiza, é na dor e na fragilidade emocional de Alice que a história realmente brilha - as crises de ansiedade e desespero da protagonista são tão realistas quanto chocantes, e podem ser passíveis de gatilhos para quem sofre de síndrome do pânico, então cuidado ao dar o play. Por outro lado, aqui também temos um drama importante, bem realizado e muito bem equilibrado, que talvez se distancie um pouco do entretenimento barato para expor como o abuso psicológico pode ser tão perigoso e avassalador quanto o fisico.
Vale muito seu play!
Sob um primeiro olhar, "Querida Alice" pode dar a impressão de se tratar de um thriller psicológico anos 90 bem ao estilo "Dormindo com o Inimigo" ou "Atração Fatal", no entanto o filme de estreia da diretora inglesa Mary Nighy (de "Industry") vai muito além - ele traz para tela uma jornada íntima, realista e brutal sobre as dores de um relacionamento tóxico sem precisar impactar a audiência com imagens fortes para manter aquele impressionante clima de tensão que nos acompanha durante toda a jornada da protagonista. Veja, o filme não se preocupa em mostrar o abuso em si, ele apenas deixa subentendido, no entanto, a perspectiva de Alice para o seu drama é visceral!
Na trama acompanhamos a história da Alice do título (interpretada por Anna Kendrick), uma mulher cuja identidade foi se fragilizando com o tempo e com isso se desconectando das amizades graças a seu namorado, Ross (Charlie Carrick), um jovem artista psicologicamente abusivo. É quando Alice se junta com Tess (Kaniehtiio Horn) e Sophie (Wunmi Mosaku) para uma viagem entre amigas, que ela entende o quanto precisa encontrar forças para se libertar desse relacionamento que vem acabando com sua auto-estima pouco am pouco. Confira o trailer (em inglês):
"Querida Alice" estreou no Festival de Cinema de Toronto em setembro de 2022 e acabou sendo aclamado pela crítica especializada, o que gerou a expectativa de algumas indicações ao Oscar do ano seguinte - expectativas essas que não se confirmaram e, para mim, de maneira até injusta. Mesmo com uma aprovação de 86% no Rotten Tomatoes e uma atuação primorosa de Kendrick (tranquilamente a melhor de sua carreira), o filme não emplacou e continuou dividindo opiniões até hoje. Para muitos, ele é cadenciado demais - existe uma linha de comentários que defende que a história não evolui e quando ela finalmente encontra seu clímax, é solucionada rapidamente. Eu discordo, porém entendo essa resistência, já que o filme, de fato, se apoia muito mais nos fantasmas de Alice do que em cenas visualmente impactantes (por sua crueldade e brutalidade) que encontramos em outros filmes com o mesmo tema.
Nighy deliberadamente escolhe o caminho mais difícil para contar essa história que exige uma certa conexão com a protagonista para entender o sofrimento que ela está passando - por isso afirmo tranquilamente que as mulheres vão se relacionar melhor com o filme. A diretora esbanja sensibilidade e mostra dominar a gramática cinematográfica do suspense psicológico - guardem esse nome: Mary Nighy. Já conceitualmente, os roteiristas Alanna Francis e Mark Van de Ven (ambos do excelente "The Rest of Us") se apropriam muito mais das sensações de medo e angustia do que do embate psicológico expositivo - mesmo que a ótima montagem do talentoso Gareth C. Scales (de "O Espião Inglês") sugira um confronto iminente (mais ou menos como em "A Assistente").
"Querida Alice" tem uma atmosfera tão realista que podemos nem nos dar conta que estamos falando de uma ficção. Embora o roteiro use uma subtrama frágil sobre o desaparecimento de uma jovem para criar um clima de suspense que nunca se concretiza, é na dor e na fragilidade emocional de Alice que a história realmente brilha - as crises de ansiedade e desespero da protagonista são tão realistas quanto chocantes, e podem ser passíveis de gatilhos para quem sofre de síndrome do pânico, então cuidado ao dar o play. Por outro lado, aqui também temos um drama importante, bem realizado e muito bem equilibrado, que talvez se distancie um pouco do entretenimento barato para expor como o abuso psicológico pode ser tão perigoso e avassalador quanto o fisico.
Vale muito seu play!
"Rede de Ódio" é um grande filme, com um roteiro excelente e uma direção impecável! Dito isso, fica muito fácil criar um paralelo desse filme polonês com uma produção sueca, dessa vez uma minissérie, chamada "Areia Movediça" - ambos mostram como é construída uma situação extrema de ódio, embora com objetivos diferentes, o foco não é ato em si, mas o que leva uma pessoa a cometer uma atrocidade dessas. É quase um estudo psicológico sobre os protagonistas, como se fosse peças de um quebra-cabeça que vão se juntando até alcançar o limite de uma ideologia - vale citar que o protagonista de "Rede de Ódio" dá um show (mas sobre isso vamos nos aprofundar mais a frente).
Tomasz Giemza (Maciej Musialowski) é um jovem rapaz vindo do interior da Polônia cujos estudos na faculdade de Direito são pagos pela família de Robert (Jacek Koman) e Zofia Krasucka (Danuta Stenka). Tomasz nutre uma paixão quase platônica por Gabi (Vanessa Aleksander), filha mais nova do casal, mas, apesar do aparente respeito entre eles, Tomasz descobre que é motivo de chacota ao escutar uma conversa dos Krasucka - por sua forma de ser e pelo abismo social que os separam. Ao ser expulso da faculdade, por plagiar um trabalho, Tomasz começa um emprego numa agência de publicidade especializada em eliminar a reputação dos concorrentes de seus clientes através das redes sociais. Quando ele é escalado para destruir um dos candidatos à prefeitura de Varsóvia e esse mesmo candidato é apoiado pela família de Gabi, Tomasz se vê em uma enorme oportunidade de mostrar que, mesmo humilhado pela vida, ele pode dar a volta por cima e ainda provar que não existem limites para sua ambição e competência! Confira o trailer (em inglês):
"Rede de Ódio" é uma agradável surpresa, chancelada pelo prêmio de melhor Filme Internacional no Tribeca Film Festival de 2020. Novo filme do diretor de "Corpus Christi", indicado ao último Oscar de Filme Estrangeiro, "Rede de Ódio" é um drama psicológico muito, mas muito bom! A forma como a trama vai se construindo é tão fluida que nem nos damos conta de como tudo aquilo que vemos na tela é tão próximo de nós, mesmo sendo tão surreal - é como misturar o documentário "Privacidade Hackeada" com o filme "22 July", ambos da Netflix! Olha, vale muito a pena mesmo e pode acreditar: esse filme vai te fazer refletir sobre muito dos absurdos que vivemos hoje em dia no nosso país!
O roteiro do jovem polonês Mateusz Pacewicz é uma aula de construção de personagem em apenas duas horas - é de Pacewicz o roteiro de "Corpus Christi", inclusive. Ele vai transformando Tomasz Giemza ao mesmo tempo em que vai se aprofundando em cada uma das camadas do personagem - se no inicio sentimos dó, em um determinado momento sentimos ódio e logo depois entendemos suas motivações, mas não concordamos com suas atitudes! Sim, é um ciclo de emoções que nos vai provocando até nos perguntarmos até onde Tomasz será capaz de ir para se provar como um homem de sucesso! O interessante na maneira como o diretor Jan Komasa direciona sua câmera é que ele nos coloca ao lado do protagonista durante o filme inteiro, como se quisesse que refletíssemos sobre o que faríamos se estivéssemos naquela mesma posição. Quando a montadora Aleksandra Gowin quebra a linha temporal para explicar como Tomasz está se sentindo, ao lidar com todo aquele menosprezo, temos uma ideia bastante clara de como o sentimento de inferioridade vai construindo um extremista que precisa ser superior em algum momento!
Logo na primeira cena do filme já temos a certeza que Jan Komasa é daqueles diretores geniais que precisamos acompanhar de perto. A sensibilidade com que ele dirigiu o ator Maciej Musialowski é impressionante. Musialowsk não vacila um minuto na construção de um criminoso dos dias de hoje - ele sabe utilizar tão bem o silêncio que antecede cada uma das suas ações que somos capazes de adivinhar exatamente o que ele está pensado (ou pesando) antes de tomar sua próxima atitude. Quando ele se aproxima do candidato Pawel Rudnicki (Maciej Stuhr) ou da sua chefe Beata Santorska (Agata Kulesza) temos absoluta certeza que se trata de uma mente psicopata em plena evolução! O interessante é que o personagem tem uma dualidade muito particular, perfeitamente alinhada a fotografia do diretor Radek Ladczuk: se nos momentos em que está sozinho, tramando suas ações, a tonalidade é mais fria, azulada, em situações sociais ela é mais quente, amarelada até!
Outro ponto que também merece destaque é o equilíbrio entre a mixagem e o desenho de som: em um determinado momento temos uma cena com uma belíssima música clássica contrastando com a força dramática que vemos na tela, bem ao estilo "Cisne Negro" - reparem! Talvez seja o ponto alto de filme e quando entendemos que tudo está muito bem conectado: direção, fotografia, atuação, trilha e, claro, roteiro!
"Rede de Ódio" parece uma história superficial, bobinha, mas pouco a pouco vamos sendo guiados por caminhos tão obscuros e inesperados, que quando nos damos conta já perdemos a noção do que é certo e do que errado, o que se justifica e o que é uma porta aberta para a loucura! Um filme que expõe os limites de uma indústria do ódio abastecida pela ferramenta das fake news que manipula e transforma qualquer pessoa menos atenta em expectadores de um circo nada amigável e quase sempre cruel! Vale a pena o seu play, já!
"Rede de Ódio" é um grande filme, com um roteiro excelente e uma direção impecável! Dito isso, fica muito fácil criar um paralelo desse filme polonês com uma produção sueca, dessa vez uma minissérie, chamada "Areia Movediça" - ambos mostram como é construída uma situação extrema de ódio, embora com objetivos diferentes, o foco não é ato em si, mas o que leva uma pessoa a cometer uma atrocidade dessas. É quase um estudo psicológico sobre os protagonistas, como se fosse peças de um quebra-cabeça que vão se juntando até alcançar o limite de uma ideologia - vale citar que o protagonista de "Rede de Ódio" dá um show (mas sobre isso vamos nos aprofundar mais a frente).
Tomasz Giemza (Maciej Musialowski) é um jovem rapaz vindo do interior da Polônia cujos estudos na faculdade de Direito são pagos pela família de Robert (Jacek Koman) e Zofia Krasucka (Danuta Stenka). Tomasz nutre uma paixão quase platônica por Gabi (Vanessa Aleksander), filha mais nova do casal, mas, apesar do aparente respeito entre eles, Tomasz descobre que é motivo de chacota ao escutar uma conversa dos Krasucka - por sua forma de ser e pelo abismo social que os separam. Ao ser expulso da faculdade, por plagiar um trabalho, Tomasz começa um emprego numa agência de publicidade especializada em eliminar a reputação dos concorrentes de seus clientes através das redes sociais. Quando ele é escalado para destruir um dos candidatos à prefeitura de Varsóvia e esse mesmo candidato é apoiado pela família de Gabi, Tomasz se vê em uma enorme oportunidade de mostrar que, mesmo humilhado pela vida, ele pode dar a volta por cima e ainda provar que não existem limites para sua ambição e competência! Confira o trailer (em inglês):
"Rede de Ódio" é uma agradável surpresa, chancelada pelo prêmio de melhor Filme Internacional no Tribeca Film Festival de 2020. Novo filme do diretor de "Corpus Christi", indicado ao último Oscar de Filme Estrangeiro, "Rede de Ódio" é um drama psicológico muito, mas muito bom! A forma como a trama vai se construindo é tão fluida que nem nos damos conta de como tudo aquilo que vemos na tela é tão próximo de nós, mesmo sendo tão surreal - é como misturar o documentário "Privacidade Hackeada" com o filme "22 July", ambos da Netflix! Olha, vale muito a pena mesmo e pode acreditar: esse filme vai te fazer refletir sobre muito dos absurdos que vivemos hoje em dia no nosso país!
O roteiro do jovem polonês Mateusz Pacewicz é uma aula de construção de personagem em apenas duas horas - é de Pacewicz o roteiro de "Corpus Christi", inclusive. Ele vai transformando Tomasz Giemza ao mesmo tempo em que vai se aprofundando em cada uma das camadas do personagem - se no inicio sentimos dó, em um determinado momento sentimos ódio e logo depois entendemos suas motivações, mas não concordamos com suas atitudes! Sim, é um ciclo de emoções que nos vai provocando até nos perguntarmos até onde Tomasz será capaz de ir para se provar como um homem de sucesso! O interessante na maneira como o diretor Jan Komasa direciona sua câmera é que ele nos coloca ao lado do protagonista durante o filme inteiro, como se quisesse que refletíssemos sobre o que faríamos se estivéssemos naquela mesma posição. Quando a montadora Aleksandra Gowin quebra a linha temporal para explicar como Tomasz está se sentindo, ao lidar com todo aquele menosprezo, temos uma ideia bastante clara de como o sentimento de inferioridade vai construindo um extremista que precisa ser superior em algum momento!
Logo na primeira cena do filme já temos a certeza que Jan Komasa é daqueles diretores geniais que precisamos acompanhar de perto. A sensibilidade com que ele dirigiu o ator Maciej Musialowski é impressionante. Musialowsk não vacila um minuto na construção de um criminoso dos dias de hoje - ele sabe utilizar tão bem o silêncio que antecede cada uma das suas ações que somos capazes de adivinhar exatamente o que ele está pensado (ou pesando) antes de tomar sua próxima atitude. Quando ele se aproxima do candidato Pawel Rudnicki (Maciej Stuhr) ou da sua chefe Beata Santorska (Agata Kulesza) temos absoluta certeza que se trata de uma mente psicopata em plena evolução! O interessante é que o personagem tem uma dualidade muito particular, perfeitamente alinhada a fotografia do diretor Radek Ladczuk: se nos momentos em que está sozinho, tramando suas ações, a tonalidade é mais fria, azulada, em situações sociais ela é mais quente, amarelada até!
Outro ponto que também merece destaque é o equilíbrio entre a mixagem e o desenho de som: em um determinado momento temos uma cena com uma belíssima música clássica contrastando com a força dramática que vemos na tela, bem ao estilo "Cisne Negro" - reparem! Talvez seja o ponto alto de filme e quando entendemos que tudo está muito bem conectado: direção, fotografia, atuação, trilha e, claro, roteiro!
"Rede de Ódio" parece uma história superficial, bobinha, mas pouco a pouco vamos sendo guiados por caminhos tão obscuros e inesperados, que quando nos damos conta já perdemos a noção do que é certo e do que errado, o que se justifica e o que é uma porta aberta para a loucura! Um filme que expõe os limites de uma indústria do ódio abastecida pela ferramenta das fake news que manipula e transforma qualquer pessoa menos atenta em expectadores de um circo nada amigável e quase sempre cruel! Vale a pena o seu play, já!
"Remédio Amargo" é mais um filme espanhol da Netflix que entra no hype para quem gosta de suspense psicológico. O grande problema, porém, é que o filme também é mais uma "sessão da tarde" e que logo será esquecido! O filme não é ruim, mas está longe de ter o impacto de "Quem com ferro fere" ou, melhor ainda, de "A Casa" - embora essas sejam ótimas referências para quem quer experimentar "Remédio Amargo", já que segue a mesma linha de narrativa!
Angel (Mário Casas) é um paramédico com caráter duvidoso, com fortes traços paranóicos e possessivos, que leva uma vida monótona com sua namorada Vane (Déborah François). Certo dia, voltando de uma ocorrência, a ambulância de Angel sofre um acidente e ele acaba ficando paraplégico. A partir daí, com a autoestima lá embaixo, ele passa a ser cada vez mais abusivo com Vane até que ela resolve deixa-lo. Inconformado, Angel se transforma em um obsessivo patológico, transformando a vida da ex-namorada em um verdadeiro inferno! Confira o trailer original:
É inegável que "El Practicante" (título original) se apoia em um amontoado de clichês de gênero e mesmo trazendo muitas referência de "Louca Obsessão" (1990), não consegue ser aproxima do nível de tensão e da potência visual que foi o filme Rob Reiner - que inclusive rendeu o Oscar de "Melhor Atriz" para Kathy Bates em 1991. Com tudo, não se pode dizer que essa produção espanhola não seja um bom entretenimento, especialmente para um público menos exigente e disposto em embarcar em uma história previsível, mas que vai render alguns bons momentos.
O roteiro de "Remédio Amargo" até se esforça, mas não surpreende. David Desola, que também esteve a frente de "O Poço", parece ter escolhido um caminho mais seguro dessa veze com isso acabou se afastando de uma identidade que parecia bastante promissora ao discutir temas difíceis com o auxílio da semiótica. Ao trazer um personagem interessante como Angel, Desola flertou com a construção de uma psiquê bem elaborada, profunda e complexa, como a de Goreng (Ivan Massagué), por exemplo, mas com o decorrer do filme, o próprio texto vai colocando o trabalho de Mário Casas no "lugar comum". As soluções narrativas são fracas e os diálogos muitos inconstantes para quem tinha a pretensão de entregar um filme denso.
A direção Carles Torras é competente, mas também sofre com o amontoado de clichês. O fato do filme se passar 80% dentro da casa de Angel não foi verdadeiramente bem aproveitado - o que eu quero dizer, é que não existe aquela sensação claustrofóbica do cárcere privado! Se faltou algo para Torras, talvez tenha sido a liberdade (ou a personalidade) de colocar um conceito mais autoral dentro daquela narrativa. Existe uma certa tensão, mas como tudo é tão óbvio, não mergulhamos naquele universo, apenas assistimos, nos divertimos e pronto! A fotografia do Juan Sebastián Vasquez e a trilha sonora até ajudam na construção do clima, mas não resolvem, ou melhor, não são suficientes para nos incomodar como pareceu ser o caso após 30 minutos de filme.
"Remédio Amargo" tem o mérito de ter uma trama envolvente e uma certa dinâmica que, de fato, conseguem nos prender - principalmente por nos colocar a dúvida de quão longe pode ir a loucura de Angel e onde esse comportamento vai acabar - e aqui cabe um comentário muito pessoal: faltou a coragem de Paco Plaza ("Quem com ferro fere") para surpreender ou nos tirar da zona de conforto com um final mais elaborado. Mais uma vez, vale o play pelo entretenimento "pipoca" do sábado chuvoso!
"Remédio Amargo" é mais um filme espanhol da Netflix que entra no hype para quem gosta de suspense psicológico. O grande problema, porém, é que o filme também é mais uma "sessão da tarde" e que logo será esquecido! O filme não é ruim, mas está longe de ter o impacto de "Quem com ferro fere" ou, melhor ainda, de "A Casa" - embora essas sejam ótimas referências para quem quer experimentar "Remédio Amargo", já que segue a mesma linha de narrativa!
Angel (Mário Casas) é um paramédico com caráter duvidoso, com fortes traços paranóicos e possessivos, que leva uma vida monótona com sua namorada Vane (Déborah François). Certo dia, voltando de uma ocorrência, a ambulância de Angel sofre um acidente e ele acaba ficando paraplégico. A partir daí, com a autoestima lá embaixo, ele passa a ser cada vez mais abusivo com Vane até que ela resolve deixa-lo. Inconformado, Angel se transforma em um obsessivo patológico, transformando a vida da ex-namorada em um verdadeiro inferno! Confira o trailer original:
É inegável que "El Practicante" (título original) se apoia em um amontoado de clichês de gênero e mesmo trazendo muitas referência de "Louca Obsessão" (1990), não consegue ser aproxima do nível de tensão e da potência visual que foi o filme Rob Reiner - que inclusive rendeu o Oscar de "Melhor Atriz" para Kathy Bates em 1991. Com tudo, não se pode dizer que essa produção espanhola não seja um bom entretenimento, especialmente para um público menos exigente e disposto em embarcar em uma história previsível, mas que vai render alguns bons momentos.
O roteiro de "Remédio Amargo" até se esforça, mas não surpreende. David Desola, que também esteve a frente de "O Poço", parece ter escolhido um caminho mais seguro dessa veze com isso acabou se afastando de uma identidade que parecia bastante promissora ao discutir temas difíceis com o auxílio da semiótica. Ao trazer um personagem interessante como Angel, Desola flertou com a construção de uma psiquê bem elaborada, profunda e complexa, como a de Goreng (Ivan Massagué), por exemplo, mas com o decorrer do filme, o próprio texto vai colocando o trabalho de Mário Casas no "lugar comum". As soluções narrativas são fracas e os diálogos muitos inconstantes para quem tinha a pretensão de entregar um filme denso.
A direção Carles Torras é competente, mas também sofre com o amontoado de clichês. O fato do filme se passar 80% dentro da casa de Angel não foi verdadeiramente bem aproveitado - o que eu quero dizer, é que não existe aquela sensação claustrofóbica do cárcere privado! Se faltou algo para Torras, talvez tenha sido a liberdade (ou a personalidade) de colocar um conceito mais autoral dentro daquela narrativa. Existe uma certa tensão, mas como tudo é tão óbvio, não mergulhamos naquele universo, apenas assistimos, nos divertimos e pronto! A fotografia do Juan Sebastián Vasquez e a trilha sonora até ajudam na construção do clima, mas não resolvem, ou melhor, não são suficientes para nos incomodar como pareceu ser o caso após 30 minutos de filme.
"Remédio Amargo" tem o mérito de ter uma trama envolvente e uma certa dinâmica que, de fato, conseguem nos prender - principalmente por nos colocar a dúvida de quão longe pode ir a loucura de Angel e onde esse comportamento vai acabar - e aqui cabe um comentário muito pessoal: faltou a coragem de Paco Plaza ("Quem com ferro fere") para surpreender ou nos tirar da zona de conforto com um final mais elaborado. Mais uma vez, vale o play pelo entretenimento "pipoca" do sábado chuvoso!
Poucas vezes você vai assistir um filme com tanta personalidade como "Réquiem para um Sonho", do incrível Darren Aronofsky (o diretor de "Mãe!"). Lançado em 2000, este filme muito impactante é capaz de nos levar para uma verdadeira montanha-russa emocional, basicamente explorando a relação de 4 personagens com as drogas e os reflexos devastadores do vício, pela perspectiva da ambição desenfreada e da busca incessante pela felicidade.
"Réquiem para um Sonho" segue quatro personagens: Harry (Jared Leto), Marion (Jennifer Connelly), Tyrone (Marlon Wayans) e Sara (Ellen Burstyn), cujas vidas são marcadas por aspirações e sonhos aparentemente inatingíveis. O filme habilmente entrelaça suas histórias enquanto eles se perdem em um labirinto de vícios, seja por drogas, amor ou fama. A narrativa cruamente realista evita o romantismo e mergulha nas profundezas sombrias das consequências dessas escolhas, resultando em um retrato visceral da fragilidade humana. Confira o trailer (em inglês):
Sem a menor dúvida que um dos pontos mais altos do filme está na direção - Aronofsky demonstra sua maestria ao utilizar uma variedade de técnicas visuais e estímulos sonoros que intensificam a nossa experiência de uma forma absurda, ao mesmo tempo em que cria uma atmosfera perturbadora para a narrativa. A montagem do Jay Rabinowitz (de "Oslo") é frenética, os cortes são rápidos e o alinhamento com a trilha sonora de Clint Mansell trabalham com tanta sinergia que acabam criando um ritmo muito particular, alucinante, eu diria; potencializando ainda mais a crescente ansiedade dos personagens. Reparem como a escolha dos enquadramentos e do uso de câmeras subjetivas são cirúrgicos, contribuindo para uma imersão profunda pela intimidade dos protagonistas, nos tornando uma espécie de cúmplice de suas tragédias.
O elenco é um show a parte, entregando performances que ecoam a angústia da narrativa de maneira poderosa. Jared Leto, Jennifer Connelly, Marlon Wayans e especialmente Ellen Burstyn (indicada ao Oscar pelo papel) transmitem a dor, a esperança e a desolação de seus personagens de maneira crua e autêntica. É o compromisso dessas atuações que nos permite a conexão emocional em uma espiral descendente, entendendo suas lutas e percebendo como elas são devastadoras.
"Réquiem para um Sonho", de fato, não é um filme fácil de assistir. Sua exploração sem concessões da realidade brutal do vício (e de seus reflexos) pode ser perturbador para muita gente - então cuidado. No entanto, é justamente por esse impacto emocional que o filme se torna tão memorável. Ao melhor estilo Aronofsky, o filme não apenas levanta questões sobre as escolhas individuais, mas também sobre a natureza da esperança e da busca pela felicidade em um mundo muitas vezes indiferente e implacável. Sua abordagem corajosa ao tratar de temas complexos e desconfortáveis torna a jornada um ponto de referência na exploração cinematográfica das sombras da psique humana.
Em um filme que transcende as barreiras do entretenimento tradicional, que exige reflexão e empatia, não existe a menor chance de não recomendar o play já com o status de "obra-prima"!
Poucas vezes você vai assistir um filme com tanta personalidade como "Réquiem para um Sonho", do incrível Darren Aronofsky (o diretor de "Mãe!"). Lançado em 2000, este filme muito impactante é capaz de nos levar para uma verdadeira montanha-russa emocional, basicamente explorando a relação de 4 personagens com as drogas e os reflexos devastadores do vício, pela perspectiva da ambição desenfreada e da busca incessante pela felicidade.
"Réquiem para um Sonho" segue quatro personagens: Harry (Jared Leto), Marion (Jennifer Connelly), Tyrone (Marlon Wayans) e Sara (Ellen Burstyn), cujas vidas são marcadas por aspirações e sonhos aparentemente inatingíveis. O filme habilmente entrelaça suas histórias enquanto eles se perdem em um labirinto de vícios, seja por drogas, amor ou fama. A narrativa cruamente realista evita o romantismo e mergulha nas profundezas sombrias das consequências dessas escolhas, resultando em um retrato visceral da fragilidade humana. Confira o trailer (em inglês):
Sem a menor dúvida que um dos pontos mais altos do filme está na direção - Aronofsky demonstra sua maestria ao utilizar uma variedade de técnicas visuais e estímulos sonoros que intensificam a nossa experiência de uma forma absurda, ao mesmo tempo em que cria uma atmosfera perturbadora para a narrativa. A montagem do Jay Rabinowitz (de "Oslo") é frenética, os cortes são rápidos e o alinhamento com a trilha sonora de Clint Mansell trabalham com tanta sinergia que acabam criando um ritmo muito particular, alucinante, eu diria; potencializando ainda mais a crescente ansiedade dos personagens. Reparem como a escolha dos enquadramentos e do uso de câmeras subjetivas são cirúrgicos, contribuindo para uma imersão profunda pela intimidade dos protagonistas, nos tornando uma espécie de cúmplice de suas tragédias.
O elenco é um show a parte, entregando performances que ecoam a angústia da narrativa de maneira poderosa. Jared Leto, Jennifer Connelly, Marlon Wayans e especialmente Ellen Burstyn (indicada ao Oscar pelo papel) transmitem a dor, a esperança e a desolação de seus personagens de maneira crua e autêntica. É o compromisso dessas atuações que nos permite a conexão emocional em uma espiral descendente, entendendo suas lutas e percebendo como elas são devastadoras.
"Réquiem para um Sonho", de fato, não é um filme fácil de assistir. Sua exploração sem concessões da realidade brutal do vício (e de seus reflexos) pode ser perturbador para muita gente - então cuidado. No entanto, é justamente por esse impacto emocional que o filme se torna tão memorável. Ao melhor estilo Aronofsky, o filme não apenas levanta questões sobre as escolhas individuais, mas também sobre a natureza da esperança e da busca pela felicidade em um mundo muitas vezes indiferente e implacável. Sua abordagem corajosa ao tratar de temas complexos e desconfortáveis torna a jornada um ponto de referência na exploração cinematográfica das sombras da psique humana.
Em um filme que transcende as barreiras do entretenimento tradicional, que exige reflexão e empatia, não existe a menor chance de não recomendar o play já com o status de "obra-prima"!
Uma ficção científica com alma! Não existe outra maneira de definir uma das maiores e melhores surpresas de 2023 - o filme "Resistência". O novo projeto de Gareth Edwards (de "Rogue One: Uma História Star Wars" e "Godzilla") chegou quietinho, mas logo de cara se mostrou uma experiência cinematográfica imperdível, equilibrando perfeitamente a ação com a reflexão em um futuro distópico. Ao explorar as consequências da guerra entre humanos e a tecnologia, especialmente a tão comentada inteligência artificial, o filme traz uma mensagem poderosa sobre a nossa humanidade e o valor das relações, algo como vimos em "I am Mother" e em "Devs" - só para citar duas obras imperdíveis disponíveis no streaming.
"Resistência" conta a história de Joshua (John David Washington), um ex-agente das forças especiais dos EUA que é recrutado para uma missão perigosa: caçar e eliminar o Criador, o arquiteto por trás de uma inteligência artificial avançada que desenvolveu uma arma misteriosa capaz de acabar com a soberania bélica americana em uma guerra contra o Oriente que pode custar a extinção de toda a humanidade. Confira o trailer:
Embora a sinopse possa parecer algo simples e talvez até um pouco batido, você não vai precisar mais do que quinze minutos para entender que o filme é muito mais profundo e interessante do que uma trama onde o "bem" luta contra o "mal" em pró da salvação do planeta e de sua raça. Edwards, com todo o seu talento para estabelecer universos bastante caóticos e visualmente requintados, cria uma narrativa complexa e envolvente, que explora temas como a natureza da inteligência artificial, o papel da humanidade no futuro e a importância da empatia, misturando a gramática da ação de filmes como "Distrito 9" e a poesia cheia de simbolismos, como encontramos em "Contos do Loop", por exemplo.
O roteiro, escrito por Edwards e Chris Weitz (também de "Rogue One") é bem planejado para explorar temas mais espinhosos sem ser expositivo demais - a passagem sobre a bomba atômica que dizimou Los Angeles sendo contata por quem foi acusado de começar uma guerra é simplesmente genial. Provocativo na medida certa sem esquecer do entretenimento do gênero, "Resistência" pontua o valor politico daquela relação entre humanos e máquinas enquanto seu subtexto discute o conceito de livre arbítrio e da natureza predadora da guerra. Com cenas de ação eletrizantes, Edwards também sabe da importância de imprimir um tom reflexivo à obra pra colocar sua narrativa e conceito estético em outro patamar - e consegue!
A fotografia de Greig Fraser (de "Duna" e "The Madalorian") é deslumbrante, enquanto a trilha sonora do mestre Hans Zimmer (de "A Origem") é proporcionalmente emocionante. As atuações de John David Washington como Joshua e da jovem Madeleine Yuna Voyles como Alphie, completam a receita do que há de melhor em ficção cientifica com o bônus de um desenho de produção e um CGI realmente impressionantes. Dito isso fica fácil perceber que estamos falando de um filme digno de Oscar, daqueles que ficam na nossa cabeça por muito tempo, testam a nossa humanidade e nos faz refletir sobre o futuro que nos espera.
"The Creator" (no original) é realmente imperdível!
Uma ficção científica com alma! Não existe outra maneira de definir uma das maiores e melhores surpresas de 2023 - o filme "Resistência". O novo projeto de Gareth Edwards (de "Rogue One: Uma História Star Wars" e "Godzilla") chegou quietinho, mas logo de cara se mostrou uma experiência cinematográfica imperdível, equilibrando perfeitamente a ação com a reflexão em um futuro distópico. Ao explorar as consequências da guerra entre humanos e a tecnologia, especialmente a tão comentada inteligência artificial, o filme traz uma mensagem poderosa sobre a nossa humanidade e o valor das relações, algo como vimos em "I am Mother" e em "Devs" - só para citar duas obras imperdíveis disponíveis no streaming.
"Resistência" conta a história de Joshua (John David Washington), um ex-agente das forças especiais dos EUA que é recrutado para uma missão perigosa: caçar e eliminar o Criador, o arquiteto por trás de uma inteligência artificial avançada que desenvolveu uma arma misteriosa capaz de acabar com a soberania bélica americana em uma guerra contra o Oriente que pode custar a extinção de toda a humanidade. Confira o trailer:
Embora a sinopse possa parecer algo simples e talvez até um pouco batido, você não vai precisar mais do que quinze minutos para entender que o filme é muito mais profundo e interessante do que uma trama onde o "bem" luta contra o "mal" em pró da salvação do planeta e de sua raça. Edwards, com todo o seu talento para estabelecer universos bastante caóticos e visualmente requintados, cria uma narrativa complexa e envolvente, que explora temas como a natureza da inteligência artificial, o papel da humanidade no futuro e a importância da empatia, misturando a gramática da ação de filmes como "Distrito 9" e a poesia cheia de simbolismos, como encontramos em "Contos do Loop", por exemplo.
O roteiro, escrito por Edwards e Chris Weitz (também de "Rogue One") é bem planejado para explorar temas mais espinhosos sem ser expositivo demais - a passagem sobre a bomba atômica que dizimou Los Angeles sendo contata por quem foi acusado de começar uma guerra é simplesmente genial. Provocativo na medida certa sem esquecer do entretenimento do gênero, "Resistência" pontua o valor politico daquela relação entre humanos e máquinas enquanto seu subtexto discute o conceito de livre arbítrio e da natureza predadora da guerra. Com cenas de ação eletrizantes, Edwards também sabe da importância de imprimir um tom reflexivo à obra pra colocar sua narrativa e conceito estético em outro patamar - e consegue!
A fotografia de Greig Fraser (de "Duna" e "The Madalorian") é deslumbrante, enquanto a trilha sonora do mestre Hans Zimmer (de "A Origem") é proporcionalmente emocionante. As atuações de John David Washington como Joshua e da jovem Madeleine Yuna Voyles como Alphie, completam a receita do que há de melhor em ficção cientifica com o bônus de um desenho de produção e um CGI realmente impressionantes. Dito isso fica fácil perceber que estamos falando de um filme digno de Oscar, daqueles que ficam na nossa cabeça por muito tempo, testam a nossa humanidade e nos faz refletir sobre o futuro que nos espera.
"The Creator" (no original) é realmente imperdível!
"Rua Cloverfield, 10" é realmente um drama dos mais envolventes justamente por não respeitar os limites de gênero - se em um primeiro momento achamos que estamos imersos em um profundo e tenso drama psicológico, em algum momento você terá a certeza de que se trata mesmo é de um angustiante thriller de suspense até que finalmente somos arremessados em uma bem estruturada e empolgante ficção cientifica! O fato é que se você é fã de cinema-raiz e valoriza histórias, de fato, cativantes, "Rua Cloverfield, 10" não deve (e não pode) passar despercebido. Dirigido por Dan Trachtenberg (de "O Predador: A Caçada"), o filme se destaca pela sua narrativa intrigante com que discute as nuances mais cruéis da "Arte da Sobrevivência".
Michelle (Mary Elizabeth Winstead) é uma mulher que, após um acidente de carro, acorda em um bunker subterrâneo com um estranho chamado Howard (John Goodman). Howard alega que o mundo exterior foi devastado por um ataque químico e que eles são os únicos sobreviventes. Com a incerteza pairando no ar, Michelle e um terceiro habitante, Emmett (John Gallagher Jr.), devem aprender a confiar um no outro enquanto tentam descobrir a verdade sobre o que realmente aconteceu lá fora. Confira o trailer:
É inegável;l que "Rua Cloverfield, 10" se destaca mesmo é por sua habilidade em criar uma atmosfera realmente tensa, intensa e claustrofóbica. A direção de Trachtenberg se aproveita da premissa do desconhecido e do gatilho da dúvida para construir uma narrativa excepcional, conseguindo nos manter em um nível de tensão que só cresce ao longo do filme - e isso é raríssimo (lembram de "Sinais"?)! A fotografia do Jeff Cutter (de "Daisy Jones & The Six") se concentra basicamente dentro de um bunker escuro e misterioso, fazendo com que suas lentes amplifiquem a sensação de isolamento e de paranoia dos personagens de uma maneira impressionante. A performance de John Goodman é verdadeiramente arrepiante, ele incorpora perfeitamente a complexidade de seu personagem, alternando entre momentos de compaixão e ameaça - essa dualidade de Howard é justamente o que nos faz entender o tamanho do drama de Michelle.
A trilha sonora, composta pelo genial Bear McCreary (de "Da Vinci's Demons", "Outlander" e muitos outros) adiciona camadas puramente emocionais à narrativa, aumentando ainda mais a sensação de perigo iminente. Os detalhes meticulosos na direção Trachtenberg se confundem com as performances do elenco, com a enorme capacidade da produção em nos colocar dentro de um cenário catastrófico que vai desde aquele bunker até os efeitos especiais que experienciamos no terceiro ato - a contribuição dessa harmonia de elementos técnicos e artísticos para a autenticidade da história, mesmo sendo uma ficção cientifica, é genial.
Dito isso, é muito fácil atestar que o que torna "Rua Cloverfield, 10" ainda mais fascinante, certamente, é a forma como o roteiro desafia as nossas expectativas e brinca com a nossa percepção de realidade. A trama é repleta de reviravoltas surpreendentes que nos mantêm constantemente intrigados e ansiosos por respostas - que muitas vezes podem não vir (então não espere uma jornada fácil ou didática demais). Reparem como a desconstrução gradual da personagem de Michelle é particularmente interessante - a medida que ela passa de uma vítima assustada para uma protagonista resiliente, ganhamos ainda mais em ação e emoção! Esse é o tom!
"Rua Cloverfield, 10" é um verdadeiro retrato sobre a luta pela sobrevivência em meio ao caos e pelo real sentido da vida! Vale muito o seu play!
"Rua Cloverfield, 10" é realmente um drama dos mais envolventes justamente por não respeitar os limites de gênero - se em um primeiro momento achamos que estamos imersos em um profundo e tenso drama psicológico, em algum momento você terá a certeza de que se trata mesmo é de um angustiante thriller de suspense até que finalmente somos arremessados em uma bem estruturada e empolgante ficção cientifica! O fato é que se você é fã de cinema-raiz e valoriza histórias, de fato, cativantes, "Rua Cloverfield, 10" não deve (e não pode) passar despercebido. Dirigido por Dan Trachtenberg (de "O Predador: A Caçada"), o filme se destaca pela sua narrativa intrigante com que discute as nuances mais cruéis da "Arte da Sobrevivência".
Michelle (Mary Elizabeth Winstead) é uma mulher que, após um acidente de carro, acorda em um bunker subterrâneo com um estranho chamado Howard (John Goodman). Howard alega que o mundo exterior foi devastado por um ataque químico e que eles são os únicos sobreviventes. Com a incerteza pairando no ar, Michelle e um terceiro habitante, Emmett (John Gallagher Jr.), devem aprender a confiar um no outro enquanto tentam descobrir a verdade sobre o que realmente aconteceu lá fora. Confira o trailer:
É inegável;l que "Rua Cloverfield, 10" se destaca mesmo é por sua habilidade em criar uma atmosfera realmente tensa, intensa e claustrofóbica. A direção de Trachtenberg se aproveita da premissa do desconhecido e do gatilho da dúvida para construir uma narrativa excepcional, conseguindo nos manter em um nível de tensão que só cresce ao longo do filme - e isso é raríssimo (lembram de "Sinais"?)! A fotografia do Jeff Cutter (de "Daisy Jones & The Six") se concentra basicamente dentro de um bunker escuro e misterioso, fazendo com que suas lentes amplifiquem a sensação de isolamento e de paranoia dos personagens de uma maneira impressionante. A performance de John Goodman é verdadeiramente arrepiante, ele incorpora perfeitamente a complexidade de seu personagem, alternando entre momentos de compaixão e ameaça - essa dualidade de Howard é justamente o que nos faz entender o tamanho do drama de Michelle.
A trilha sonora, composta pelo genial Bear McCreary (de "Da Vinci's Demons", "Outlander" e muitos outros) adiciona camadas puramente emocionais à narrativa, aumentando ainda mais a sensação de perigo iminente. Os detalhes meticulosos na direção Trachtenberg se confundem com as performances do elenco, com a enorme capacidade da produção em nos colocar dentro de um cenário catastrófico que vai desde aquele bunker até os efeitos especiais que experienciamos no terceiro ato - a contribuição dessa harmonia de elementos técnicos e artísticos para a autenticidade da história, mesmo sendo uma ficção cientifica, é genial.
Dito isso, é muito fácil atestar que o que torna "Rua Cloverfield, 10" ainda mais fascinante, certamente, é a forma como o roteiro desafia as nossas expectativas e brinca com a nossa percepção de realidade. A trama é repleta de reviravoltas surpreendentes que nos mantêm constantemente intrigados e ansiosos por respostas - que muitas vezes podem não vir (então não espere uma jornada fácil ou didática demais). Reparem como a desconstrução gradual da personagem de Michelle é particularmente interessante - a medida que ela passa de uma vítima assustada para uma protagonista resiliente, ganhamos ainda mais em ação e emoção! Esse é o tom!
"Rua Cloverfield, 10" é um verdadeiro retrato sobre a luta pela sobrevivência em meio ao caos e pelo real sentido da vida! Vale muito o seu play!
Sabe aquele episódio de "Black Mirror" que daria uma excelente série se fosse desenvolvido com mais calma, com ótimos personagens e ainda um arco cheio de mistério para "Iniciativa Dharma" alguma colocar defeito? Pois é, temos! "Ruptura", nova série da AppleTV+, é uma jóia para quem gosta de um drama bem construído, com elementos de ficção cientifica (com alma!) ao melhor estilo "Brilho Eterno de uma Mente Sem Lembranças", cheio de camadas e muito bem dirigido pela talentosa Aoife McArdle e pelo, acreditem, Ben Stiller - tudo isso baseado na criação de um estreante, o surpreendente Dan Erickson (guardem esse nome)!
Na trama conhecemos a história de alguns funcionários de uma empresa de tecnologia chamada Lumon. Sem muitas explicações, eles aceitam fazer um procedimento chamado de Severance, ou seja, eles separam suas personalidades em duas: uma que representa um funcionário exclusivo da Lumon e outra que é a pessoa que eles realmente são na vida real. O intrigante é que uma versão não sabe da outra, fazendo com que a mesma pessoa, viva em duas realidades distintas. Confira o trailer:
Em tempos pós-pandemia "Ruptura" tem um texto muito inteligente, cheio de críticas à tecnologia e, principalmente, perante nossas dinâmicas através dela. Claramente cheia de alegorias, muito bem colocadas e sempre cercada de muita ironia, o roteiro transforma o cotidiano dos personagens em uma espécie de prisão corporativista, explorando uma rotina exaustiva e completamente alienada que serve como fuga para o "eu" real - curioso como conhecemos muitas pessoas assim, não?
Mark (Adam Scott) resolveu fazer a ruptura para esquecer por 8 horas que sua mulher morreu em um acidente de carro, porém o mistério acompanha todos os outros personagens: seja a chefona durona totalmente non-sense, Harmony (Patricia Arquette), até o funcionário modelo Irving (John Turturro), ou o excêntrico Dylan (Zach Cherry) e a rebelde nova funcionária Holly (Britt Lower) - o elenco é tão incrível que eu já separaria muitos prêmios no próximo Emmy. Isso porque eu nem citei o impagável segurança Milchick (Tramell Tillman).
Outro ponto que merece sua atenção diz respeito ao desenho de produção: o ambiente criado pelo Jeremy Hindle ("A hora mais escura") é genial - uma verdadeira folha em branco, cheia de corredores e totalmente desprovido de vida - o movimento de câmera acompanhando os atores pelos longos corredores dá a exata impressão de que todos são ratos de laboratório num labirinto interminável. Chega a ser claustrofóbico! Aliás a sensação de vazio que o cenário nos passa é impressionante - eu diria que essa configuração visual é tão impactante e importante que pode ser considerado um personagem.
Antes de finalizar, é preciso dizer que "Ruptura" tem uma narrativa bastante cadenciada, o que pode dar a impressão que a história não está indo para lugar algum - esquece, pois tudo (eu disse "tudo") tem uma razão de estar em cena. Todo diálogo é importante. E toda pergunta parece ter uma resposta - os dois últimos episódios dão uma boa ideia de como essa série pode entrar para a história. Sem exageros, "Ruptura" é uma das melhores coisas que assisti em muitos anos - desde o cuidado técnico para nos mergulhar em inúmeras alegorias e mistérios até os subtextos críticos e filosóficos em torno de temas profundamente realistas e atuais.
Vale muito seu play!
Sabe aquele episódio de "Black Mirror" que daria uma excelente série se fosse desenvolvido com mais calma, com ótimos personagens e ainda um arco cheio de mistério para "Iniciativa Dharma" alguma colocar defeito? Pois é, temos! "Ruptura", nova série da AppleTV+, é uma jóia para quem gosta de um drama bem construído, com elementos de ficção cientifica (com alma!) ao melhor estilo "Brilho Eterno de uma Mente Sem Lembranças", cheio de camadas e muito bem dirigido pela talentosa Aoife McArdle e pelo, acreditem, Ben Stiller - tudo isso baseado na criação de um estreante, o surpreendente Dan Erickson (guardem esse nome)!
Na trama conhecemos a história de alguns funcionários de uma empresa de tecnologia chamada Lumon. Sem muitas explicações, eles aceitam fazer um procedimento chamado de Severance, ou seja, eles separam suas personalidades em duas: uma que representa um funcionário exclusivo da Lumon e outra que é a pessoa que eles realmente são na vida real. O intrigante é que uma versão não sabe da outra, fazendo com que a mesma pessoa, viva em duas realidades distintas. Confira o trailer:
Em tempos pós-pandemia "Ruptura" tem um texto muito inteligente, cheio de críticas à tecnologia e, principalmente, perante nossas dinâmicas através dela. Claramente cheia de alegorias, muito bem colocadas e sempre cercada de muita ironia, o roteiro transforma o cotidiano dos personagens em uma espécie de prisão corporativista, explorando uma rotina exaustiva e completamente alienada que serve como fuga para o "eu" real - curioso como conhecemos muitas pessoas assim, não?
Mark (Adam Scott) resolveu fazer a ruptura para esquecer por 8 horas que sua mulher morreu em um acidente de carro, porém o mistério acompanha todos os outros personagens: seja a chefona durona totalmente non-sense, Harmony (Patricia Arquette), até o funcionário modelo Irving (John Turturro), ou o excêntrico Dylan (Zach Cherry) e a rebelde nova funcionária Holly (Britt Lower) - o elenco é tão incrível que eu já separaria muitos prêmios no próximo Emmy. Isso porque eu nem citei o impagável segurança Milchick (Tramell Tillman).
Outro ponto que merece sua atenção diz respeito ao desenho de produção: o ambiente criado pelo Jeremy Hindle ("A hora mais escura") é genial - uma verdadeira folha em branco, cheia de corredores e totalmente desprovido de vida - o movimento de câmera acompanhando os atores pelos longos corredores dá a exata impressão de que todos são ratos de laboratório num labirinto interminável. Chega a ser claustrofóbico! Aliás a sensação de vazio que o cenário nos passa é impressionante - eu diria que essa configuração visual é tão impactante e importante que pode ser considerado um personagem.
Antes de finalizar, é preciso dizer que "Ruptura" tem uma narrativa bastante cadenciada, o que pode dar a impressão que a história não está indo para lugar algum - esquece, pois tudo (eu disse "tudo") tem uma razão de estar em cena. Todo diálogo é importante. E toda pergunta parece ter uma resposta - os dois últimos episódios dão uma boa ideia de como essa série pode entrar para a história. Sem exageros, "Ruptura" é uma das melhores coisas que assisti em muitos anos - desde o cuidado técnico para nos mergulhar em inúmeras alegorias e mistérios até os subtextos críticos e filosóficos em torno de temas profundamente realistas e atuais.
Vale muito seu play!
"Servant", série da Apple TV+, já havia me chamado a atenção desde os primeiros teasers até seu trailer final. Primeiro por ser um suspense psicológico - gênero que eu gosto muito - e depois por ter M. Night Shyamalan como produtor executivo. Claro que a sinopse misteriosa ajudou a criar uma certa expectativa pelo seu lançamento e conforme as informações sobre a história foram surgindo, mais dúvidas do que certezas rodearam o projeto.
Pois bem, "Servant" conta o drama de Dorothy e Sean Turner que vivem o drama da perda repentina do filho de treze semanas, Jericho. Com um intuito terapêutico, Dorothy passa a se relacionar com um boneco, um bebê ultra realista, como se fosse seu filho real - e o bizarro não para por aí: para valorizar ainda mais o tratamento, o casal é orientado a contratar um babá para tornar o dia a dia bem próximo da realidade, acontece que a nova contratada começa a agir de uma forma tão estranha quanto Dorothy, o que acaba incomodando Sean e interferindo perigosamente na relação do casal. O que eu disser a partir daqui pode soar como spolier, então vou sugerir que você assista a série se gostar de um suspense bem montado e muito instigante. Vale ressaltar que os episódios são de 30 minutos, o que nos convida a sempre assistir o próximo episódio, pois a trama vai envolvendo e a curiosidade só aumenta conforme algumas respostas vão sendo colocadas pelo roteiro. Ah, sobre a dúvida que o projeto está gerando? Simples, é muito difícil que a série seja capaz de manter esse clima dos primeiros episódios durante as 6 temporadas prometidas por Shyamalan. Parece não ter fôlego para isso, mas é preciso esperar; enquanto isso a diversão está garantida!
Embora eu não tenha conseguido parar de assistir, algumas coisas me incomodaram em "Servant". A primeira é o fato do M. Night Shyamalan só ter dirigido o primeiro episódio - eu sei que é inviável um diretor como ele se comprometer com a direção do projeto inteiro, mas a diferença na gramática cinematográfica do primeiro episódio para os demais é enorme! Shyamalan é um dos diretores mais criativos que acompanho. Já comentei aquio quanto admiro sua capacidade de contar uma história sem a necessidade de ficar trocando a câmera de lugar em todo momento - ele tem um estilo muito claro e isso me fascina! Nos demais episódios, toda essa inventividade some e o "arroz com feijão" (muito bem feito, ok) impera! Não sei, faltou uma unidade conceitual - vou dar um exemplo: existe uma cena no episódio 1 onde o casal está conversando na cozinha. A câmera fica fixa na ponta da mesa e o atores entram e saem de quadro a todo momento, nem vemos o rosto deles direito, mas o diálogo não para e isso nos gera uma sensação ruim (bem alinhado com o mood da série). Outro detalhe, Shyamalan brinca muito com os planos fechados (close) durante alguns diálogos e isso dá uma certa sensação de claustrofobia - mais uma vez extremamente alinhado ao conceito narrativo na série que se passa 90% dentro do mesmo lugar: uma casa escura, elegante, porém decadente. A fotografia de Mike Gioulakis está espetacular - ele brinca com a sombra como ninguém (basta lembrar de "Nós"), mas isso é a única coisa que fica, o resto simplesmente desaparece nos demais episódios - uma pena!
A outra coisa que me incomoda é que a história que a série se propõe contar, termina logo depois do primeiro episódio e a partir daí o problema continua, mas o elemento mais aterrorizante some - ok, acho até que o roteiro soube trabalhar com isso, mas se você viu o teaser e depois o trailer, a entrega perde o sentido. O suspense psicológico está ali, elementos sobrenaturais são parcialmente descartados (pelo menos até agora) e o bizarro se transforma em paranóia. Em contraponto, o clima envolvente merece ser elogiado, percebemos nos episódios uma certa sensação de ameaça constante, sem saber exatamente quem é o inimigo (ou onde ele está), aproveitando uma atmosfera que provoca a nossa imaginação - é impossível ter certeza sobre o que, exatamente, está acontecendo ali!
Os atores estão ótimos: Dorothy (Lauren Ambrose de Arquivo X) está sensacional como uma "mãe" que não entende o que a maternidade representa, pelo simples fato do seu filho não existir - ela sabe, mas não aceita ou ignora! É interessante como ela se apoia no trabalho como repórter para se colocar acima do marido Sean (Toby Kebbell de Black Mirror) um inseguro crítico e consultor gastronômico - reparem nas reportagens de Dorothy: é possível perceber um desequilíbrio que só justifica suas ações dentro de casa. E em Sean, como ele se relaciona com suas criações - o sorvete de lagosta é um ótimo exemplo. A Trilha Sonora é quase um personagem, mérito de Trevor Gureckis (de Bloodline) - muito presente, ela pontua cada momento da história!
"Servant" é o tipo da série que adoramos assistir, discutir, tentar adivinhar o que tudo aquilo representa, mas é também uma incógnita - daquelas que normalmente nos frustramos com o final. Vamos aguardar e acompanhar tudo com muita atenção! O que eu posso garantir, hoje, é que "Servant" é um excelente entretenimento e nos envolve com sua trama logo de cara. Vale a pena!
"Servant", série da Apple TV+, já havia me chamado a atenção desde os primeiros teasers até seu trailer final. Primeiro por ser um suspense psicológico - gênero que eu gosto muito - e depois por ter M. Night Shyamalan como produtor executivo. Claro que a sinopse misteriosa ajudou a criar uma certa expectativa pelo seu lançamento e conforme as informações sobre a história foram surgindo, mais dúvidas do que certezas rodearam o projeto.
Pois bem, "Servant" conta o drama de Dorothy e Sean Turner que vivem o drama da perda repentina do filho de treze semanas, Jericho. Com um intuito terapêutico, Dorothy passa a se relacionar com um boneco, um bebê ultra realista, como se fosse seu filho real - e o bizarro não para por aí: para valorizar ainda mais o tratamento, o casal é orientado a contratar um babá para tornar o dia a dia bem próximo da realidade, acontece que a nova contratada começa a agir de uma forma tão estranha quanto Dorothy, o que acaba incomodando Sean e interferindo perigosamente na relação do casal. O que eu disser a partir daqui pode soar como spolier, então vou sugerir que você assista a série se gostar de um suspense bem montado e muito instigante. Vale ressaltar que os episódios são de 30 minutos, o que nos convida a sempre assistir o próximo episódio, pois a trama vai envolvendo e a curiosidade só aumenta conforme algumas respostas vão sendo colocadas pelo roteiro. Ah, sobre a dúvida que o projeto está gerando? Simples, é muito difícil que a série seja capaz de manter esse clima dos primeiros episódios durante as 6 temporadas prometidas por Shyamalan. Parece não ter fôlego para isso, mas é preciso esperar; enquanto isso a diversão está garantida!
Embora eu não tenha conseguido parar de assistir, algumas coisas me incomodaram em "Servant". A primeira é o fato do M. Night Shyamalan só ter dirigido o primeiro episódio - eu sei que é inviável um diretor como ele se comprometer com a direção do projeto inteiro, mas a diferença na gramática cinematográfica do primeiro episódio para os demais é enorme! Shyamalan é um dos diretores mais criativos que acompanho. Já comentei aquio quanto admiro sua capacidade de contar uma história sem a necessidade de ficar trocando a câmera de lugar em todo momento - ele tem um estilo muito claro e isso me fascina! Nos demais episódios, toda essa inventividade some e o "arroz com feijão" (muito bem feito, ok) impera! Não sei, faltou uma unidade conceitual - vou dar um exemplo: existe uma cena no episódio 1 onde o casal está conversando na cozinha. A câmera fica fixa na ponta da mesa e o atores entram e saem de quadro a todo momento, nem vemos o rosto deles direito, mas o diálogo não para e isso nos gera uma sensação ruim (bem alinhado com o mood da série). Outro detalhe, Shyamalan brinca muito com os planos fechados (close) durante alguns diálogos e isso dá uma certa sensação de claustrofobia - mais uma vez extremamente alinhado ao conceito narrativo na série que se passa 90% dentro do mesmo lugar: uma casa escura, elegante, porém decadente. A fotografia de Mike Gioulakis está espetacular - ele brinca com a sombra como ninguém (basta lembrar de "Nós"), mas isso é a única coisa que fica, o resto simplesmente desaparece nos demais episódios - uma pena!
A outra coisa que me incomoda é que a história que a série se propõe contar, termina logo depois do primeiro episódio e a partir daí o problema continua, mas o elemento mais aterrorizante some - ok, acho até que o roteiro soube trabalhar com isso, mas se você viu o teaser e depois o trailer, a entrega perde o sentido. O suspense psicológico está ali, elementos sobrenaturais são parcialmente descartados (pelo menos até agora) e o bizarro se transforma em paranóia. Em contraponto, o clima envolvente merece ser elogiado, percebemos nos episódios uma certa sensação de ameaça constante, sem saber exatamente quem é o inimigo (ou onde ele está), aproveitando uma atmosfera que provoca a nossa imaginação - é impossível ter certeza sobre o que, exatamente, está acontecendo ali!
Os atores estão ótimos: Dorothy (Lauren Ambrose de Arquivo X) está sensacional como uma "mãe" que não entende o que a maternidade representa, pelo simples fato do seu filho não existir - ela sabe, mas não aceita ou ignora! É interessante como ela se apoia no trabalho como repórter para se colocar acima do marido Sean (Toby Kebbell de Black Mirror) um inseguro crítico e consultor gastronômico - reparem nas reportagens de Dorothy: é possível perceber um desequilíbrio que só justifica suas ações dentro de casa. E em Sean, como ele se relaciona com suas criações - o sorvete de lagosta é um ótimo exemplo. A Trilha Sonora é quase um personagem, mérito de Trevor Gureckis (de Bloodline) - muito presente, ela pontua cada momento da história!
"Servant" é o tipo da série que adoramos assistir, discutir, tentar adivinhar o que tudo aquilo representa, mas é também uma incógnita - daquelas que normalmente nos frustramos com o final. Vamos aguardar e acompanhar tudo com muita atenção! O que eu posso garantir, hoje, é que "Servant" é um excelente entretenimento e nos envolve com sua trama logo de cara. Vale a pena!
"Shirley" é um filme difícil, com uma narrativa truncada e um ar independente conceitualmente - aliás, é isso que vai fazer com que as pessoas amem ou odeiem essa cinebiografia produzida por Martin Scorsese e dirigia pela talentosa Josephine Decker. Apenas contextualizando, Shirley Jackson foi a escritora responsável pela obra "A Assombração da Casa da Colina", escrito em 1959 e que em 2018 ganhou uma adaptação pela mãos de Mike Flanagan para a Netflix com o título de "A Maldição da Residência Hill" - vale dizer que até hoje essa é considerada uma das maiores obras de terror do século XX.
Em "Shirley" temos um recorte da mente perturbada da escritora (Elisabeth Moss), que se apoia no gênero de terror para enfrentar seus mais profundos fantasmas em uma realidade completamente machista personificada pelo seu marido Stanley Hyman (Michael Stuhlbarg), um professor universitário cínico e prepotente em relação à ela, mas extremamente querido pela comunidade acadêmica local. Ambos abrigam um jovem casal e é a partir da aproximação com Rose (Odessa Young) que a escritora encontra uma real inspiração para o seu novo projeto, o romance "Hangsaman". Confira o trailer (em inglês):
Embora "Shirley" seja uma biografia (muito perturbadora), a diretora Josephine Decker trabalha muito bem os elementos dramáticos com uma pitada de suspense psicológico que o roteiro de Sarah Gubbins, que é baseado no livro de Susan Scarf Merrell, propõe. Veja, o filme basicamente se passa dentro da casa de "Shirley" onde muito das cenas são filmadas com lentes bem fechadas, ou seja, existe uma sensação de claustrofobia na mesma medida que a própria narrativa vai nos provocando uma sensação de angustia avassaladora.
Se algumas escolhas Decker privilegiam o conceito narrativo mais denso, pode ter certeza que a veracidade de algumas situações estarão sempre em dúvida, por outro lado, essas mesmas situações vão estabelecer um ar mais autoral ao filme sem perder a essência, mesmo que antecipando alguns gatilhos. Eu explico: Shirley Jackson sofria de agorafobia, o que justifica todas as passagens do roteiro sobre o seu medo de sair de casa e até de priorizar a reclusão; porém essa condição foi desenvolvida mais para os anos 60, bem depois dos acontecimentos que assistimos no filme.
O fato é que todas as licenças que o filme se apropria estão completamente alinhas com a condução de Decker e isso merece muitos elogios - desde a montagem fragmentada de David Barker (de "Birds of Paradise") até a fotografia do genial Sturla Brandth Grøvlen (de "Victoria" e "Drunk") que é pautada nos incômodos planos detalhes das situações. Sobre o elenco, obviamente que Elisabeth Moss dá mais um show, mas fica impossível não citar o trabalho de Michael Stuhlbarg - perfeito!
A vida de Shirley Jackson, que se tornou leitura obrigatória em escolas americanas, soa tão perturbadora quanto suas histórias e o recorte que assistimos em "Shirley" nos traz uma boa noção dessa jornada criativa que influenciou nomes como Stephen King e Neil Gaiman. Agora esteja atento, pois o filme é muito desconfortável porque exibe, sem cortes, como o machismo pode afetar a vida de mulheres fantásticas, expondo os traumas e as marcas deixadas durante anos de opressão.
Vale a pena e embora não seja genial, certamente a conexão com as mulheres refletirá em uma experiência mais impactante.
Obs: "Shirley" foi muito elogiado no Festival de Sundance em 2020, chegando a conquistar o "U.S. Dramatic Special Jury Award".
"Shirley" é um filme difícil, com uma narrativa truncada e um ar independente conceitualmente - aliás, é isso que vai fazer com que as pessoas amem ou odeiem essa cinebiografia produzida por Martin Scorsese e dirigia pela talentosa Josephine Decker. Apenas contextualizando, Shirley Jackson foi a escritora responsável pela obra "A Assombração da Casa da Colina", escrito em 1959 e que em 2018 ganhou uma adaptação pela mãos de Mike Flanagan para a Netflix com o título de "A Maldição da Residência Hill" - vale dizer que até hoje essa é considerada uma das maiores obras de terror do século XX.
Em "Shirley" temos um recorte da mente perturbada da escritora (Elisabeth Moss), que se apoia no gênero de terror para enfrentar seus mais profundos fantasmas em uma realidade completamente machista personificada pelo seu marido Stanley Hyman (Michael Stuhlbarg), um professor universitário cínico e prepotente em relação à ela, mas extremamente querido pela comunidade acadêmica local. Ambos abrigam um jovem casal e é a partir da aproximação com Rose (Odessa Young) que a escritora encontra uma real inspiração para o seu novo projeto, o romance "Hangsaman". Confira o trailer (em inglês):
Embora "Shirley" seja uma biografia (muito perturbadora), a diretora Josephine Decker trabalha muito bem os elementos dramáticos com uma pitada de suspense psicológico que o roteiro de Sarah Gubbins, que é baseado no livro de Susan Scarf Merrell, propõe. Veja, o filme basicamente se passa dentro da casa de "Shirley" onde muito das cenas são filmadas com lentes bem fechadas, ou seja, existe uma sensação de claustrofobia na mesma medida que a própria narrativa vai nos provocando uma sensação de angustia avassaladora.
Se algumas escolhas Decker privilegiam o conceito narrativo mais denso, pode ter certeza que a veracidade de algumas situações estarão sempre em dúvida, por outro lado, essas mesmas situações vão estabelecer um ar mais autoral ao filme sem perder a essência, mesmo que antecipando alguns gatilhos. Eu explico: Shirley Jackson sofria de agorafobia, o que justifica todas as passagens do roteiro sobre o seu medo de sair de casa e até de priorizar a reclusão; porém essa condição foi desenvolvida mais para os anos 60, bem depois dos acontecimentos que assistimos no filme.
O fato é que todas as licenças que o filme se apropria estão completamente alinhas com a condução de Decker e isso merece muitos elogios - desde a montagem fragmentada de David Barker (de "Birds of Paradise") até a fotografia do genial Sturla Brandth Grøvlen (de "Victoria" e "Drunk") que é pautada nos incômodos planos detalhes das situações. Sobre o elenco, obviamente que Elisabeth Moss dá mais um show, mas fica impossível não citar o trabalho de Michael Stuhlbarg - perfeito!
A vida de Shirley Jackson, que se tornou leitura obrigatória em escolas americanas, soa tão perturbadora quanto suas histórias e o recorte que assistimos em "Shirley" nos traz uma boa noção dessa jornada criativa que influenciou nomes como Stephen King e Neil Gaiman. Agora esteja atento, pois o filme é muito desconfortável porque exibe, sem cortes, como o machismo pode afetar a vida de mulheres fantásticas, expondo os traumas e as marcas deixadas durante anos de opressão.
Vale a pena e embora não seja genial, certamente a conexão com as mulheres refletirá em uma experiência mais impactante.
Obs: "Shirley" foi muito elogiado no Festival de Sundance em 2020, chegando a conquistar o "U.S. Dramatic Special Jury Award".
Você não vai precisar mais do que um episódio para se perguntar "por que diabos eu não assisti essa série antes?". "Silo", da AppleTV+, é uma ficção científica de respeito, que se baseia no aclamado romance "Wool" de Hugh Howey. Desenvolvida por Graham Yost (de "From the Earth to the Moon"), a série nos transporta para um futuro distópico onde a humanidade vive em um gigantesco silo subterrâneo de 144 andares, protegido de um mundo exterior tóxico e desconhecido. Com uma narrativa das mais misteriosas e envolventes, um conceito visual impressionante e um elenco de peso, "Silo" realmente chama atenção pela forma como oferece uma exploração profunda, cheia de simbologia, sobre o controle da informação, os mistérios da sobrevivência e a incessante busca pela verdade.
Você não vai precisar mais do que um episódio para se perguntar "por que diabos eu não assisti essa série antes?". "Silo", da AppleTV+, é uma ficção científica de respeito, que se baseia no aclamado romance "Wool" de Hugh Howey. Desenvolvida por Graham Yost (de "From the Earth to the Moon"), a série nos transporta para um futuro distópico onde a humanidade vive em um gigantesco silo subterrâneo de 144 andares, protegido de um mundo exterior tóxico e desconhecido. Com uma narrativa das mais misteriosas e envolventes, um conceito visual impressionante e um elenco de peso, "Silo" realmente chama atenção pela forma como oferece uma exploração profunda, cheia de simbologia, sobre o controle da informação, os mistérios da sobrevivência e a incessante busca pela verdade.
"Sobreviventes" (que por aqui ainda ganhou o complemento de "Depois do Terremoto"), por incrível que pareça, não é um "filme-catátrofe" - pelo menos não em sua essência. O que quero dizer é que essa produção coreana dirigida pelo talentoso Tae-hwa Eom (de "Desaparecimento: O Garoto que Retornou") está mais para um drama social ao melhor estilo "Parasita" do que para um thriller de ação e efeitos especiais como "Terremoto: A Falha de San Andreas". Aliás, essa confusão conceitual muito se dá pelo fato de não se ter mantido o título original do filme aqui no Brasil, algo como "Concreto Utópico", em tradução livre - que certamente se conecta muito melhor com o que assistimos na tela! Veja, aqui não se trata de "por que" toda a cidade de Seul foi destruída por um terremoto de proporções inimagináveis, mas sim "como" os seres humanos que sobreviveram, diante desse cenário apocalíptico, se comportam intimamente e perante o seu semelhante!
A trama, basicamente, acompanha os moradores de um prédio de apartamentos que, milagrosamente, permaneceu intacto após o cataclisma. Com o passar do tempo, refugiados em busca de abrigo devido ao frio glacial que assola Seul e sem qualquer tipo de alimentação, começam a invadir o local, obrigando os moradores a tomarem medidas drásticas para garantir sua sobrevivência. Essa dinâmica segregadora, gera um conflito crescente, expondo os lados mais sombrios e altruístas da alma humana em uma luta moral que vai além da sobrevivência. Confira o trailer (dublado):
"Sobreviventes - Depois do Terremoto" de fato se diferencia por sua capacidade imersiva em um ambiente extremamente claustrofóbico e realista, onde cada metro quadrado se torna palco de tensões e conflitos além do óbvio. Se em um primeiro momento nossa preocupação como audiência é entender a razão pela qual apenas um prédio se manteve em pé após a catástrofe, rapidamente percebemos que o evento em si é apenas o pano de fundo para discussões infinitamente mais profundas. É preciso pontuar que o filme ainda sim tem excelentes sequências que mostram o terremoto acontecendo, no entanto é no cenário caótico posterior que o drama realmente ganha força.
O que vale são os conflitos de relacionamento entre os personagens em uma "nova" dinâmica de poder e influência - mais uma vez o cinema coreano mostra, com muita simbologia, como o ser humano pode ser brutal. A direção de Tae-hwa Eom é precisa e visceral nesse sentido já que ele conduz a trama com um ritmo frenético e um suspense constante sem perder aquela atmosfera de tensão permanente. A câmera de Eom explora com maestria os corredores apertados do prédio, os apartamentos precários e os rostos angustiados dos personagens, criando uma sensação sufocante - a montagem equilibra os cortes rápidos com planos bem estruturados dos embates entres os personagens, o que pontua o tom mais melancólico do filme com as complexas emoções daqueles personagens. Olha, é praticamente impossível não se colocar dentro daquela dinâmica social sem refletir sobre qual seria o melhor caminho para sobreviver!
"Sobreviventes - Depois do Terremoto" é um filme imperdível que obviamente te fará questionar seus próprios limites e que vai te provocar discussões interessantes como a própria fragilidade da civilização diante de eventos catastróficos. Com atuações realmente impecáveis, especialmente de Min-sung (o Park Seo-joon, de "Parasita:), uma direção precisa de Eom e uma história instigante e inteligente ao mesmo tempo, eu te garanto que, embarcando na proposta crítica do diretor, você estará diante de muito mais que um simples entretenimento.
Prepare-se para uma jornada perturbadora que te mostrará o lado mais sombrio e por consequência, o mais resiliente, da humanidade em situações impensáveis. Vale seu play!
"Sobreviventes" (que por aqui ainda ganhou o complemento de "Depois do Terremoto"), por incrível que pareça, não é um "filme-catátrofe" - pelo menos não em sua essência. O que quero dizer é que essa produção coreana dirigida pelo talentoso Tae-hwa Eom (de "Desaparecimento: O Garoto que Retornou") está mais para um drama social ao melhor estilo "Parasita" do que para um thriller de ação e efeitos especiais como "Terremoto: A Falha de San Andreas". Aliás, essa confusão conceitual muito se dá pelo fato de não se ter mantido o título original do filme aqui no Brasil, algo como "Concreto Utópico", em tradução livre - que certamente se conecta muito melhor com o que assistimos na tela! Veja, aqui não se trata de "por que" toda a cidade de Seul foi destruída por um terremoto de proporções inimagináveis, mas sim "como" os seres humanos que sobreviveram, diante desse cenário apocalíptico, se comportam intimamente e perante o seu semelhante!
A trama, basicamente, acompanha os moradores de um prédio de apartamentos que, milagrosamente, permaneceu intacto após o cataclisma. Com o passar do tempo, refugiados em busca de abrigo devido ao frio glacial que assola Seul e sem qualquer tipo de alimentação, começam a invadir o local, obrigando os moradores a tomarem medidas drásticas para garantir sua sobrevivência. Essa dinâmica segregadora, gera um conflito crescente, expondo os lados mais sombrios e altruístas da alma humana em uma luta moral que vai além da sobrevivência. Confira o trailer (dublado):
"Sobreviventes - Depois do Terremoto" de fato se diferencia por sua capacidade imersiva em um ambiente extremamente claustrofóbico e realista, onde cada metro quadrado se torna palco de tensões e conflitos além do óbvio. Se em um primeiro momento nossa preocupação como audiência é entender a razão pela qual apenas um prédio se manteve em pé após a catástrofe, rapidamente percebemos que o evento em si é apenas o pano de fundo para discussões infinitamente mais profundas. É preciso pontuar que o filme ainda sim tem excelentes sequências que mostram o terremoto acontecendo, no entanto é no cenário caótico posterior que o drama realmente ganha força.
O que vale são os conflitos de relacionamento entre os personagens em uma "nova" dinâmica de poder e influência - mais uma vez o cinema coreano mostra, com muita simbologia, como o ser humano pode ser brutal. A direção de Tae-hwa Eom é precisa e visceral nesse sentido já que ele conduz a trama com um ritmo frenético e um suspense constante sem perder aquela atmosfera de tensão permanente. A câmera de Eom explora com maestria os corredores apertados do prédio, os apartamentos precários e os rostos angustiados dos personagens, criando uma sensação sufocante - a montagem equilibra os cortes rápidos com planos bem estruturados dos embates entres os personagens, o que pontua o tom mais melancólico do filme com as complexas emoções daqueles personagens. Olha, é praticamente impossível não se colocar dentro daquela dinâmica social sem refletir sobre qual seria o melhor caminho para sobreviver!
"Sobreviventes - Depois do Terremoto" é um filme imperdível que obviamente te fará questionar seus próprios limites e que vai te provocar discussões interessantes como a própria fragilidade da civilização diante de eventos catastróficos. Com atuações realmente impecáveis, especialmente de Min-sung (o Park Seo-joon, de "Parasita:), uma direção precisa de Eom e uma história instigante e inteligente ao mesmo tempo, eu te garanto que, embarcando na proposta crítica do diretor, você estará diante de muito mais que um simples entretenimento.
Prepare-se para uma jornada perturbadora que te mostrará o lado mais sombrio e por consequência, o mais resiliente, da humanidade em situações impensáveis. Vale seu play!