Embora os streamers continuem a derrubar todos e quaisquer modelos de negócios tradicionais da indústria de entretenimento, eles agora estão enfrentando o poder do usuário sobre quais serviços escolher e potencialmente perder. De fato, o desafio para todos os players concorrentes não é apenas atrair novos assinantes, mas manter os existentes – um fenômeno conhecido como "captura de valor de longo prazo" e que agora parece ser uma espécie de "Santo Graal" para o negócio.
O modelo “Campo dos Sonhos" acabou. Não é mais um caso de "construa e eles virão", pois assim que os assinantes chegam, o trabalho de um player de streaming é manter esse usuário lá por toda a vida,, aumentando seu LTV. "É aí que o modelo de negócios precisa se concentrar no longo prazo”, diz um ex-executivo sênior da Disney que pediu para não ser identificado pela Variety.
O combate de incêndios no lugar de estratégias para alcançar esse valor de longo prazo parece abundante. O medo crescente nas principais plataformas de streaming passou a ser o “churn”, ou seja, os assinantes que pagam por um serviço por um curto período para ver algo específico, mas que depois optam por sair e/ou mudar para uma plataforma diferente. Em resposta aos hábitos inconstantes desse assinante, a Netflix descontinuou os testes gratuitos de 30 dias, enquanto Disney+, HBO Max e Prime Vídeo passaram a lançar episódios de séries semanalmente para prolongar a vida útil do conteúdo e tentar brecar a rotatividade de assinaturas.
O relatório intitulado "Video Churn Today: Trends, Changes and Outlook 2021", da Interpret, estimou que as assinaturas de streaming aumentaram 14% no segundo semestre de 2021, mas ao mesmo tempo a taxa de cancelamento também subiu: de 15% para 20%. 13% dos pesquisados afirmaram cancelar um serviço depois de assistir a uma determinada série. "A taxa de declínio de um conteúdo de streaming é incrivelmente rápida”, diz o analista de Wall Street Michael Nathanson, da MoffetNathanson.
Os 10 players de streaming atualmente no topo da cadeia de valor estão compreensivelmente focados em como tornar o negócio mais lucrativo. E embora o preço da assinatura tenha um papel importante nesse desafio, eles não são os únicos fatores críticos dessa equação. Os próprios players estão começando a questionar a “oferta” de conteúdo que suas interfaces estão apresentando ao público. Já é uma unanimidade que existe muita confusão e pouca orientação. O consenso na indústria é que os players de streaming mais mainstream precisam de uma mudança em termos de como e o que está sendo apresentado para o assinante!
Aprofundando ainda mais essa crítica, o principal desafio enfrentado pelos streamers são duas ferramentas opostas, mas importantes, a serem consideradas. Primeiro: o algoritmo sempre controverso, construído em torno de uma série de dados (limitados apenas a sua plataforma) que empurra recomendações para o assinante. A outra ferramenta, mas que muitas vezes é esquecida nos corredores das empresas de entretenimento, é a arte da curadoria. “Em uma escala muito mais ampla do que apenas plataformas online, é importante reconhecer que a própria indústria cinematográfica é uma enorme máquina de curadoria. Temos prêmios importantes, festivais competitivos, filtros de financiamento e uma variedade de gatekeepers e críticos em todos os lugares. Há uma grande quantidade de curadoria que já aconteceu antes mesmo do público ter acesso ao conteúdo. Tomamos decisões baseadas em dados… mas apresentar ao público novas formas de cinema é o princípio orientador”, diz Jake Garriock, da Curzon Cinema, que atualmente lança o vencedor do Sundance “Flee” no Reino Unido.
Acontece que muitas vezes as plataformas de streaming não possuem em seu catálogo um conteúdo que esteja completamente alinhado ao próximo título que o assinante gostaria de assistir ou, melhor ainda, um determinado serviço não tem informações de outras plataformas que poderiam servir de base para uma melhor recomendação - o que aliás o algoritmo desenvolvido pela Viu Review faz. Vamos pegar o exemplo dessa recomendação do nosso app:
Nós só fomos capazes de recomendar para o usuário da Viu Review e assinante da Globoplay, a série "A voz mais forte" porque sabíamos que aquela pessoa já tinha assistido o filme "O Escândalo" que está na Prime Vídeo e o documentário “Quarto 2806: A Acusação” que está na Netflix. Embora os algoritmos dos players de streaming possam criar uma rede de recomendações em cima de um determinado hábito de consumo, ele nunca será tão inteligente e amplo quanto o nosso por não conseguir levar em consideração títulos que estão no catálogo do seus concorrentes.
É impossível a Globoplay saber que você vai gostar da série "Waco" sem saber que você gostou "Chernobyl" da HBO! Aliás você sabia que "Waco" está disponível na Globoplay?
Obviamente que a curadoria tem papel importante nesse fluxo, já que não podemos indicar para nosso "melhor amigo" algo que não gostamos, certo? Acontece que "gosto" é relativo, por isso que a construção de perfis dentro do algoritmo nos ajuda a entender um determinado padrão de preferência e assim conseguir ser mais assertivo no direcionamento de títulos que já passaram por nossa análise. "É nesse contexto que surpreendemos nossos usuários, pois com essa lógica somos capazes de ampliar as possibilidades de um serviço de streaming agradar seu assinante. Como 46% dos assinantes de streaming não sabem exatamente o que eles gostariam de assistir quando acessam uma plataforma, eles estão realmente dispostos a experimentar novas recomendações desde que faça um sentido real para ele". Afirmou André Siqueira, head de conteúdo e inovação da Viu Review. "As vezes ele nem está acostumado a assistir um documentário, mas o tema e a estrutura narrativa são tão próximos de uma série que ele acabou de assistir que ele acaba se surpreendendo positivamente com a nossa recomendação!"
O fator de “senso comum” que fica fora das equações baseadas unicamente em dados poderia ser chamado de “fator humano”. E é aí que entra a abordagem curatorial, como diz Sandra Hebron, ex-diretora artística do Festival de Cinema de Londres e agora chefe de Screen Arts da Escola Nacional de Cinema e Televisão do Reino Unido, “o processo é sobre seleção, reunião e contextualização. Uma boa curadoria sempre pensa no público e é honesta – nunca esconde quem está fazendo a escolha".
“Muitas vezes, o público não sabe o que quer até ver no carrossel”, diz Paul Brett, produtor executivo de “The King’s Speech”. Elementos surpresas e descobertas exigem um envolvimento mais profundo – por meio de uma confiança conquistada com muito esforço: “A única parte da Amazon que gera grandes somas de dinheiro é o serviço de nuvem. O Prime Video é um líder de perdas porque é difícil de navegar por ser tão vasto. Existe o risco de alienar os assinantes e gerar rotatividade se o público não encontrar o que está procurando.”
No Disney+, por exemplo, as ofertas da "Marvel" e de "Star Wars" estão organizadas por meio de cronologias narrativas alinhadas com seus universos e não por data de produção. “As referências são abundantes nas franquias da Disney, e os personagens estão aparecendo de repente e criando barulho. As gerações mais jovens e mais velhas adoram essas referências e isso impulsiona um engajamento mais amplo”, diz o blogueiro cultural James K. Wight e Siqueira ainda completa: "Mas até que ponto essa forma de facilitar a navegação pode ser um diferencial competitivo no longo prazo? Me parece pouco!"
Para ler o artigo completo da Variety, clicar aqui.