"Em Pedaços" conta a história de Katia Sekerci (Diane Kruger), uma alemã que leva uma vida normal ao lado do marido turco Nuri (Numan Acar), e do filho de 7 anos. Certo dia, ela é surpreendida ao descobrir que ambos morreram devido a uma bomba colocada na frente do escritório do marido. Desesperada, Katia decide lutar por justiça ao descobrir que os responsáveis foram integrantes de um grupo neonazista. Veja o trailer:
Olha, "In the Fade" (no original) foi o vencedor do Golden Globe de 2018, foi indicado ao Palme d'Or e vencedor da categoria melhor atriz com Diane Kruger em Cannes. Sério, o filme é imperdível! Tenso do começo ao fim, é extremamente bem dirigido pelo alemão (com descendência turca) Fatih Akin, e tem um roteiro capaz de brincar com nossos sentimentos a cada cena. Chega ser inacreditável que a Diane Kruger não tenha sido indicada ao Oscar de 2008 - reparem como ela está simplesmente perfeita no filme!
A experiência de assistir esse filme sem saber muito sobre ele, é única! Faça isso que você não vai se arrepender!
"Em Pedaços" conta a história de Katia Sekerci (Diane Kruger), uma alemã que leva uma vida normal ao lado do marido turco Nuri (Numan Acar), e do filho de 7 anos. Certo dia, ela é surpreendida ao descobrir que ambos morreram devido a uma bomba colocada na frente do escritório do marido. Desesperada, Katia decide lutar por justiça ao descobrir que os responsáveis foram integrantes de um grupo neonazista. Veja o trailer:
Olha, "In the Fade" (no original) foi o vencedor do Golden Globe de 2018, foi indicado ao Palme d'Or e vencedor da categoria melhor atriz com Diane Kruger em Cannes. Sério, o filme é imperdível! Tenso do começo ao fim, é extremamente bem dirigido pelo alemão (com descendência turca) Fatih Akin, e tem um roteiro capaz de brincar com nossos sentimentos a cada cena. Chega ser inacreditável que a Diane Kruger não tenha sido indicada ao Oscar de 2008 - reparem como ela está simplesmente perfeita no filme!
A experiência de assistir esse filme sem saber muito sobre ele, é única! Faça isso que você não vai se arrepender!
O "Estrangulador de Boston" é um excelente filme para quem está com saudades de uma trama bem construída, inteligente e sensível, onde as motivações perante a investigação são até mais importantes do que o impacto visual ou a brutalidade dos crimes em si. E aqui existe um componente que impacta diretamente na nossa experiência como audiência, mas que de forma alguma nos distancia do estilo "true crime" que a ficção carrega em seu DNA: as protagonistas, jornalistas, tem uma segunda camada que acaba dando um certo charme para a narrativa, já que nos anos 60 as mulheres praticamente não tinham voz nas redações dos jornais e muito menos no universo policial.
O filme acompanha os reflexos sociais provocados por um misterioso assassino que fazia cada vez mais vítimas (todas mulheres) e por Loretta McLaughlin (Keira Knightley), que se tornou uma das primeiras jornalistas a conectar os crimes do estrangulador de Boston ao termo que nem existia ainda: serial killer. Todavia, quando Loretta passa a seguir sua investigação ao lado da colega Jean Cole (Carrie Coon), a dupla se vê prejudicada pelo implacável sexismo da época. Mesmo assim, elas seguem corajosamente, arriscando suas vidas em uma busca para descobrir a verdade antes que a próxima vítima seja encontrada. Confira o trailer:
Entender o que leva uma jornalista a tentar resolver um caso notadamente policial, onde outras mulheres são vitimas de um cruel assassino, é quase uma jornada íntima de auto-sobrevivência fantasiada de motivação profissional - basta lembrar do excelente (e imperdível) documentário da HBO, "Eu Terei Sumido na Escuridão". No caso da escritora Michelle McNamara estávamos de frente com uma narração em off que foi capaz de transmitir as angustias, medos, revoltas e até com uma certa coragem, as fragilidades de uma mulher que buscava, incansavelmente, desvendar uma das maiores sequências de crimes bárbaros da história dos EUA. Com Loretta McLaughlin é a mesma coisa, porém aqui, enxergamos a personagem, seu drama se torna mais palpável e com isso nossa relação com a trama passa a ser outra já que nos identificamos com os anseios da jornalista antes mesmo de nos sentirmos impactados pelos crimes. Veja, em nenhum momento conseguimos dissociar sua busca por igualdade com a preocupação para com as próximas vítimas.
Essa conceito do diretor e roteirista Matt Ruskin (de "Crown Heights") cobra seu preço: em alguns momentos a narrativa fica cadenciada demais, perde um pouco da dinâmica investigativa/policial para focar nos reflexos das escolhas pessoais e profissionais das personagens. Keira Knightley e Carrie Coon sustentam o filme mesmo quando o conflito principal se dissipa e isso nos dá uma certa sensação de desequilíbrio - é como se "Estrangulador de Boston" se distanciasse do estilo "Zodíaco" de David Fincher e se aproximasse de "Ela Disse" de Maria Schrader. Por outro lado o filme ganha em humanidade, em sororidade - é impressionante como Ruskin pontua elementos biográficos como a "coragem" e a "resiliência" dessas mulheres, para retratar como elas precisaram deixar de lado uma parte importante de suas vidas, para que pudessem passar a ser reconhecidas como profissionais de respeito.
Dito isso, é possível afirmar que o maior triunfo de "O Estrangulador de Boston" não é o de contar uma angustiante e misteriosa história sobre cruéis assassinatos em série, muito menos de glamourizar esses crimes ou seus autores, naquela busca incansável por encontrar padrões e com isso construir um perfil psicológico que nos ajude a resolver o caso. Embora exista um pouco disso tudo, o foco aqui é até menos impactante, já que as histórias como a de McLaughlin e de Cole falam por si só e certamente nos ajudam a refletir sobre como o machismo estrutural pode nos atingir em diferentes esferas e como o jornalismo sério pode mudar o jogo com competência e liberdade.
Vale muito seu play!
O "Estrangulador de Boston" é um excelente filme para quem está com saudades de uma trama bem construída, inteligente e sensível, onde as motivações perante a investigação são até mais importantes do que o impacto visual ou a brutalidade dos crimes em si. E aqui existe um componente que impacta diretamente na nossa experiência como audiência, mas que de forma alguma nos distancia do estilo "true crime" que a ficção carrega em seu DNA: as protagonistas, jornalistas, tem uma segunda camada que acaba dando um certo charme para a narrativa, já que nos anos 60 as mulheres praticamente não tinham voz nas redações dos jornais e muito menos no universo policial.
O filme acompanha os reflexos sociais provocados por um misterioso assassino que fazia cada vez mais vítimas (todas mulheres) e por Loretta McLaughlin (Keira Knightley), que se tornou uma das primeiras jornalistas a conectar os crimes do estrangulador de Boston ao termo que nem existia ainda: serial killer. Todavia, quando Loretta passa a seguir sua investigação ao lado da colega Jean Cole (Carrie Coon), a dupla se vê prejudicada pelo implacável sexismo da época. Mesmo assim, elas seguem corajosamente, arriscando suas vidas em uma busca para descobrir a verdade antes que a próxima vítima seja encontrada. Confira o trailer:
Entender o que leva uma jornalista a tentar resolver um caso notadamente policial, onde outras mulheres são vitimas de um cruel assassino, é quase uma jornada íntima de auto-sobrevivência fantasiada de motivação profissional - basta lembrar do excelente (e imperdível) documentário da HBO, "Eu Terei Sumido na Escuridão". No caso da escritora Michelle McNamara estávamos de frente com uma narração em off que foi capaz de transmitir as angustias, medos, revoltas e até com uma certa coragem, as fragilidades de uma mulher que buscava, incansavelmente, desvendar uma das maiores sequências de crimes bárbaros da história dos EUA. Com Loretta McLaughlin é a mesma coisa, porém aqui, enxergamos a personagem, seu drama se torna mais palpável e com isso nossa relação com a trama passa a ser outra já que nos identificamos com os anseios da jornalista antes mesmo de nos sentirmos impactados pelos crimes. Veja, em nenhum momento conseguimos dissociar sua busca por igualdade com a preocupação para com as próximas vítimas.
Essa conceito do diretor e roteirista Matt Ruskin (de "Crown Heights") cobra seu preço: em alguns momentos a narrativa fica cadenciada demais, perde um pouco da dinâmica investigativa/policial para focar nos reflexos das escolhas pessoais e profissionais das personagens. Keira Knightley e Carrie Coon sustentam o filme mesmo quando o conflito principal se dissipa e isso nos dá uma certa sensação de desequilíbrio - é como se "Estrangulador de Boston" se distanciasse do estilo "Zodíaco" de David Fincher e se aproximasse de "Ela Disse" de Maria Schrader. Por outro lado o filme ganha em humanidade, em sororidade - é impressionante como Ruskin pontua elementos biográficos como a "coragem" e a "resiliência" dessas mulheres, para retratar como elas precisaram deixar de lado uma parte importante de suas vidas, para que pudessem passar a ser reconhecidas como profissionais de respeito.
Dito isso, é possível afirmar que o maior triunfo de "O Estrangulador de Boston" não é o de contar uma angustiante e misteriosa história sobre cruéis assassinatos em série, muito menos de glamourizar esses crimes ou seus autores, naquela busca incansável por encontrar padrões e com isso construir um perfil psicológico que nos ajude a resolver o caso. Embora exista um pouco disso tudo, o foco aqui é até menos impactante, já que as histórias como a de McLaughlin e de Cole falam por si só e certamente nos ajudam a refletir sobre como o machismo estrutural pode nos atingir em diferentes esferas e como o jornalismo sério pode mudar o jogo com competência e liberdade.
Vale muito seu play!
Dos documentários "true crime" que já assisti e analisei até hoje, "Eu Terei Sumido na Escuridão" da HBO talvez seja o mais humano de todos. Essa característica não faz dele o melhor ou o pior do gênero, mas certamente nos entrega uma narrativa diferente, nos provocando a embarcar em uma história terrível, mas sob o ponto de vista de uma terceira pessoa, a escritora Michelle McNamara, que é capaz de nos conquistar com suas angustias, medos, revoltas e até com uma certa coragem ao expôr suas fragilidades da mesma forma com que tenta, incansavelmente, desvendar uma das maiores sequências de crimes bárbaros da história dos EUA.
McNamara é a autora do livro homônimo "I'll Be Gone in the Dark" (título original), onde narra sua jornada como escritora durante a investigação de uma série de casos de estupros e assassinatos em Sacramento durante as décadas de 70 e 80 que posteriormente ficou conhecido como "O caso do assassino de Golden State". Confira o trailer:
A série conta em detalhes todo o trabalho de Michelle McNamara como jornalista investigativa até o momento em que passa a se dedicar integralmente ao caso não resolvido do assassino de Golden State, que estuprou 50 mulheres e matou outras 10 pessoas. O interessante dessa jornada é que pouco a pouco a obstinação de McNamara vai se transformando em uma enorme obsessão, fazendo com que o próprio assassino (ou o que ele representa) domine sua mente e interfira visivelmente na sua vida pessoal - e aqui temos o ponto alto da série: essa linha tênue onde McNamara tenta se equilibrar tem reflexos cruciais e eles são muito mais profundos do que qualquer um que vivia com ela poderia imaginar. Olha, em vários momentos é preciso ter estômago, já que muitas sobreviventes contam sobre os ataques que sofreram com uma riqueza de sensações assustadora e em outros, sofremos na pele as mesmas angústias de uma McNamara inconformada (e pressionada) com o fato do assassino ainda estar solto e isso, de certa forma, vai nos impulsionando a torcer por uma resolução, mesmo sabendo que a protagonista não estará lá para ver!
Escrito por Liz Garbus (que também dirige dois episódios), a série se divide entre a investigação de McNamara e sua biografia recente, até que ambos se misturam quando ela começa a escrever o livro sobre o assassino. Se apoiando muito na semiótica, Garbus (que já foi indicada para dois Oscars: um com "The Farm: Angola, USA" e outro com o excepcional "What Happened, Miss Simone?") soube trabalhar como ninguém o fato de que McNamara nunca esteve presente durante a produção da série - ao usar suas palavras escritas no livro, brilhantemente narradas por Karen Kilgariff, a diretora acabou criando um tom poético para a visão de McNamara ao mesmo tempo que a força emocional de suas palavras contrastam com a brutalidade dos ataques.
Garbus alternou inúmeras entrevistas bem interessantes, com imagens de arquivo e até uma ou outra dramatização. Dar voz ao marido de McNamara, aos amigos, fãs do blog que escrevia, policiais que trabalharam na investigação na época dos crimes e, por fim, para os seus próprios parceiros de trabalho, mostram exatamente a quantidade de informações relevantes que essa história demanda. O bacana é que mesmo com tanto material, em nenhum momento nos sentimos perdidos - o ritmo é intenso, mas muito bem construído, com muitos elementos de ficção, inclusive, só que extremamente pertinentes ao conceito narrativo imposto pela diretora!
""Eu Terei Sumido na Escuridão" vai agradar quem gosta de séries policiais de crimes reais da mesma forma de quem gosta de biografias com pessoas interessantes e inteligentes. Essa mistura de gêneros entrega um resultado impecável e que, certamente, virá muito forte na temporada de premiações do ano que vem. Vale muito o seu play, de verdade!
Dos documentários "true crime" que já assisti e analisei até hoje, "Eu Terei Sumido na Escuridão" da HBO talvez seja o mais humano de todos. Essa característica não faz dele o melhor ou o pior do gênero, mas certamente nos entrega uma narrativa diferente, nos provocando a embarcar em uma história terrível, mas sob o ponto de vista de uma terceira pessoa, a escritora Michelle McNamara, que é capaz de nos conquistar com suas angustias, medos, revoltas e até com uma certa coragem ao expôr suas fragilidades da mesma forma com que tenta, incansavelmente, desvendar uma das maiores sequências de crimes bárbaros da história dos EUA.
McNamara é a autora do livro homônimo "I'll Be Gone in the Dark" (título original), onde narra sua jornada como escritora durante a investigação de uma série de casos de estupros e assassinatos em Sacramento durante as décadas de 70 e 80 que posteriormente ficou conhecido como "O caso do assassino de Golden State". Confira o trailer:
A série conta em detalhes todo o trabalho de Michelle McNamara como jornalista investigativa até o momento em que passa a se dedicar integralmente ao caso não resolvido do assassino de Golden State, que estuprou 50 mulheres e matou outras 10 pessoas. O interessante dessa jornada é que pouco a pouco a obstinação de McNamara vai se transformando em uma enorme obsessão, fazendo com que o próprio assassino (ou o que ele representa) domine sua mente e interfira visivelmente na sua vida pessoal - e aqui temos o ponto alto da série: essa linha tênue onde McNamara tenta se equilibrar tem reflexos cruciais e eles são muito mais profundos do que qualquer um que vivia com ela poderia imaginar. Olha, em vários momentos é preciso ter estômago, já que muitas sobreviventes contam sobre os ataques que sofreram com uma riqueza de sensações assustadora e em outros, sofremos na pele as mesmas angústias de uma McNamara inconformada (e pressionada) com o fato do assassino ainda estar solto e isso, de certa forma, vai nos impulsionando a torcer por uma resolução, mesmo sabendo que a protagonista não estará lá para ver!
Escrito por Liz Garbus (que também dirige dois episódios), a série se divide entre a investigação de McNamara e sua biografia recente, até que ambos se misturam quando ela começa a escrever o livro sobre o assassino. Se apoiando muito na semiótica, Garbus (que já foi indicada para dois Oscars: um com "The Farm: Angola, USA" e outro com o excepcional "What Happened, Miss Simone?") soube trabalhar como ninguém o fato de que McNamara nunca esteve presente durante a produção da série - ao usar suas palavras escritas no livro, brilhantemente narradas por Karen Kilgariff, a diretora acabou criando um tom poético para a visão de McNamara ao mesmo tempo que a força emocional de suas palavras contrastam com a brutalidade dos ataques.
Garbus alternou inúmeras entrevistas bem interessantes, com imagens de arquivo e até uma ou outra dramatização. Dar voz ao marido de McNamara, aos amigos, fãs do blog que escrevia, policiais que trabalharam na investigação na época dos crimes e, por fim, para os seus próprios parceiros de trabalho, mostram exatamente a quantidade de informações relevantes que essa história demanda. O bacana é que mesmo com tanto material, em nenhum momento nos sentimos perdidos - o ritmo é intenso, mas muito bem construído, com muitos elementos de ficção, inclusive, só que extremamente pertinentes ao conceito narrativo imposto pela diretora!
""Eu Terei Sumido na Escuridão" vai agradar quem gosta de séries policiais de crimes reais da mesma forma de quem gosta de biografias com pessoas interessantes e inteligentes. Essa mistura de gêneros entrega um resultado impecável e que, certamente, virá muito forte na temporada de premiações do ano que vem. Vale muito o seu play, de verdade!
Assistir "Every Breath You Take" é como olhar para os dramas psicológicos, daqueles com fortes elementos de suspense do passado, como "Mulher Solteira Procura" ou "A Mão que Balança o Berço", porém com uma nova perspectiva de tentar focar no desenvolvimento de personagens mais complexos - funciona, mas até certo ponto. De fato o filme dirigido pelo Vaughn Stein (de "A Vingança Perfeita") entrega uma narrativa tensa e envolvente, mesmo com algumas passagens mais cadenciadas, explorando com inteligência as complexidades da mente humana. No entanto, o roteiro do novato David Murray acaba tropeçando na falta de originalidade de sua trama e na simplicidade de suas conclusões - isso acaba colocando um filme com muito potencial naquela prateleira de "apenas um excelente entretenimento para um sábado chuvoso". Eu diria que aqui temos um filme bom, fácil e bastante divertido, mas não inesquecível!
Após a trágica morte de Daphne (Emily Alyn Lind), uma de suas pacientes e com quem estabeleceu um forte vinculo emocional, o renomado psicólogo Philip (Casey Affleck) se vê envolvido em uma teia de segredos e obsessão. Ele passa a ser perseguido por James (Sam Claflin), o irmão perturbado de Daphne, que acredita ter motivos suficientes para aterrorizar Philip e toda sua família. Confira o trailer (em inglês):
Um dos pontos positivos de "Every Breath You Take" é o desempenho do elenco. Casey Affleck traz uma intensidade sutil ao seu papel, transmitindo a confusão e a angústia de seu personagem de maneira convincente - ele sabe trabalhar o silêncio e a dor mais íntima, criando uma atmosfera de melancolia impressionante. Reparem como ele se relaciona com sua mulher, Grace (Michelle Monaghan), e como essa relação vai ganhando força e desconstruindo toda uma expectativa de "volta por cima" para essa família. Já Sam Claflin, de certa forma, também se destaca como o antagonista - em alguns momentos ele pode até parecer mais estereotipado, mas é inegável sua capacidade de transmitir um tom de ameaça constante e perturbadora sem precisar se apoiar nos diálogos.
A direção de Vaughn Stein é competente, apresentando uma estética pesada que chama atenção. Ao lado do fotógrafo Michael Merriman (responsável pela segunda unidade de "Green Book"), Stein se aproveita de um conceito visualmente desconfortável, valorizando uma palheta mais fria e um cenário gélido - isso aproxima o drama do suspense com a gramática correta. Ao criar essa atmosfera de tensão permanente, ele nos conquista pela forma e não necessariamente pelo conteúdo - no terceiro ato, mesmo com uma reviravolta interessante (e talvez óbvia), essa afirmação fica ainda mais clara.
"Every Breath You Take" é um filme que se propõe a examinar as consequências devastadoras da psicopatia, explorando os limites da moralidade de uma maneira mais clássica. Com performances intensas e uma direção habilidosa, o filme nos leva por um caminho sinuoso, onde nada pode ser descartado quando o assunto é a dor íntima, a depressão. Ao mergulhar em uma história naturalmente envolvente, nos permitimos entender as fraquezas do roteiro como parte da imaturidade de seu roteirista, mas que nem por isso deixa de entregar uma trama divertida.
Pela pipoca, pelo cobertor e pelo entretenimento despretensioso, vá para o play!
Assistir "Every Breath You Take" é como olhar para os dramas psicológicos, daqueles com fortes elementos de suspense do passado, como "Mulher Solteira Procura" ou "A Mão que Balança o Berço", porém com uma nova perspectiva de tentar focar no desenvolvimento de personagens mais complexos - funciona, mas até certo ponto. De fato o filme dirigido pelo Vaughn Stein (de "A Vingança Perfeita") entrega uma narrativa tensa e envolvente, mesmo com algumas passagens mais cadenciadas, explorando com inteligência as complexidades da mente humana. No entanto, o roteiro do novato David Murray acaba tropeçando na falta de originalidade de sua trama e na simplicidade de suas conclusões - isso acaba colocando um filme com muito potencial naquela prateleira de "apenas um excelente entretenimento para um sábado chuvoso". Eu diria que aqui temos um filme bom, fácil e bastante divertido, mas não inesquecível!
Após a trágica morte de Daphne (Emily Alyn Lind), uma de suas pacientes e com quem estabeleceu um forte vinculo emocional, o renomado psicólogo Philip (Casey Affleck) se vê envolvido em uma teia de segredos e obsessão. Ele passa a ser perseguido por James (Sam Claflin), o irmão perturbado de Daphne, que acredita ter motivos suficientes para aterrorizar Philip e toda sua família. Confira o trailer (em inglês):
Um dos pontos positivos de "Every Breath You Take" é o desempenho do elenco. Casey Affleck traz uma intensidade sutil ao seu papel, transmitindo a confusão e a angústia de seu personagem de maneira convincente - ele sabe trabalhar o silêncio e a dor mais íntima, criando uma atmosfera de melancolia impressionante. Reparem como ele se relaciona com sua mulher, Grace (Michelle Monaghan), e como essa relação vai ganhando força e desconstruindo toda uma expectativa de "volta por cima" para essa família. Já Sam Claflin, de certa forma, também se destaca como o antagonista - em alguns momentos ele pode até parecer mais estereotipado, mas é inegável sua capacidade de transmitir um tom de ameaça constante e perturbadora sem precisar se apoiar nos diálogos.
A direção de Vaughn Stein é competente, apresentando uma estética pesada que chama atenção. Ao lado do fotógrafo Michael Merriman (responsável pela segunda unidade de "Green Book"), Stein se aproveita de um conceito visualmente desconfortável, valorizando uma palheta mais fria e um cenário gélido - isso aproxima o drama do suspense com a gramática correta. Ao criar essa atmosfera de tensão permanente, ele nos conquista pela forma e não necessariamente pelo conteúdo - no terceiro ato, mesmo com uma reviravolta interessante (e talvez óbvia), essa afirmação fica ainda mais clara.
"Every Breath You Take" é um filme que se propõe a examinar as consequências devastadoras da psicopatia, explorando os limites da moralidade de uma maneira mais clássica. Com performances intensas e uma direção habilidosa, o filme nos leva por um caminho sinuoso, onde nada pode ser descartado quando o assunto é a dor íntima, a depressão. Ao mergulhar em uma história naturalmente envolvente, nos permitimos entender as fraquezas do roteiro como parte da imaturidade de seu roteirista, mas que nem por isso deixa de entregar uma trama divertida.
Pela pipoca, pelo cobertor e pelo entretenimento despretensioso, vá para o play!
"Evil" é muito bacana - um ótimo e despretensioso entretenimento que foi capaz de juntar elementos de "Código da Vinci", da franquia "Invocação do Mal", de "O Advogado do Diabo" e até de "Arquivo X". Por mais que essa mistura soe até indigesta, tudo funciona perfeitamente, pois a série segue o conceito procedural para construir a sua linha narrativa, ou seja, em cada episódio temos um misterioso caso para ser investigado, enquanto acompanhamos um arco maior baseado nos problemas e nas relações conflituosas entre os personagens.
Um seminarista chamado David Acosta (Mike Colter) trabalha para a igreja católica usando sua fé e sua sensibilidade para investigar possíveis casos sobrenaturais. Mas, ele precisa contratar a psicóloga forense Kristen Bouchard (Katja Herbers) para oferecer um contraponto e levantar as dúvidas que naturalmente poderiam surgir. Confira o trailer:
"Evil" (que por aqui ganhou um sugestivo subtítulo, "Contatos Sobrenaturais") foi criada por Robert e Michelle King, o casal responsável por "The Good Wife" e pelo derivado "The Good Fight" e tem Michael Emerson (o Ben de "Lost") no seu elenco. Dito isso, já é possível antecipar que a série não deve ser tão levada a sério para que ela se torne aquele compromisso de "apenas um episódio antes de dormir". Ela carrega esse mood informal e antes de nos darmos conta, estamos viciados - então cuidado!
Vendida como um suspense, posso te garantir que ela não passa nem perto da experiência de assistir "A Maldição da Residência Hill" da Netflix - é importante alinhar essa expectativa. Você pode até levar um susto aqui e outro ali, mas nada que possa impactar na sua noite de sono. Os episódios partem do principio fantástico das situações, mas finalizam com respostas céticas e palpáveis sobre os ditos "fenômenos", porém existe algo por trás e a genialidade do roteiro está em nos dar detalhes que, justamente, não podem ser explicados - essa dualidade de interpretações é muito interessante e praticamente nos transformam em um detetive da internet para encontrar uma possível brecha ou a inconsistência de uma tese.
Outro ponto que me agradou, mesmo não se preocupando em se aprofundar, são os confrontos ideológicos entre ciência e religião. Personificadas por Acosta e Bouchard (e essa ainda conta com a ajuda do ótimo Ben Shakir), as discussões são interessantes, respeitosas e até provocadoras - o clima entre os dois personagens e a tensão sexual que os rodeiam, ajudam criar outro elemento narrativo que funciona perfeitamente com a proposta da série: o que é certo e o que é errado, perante a fé ou a ciência? Os subtextos são excelentes e merecem uma certa atenção, mas nunca interferem na linha mais leve dos episódios - mesmo em assuntos densos.
O final da primeira temporada estabelece alguns ganchos interessantes, mas talvez tenha sido expositiva demais. Por outro lado, o roteiro deixa claro que não existe a menor necessidade de se prender aos casos da semana para a série funcionar - focar na mitologia do arco maior foi uma acerto muito bem explorado na segunda temporada que mantém a qualidade, surpreende até e ainda garante uma renovação para a terceira.
Mais uma vez, "Evil - Contatos Sobrenaturais" é entretenimento puro e muito divertido!
"Evil" é muito bacana - um ótimo e despretensioso entretenimento que foi capaz de juntar elementos de "Código da Vinci", da franquia "Invocação do Mal", de "O Advogado do Diabo" e até de "Arquivo X". Por mais que essa mistura soe até indigesta, tudo funciona perfeitamente, pois a série segue o conceito procedural para construir a sua linha narrativa, ou seja, em cada episódio temos um misterioso caso para ser investigado, enquanto acompanhamos um arco maior baseado nos problemas e nas relações conflituosas entre os personagens.
Um seminarista chamado David Acosta (Mike Colter) trabalha para a igreja católica usando sua fé e sua sensibilidade para investigar possíveis casos sobrenaturais. Mas, ele precisa contratar a psicóloga forense Kristen Bouchard (Katja Herbers) para oferecer um contraponto e levantar as dúvidas que naturalmente poderiam surgir. Confira o trailer:
"Evil" (que por aqui ganhou um sugestivo subtítulo, "Contatos Sobrenaturais") foi criada por Robert e Michelle King, o casal responsável por "The Good Wife" e pelo derivado "The Good Fight" e tem Michael Emerson (o Ben de "Lost") no seu elenco. Dito isso, já é possível antecipar que a série não deve ser tão levada a sério para que ela se torne aquele compromisso de "apenas um episódio antes de dormir". Ela carrega esse mood informal e antes de nos darmos conta, estamos viciados - então cuidado!
Vendida como um suspense, posso te garantir que ela não passa nem perto da experiência de assistir "A Maldição da Residência Hill" da Netflix - é importante alinhar essa expectativa. Você pode até levar um susto aqui e outro ali, mas nada que possa impactar na sua noite de sono. Os episódios partem do principio fantástico das situações, mas finalizam com respostas céticas e palpáveis sobre os ditos "fenômenos", porém existe algo por trás e a genialidade do roteiro está em nos dar detalhes que, justamente, não podem ser explicados - essa dualidade de interpretações é muito interessante e praticamente nos transformam em um detetive da internet para encontrar uma possível brecha ou a inconsistência de uma tese.
Outro ponto que me agradou, mesmo não se preocupando em se aprofundar, são os confrontos ideológicos entre ciência e religião. Personificadas por Acosta e Bouchard (e essa ainda conta com a ajuda do ótimo Ben Shakir), as discussões são interessantes, respeitosas e até provocadoras - o clima entre os dois personagens e a tensão sexual que os rodeiam, ajudam criar outro elemento narrativo que funciona perfeitamente com a proposta da série: o que é certo e o que é errado, perante a fé ou a ciência? Os subtextos são excelentes e merecem uma certa atenção, mas nunca interferem na linha mais leve dos episódios - mesmo em assuntos densos.
O final da primeira temporada estabelece alguns ganchos interessantes, mas talvez tenha sido expositiva demais. Por outro lado, o roteiro deixa claro que não existe a menor necessidade de se prender aos casos da semana para a série funcionar - focar na mitologia do arco maior foi uma acerto muito bem explorado na segunda temporada que mantém a qualidade, surpreende até e ainda garante uma renovação para a terceira.
Mais uma vez, "Evil - Contatos Sobrenaturais" é entretenimento puro e muito divertido!
David Fincher é daqueles poucos diretores capaz de criar um ambiente de extrema tensão apenas posicionando a câmera no lugar certo e deixando que a história (com a ajuda de ótimas performances) se conte sozinha - talvez seja esse o maior mérito de "Garota Exemplar". Mesmo se apropriando de diversos elementos narrativos que nos dão a exata sensação de estarmos diante de um complexo thriller policial, Fincher vai além ao nos entregar um inteligente ensaio sobre as interações humanas, a vida adulta e a convivência de um relacionamento.
Adaptação de livro homônimo de Gillian Flynn (a mesma de "Sharp Objects" da HBO), que também assume o papel de roteirista no filme, "Garota Exemplar" conta a história de Nick (Ben Affleck) e Amy Dunne (Rosamund Pike). Após um casamento dos sonhos, eles se veem obrigados a deixar a vida em Nova York e se mudar para uma cidadezinha no Missouri após a notícia de que a mãe de Nick está com câncer. No dia em que comemorariam o aniversário de cinco anos de casamento, Nick retorna para casa e encontra o lugar completamente revirado. Ao não encontrar sua esposa, ele chama a polícia, mas o que ele não imaginava é que a partir daí ele se tornaria o principal suspeito. Confira o trailer:
Depois desse belíssimo trailer ao som de "She" (de Elvis Costello), já dá para se ter uma ideia do que esperar de "Garota Exemplar" e acreditem: você não vai se decepcionar. Com uma fotografia bastante contrastada e trazendo o verde para o primeiro plano da iluminação do diretor Jeff Cronenweth (indicado ao Oscar duas vezes por "The Girl with the Dragon Tattoo" e "Rede Social") e somando com um trabalho de design de som e uma trilha sonora incríveis, o filme nos remete aos bons tempos dos dramas policiais cheio de reviravoltas como "Seven" ou "Zodíaco" (para ficar só na filmografia de Fincher)! Outro ponto que merece muito destaque é a montagem de Kirk Baxter - a forma original como a história vai sendo contada, mesclando cenas atuais, com flashbackse sequências que são fruto da imaginação dos personagens, é simplesmente extraordinária!
O roteiro, fielmente adaptado por Flynn, se apropria do conceito narrativo do livro, mas expande nossa percepção graças ao trabalho detalhista do diretor - se nas cenas do presente, temos o foco no homem, que é objeto de investigação e que segura o mistério até o último ato; nos flashbacks o que interessa é o ponto de vista de Amy, com sua narração humana e que retrata exatamente o que ela mesmo escrevia em seu diário de uma forma quase juvenil - não à toa que Pike foi indicada ao Oscar por essa performance profunda e cheia de camadas. Você vai se surpreender com essa personagem!
O caminho percorrido pelos personagens através da condução segura de Fincher vai além do óbvio. Tecnicamente exemplar (sem nenhum trocadilho), "Gone Girl" (no original) é de uma originalidade artística acima da média e muito atraente para uma audiência disposta a enfrentar aquele universo tão particular. Cheio de contrastes como a vida costuma ser, o filme brinca com nossa percepção da mesma forma que nos provoca a reflexão. Impecável até mesmo diante dos altos parâmetros aos quais constrói sua história, Fincher é capaz de atender aos mais diferentes níveis de leitura, como poucos. Entretenimento de qualidade, "Garota Exemplar" já pode ser considerado um marco na carreira do diretor!
Vale muito o seu play e o seu replay!
David Fincher é daqueles poucos diretores capaz de criar um ambiente de extrema tensão apenas posicionando a câmera no lugar certo e deixando que a história (com a ajuda de ótimas performances) se conte sozinha - talvez seja esse o maior mérito de "Garota Exemplar". Mesmo se apropriando de diversos elementos narrativos que nos dão a exata sensação de estarmos diante de um complexo thriller policial, Fincher vai além ao nos entregar um inteligente ensaio sobre as interações humanas, a vida adulta e a convivência de um relacionamento.
Adaptação de livro homônimo de Gillian Flynn (a mesma de "Sharp Objects" da HBO), que também assume o papel de roteirista no filme, "Garota Exemplar" conta a história de Nick (Ben Affleck) e Amy Dunne (Rosamund Pike). Após um casamento dos sonhos, eles se veem obrigados a deixar a vida em Nova York e se mudar para uma cidadezinha no Missouri após a notícia de que a mãe de Nick está com câncer. No dia em que comemorariam o aniversário de cinco anos de casamento, Nick retorna para casa e encontra o lugar completamente revirado. Ao não encontrar sua esposa, ele chama a polícia, mas o que ele não imaginava é que a partir daí ele se tornaria o principal suspeito. Confira o trailer:
Depois desse belíssimo trailer ao som de "She" (de Elvis Costello), já dá para se ter uma ideia do que esperar de "Garota Exemplar" e acreditem: você não vai se decepcionar. Com uma fotografia bastante contrastada e trazendo o verde para o primeiro plano da iluminação do diretor Jeff Cronenweth (indicado ao Oscar duas vezes por "The Girl with the Dragon Tattoo" e "Rede Social") e somando com um trabalho de design de som e uma trilha sonora incríveis, o filme nos remete aos bons tempos dos dramas policiais cheio de reviravoltas como "Seven" ou "Zodíaco" (para ficar só na filmografia de Fincher)! Outro ponto que merece muito destaque é a montagem de Kirk Baxter - a forma original como a história vai sendo contada, mesclando cenas atuais, com flashbackse sequências que são fruto da imaginação dos personagens, é simplesmente extraordinária!
O roteiro, fielmente adaptado por Flynn, se apropria do conceito narrativo do livro, mas expande nossa percepção graças ao trabalho detalhista do diretor - se nas cenas do presente, temos o foco no homem, que é objeto de investigação e que segura o mistério até o último ato; nos flashbacks o que interessa é o ponto de vista de Amy, com sua narração humana e que retrata exatamente o que ela mesmo escrevia em seu diário de uma forma quase juvenil - não à toa que Pike foi indicada ao Oscar por essa performance profunda e cheia de camadas. Você vai se surpreender com essa personagem!
O caminho percorrido pelos personagens através da condução segura de Fincher vai além do óbvio. Tecnicamente exemplar (sem nenhum trocadilho), "Gone Girl" (no original) é de uma originalidade artística acima da média e muito atraente para uma audiência disposta a enfrentar aquele universo tão particular. Cheio de contrastes como a vida costuma ser, o filme brinca com nossa percepção da mesma forma que nos provoca a reflexão. Impecável até mesmo diante dos altos parâmetros aos quais constrói sua história, Fincher é capaz de atender aos mais diferentes níveis de leitura, como poucos. Entretenimento de qualidade, "Garota Exemplar" já pode ser considerado um marco na carreira do diretor!
Vale muito o seu play e o seu replay!
Antes de mais nada é preciso alinhar as expectativas, já que "Holy Spider" pode ser entendido de duas formas: uma pela perspectiva mais sócio-cultural e religiosa do cinema independente iraniano e outra pelo olhar mais investigativo do entretenimento nórdico. Pois bem, se analisarmos o filme mais superficialmente, eu diria que essa produção dinamarquesa dirigida pelo iraniano Ali Abbasi (de "Border"), é apenas um mediado (para bom) thriller policial. Então não caia nessa armadilha, pois essa atmosfera "serial killer" é apenas o pano de fundo para discutir camadas muito mais delicadas sobre a relação visceral entre o ser humano extremista e a violência misógina do Irã. Um dos lançamentos mais comentados de 2022, dividindo opiniões e gerando debates acalorados, "Holy Spider" chega chancelado por mais de 20 prêmios em festivais ao redor do planeta incluindo o de Melhor Atriz no Festival de Cannes para Zar Amir Ebrahimi.
A trama acompanha a saga da destemida jornalista Arezoo Rahimi (Amir-Ebrahimi), que se infiltra no submundo da cidade sagrada de Mashhad, no Irã, em busca de um serial killer que aterroriza a comunidade: o "Aranha Assassina". Motivado por crenças religiosas distorcidas e sexistas, ele se autoproclama o purificador da cidade, exterminando prostitutas que considera "impuras". Confira o trailer (com legendas em inglês):
Impactante no seu conteúdo e provocar na forma como esse conteúdo é apresentado, Abbasi merece todos os elogios por nos entregar um retrato cru e sem concessões sobre a realidade iraniana, onde a misoginia está enraizada na cultura e na religião. Embora em um primeiro olhar "Holy Spider" pareça focar na investigação de Rahimi, o roteiro do próprio diretor com o estreante Afshin Kamran Bahrami, sai do óbvio ao colocar a jornalista em uma verdadeira rota de colisão com as autoridades corruptas e os homens misóginos que defendem os atos do assassino. Se a cada passo, Rahimi enfrenta os perigos e os obstáculos de uma mulher, solteira, jornalista e forasteira, tentando entender a razão da polícia local não estar dando atenção aos crimes, seu impulso, sem dúvida, está na razão pela qual essa busca por justiça acontece: é preciso dar voz às mulheres silenciadas pela violência.
O diretor constrói uma atmosfera claustrofóbica e sufocante, utilizando planos fechados e uma paleta de cores sombrias que refletem a opressão e a violência presentes na história. Esse estilo de fotografia do dinamarquês Nadim Carlsen nos remete aos excelentes policiais nórdicos - aqui sem o azul gélido, mas com o verde e o marrom das paisagens de Mashhad totalmente alinhados ao conceito mais documental de Abbasi. Ele usa muito da câmera solta para trazer veracidade para a narrativa e valorizar a história que é baseada em fatos reais. As performances dos atores são igualmente competentes, com destaque para Zar Amir-Ebrahimi, que entrega uma jornada comovente como Rahimi.
"Holy Spider" é realmente um filme mais difícil, que vai exigir um olhar mais holístico sobre a trama e por se tratar de uma forte crítica social, profunda e contundente, que expõe a hipocrisia e a brutalidade de um sistema patriarcal que oprime e silencia as mulheres iranianas. É um filme que choca e que revolta, mas que também nos convida para uma reflexão importante sobre a força e a resiliência das mulheres em sua luta por justiça e liberdade. Então se você busca uma experiência cinematográfica perturbadora e ao mesmo tempo instigante, que te fará questionar as estruturas de poder e as raízes da violência contra as mulheres, "Holy Spider" é um filme imperdível - especialmente por um terceiro ato digno de muitos prêmios.
Prepare-se para ser confrontado com realidades duras e incômodas, mas também com a força e a bravura de uma mulher que luta por um mundo mais justo. Pode dar o play!
Antes de mais nada é preciso alinhar as expectativas, já que "Holy Spider" pode ser entendido de duas formas: uma pela perspectiva mais sócio-cultural e religiosa do cinema independente iraniano e outra pelo olhar mais investigativo do entretenimento nórdico. Pois bem, se analisarmos o filme mais superficialmente, eu diria que essa produção dinamarquesa dirigida pelo iraniano Ali Abbasi (de "Border"), é apenas um mediado (para bom) thriller policial. Então não caia nessa armadilha, pois essa atmosfera "serial killer" é apenas o pano de fundo para discutir camadas muito mais delicadas sobre a relação visceral entre o ser humano extremista e a violência misógina do Irã. Um dos lançamentos mais comentados de 2022, dividindo opiniões e gerando debates acalorados, "Holy Spider" chega chancelado por mais de 20 prêmios em festivais ao redor do planeta incluindo o de Melhor Atriz no Festival de Cannes para Zar Amir Ebrahimi.
A trama acompanha a saga da destemida jornalista Arezoo Rahimi (Amir-Ebrahimi), que se infiltra no submundo da cidade sagrada de Mashhad, no Irã, em busca de um serial killer que aterroriza a comunidade: o "Aranha Assassina". Motivado por crenças religiosas distorcidas e sexistas, ele se autoproclama o purificador da cidade, exterminando prostitutas que considera "impuras". Confira o trailer (com legendas em inglês):
Impactante no seu conteúdo e provocar na forma como esse conteúdo é apresentado, Abbasi merece todos os elogios por nos entregar um retrato cru e sem concessões sobre a realidade iraniana, onde a misoginia está enraizada na cultura e na religião. Embora em um primeiro olhar "Holy Spider" pareça focar na investigação de Rahimi, o roteiro do próprio diretor com o estreante Afshin Kamran Bahrami, sai do óbvio ao colocar a jornalista em uma verdadeira rota de colisão com as autoridades corruptas e os homens misóginos que defendem os atos do assassino. Se a cada passo, Rahimi enfrenta os perigos e os obstáculos de uma mulher, solteira, jornalista e forasteira, tentando entender a razão da polícia local não estar dando atenção aos crimes, seu impulso, sem dúvida, está na razão pela qual essa busca por justiça acontece: é preciso dar voz às mulheres silenciadas pela violência.
O diretor constrói uma atmosfera claustrofóbica e sufocante, utilizando planos fechados e uma paleta de cores sombrias que refletem a opressão e a violência presentes na história. Esse estilo de fotografia do dinamarquês Nadim Carlsen nos remete aos excelentes policiais nórdicos - aqui sem o azul gélido, mas com o verde e o marrom das paisagens de Mashhad totalmente alinhados ao conceito mais documental de Abbasi. Ele usa muito da câmera solta para trazer veracidade para a narrativa e valorizar a história que é baseada em fatos reais. As performances dos atores são igualmente competentes, com destaque para Zar Amir-Ebrahimi, que entrega uma jornada comovente como Rahimi.
"Holy Spider" é realmente um filme mais difícil, que vai exigir um olhar mais holístico sobre a trama e por se tratar de uma forte crítica social, profunda e contundente, que expõe a hipocrisia e a brutalidade de um sistema patriarcal que oprime e silencia as mulheres iranianas. É um filme que choca e que revolta, mas que também nos convida para uma reflexão importante sobre a força e a resiliência das mulheres em sua luta por justiça e liberdade. Então se você busca uma experiência cinematográfica perturbadora e ao mesmo tempo instigante, que te fará questionar as estruturas de poder e as raízes da violência contra as mulheres, "Holy Spider" é um filme imperdível - especialmente por um terceiro ato digno de muitos prêmios.
Prepare-se para ser confrontado com realidades duras e incômodas, mas também com a força e a bravura de uma mulher que luta por um mundo mais justo. Pode dar o play!
"Inacreditável" é o tipo de história que só te surpreende com o passar dos episódios, então, se você for assistir, sugiro que você leia todo esse review antes para entender como funciona a estrutura da minissérie.
Com 8 episódios de 45 minutos de média, "Inacreditável" pode não agradar logo de cara, até porque a estratégia de lançamento não foi, na verdade, 100% honesta! A Netflix apresentou o projeto como uma minissérie que acompanharia a história de uma jovem chamada Marie Adler (Kaitlyn Dever) que, ao relatar um suposto estupro, é desacreditada pela polícia de seu estado, gerando uma série de complicações na sua vida por muito tempo. De fato essa trama está em "Inacreditável", mas ela é só o ponto de partida para um arco muito maior: o trabalho de investigação das detetives Karen Duvall (Merritt Wever) e Grace Rasmussen (Toni Collette) para encontrar um estuprador serial! Na realidade, são duas linhas temporais distintas, uma em 2008, mostrando o reflexo das escolhas de Adler após seus depoimentos para a polícia e outra em 2011, acompanhando o complicado trabalho de duas detetives de regiões diferentes, caçando o mesmo criminoso.
É preciso dizer que, à partir do momento que você entende o conceito narrativo da série, tudo se encaixa e a experiência melhora muito, mas isso não é imediato - eu diria que durante o terceiro episódio, a estrutura vai ficando mais clara e a história começa a fazer mais sentido e é aí que vem aquela ótima sensação de que valeu muito a pena ter dado o play!
Baseada na reportagem “An unbelivable story of rape” (Uma inacreditável história de estupro), escrita por T. Christian Miller e Ken Armstrong em 2015 - que inclusive lhes rendeu prêmio Pulitzer - o roteiro de "Inacreditável" acaba sendo muito inteligente em separar as histórias em duas linhas temporais distintas que se unem no final (isso não é spoiler, isso é óbvio). Em 2008, ficamos com o caso "mal contado" de Marie - e realmente é difícil cravar o que realmente aconteceu com ela. Mas isso não importa, porque o foco dessa linha é mostrar os reflexos que o frágil sistema policial (e jurídico) dos EUA, podem causar em pessoas que sofrem estupro. Quando Marie é forçada a contar sua experiência várias vezes, para diferentes detetives, que a cada versão vão ficando mais hostis, céticos e menos inclinados a acreditar nela, ela resolve assumir que inventou a história com medo do que poderia acontecer caso nada fosse comprovado. Ela inventou mesmo ou foi realmente atacada? - o grande valor do roteiro é brincar com nossa imaginação e nos forçar ao julgamento, então se permita. O fato é que depois disso as coisas só pioram para ela, provocando sensações muito parecidas com as que sentimos assistindo "Olhos que condenam"! Paralelamente, já três anos mais tarde (é preciso ficar atento nas legendas), somos apresentados à duas investigadoras que não se conhecem por trabalhar em delegacias diferentes, mas que investigam crimes muito semelhantes de estupro, e que nos fazem lembrar do depoimento de Marie. Essa linha trás elementos de gênero policial muito mais próximos de "Manhunt: Unabomber" por exemplo. É de se elogiar a química entre as duas protagonistas femininas da minissérie: a investigadora Duvall é mais reservada e calculista, enquanto a experiente Rasmussen é uma bomba relógio de emoções.
Admito que, para mim, 6 episódios seriam capazes de contar a mesma história sem tanta enrolação, mas é justificável quando o maior objetivo de uma série policial é criar a tensão até se descobrir quem é o criminoso - e aqui dou mais um ponto para o roteiro: ele não rouba no jogo! A sequência de fatos é coerente, real e angustiante, apresenta possibilidades, mas também as descarta rapidamente sem causar nenhum ruído na história - tudo fica redondo, mesmo quando o plot principal parece escapar. O fato de ser basado em fatos reais ajuda muito nesse desenvolvimento e os roteiristas foram inteligentes em usar essas "derrapadas" à favor da trama.
"Inacreditável" não é uma história fácil e imagino que deve ter um peso ainda maior para as mulheres, pois a violência é velada e as vítimas são pessoas comuns da comunidade - sem nenhum tipo de estereótipo! Dói como ser humano, claro, mas ao olhar para lado e ver sua filha brincando vem um sentimento ainda mais forte. É revoltante como a sociedade (no geral) lida com o assunto e quem sofre acaba sendo a que mais é questionada. É a que tem que provar, é a que precisa ser coerente no discurso mesmo estando destroçada por dentro... olha, é preciso ter estômago! Mais dois destaques antes de finalizar: Kaitlyn Dever, como Marie acertou no tom, na forma, no silêncio - ela sofre com os olhos, é possível sentir sua dor! E os episódios 5 e 7 merecem atenção, eles valem a minissérie - ótimos diálogos e interpretações dignas de prêmio! Não perca tempo... play!!!!
"Inacreditável" é o tipo de história que só te surpreende com o passar dos episódios, então, se você for assistir, sugiro que você leia todo esse review antes para entender como funciona a estrutura da minissérie.
Com 8 episódios de 45 minutos de média, "Inacreditável" pode não agradar logo de cara, até porque a estratégia de lançamento não foi, na verdade, 100% honesta! A Netflix apresentou o projeto como uma minissérie que acompanharia a história de uma jovem chamada Marie Adler (Kaitlyn Dever) que, ao relatar um suposto estupro, é desacreditada pela polícia de seu estado, gerando uma série de complicações na sua vida por muito tempo. De fato essa trama está em "Inacreditável", mas ela é só o ponto de partida para um arco muito maior: o trabalho de investigação das detetives Karen Duvall (Merritt Wever) e Grace Rasmussen (Toni Collette) para encontrar um estuprador serial! Na realidade, são duas linhas temporais distintas, uma em 2008, mostrando o reflexo das escolhas de Adler após seus depoimentos para a polícia e outra em 2011, acompanhando o complicado trabalho de duas detetives de regiões diferentes, caçando o mesmo criminoso.
É preciso dizer que, à partir do momento que você entende o conceito narrativo da série, tudo se encaixa e a experiência melhora muito, mas isso não é imediato - eu diria que durante o terceiro episódio, a estrutura vai ficando mais clara e a história começa a fazer mais sentido e é aí que vem aquela ótima sensação de que valeu muito a pena ter dado o play!
Baseada na reportagem “An unbelivable story of rape” (Uma inacreditável história de estupro), escrita por T. Christian Miller e Ken Armstrong em 2015 - que inclusive lhes rendeu prêmio Pulitzer - o roteiro de "Inacreditável" acaba sendo muito inteligente em separar as histórias em duas linhas temporais distintas que se unem no final (isso não é spoiler, isso é óbvio). Em 2008, ficamos com o caso "mal contado" de Marie - e realmente é difícil cravar o que realmente aconteceu com ela. Mas isso não importa, porque o foco dessa linha é mostrar os reflexos que o frágil sistema policial (e jurídico) dos EUA, podem causar em pessoas que sofrem estupro. Quando Marie é forçada a contar sua experiência várias vezes, para diferentes detetives, que a cada versão vão ficando mais hostis, céticos e menos inclinados a acreditar nela, ela resolve assumir que inventou a história com medo do que poderia acontecer caso nada fosse comprovado. Ela inventou mesmo ou foi realmente atacada? - o grande valor do roteiro é brincar com nossa imaginação e nos forçar ao julgamento, então se permita. O fato é que depois disso as coisas só pioram para ela, provocando sensações muito parecidas com as que sentimos assistindo "Olhos que condenam"! Paralelamente, já três anos mais tarde (é preciso ficar atento nas legendas), somos apresentados à duas investigadoras que não se conhecem por trabalhar em delegacias diferentes, mas que investigam crimes muito semelhantes de estupro, e que nos fazem lembrar do depoimento de Marie. Essa linha trás elementos de gênero policial muito mais próximos de "Manhunt: Unabomber" por exemplo. É de se elogiar a química entre as duas protagonistas femininas da minissérie: a investigadora Duvall é mais reservada e calculista, enquanto a experiente Rasmussen é uma bomba relógio de emoções.
Admito que, para mim, 6 episódios seriam capazes de contar a mesma história sem tanta enrolação, mas é justificável quando o maior objetivo de uma série policial é criar a tensão até se descobrir quem é o criminoso - e aqui dou mais um ponto para o roteiro: ele não rouba no jogo! A sequência de fatos é coerente, real e angustiante, apresenta possibilidades, mas também as descarta rapidamente sem causar nenhum ruído na história - tudo fica redondo, mesmo quando o plot principal parece escapar. O fato de ser basado em fatos reais ajuda muito nesse desenvolvimento e os roteiristas foram inteligentes em usar essas "derrapadas" à favor da trama.
"Inacreditável" não é uma história fácil e imagino que deve ter um peso ainda maior para as mulheres, pois a violência é velada e as vítimas são pessoas comuns da comunidade - sem nenhum tipo de estereótipo! Dói como ser humano, claro, mas ao olhar para lado e ver sua filha brincando vem um sentimento ainda mais forte. É revoltante como a sociedade (no geral) lida com o assunto e quem sofre acaba sendo a que mais é questionada. É a que tem que provar, é a que precisa ser coerente no discurso mesmo estando destroçada por dentro... olha, é preciso ter estômago! Mais dois destaques antes de finalizar: Kaitlyn Dever, como Marie acertou no tom, na forma, no silêncio - ela sofre com os olhos, é possível sentir sua dor! E os episódios 5 e 7 merecem atenção, eles valem a minissérie - ótimos diálogos e interpretações dignas de prêmio! Não perca tempo... play!!!!
"Iris" (que em em inglês recebeu o título de "In the Shadow of Iris") é um excelente drama policial francês - daqueles que as informações mais embaralham nossa cabeça, mas que em nenhum momento rouba no jogo. Talvez sem a necessidade de uma suspensão da realidade tão marcante como em "Contratiempo", mas não menos competente na construção de seu mistério - eu diria até que "Iris" vem bem na linha do ótimo "O Amante Duplo".
Iris (Charlotte Le Bon) a linda esposa de Antoine (Jalil Lespert), um banqueiro muito rico e poderoso, desaparece no centro de Paris enquanto esperava do lado de fora de um restaurante enquanto o marido pagava a conta. Depois de apenas algumas horas, um sequestrador exige meio milhão de euros como resgate - a grande questão, porém, é que nem tudo é o que parece quando a corda começa a estourar para lado mais fraco. Confira o trailer com legendas em inglês:
"Iris" que na verdade é um remake do filme "Chaos" (2000), de Hideo Nakata, é instigante desde o primeiro plano. O roteiro do australiano Andrew Bovell vai construindo uma trama que parece previsível, mas que vai nos provocando um certo caos (e aqui fica impossível não citar o acerto do título original). Lespert, que também dirige o filme, foi muito feliz (e corajoso) ao escolher um conceito visual onde os planos (e os cortes) são rápidos e quase sempre "sujos", para justamente nos causar uma sensação de confusão - o fato é que o diretor não deixa de mostrar absolutamente nada durante as cenas, mas nunca ele expõe com clareza a razão de determinados movimentos dos atores em ação.
A dúvida sobre o que assistimos em uma cena, algum relance de personagem ou o que de fato aconteceu como um todo, ganha uma camada ainda mais corajosa quando Lespert não diferencia visualmente as ações na linha do tempo, ou seja, o que é flashback tem exatamente o mesmo conceito estético que o presente. A fotografia do Pierre-Yves Bastard (Versailles) é igualmente linda ao retratar Paris com a mesma competência em que cria esse mood de mistério que o roteiro tanto exige. O elenco também caminha alinhado com essa proposta: Charlotte Le Bon está impecável mais uma vez, mas quem rouba a cena, sem dúvida, é Camille Cottin - ela é uma das melhores atrizes da França na atualidade: versátil e sempre no tom certo!
"Iris" é o tipo do filme que está escondido no catálogo do streaming, mas que vale muito a pena e que é louco para entrar no boca a boca dos amantes de dramas policiais - eu diria, inclusive, que é um thriller que merece ser descoberto e apreciado como um ótimo entretenimento. Saíba que ele é desafiador - um prato cheio para quem gosta de mistério policial com um toque sex appeal!
Vale o play!
"Iris" (que em em inglês recebeu o título de "In the Shadow of Iris") é um excelente drama policial francês - daqueles que as informações mais embaralham nossa cabeça, mas que em nenhum momento rouba no jogo. Talvez sem a necessidade de uma suspensão da realidade tão marcante como em "Contratiempo", mas não menos competente na construção de seu mistério - eu diria até que "Iris" vem bem na linha do ótimo "O Amante Duplo".
Iris (Charlotte Le Bon) a linda esposa de Antoine (Jalil Lespert), um banqueiro muito rico e poderoso, desaparece no centro de Paris enquanto esperava do lado de fora de um restaurante enquanto o marido pagava a conta. Depois de apenas algumas horas, um sequestrador exige meio milhão de euros como resgate - a grande questão, porém, é que nem tudo é o que parece quando a corda começa a estourar para lado mais fraco. Confira o trailer com legendas em inglês:
"Iris" que na verdade é um remake do filme "Chaos" (2000), de Hideo Nakata, é instigante desde o primeiro plano. O roteiro do australiano Andrew Bovell vai construindo uma trama que parece previsível, mas que vai nos provocando um certo caos (e aqui fica impossível não citar o acerto do título original). Lespert, que também dirige o filme, foi muito feliz (e corajoso) ao escolher um conceito visual onde os planos (e os cortes) são rápidos e quase sempre "sujos", para justamente nos causar uma sensação de confusão - o fato é que o diretor não deixa de mostrar absolutamente nada durante as cenas, mas nunca ele expõe com clareza a razão de determinados movimentos dos atores em ação.
A dúvida sobre o que assistimos em uma cena, algum relance de personagem ou o que de fato aconteceu como um todo, ganha uma camada ainda mais corajosa quando Lespert não diferencia visualmente as ações na linha do tempo, ou seja, o que é flashback tem exatamente o mesmo conceito estético que o presente. A fotografia do Pierre-Yves Bastard (Versailles) é igualmente linda ao retratar Paris com a mesma competência em que cria esse mood de mistério que o roteiro tanto exige. O elenco também caminha alinhado com essa proposta: Charlotte Le Bon está impecável mais uma vez, mas quem rouba a cena, sem dúvida, é Camille Cottin - ela é uma das melhores atrizes da França na atualidade: versátil e sempre no tom certo!
"Iris" é o tipo do filme que está escondido no catálogo do streaming, mas que vale muito a pena e que é louco para entrar no boca a boca dos amantes de dramas policiais - eu diria, inclusive, que é um thriller que merece ser descoberto e apreciado como um ótimo entretenimento. Saíba que ele é desafiador - um prato cheio para quem gosta de mistério policial com um toque sex appeal!
Vale o play!
"Jóias Brutas" é sobre o caos que pode se tornar a vida de um ser-humano que está sempre preocupado em ganhar mais dinheiro, no sentido ganancioso da palavra! Aliás, é angustiante como a direção, o roteiro e a montagem trabalham alinhados para provocar essa sensação de caos, de desordem, de desespero! Simplesmente incrível!
O filme acompanha a jornada do joalheiro (e judeu) Howard Ratner (Adam Sandler). Viciado em apostas, e não necessariamente apenas com dinheiro, Ratner está sempre colocando sua própria vida jogo. Assim que consegue uma pedra de opala de mineradores da Etiópia, ele inicia uma série de negociações paralelas com o objetivo de valorizar o artefacto que vai entrar em um leilão em breve. Acontece que Ratner acaba se enrolando e agora precisa quitar algumas dívidas anteriores, para isso, sua única saída são as apostas, cada vez mais arriscadas, envolvendo jogos de basquete e um dos seus principais clientes, o astro do Boston Celtics, Kevin Garnett. Confira o trailer:
Esse é o segundo filme que assisto dos irmãos Benny e Josh Safdie - o primeiro, o excelente, Amor, Drogas e Nova York, uma espécie de "Eu, Christiane F." com um olhar extremamente visceral sobre o relacionamento humano e como o ambiente impacta nesse processo de auto-destruição. O interessante é que "Jóias Brutas" segue esse mesmo conceito narrativo e visual, e fortalece a identidade dos irmãos Safdie como poucas vezes vi na história recente do cinema autoral. Eu já adianto: prestem muita atenção no trabalho desses caras!
Se existiu toda a polêmica pela não indicação do Adam Sandler por "Jóias Brutas", já que essa parecia ser a chance da sua vida como comentamos no blog, é preciso dizer que o filme vai muito além do seu incrível trabalho. Da concepção estética ao roteiro redondinho, passando por uma direção de elenco simplesmente fabulosa - esse filme é daqueles que mexem com nossas sensações e que entrega um final impecável!
Existem alguns elementos nesse filme dos irmão Safdie que podem passar despercebidos para os menos atentos, mas que ajudam a construir todas as sensações que temos enquanto acompanhamos a história. Muito do que sentimos é reflexo de como a ambientação de uma ação nos provoca a refletir, veja: existe um conceito visual frenético, mérito de um trabalho sensacional do fotógrafo Darius Khondji - um daqueles profissionais notáveis que ainda não ganhou um Oscar, mas carrega no currículo obras-primas como "Seven", "Evita", "Okja", "Amor", "Meia-noite em Paris" e por aí vai! Pois bem, alinhado a isso temos um desenho de som fantástico - reparem em como a cidade pulsa (NY é aquilo) e em detalhes simples como o som da botão que abre a porta de segurança da loja, nos causam uma enorme sensação de angústia! Tudo isso com personagens falando todos ao mesmo tempo onde, mais importante do que entende-los, é experimentar aquela desorientação momentânea que a cena propõe!
Seguindo essa linha, a trilha sonora mais tecno traz para "Jóias Brutas" um ar hipnótico, moderno, inovador, tão presente na vida do nova-iorquino! Reparem no desenho da luz negra e no brilho das roupas na cena da boate onde, em determinado momento, tudo desaparece para dar protagonismo ao personagem que interessa na construção do próximo caos: no caso, Demany (LaKeith Stanfield), o responsável por levar clientes ilustres para a joalheria de Ratner. Nessa mesma sequência, sentimos na pele a dor de nunca ser o centro das atenções ou de ter o respeito por ser o que é, e sim por já ter tido algo, quando Howard Ratner se depara com sua "amante gostosa" (Julia Fox) ao lado de alguém supostamente mais em evidência naquele momento! É intenso, real e cruel!
O resumo técnico de "Jóias Brutas" comprova uma das maiores injustiças que a Academia cometeu em 2020 (ao lado de "A Despedida"). Como "Closer", onde o subtexto e as sensações são mais profundos do que exatamente o que vemos na tela, talvez esse filme não se estabeleça como uma unanimidade! Para mim, um dos melhores do ano sem a menor sombra de dúvidas e um convite ao "cinema de gênero com alma". Não se trata de um suspense policial como a Netflix erradamente divulgou, "Jóias Brutas" é sim um drama profundo, auto-destrutivo e caótico, capaz de relativizar a importância da família, da vida e do caráter pela busca de um sonho material e ostensivo que só existe onde pouco se constrói com propósito!
Play, para não se arrepender!
"Jóias Brutas" é sobre o caos que pode se tornar a vida de um ser-humano que está sempre preocupado em ganhar mais dinheiro, no sentido ganancioso da palavra! Aliás, é angustiante como a direção, o roteiro e a montagem trabalham alinhados para provocar essa sensação de caos, de desordem, de desespero! Simplesmente incrível!
O filme acompanha a jornada do joalheiro (e judeu) Howard Ratner (Adam Sandler). Viciado em apostas, e não necessariamente apenas com dinheiro, Ratner está sempre colocando sua própria vida jogo. Assim que consegue uma pedra de opala de mineradores da Etiópia, ele inicia uma série de negociações paralelas com o objetivo de valorizar o artefacto que vai entrar em um leilão em breve. Acontece que Ratner acaba se enrolando e agora precisa quitar algumas dívidas anteriores, para isso, sua única saída são as apostas, cada vez mais arriscadas, envolvendo jogos de basquete e um dos seus principais clientes, o astro do Boston Celtics, Kevin Garnett. Confira o trailer:
Esse é o segundo filme que assisto dos irmãos Benny e Josh Safdie - o primeiro, o excelente, Amor, Drogas e Nova York, uma espécie de "Eu, Christiane F." com um olhar extremamente visceral sobre o relacionamento humano e como o ambiente impacta nesse processo de auto-destruição. O interessante é que "Jóias Brutas" segue esse mesmo conceito narrativo e visual, e fortalece a identidade dos irmãos Safdie como poucas vezes vi na história recente do cinema autoral. Eu já adianto: prestem muita atenção no trabalho desses caras!
Se existiu toda a polêmica pela não indicação do Adam Sandler por "Jóias Brutas", já que essa parecia ser a chance da sua vida como comentamos no blog, é preciso dizer que o filme vai muito além do seu incrível trabalho. Da concepção estética ao roteiro redondinho, passando por uma direção de elenco simplesmente fabulosa - esse filme é daqueles que mexem com nossas sensações e que entrega um final impecável!
Existem alguns elementos nesse filme dos irmão Safdie que podem passar despercebidos para os menos atentos, mas que ajudam a construir todas as sensações que temos enquanto acompanhamos a história. Muito do que sentimos é reflexo de como a ambientação de uma ação nos provoca a refletir, veja: existe um conceito visual frenético, mérito de um trabalho sensacional do fotógrafo Darius Khondji - um daqueles profissionais notáveis que ainda não ganhou um Oscar, mas carrega no currículo obras-primas como "Seven", "Evita", "Okja", "Amor", "Meia-noite em Paris" e por aí vai! Pois bem, alinhado a isso temos um desenho de som fantástico - reparem em como a cidade pulsa (NY é aquilo) e em detalhes simples como o som da botão que abre a porta de segurança da loja, nos causam uma enorme sensação de angústia! Tudo isso com personagens falando todos ao mesmo tempo onde, mais importante do que entende-los, é experimentar aquela desorientação momentânea que a cena propõe!
Seguindo essa linha, a trilha sonora mais tecno traz para "Jóias Brutas" um ar hipnótico, moderno, inovador, tão presente na vida do nova-iorquino! Reparem no desenho da luz negra e no brilho das roupas na cena da boate onde, em determinado momento, tudo desaparece para dar protagonismo ao personagem que interessa na construção do próximo caos: no caso, Demany (LaKeith Stanfield), o responsável por levar clientes ilustres para a joalheria de Ratner. Nessa mesma sequência, sentimos na pele a dor de nunca ser o centro das atenções ou de ter o respeito por ser o que é, e sim por já ter tido algo, quando Howard Ratner se depara com sua "amante gostosa" (Julia Fox) ao lado de alguém supostamente mais em evidência naquele momento! É intenso, real e cruel!
O resumo técnico de "Jóias Brutas" comprova uma das maiores injustiças que a Academia cometeu em 2020 (ao lado de "A Despedida"). Como "Closer", onde o subtexto e as sensações são mais profundos do que exatamente o que vemos na tela, talvez esse filme não se estabeleça como uma unanimidade! Para mim, um dos melhores do ano sem a menor sombra de dúvidas e um convite ao "cinema de gênero com alma". Não se trata de um suspense policial como a Netflix erradamente divulgou, "Jóias Brutas" é sim um drama profundo, auto-destrutivo e caótico, capaz de relativizar a importância da família, da vida e do caráter pela busca de um sonho material e ostensivo que só existe onde pouco se constrói com propósito!
Play, para não se arrepender!
Séries de crimes existem de sobra, e algumas seguem aquela linearidade e padrões já estabelecidos que muitas vezes temos a impressão de estarmos em uma nova temporada de algo que já vimos antes. Nem sempre essa familiaridade é um bom sinal, por isso quando alguma obra ousa contar de forma diferente a sua história, acaba se tornando um grande sucesso - como foi com o caso de ”Mare of Easttown” e “True Detective” da HBO, que embora não sejam tão diferentes assim, apostavam nos dramas pessoais de seus personagens que eram tão complexos quanto o mistério do crime central. ”Landscapers” consegue ser até mais do que isso (não estou dizendo que é melhor que as outras duas que eu citei, porque todas são excelentes em diferentes formas), já que além da profundidade que os personagens também possuem, a minissérie de quatro episódios acaba inserindo um conceito estético e narrativo diferentes, e muita arte para ir além de uma história previsível de crime, no caso, real - bem no tom de "Flesh and Blood: Um Crime Na Vizinhança", aliás.
O casal Susan (Olivia Colman) e Christopher (David Thewlis) viviam uma vida tranquila em um bairro residencial na pequena cidade de Mansfield, na Inglaterra, até se mudarem misteriosamente para Lille na França. Quando a polícia inglesa encontram dois corpos enterrados no quintal da casa que eram deles e descobrem que os cadáveres pertencem aos pais de Susan, ela e o marido se tornam, obviamente, os principais suspeitos de um crime que aconteceu 15 anos atrás. Confira o trailer (em inglês):
O interessante dessa minissérie é que ela transita entre vários gêneros com uma delicadeza admirável - do drama ao suspense, do suspense ao humor ácido (muito próximo de “Fargo”), e certas vezes até ao romance, afinal ”Landscapers”, no final das contas, não deixa de ser uma história de amor. Apesar de todos seus acertos, “Landscapers” deve atrair uma parcela bem específica da audiência, basta ver a grande aceitação entre a crítica especializada, alcançando até 98% de aceitação com base em 46 resenhas. Já a porcentagem entre o público ficou apenas em 75% - e eu digo "apenas" porque uma minissérie desse calibre merecia um consenso geral.
A minissérie tem um conceito narrativo bastante experimental, brincando com tudo que é possível (algo como acontece nos filmes de Wes Anderson, por exemplo): desde recriar cenas de clássicos do cinema para fazer metáforas com a trama principal, até mesmo mostrar os bastidores da gravação de alguma cena enquanto a trama acontece! O excelente diretor Will Sharpe (“A Vida Eletrizante de Louis Wain”) não tem medo de ousar e ir além do que uma história de crime deveria entregar, entretanto, são justamente essas escolhas conceituais que podem distanciar algumas pessoas mais desatentas.
Veja, embora a trama oscile entre o realismo e o surrealismo, nenhum dos recursos visuais parece gratuito, especialmente por se tratar de uma história em que os personagens, de fato, se encaixam nesse mundo fantástico - para não dizer "esquisito". A protagonista Susan (Olivia Colman) adora tanto cinema, que praticamente ignora os problemas da sua vida real, gastando até mais do que poderia para ter seus pôsteres e colecionáveis de clássicos do faroeste - entre outros absurdos que a personagem faz.
"Landscapers” prende a atenção - inicialmente pela história real em que se baseia, mas com o decorrer dos episódios o que nos encanta é a proposta artística, com o capricho da produção, a enorme criatividade, as sutilezas e, claro, as performances sublimes de seus protagonistas. Vale muito a pena e esteja preparado para se surpreender!
Escrito por Mark Hewes - uma parceria @indiqueipraver
Séries de crimes existem de sobra, e algumas seguem aquela linearidade e padrões já estabelecidos que muitas vezes temos a impressão de estarmos em uma nova temporada de algo que já vimos antes. Nem sempre essa familiaridade é um bom sinal, por isso quando alguma obra ousa contar de forma diferente a sua história, acaba se tornando um grande sucesso - como foi com o caso de ”Mare of Easttown” e “True Detective” da HBO, que embora não sejam tão diferentes assim, apostavam nos dramas pessoais de seus personagens que eram tão complexos quanto o mistério do crime central. ”Landscapers” consegue ser até mais do que isso (não estou dizendo que é melhor que as outras duas que eu citei, porque todas são excelentes em diferentes formas), já que além da profundidade que os personagens também possuem, a minissérie de quatro episódios acaba inserindo um conceito estético e narrativo diferentes, e muita arte para ir além de uma história previsível de crime, no caso, real - bem no tom de "Flesh and Blood: Um Crime Na Vizinhança", aliás.
O casal Susan (Olivia Colman) e Christopher (David Thewlis) viviam uma vida tranquila em um bairro residencial na pequena cidade de Mansfield, na Inglaterra, até se mudarem misteriosamente para Lille na França. Quando a polícia inglesa encontram dois corpos enterrados no quintal da casa que eram deles e descobrem que os cadáveres pertencem aos pais de Susan, ela e o marido se tornam, obviamente, os principais suspeitos de um crime que aconteceu 15 anos atrás. Confira o trailer (em inglês):
O interessante dessa minissérie é que ela transita entre vários gêneros com uma delicadeza admirável - do drama ao suspense, do suspense ao humor ácido (muito próximo de “Fargo”), e certas vezes até ao romance, afinal ”Landscapers”, no final das contas, não deixa de ser uma história de amor. Apesar de todos seus acertos, “Landscapers” deve atrair uma parcela bem específica da audiência, basta ver a grande aceitação entre a crítica especializada, alcançando até 98% de aceitação com base em 46 resenhas. Já a porcentagem entre o público ficou apenas em 75% - e eu digo "apenas" porque uma minissérie desse calibre merecia um consenso geral.
A minissérie tem um conceito narrativo bastante experimental, brincando com tudo que é possível (algo como acontece nos filmes de Wes Anderson, por exemplo): desde recriar cenas de clássicos do cinema para fazer metáforas com a trama principal, até mesmo mostrar os bastidores da gravação de alguma cena enquanto a trama acontece! O excelente diretor Will Sharpe (“A Vida Eletrizante de Louis Wain”) não tem medo de ousar e ir além do que uma história de crime deveria entregar, entretanto, são justamente essas escolhas conceituais que podem distanciar algumas pessoas mais desatentas.
Veja, embora a trama oscile entre o realismo e o surrealismo, nenhum dos recursos visuais parece gratuito, especialmente por se tratar de uma história em que os personagens, de fato, se encaixam nesse mundo fantástico - para não dizer "esquisito". A protagonista Susan (Olivia Colman) adora tanto cinema, que praticamente ignora os problemas da sua vida real, gastando até mais do que poderia para ter seus pôsteres e colecionáveis de clássicos do faroeste - entre outros absurdos que a personagem faz.
"Landscapers” prende a atenção - inicialmente pela história real em que se baseia, mas com o decorrer dos episódios o que nos encanta é a proposta artística, com o capricho da produção, a enorme criatividade, as sutilezas e, claro, as performances sublimes de seus protagonistas. Vale muito a pena e esteja preparado para se surpreender!
Escrito por Mark Hewes - uma parceria @indiqueipraver
"Lorena" é uma minissérie documental da Prime Vídeo das mais curiosas - primeiro por se tratar de uma história incomum e segundo por ser um recorte infeliz de parte de uma sociedade americana que merece (ou não) ser estudada. Desde o inicio do documentário já nos deparamos com o circo que foi criado em cima de um fato muito sério, que teve como causa episódios de violência doméstica e como resultado uma lesão corporal das mais graves. O grande problema, no entanto, foi a espetacularização do caso e graças a isso, as consequências foram as mais cruéis para todos os envolvidos.
Em 1993, as manchetes de todo mundo divulgavam, vorazmente, a história da jovem imigrante Lorena Bobbitt que cortou o órgão genital de seu marido, John Wayne Bobbitt, um ex-fuzileiro da marinha americana. O assunto, que dominou a imprensa ao longo de todo o ano, e que virou motivo piada por muito tempo, trazia o "bizarro" como seu fator mais instigante, mas escondia uma dolorosa experiência de sofrimento fisico e psicológico contínuo ao longo de quatro anos de uma relação completamente abusiva. Confira o trailer (em inglês):
Dividida em quatro episódios de uma hora, a minissérie produzida por Jordan Peele (vencedor do Oscar por "Corra!") tenta corrigir os erros cometidos pela mídia nos anos 90, entender as motivações de Lorena para atacar John Wayne e ainda posicionar os dois lados da história de uma forma que a própria audiência tire suas conclusões - e te garanto: é impossível não julgar as atitudes dos dois personagens a cada nova informação! Obviamente, o documentário traça uma linha do tempo baseada não apenas em como o crime se tornou alvo de tabloides mundiais (com um significado cultural bem mais forte nos Estados Unidos), mas de como essa narrativa foi contada de uma forma completamente unilateral. Mesmo respeitando as limitações da época do crime, "Lorena" busca outros olhares, interpretações e acaba pontuando, da sua forma, como a sociedade lidou com tudo isso da pior maneira possível. Vale lembrar que quando o caso veio à tona, todos lembravam do membro decepado do rapaz, mas poucos comentavam sobre a moça que foi agredida e estuprada.
A minissérie é muito competente em montar um denso e complexo mapa de conexões onde nomes, locais, circunstâncias e contextos são interligados de maneira muito simples e inteligente, nos dando uma percepção bastante clara e completa sobre o caso. São depoimentos de médicos, cirurgiões, enfermeiros, socorristas, advogados, familiares, amigos e até de membros do júri, que se conectam com uma quantidade enorme (e relevante) de imagens de arquivo - aliás, em um dos episódios temos acesso aos trechos mais importantes do testemunho da própria Lorena em seu julgamento, que na época foi transmitido ao vivo pela "Court TV", e olha, são impressionantes! Sem cortes, sem trilha, apenas as palavras de uma mulher que mal consegue se comunicar, relatando como foi violentada e estuprada pelo marido - é de embrulhar o estômago e muito difícil de assistir.
Dirigida pelo talentoso Joshua Rofé, a minissérie acerta em cheio ao mostrar diversos olhares de uma mesma história sem ter a pretensão (pelo menos descaradamente) de nomear um vilão ou um mocinho. O fato é que "Lorena" explica como o senso comum preferiu se apegar ao que existe de mais superficial sobre o assunto, buscando um debate ignorante sobre violência em troca de uma audiência alta, enquanto as consequências desse silêncio serviram apenas para dar continuidade a um problema que está longe de ser extinto!
Vale muito o seu play!
"Lorena" é uma minissérie documental da Prime Vídeo das mais curiosas - primeiro por se tratar de uma história incomum e segundo por ser um recorte infeliz de parte de uma sociedade americana que merece (ou não) ser estudada. Desde o inicio do documentário já nos deparamos com o circo que foi criado em cima de um fato muito sério, que teve como causa episódios de violência doméstica e como resultado uma lesão corporal das mais graves. O grande problema, no entanto, foi a espetacularização do caso e graças a isso, as consequências foram as mais cruéis para todos os envolvidos.
Em 1993, as manchetes de todo mundo divulgavam, vorazmente, a história da jovem imigrante Lorena Bobbitt que cortou o órgão genital de seu marido, John Wayne Bobbitt, um ex-fuzileiro da marinha americana. O assunto, que dominou a imprensa ao longo de todo o ano, e que virou motivo piada por muito tempo, trazia o "bizarro" como seu fator mais instigante, mas escondia uma dolorosa experiência de sofrimento fisico e psicológico contínuo ao longo de quatro anos de uma relação completamente abusiva. Confira o trailer (em inglês):
Dividida em quatro episódios de uma hora, a minissérie produzida por Jordan Peele (vencedor do Oscar por "Corra!") tenta corrigir os erros cometidos pela mídia nos anos 90, entender as motivações de Lorena para atacar John Wayne e ainda posicionar os dois lados da história de uma forma que a própria audiência tire suas conclusões - e te garanto: é impossível não julgar as atitudes dos dois personagens a cada nova informação! Obviamente, o documentário traça uma linha do tempo baseada não apenas em como o crime se tornou alvo de tabloides mundiais (com um significado cultural bem mais forte nos Estados Unidos), mas de como essa narrativa foi contada de uma forma completamente unilateral. Mesmo respeitando as limitações da época do crime, "Lorena" busca outros olhares, interpretações e acaba pontuando, da sua forma, como a sociedade lidou com tudo isso da pior maneira possível. Vale lembrar que quando o caso veio à tona, todos lembravam do membro decepado do rapaz, mas poucos comentavam sobre a moça que foi agredida e estuprada.
A minissérie é muito competente em montar um denso e complexo mapa de conexões onde nomes, locais, circunstâncias e contextos são interligados de maneira muito simples e inteligente, nos dando uma percepção bastante clara e completa sobre o caso. São depoimentos de médicos, cirurgiões, enfermeiros, socorristas, advogados, familiares, amigos e até de membros do júri, que se conectam com uma quantidade enorme (e relevante) de imagens de arquivo - aliás, em um dos episódios temos acesso aos trechos mais importantes do testemunho da própria Lorena em seu julgamento, que na época foi transmitido ao vivo pela "Court TV", e olha, são impressionantes! Sem cortes, sem trilha, apenas as palavras de uma mulher que mal consegue se comunicar, relatando como foi violentada e estuprada pelo marido - é de embrulhar o estômago e muito difícil de assistir.
Dirigida pelo talentoso Joshua Rofé, a minissérie acerta em cheio ao mostrar diversos olhares de uma mesma história sem ter a pretensão (pelo menos descaradamente) de nomear um vilão ou um mocinho. O fato é que "Lorena" explica como o senso comum preferiu se apegar ao que existe de mais superficial sobre o assunto, buscando um debate ignorante sobre violência em troca de uma audiência alta, enquanto as consequências desse silêncio serviram apenas para dar continuidade a um problema que está longe de ser extinto!
Vale muito o seu play!
"Losing Alice" é sensacional, eu diria, imperdível! Provavelmente você nem saiba do que eu estou falando, já que a série estreou quietinha, sem muito marketing e na AppleTV+, serviço de streaming que ainda está se estabelecendo no mercado nacional; mas, meu amigo, essa produção israelense com elementos de suspense psicológico, drama e erotismo, bem ao estilo "Instinto Selvagem" ou "Mulher solteira procura", nos prende de tal forma que nem vemos o tempo passar!
A trama é inspirada na história de Fausto e está dividida em 8 episódios de 50 minutos. Ela acompanha Alice (Ayelet Zurer) uma ambiciosa diretora de cinema de 47 anos que tenta dar uma guinada em sua carreira depois de passar um bom tempo cuidado de sua família. Quando ela encontra uma jovem e sexy roteirista, Sophie (Lihi Kornowski), sua vida vira de ponta cabeça. Alice fica obcecada pelo roteiro de Sophie que, por coincidência, seu marido, David (Gal Toren) irá protagonizar, e faz de tudo para assumir a direção do projeto. Obviamente que ela entra no projeto e conforme as duas vão se aproximando e o roteiro de Sophie vai ganhando vida, Alice vai renunciando toda sua integridade moral em um jogo perigoso de sedução, busca pelo sucesso e poder. Confira o trailer:
"Losing Alice", é escrita e dirigida por Sigal Avin, o que nos proporciona uma total integração de um texto excelente com uma direção muito segura e de muita qualidade. Veja, não se trata de uma tarefa fácil já que a história, propositalmente, orbita entre o real e a fantasia de uma forma muito orgânica e inteligente, nos provocando a criar inúmeras teorias do que realmente está acontecendo - mesmo que não esteja acontecendo nada demais! É incrível como o roteiro nos convida para mergulhar nas inúmeras camadas dos protagonistas (e aqui cito: Alice, Sophie e o próprio David) e encarar de frente todos os seus desejos mais ocultos e particulares, suas angústias, inseguranças, alegrias, e claro, ambições.
A fotografia, a trilha sonora e a direção de arte são sensacionais - tudo se conecta perfeitamente com uma atmosfera provocante, cheia de fetiches, no limite da tensão e do prazer. Reparem na casa de Alice e David - ela é toda de vidro e a relação com os vizinhos, embora pontuais, fortalecem a personalidade dos protagonistas e a complexidade das suas atitudes. É, de fato, um roteiro muito cuidadoso, com uma direção de muito bom gosto e uma produção irretocável - nível HBO!
Com essa chancela, embarque nessa jornada que vai valer muito a pena!
"Losing Alice" é sensacional, eu diria, imperdível! Provavelmente você nem saiba do que eu estou falando, já que a série estreou quietinha, sem muito marketing e na AppleTV+, serviço de streaming que ainda está se estabelecendo no mercado nacional; mas, meu amigo, essa produção israelense com elementos de suspense psicológico, drama e erotismo, bem ao estilo "Instinto Selvagem" ou "Mulher solteira procura", nos prende de tal forma que nem vemos o tempo passar!
A trama é inspirada na história de Fausto e está dividida em 8 episódios de 50 minutos. Ela acompanha Alice (Ayelet Zurer) uma ambiciosa diretora de cinema de 47 anos que tenta dar uma guinada em sua carreira depois de passar um bom tempo cuidado de sua família. Quando ela encontra uma jovem e sexy roteirista, Sophie (Lihi Kornowski), sua vida vira de ponta cabeça. Alice fica obcecada pelo roteiro de Sophie que, por coincidência, seu marido, David (Gal Toren) irá protagonizar, e faz de tudo para assumir a direção do projeto. Obviamente que ela entra no projeto e conforme as duas vão se aproximando e o roteiro de Sophie vai ganhando vida, Alice vai renunciando toda sua integridade moral em um jogo perigoso de sedução, busca pelo sucesso e poder. Confira o trailer:
"Losing Alice", é escrita e dirigida por Sigal Avin, o que nos proporciona uma total integração de um texto excelente com uma direção muito segura e de muita qualidade. Veja, não se trata de uma tarefa fácil já que a história, propositalmente, orbita entre o real e a fantasia de uma forma muito orgânica e inteligente, nos provocando a criar inúmeras teorias do que realmente está acontecendo - mesmo que não esteja acontecendo nada demais! É incrível como o roteiro nos convida para mergulhar nas inúmeras camadas dos protagonistas (e aqui cito: Alice, Sophie e o próprio David) e encarar de frente todos os seus desejos mais ocultos e particulares, suas angústias, inseguranças, alegrias, e claro, ambições.
A fotografia, a trilha sonora e a direção de arte são sensacionais - tudo se conecta perfeitamente com uma atmosfera provocante, cheia de fetiches, no limite da tensão e do prazer. Reparem na casa de Alice e David - ela é toda de vidro e a relação com os vizinhos, embora pontuais, fortalecem a personalidade dos protagonistas e a complexidade das suas atitudes. É, de fato, um roteiro muito cuidadoso, com uma direção de muito bom gosto e uma produção irretocável - nível HBO!
Com essa chancela, embarque nessa jornada que vai valer muito a pena!
O fato de "Lost Girls" (que em português ganhou o subtítulo de "Os crimes de Long Island") ser baseado em fatos reais, joga muito a favor dessa produção da Netflix que estreiou no último Festival de Sundance. A história se passa em 2010 e gira em torno de Mari Gilbert (Amy Ryan), mãe de uma prostituta recém desaparecida chamada Shannan. Após a descoberta de 4 ossadas de outras mulheres, também prostitutas, Gilbert inicia uma campanha implacável, forçando o chefe de polícia de Long Island (Gabriel Byrne) a conduzir uma busca por sua filha e a procurar pelo assassino em série que pode ter sido responsável por matar mais de 16 mulheres desde meados dos anos 90. Confira o trailer:
Embora a premissa seja muito parecida com "Três Anúncios para um Crime", a jornada de uma mãe para encontrar o responsável pela morte de sua filha enquanto luta contra o descaso (e a incompetência) da policia; "Lost Girls" entrega um filme sem a mesma força dramática e, mesmo muito bem produzido, fica muito fácil encontrar seu principal problema: o roteiro. O roteiristaMichael Werwie, do ótimo "Ted Bundy: A Irresistível Face do Mal", tinha um excelente material na mão: o livro "Lost Girls: An Unsolved American Mystery", de Robert Kolker, tem tudo que um bom filme de investigação precisa, mas parece que na prática tudo ficou meio jogado, corrido e até superficial se analisarmos bem. Fiquei com a sensação de que a história tinha muito mais para contar e com vários personagens para desenvolver - e aqui cito três exemplos: o chefe de polícia prestes a se aposentar, Richard Dormer, e as filhas mais novas de Gilbert, Sherre (Thomasin McKenzie) e, principalmente, Sarra (Oona Laurence) - quando você ler as legendas finais, essa minha observação fará ainda mais sentido - é surpreendente!
É claro que não há como deixar de ter empatia pela família Gilbert e que os elementos de policiais, ao melhor estilo "Making a Murderer", nos mantém conectados com a história, mas é inegável também que "Lost Girls" tinha potencial para alcançar voos mais altos - eu diria até que tem material para uma boa minissérie!Vale o play para quem gosta do gênero, mas será necessário uma boa dose de abstração da realidade para lidar com as escolhas pouco inspiradas do roteiro e também com a falta de habilidade da diretora em criar um clima de tensão como pede um filme como esse!
A diretora Liz Garbus é uma documentarista de muito sucesso, duas vezes indicada ao Oscar de "Melhor Documentário", com "The Farm" em 1998 e, mais recentemente, "What Happened, Miss Simone?" em 2016!. Acontece que, como comentamos em "Sergio", a gramática cinematográfica da ficção é completamente diferente do documentário - o time é outro, a relação do roteiro com a filmagem tem outras prioridades e a condução da história tem um elemento essencial que nunca deve ser descartado: a importância do trabalho do ator! Garbus sabe enquadrar para contar a história e ao lado do seu parceiro, o excelente fotógrafo Igor Martinovic (The Outsider), nos entrega lindos planos, muito bem conceitualizados e coerentes com o gênero, mas a construção das cenas de tensão e a falta de domínio na relação com os atores derrubam o filme - basta comparar as personagens Mildred Hayes (Frances McDormand) de "Três Anúncios para um Crime" com Mari Gilbert (Amy Ryan) de "Lost Girls". Embora as duas sejam excelentes atrizes e carreguem a responsabilidade de nos guiar pelos respectivos dramas familiares e sentimentos mais íntimos da dor de perder uma filha, McDormand fica anos luz de Gilbert em profundidade e oportunidade de expor seu trabalho!
“Quem perderia tanto tempo procurando uma prostituta?” - essa frase dita por um dos policiais, funciona quase como uma provocação: enquanto as mulheres assassinadas são constantemente chamadas de prostitutas com certo desdém, existe uma forte crítica à sociedade elitista e misógina americana personificadas por dois ótimos personagens (que também mereciam mais tempo de tela): o médico Peter Hackett (Reed Birney) e o policial Dean Bostick (Dean Winters). Mais uma vez sentimos que ambos poderiam ser muito melhor aproveitados para que os odiássemos ainda mais. Quando a diretora Liz Garbus foca nos elementos dramáticos que constroem o caso real, investigativo, inclusive com cenas documentais da época, temos um ótimo filme; quando é cobrado um pouco mais de dramaturgia, tensão ou até uma sensibilidade maior para cenas mais introspectivas ou que dialogam com sentimentos mais latentes, como raiva ou culpa, aí vemos que existe um problema estrutural e de alinhamento entre roteiro / direção - o que resulta só em um bom entretenimento.
"Lost Girls" não é um filme do David Fincher como ("Garota Exemplar" ou "Zodíaco"), mas também não é algo enlatado como "Não fale com estranhos" - o filme funciona bem, tem uma excelente qualidade técnica e uma história bastante envolvente, só peca na falta de aprofundamento do roteiro e na pouca habilidade da diretor para acertar o tom, mas posso afirmar tranqüilamente que vale o pouco mais de 90 minutos de filme!
O fato de "Lost Girls" (que em português ganhou o subtítulo de "Os crimes de Long Island") ser baseado em fatos reais, joga muito a favor dessa produção da Netflix que estreiou no último Festival de Sundance. A história se passa em 2010 e gira em torno de Mari Gilbert (Amy Ryan), mãe de uma prostituta recém desaparecida chamada Shannan. Após a descoberta de 4 ossadas de outras mulheres, também prostitutas, Gilbert inicia uma campanha implacável, forçando o chefe de polícia de Long Island (Gabriel Byrne) a conduzir uma busca por sua filha e a procurar pelo assassino em série que pode ter sido responsável por matar mais de 16 mulheres desde meados dos anos 90. Confira o trailer:
Embora a premissa seja muito parecida com "Três Anúncios para um Crime", a jornada de uma mãe para encontrar o responsável pela morte de sua filha enquanto luta contra o descaso (e a incompetência) da policia; "Lost Girls" entrega um filme sem a mesma força dramática e, mesmo muito bem produzido, fica muito fácil encontrar seu principal problema: o roteiro. O roteiristaMichael Werwie, do ótimo "Ted Bundy: A Irresistível Face do Mal", tinha um excelente material na mão: o livro "Lost Girls: An Unsolved American Mystery", de Robert Kolker, tem tudo que um bom filme de investigação precisa, mas parece que na prática tudo ficou meio jogado, corrido e até superficial se analisarmos bem. Fiquei com a sensação de que a história tinha muito mais para contar e com vários personagens para desenvolver - e aqui cito três exemplos: o chefe de polícia prestes a se aposentar, Richard Dormer, e as filhas mais novas de Gilbert, Sherre (Thomasin McKenzie) e, principalmente, Sarra (Oona Laurence) - quando você ler as legendas finais, essa minha observação fará ainda mais sentido - é surpreendente!
É claro que não há como deixar de ter empatia pela família Gilbert e que os elementos de policiais, ao melhor estilo "Making a Murderer", nos mantém conectados com a história, mas é inegável também que "Lost Girls" tinha potencial para alcançar voos mais altos - eu diria até que tem material para uma boa minissérie!Vale o play para quem gosta do gênero, mas será necessário uma boa dose de abstração da realidade para lidar com as escolhas pouco inspiradas do roteiro e também com a falta de habilidade da diretora em criar um clima de tensão como pede um filme como esse!
A diretora Liz Garbus é uma documentarista de muito sucesso, duas vezes indicada ao Oscar de "Melhor Documentário", com "The Farm" em 1998 e, mais recentemente, "What Happened, Miss Simone?" em 2016!. Acontece que, como comentamos em "Sergio", a gramática cinematográfica da ficção é completamente diferente do documentário - o time é outro, a relação do roteiro com a filmagem tem outras prioridades e a condução da história tem um elemento essencial que nunca deve ser descartado: a importância do trabalho do ator! Garbus sabe enquadrar para contar a história e ao lado do seu parceiro, o excelente fotógrafo Igor Martinovic (The Outsider), nos entrega lindos planos, muito bem conceitualizados e coerentes com o gênero, mas a construção das cenas de tensão e a falta de domínio na relação com os atores derrubam o filme - basta comparar as personagens Mildred Hayes (Frances McDormand) de "Três Anúncios para um Crime" com Mari Gilbert (Amy Ryan) de "Lost Girls". Embora as duas sejam excelentes atrizes e carreguem a responsabilidade de nos guiar pelos respectivos dramas familiares e sentimentos mais íntimos da dor de perder uma filha, McDormand fica anos luz de Gilbert em profundidade e oportunidade de expor seu trabalho!
“Quem perderia tanto tempo procurando uma prostituta?” - essa frase dita por um dos policiais, funciona quase como uma provocação: enquanto as mulheres assassinadas são constantemente chamadas de prostitutas com certo desdém, existe uma forte crítica à sociedade elitista e misógina americana personificadas por dois ótimos personagens (que também mereciam mais tempo de tela): o médico Peter Hackett (Reed Birney) e o policial Dean Bostick (Dean Winters). Mais uma vez sentimos que ambos poderiam ser muito melhor aproveitados para que os odiássemos ainda mais. Quando a diretora Liz Garbus foca nos elementos dramáticos que constroem o caso real, investigativo, inclusive com cenas documentais da época, temos um ótimo filme; quando é cobrado um pouco mais de dramaturgia, tensão ou até uma sensibilidade maior para cenas mais introspectivas ou que dialogam com sentimentos mais latentes, como raiva ou culpa, aí vemos que existe um problema estrutural e de alinhamento entre roteiro / direção - o que resulta só em um bom entretenimento.
"Lost Girls" não é um filme do David Fincher como ("Garota Exemplar" ou "Zodíaco"), mas também não é algo enlatado como "Não fale com estranhos" - o filme funciona bem, tem uma excelente qualidade técnica e uma história bastante envolvente, só peca na falta de aprofundamento do roteiro e na pouca habilidade da diretor para acertar o tom, mas posso afirmar tranqüilamente que vale o pouco mais de 90 minutos de filme!
"Manhunt: Unabomber" passou batido no seu lançamento, mas, se você gosta de investigação, essa série é imperdível! Produzida pelo Discovery e distribuído pela Netflix, a série acompanha Jim 'Fitz' Fitzgerald (Sam Worthington) desde sua chegada ao FBI para ajudar no caso que ficou conhecido como "Unabomber" - sua função (ou especialidade), digamos, era muito inusitada para os anos 90: linguística. A busca pelo terrorista era tão improdutiva até ali que o FBI precisou arriscar e recorrer à Fitz porém seus métodos e conhecimentos eram completamente desacreditados em um momento tão delicado como esse. Confira no trailer:
De fato fica muito fácil torcer para que as análises de Fitz apresentem resultados que façam os que o denegriram se envergonharem - a cada vitória de Fitz só aumenta nossa vontade de continuar assistindo, ainda mais sabendo que seu "adversário" tinha uma forma meticulosa de enviar suas mensagens!
Ted Kaczynski (Paul Bettany), foi um gênio que frequentou Harvard com apenas 16 anos e desenvolveu uma espécie de filosofia de vida que foi "eruditamente redigida e publicada". Na verdade, tudo que saia da boca de Ted precisava ser coerente perante as manipulações idealistas que ele mesmo propagava. As narrações que invocam trechos do manifesto de Ted na série, lembram muito os melhores momentos de "Seven" - sem demonizar essas ideias, apenas aproveitando para estudar o impacto que ela causaram nas pessoas que não estavam dispostas a explodir outras para se posicionar perante um determinado assunto!
Admito que não sou muito fã do protagonista (Sam Worthington), mas sua canastrice (no sentido profissional da palavra) não prejudicou sua performance na série. Aliás, séries de investigação/crime/terrorismo voltaram com tudo no final de 2017/2018, em um movimento, ou tendência, fácil de ser percebida e "Manhunt: Unabomber" é um ótimo exemplo de como o gênero conquista muita audiência se bem desenvolvido!
Pode dar o play tranquilamente que eu garanto!!!
Up-date: a segunda temporada, com outra história sobre o o mesmo assunto, já estreou nos EUA, mas ainda não tem data para chegar no Brasil. Ela pega carona no "O Caso Richard Jewell"que recentemente ganhou as telas pelas mãos do diretor Clint Eastwood e do roteirista Billy Ray. Confira o trailer aqui!
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De fato fica muito fácil torcer para que as análises de Fitz apresentem resultados que façam os que o denegriram se envergonharem - a cada vitória de Fitz só aumenta nossa vontade de continuar assistindo, ainda mais sabendo que seu "adversário" tinha uma forma meticulosa de enviar suas mensagens!
Ted Kaczynski (Paul Bettany), foi um gênio que frequentou Harvard com apenas 16 anos e desenvolveu uma espécie de filosofia de vida que foi "eruditamente redigida e publicada". Na verdade, tudo que saia da boca de Ted precisava ser coerente perante as manipulações idealistas que ele mesmo propagava. As narrações que invocam trechos do manifesto de Ted na série, lembram muito os melhores momentos de "Seven" - sem demonizar essas ideias, apenas aproveitando para estudar o impacto que ela causaram nas pessoas que não estavam dispostas a explodir outras para se posicionar perante um determinado assunto!
Admito que não sou muito fã do protagonista (Sam Worthington), mas sua canastrice (no sentido profissional da palavra) não prejudicou sua performance na série. Aliás, séries de investigação/crime/terrorismo voltaram com tudo no final de 2017/2018, em um movimento, ou tendência, fácil de ser percebida e "Manhunt: Unabomber" é um ótimo exemplo de como o gênero conquista muita audiência se bem desenvolvido!
Pode dar o play tranquilamente que eu garanto!!!
Up-date: a segunda temporada, com outra história sobre o o mesmo assunto, já estreou nos EUA, mas ainda não tem data para chegar no Brasil. Ela pega carona no "O Caso Richard Jewell"que recentemente ganhou as telas pelas mãos do diretor Clint Eastwood e do roteirista Billy Ray. Confira o trailer aqui!
Finalmente consegui assistir "Marcella" na Netflix. Olha, só o fato de ter sido criada pelo sueco Hans Rosenfeldt, o mesmo de "Bron/Broen", já faz valer a pena a maratona. E falo de maratona de cara porque realmente não dá para para de assistir. Seguindo a mesma linha "The Fall" ou até "The Killing": uma detetive cheia de problemas pessoais tem que desvendar uma série de assassinatos em Londres.
Basicamente, a série acompanha Marcella Backland (Anna Friel) depois que foi surpreendida quando seu marido Jason (Nicholas Pinnock) pediu a separação inesperadamente, confessando que não a amava mais. Ainda com o coração partido, Marcella retorna suas atividades no Esquadrão de Homicídios para investigar uma série de assassinatos que lhe parece perturbadoramente familiar.
Embora seja meu gênero favorito, eu indico "Marcella" com a maior tranquilidade e propriedade: essa série inglesa está entre as melhores que já assisti! As duas temporadas são excelentes e assumo que fiquei me perguntando porque eu não assisti antes! Os roteiros são redondinhos, inteligentes e instigantes; não perde força como aconteceu com a norueguesa "Borderliner", por exemplo. A produção da Buccaneers Media está impecável, grandiosa, ao melhor estilo inglês (o que nos afasta um pouco daquela fotografia gélida e tensa das séries nórdicas - que eu adoro por sinal). Londres é um personagem importante, isso fica claro nas duas temporadas e quando os personagens se confundem com seu universo é um ótimo sinal; não tem como não se encantar com a narrativa e com o trabalho primoroso da Anna Friel!
Me surpreendeu, não esperava tanto. Só o nome da série acho que poderia ser melhor: "Marcella" não atrai o público, mas basta assistir alguns episódios para se surpreender! Vale muito a pena para quem gosta do gênero e tenha certeza, a história é muito, mas muito, melhor que seu título!
PS: A terceira temporada já foi finalizada e agora está disponível na Netflix!
Finalmente consegui assistir "Marcella" na Netflix. Olha, só o fato de ter sido criada pelo sueco Hans Rosenfeldt, o mesmo de "Bron/Broen", já faz valer a pena a maratona. E falo de maratona de cara porque realmente não dá para para de assistir. Seguindo a mesma linha "The Fall" ou até "The Killing": uma detetive cheia de problemas pessoais tem que desvendar uma série de assassinatos em Londres.
Basicamente, a série acompanha Marcella Backland (Anna Friel) depois que foi surpreendida quando seu marido Jason (Nicholas Pinnock) pediu a separação inesperadamente, confessando que não a amava mais. Ainda com o coração partido, Marcella retorna suas atividades no Esquadrão de Homicídios para investigar uma série de assassinatos que lhe parece perturbadoramente familiar.
Embora seja meu gênero favorito, eu indico "Marcella" com a maior tranquilidade e propriedade: essa série inglesa está entre as melhores que já assisti! As duas temporadas são excelentes e assumo que fiquei me perguntando porque eu não assisti antes! Os roteiros são redondinhos, inteligentes e instigantes; não perde força como aconteceu com a norueguesa "Borderliner", por exemplo. A produção da Buccaneers Media está impecável, grandiosa, ao melhor estilo inglês (o que nos afasta um pouco daquela fotografia gélida e tensa das séries nórdicas - que eu adoro por sinal). Londres é um personagem importante, isso fica claro nas duas temporadas e quando os personagens se confundem com seu universo é um ótimo sinal; não tem como não se encantar com a narrativa e com o trabalho primoroso da Anna Friel!
Me surpreendeu, não esperava tanto. Só o nome da série acho que poderia ser melhor: "Marcella" não atrai o público, mas basta assistir alguns episódios para se surpreender! Vale muito a pena para quem gosta do gênero e tenha certeza, a história é muito, mas muito, melhor que seu título!
PS: A terceira temporada já foi finalizada e agora está disponível na Netflix!
Desde o lançamento do primeiro trailer ou dos primeiros episódios que assistimos comentamos, já dava para se ter uma ideia do que seria "Mare of Easttown", mas admito: a minissérie de 7 episódios da HBO conseguiu me surpreender, ela foi além das minhas expectativas - e isso é sensacional!!!
Na história, somos apresentados a uma pequena e bucólica cidade da Pensilvânia chamada Easttown. Kate Winslet é Mare Sheehan, uma detetive de personalidade forte e muito conhecida, que trabalha diariamente para manter a ordem na sua comunidade. Outrora uma famosa jogadora de basquete no colégio local, Mare é respeitada por todos, mas parece não ter mais forças para enfrentar os inúmeros problemas pessoais no seu dia a dia: de um divórcio não digerido ao misterioso suicídio do filho mais velho. Profissionalmente, a detetive ainda precisa lidar com um importante caso não resolvido: o desaparecimento de uma jovem, filha de uma de suas amigas e companheira de time desde os tempos de escola. Porém, quando a jovem Erin McMenamin, uma mãe solteira de 17 anos, que vive às custas de um pai bêbado e de um ex-namorado imaturo; aparece morta no riacho que cruza a cidade, Mare se vê mais uma vez no olho do furacão, sendo pressionada por todos os lados, obrigada a lidar com um possível assassinato e com muitos suspeitos próximos ao seu convívio. Confira o trailer:
O mais interessante nessa minissérie criada pelo Brad Ingelsby (de "Uma Mulher Americana") é que a história vai muito além de ótimas referências do mesmo gênero já produzidas pela HBO, como "Big Little Lies"ou "Sharp Objects" - para citar apenas duas. Com um roteiro criativo, bem amarrado e extremamente original, "Mare of Easttown" é um exemplo de como uma trama bem desenvolvida pode ir além de um arco narrativo principal consistente, no caso a investigação de um crime em uma cidade pequena dos EUA, para se transformar em um primoroso estudo de personagens - e aqui eu não falo apenas de Mare (Kate Winslet); Lori (Julianne Nicholson), Helen (Jean Smart), Dawn (Enid Graham), Beth (Chinasa Ogbuagu), John (Joe Tippett), Colin (Evan Peters) são incríveis. Olha que interessante, essa quantidade de personagens, que a primeira vista pode parecer grande demais, existe justamente para criar um contexto bastante particular de Easttown e uma atmosfera tão realista que muitas vezes nos perdemos nos dramas pessoais e complexos dos coadjuvantes com a mesma força com que acompanhamos todas as camadas que Mare vai nos mostrando enquanto tenta desvendar o grande mistério e lidar com sua vida caótica.
Muito bem dirigida pelo Craig Zobel (de "Compliance" e "The Leftovers"), "Mare of Easttown" é tecnicamente perfeita, mesmo nos episódios onde foi necessário construir a complexidade daquela dinâmica ente os personagens para poder entregar um final que superasse nossa expectativa - tanto pelo lado mais humano quanto pela surpreendente narrativa cheia de reviravoltas. Se os mistérios vão sendo resolvidos um a um, os fantasmas dos personagens não - e a forma como o diretor conseguiu nos guiar por essas duas linhas conceituais que vão se completando e, óbvio, nos provocando emocionalmente é simplesmente fantástica. Os dois últimos episódios, por exemplo, são incríveis - especialmente no que diz respeito ao último interrogatório que Mare lidera. É uma facada no peito que vem se construindo desde o primeiro ato do episódio - reparem no tom, no jeito de falar, na forma como Mare tem que enfrentar aquela situação; é lindo!
"Mare of Easttown" deve ganhar tudo que disputar na próxima temporada de premiação: Kate Winslet será barbada, Julianne Nicholson e Jean Smart chegam fortes como coadjuvantes, Brad Ingelsby deve faturar em roteiro e, para mim, a minissérie é a melhor de 2021 até aqui e será difícil superá-la. Dito isso, não perca tempo, dê o play e tenha o melhor entretenimento que podemos te recomendar!
Desde o lançamento do primeiro trailer ou dos primeiros episódios que assistimos comentamos, já dava para se ter uma ideia do que seria "Mare of Easttown", mas admito: a minissérie de 7 episódios da HBO conseguiu me surpreender, ela foi além das minhas expectativas - e isso é sensacional!!!
Na história, somos apresentados a uma pequena e bucólica cidade da Pensilvânia chamada Easttown. Kate Winslet é Mare Sheehan, uma detetive de personalidade forte e muito conhecida, que trabalha diariamente para manter a ordem na sua comunidade. Outrora uma famosa jogadora de basquete no colégio local, Mare é respeitada por todos, mas parece não ter mais forças para enfrentar os inúmeros problemas pessoais no seu dia a dia: de um divórcio não digerido ao misterioso suicídio do filho mais velho. Profissionalmente, a detetive ainda precisa lidar com um importante caso não resolvido: o desaparecimento de uma jovem, filha de uma de suas amigas e companheira de time desde os tempos de escola. Porém, quando a jovem Erin McMenamin, uma mãe solteira de 17 anos, que vive às custas de um pai bêbado e de um ex-namorado imaturo; aparece morta no riacho que cruza a cidade, Mare se vê mais uma vez no olho do furacão, sendo pressionada por todos os lados, obrigada a lidar com um possível assassinato e com muitos suspeitos próximos ao seu convívio. Confira o trailer:
O mais interessante nessa minissérie criada pelo Brad Ingelsby (de "Uma Mulher Americana") é que a história vai muito além de ótimas referências do mesmo gênero já produzidas pela HBO, como "Big Little Lies"ou "Sharp Objects" - para citar apenas duas. Com um roteiro criativo, bem amarrado e extremamente original, "Mare of Easttown" é um exemplo de como uma trama bem desenvolvida pode ir além de um arco narrativo principal consistente, no caso a investigação de um crime em uma cidade pequena dos EUA, para se transformar em um primoroso estudo de personagens - e aqui eu não falo apenas de Mare (Kate Winslet); Lori (Julianne Nicholson), Helen (Jean Smart), Dawn (Enid Graham), Beth (Chinasa Ogbuagu), John (Joe Tippett), Colin (Evan Peters) são incríveis. Olha que interessante, essa quantidade de personagens, que a primeira vista pode parecer grande demais, existe justamente para criar um contexto bastante particular de Easttown e uma atmosfera tão realista que muitas vezes nos perdemos nos dramas pessoais e complexos dos coadjuvantes com a mesma força com que acompanhamos todas as camadas que Mare vai nos mostrando enquanto tenta desvendar o grande mistério e lidar com sua vida caótica.
Muito bem dirigida pelo Craig Zobel (de "Compliance" e "The Leftovers"), "Mare of Easttown" é tecnicamente perfeita, mesmo nos episódios onde foi necessário construir a complexidade daquela dinâmica ente os personagens para poder entregar um final que superasse nossa expectativa - tanto pelo lado mais humano quanto pela surpreendente narrativa cheia de reviravoltas. Se os mistérios vão sendo resolvidos um a um, os fantasmas dos personagens não - e a forma como o diretor conseguiu nos guiar por essas duas linhas conceituais que vão se completando e, óbvio, nos provocando emocionalmente é simplesmente fantástica. Os dois últimos episódios, por exemplo, são incríveis - especialmente no que diz respeito ao último interrogatório que Mare lidera. É uma facada no peito que vem se construindo desde o primeiro ato do episódio - reparem no tom, no jeito de falar, na forma como Mare tem que enfrentar aquela situação; é lindo!
"Mare of Easttown" deve ganhar tudo que disputar na próxima temporada de premiação: Kate Winslet será barbada, Julianne Nicholson e Jean Smart chegam fortes como coadjuvantes, Brad Ingelsby deve faturar em roteiro e, para mim, a minissérie é a melhor de 2021 até aqui e será difícil superá-la. Dito isso, não perca tempo, dê o play e tenha o melhor entretenimento que podemos te recomendar!
Se "Em Defesa de Jacob" o promotor Andy Barber (Chris Evans) e sua esposa Laurie (Michelle Dockery) estão cheio de dúvidas e questionamentos sobre a participação do filho, Jacob (Jaeden Martell), no assassinato do seu amigo de 14 anos; em "Mentira Incondicional" só existe uma certeza para os pais, Jay (Peter Saarsgad) e Rebecca (Mireille Enos): sua filha adolescente, Kayla (Joey King), matou sua melhor amiga!
Como na série da AppleTV+, a produção da Blumhouse para a Prime Vídeo, discute as imperfeições dos relacionamentos familiares e expõe as situações limite que alguns pais estariam dispostos a passar para proteger seus filhos, mesmo que isso possa deixar marcas para sempre e impactar no caráter de todos os envolvidos! Porém, é preciso dizer que "Mentira Incondicional" não tem um roteiro tão redondo quanto "Em Defesa de Jacob" - longe disso! Seu plot twist é bastante previsível e a justificativa extremamente superficial - quase infantil!
Então estamos falando de um filme ruim? Não acho, mas vai entrar naquela prateleira de bom entretenimento, sem grandes expectativas ou pretenções de se tornar inesquecível!
"The Lie" (título original) acompanha o drama de uma garota adolescente que confessa ter matado impulsivamente sua melhor amiga e de seus pais que, desesperados, tentam encobrir o crime, levando-os a uma complicada teia de mentiras e enganos. Confira o trailer:
Dirigido e roteirizado por Veena Sud, o filme é uma refilmagem da produção alemã "Wir Monster" (de 2015) do diretor Sebatian Ko. Se "Mentira Incondicional" tem uma interessante premissa, e isso é um fato; sua execução é rodeada de estereótipos e superficialidade para aqueles adeptos ao gênero de suspense policial. Justamente por isso, essa recomendação precisa ser relativizada de acordo com sua disposição de se abster de um desenvolvimento de personagens mais profundo e de uma história que possa surpreender ou, pelo menos, nos provocar alguma dúvida! Eu diria que o filme pode agradar, mas não será uma unanimidade!
"Mentira Incondicional" é muito bem realizado, isso é inegável, principalmente por ter um primeiro ato muito bom, com uma proposta documental (e emocional) na apresentação dos personagens que te prende logo de cara! Com o elo emocional estabelecido, a construção do drama nos dá a impressão que não vamos conseguir escapar da tensão e angústia do "quanto mais eu faço, mais eu me complico" - tão comum nesse tipo de narrativa. Acontece que o segundo ato cria uma "barriga" muito grande, não nos levando a lugar algum e, pior, nos afasta do sentimento de desconfiança, pelo simples fato dos diálogos parecerem um conjunto de desculpas superficiais que não engana ninguém. A falta de uma investigação de verdade, e aqui a escolha do elenco prejudicou muito o filme, nos tira o beneficio da dúvida, do julgamento ou da identificação com a situação e com os personagens - em nenhum momento deixamos de saber para quem devemos torce ou nos perguntamos quem é o verdadeiro bandidor!
Agora, alguns pontos merecem destaque: gosto muito do trabalho da Mireille Enos - ela consegue passar o desespero que aquela família está vivendo. Se Peter Saarsgad não tem o mesmo talento, pelo menos não compromete. A fotografia do canadense, Peter Wunstorf, que inclusive esteve no sensacional "The Killing"; é muito interessante - principalmente por estar completamente alinhada ao conceito narrativo que Veena Sud imprime na história. A forma como ela enquadra os personagens, com planos extremamente fechados, justificam os objetivos da cena, criando lampejos de emoção.
A verdade é que não dá para comparar "Mentira Incondicional" com "Em Defesa de Jacob", mas também seria injusto colocá-los em lados tão opostos de qualidade. A produção da Blumhouse talvez tenha se limitado ao potencial da história e seu resultado tenha ficado apenas no mediano diante da expectativa, mas reafirmo: como "sessão da tarde" vai cumprir sua função e se dormir, dormiu!
Se "Em Defesa de Jacob" o promotor Andy Barber (Chris Evans) e sua esposa Laurie (Michelle Dockery) estão cheio de dúvidas e questionamentos sobre a participação do filho, Jacob (Jaeden Martell), no assassinato do seu amigo de 14 anos; em "Mentira Incondicional" só existe uma certeza para os pais, Jay (Peter Saarsgad) e Rebecca (Mireille Enos): sua filha adolescente, Kayla (Joey King), matou sua melhor amiga!
Como na série da AppleTV+, a produção da Blumhouse para a Prime Vídeo, discute as imperfeições dos relacionamentos familiares e expõe as situações limite que alguns pais estariam dispostos a passar para proteger seus filhos, mesmo que isso possa deixar marcas para sempre e impactar no caráter de todos os envolvidos! Porém, é preciso dizer que "Mentira Incondicional" não tem um roteiro tão redondo quanto "Em Defesa de Jacob" - longe disso! Seu plot twist é bastante previsível e a justificativa extremamente superficial - quase infantil!
Então estamos falando de um filme ruim? Não acho, mas vai entrar naquela prateleira de bom entretenimento, sem grandes expectativas ou pretenções de se tornar inesquecível!
"The Lie" (título original) acompanha o drama de uma garota adolescente que confessa ter matado impulsivamente sua melhor amiga e de seus pais que, desesperados, tentam encobrir o crime, levando-os a uma complicada teia de mentiras e enganos. Confira o trailer:
Dirigido e roteirizado por Veena Sud, o filme é uma refilmagem da produção alemã "Wir Monster" (de 2015) do diretor Sebatian Ko. Se "Mentira Incondicional" tem uma interessante premissa, e isso é um fato; sua execução é rodeada de estereótipos e superficialidade para aqueles adeptos ao gênero de suspense policial. Justamente por isso, essa recomendação precisa ser relativizada de acordo com sua disposição de se abster de um desenvolvimento de personagens mais profundo e de uma história que possa surpreender ou, pelo menos, nos provocar alguma dúvida! Eu diria que o filme pode agradar, mas não será uma unanimidade!
"Mentira Incondicional" é muito bem realizado, isso é inegável, principalmente por ter um primeiro ato muito bom, com uma proposta documental (e emocional) na apresentação dos personagens que te prende logo de cara! Com o elo emocional estabelecido, a construção do drama nos dá a impressão que não vamos conseguir escapar da tensão e angústia do "quanto mais eu faço, mais eu me complico" - tão comum nesse tipo de narrativa. Acontece que o segundo ato cria uma "barriga" muito grande, não nos levando a lugar algum e, pior, nos afasta do sentimento de desconfiança, pelo simples fato dos diálogos parecerem um conjunto de desculpas superficiais que não engana ninguém. A falta de uma investigação de verdade, e aqui a escolha do elenco prejudicou muito o filme, nos tira o beneficio da dúvida, do julgamento ou da identificação com a situação e com os personagens - em nenhum momento deixamos de saber para quem devemos torce ou nos perguntamos quem é o verdadeiro bandidor!
Agora, alguns pontos merecem destaque: gosto muito do trabalho da Mireille Enos - ela consegue passar o desespero que aquela família está vivendo. Se Peter Saarsgad não tem o mesmo talento, pelo menos não compromete. A fotografia do canadense, Peter Wunstorf, que inclusive esteve no sensacional "The Killing"; é muito interessante - principalmente por estar completamente alinhada ao conceito narrativo que Veena Sud imprime na história. A forma como ela enquadra os personagens, com planos extremamente fechados, justificam os objetivos da cena, criando lampejos de emoção.
A verdade é que não dá para comparar "Mentira Incondicional" com "Em Defesa de Jacob", mas também seria injusto colocá-los em lados tão opostos de qualidade. A produção da Blumhouse talvez tenha se limitado ao potencial da história e seu resultado tenha ficado apenas no mediano diante da expectativa, mas reafirmo: como "sessão da tarde" vai cumprir sua função e se dormir, dormiu!
"Mistério e Morte no Hotel Cecil" foi o nome dado para a primeira temporada de uma nova série que pretende desvendar todos os mistérios e ampliar as discussões sobre alguns crimes reais que, por alguma razão, ficaram marcados na memória de todos nós (ou pelo menos da sociedade americana). A temporada de estreia de "Cena do Crime" foi dirigida pelo indicado ao Oscar pela terceira parte da trilogia "Paradise Lost", Joe Berlinger - um diretor que usa e abusa das dramatizações para criar uma certa sensação de angustia e ansiedade, tornando seu conceito narrativo muito próximo da ficção, especialmente dos thrillers policiais.
Em "Cena do Crime: Mistério e Morte no Hotel Cecil" acompanhamos a desconstrução de toda uma mitologia e mistérios em torno de um dos locais mais infames de crimes contemporâneos: o Hotel Cecil. No centro de Los Angeles, o hotel é frequentemente associado a algumas das mais notórias atividades da cidade, entre suicídios, assassinatos e crimes sem explicações, até a presença de hóspedes "famosos" e serial killers que aterrorizaram a sociedade americana durante os anos. Em 2013, a universitária Elisa Lam estava hospedada no Cecil quando desapareceu, iniciando um frenesi na mídia e mobilizando uma comunidade global de detetives internéticos ansiosos para solucionar o caso. O desaparecimento de Lam, mais recente capítulo na complexa história do hotel, oferece uma visão arrepiante e cativante de um dos locais mais nefastos de LA. Confira o trailer:
Antes de mais nada é preciso dizer que "Cena do Crime: Mistério e Morte no Hotel Cecil" tem um história tão maluca que se encaixa muito bem no estilo que o diretor Joe Berlinger gosta de trabalhar e essa, digamos, espetacularização narrativa de um "drama real" pode incomodar algumas pessoas - veja, o caso de Elisa vai ser explorado de todas maneiras, da tese mais provável à teoria conspiratória mais absurda, e que nem por isso deixa de fazer algum sentido.
Não se trata de um relato documental tradicional, com uma linguagem mais jornalística e um tom mais sério do texto; muito pelo contrário, nos quatro episódios dessa primeira temporada o que mais vemos são tantas camadas sendo analisadas que até nos esquecemos de pontos realmente importantes da investigação. O que eu quero dizer com isso é que não se trata de uma série onde as pistas são entregues ao mesmo tempo que os investigadores tem acesso a elas para, juntos, encontrarmos a solução do mistério - tudo é entregue de acordo com as necessidades narrativas e não respeitando a linha do tempo! Com isso a série ganha em entretenimento, mas parece se distanciar da realidade - é um estilo!
Um ponto que vale a pena reparar é que todos os “personagens” do documentário foram cuidadosamente escolhidos para maximizar essa atmosfera surreal criada em torno da histeria que a morte de Elisa provocou na época e como isso impactou profundamente na vida de alguns deles. A relação dos investigadores de internet com o caso dava um spin-off tranquilamente. Enfim, "Cena do Crime: Mistério e Morte no Hotel Cecil" é dinâmico, te prende, é interessante, mas não toca a alma como "Making a Murderer" ou "The Staircase" - é entretenimento na forma de documentário com toques de ficção como o recente sucesso, também da Netflix, "Night Stalker" tão bem explorou!
PS: Aliás, um dica antes do play: se você não assistiu "Night Stalker", faça isso antes de "Cena do Crime: Mistério e Morte no Hotel Cecil", pois alguns personagens se repetem e a experiência fica ainda mais completa.
"Mistério e Morte no Hotel Cecil" foi o nome dado para a primeira temporada de uma nova série que pretende desvendar todos os mistérios e ampliar as discussões sobre alguns crimes reais que, por alguma razão, ficaram marcados na memória de todos nós (ou pelo menos da sociedade americana). A temporada de estreia de "Cena do Crime" foi dirigida pelo indicado ao Oscar pela terceira parte da trilogia "Paradise Lost", Joe Berlinger - um diretor que usa e abusa das dramatizações para criar uma certa sensação de angustia e ansiedade, tornando seu conceito narrativo muito próximo da ficção, especialmente dos thrillers policiais.
Em "Cena do Crime: Mistério e Morte no Hotel Cecil" acompanhamos a desconstrução de toda uma mitologia e mistérios em torno de um dos locais mais infames de crimes contemporâneos: o Hotel Cecil. No centro de Los Angeles, o hotel é frequentemente associado a algumas das mais notórias atividades da cidade, entre suicídios, assassinatos e crimes sem explicações, até a presença de hóspedes "famosos" e serial killers que aterrorizaram a sociedade americana durante os anos. Em 2013, a universitária Elisa Lam estava hospedada no Cecil quando desapareceu, iniciando um frenesi na mídia e mobilizando uma comunidade global de detetives internéticos ansiosos para solucionar o caso. O desaparecimento de Lam, mais recente capítulo na complexa história do hotel, oferece uma visão arrepiante e cativante de um dos locais mais nefastos de LA. Confira o trailer:
Antes de mais nada é preciso dizer que "Cena do Crime: Mistério e Morte no Hotel Cecil" tem um história tão maluca que se encaixa muito bem no estilo que o diretor Joe Berlinger gosta de trabalhar e essa, digamos, espetacularização narrativa de um "drama real" pode incomodar algumas pessoas - veja, o caso de Elisa vai ser explorado de todas maneiras, da tese mais provável à teoria conspiratória mais absurda, e que nem por isso deixa de fazer algum sentido.
Não se trata de um relato documental tradicional, com uma linguagem mais jornalística e um tom mais sério do texto; muito pelo contrário, nos quatro episódios dessa primeira temporada o que mais vemos são tantas camadas sendo analisadas que até nos esquecemos de pontos realmente importantes da investigação. O que eu quero dizer com isso é que não se trata de uma série onde as pistas são entregues ao mesmo tempo que os investigadores tem acesso a elas para, juntos, encontrarmos a solução do mistério - tudo é entregue de acordo com as necessidades narrativas e não respeitando a linha do tempo! Com isso a série ganha em entretenimento, mas parece se distanciar da realidade - é um estilo!
Um ponto que vale a pena reparar é que todos os “personagens” do documentário foram cuidadosamente escolhidos para maximizar essa atmosfera surreal criada em torno da histeria que a morte de Elisa provocou na época e como isso impactou profundamente na vida de alguns deles. A relação dos investigadores de internet com o caso dava um spin-off tranquilamente. Enfim, "Cena do Crime: Mistério e Morte no Hotel Cecil" é dinâmico, te prende, é interessante, mas não toca a alma como "Making a Murderer" ou "The Staircase" - é entretenimento na forma de documentário com toques de ficção como o recente sucesso, também da Netflix, "Night Stalker" tão bem explorou!
PS: Aliás, um dica antes do play: se você não assistiu "Night Stalker", faça isso antes de "Cena do Crime: Mistério e Morte no Hotel Cecil", pois alguns personagens se repetem e a experiência fica ainda mais completa.
Essa é o tipo de recomendação que não tem erro - se você gostou de "Dahmer: Um Canibal Americano", "O Paraíso e a Serpente" e "American Crime Story", é impossível você não gostar da segunda temporada da (queridinha) série antológica de Ryan Murphy, "Monstros: Irmãos Menendez". Essa leva de nove episódios foca no brutal assassinato de José e Kitty Menendez em 1989. A temporada mergulha profundamente nas complexidades desse caso de grande repercussão, que chocou os Estados Unidos e levantou debates sobre abuso, poder e as pressões dentro de uma família aparentemente perfeita. Tal como a primeira temporada da série, que abordou a história de Jeffrey Dahmer, esta nova abordagem de "Monstros" continua com o estilo característico de Ryan Murphy: visualmente impactante, intensa em sua trama e com uma narrativa que usa e abusa do drama psicológico.
Aqui história se passa em Beverly Hills, onde Lyle (Nicholas Alexander Chavez) e Erik Menendez (Cooper Koch) assassinaram seus pais, José (Javier Bardem) e Kitty Menendez (Chloë Sevigny), em sua própria casa. Inicialmente, o crime parecia ser um assassinato motivado por ganância, já que os jovens herdeiros gastaram vastas quantias de dinheiro após a morte de seus pais. No entanto, durante o julgamento, a defesa revelou uma nova camada da narrativa: os irmãos alegaram que os assassinatos foram uma reação aos anos de abuso físico, psicológico e sexual que teriam sofrido nas mãos de José Menendez. A temporada explora esses dois lados — o do sensacionalismo e o íntimo e sombrio do abuso dentro de uma família completamente disfuncional. Confira o trailer:
Obviamente que a força da segunda temporada de Monstros está na forma como Ryan Murphy e seu parceiro Ian Brennan (de "Halston") estruturam a narrativa - eles não economizam na densidade dos diálogos, no grafismo dos assassinatos e no exagero de seus cenários, figurinos, maquiagens e até das performances. Dito isso, fica fácil afirmar: "Monstros: Irmãos Menendez" é, sim, apelativa, mas funciona! Por outro lado, a série se esforça para não apresentar uma versão simplificada do caso e, em vez disso, sugere um estudo de personagens muitas vezes desconfortável. Os episódios são montados de forma que a audiência constantemente questione as motivações dos irmãos - ao melhor estilo Suzane Richthofen, os Menendez foram vítimas de uma situação insustentável ou assassinos friamente calculistas?
Essa temporada da série, como em muitas outras produções de Murphy, se move na direção da ambiguidade, deixando para quem assiste a reflexão sobre qual a verdade por trás dos acontecimentos. Murphy e Brennan fazem o que sabem de melhor: criar a atmosfera de tensão psicológica que permeia cada episódio - e aqui cabe um comentário: o episódio 5, chamado de "Apelido" e rodado em um único plano, com a câmera sem nunca sair da mesma posição, é algo a ser celebrado e aplaudido de pé. Embora seja notavelmente diferente do tom de "Dahmer", a estética visual dessa temporada é igualmente competente já que tem uma fotografia que não se intimida em mostrar o contraste entre o glamour de Beverly Hills e o horror silencioso dentro da mansão dos Menendez. O uso de sombras e tons escuros para simbolizar o trauma reprimido é uma assinatura estética de Murphy, que aqui é usada com a precisão que a narrativa pede.
Nicholas Alexander Chavez e Cooper Koch capturam com eficácia a complexidade emocional dos irmãos. Suas performances oscilam entre jovens traumatizados, tentando lidar com os horrores de suas infâncias, e figuras manipuladoras, cientes das repercussões de seus atos. Esse equilíbrio é fundamental para nos manter envolvidos na narrativa, uma vez que o caso real dos Menendez continua a ser um dos mais divisivos na história criminal americana. Repare na química entre os dois atores e como ela é crucial para retratar a relação entre os irmãos, que oscila entre cumplicidade, desespero e um profundo vínculo de dependência emocional.
Embora o caso Menendez seja chocante por si só, a tendência de Murphy em enfatizar o drama extremo pode, às vezes, parecer excessiva para quem busca uma análise mais equilibrada e factual dos eventos - mas nesse caso não tem jeito, esse é seu estilo e muito do que você vai ver na tela foi de fato potencializado em troca de um conflito mais evidente e uma dramatização mais impactante. Apesar dessa ressalva, posso te garantir que "Monstros: Irmãos Menendez" é um entretenimento de primeira - essencialmente se você for mesmo um fã de true crime. Eu diria até que essa temporada é um retrato profundo e angustiante de uma das famílias mais disfuncionais da história criminal dos EUA, que aborda não apenas os atos brutais de violência, mas também as causas subjacentes do trauma.
Se você está disposto a considerar questões morais complexas, enquanto a narrativa desafia noções simplistas de culpabilidade e justiça, pode dar o play sem o menor medo de errar!
Essa é o tipo de recomendação que não tem erro - se você gostou de "Dahmer: Um Canibal Americano", "O Paraíso e a Serpente" e "American Crime Story", é impossível você não gostar da segunda temporada da (queridinha) série antológica de Ryan Murphy, "Monstros: Irmãos Menendez". Essa leva de nove episódios foca no brutal assassinato de José e Kitty Menendez em 1989. A temporada mergulha profundamente nas complexidades desse caso de grande repercussão, que chocou os Estados Unidos e levantou debates sobre abuso, poder e as pressões dentro de uma família aparentemente perfeita. Tal como a primeira temporada da série, que abordou a história de Jeffrey Dahmer, esta nova abordagem de "Monstros" continua com o estilo característico de Ryan Murphy: visualmente impactante, intensa em sua trama e com uma narrativa que usa e abusa do drama psicológico.
Aqui história se passa em Beverly Hills, onde Lyle (Nicholas Alexander Chavez) e Erik Menendez (Cooper Koch) assassinaram seus pais, José (Javier Bardem) e Kitty Menendez (Chloë Sevigny), em sua própria casa. Inicialmente, o crime parecia ser um assassinato motivado por ganância, já que os jovens herdeiros gastaram vastas quantias de dinheiro após a morte de seus pais. No entanto, durante o julgamento, a defesa revelou uma nova camada da narrativa: os irmãos alegaram que os assassinatos foram uma reação aos anos de abuso físico, psicológico e sexual que teriam sofrido nas mãos de José Menendez. A temporada explora esses dois lados — o do sensacionalismo e o íntimo e sombrio do abuso dentro de uma família completamente disfuncional. Confira o trailer:
Obviamente que a força da segunda temporada de Monstros está na forma como Ryan Murphy e seu parceiro Ian Brennan (de "Halston") estruturam a narrativa - eles não economizam na densidade dos diálogos, no grafismo dos assassinatos e no exagero de seus cenários, figurinos, maquiagens e até das performances. Dito isso, fica fácil afirmar: "Monstros: Irmãos Menendez" é, sim, apelativa, mas funciona! Por outro lado, a série se esforça para não apresentar uma versão simplificada do caso e, em vez disso, sugere um estudo de personagens muitas vezes desconfortável. Os episódios são montados de forma que a audiência constantemente questione as motivações dos irmãos - ao melhor estilo Suzane Richthofen, os Menendez foram vítimas de uma situação insustentável ou assassinos friamente calculistas?
Essa temporada da série, como em muitas outras produções de Murphy, se move na direção da ambiguidade, deixando para quem assiste a reflexão sobre qual a verdade por trás dos acontecimentos. Murphy e Brennan fazem o que sabem de melhor: criar a atmosfera de tensão psicológica que permeia cada episódio - e aqui cabe um comentário: o episódio 5, chamado de "Apelido" e rodado em um único plano, com a câmera sem nunca sair da mesma posição, é algo a ser celebrado e aplaudido de pé. Embora seja notavelmente diferente do tom de "Dahmer", a estética visual dessa temporada é igualmente competente já que tem uma fotografia que não se intimida em mostrar o contraste entre o glamour de Beverly Hills e o horror silencioso dentro da mansão dos Menendez. O uso de sombras e tons escuros para simbolizar o trauma reprimido é uma assinatura estética de Murphy, que aqui é usada com a precisão que a narrativa pede.
Nicholas Alexander Chavez e Cooper Koch capturam com eficácia a complexidade emocional dos irmãos. Suas performances oscilam entre jovens traumatizados, tentando lidar com os horrores de suas infâncias, e figuras manipuladoras, cientes das repercussões de seus atos. Esse equilíbrio é fundamental para nos manter envolvidos na narrativa, uma vez que o caso real dos Menendez continua a ser um dos mais divisivos na história criminal americana. Repare na química entre os dois atores e como ela é crucial para retratar a relação entre os irmãos, que oscila entre cumplicidade, desespero e um profundo vínculo de dependência emocional.
Embora o caso Menendez seja chocante por si só, a tendência de Murphy em enfatizar o drama extremo pode, às vezes, parecer excessiva para quem busca uma análise mais equilibrada e factual dos eventos - mas nesse caso não tem jeito, esse é seu estilo e muito do que você vai ver na tela foi de fato potencializado em troca de um conflito mais evidente e uma dramatização mais impactante. Apesar dessa ressalva, posso te garantir que "Monstros: Irmãos Menendez" é um entretenimento de primeira - essencialmente se você for mesmo um fã de true crime. Eu diria até que essa temporada é um retrato profundo e angustiante de uma das famílias mais disfuncionais da história criminal dos EUA, que aborda não apenas os atos brutais de violência, mas também as causas subjacentes do trauma.
Se você está disposto a considerar questões morais complexas, enquanto a narrativa desafia noções simplistas de culpabilidade e justiça, pode dar o play sem o menor medo de errar!