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The Undoing

"The Undoing" nunca foi uma aposta e isso precisa ficar muito claro, pois desde o seu anúncio em 25 de janeiro de 2020, foi muito fácil perceber que a junção de alguns elementos resultariam no sucesso absoluto que a minissérie se tornou - tanto que a própria HBO atrasou ao máximo o seu lançamento para evitar algum tipo de impacto inicial devido a pandemia, já que a série estrearia em maio. 

"The Undoing" é mais um thriller psicológico com o selo de David E. Kelley, um cara que já ganhou 11 Emmys, e assinou um outro recente sucesso da HBO: "Big Little Lies". Dito isso, você traz para a direção Susanne Bier do incrível "The Night Manager" e um elenco com Nicole Kidman, Hugh Grant, Noah Jupe e Donald Sutherland; e a receita está pronta! Repare: a minissérie conta a história de Grace Sachs (Nicole Kidman), uma terapeuta de sucesso que parece ter uma vida perfeita. Ela mora no Upper East Side, é casada com Jonathan (Hugh Grant), um marido extremamente dedicado, oncologista pediátrico de um grande hospital de câncer de NY, e tem um filho tranquilo e inteligente, Henry (Noah Jupe de "Um lugar silencioso"). Acontece que, da noite para o dia, sua vida vira de ponta cabeça quando uma morte violenta toma conta dos noticiários locais e seu marido desaparece misteriosamente - criando assim uma suspeita que parecia muito distante da realidade de Grace, mas na verdade não era. Confira o trailer:

"The Undoing" têm muitos méritos e o primeiro talvez seja o de nos prender durante seis episódios, provocando aquele sentimento de incerteza a cada plot twist e, sem roubar no jogo, escondendo quem realmente matou Elena (Matilda De Angelis). O bacana do roteiro, mesmo com algumas escorregadas, é que todas as peças são colocadas na mesa rapidamente e mesmo assim ainda é muito difícil encaixá-las, como se o "óbvio" fosse um pecado e o "surpreendente" apenas uma ferramenta narrativa para nos deixar incrédulos. Como tudo que a HBO faz nesse sentido, essa minissérie é mais uma daquelas imperdíveis e que vai te entreter com inteligência e qualidade!

Quando assisti o primeiro episódio de "The Undoing" comenteique o roteiro precisaria amarrar muito bem os perfis dos personagens com as descobertas das investigações para que o mistério se mantivesse até o final e com isso eliminasse a impressão inicial de que apenas Jonathan tinha muito a esconder. Finalizado todos os episódios, é fácil afirmar que o roteiro cumpriu o seu papel de nos provocar a descobrir "quem matou", porém é preciso que se diga que acontece um distanciamento das investigações para focar no impacto que o crime teve na família de Grace. Alguns pontos que levantei, como a tensão sexual criada entre Grace e Elena foi praticamente esquecida e muito mal aproveitada. Outro elemento que, na minha opinião fez muita falta no final e que amarraria perfeitamente com o depoimento de Grace no julgamento, foi a escolha de eliminar do roteiro o fato dela estar prestes a lançar um livro chamado “Você deveria ter conhecido”, em que ela critica as mulheres por não valorizarem sua intuição e as ensina a prestar mais atenção nas primeiras impressões dos homens ao começarem um relacionamento - assim que terminarem de assistir, reparem como seria perfeito essa conexão com tudo que vimos no episódio 6!

Fora essas duas passagens, Kelley é muito perspicaz em usar da nossa familiaridade com o gênero para ir nos distanciando da realidade, dos fatos - ele faz isso tão bem e Susanne Bie aproveita cada umas dessas possibilidades para criar uma atmosfera de dúvida que vai se sustentando e nos criando uma sensação de ansiedade. Um ponto que exemplifica muito bem essa característica do texto é quando Jonathan comenta com sua advogada que, além de Elena, teve mais um caso fora do casamento - pronto, bastou isso para colocar uma puga atrás da nossa orelha! Outro ponto alto, claro, é o trabalho do elenco: Donald Sutherland está simplesmente impecável e chega forte para as premiações de 2021! Nicole Kidman e Hugh Grant tem química, são carismáticos, bonitos, inteligentes, elegantes e a soma de tudo isso entrega um casal que parece ser inabalável - o legal é que, juntamente tudo isso, rotula os personagens, mas de uma forma tão orgânica que nos perdemos entre ficção e realidade! Talvez aqui esteja o diferencial do projeto: "The Undoing" não é sobre descobrir o assassino e sim uma busca por entender "como" e "porquê" uma pessoa aparentemente normal pode se tornar um!

Antes de finalizar, fica um comentário muito pessoal: a minissérie pode até parecer um pouco decepcionante com seu final - para mim, não foi o caso; mas será preciso observar as várias camadas que vão sendo construídas durante a história, principalmente porque sabemos do o background profissional de Grace - e ao perceber isso, "The Undoing" se torna ainda mais fascinante, pois ela está sempre buscando respostas no seu repertório como psiquiatra. Haley Fitzgerald (Noma Dumezweni), a advogada que conduziu o caso, talvez seja a personificação do que estamos pensando como audiência, mas com aquela "coragem" que não temos para assumir nossas (su)posições e que ao trazer a "sociopatia" para uma discussão tão próxima da realidade, no mínimo, devemos repensar e ligar nosso sinal de alerta!

Dê o play e divirta-se!

Assista Agora

"The Undoing" nunca foi uma aposta e isso precisa ficar muito claro, pois desde o seu anúncio em 25 de janeiro de 2020, foi muito fácil perceber que a junção de alguns elementos resultariam no sucesso absoluto que a minissérie se tornou - tanto que a própria HBO atrasou ao máximo o seu lançamento para evitar algum tipo de impacto inicial devido a pandemia, já que a série estrearia em maio. 

"The Undoing" é mais um thriller psicológico com o selo de David E. Kelley, um cara que já ganhou 11 Emmys, e assinou um outro recente sucesso da HBO: "Big Little Lies". Dito isso, você traz para a direção Susanne Bier do incrível "The Night Manager" e um elenco com Nicole Kidman, Hugh Grant, Noah Jupe e Donald Sutherland; e a receita está pronta! Repare: a minissérie conta a história de Grace Sachs (Nicole Kidman), uma terapeuta de sucesso que parece ter uma vida perfeita. Ela mora no Upper East Side, é casada com Jonathan (Hugh Grant), um marido extremamente dedicado, oncologista pediátrico de um grande hospital de câncer de NY, e tem um filho tranquilo e inteligente, Henry (Noah Jupe de "Um lugar silencioso"). Acontece que, da noite para o dia, sua vida vira de ponta cabeça quando uma morte violenta toma conta dos noticiários locais e seu marido desaparece misteriosamente - criando assim uma suspeita que parecia muito distante da realidade de Grace, mas na verdade não era. Confira o trailer:

"The Undoing" têm muitos méritos e o primeiro talvez seja o de nos prender durante seis episódios, provocando aquele sentimento de incerteza a cada plot twist e, sem roubar no jogo, escondendo quem realmente matou Elena (Matilda De Angelis). O bacana do roteiro, mesmo com algumas escorregadas, é que todas as peças são colocadas na mesa rapidamente e mesmo assim ainda é muito difícil encaixá-las, como se o "óbvio" fosse um pecado e o "surpreendente" apenas uma ferramenta narrativa para nos deixar incrédulos. Como tudo que a HBO faz nesse sentido, essa minissérie é mais uma daquelas imperdíveis e que vai te entreter com inteligência e qualidade!

Quando assisti o primeiro episódio de "The Undoing" comenteique o roteiro precisaria amarrar muito bem os perfis dos personagens com as descobertas das investigações para que o mistério se mantivesse até o final e com isso eliminasse a impressão inicial de que apenas Jonathan tinha muito a esconder. Finalizado todos os episódios, é fácil afirmar que o roteiro cumpriu o seu papel de nos provocar a descobrir "quem matou", porém é preciso que se diga que acontece um distanciamento das investigações para focar no impacto que o crime teve na família de Grace. Alguns pontos que levantei, como a tensão sexual criada entre Grace e Elena foi praticamente esquecida e muito mal aproveitada. Outro elemento que, na minha opinião fez muita falta no final e que amarraria perfeitamente com o depoimento de Grace no julgamento, foi a escolha de eliminar do roteiro o fato dela estar prestes a lançar um livro chamado “Você deveria ter conhecido”, em que ela critica as mulheres por não valorizarem sua intuição e as ensina a prestar mais atenção nas primeiras impressões dos homens ao começarem um relacionamento - assim que terminarem de assistir, reparem como seria perfeito essa conexão com tudo que vimos no episódio 6!

Fora essas duas passagens, Kelley é muito perspicaz em usar da nossa familiaridade com o gênero para ir nos distanciando da realidade, dos fatos - ele faz isso tão bem e Susanne Bie aproveita cada umas dessas possibilidades para criar uma atmosfera de dúvida que vai se sustentando e nos criando uma sensação de ansiedade. Um ponto que exemplifica muito bem essa característica do texto é quando Jonathan comenta com sua advogada que, além de Elena, teve mais um caso fora do casamento - pronto, bastou isso para colocar uma puga atrás da nossa orelha! Outro ponto alto, claro, é o trabalho do elenco: Donald Sutherland está simplesmente impecável e chega forte para as premiações de 2021! Nicole Kidman e Hugh Grant tem química, são carismáticos, bonitos, inteligentes, elegantes e a soma de tudo isso entrega um casal que parece ser inabalável - o legal é que, juntamente tudo isso, rotula os personagens, mas de uma forma tão orgânica que nos perdemos entre ficção e realidade! Talvez aqui esteja o diferencial do projeto: "The Undoing" não é sobre descobrir o assassino e sim uma busca por entender "como" e "porquê" uma pessoa aparentemente normal pode se tornar um!

Antes de finalizar, fica um comentário muito pessoal: a minissérie pode até parecer um pouco decepcionante com seu final - para mim, não foi o caso; mas será preciso observar as várias camadas que vão sendo construídas durante a história, principalmente porque sabemos do o background profissional de Grace - e ao perceber isso, "The Undoing" se torna ainda mais fascinante, pois ela está sempre buscando respostas no seu repertório como psiquiatra. Haley Fitzgerald (Noma Dumezweni), a advogada que conduziu o caso, talvez seja a personificação do que estamos pensando como audiência, mas com aquela "coragem" que não temos para assumir nossas (su)posições e que ao trazer a "sociopatia" para uma discussão tão próxima da realidade, no mínimo, devemos repensar e ligar nosso sinal de alerta!

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The Vow

Se você assistiu algum dos dois (razoavelmente) recentes documentários, "A Inventora: À Procura de Sangue no Vale do Silício" (HBO) e "Fyre" (Netflix), você já entendeu como a força de uma comunicação e do poder do convencimento podem influenciar uma pessoa (ou muitas), independente da capacidade de realização que o interlocutor possa ter. Em diferentes níveis, foi isso que Elizabeth Holmes da Theranos fez com seus investidores e Billy McFarland fez com todos que estavam envolvidos em seu Festival megalomaníaco! Pois bem, em "The Vow" surge um personagem raro, que consegue unir, com a mesma competência, a capacidade de comunicação com a de realização e ainda chancelado por um QI de 240 pontos: esse é o fundador da NXIVM, Keith Raniere.

"The Vow", documentário divido em 9 partes de 50 minutos, conta mais do que a história de Keith Raniere, criador de uma empresa de marketing multi-nível, que cresceu absurdamente nos Estados Unidos até ser fechada por sérios problemas trabalhistas. Aproveitando do seu comprovado discurso de convencimento, Keith criou a ESP (Executive Success Programs) um Programa de Sucesso Executivo focado no desenvolvimento pessoal. Seguindo o mesmo conceito de pirâmide, ele foi, pouco a pouco, transformando seus professores em aliciadores e seus alunos em uma espécie de seguidores de uma seita com atuações bastante questionáveis e que, posteriormente, acabou se transformando no principal motivo para uma dura jornada pessoal de ex-membros da organização para desmascarar seu fundador, que se auto-denominava "Vanguarda", e suas reais intenções com tudo isso! Confira o trailer:

A história por trás de "The Vow" chamou atenção da mídia internacional pelo fato da atriz Allison Mack, a Chloe Sullivan em "Smallville", ser uma das aliciadoras mais próxima de Keith Raniere, porém o comentário é muito feliz em dissecar a instituição pelos olhos de quem esteve lá, mas saiu por vontade própria ao perceber que algo estava muito errado. A jornada de três personagens bastante importantes na desconstrução dessa organização criminosa que se tornou a NXIVM, é o ponto de partida para uma história realmente impressionante. Sarah Edmonson, Bonnie Piesse e Mark Vicente, e um pouco mais a frente, Catherine Oxenberg, são acompanhados pela produção durante todos os episódios, contando suas histórias e tentando reverter uma situação que eles mesmos ajudaram a provocar, cada um em seu nível. Ao mesmo tempo vemos inúmeras imagens de arquivos, depoimentos, cenas do treinamento, entrevistas do próprio Keith e sua equipe, e até um encontro bastante impactante com o Dalai-lama.

O que mais me chamou a atenção foram os discursos de Keith: completamente coerentes, bem estruturados e de uma capacidade intelectual e de manipulação que em muitos momentos me fizeram questionar se, em algum momento da vida, eu também não seria uma potencial vítima - tenho certeza que você fará esse mesmo questionamento e talvez por isso, esse sentimento gere tanta vergonha e arrependimento nos protagonistas.

Dê o play sem o menor receio!

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Se você assistiu algum dos dois (razoavelmente) recentes documentários, "A Inventora: À Procura de Sangue no Vale do Silício" (HBO) e "Fyre" (Netflix), você já entendeu como a força de uma comunicação e do poder do convencimento podem influenciar uma pessoa (ou muitas), independente da capacidade de realização que o interlocutor possa ter. Em diferentes níveis, foi isso que Elizabeth Holmes da Theranos fez com seus investidores e Billy McFarland fez com todos que estavam envolvidos em seu Festival megalomaníaco! Pois bem, em "The Vow" surge um personagem raro, que consegue unir, com a mesma competência, a capacidade de comunicação com a de realização e ainda chancelado por um QI de 240 pontos: esse é o fundador da NXIVM, Keith Raniere.

"The Vow", documentário divido em 9 partes de 50 minutos, conta mais do que a história de Keith Raniere, criador de uma empresa de marketing multi-nível, que cresceu absurdamente nos Estados Unidos até ser fechada por sérios problemas trabalhistas. Aproveitando do seu comprovado discurso de convencimento, Keith criou a ESP (Executive Success Programs) um Programa de Sucesso Executivo focado no desenvolvimento pessoal. Seguindo o mesmo conceito de pirâmide, ele foi, pouco a pouco, transformando seus professores em aliciadores e seus alunos em uma espécie de seguidores de uma seita com atuações bastante questionáveis e que, posteriormente, acabou se transformando no principal motivo para uma dura jornada pessoal de ex-membros da organização para desmascarar seu fundador, que se auto-denominava "Vanguarda", e suas reais intenções com tudo isso! Confira o trailer:

A história por trás de "The Vow" chamou atenção da mídia internacional pelo fato da atriz Allison Mack, a Chloe Sullivan em "Smallville", ser uma das aliciadoras mais próxima de Keith Raniere, porém o comentário é muito feliz em dissecar a instituição pelos olhos de quem esteve lá, mas saiu por vontade própria ao perceber que algo estava muito errado. A jornada de três personagens bastante importantes na desconstrução dessa organização criminosa que se tornou a NXIVM, é o ponto de partida para uma história realmente impressionante. Sarah Edmonson, Bonnie Piesse e Mark Vicente, e um pouco mais a frente, Catherine Oxenberg, são acompanhados pela produção durante todos os episódios, contando suas histórias e tentando reverter uma situação que eles mesmos ajudaram a provocar, cada um em seu nível. Ao mesmo tempo vemos inúmeras imagens de arquivos, depoimentos, cenas do treinamento, entrevistas do próprio Keith e sua equipe, e até um encontro bastante impactante com o Dalai-lama.

O que mais me chamou a atenção foram os discursos de Keith: completamente coerentes, bem estruturados e de uma capacidade intelectual e de manipulação que em muitos momentos me fizeram questionar se, em algum momento da vida, eu também não seria uma potencial vítima - tenho certeza que você fará esse mesmo questionamento e talvez por isso, esse sentimento gere tanta vergonha e arrependimento nos protagonistas.

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The White Lotus

"The White Lotus" é sensacional! Certamente uma das melhores séries do ano, porém não vai agradar a todos pelas suas escolhas conceituais e narrativas bem particulares - e aqui cabe uma rápida comparação: se você não gostou de "Breaking Bad", é bem possível que você também não goste dessa produção da HBO, pois embora sejam completamente diferentes, alguns elementos muito marcantes na série de Vince Gilligan e que dividiu a opinião da audiência, praticamente explodem na tela em "The White Lotus" como o refinado humor negro inserido em diálogos cheios de profundidade dramática, uma pontuação de moodquase "insuportável" de boa (que em Breaking Bad era visual e aqui é sonoro) e para finalizar, o time entre uma ação e sua consequência que implica em sensações muito incomodas. Mas calma, vou aprofundar melhor isso mais abaixo.

A narrativa, centrada em umresort de luxo no Havaí, acompanha o cotidiano de alguns hóspedes e membros do quadro de funcionários e, à medida que seus problemas se misturam, as tramas se afunilam em um emaranhado de mentiras, ressentimentos e discussões que colocam toda a atmosfera paradisíaca e relaxante em xeque. Nessa primeira temporada temos uma mulher emocionalmente afetada que precisa cumprir o ritual de jogar as cinzas da sua mãe no mar, uma família típica americana completamente desestruturada e um casal em Lua de Mel absolutamente desconectados entre si - o que eles tem em comum: todos são ricos, brancos e estão em posições privilegiadas na sociedade graças a essas características. Confira o trailer:

Primeiro vamos falar do roteiro - genial, mas longe de ser perfeito. Imagino que por algum tipo de estratégia (desnecessária), a série começa já no final de uma semana de férias onde descobrimos que alguém que estava noresort,morreu.Embora isso não impacte em absolutamente nada na experiência de assistir "The White Lotus", acaba até irritando quando nos deparamos com a solução desse "impasse"! Por outro lado, toda jornada se sobressai a partir de um texto muito inspirado que soube equilibrar três elementos essenciais para a construção de uma narrativa tão imersiva: o elenco, a trilha sonora e uma excepcional montagem.

trilha sonora eclética composta por Cristobal Tapia de Veer (de "Electric Dreams") dita o ritmo sa série e nos traz sensações que uma montagem bem sagaz do Heather Persons ("The Flight Attendant") só amplifica. No meio disso tudo, um elenco sensacional. Destaque para Jennifer Coolidge como a solitária, insegura e cheia de problemas Tanya McQuoid; Steve Zahn, como Markum pai de família liberal e submisso marido de uma alta executiva paranóica e, finalmente, Murray Bartlett como Armond, o gerente do hotel, que enfrentou vícios e que há cinco anos luta para se manter sóbrio.

"The White Lotus" é um excelente entretenimento que mergulha nas diversas camadas dos personagens e que ritmadas por uma condução competente do diretor Mike White ("O Estado das Coisas") faz da crítica social apenas o ponto de partida para discutir uma série de outros assuntos que se fossem enxergados de outra forma, certamente, seriam classificados como "tabu".  Eu diria que a série toca fundo no egocentrismo, no conformismo, na falta de noção e percepção de mundo, além é claro, do pessimismo perante uma conturbada essência humana.

Vale muito a pena! Mesmo!

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"The White Lotus" é sensacional! Certamente uma das melhores séries do ano, porém não vai agradar a todos pelas suas escolhas conceituais e narrativas bem particulares - e aqui cabe uma rápida comparação: se você não gostou de "Breaking Bad", é bem possível que você também não goste dessa produção da HBO, pois embora sejam completamente diferentes, alguns elementos muito marcantes na série de Vince Gilligan e que dividiu a opinião da audiência, praticamente explodem na tela em "The White Lotus" como o refinado humor negro inserido em diálogos cheios de profundidade dramática, uma pontuação de moodquase "insuportável" de boa (que em Breaking Bad era visual e aqui é sonoro) e para finalizar, o time entre uma ação e sua consequência que implica em sensações muito incomodas. Mas calma, vou aprofundar melhor isso mais abaixo.

A narrativa, centrada em umresort de luxo no Havaí, acompanha o cotidiano de alguns hóspedes e membros do quadro de funcionários e, à medida que seus problemas se misturam, as tramas se afunilam em um emaranhado de mentiras, ressentimentos e discussões que colocam toda a atmosfera paradisíaca e relaxante em xeque. Nessa primeira temporada temos uma mulher emocionalmente afetada que precisa cumprir o ritual de jogar as cinzas da sua mãe no mar, uma família típica americana completamente desestruturada e um casal em Lua de Mel absolutamente desconectados entre si - o que eles tem em comum: todos são ricos, brancos e estão em posições privilegiadas na sociedade graças a essas características. Confira o trailer:

Primeiro vamos falar do roteiro - genial, mas longe de ser perfeito. Imagino que por algum tipo de estratégia (desnecessária), a série começa já no final de uma semana de férias onde descobrimos que alguém que estava noresort,morreu.Embora isso não impacte em absolutamente nada na experiência de assistir "The White Lotus", acaba até irritando quando nos deparamos com a solução desse "impasse"! Por outro lado, toda jornada se sobressai a partir de um texto muito inspirado que soube equilibrar três elementos essenciais para a construção de uma narrativa tão imersiva: o elenco, a trilha sonora e uma excepcional montagem.

trilha sonora eclética composta por Cristobal Tapia de Veer (de "Electric Dreams") dita o ritmo sa série e nos traz sensações que uma montagem bem sagaz do Heather Persons ("The Flight Attendant") só amplifica. No meio disso tudo, um elenco sensacional. Destaque para Jennifer Coolidge como a solitária, insegura e cheia de problemas Tanya McQuoid; Steve Zahn, como Markum pai de família liberal e submisso marido de uma alta executiva paranóica e, finalmente, Murray Bartlett como Armond, o gerente do hotel, que enfrentou vícios e que há cinco anos luta para se manter sóbrio.

"The White Lotus" é um excelente entretenimento que mergulha nas diversas camadas dos personagens e que ritmadas por uma condução competente do diretor Mike White ("O Estado das Coisas") faz da crítica social apenas o ponto de partida para discutir uma série de outros assuntos que se fossem enxergados de outra forma, certamente, seriam classificados como "tabu".  Eu diria que a série toca fundo no egocentrismo, no conformismo, na falta de noção e percepção de mundo, além é claro, do pessimismo perante uma conturbada essência humana.

Vale muito a pena! Mesmo!

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Tiger

Tiger Woods foi um verdadeiro fenômeno - no esporte e no marketing. Colocou o golfe sob os holofotes da imprensa esportiva no mesmo nível que um jogo dos Bulls de Jordan - e isso não é suposição, são números! Um jovem negro, em um esporte elitista, majoritariamente praticado por brancos, que se torna profissional com apenas 19 anos, vence mais de 70 torneios profissionais e 15 majors, é o segundo maior vencedor da história - justamente por isso, esse documentário da HBO em duas partes, é tão incrível: por que um fenômeno como Woods não se tornou o maior jogador de golfe de todos os tempos? A resposta é muito simples: não é fácil ser o Tiger Woods que a mídia precisava que ele fosse! Abstraindo todo julgamento moral, afinal, quem somos nós para julgar, "Tiger" pontua grande parte da carreira do campeão, mas também tenta encontrar respostas para seu comportamento fora de campo. Confira o trailer:

Os diretores Matthew Hamachek (de "Guerra dos Consoles") e Matthew Heineman (de "Cartel Land" - indicado ao Oscar de documentário em 2016) traçam uma verdadeira jornada do herói e constroem uma narrativa de admiração e empatia com o protagonista na primeira parte que, propositalmente, entra em colapso na segunda. Seguindo um conceito muito bem definido, onde entrevistam personagens que orbitaram no universo de Woods em vários momentos da vida do campeão, imagens de arquivos, tanto pessoal, quanto de veículos de comunicação; o documentário cria uma dinâmica que fica impossível não embarcar (mesmo não sabendo absolutamente nada do esporte). Diferente de "Last Dance" onde o foco era a história de uma conquista, se apoiando na construção de um mito; em "Tiger" o mito é construído rapidamente, mas completamente humanizado a partir dos seus erros como marido e como homem.

"Tiger" não é um projeto isento de opiniões pessoais ou de retratação pública, entendam como quiser; o fato é que a narrativa soube destacar o quanto a hipocrisia está presente dentro na sociedade americana, especialmente na mídia, e como a necessidade de construir mitos para depois ter o prazer de destrui-los se torna uma sombra na vida de quase todos os esportistas em qualquer lugar do mundo - reparem, reflitam e percebam como essa história não tem nada de novo!

Da relação com o pai, com a mãe, com a namorada e com a mulher traída, ao reflexo de muita dedicação e talento, "Tiger" é um obra essencial para entender o outro lado, menos glamuroso, que quase sempre é esquecido pelo simples incomodo que o sucesso pode provocar nas pessoas. O documentário é imperdível por isso e pelo registro da história de um dos maiores esportistas de todos os tempos e de todos os esportes!

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Tiger Woods foi um verdadeiro fenômeno - no esporte e no marketing. Colocou o golfe sob os holofotes da imprensa esportiva no mesmo nível que um jogo dos Bulls de Jordan - e isso não é suposição, são números! Um jovem negro, em um esporte elitista, majoritariamente praticado por brancos, que se torna profissional com apenas 19 anos, vence mais de 70 torneios profissionais e 15 majors, é o segundo maior vencedor da história - justamente por isso, esse documentário da HBO em duas partes, é tão incrível: por que um fenômeno como Woods não se tornou o maior jogador de golfe de todos os tempos? A resposta é muito simples: não é fácil ser o Tiger Woods que a mídia precisava que ele fosse! Abstraindo todo julgamento moral, afinal, quem somos nós para julgar, "Tiger" pontua grande parte da carreira do campeão, mas também tenta encontrar respostas para seu comportamento fora de campo. Confira o trailer:

Os diretores Matthew Hamachek (de "Guerra dos Consoles") e Matthew Heineman (de "Cartel Land" - indicado ao Oscar de documentário em 2016) traçam uma verdadeira jornada do herói e constroem uma narrativa de admiração e empatia com o protagonista na primeira parte que, propositalmente, entra em colapso na segunda. Seguindo um conceito muito bem definido, onde entrevistam personagens que orbitaram no universo de Woods em vários momentos da vida do campeão, imagens de arquivos, tanto pessoal, quanto de veículos de comunicação; o documentário cria uma dinâmica que fica impossível não embarcar (mesmo não sabendo absolutamente nada do esporte). Diferente de "Last Dance" onde o foco era a história de uma conquista, se apoiando na construção de um mito; em "Tiger" o mito é construído rapidamente, mas completamente humanizado a partir dos seus erros como marido e como homem.

"Tiger" não é um projeto isento de opiniões pessoais ou de retratação pública, entendam como quiser; o fato é que a narrativa soube destacar o quanto a hipocrisia está presente dentro na sociedade americana, especialmente na mídia, e como a necessidade de construir mitos para depois ter o prazer de destrui-los se torna uma sombra na vida de quase todos os esportistas em qualquer lugar do mundo - reparem, reflitam e percebam como essa história não tem nada de novo!

Da relação com o pai, com a mãe, com a namorada e com a mulher traída, ao reflexo de muita dedicação e talento, "Tiger" é um obra essencial para entender o outro lado, menos glamuroso, que quase sempre é esquecido pelo simples incomodo que o sucesso pode provocar nas pessoas. O documentário é imperdível por isso e pelo registro da história de um dos maiores esportistas de todos os tempos e de todos os esportes!

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Togetherness

Togetherness

Essa é uma série despretenciosa que foi lançada sem tanto alarde pela HBO em 2015. e que fechou o seu ciclo com apenas duas temporadas - se você gosta de séries como "Easy"ou "Modern Love", certamente "Togetherness" é para você, mas saiba que o gostinho de "quero mais" pode te consumir no final do 16º episódio. Criada pelos irmãos Duplass (dos geniais "Transparent" e "Room 104") e por Steve Zissis (de "Cruella"), "Togetherness" te fará rir e chorar em uma jornada, de fato, apaixonante. Com um humor até certo ponto ácido e uma sensibilidade bastante aguçada, a narrativa explora com muita inteligência os desafios da vida adulta com um toque de realismo que nos distancia daquelas comédias românticas mais tradicionais - talvez por isso ela tenha agradado mais a critica do que o público em geral, mesmo depois das duas indicações no "Critics Choice Awards" de 2015.

A trama, basicamente, gira em torno de Brett (Mark Duplass) e Michelle (Melanie Lynskey), um casal que enfrenta uma crise no casamento após a chegada dos filhos. Buscando recuperar a chama da paixão, eles decidem convidar o melhor amigo de Brett, Alex (Steve Zissis), e a irmã de Michelle, Tina (Amanda Peet), para morarem com eles. A convivência entre os quatro personagens, com suas próprias frustrações e inseguranças, gera situações hilárias e comoventes, explorando temas como amizade, amor, família e a busca pela felicidade. Confira o trailer a seguir (em inglês):

Me diga se você já viu isso em algum ligar: primeiro um casal na faixa dos seus 35 anos, com família e tudo mais, que se amam, mas que vem sofrendo com o desgaste natural após 10 anos de relacionamento. Segundo, um outro casal de amigos improváveis formado por um ator, quase fracassado, e uma linda mulher que ainda está solteira, mas não se conforma com isso. Pois é, eu sei sua resposta e é justamente isso que torna "Togetherness"  imperdível - a forma como os irmãos Duplass e a Nicole Holofcener capturam a essência da vida real, com seus altos e baixos, sem filtros ou romantizações, é impressionante (e dolorido). Reparem como a série até começa apresentando um lado mais cômico da trama e de seus personagens, mas conforme vão passando os episódios é o drama que vai dando o tom da narrativa.

"Togetherness" se destaca pela naturalidade das atuações de seu pequeno elenco - mérito da direção sensível e cirúrgica dos Duplass. Não por acaso, todo aquele contexto de identificação nos leva para uma jornada verdadeiramente emocional, onde nos empatizamos com as dúvidas e angústias dos personagens ao ponto de nos fazer questionar nossas próprias escolhas de vida. Sem dúvida que a série representa um convite a reflexão sobre o que realmente importa na vida.

Ao mesmo tempo que nos diverte com situações e personagens excêntricos cheios de camadas que nos conquistam com sua humanidade, "Togetherness" também sabe ser apaixonante pelas discussões sobre os dilemas da vida adulta. Os irmãos Duplass mais uma vez marcam um golaço com essa comédia dramática que aposta na sabedoria de seu conceito narrativo para falar de sentimentos e trazer sensações muito presentes em algum momento da nossa vida - é o equilíbrio perfeito entre o alivio cômico e o drama mais intenso! Olhando alguns anos em retrospectiva, fica fácil atestar que "Togetherness" merecia uma melhor chance - leia-se uma terceira e definitiva temporada!

Sim, essa é daquelas de sentimos seu cancelamento, mas que ainda assim merece ser descoberta!

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Essa é uma série despretenciosa que foi lançada sem tanto alarde pela HBO em 2015. e que fechou o seu ciclo com apenas duas temporadas - se você gosta de séries como "Easy"ou "Modern Love", certamente "Togetherness" é para você, mas saiba que o gostinho de "quero mais" pode te consumir no final do 16º episódio. Criada pelos irmãos Duplass (dos geniais "Transparent" e "Room 104") e por Steve Zissis (de "Cruella"), "Togetherness" te fará rir e chorar em uma jornada, de fato, apaixonante. Com um humor até certo ponto ácido e uma sensibilidade bastante aguçada, a narrativa explora com muita inteligência os desafios da vida adulta com um toque de realismo que nos distancia daquelas comédias românticas mais tradicionais - talvez por isso ela tenha agradado mais a critica do que o público em geral, mesmo depois das duas indicações no "Critics Choice Awards" de 2015.

A trama, basicamente, gira em torno de Brett (Mark Duplass) e Michelle (Melanie Lynskey), um casal que enfrenta uma crise no casamento após a chegada dos filhos. Buscando recuperar a chama da paixão, eles decidem convidar o melhor amigo de Brett, Alex (Steve Zissis), e a irmã de Michelle, Tina (Amanda Peet), para morarem com eles. A convivência entre os quatro personagens, com suas próprias frustrações e inseguranças, gera situações hilárias e comoventes, explorando temas como amizade, amor, família e a busca pela felicidade. Confira o trailer a seguir (em inglês):

Me diga se você já viu isso em algum ligar: primeiro um casal na faixa dos seus 35 anos, com família e tudo mais, que se amam, mas que vem sofrendo com o desgaste natural após 10 anos de relacionamento. Segundo, um outro casal de amigos improváveis formado por um ator, quase fracassado, e uma linda mulher que ainda está solteira, mas não se conforma com isso. Pois é, eu sei sua resposta e é justamente isso que torna "Togetherness"  imperdível - a forma como os irmãos Duplass e a Nicole Holofcener capturam a essência da vida real, com seus altos e baixos, sem filtros ou romantizações, é impressionante (e dolorido). Reparem como a série até começa apresentando um lado mais cômico da trama e de seus personagens, mas conforme vão passando os episódios é o drama que vai dando o tom da narrativa.

"Togetherness" se destaca pela naturalidade das atuações de seu pequeno elenco - mérito da direção sensível e cirúrgica dos Duplass. Não por acaso, todo aquele contexto de identificação nos leva para uma jornada verdadeiramente emocional, onde nos empatizamos com as dúvidas e angústias dos personagens ao ponto de nos fazer questionar nossas próprias escolhas de vida. Sem dúvida que a série representa um convite a reflexão sobre o que realmente importa na vida.

Ao mesmo tempo que nos diverte com situações e personagens excêntricos cheios de camadas que nos conquistam com sua humanidade, "Togetherness" também sabe ser apaixonante pelas discussões sobre os dilemas da vida adulta. Os irmãos Duplass mais uma vez marcam um golaço com essa comédia dramática que aposta na sabedoria de seu conceito narrativo para falar de sentimentos e trazer sensações muito presentes em algum momento da nossa vida - é o equilíbrio perfeito entre o alivio cômico e o drama mais intenso! Olhando alguns anos em retrospectiva, fica fácil atestar que "Togetherness" merecia uma melhor chance - leia-se uma terceira e definitiva temporada!

Sim, essa é daquelas de sentimos seu cancelamento, mas que ainda assim merece ser descoberta!

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Tokyo Vice

Você não vai se apaixonar por "Tokyo Vice" imediatamente - será necessários pelo menos 3 ou 4 episódios para você desejar emendar um episódio no outro (e isso vai acontecer)! Basicamente, essa série da HBO Max é um drama policial com fortes elementos de jornalismo investigativo. Ambientado no submundo da Yakuza na Tóquio dos anos 90, a série criada por J.T. Rogers (de "Oslo"), captura como poucas a vibrante energia da capital japonesa, contrastando sua atmosfera histriônica com a brutalidade do crime organizado. Com uma narrativa até certo ponto cadenciada, mas naturalmente envolvente, atuações impecáveis e uma proposta de direção das mais interessantes, "Tokyo Vice" se destacou como uma das melhores séries de 2022, figurando, inclusive, em premiações como o Critics Choice Awards e o Gotham Independent Film Awards.

Jake Adelstein (Ansel Elgort) é um jovem jornalista americano obcecado pelo Japão que se muda para Tóquio em busca de uma oportunidade no prestigiado jornal Meicho Shimbun. Motivado por um idealismo ingênuo, ele logo se depara com a dura realidade do crime organizado, atraindo a atenção de Sato (Ken Watanabe), um detetive da divisão de homicídios que o guia pelas complexas teias da Yakuza. Confira o trailer:

Certamente o que vai mudar sua percepção sobre "Tokyo Vice" é o fato de se tratar de uma história real. Na verdade a série é inspirada no livro homônimo de memória de Adelstein, um jornalista judeu que realmente vivenciou as experiências retratadas na série. Naturalmente que não estamos falando de uma cópia página por página do livro, mas a essência dramática, acreditem, é a mesma. Observar um imigrante, natural do Meio-Oeste americano, vivendo em Tóquio e mergulhando na cultura nacionalista japonesa, é só uma das qualidades do roteiro de J.T. Roger. É impressionante como ele sabe aproveitar dessa base factual para agregar um peso extra à narrativa, conferindo veracidade aos eventos e seus personagens de uma forma realmente orgânica.

A atmosfera noirda série é lindamente potencializada pela fotografia impecável do Daniel Satinoff (e sua equipe) - ele captura a beleza noturna, totalmente neon, de Tóquio ao mesmo tempo que pontua uma aura de perigo constante do submundo do crime. São planos realmente muito bem planejados e impecáveis em sua realização, que ao lado de uma trilha sonora extremamente melancólica dão o tom exato do suspense e da tensão que a direção, especialmente, de Michael Mann ("Heat") exige - aliás, "Tokyo Vice" tem muito de "Colateral" na sua proposta visual e narrativa, uma pena que o talento de Mann na concepção de uma unidade estética vá se perdendo depois do piloto. Outro destaque, sem dúvida, é Ansel Elgort - ele entrega uma performance visceral como Jake, transmitindo sua ambição, ingenuidade e, principalmente, sua gradual desilusão com aquele mundo que o cerca. Ken Watanabe também rouba a cena como Sato, um detetive experiente e ambivalente, dividido entre a lealdade à lei e a necessidade de fazer justiça. 

O fato é que "Tokyo Vice" começa morninha, mas vai aquecendo ao ponto de ter garantido uma segunda temporada com muitos méritos. Essa é uma série imperdível para os fãs de thrillers policiais baseado em histórias reais que de alguma forma provoca inúmeras sensações: da solidão ao entusiasmo, passando pela ansiedade e pela melancolia de seu protagonista - que não raramente se confunde com a atmosfera desafiadora de Tóquio. Ao explorar alguns temas através de vários personagens que se cruzam e se conectam por pontos em comum, como a dificuldade de um choque cultural tão marcante ou a busca por uma identidade que traria algum conforto ou até mesmo pela luta por justiça em um sistema tão corrompido e hipócrita, enfim, toda essa combinação de elementos resulta em uma experiência, de fato, única e memorável que vale a pena dar uma chance - por mais que inicialmente soe enganosa.

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Você não vai se apaixonar por "Tokyo Vice" imediatamente - será necessários pelo menos 3 ou 4 episódios para você desejar emendar um episódio no outro (e isso vai acontecer)! Basicamente, essa série da HBO Max é um drama policial com fortes elementos de jornalismo investigativo. Ambientado no submundo da Yakuza na Tóquio dos anos 90, a série criada por J.T. Rogers (de "Oslo"), captura como poucas a vibrante energia da capital japonesa, contrastando sua atmosfera histriônica com a brutalidade do crime organizado. Com uma narrativa até certo ponto cadenciada, mas naturalmente envolvente, atuações impecáveis e uma proposta de direção das mais interessantes, "Tokyo Vice" se destacou como uma das melhores séries de 2022, figurando, inclusive, em premiações como o Critics Choice Awards e o Gotham Independent Film Awards.

Jake Adelstein (Ansel Elgort) é um jovem jornalista americano obcecado pelo Japão que se muda para Tóquio em busca de uma oportunidade no prestigiado jornal Meicho Shimbun. Motivado por um idealismo ingênuo, ele logo se depara com a dura realidade do crime organizado, atraindo a atenção de Sato (Ken Watanabe), um detetive da divisão de homicídios que o guia pelas complexas teias da Yakuza. Confira o trailer:

Certamente o que vai mudar sua percepção sobre "Tokyo Vice" é o fato de se tratar de uma história real. Na verdade a série é inspirada no livro homônimo de memória de Adelstein, um jornalista judeu que realmente vivenciou as experiências retratadas na série. Naturalmente que não estamos falando de uma cópia página por página do livro, mas a essência dramática, acreditem, é a mesma. Observar um imigrante, natural do Meio-Oeste americano, vivendo em Tóquio e mergulhando na cultura nacionalista japonesa, é só uma das qualidades do roteiro de J.T. Roger. É impressionante como ele sabe aproveitar dessa base factual para agregar um peso extra à narrativa, conferindo veracidade aos eventos e seus personagens de uma forma realmente orgânica.

A atmosfera noirda série é lindamente potencializada pela fotografia impecável do Daniel Satinoff (e sua equipe) - ele captura a beleza noturna, totalmente neon, de Tóquio ao mesmo tempo que pontua uma aura de perigo constante do submundo do crime. São planos realmente muito bem planejados e impecáveis em sua realização, que ao lado de uma trilha sonora extremamente melancólica dão o tom exato do suspense e da tensão que a direção, especialmente, de Michael Mann ("Heat") exige - aliás, "Tokyo Vice" tem muito de "Colateral" na sua proposta visual e narrativa, uma pena que o talento de Mann na concepção de uma unidade estética vá se perdendo depois do piloto. Outro destaque, sem dúvida, é Ansel Elgort - ele entrega uma performance visceral como Jake, transmitindo sua ambição, ingenuidade e, principalmente, sua gradual desilusão com aquele mundo que o cerca. Ken Watanabe também rouba a cena como Sato, um detetive experiente e ambivalente, dividido entre a lealdade à lei e a necessidade de fazer justiça. 

O fato é que "Tokyo Vice" começa morninha, mas vai aquecendo ao ponto de ter garantido uma segunda temporada com muitos méritos. Essa é uma série imperdível para os fãs de thrillers policiais baseado em histórias reais que de alguma forma provoca inúmeras sensações: da solidão ao entusiasmo, passando pela ansiedade e pela melancolia de seu protagonista - que não raramente se confunde com a atmosfera desafiadora de Tóquio. Ao explorar alguns temas através de vários personagens que se cruzam e se conectam por pontos em comum, como a dificuldade de um choque cultural tão marcante ou a busca por uma identidade que traria algum conforto ou até mesmo pela luta por justiça em um sistema tão corrompido e hipócrita, enfim, toda essa combinação de elementos resulta em uma experiência, de fato, única e memorável que vale a pena dar uma chance - por mais que inicialmente soe enganosa.

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Top of The Lake

“Top of The Lake” é uma série de suspense criminal original BBC criada por Jane Campion (do premiado “Ataque de Cães”) e Gerard Lee que merece sua atenção! Mas é preciso que se diga: inicialmente a série foi exibida em Sundance e só por isso já dá para saber que se trata de uma obra bastante intimista e fora da curva, semelhante aos filmes que são exibidos pela organização do Festival.

Na trama, a detetive Robin Griffin (Elisabeth Moss) precisa descobrir o que aconteceu com Tui Mitcham (Jacqueline Joe) e está decidida a encontrar o narcotraficante Matt Mitcham (Peter Mullan), o pai da menina, para obter mais informações. Mas, no caminho, ela se depara com o líder espiritual GJ (Holly Hunter) e percebe que a cidade esconde mais segredos do que ela imaginava. Confira o trailer (em inglês):

“Top of The Lake” é uma produção semelhante as mais recentes “Mare of Easttown”e “Sharp Objects”. Embora a série não esteja à altura das minisséries citadas, o thriller é bastante competente e entrega um final satisfatório (da primeira temporada) que compensa todo o ritmo cadenciado. Diferente de outras séries do gênero que focam muito na investigação, o trabalho de Campion (que também dirige os 8 episódios) se concentra nas complexidades dos personagens e do ambiente que os cercam. 

A única resposta que se pode esperar envolve o crime central - que em sua conclusão final surpreende com uma revelação inusitada. Minutos antes do mistério ser desvendado, você consegue captar o que vem a seguir, mas até o episódio de encerramento tudo é desconhecido. Já os personagens nunca tem seus dramas devidamente explorados, as incertezas são o charme da série que sempre busca trazer questionamentos sobre essas pessoas que estão em um ambiente caótico e de desesperança. A presença de Elisabeth Moss como Griffin é forte, um dos pontos altos da série - assim como Petter Mullan, que interpreta um homem detestável.

“Top of The Lake” testa a paciência de quem não costuma acompanhar séries com ritmo lento, mas compensa para quem aprecia dramas mais contemplativos e que exploram diversos temas, mesmo que em sua superfície.

Pode dar o play tranquilamente!

PS: A segunda temporada também já está disponível e mantem a enorme qualidade de roteiro e produção da primeira.

Escrito por Mark Hewes - uma parceria @indiqueipraver

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“Top of The Lake” é uma série de suspense criminal original BBC criada por Jane Campion (do premiado “Ataque de Cães”) e Gerard Lee que merece sua atenção! Mas é preciso que se diga: inicialmente a série foi exibida em Sundance e só por isso já dá para saber que se trata de uma obra bastante intimista e fora da curva, semelhante aos filmes que são exibidos pela organização do Festival.

Na trama, a detetive Robin Griffin (Elisabeth Moss) precisa descobrir o que aconteceu com Tui Mitcham (Jacqueline Joe) e está decidida a encontrar o narcotraficante Matt Mitcham (Peter Mullan), o pai da menina, para obter mais informações. Mas, no caminho, ela se depara com o líder espiritual GJ (Holly Hunter) e percebe que a cidade esconde mais segredos do que ela imaginava. Confira o trailer (em inglês):

“Top of The Lake” é uma produção semelhante as mais recentes “Mare of Easttown”e “Sharp Objects”. Embora a série não esteja à altura das minisséries citadas, o thriller é bastante competente e entrega um final satisfatório (da primeira temporada) que compensa todo o ritmo cadenciado. Diferente de outras séries do gênero que focam muito na investigação, o trabalho de Campion (que também dirige os 8 episódios) se concentra nas complexidades dos personagens e do ambiente que os cercam. 

A única resposta que se pode esperar envolve o crime central - que em sua conclusão final surpreende com uma revelação inusitada. Minutos antes do mistério ser desvendado, você consegue captar o que vem a seguir, mas até o episódio de encerramento tudo é desconhecido. Já os personagens nunca tem seus dramas devidamente explorados, as incertezas são o charme da série que sempre busca trazer questionamentos sobre essas pessoas que estão em um ambiente caótico e de desesperança. A presença de Elisabeth Moss como Griffin é forte, um dos pontos altos da série - assim como Petter Mullan, que interpreta um homem detestável.

“Top of The Lake” testa a paciência de quem não costuma acompanhar séries com ritmo lento, mas compensa para quem aprecia dramas mais contemplativos e que exploram diversos temas, mesmo que em sua superfície.

Pode dar o play tranquilamente!

PS: A segunda temporada também já está disponível e mantem a enorme qualidade de roteiro e produção da primeira.

Escrito por Mark Hewes - uma parceria @indiqueipraver

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Trapaça

Esse é mais um título que me fez perguntar: "Onde eu estava que não assisti esse filme antes?". "Trapaça" é uma produção de 2013 que foi indicada, pasmem, em dez categorias no Oscar - e com muito mérito, eu completo. Em uma época onde streaming era uma palavra que nem no dicionário estava, o filme simplesmente passou batido por mim e tenho a impressão de que por muita gente - o que é um pecado, pois ele é excelente, com uma narrativa dinâmica, muito bem dirigido e com performances de cair o queixo de um elenco que conta "só" com Christian Bale, Amy Adams, Bradley Cooper e Jennifer Lawrence (todos indicados ao Oscar, inclusive).

Incrivelmente baseado em um fato real, o filme conta a história de Irving Rosenfeld (Bale), um grande trapaceiro que tem como sócia e amante Sydney Prosser (Adams). Depois de serem surpreendidos e pegos por uma ação do FBI, os dois são forçados a colaborar com o agente Richie DiMaso (Cooper), que infiltra Rosenfeld no mundo da máfia ao mesmo tempo em que tenta conseguir provas do envolvimento político do mais alto escalão do país, em corrupção através do candidato Carmine Polito (Jeremy Renner). Os planos parecem dar certo, até a esposa de Irving, Rosalyn (Lawrence), aparecer e mudar completamente as regras do jogo. Confira o trailer:

Dirigido pelo sempre competente e muito talentoso (cinco vezes indicado ao Oscar), David Owen Russell de "Joy", "Trapaça" é meio que uma mistura de Guy Ritchie com Adam McKay, não visualmente (marca registrada dos dois diretores), mas na dinâmica narrativa, na escolha do tom e na ironia que cada linha de diálogo representa para a história que, a todo momento, soa tão absurda que parece mentira. Russell e seus montadores (Jay Cassidy, Crispin Struthers, Alan Baumgarten) constroem uma linha temporal muito interessante, narrada por diversos pontos de vista, com diferentes personagens, mas sempre mantendo a uma coerência cinematográfica que impressiona pela didática sem ser expositiva. Veja, quando vemos um verdadeiro "Zé Ninguém", careca, barrigudo, brega e, aparentemente, pacato, se transformar em Irving Rosenfeld; temos a certeza que a história vai nos levar para um lugar que nem podemos imaginar.

Escrito pelo próprio Russell ao lado de Eric Warren Singer (de "Top Gun: Maverick"), o filme vai nos surpreendendo a cada movimento dos personagens - como a trapaça está no centro da discussão, é impossível cravar o que de fato é sincero durante toda a jornada. O interessante é que todos os personagens parecem saber disso, e mesmo apoiados em alguns esteriótipos (propositais) e ações normalmente exageradas, toda essa desconfiança funciona como motivação e quando menos esperamos, algo quebra essa cadeia e somos surpreendidos. Talvez a personagem de Lawrence, a Rosalyn Rosenfeld, seja a personificação desse mood  (ela está incrível) ou até mesmo as maravilhosas conversas entre os personagens de Cooper e Louis C.K. (o Stoddard Thorsen) nos escritórios do FBI dos anos 70 sintetizem bem esse conceito um pouco "over" de ser.

"Trapaça" tem a sagacidade de enganar a audiência ao se apresentar como algo mais complexo do que realmente é. Russell foi muito feliz em "sugerir" muito mais do que "mostrar", nos provocando o julgamento a cada novo movimento - mas tudo isso de uma forma tão orgânica e fácil, que nem nos damos conta quando o filme termina. A história não precisa empolgar, não é esse o objetivo, são os personagens e como eles se relacionam que realmente importa - é na profundidade de algo aparentemente superficial que a magia realmente acontece. Uma aula!

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Esse é mais um título que me fez perguntar: "Onde eu estava que não assisti esse filme antes?". "Trapaça" é uma produção de 2013 que foi indicada, pasmem, em dez categorias no Oscar - e com muito mérito, eu completo. Em uma época onde streaming era uma palavra que nem no dicionário estava, o filme simplesmente passou batido por mim e tenho a impressão de que por muita gente - o que é um pecado, pois ele é excelente, com uma narrativa dinâmica, muito bem dirigido e com performances de cair o queixo de um elenco que conta "só" com Christian Bale, Amy Adams, Bradley Cooper e Jennifer Lawrence (todos indicados ao Oscar, inclusive).

Incrivelmente baseado em um fato real, o filme conta a história de Irving Rosenfeld (Bale), um grande trapaceiro que tem como sócia e amante Sydney Prosser (Adams). Depois de serem surpreendidos e pegos por uma ação do FBI, os dois são forçados a colaborar com o agente Richie DiMaso (Cooper), que infiltra Rosenfeld no mundo da máfia ao mesmo tempo em que tenta conseguir provas do envolvimento político do mais alto escalão do país, em corrupção através do candidato Carmine Polito (Jeremy Renner). Os planos parecem dar certo, até a esposa de Irving, Rosalyn (Lawrence), aparecer e mudar completamente as regras do jogo. Confira o trailer:

Dirigido pelo sempre competente e muito talentoso (cinco vezes indicado ao Oscar), David Owen Russell de "Joy", "Trapaça" é meio que uma mistura de Guy Ritchie com Adam McKay, não visualmente (marca registrada dos dois diretores), mas na dinâmica narrativa, na escolha do tom e na ironia que cada linha de diálogo representa para a história que, a todo momento, soa tão absurda que parece mentira. Russell e seus montadores (Jay Cassidy, Crispin Struthers, Alan Baumgarten) constroem uma linha temporal muito interessante, narrada por diversos pontos de vista, com diferentes personagens, mas sempre mantendo a uma coerência cinematográfica que impressiona pela didática sem ser expositiva. Veja, quando vemos um verdadeiro "Zé Ninguém", careca, barrigudo, brega e, aparentemente, pacato, se transformar em Irving Rosenfeld; temos a certeza que a história vai nos levar para um lugar que nem podemos imaginar.

Escrito pelo próprio Russell ao lado de Eric Warren Singer (de "Top Gun: Maverick"), o filme vai nos surpreendendo a cada movimento dos personagens - como a trapaça está no centro da discussão, é impossível cravar o que de fato é sincero durante toda a jornada. O interessante é que todos os personagens parecem saber disso, e mesmo apoiados em alguns esteriótipos (propositais) e ações normalmente exageradas, toda essa desconfiança funciona como motivação e quando menos esperamos, algo quebra essa cadeia e somos surpreendidos. Talvez a personagem de Lawrence, a Rosalyn Rosenfeld, seja a personificação desse mood  (ela está incrível) ou até mesmo as maravilhosas conversas entre os personagens de Cooper e Louis C.K. (o Stoddard Thorsen) nos escritórios do FBI dos anos 70 sintetizem bem esse conceito um pouco "over" de ser.

"Trapaça" tem a sagacidade de enganar a audiência ao se apresentar como algo mais complexo do que realmente é. Russell foi muito feliz em "sugerir" muito mais do que "mostrar", nos provocando o julgamento a cada novo movimento - mas tudo isso de uma forma tão orgânica e fácil, que nem nos damos conta quando o filme termina. A história não precisa empolgar, não é esse o objetivo, são os personagens e como eles se relacionam que realmente importa - é na profundidade de algo aparentemente superficial que a magia realmente acontece. Uma aula!

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Tudo o que Respira

É possível encontrar alguma beleza no meio do caos, da poluição e do descaso perante a natureza e ainda assim perceber que existe um fio de esperança? É justamente essa pergunta que diretor indiano, Shaunak Sen (de "Cities of Sleep") pretende responder com o seu nomeado ao Oscar de "Melhor Documentário" e multi-premiado (foram mais de 20 prêmios em festivais pelo mundo inteiro), "Tudo o que Respira". No entanto é preciso que se diga, embora chancelado pelo "Grand Jury Prize" em Sundance e pelo "Golden Eye" em Cannes, ambos em 2022, esse longa-metragem deve dividir opiniões por dois motivos: primeiro por ter um roteiro que fragmenta a jornada de uma forma pouco usual (quase sempre sem maiores explicações) e segundo pela narrativa mais cadenciada que tenta equilibrar lindas imagens com a triste realidade que é viver em uma Nova Deli nada glamourosa.

O filme segue três jovens (Saud, Salik e Nadeem) que dirigem um hospital de aves dedicado ao resgate de "milhafres pretos" feridos em Nova Deli, uma das cidades mais populosas do mundo, na Índia. À medida que a toxicidade ambiental e a agitação civil aumentam, a relação entre o ser humano e algumas espécies negligenciadas formam uma espécie de crônica poética da ecologia em colapso e aprofunda debates que expõem o tamanho da falha social que conduz a evolução. Confira o trailer:

milhafre-preto é uma espécie de ave carnívora que se alimenta de ratos e outros animais que são facilmente encontrados em locais onde existe um volume considerável de lixo. Acontece que a mesma poluição que alimenta, também mata - inclusive, existem partículas cancerígenas em níveis tão absurdos no ar de determinados locais de Nova Deli que fazem com que as aves simplesmente caiam do céu. Contextualizado o absurdo desse cenário apocalíptico, o roteiro se esforça para equilibrar as nuances de uma vida caótica controlada pelo ser humano (que não por acaso sofre com suas próprias diferenças - e isso é brilhantemente retratado em vários níveis dentro da história: das escolhas pessoais de Nadeem às ondas de protestos religiosos extremamente violentos nas ruas da capital da Índia) e de uma natureza que segue se adaptando e improvisando (onde os pássaros passaram, vejam só, a utilizar as bitucas de cigarro encontradas nos lixões para espantar parasitas).

Obviamente que a descrição até aqui retratada pode soar indigesta, e de fato a sensação de repulsa é enorme, porém Shaunak Sen ao lado dos fotógrafos Ben Bernhard, Riju Das e Saumyananda Sahi, aproveitam desse cenário para extrair o máximo de beleza possível - os planos, muitos deles sensíveis em bem executas panorâmicas, dão a exata noção do tamanho do problema. Não raramente Sen traz para o primeiro plano uma infinidade de ratos se alimentando de lixo, larvas se chacoalhando num tanque de água parada ou ainda o céu coberto por aves sobrevoando as ruas imundas ou os lixões abertos - reparem em como o diretor usa do desenho de som (quase insuportável) para provocar uma experiência imersiva tão impressionante quanto angustiante.

Mas nem só de "dor" vive "Tudo o que Respira", existe o "amor" e a maneira como o diretor retrata a jornada dos irmãos Mohammade constrói sua narrativa para que a audiência entenda as dificuldades, os medos, os anseios e as frustrações de cada um deles,  é simplesmente genial - veja, o filme não se preocupa em se aprofundar ou entregar todas as informações, mas o que importa está sempre ali na tela, mesmo que exija uma certa interpretação como quando o silêncio, entre um assunto e outro, diz mais que qualquer diálogo. 

Vale muito o seu play, desde que você esteja disposto a sair de uma bolha para encarar essa dura (e não tão distante assim) realidade!

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É possível encontrar alguma beleza no meio do caos, da poluição e do descaso perante a natureza e ainda assim perceber que existe um fio de esperança? É justamente essa pergunta que diretor indiano, Shaunak Sen (de "Cities of Sleep") pretende responder com o seu nomeado ao Oscar de "Melhor Documentário" e multi-premiado (foram mais de 20 prêmios em festivais pelo mundo inteiro), "Tudo o que Respira". No entanto é preciso que se diga, embora chancelado pelo "Grand Jury Prize" em Sundance e pelo "Golden Eye" em Cannes, ambos em 2022, esse longa-metragem deve dividir opiniões por dois motivos: primeiro por ter um roteiro que fragmenta a jornada de uma forma pouco usual (quase sempre sem maiores explicações) e segundo pela narrativa mais cadenciada que tenta equilibrar lindas imagens com a triste realidade que é viver em uma Nova Deli nada glamourosa.

O filme segue três jovens (Saud, Salik e Nadeem) que dirigem um hospital de aves dedicado ao resgate de "milhafres pretos" feridos em Nova Deli, uma das cidades mais populosas do mundo, na Índia. À medida que a toxicidade ambiental e a agitação civil aumentam, a relação entre o ser humano e algumas espécies negligenciadas formam uma espécie de crônica poética da ecologia em colapso e aprofunda debates que expõem o tamanho da falha social que conduz a evolução. Confira o trailer:

milhafre-preto é uma espécie de ave carnívora que se alimenta de ratos e outros animais que são facilmente encontrados em locais onde existe um volume considerável de lixo. Acontece que a mesma poluição que alimenta, também mata - inclusive, existem partículas cancerígenas em níveis tão absurdos no ar de determinados locais de Nova Deli que fazem com que as aves simplesmente caiam do céu. Contextualizado o absurdo desse cenário apocalíptico, o roteiro se esforça para equilibrar as nuances de uma vida caótica controlada pelo ser humano (que não por acaso sofre com suas próprias diferenças - e isso é brilhantemente retratado em vários níveis dentro da história: das escolhas pessoais de Nadeem às ondas de protestos religiosos extremamente violentos nas ruas da capital da Índia) e de uma natureza que segue se adaptando e improvisando (onde os pássaros passaram, vejam só, a utilizar as bitucas de cigarro encontradas nos lixões para espantar parasitas).

Obviamente que a descrição até aqui retratada pode soar indigesta, e de fato a sensação de repulsa é enorme, porém Shaunak Sen ao lado dos fotógrafos Ben Bernhard, Riju Das e Saumyananda Sahi, aproveitam desse cenário para extrair o máximo de beleza possível - os planos, muitos deles sensíveis em bem executas panorâmicas, dão a exata noção do tamanho do problema. Não raramente Sen traz para o primeiro plano uma infinidade de ratos se alimentando de lixo, larvas se chacoalhando num tanque de água parada ou ainda o céu coberto por aves sobrevoando as ruas imundas ou os lixões abertos - reparem em como o diretor usa do desenho de som (quase insuportável) para provocar uma experiência imersiva tão impressionante quanto angustiante.

Mas nem só de "dor" vive "Tudo o que Respira", existe o "amor" e a maneira como o diretor retrata a jornada dos irmãos Mohammade constrói sua narrativa para que a audiência entenda as dificuldades, os medos, os anseios e as frustrações de cada um deles,  é simplesmente genial - veja, o filme não se preocupa em se aprofundar ou entregar todas as informações, mas o que importa está sempre ali na tela, mesmo que exija uma certa interpretação como quando o silêncio, entre um assunto e outro, diz mais que qualquer diálogo. 

Vale muito o seu play, desde que você esteja disposto a sair de uma bolha para encarar essa dura (e não tão distante assim) realidade!

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Tully

Talvez uma das experiências mais marcantes e sensacionais na vida de uma uma mulher (e de um homem) seja se tornar mãe (e pai) - a grande questão é que essa jornada não tem nada de romântica e é justamente isso que "Tully", com muita sensibilidade e uma boa dose de verdade, discute!

Marlo (Charlize Theron) é uma mãe de três filhos – um deles recém-nascido – que vive uma vida muito atarefada e exaustiva. Certo dia, seu irmão oferece para ela, como presente, a ajuda de uma babá para cuidar das crianças durante o período da noite, Tully (Mackenzie Davis). Mesmo hesitante, ela acaba se surpreendendo com a jovem e criando um laço emocional capaz de mudar sua vida. Confira o trailer:

Se em "Namorados Para Sempre"(“Blue Valentine”), o diretor Derek Cianfrance expõe as incertezas e inseguranças de um jovem casal que passa por uma profunda crise em seu casamento, "Tully" transporta essa dura realidade para a maternidade. Talvez o filme dirigido pelo sempre excelente Jason Reitman em mais uma parceria com a roteirista Diablo Cody (os mesmos de "Juno" e "Jovens Adultos") suavize na "forma", mas sem dúvida alguma continua respeitando a força e o impacto do "conteúdo". Veja, se em "Juno" a dupla discutiu a gravidez na adolescência e as implicações de uma adoção, agora eles retratam os meses seguintes ao nascimento de um terceiro filho e o que isso representa para uma mulher na casa dos 30 anos - sem esconder nenhum detalhe, aliás.

Alguns pontos chamam muito atenção em "Tully": o primeiro é que o filme é muito bem dirigido - ratificando o talento de Reitman no trabalho com os atores. A química entre Charlize Theron e Mackenzie Davis impressiona. O subtexto é tão bem trabalhado que somos capazes de imaginar exatamente o que as personagens estão vivendo internamente e como isso está refletindo na relação entre elas. É isso que nos leva ao segundo destaque: Charlize Theron está fantástica como Marlo - uma atriz belíssima (e aqui falo do seu talento e da sua beleza física) que já provou ser capaz de se desconstruir em pró da composição dramática de suas personagens, mais uma vez dá uma aula com sua performance. E por, fim, não menos importante, é o roteiro Cody: os diálogos são tão afiados, irônicos e incrivelmente sensíveis que é impossível qualquer mulher (mãe) não se conectar com a história - para os homens, pais, que muitas vezes são incapazes de ler com exatidão o que acontece com uma mulher após o nascimento de um filho, também vale o comentário.

"Tully" é um filme com alma, tecnicamente representada por uma edição capaz de potencializar e dar o tom exato de um excelente roteiro e uma direção muito competente. Lembrando que estamos falando das imperfeições da maternidade, que quebram velhas concepções de como uma família deve funcionar e que metaforicamente expõe as dores íntimas das mulheres com muita inteligência, sem a necessidade de uma exposição exagerada e muito menos de entregar todas as respostas - afinal, cada um é cada um!

Val muito o seu play!

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Talvez uma das experiências mais marcantes e sensacionais na vida de uma uma mulher (e de um homem) seja se tornar mãe (e pai) - a grande questão é que essa jornada não tem nada de romântica e é justamente isso que "Tully", com muita sensibilidade e uma boa dose de verdade, discute!

Marlo (Charlize Theron) é uma mãe de três filhos – um deles recém-nascido – que vive uma vida muito atarefada e exaustiva. Certo dia, seu irmão oferece para ela, como presente, a ajuda de uma babá para cuidar das crianças durante o período da noite, Tully (Mackenzie Davis). Mesmo hesitante, ela acaba se surpreendendo com a jovem e criando um laço emocional capaz de mudar sua vida. Confira o trailer:

Se em "Namorados Para Sempre"(“Blue Valentine”), o diretor Derek Cianfrance expõe as incertezas e inseguranças de um jovem casal que passa por uma profunda crise em seu casamento, "Tully" transporta essa dura realidade para a maternidade. Talvez o filme dirigido pelo sempre excelente Jason Reitman em mais uma parceria com a roteirista Diablo Cody (os mesmos de "Juno" e "Jovens Adultos") suavize na "forma", mas sem dúvida alguma continua respeitando a força e o impacto do "conteúdo". Veja, se em "Juno" a dupla discutiu a gravidez na adolescência e as implicações de uma adoção, agora eles retratam os meses seguintes ao nascimento de um terceiro filho e o que isso representa para uma mulher na casa dos 30 anos - sem esconder nenhum detalhe, aliás.

Alguns pontos chamam muito atenção em "Tully": o primeiro é que o filme é muito bem dirigido - ratificando o talento de Reitman no trabalho com os atores. A química entre Charlize Theron e Mackenzie Davis impressiona. O subtexto é tão bem trabalhado que somos capazes de imaginar exatamente o que as personagens estão vivendo internamente e como isso está refletindo na relação entre elas. É isso que nos leva ao segundo destaque: Charlize Theron está fantástica como Marlo - uma atriz belíssima (e aqui falo do seu talento e da sua beleza física) que já provou ser capaz de se desconstruir em pró da composição dramática de suas personagens, mais uma vez dá uma aula com sua performance. E por, fim, não menos importante, é o roteiro Cody: os diálogos são tão afiados, irônicos e incrivelmente sensíveis que é impossível qualquer mulher (mãe) não se conectar com a história - para os homens, pais, que muitas vezes são incapazes de ler com exatidão o que acontece com uma mulher após o nascimento de um filho, também vale o comentário.

"Tully" é um filme com alma, tecnicamente representada por uma edição capaz de potencializar e dar o tom exato de um excelente roteiro e uma direção muito competente. Lembrando que estamos falando das imperfeições da maternidade, que quebram velhas concepções de como uma família deve funcionar e que metaforicamente expõe as dores íntimas das mulheres com muita inteligência, sem a necessidade de uma exposição exagerada e muito menos de entregar todas as respostas - afinal, cada um é cada um!

Val muito o seu play!

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Uma Bela Manhã

Um filme sobre a vida como ela é - linda, mas cheia de pancadas!

Talvez não tenha maneira mais direta de definir "Uma Bela Manhã", filme dirigido por uma das mais respeitadas cineastas francesas em atividade, Mia Hansen-Løve (de "O Que Está Por Vir"). Seguindo muito seu conceito cinematográfico de retratar a vida cotidiana e suas relações mais particulares, Mia, mais uma vez, lança um olhar dos mais interessantes sobre seus personagens ao mesmo tempo em que se revela disposta a confrontá-los com situações complexas, mas de fácil identificação. Veja, se você está a procura do embate natural das relações ou uma história que segue aquela estrutura mais tradicional, certamente esse filme não é para você. Por outro lado, se estiver disposto a mergulhar em uma narrativa profundamente intima, de uma personagem que tenta encontrar a alegria nas pequenas coisas e na esperança de que tudo vai se encaixar em algum momento, mesmo que para isso tenha que lidar com os tombos da vida e com o tempo que faz questão de mostrar a sua crueldade, você está no lugar certo - mas não será uma jornada fácil (e dependendo do momento em que está passando, será uma jornada dificílima)!

Sandra (Léa Seydoux) é uma jovem viúva que trabalha como tradutora e que cria sozinha sua filha de 8 anos, tendo que lidar com os desafios da maternidade ao mesmo tempo em que cuida de seu pai, Georg Kinsler (Pascal Greggory), um professor de Filosofia aposentado e que já não pode mais se esquivar de uma morte lenta diante de uma doença degenerativa. Enquanto ela embarca com sua família por obstáculos em hospitais e lares de idosos para instalar Georg em um lugar seguro, Sandra se envolve com Clément (Melvil Poupaud), um homem casado e amigo do seu falecido marido. Confira o trailer:

É impossível não olhar para "Un Beau Matin" (no original) e não ficar absolutamente boquiaberto com a performance de Léa Seydoux (de "Azul é a Cor Mais Quente"). Dentro daquela atmosfera tão deprimente quanto humana, Seydoux entrega no olhar, a sua dor - e saiba que o "deprimente" que cito não se vale do estereótipo ou do convencional, mas sim da sensibilidade de entender que longe da fantasia, existe uma batalha diária para lidar com sua própria cruz. E aqui, também é preciso que se diga, o roteiro da própria Mia enaltece essa perspectiva mais introspectiva em um confronto quase visceral entre o que se sente e o que se mostra! É impressionante como essa dualidade alcança tons tão marcantes na maneira como experienciamos o filme - é de sentir uma dor no peito, pelo outro, ou por nós mesmos.

A diretora sabe do tamanho de sua responsabilidade ao basear uma história de quase duas horas apenas na psicologia de seus personagens. Reparem como até mesmo um pedido aparentemente simples de uma ex-aluna de seu pai como “você poderia me passar o e-mail dele?”,  é capaz de levar Sandra às lágrimas. Sim, é um pedido cotidiano, mas o impacto do "comum" é o que move Mia na exploração magistral da condição humana como ninguém. Ela usa gatilhos narrativos perfeitos para discutir a complexidade dos relacionamentos (a dúvida natural de Clément sobre seu casamento, é um ótimo ponto) e das mudanças ao longo do tempo (a relação com sua mãe e sua irmã, e depois com seu pai, exemplificam bem essa provocação).  

A direção de arte de Mila Preli (de "História de um Olhar") é fantástica - reparem como os cenários ajudam a construir a personalidade dos personagens. Já a fotografia do Denis Lenoir (de "Irma Vep") ao mesmo tempo que cria um ambiente sutil e palpável, carrega uma densidade impressionante. O fato é que tecnicamente o filme é tão bom quanto artisticamente, mesmo com seu ar mais independente.  "Uma Bela Manhã" tem mesmo esse olhar sensível sobre a vida, sobre o tempo e sobre os relacionamentos amorosos e familiares, oferecendo uma experiência que certamente irá ressoar muito depois dos créditos finais - principalmente se você for uma pessoa que sofre, que luta, que chora e que se recompõe, que é forte quando necessário, mas frágil quando lhe permitem.

Filmaço!

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Um filme sobre a vida como ela é - linda, mas cheia de pancadas!

Talvez não tenha maneira mais direta de definir "Uma Bela Manhã", filme dirigido por uma das mais respeitadas cineastas francesas em atividade, Mia Hansen-Løve (de "O Que Está Por Vir"). Seguindo muito seu conceito cinematográfico de retratar a vida cotidiana e suas relações mais particulares, Mia, mais uma vez, lança um olhar dos mais interessantes sobre seus personagens ao mesmo tempo em que se revela disposta a confrontá-los com situações complexas, mas de fácil identificação. Veja, se você está a procura do embate natural das relações ou uma história que segue aquela estrutura mais tradicional, certamente esse filme não é para você. Por outro lado, se estiver disposto a mergulhar em uma narrativa profundamente intima, de uma personagem que tenta encontrar a alegria nas pequenas coisas e na esperança de que tudo vai se encaixar em algum momento, mesmo que para isso tenha que lidar com os tombos da vida e com o tempo que faz questão de mostrar a sua crueldade, você está no lugar certo - mas não será uma jornada fácil (e dependendo do momento em que está passando, será uma jornada dificílima)!

Sandra (Léa Seydoux) é uma jovem viúva que trabalha como tradutora e que cria sozinha sua filha de 8 anos, tendo que lidar com os desafios da maternidade ao mesmo tempo em que cuida de seu pai, Georg Kinsler (Pascal Greggory), um professor de Filosofia aposentado e que já não pode mais se esquivar de uma morte lenta diante de uma doença degenerativa. Enquanto ela embarca com sua família por obstáculos em hospitais e lares de idosos para instalar Georg em um lugar seguro, Sandra se envolve com Clément (Melvil Poupaud), um homem casado e amigo do seu falecido marido. Confira o trailer:

É impossível não olhar para "Un Beau Matin" (no original) e não ficar absolutamente boquiaberto com a performance de Léa Seydoux (de "Azul é a Cor Mais Quente"). Dentro daquela atmosfera tão deprimente quanto humana, Seydoux entrega no olhar, a sua dor - e saiba que o "deprimente" que cito não se vale do estereótipo ou do convencional, mas sim da sensibilidade de entender que longe da fantasia, existe uma batalha diária para lidar com sua própria cruz. E aqui, também é preciso que se diga, o roteiro da própria Mia enaltece essa perspectiva mais introspectiva em um confronto quase visceral entre o que se sente e o que se mostra! É impressionante como essa dualidade alcança tons tão marcantes na maneira como experienciamos o filme - é de sentir uma dor no peito, pelo outro, ou por nós mesmos.

A diretora sabe do tamanho de sua responsabilidade ao basear uma história de quase duas horas apenas na psicologia de seus personagens. Reparem como até mesmo um pedido aparentemente simples de uma ex-aluna de seu pai como “você poderia me passar o e-mail dele?”,  é capaz de levar Sandra às lágrimas. Sim, é um pedido cotidiano, mas o impacto do "comum" é o que move Mia na exploração magistral da condição humana como ninguém. Ela usa gatilhos narrativos perfeitos para discutir a complexidade dos relacionamentos (a dúvida natural de Clément sobre seu casamento, é um ótimo ponto) e das mudanças ao longo do tempo (a relação com sua mãe e sua irmã, e depois com seu pai, exemplificam bem essa provocação).  

A direção de arte de Mila Preli (de "História de um Olhar") é fantástica - reparem como os cenários ajudam a construir a personalidade dos personagens. Já a fotografia do Denis Lenoir (de "Irma Vep") ao mesmo tempo que cria um ambiente sutil e palpável, carrega uma densidade impressionante. O fato é que tecnicamente o filme é tão bom quanto artisticamente, mesmo com seu ar mais independente.  "Uma Bela Manhã" tem mesmo esse olhar sensível sobre a vida, sobre o tempo e sobre os relacionamentos amorosos e familiares, oferecendo uma experiência que certamente irá ressoar muito depois dos créditos finais - principalmente se você for uma pessoa que sofre, que luta, que chora e que se recompõe, que é forte quando necessário, mas frágil quando lhe permitem.

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Verdades Dolorosas

Antes de iniciar esse review, uma pergunta: você mentiria para seu companheiro com o intuito de não desmotivá-lo perante uma jornada? Pois bem, é na tentativa de responder essa pergunta capciosa que a diretora e roteirista Nicole Holofcener (dos excelentes "Mrs. Fletcher" e "Togetherness") constrói um retrato ácido e comovente sobre as relações e as complexidades do casamento pela perspectiva da insegurança e da busca pela validação mesmo depois de uma certa idade. "Verdades Dolorosas" é um filme leve, divertido, mas muito realista - tão realista que não serão poucas as vezes que você vai se pegar rindo de si mesma ao se ver retratada na tela. Mas fica um aviso: ao melhor estilo Woody Allen, o filme ambientado em Nova York é quase uma crônica sobre as neuroses e os dilemas da classe média alta que, mais do que nos divertir, nos convida para ótimas reflexões, ou seja, é preciso gostar desse estilo narrativo onde o charme da história está naquilo com que nos identificamos, não necessariamente naquilo que estamos assistindo.

Protagonizado pela icônica Julia Louis-Dreyfus (de "Veep") e pelo versátil Tobias Menzies (de "The Crown" e "Game of Thrones"), "You Hurt My Feelings" (no original) acompanha a jornada de Beth, uma romancista de sucesso, e Don, seu marido, em uma vida aparentemente perfeita, mas que começa a ruir quando ela acidentalmente ouve ele criticando seu novo livro de forma brutal e honesta, mesmo dizendo repetidamente para ela que havia gostado! Confira o trailer:

A partir de um evento aparentemente banal, "Verdades Dolorosas" tece uma narrativa rica em nuances, explorando os meandros da comunicação, a fragilidade do ego e os questionamentos que surgem quando a verdade nua e crua é exposta. Como já havia provado em seus outros trabalhos, Holofcener demonstra maestria na construção de personagens para esse tipo de embate, explorando camadas e ambiguidades que os tornam extremamente humanos e cativantes - daí a facilidade de identificação com as dores e frustrações de cada um deles.  

Obviamente que a química entre Louis-Dreyfus e Menzies ajuda muito nessa entrega - a relação de seus personagens é tão palpável quanto suas performances, transbordando sensações e sentimentos repletos de emoção. Veja, o trabalho de Holofcener como diretora (essencialmente de atores) permite que eles transitem com a mesma competência entre a comédia sutil até o drama mais intimista onde percebemos uma real e profunda dor, só que sem pesar muito na mão. Existe uma precisão e uma sensibilidade que somados ao trabalho magistral do fotógrafo Jeffrey Waldron (de "The Morning Show") elevam a qualidade da narrativa colocando-a em outro patamar - o que eu quero dizer é que, por mais que possa parecer bobinha em um primeiro olhar, "Verdades Dolorosas" vai te tocar. Waldron usa uma câmera mais fixa e lentes mais fechadas para criar uma atmosfera intimista e claustrofóbica que reflete o estado emocional dos personagens, enquanto seus planos mais abertos passeiam por uma charmosa e apaixonante Nova York. A trilha sonora mais minimalista, composta por Michael Andrews, sem dúvida, complementa essa atmosfera com notas melancólicas e introspectivas, ao mesmo tempo otimistas e emotivas.

O fato é que "Verdades Dolorosas" não se limita a ser apenas um filme sobre um casamento em crise. Aqui temos uma reflexão profunda (e divertida) sobre a natureza das relações verdadeiramente sinceras, senão pelas palavras, pelo receio de magoar quem realmente amamos. Discussões sobre a busca pela aprovação do outro e a importância de uma comunicação honesta em qualquer relacionamento estão ali, mas acredite: a beleza desse filme está no entendimento de que a última coisa que queremos é magoar aqueles que escolhemos para dividir essa jornada complicada chamada vida!

Vale seu play!

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Antes de iniciar esse review, uma pergunta: você mentiria para seu companheiro com o intuito de não desmotivá-lo perante uma jornada? Pois bem, é na tentativa de responder essa pergunta capciosa que a diretora e roteirista Nicole Holofcener (dos excelentes "Mrs. Fletcher" e "Togetherness") constrói um retrato ácido e comovente sobre as relações e as complexidades do casamento pela perspectiva da insegurança e da busca pela validação mesmo depois de uma certa idade. "Verdades Dolorosas" é um filme leve, divertido, mas muito realista - tão realista que não serão poucas as vezes que você vai se pegar rindo de si mesma ao se ver retratada na tela. Mas fica um aviso: ao melhor estilo Woody Allen, o filme ambientado em Nova York é quase uma crônica sobre as neuroses e os dilemas da classe média alta que, mais do que nos divertir, nos convida para ótimas reflexões, ou seja, é preciso gostar desse estilo narrativo onde o charme da história está naquilo com que nos identificamos, não necessariamente naquilo que estamos assistindo.

Protagonizado pela icônica Julia Louis-Dreyfus (de "Veep") e pelo versátil Tobias Menzies (de "The Crown" e "Game of Thrones"), "You Hurt My Feelings" (no original) acompanha a jornada de Beth, uma romancista de sucesso, e Don, seu marido, em uma vida aparentemente perfeita, mas que começa a ruir quando ela acidentalmente ouve ele criticando seu novo livro de forma brutal e honesta, mesmo dizendo repetidamente para ela que havia gostado! Confira o trailer:

A partir de um evento aparentemente banal, "Verdades Dolorosas" tece uma narrativa rica em nuances, explorando os meandros da comunicação, a fragilidade do ego e os questionamentos que surgem quando a verdade nua e crua é exposta. Como já havia provado em seus outros trabalhos, Holofcener demonstra maestria na construção de personagens para esse tipo de embate, explorando camadas e ambiguidades que os tornam extremamente humanos e cativantes - daí a facilidade de identificação com as dores e frustrações de cada um deles.  

Obviamente que a química entre Louis-Dreyfus e Menzies ajuda muito nessa entrega - a relação de seus personagens é tão palpável quanto suas performances, transbordando sensações e sentimentos repletos de emoção. Veja, o trabalho de Holofcener como diretora (essencialmente de atores) permite que eles transitem com a mesma competência entre a comédia sutil até o drama mais intimista onde percebemos uma real e profunda dor, só que sem pesar muito na mão. Existe uma precisão e uma sensibilidade que somados ao trabalho magistral do fotógrafo Jeffrey Waldron (de "The Morning Show") elevam a qualidade da narrativa colocando-a em outro patamar - o que eu quero dizer é que, por mais que possa parecer bobinha em um primeiro olhar, "Verdades Dolorosas" vai te tocar. Waldron usa uma câmera mais fixa e lentes mais fechadas para criar uma atmosfera intimista e claustrofóbica que reflete o estado emocional dos personagens, enquanto seus planos mais abertos passeiam por uma charmosa e apaixonante Nova York. A trilha sonora mais minimalista, composta por Michael Andrews, sem dúvida, complementa essa atmosfera com notas melancólicas e introspectivas, ao mesmo tempo otimistas e emotivas.

O fato é que "Verdades Dolorosas" não se limita a ser apenas um filme sobre um casamento em crise. Aqui temos uma reflexão profunda (e divertida) sobre a natureza das relações verdadeiramente sinceras, senão pelas palavras, pelo receio de magoar quem realmente amamos. Discussões sobre a busca pela aprovação do outro e a importância de uma comunicação honesta em qualquer relacionamento estão ali, mas acredite: a beleza desse filme está no entendimento de que a última coisa que queremos é magoar aqueles que escolhemos para dividir essa jornada complicada chamada vida!

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Vidas à Deriva

Você vai se surpreender - principalmente se você gosta de filmes angustiantes, baseado em fatos reais, como "127 Horas", por exemplo. Aliás, "Vidas à Deriva" é sim mais "um filme de ator" e admito: fiquei muito impressionado com a performance de Shailene Woodley (de "Big Little Lies") - praticamente sozinha, como James Franco (diga-se de passagem), ela é capaz de nos conectar com aquele pesadelo de uma forma muito particular, homeopática até, se aproveitando muito bem do "tempo de tela" para potencializar o valor do silêncio, da solidão, da reflexão e da angustia, que nos provoca, nos tira da zona de conforto e, finalmente, nos emociona! 

Apaixonados, os noivos Tami Oldham (Shailene Woodley) e Richard Sharp (Sam Claflin) velejam em mar aberto quando são atingidos por uma terrível tempestade. Passada a tormenta, ela se vê completamente perdida na embarcação em ruínas e tenta encontrar uma maneira de salvar a própria vida e a do parceiro bastante machucado. Confira o trailer:

Dirigido pelo talentoso cineasta islandês Baltasar Kormákur (de "A Fera") e escrito pelo trio Aaron Kandell, Jordan Kandell (ambos de "Moana") e David Branson Smith (de "UnReal"), "Vidas à Deriva" funciona basicamente como dois filmes em um - o primeiro é pautado no relacionamento de Oldham e Sharp; e o segundo na luta pela sobrevivência durante a deriva. Naturalmente, contada a partir de flashbacks, a versão romântica da história, de fato, não soa como das mais atraentes - tudo acontece tão rápido que mesmo com cenas belíssimas, muito bem fotografadas pelo craque Robert Richardson (vencedor de 3 Oscars, o último por "Hugo"), fica difícil se envolver ou se identificar com aquela dinâmica entre os personagens (soa adolescente demais). Já o lado mais dramático do filme, esse sim funciona perfeitamente, algo como "Mar Aberto" - e aqui cabe um comentário: durante esse plot, não existe muita ação ou cortes mais acelerados para criar tensão; a própria situação já nos provoca inúmeras sensações que acabam colocando nossa experiência em outro patamar. Funciona e bem!

É claro que a escolha conceitual de misturar esses dois plots tão diferentes em uma montagem que vai e volta na linha temporal sem deixar muito espaço para nos localizarmos ou nos conectarmos com os personagens, cria um fluxo narrativo frágil, mas tambémnão deixa de ser interessante, só que prejudica uma imersão mais profunda e em determinadas passagens faz falta essa relação de empatia - principalmente no primeiro e segundo atos. Sinceramente isso não me atrapalhou, pois eu achei que os saltos aconteceram de forma bem orgânica e consciente - lembra um pouco "Lost" nesse sentido; mas imagino que isso pode incomodar parte da audiência.

A jornada contada pelos olhos de Tami contém desespero (reparem na cena em que ela nota um navio cargueiro vindo ao seu encontro) e também alívio (igualmente ótima a cena em que a ela comemora a chegada da chuva, nua, sobre a proa do barco), e é essa dicotomia que dá o tom de "Vidas à Deriva" - essa complexidade da personagem X o drama que ela esta vivendo, faz valer a jornada da mesma forma que nos faz esquecer o lado "love is in the air" do roteiro; porém, é inegável que o ponto de virada do terceiro ato e o que se segue, ajuda demais na conclusão emocionante e (aí sim) coerente dessa história de amor em meio ao caos!

Vale muito o seu play!

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Você vai se surpreender - principalmente se você gosta de filmes angustiantes, baseado em fatos reais, como "127 Horas", por exemplo. Aliás, "Vidas à Deriva" é sim mais "um filme de ator" e admito: fiquei muito impressionado com a performance de Shailene Woodley (de "Big Little Lies") - praticamente sozinha, como James Franco (diga-se de passagem), ela é capaz de nos conectar com aquele pesadelo de uma forma muito particular, homeopática até, se aproveitando muito bem do "tempo de tela" para potencializar o valor do silêncio, da solidão, da reflexão e da angustia, que nos provoca, nos tira da zona de conforto e, finalmente, nos emociona! 

Apaixonados, os noivos Tami Oldham (Shailene Woodley) e Richard Sharp (Sam Claflin) velejam em mar aberto quando são atingidos por uma terrível tempestade. Passada a tormenta, ela se vê completamente perdida na embarcação em ruínas e tenta encontrar uma maneira de salvar a própria vida e a do parceiro bastante machucado. Confira o trailer:

Dirigido pelo talentoso cineasta islandês Baltasar Kormákur (de "A Fera") e escrito pelo trio Aaron Kandell, Jordan Kandell (ambos de "Moana") e David Branson Smith (de "UnReal"), "Vidas à Deriva" funciona basicamente como dois filmes em um - o primeiro é pautado no relacionamento de Oldham e Sharp; e o segundo na luta pela sobrevivência durante a deriva. Naturalmente, contada a partir de flashbacks, a versão romântica da história, de fato, não soa como das mais atraentes - tudo acontece tão rápido que mesmo com cenas belíssimas, muito bem fotografadas pelo craque Robert Richardson (vencedor de 3 Oscars, o último por "Hugo"), fica difícil se envolver ou se identificar com aquela dinâmica entre os personagens (soa adolescente demais). Já o lado mais dramático do filme, esse sim funciona perfeitamente, algo como "Mar Aberto" - e aqui cabe um comentário: durante esse plot, não existe muita ação ou cortes mais acelerados para criar tensão; a própria situação já nos provoca inúmeras sensações que acabam colocando nossa experiência em outro patamar. Funciona e bem!

É claro que a escolha conceitual de misturar esses dois plots tão diferentes em uma montagem que vai e volta na linha temporal sem deixar muito espaço para nos localizarmos ou nos conectarmos com os personagens, cria um fluxo narrativo frágil, mas tambémnão deixa de ser interessante, só que prejudica uma imersão mais profunda e em determinadas passagens faz falta essa relação de empatia - principalmente no primeiro e segundo atos. Sinceramente isso não me atrapalhou, pois eu achei que os saltos aconteceram de forma bem orgânica e consciente - lembra um pouco "Lost" nesse sentido; mas imagino que isso pode incomodar parte da audiência.

A jornada contada pelos olhos de Tami contém desespero (reparem na cena em que ela nota um navio cargueiro vindo ao seu encontro) e também alívio (igualmente ótima a cena em que a ela comemora a chegada da chuva, nua, sobre a proa do barco), e é essa dicotomia que dá o tom de "Vidas à Deriva" - essa complexidade da personagem X o drama que ela esta vivendo, faz valer a jornada da mesma forma que nos faz esquecer o lado "love is in the air" do roteiro; porém, é inegável que o ponto de virada do terceiro ato e o que se segue, ajuda demais na conclusão emocionante e (aí sim) coerente dessa história de amor em meio ao caos!

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Virada no Jogo

O cenário político sempre foi terreno fértil para histórias fascinantes, e o filme "Virada no Jogo" não foge à regra - eu diria que é uma espécie de "House of Cards" da vida real. Essa é um história que provavelmente você não conhece, mas posso te garantir que o filme dirigido pelo talentoso Jay Roach (de "O Escândalo"), não apenas captura a essência eletrizante de uma campanha presidencial dos EUA, como também oferece uma visão única sobre os bastidores da eleição de 2008, após a entrada de Sarah Palin na chapa de John McCain. Se você é daqueles que não perdem um bom drama político, vai tranquilo para o play que você não vai se decepcionar!

"Game Change" (no original) nos apresenta o dilema enfrentado pela equipe que cuidava da campanha presidencial republicana após uma escolha surpreendente: apresentar Sarah Palin (Julianne Moore) como candidata a vice-presidente dos EUA. Steve Schmidt (Woody Harrelson) lidera uma equipe que se vê diante dos desafios de gerenciar a imagem pública de Palin, uma mulher extremamente carismática, mas visivelmente despreparada (tecnicamente e emocionalmente) para assumir o desafio de ajudar McCain a vencer Barak Obama em 2008. Confira o trailer (em inglês):

Mesmo chancelada por 12 indicações ao Emmy de 2012 (com 5 vitórias, inclusive na categoria de "Melhor Filme para TV"), é impossível não ressaltar a habilidade de Roach em construir uma narrativa capaz de nos colocar diante de toda aquela intensidade (e complexidade) de uma campanha presidencial. Se em "House of Cards" esse plot se confundia com as peripécias de seu protagonista, aqui a dinâmica não é muito diferente mesmo se tratando de uma história real. É muito interessante como o premiado roteiro de Danny Strong (de "Dopesick"), baseado no livro de Mark Halperin e John Heilemann, transcende as barreiras do drama político e oferece uma perspectiva mais íntima e cativante dos personagens - o caos psicológico de Palin, de motivo de chacotas à postulante a ser a segunda pessoa mais poderosa do mundo, é realmente a cereja do bolo de  "Virada no Jogo".

Aliás, a interpretação brilhante de Moore merece sua atenção. Ela não apenas se assemelha fisicamente a Palin, mas também é capaz de replicar essa dualidade de humor e de aceitação, tão comuns em uma disputa cheia de pressão e, claro, de hipocrisia - o processo de transformação da protagonista ao se ver diante de tanto poder, é sensacional. Por outro lado, Moore nos proporciona uma visão humana e multidimensional de uma figura pública despreparada, sem soar estereotipada demais. Woody Harrelson, Sarah Paulson e Ed Harris também merecem elogios e prêmios - saiba que esse foi o elenco mais vencedor na temporada de premiação de 2012. Moore, por exemplo, ganhou o Emmy, o Globo de Ouro, o Satellite Awards, o Screen Actors Guild Awards, o Critics Choice Television Awards e por aí vai.

Com uma direção magistral ao guiar seus atores nessa exploração de nuances emocionais, Roach é capaz de elevar a narrativa para um outro patamar e fazer de "Virada no Jogo" mais um "achado" dessa era de streaming que possivelmente passou batido por muita gente até aqui. Uma jornada complexa e verdadeira que nos leva a refletir sobre os altos custos emocionais da vida publica, do cenário político e da luta por poder, em um universo onde o peso das decisões tomadas faz toda diferença no resultado final de uma eleição. Tenha certeza que essa é uma obra que não apenas entretém, mas que também provoca uma análise profunda sobre o ego, sobre o propósito e sobre o momento em que ambos se confundem.

Vale muito o seu play!

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O cenário político sempre foi terreno fértil para histórias fascinantes, e o filme "Virada no Jogo" não foge à regra - eu diria que é uma espécie de "House of Cards" da vida real. Essa é um história que provavelmente você não conhece, mas posso te garantir que o filme dirigido pelo talentoso Jay Roach (de "O Escândalo"), não apenas captura a essência eletrizante de uma campanha presidencial dos EUA, como também oferece uma visão única sobre os bastidores da eleição de 2008, após a entrada de Sarah Palin na chapa de John McCain. Se você é daqueles que não perdem um bom drama político, vai tranquilo para o play que você não vai se decepcionar!

"Game Change" (no original) nos apresenta o dilema enfrentado pela equipe que cuidava da campanha presidencial republicana após uma escolha surpreendente: apresentar Sarah Palin (Julianne Moore) como candidata a vice-presidente dos EUA. Steve Schmidt (Woody Harrelson) lidera uma equipe que se vê diante dos desafios de gerenciar a imagem pública de Palin, uma mulher extremamente carismática, mas visivelmente despreparada (tecnicamente e emocionalmente) para assumir o desafio de ajudar McCain a vencer Barak Obama em 2008. Confira o trailer (em inglês):

Mesmo chancelada por 12 indicações ao Emmy de 2012 (com 5 vitórias, inclusive na categoria de "Melhor Filme para TV"), é impossível não ressaltar a habilidade de Roach em construir uma narrativa capaz de nos colocar diante de toda aquela intensidade (e complexidade) de uma campanha presidencial. Se em "House of Cards" esse plot se confundia com as peripécias de seu protagonista, aqui a dinâmica não é muito diferente mesmo se tratando de uma história real. É muito interessante como o premiado roteiro de Danny Strong (de "Dopesick"), baseado no livro de Mark Halperin e John Heilemann, transcende as barreiras do drama político e oferece uma perspectiva mais íntima e cativante dos personagens - o caos psicológico de Palin, de motivo de chacotas à postulante a ser a segunda pessoa mais poderosa do mundo, é realmente a cereja do bolo de  "Virada no Jogo".

Aliás, a interpretação brilhante de Moore merece sua atenção. Ela não apenas se assemelha fisicamente a Palin, mas também é capaz de replicar essa dualidade de humor e de aceitação, tão comuns em uma disputa cheia de pressão e, claro, de hipocrisia - o processo de transformação da protagonista ao se ver diante de tanto poder, é sensacional. Por outro lado, Moore nos proporciona uma visão humana e multidimensional de uma figura pública despreparada, sem soar estereotipada demais. Woody Harrelson, Sarah Paulson e Ed Harris também merecem elogios e prêmios - saiba que esse foi o elenco mais vencedor na temporada de premiação de 2012. Moore, por exemplo, ganhou o Emmy, o Globo de Ouro, o Satellite Awards, o Screen Actors Guild Awards, o Critics Choice Television Awards e por aí vai.

Com uma direção magistral ao guiar seus atores nessa exploração de nuances emocionais, Roach é capaz de elevar a narrativa para um outro patamar e fazer de "Virada no Jogo" mais um "achado" dessa era de streaming que possivelmente passou batido por muita gente até aqui. Uma jornada complexa e verdadeira que nos leva a refletir sobre os altos custos emocionais da vida publica, do cenário político e da luta por poder, em um universo onde o peso das decisões tomadas faz toda diferença no resultado final de uma eleição. Tenha certeza que essa é uma obra que não apenas entretém, mas que também provoca uma análise profunda sobre o ego, sobre o propósito e sobre o momento em que ambos se confundem.

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Wahl Street

Dizer "não" é fácil, o complicado é saber quando dizer "sim". Se você, empreendedor, se conectou com essa frase dita pelo ex-CEO da Disney, Michael Eisner, em um dos episódios de "Wahl Street", provavelmente você nem vai precisar ler toda essa análise para ter a certeza que essa série de seis episódios é realmente para você! Aliás, para os menos atentos, descobrir que o ator Mark Wahlberg além de reconhecido em Hollywood, ainda está envolvido em mais de 20 negócios, pode parecer uma simples jogada de marketing, porém essa ótima produção da HBO serve justamente para desmistificar esse pré-conceito e deixar claro que até para Wahlberg a jornada empreendedora não é das mais tranquilas!

A premissa de "Wahl Street" é relativamente simples já que sua trama gira em torno da vida pessoal e profissional do astro global Mark Wahlberg enquanto ele concilia as demandas de uma rigorosa programação como ator com sua rede cada vez maior de investimentos e como empreendedor de diversos negócios. Confira o trailer (em inglês):

É inegável que aquela máxima que diz: "as pessoas querem o whisky que eu tomo, mas não os tombos que eu levo", pode ser levada para outro patamar ao acompanhar a vida por trás das câmeras de um astro de Hollywood. Obviamente que o tema não é nenhuma novidade, visto que séries e filmes adoram tocar no assunto se aproveitando da comédia ou do drama para tentar matar a curiosidade de quem acompanha o showbiz e acha que tudo é festa - foi assim com "Entourage" (projeto onde o próprio Wahlberg esteve diretamente envolvido) e com o inesquecível "Somewhere" de Sofia Coppola.

Em "Wahl Street" ainda encontramos vários elementos que de alguma forma fazem parte da jornada empreendedora de qualquer pessoa - e esse talvez seja o grande mérito do documentário, pois em muitos momentos Wahlberg é colocado em uma posição de vulnerabilidade com a mesma honestidade de quando tem que tomar alguma decisão difícil ou lidar com o inesperado, como foi o caso da pandemia que fez com que todas as suas lanchonetes e academias tivessem que fechar da noite para o dia. Veja, embora sem se aprofundar em nenhuma decisão estratégica ou em algum estudo bastante particular de seus negócios, é possível entender alguns movimentos do "Wahlberg empresário" que são brilhantemente ilustrados por "mentores" de altíssima qualidade que vão do já citado Michael Eisner; passando pelo falecido ex-CEO da Hasbro, Brian Goldner; até chegar em Janice Bryant Howroyd, fundadora da The ActOne Group (a maior empresa privada de recursos humanos dos EUA) ou até de Dana White CEO do UFC.

"Wahl Street" vai fazer mais sentido para quem busca entender a dinâmica de um empreendedor, mesmo que em um universo bastante distante da nossa realidade. Não podemos embarcar nessa série com a ideia pré-concebida de que tudo é muito mais fácil quando se ganha milhões ao atuar em um filme de ação - essa análise é tão rasa quanto aquela que tende a diminuir a conquista de alguém pelo simples fato dele (ou dela) ter um determinado sobrenome. Dito isso, é fácil definir a série como um bom entretenimento, daqueles bacanas de assistir para quem gosta do tema ou para quem é capaz de tirar alguma boa lição mesmo quando tudo soa tão inalcançável.

PS: A segunda temporada também já está disponível na HBO Max.

Vale muito o seu play!

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Dizer "não" é fácil, o complicado é saber quando dizer "sim". Se você, empreendedor, se conectou com essa frase dita pelo ex-CEO da Disney, Michael Eisner, em um dos episódios de "Wahl Street", provavelmente você nem vai precisar ler toda essa análise para ter a certeza que essa série de seis episódios é realmente para você! Aliás, para os menos atentos, descobrir que o ator Mark Wahlberg além de reconhecido em Hollywood, ainda está envolvido em mais de 20 negócios, pode parecer uma simples jogada de marketing, porém essa ótima produção da HBO serve justamente para desmistificar esse pré-conceito e deixar claro que até para Wahlberg a jornada empreendedora não é das mais tranquilas!

A premissa de "Wahl Street" é relativamente simples já que sua trama gira em torno da vida pessoal e profissional do astro global Mark Wahlberg enquanto ele concilia as demandas de uma rigorosa programação como ator com sua rede cada vez maior de investimentos e como empreendedor de diversos negócios. Confira o trailer (em inglês):

É inegável que aquela máxima que diz: "as pessoas querem o whisky que eu tomo, mas não os tombos que eu levo", pode ser levada para outro patamar ao acompanhar a vida por trás das câmeras de um astro de Hollywood. Obviamente que o tema não é nenhuma novidade, visto que séries e filmes adoram tocar no assunto se aproveitando da comédia ou do drama para tentar matar a curiosidade de quem acompanha o showbiz e acha que tudo é festa - foi assim com "Entourage" (projeto onde o próprio Wahlberg esteve diretamente envolvido) e com o inesquecível "Somewhere" de Sofia Coppola.

Em "Wahl Street" ainda encontramos vários elementos que de alguma forma fazem parte da jornada empreendedora de qualquer pessoa - e esse talvez seja o grande mérito do documentário, pois em muitos momentos Wahlberg é colocado em uma posição de vulnerabilidade com a mesma honestidade de quando tem que tomar alguma decisão difícil ou lidar com o inesperado, como foi o caso da pandemia que fez com que todas as suas lanchonetes e academias tivessem que fechar da noite para o dia. Veja, embora sem se aprofundar em nenhuma decisão estratégica ou em algum estudo bastante particular de seus negócios, é possível entender alguns movimentos do "Wahlberg empresário" que são brilhantemente ilustrados por "mentores" de altíssima qualidade que vão do já citado Michael Eisner; passando pelo falecido ex-CEO da Hasbro, Brian Goldner; até chegar em Janice Bryant Howroyd, fundadora da The ActOne Group (a maior empresa privada de recursos humanos dos EUA) ou até de Dana White CEO do UFC.

"Wahl Street" vai fazer mais sentido para quem busca entender a dinâmica de um empreendedor, mesmo que em um universo bastante distante da nossa realidade. Não podemos embarcar nessa série com a ideia pré-concebida de que tudo é muito mais fácil quando se ganha milhões ao atuar em um filme de ação - essa análise é tão rasa quanto aquela que tende a diminuir a conquista de alguém pelo simples fato dele (ou dela) ter um determinado sobrenome. Dito isso, é fácil definir a série como um bom entretenimento, daqueles bacanas de assistir para quem gosta do tema ou para quem é capaz de tirar alguma boa lição mesmo quando tudo soa tão inalcançável.

PS: A segunda temporada também já está disponível na HBO Max.

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Y2K: Bomba-Relógio

"Y2K: Bomba-Relógio" é um documentário clássico, ou seja, foge daquela estética moderninha de transformar uma história real em uma narrativa fluida cheia de intervenções gráficas, reconstituições ou depoimentos atuais. Não, aqui temos um recorte temporal baseado em imagens de arquivos muito bem montado, diga-se de passagem, para que tudo faça sentido como documento histórico. Embora esse conceito deixe a narrativa mais cadenciada, eu diria que para aqueles que apreciam tecnologia como estudo antropológico, claro que com um certo toque de nostalgia bem anos 90, esse documentário é imperdível. Dirigido pelo Brian Becker (de "America's War on Drugs") e pela estreante Marley McDonald, o filme mergulha nos bastidores do bug do milênio e destrincha como uma possível falha (ou escolha) administrativa se tornou uma ameaça de colapso global em 31 de dezembro de 1999. 

"Y2K: Bomba-Relógio" nos convida a acompanhar a investigação sobre o bug do milênio, desde sua origem até as medidas drásticas tomadas pelo governo dos EUA para evitar uma verdadeira catástrofe mundial. Através de depoimentos com especialistas, programadores e figuras chave da época, como Bill Gates, Steve Jobs e o mensageiro do apocalipse digital, Peter de Jager, o documentário explora o desenvolvimento tecnológico do século passado pela perspectiva da dependência social e como as falhas nos sistemas computacionais teriam consequências potencialmente devastadoras. Confira o trailer (em inglês):

"É preciso pensar o passado para compreender o presente e idealizar o futuro" - em uma época pós-pandemia pouca coisa faz tanto sentido quanto essa frase do historiador grego Heródoto. A partir dessa premissa, "Y2K: Bomba-Relógio" ganha força como obra documental e se torna tão especial por ser capaz de retratar com muita inteligência e sensibilidade uma época marcada tanto pela euforia tecnológica quanto pelo medo do desconhecido. A direção de Becker e McDonald utiliza poucos recursos gráficos que poderiam nos distrair, tudo para manter o foco no que realmente interessa: construir com imagens de arquivo uma linha temporal capaz de criar uma experiência imersiva no que foi o assunto de pelo menos 4 anos. 

A qualidade das entrevistas, todas realizadas na época, de fato, fornecem diferentes perspectivas sobre o bug do milênio. Através de seus relatos, podemos entender a magnitude do problema e a importância do trabalho para evitá-lo. É nesse contexto que figuras como Peter de Jager se tornam referências de como a humanidade pode ser facilmente manipulada ao se sentir acuada - embora de uma forma mais dramática, é mais ou menos como assistimos em "O Nevoeiro" de 2007.

"Y2K: Bomba-Relógio" pode ser considerada mais do que um documentário sobre um bug do milênio (aquele que nunca aconteceu). Na verdade, ele é mais um lembrete da importância sobre tomar as decisões corretas sem pensar apenas no seu umbigo. Olhar para o ser humano ganancioso é dar a devida atenção para o que representa a segurança cibernética e a necessidade de estarmos preparados para enfrentar os desafios (que certamente virão) do futuro. Em um mundo tão infinitamente mais rápido do que em 1999, não aprender com os erros do passado é como assinar nosso atestado de incompetência, então, se você se interessa por tecnologia e como ela se torna sensível para uma sociedade em transformação, essa produção da HBO é a escolha perfeita e vai te provocar ótimas reflexões!

Ah, e antes de finalizar, você sabe de onde surgiu o termo "bug" para uma falha tecnológica?

Divirta-se!

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"Y2K: Bomba-Relógio" é um documentário clássico, ou seja, foge daquela estética moderninha de transformar uma história real em uma narrativa fluida cheia de intervenções gráficas, reconstituições ou depoimentos atuais. Não, aqui temos um recorte temporal baseado em imagens de arquivos muito bem montado, diga-se de passagem, para que tudo faça sentido como documento histórico. Embora esse conceito deixe a narrativa mais cadenciada, eu diria que para aqueles que apreciam tecnologia como estudo antropológico, claro que com um certo toque de nostalgia bem anos 90, esse documentário é imperdível. Dirigido pelo Brian Becker (de "America's War on Drugs") e pela estreante Marley McDonald, o filme mergulha nos bastidores do bug do milênio e destrincha como uma possível falha (ou escolha) administrativa se tornou uma ameaça de colapso global em 31 de dezembro de 1999. 

"Y2K: Bomba-Relógio" nos convida a acompanhar a investigação sobre o bug do milênio, desde sua origem até as medidas drásticas tomadas pelo governo dos EUA para evitar uma verdadeira catástrofe mundial. Através de depoimentos com especialistas, programadores e figuras chave da época, como Bill Gates, Steve Jobs e o mensageiro do apocalipse digital, Peter de Jager, o documentário explora o desenvolvimento tecnológico do século passado pela perspectiva da dependência social e como as falhas nos sistemas computacionais teriam consequências potencialmente devastadoras. Confira o trailer (em inglês):

"É preciso pensar o passado para compreender o presente e idealizar o futuro" - em uma época pós-pandemia pouca coisa faz tanto sentido quanto essa frase do historiador grego Heródoto. A partir dessa premissa, "Y2K: Bomba-Relógio" ganha força como obra documental e se torna tão especial por ser capaz de retratar com muita inteligência e sensibilidade uma época marcada tanto pela euforia tecnológica quanto pelo medo do desconhecido. A direção de Becker e McDonald utiliza poucos recursos gráficos que poderiam nos distrair, tudo para manter o foco no que realmente interessa: construir com imagens de arquivo uma linha temporal capaz de criar uma experiência imersiva no que foi o assunto de pelo menos 4 anos. 

A qualidade das entrevistas, todas realizadas na época, de fato, fornecem diferentes perspectivas sobre o bug do milênio. Através de seus relatos, podemos entender a magnitude do problema e a importância do trabalho para evitá-lo. É nesse contexto que figuras como Peter de Jager se tornam referências de como a humanidade pode ser facilmente manipulada ao se sentir acuada - embora de uma forma mais dramática, é mais ou menos como assistimos em "O Nevoeiro" de 2007.

"Y2K: Bomba-Relógio" pode ser considerada mais do que um documentário sobre um bug do milênio (aquele que nunca aconteceu). Na verdade, ele é mais um lembrete da importância sobre tomar as decisões corretas sem pensar apenas no seu umbigo. Olhar para o ser humano ganancioso é dar a devida atenção para o que representa a segurança cibernética e a necessidade de estarmos preparados para enfrentar os desafios (que certamente virão) do futuro. Em um mundo tão infinitamente mais rápido do que em 1999, não aprender com os erros do passado é como assinar nosso atestado de incompetência, então, se você se interessa por tecnologia e como ela se torna sensível para uma sociedade em transformação, essa produção da HBO é a escolha perfeita e vai te provocar ótimas reflexões!

Ah, e antes de finalizar, você sabe de onde surgiu o termo "bug" para uma falha tecnológica?

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