Essa minissérie é simplesmente imperdível! "Não Diga Nada", adaptada no aclamado livro de Patrick Radden Keefe e desenvolvida por Joshua Zetumer (roteirista de "RoboCop" do José Padilha), é realmente uma jornada densa e profundamente impactante sobre os eventos violentos que marcaram o período dos Troubles - conflito armado que durou cerca de 30 anos na Irlanda do Norte, entre o final dos anos 1960 e 1998. Combinando rigor histórico e uma narrativa habilmente construída baseada em fatos reais, a produção aborda questões sensíveis sobre diferenças religiosas e politicas, sob a perspectiva da lealdade, da moralidade e do impacto duradouro da violência em indivíduos e suas comunidades. Assim como "Chernobyl" ou "The Looming Tower", a série une drama humano com uma reconstituição histórica detalhada e precisa, criando uma experiência poderosa e inquietante, com um leve toque do premiado "Belfast".
A história é centrada no desaparecimento de Jean McConville (Emily Healy), uma mãe de dez filhos, em 1972, um crime que se tornou um símbolo das complexidades e brutalidades do conflito entre católicos republicanos e protestantes unionistas. A narrativa entrelaça múltiplas perspectivas, desde a vida de McConville e sua família até figuras-chave do IRA (Exército Republicano Irlandês) como Gerry Adams (Josh Finan), Marian Price (Hazel Doupe), Dolours Price (Lola Petticrew), além de agentes governamentais que operavam na sombra do conflito. Ao examinar o impacto do desaparecimento de Jean em sua família e na sociedade irlandesa, "Não Diga Nada" explora questões de responsabilidade, justiça e as cicatrizes deixadas por anos de guerra. Confira o trailer:
Joshua Zetumer, conhecido por seu trabalho em "O Dia do Atentado", entrega um roteiro denso e emocionalmente complexo para conduzir uma minissérie que deveria receber o status de "obra-prima". Com um equilíbrio impressionante entre a tensão dramática e a fidelidade histórica, Zetumer utiliza uma abordagem narrativa que alterna entre o passado e o presente, revelando gradualmente os eventos que levaram ao desaparecimento de McConville enquanto explora em paralelo as consequências do conflito armado e do terrorismo praticado pelo IRA décadas depois. Essa estrutura ressalta a persistência das feridas abertas por eventos que muitos prefeririam esquecer, sem temer mostrar todos os lados da história. O timaço de direção liderado pelo Michael Lennox (indicado ao Oscar de Curta-Metragem em 2015 por "Boogaloo and Graham") enfatiza tanto a grandiosidade do conflito quanto a intimidade das nuances mais humanas de quem viveu o período - é muito interessante a forma como Lennox conceitualiza a minissérie na sua "forma" e no seu "conteúdo", criando uma dinâmica que nos impede de parar de assistir (e olha que são 9 episódios).
Os cenários são recriados com meticulosidade pelo time de arte liderado pela Emma Painter e pela Rebecca Barker-McLean (ambas de "The Great"). Repare como as ruas sombrias de Belfast nos anos 70 são opressivas e deixam uma sensação de densidade extremamente alinhada com a fotografia do David Raedeker (de "A Serpente de Essex") - os tons frios capturam a atmosfera de desconfiança e perigo constante do conflito enquanto o silêncio proposto por Lennox sublinha a dor e o peso emocional dos personagens. Aliás, o elenco entrega performances que ancoram a narrativa com uma autenticidade e emoção dignas de prêmios. Josh Finan, Hazel Doupe e Lola Petticrew, como líderes do IRA, são retratados com uma complexidade moral muito interessante, evitando caricaturas simplistas e explorando as tensões internas entre o idealismo político e a brutalidade pragmática. Destaco também Maxine Peake como Dolours Price já mais velha - que trabalho incrível, que profundidade!
"Say Nothing, no original, é rica em detalhes e emocionante na sua essência. Sua força narrativa, mesmo que um desafio para alguns, é algo que chama a atenção - sem exageros, me trouxe muito das sensações de "Chernobyl". A abordagem multifacetada e a constante alternância entre linhas do tempo exigem atenção e envolvimento, isso é um fato, mas para quem está disposto a acompanhar a minissérie de Joshua Zetumer e de Michael Lennox, a recompensa é uma compreensão no mínimo reflexiva de um dos períodos mais turbulentos da história moderna da humanidade. Saiba que "Não Diga Nada" transcende o rótulo de uma simples adaptação para se tornar uma obra impactante sobre memória, culpa e a busca por justiça, como poucas vezes encontramos no play!
Vale demais a jornada! Uma das melhores de 2024 com certeza!
Essa minissérie é simplesmente imperdível! "Não Diga Nada", adaptada no aclamado livro de Patrick Radden Keefe e desenvolvida por Joshua Zetumer (roteirista de "RoboCop" do José Padilha), é realmente uma jornada densa e profundamente impactante sobre os eventos violentos que marcaram o período dos Troubles - conflito armado que durou cerca de 30 anos na Irlanda do Norte, entre o final dos anos 1960 e 1998. Combinando rigor histórico e uma narrativa habilmente construída baseada em fatos reais, a produção aborda questões sensíveis sobre diferenças religiosas e politicas, sob a perspectiva da lealdade, da moralidade e do impacto duradouro da violência em indivíduos e suas comunidades. Assim como "Chernobyl" ou "The Looming Tower", a série une drama humano com uma reconstituição histórica detalhada e precisa, criando uma experiência poderosa e inquietante, com um leve toque do premiado "Belfast".
A história é centrada no desaparecimento de Jean McConville (Emily Healy), uma mãe de dez filhos, em 1972, um crime que se tornou um símbolo das complexidades e brutalidades do conflito entre católicos republicanos e protestantes unionistas. A narrativa entrelaça múltiplas perspectivas, desde a vida de McConville e sua família até figuras-chave do IRA (Exército Republicano Irlandês) como Gerry Adams (Josh Finan), Marian Price (Hazel Doupe), Dolours Price (Lola Petticrew), além de agentes governamentais que operavam na sombra do conflito. Ao examinar o impacto do desaparecimento de Jean em sua família e na sociedade irlandesa, "Não Diga Nada" explora questões de responsabilidade, justiça e as cicatrizes deixadas por anos de guerra. Confira o trailer:
Joshua Zetumer, conhecido por seu trabalho em "O Dia do Atentado", entrega um roteiro denso e emocionalmente complexo para conduzir uma minissérie que deveria receber o status de "obra-prima". Com um equilíbrio impressionante entre a tensão dramática e a fidelidade histórica, Zetumer utiliza uma abordagem narrativa que alterna entre o passado e o presente, revelando gradualmente os eventos que levaram ao desaparecimento de McConville enquanto explora em paralelo as consequências do conflito armado e do terrorismo praticado pelo IRA décadas depois. Essa estrutura ressalta a persistência das feridas abertas por eventos que muitos prefeririam esquecer, sem temer mostrar todos os lados da história. O timaço de direção liderado pelo Michael Lennox (indicado ao Oscar de Curta-Metragem em 2015 por "Boogaloo and Graham") enfatiza tanto a grandiosidade do conflito quanto a intimidade das nuances mais humanas de quem viveu o período - é muito interessante a forma como Lennox conceitualiza a minissérie na sua "forma" e no seu "conteúdo", criando uma dinâmica que nos impede de parar de assistir (e olha que são 9 episódios).
Os cenários são recriados com meticulosidade pelo time de arte liderado pela Emma Painter e pela Rebecca Barker-McLean (ambas de "The Great"). Repare como as ruas sombrias de Belfast nos anos 70 são opressivas e deixam uma sensação de densidade extremamente alinhada com a fotografia do David Raedeker (de "A Serpente de Essex") - os tons frios capturam a atmosfera de desconfiança e perigo constante do conflito enquanto o silêncio proposto por Lennox sublinha a dor e o peso emocional dos personagens. Aliás, o elenco entrega performances que ancoram a narrativa com uma autenticidade e emoção dignas de prêmios. Josh Finan, Hazel Doupe e Lola Petticrew, como líderes do IRA, são retratados com uma complexidade moral muito interessante, evitando caricaturas simplistas e explorando as tensões internas entre o idealismo político e a brutalidade pragmática. Destaco também Maxine Peake como Dolours Price já mais velha - que trabalho incrível, que profundidade!
"Say Nothing, no original, é rica em detalhes e emocionante na sua essência. Sua força narrativa, mesmo que um desafio para alguns, é algo que chama a atenção - sem exageros, me trouxe muito das sensações de "Chernobyl". A abordagem multifacetada e a constante alternância entre linhas do tempo exigem atenção e envolvimento, isso é um fato, mas para quem está disposto a acompanhar a minissérie de Joshua Zetumer e de Michael Lennox, a recompensa é uma compreensão no mínimo reflexiva de um dos períodos mais turbulentos da história moderna da humanidade. Saiba que "Não Diga Nada" transcende o rótulo de uma simples adaptação para se tornar uma obra impactante sobre memória, culpa e a busca por justiça, como poucas vezes encontramos no play!
Vale demais a jornada! Uma das melhores de 2024 com certeza!
É impossível assistir os primeiros minutos da série documental da Netflix, "Naomi Osaka: Estrela do Tênis" e não lembrar do recente "King Richard" - a jornada é muito parecida, porém tendo como protagonista uma asiática de 20 e poucos anos que, curiosamente, chega ao estrelato ao derrotar justamente a americana Serena Williams na final do Aberto dos Estados Unidos de 2018. Dirigido pela Garrett Bradley (indicada ao Oscar pelo excelente e imperdível "Time"), essa é mais uma produção de LeBron e Maverick Carter da Uninterrupted, empresa responsável, entre outros, pelo documentário "Neymar - O Caos Perfeito".
Em três episódios, o documentário é um olhar íntimo sobre a vida de uma das mais dotadas e complexas atletas da sua geração. Uma perspetiva sobre as duras decisões e os incríveis triunfos que definem Naomi Osaka simultaneamente como uma superestrela de elite mundial e uma jovem que precisa lidar com uma enorme pressão graças ao mundo conectado de hoje. Confira o trailer:
Com uma linha narrativa bem construída, mas sem se aprofundar muito nos assuntos levantados pelo roteiro, a série segue uma linha bem de observação, com pouca ou nenhuma influência da diretora na condução da história, fazendo com que a audiência seja um olhar curioso sobre o dia a dia da atleta. Através de um acesso inédito, Bradley acompanha Osaka durante dois anos - talvez os mais importantes na vida dela até aqui. São os anos de transformação esportiva, mas também uma época onde ela começa a encontrar a sua voz e compreender seu poder como referência na modalidade.
O interessante é que vemos a preparação para defender os dois títulos de Grand Slam que ela conquistou no ano anterior, da mesma forma em que ela se coloca como defensora dos direitos humanos usando máscaras com o nome de pessoas afro-americanas que perderam suas vidas covardemente. Outro ponto interessante é o seu processo de luto pela perda inesperada do seu mentor e amigo Kobe Bryant - e como isso impactou na sua performance nas quadras. Talvez o pouco esforço do roteiro em humanizar Osaka seja uma das coisas mais surpreendentes da narrativa (diferente do documentário de Neymar, por exemplo) - sua relação com a tenista americana de 15 anos, Cori Gauff, é real e muito bacana por isso. Quando Osaka perde para Gauff, sua naturalidade em dizer o quanto aquilo foi ruim, mesmo gostando da adversária, é muito honesto!
Com essa abordagem empática, "Naomi Osaka: Estrela do Tênis" brilha pelas curiosidades: seja pelo infernal programa de treinos e viagens, ou pela exploração de todas as camadas de pressão que a atleta está sujeita - é de se compreender o histórico de ansiedade, medos, perdas, derrotas, reinvenção, vitórias e posicionamento perante a importância da saúde mental que Osaka encabeçou ao lado de Simone Biles. Ela mesmo faz uma auto-avaliação sobre a necessidade de desenvolver seu mindset vencedor para mudar de patamar como atleta.
O fato é que, pelo esporte, pela figura marcante e pelo aprendizado, a minissérie vale muito a pena!
É impossível assistir os primeiros minutos da série documental da Netflix, "Naomi Osaka: Estrela do Tênis" e não lembrar do recente "King Richard" - a jornada é muito parecida, porém tendo como protagonista uma asiática de 20 e poucos anos que, curiosamente, chega ao estrelato ao derrotar justamente a americana Serena Williams na final do Aberto dos Estados Unidos de 2018. Dirigido pela Garrett Bradley (indicada ao Oscar pelo excelente e imperdível "Time"), essa é mais uma produção de LeBron e Maverick Carter da Uninterrupted, empresa responsável, entre outros, pelo documentário "Neymar - O Caos Perfeito".
Em três episódios, o documentário é um olhar íntimo sobre a vida de uma das mais dotadas e complexas atletas da sua geração. Uma perspetiva sobre as duras decisões e os incríveis triunfos que definem Naomi Osaka simultaneamente como uma superestrela de elite mundial e uma jovem que precisa lidar com uma enorme pressão graças ao mundo conectado de hoje. Confira o trailer:
Com uma linha narrativa bem construída, mas sem se aprofundar muito nos assuntos levantados pelo roteiro, a série segue uma linha bem de observação, com pouca ou nenhuma influência da diretora na condução da história, fazendo com que a audiência seja um olhar curioso sobre o dia a dia da atleta. Através de um acesso inédito, Bradley acompanha Osaka durante dois anos - talvez os mais importantes na vida dela até aqui. São os anos de transformação esportiva, mas também uma época onde ela começa a encontrar a sua voz e compreender seu poder como referência na modalidade.
O interessante é que vemos a preparação para defender os dois títulos de Grand Slam que ela conquistou no ano anterior, da mesma forma em que ela se coloca como defensora dos direitos humanos usando máscaras com o nome de pessoas afro-americanas que perderam suas vidas covardemente. Outro ponto interessante é o seu processo de luto pela perda inesperada do seu mentor e amigo Kobe Bryant - e como isso impactou na sua performance nas quadras. Talvez o pouco esforço do roteiro em humanizar Osaka seja uma das coisas mais surpreendentes da narrativa (diferente do documentário de Neymar, por exemplo) - sua relação com a tenista americana de 15 anos, Cori Gauff, é real e muito bacana por isso. Quando Osaka perde para Gauff, sua naturalidade em dizer o quanto aquilo foi ruim, mesmo gostando da adversária, é muito honesto!
Com essa abordagem empática, "Naomi Osaka: Estrela do Tênis" brilha pelas curiosidades: seja pelo infernal programa de treinos e viagens, ou pela exploração de todas as camadas de pressão que a atleta está sujeita - é de se compreender o histórico de ansiedade, medos, perdas, derrotas, reinvenção, vitórias e posicionamento perante a importância da saúde mental que Osaka encabeçou ao lado de Simone Biles. Ela mesmo faz uma auto-avaliação sobre a necessidade de desenvolver seu mindset vencedor para mudar de patamar como atleta.
O fato é que, pelo esporte, pela figura marcante e pelo aprendizado, a minissérie vale muito a pena!
"Nasce uma Estrela" começa com um jeitão de comédia romântica, meio que no estilo "Nothing Hill" sabe?!!! Vem com aquela levada de "conto de fadas moderno" adaptada para universo da música, onde o Pop Star (famoso, rico e bonito) se apaixona pela garota normal, mas muito talentosa, que canta nos bares da noite após dar um duro danado durante o dia inteiro, aguentando o chefe idiota e a difícil batalha cotidiana da vida normal!!! Sim, eu sei que, pela rápida sinopse, parece o típico filme "Sessão da Tarde" que já cansamos de assistir... mas, te garanto, a superficialidade do enredo acaba justamente por aí, ou melhor, ela vai se transformando em algo muito mais intenso!!!
"Nasce uma Estrela" tem o mérito de revisitar uma história que já foi contada no cinema pelo menos três vezes, mas vem com um novo olhar e, principalmente, com uma sensibilidade muito interessante, diferente. Com o desenrolar do filme, vamos sendo apresentados às várias camadas dos personagens e das situações que os rodeiam e conforme você vai conhecendo cada uma delas, vai se aprofundando e entendendo dramas mais complexos do que parecem - aí fica fácil perceber porque ganhou mais de 50 prêmios em Festivais ao redor do Mundo e porque está indicado em 8 categorias do Oscar, inclusive como melhor filme!!!
O Filme traz em primeiro plano o sonho de um amor improvável, da imperdível chance de mostrar um talento escondido, mas logo trás à tona o drama do alcoolismo, da insegurança da perda de personalidade. Ao mesmo tempo que trás a sedução do sucesso, mostra o constrangimento do fracasso. Fala sobre cumplicidade familiar, mas também escancara as feridas de um passado marcado por decepções. O genial é que tudo isso está personificado nos dois personagens principais e em duas excelentes atuações: Bradley Cooper como Jack e Lady Gaga como Allie - aliás, Lady Gaga foi uma notável surpresa... a primeira cena dela mostra até um pouco de insegurança, mas depois ela vai ganhando força, encontrando o caminho, o tom certo! Já o Bradley Cooper, talvez tenha feito o melhor papel dele.
"Nasce uma Estrela" ainda tem "Shallow" concorrendo como Melhor Canção (e tem tudo para levar), Melhor Edição de Som (esquece) , Melhor Roteiro Adaptado (aqui também pode levar), Melhor Fotografia (duvido) e Melhor Ator Coadjuvante, com o também excelente Sam Elliott (que corre por fora, mas não seria uma surpresa se levasse). Uma categoria que senti falta na indicação foi a de Melhor Diretor - talvez por puro preconceito. Bradley Cooper fez um excelente trabalho, foi indicado em todos os prêmios até agora e, para mim, foi até melhor que o Bryan Singer em Bohemian Rhapsody, principalmente nas cenas de palco onde a comparação é inevitável. Está certo que são câmeras diferentes: a do Cooper é mais solta, mais orgânica; a do Singer, é mais fixa, ensaiada, porém muito inventiva - pessoalmente, gosto mais da escolha do Cooper: tem uns planos sequência, onde ele deixa aquele flare das luzes do palco interferirem na lente no meio da narrativa, de uma forma tão natural, que fica lindo!!!
Enfim, "Nasce uma Estrela" é um filme que transita por um universo bastante seguro, porque é praticamente impossível, quem assiste, não se importar (e não sofrer) com a história da protagonista. Cooper sabia disso e conduziu a história de uma maneira bem bacana - tecnicamente é muito bem realizado - até melhor que Bohemian.
Olha, é um excelente entretenimento, fácil de se emocionar!
Up-date: "Nasce uma Estrela" ganhou em uma categoria no Oscar 2019: Melhor Canção!
"Nasce uma Estrela" começa com um jeitão de comédia romântica, meio que no estilo "Nothing Hill" sabe?!!! Vem com aquela levada de "conto de fadas moderno" adaptada para universo da música, onde o Pop Star (famoso, rico e bonito) se apaixona pela garota normal, mas muito talentosa, que canta nos bares da noite após dar um duro danado durante o dia inteiro, aguentando o chefe idiota e a difícil batalha cotidiana da vida normal!!! Sim, eu sei que, pela rápida sinopse, parece o típico filme "Sessão da Tarde" que já cansamos de assistir... mas, te garanto, a superficialidade do enredo acaba justamente por aí, ou melhor, ela vai se transformando em algo muito mais intenso!!!
"Nasce uma Estrela" tem o mérito de revisitar uma história que já foi contada no cinema pelo menos três vezes, mas vem com um novo olhar e, principalmente, com uma sensibilidade muito interessante, diferente. Com o desenrolar do filme, vamos sendo apresentados às várias camadas dos personagens e das situações que os rodeiam e conforme você vai conhecendo cada uma delas, vai se aprofundando e entendendo dramas mais complexos do que parecem - aí fica fácil perceber porque ganhou mais de 50 prêmios em Festivais ao redor do Mundo e porque está indicado em 8 categorias do Oscar, inclusive como melhor filme!!!
O Filme traz em primeiro plano o sonho de um amor improvável, da imperdível chance de mostrar um talento escondido, mas logo trás à tona o drama do alcoolismo, da insegurança da perda de personalidade. Ao mesmo tempo que trás a sedução do sucesso, mostra o constrangimento do fracasso. Fala sobre cumplicidade familiar, mas também escancara as feridas de um passado marcado por decepções. O genial é que tudo isso está personificado nos dois personagens principais e em duas excelentes atuações: Bradley Cooper como Jack e Lady Gaga como Allie - aliás, Lady Gaga foi uma notável surpresa... a primeira cena dela mostra até um pouco de insegurança, mas depois ela vai ganhando força, encontrando o caminho, o tom certo! Já o Bradley Cooper, talvez tenha feito o melhor papel dele.
"Nasce uma Estrela" ainda tem "Shallow" concorrendo como Melhor Canção (e tem tudo para levar), Melhor Edição de Som (esquece) , Melhor Roteiro Adaptado (aqui também pode levar), Melhor Fotografia (duvido) e Melhor Ator Coadjuvante, com o também excelente Sam Elliott (que corre por fora, mas não seria uma surpresa se levasse). Uma categoria que senti falta na indicação foi a de Melhor Diretor - talvez por puro preconceito. Bradley Cooper fez um excelente trabalho, foi indicado em todos os prêmios até agora e, para mim, foi até melhor que o Bryan Singer em Bohemian Rhapsody, principalmente nas cenas de palco onde a comparação é inevitável. Está certo que são câmeras diferentes: a do Cooper é mais solta, mais orgânica; a do Singer, é mais fixa, ensaiada, porém muito inventiva - pessoalmente, gosto mais da escolha do Cooper: tem uns planos sequência, onde ele deixa aquele flare das luzes do palco interferirem na lente no meio da narrativa, de uma forma tão natural, que fica lindo!!!
Enfim, "Nasce uma Estrela" é um filme que transita por um universo bastante seguro, porque é praticamente impossível, quem assiste, não se importar (e não sofrer) com a história da protagonista. Cooper sabia disso e conduziu a história de uma maneira bem bacana - tecnicamente é muito bem realizado - até melhor que Bohemian.
Olha, é um excelente entretenimento, fácil de se emocionar!
Up-date: "Nasce uma Estrela" ganhou em uma categoria no Oscar 2019: Melhor Canção!
Simplesmente sensacional - embora a sensação ao subirem os créditos não seja das mais agradáveis! "Navalny", documentário da HBO em parceira com a CNN e indicado ao Oscar 2023, é um verdadeiro soco no estômago, daqueles difíceis de digerir e capaz de nos provocar as mais diversas emoções em uma jornada que soa até ficção, mas que infelizmente é um retrato dolorido da realidade que representa a política de Valdimir Putin na Rússia.
Aqui conhecemos a história de Alexei Navalny, um dos opositores mais fortes que Putin jamais enfrentou e que, justamente por isso, em 2020, em um voo doméstico da Sibéria para Moscou, foi envenenado com Novichok, uma combinação de substâncias neurotóxicas altamente letal e marca registrada de como o presidente da Rússia trata seus desafetos. Confira o trailer (original):
"Navalny" representa para a política, mais ou menos o que representou "Icarus" para o esporte em 2018 - onde, aliás, o "bandido" era o mesmo! Revelador e muito potente como narrativa, o documentário do diretor Daniel Roher (de "Once Were Brothers: Robbie Robertson & The Band") se propõe a mostrar de uma forma muito honesta, as ideias políticas de Navalny, passando por toda sua estratégia para enfrentar Putin após o evento do envenenamento que quase tirou a sua vida. Roher equilibra muito bem o tom investigativo da história com um recorte mais pessoal do protagonista que expõe sua relação com a mulher e com seus filhos ao mesmo tempo em que precisa lidar com as constantes ameaças que sua posição provoca em seus oponentes.
E acho que aqui cabe um pequeno disclaimer: mesmo sendo muito cuidadoso para não apagar (ou manchar) a aura de "salvador da pátria" de Navalny, Roher não se esconde ao trazer para discussão algumas passagens polêmicas do politico como quando ele participou de um evento nacionalista com inspirações neonazistas ou quando ele discute com sua RP sobre a forma com que está transmitindo suas mensagens no documentário (aqui sem saber que câmera estava ligada e gravando a conversa). Veja, ninguém é santo, muito menos políticos (e estamos cansados de saber disso), porém o foco aqui vai além dos fatos em si, já que o plot se apoia em como hoje em dia é possível criar e capilarizar um discurso capaz de incomodar até aqueles que se acham intocáveis - reparem como Navalny e sua equipe lidam com as informações usando todos os canais de comunicação eletrônica, e seus respectivos públicos, com muita inteligência e, principalmente, coerência.
Como em "Icarus", alguns momentos são incrivelmente marcantes (para não dizer históricos) - é o caso da ligação entre o protagonista e um cientista, aliado de Putin, que trabalhou na missão de envenená-lo. O fato é que "Navalny" consegue trazer para os holofotes um assunto relevante para o futuro da geopolítica mundial e que mais uma vez expõe o modus operandi de um ser-humano que foi agente da KGB, chefe dos serviços secretos soviético e que hoje comanda um país tão forte como a Rússia. Se o documentário será um instrumento de mudança, é difícil saber, mas que ele, de alguma forma, vai provocar muita reflexão, isso é inegável!
Daqueles imperdíveis! Vale muito o seu play!
Up-date: "Navalny" foi o grande vencedor do Oscar 2023 na categoria "Melhor Documentário"!
Simplesmente sensacional - embora a sensação ao subirem os créditos não seja das mais agradáveis! "Navalny", documentário da HBO em parceira com a CNN e indicado ao Oscar 2023, é um verdadeiro soco no estômago, daqueles difíceis de digerir e capaz de nos provocar as mais diversas emoções em uma jornada que soa até ficção, mas que infelizmente é um retrato dolorido da realidade que representa a política de Valdimir Putin na Rússia.
Aqui conhecemos a história de Alexei Navalny, um dos opositores mais fortes que Putin jamais enfrentou e que, justamente por isso, em 2020, em um voo doméstico da Sibéria para Moscou, foi envenenado com Novichok, uma combinação de substâncias neurotóxicas altamente letal e marca registrada de como o presidente da Rússia trata seus desafetos. Confira o trailer (original):
"Navalny" representa para a política, mais ou menos o que representou "Icarus" para o esporte em 2018 - onde, aliás, o "bandido" era o mesmo! Revelador e muito potente como narrativa, o documentário do diretor Daniel Roher (de "Once Were Brothers: Robbie Robertson & The Band") se propõe a mostrar de uma forma muito honesta, as ideias políticas de Navalny, passando por toda sua estratégia para enfrentar Putin após o evento do envenenamento que quase tirou a sua vida. Roher equilibra muito bem o tom investigativo da história com um recorte mais pessoal do protagonista que expõe sua relação com a mulher e com seus filhos ao mesmo tempo em que precisa lidar com as constantes ameaças que sua posição provoca em seus oponentes.
E acho que aqui cabe um pequeno disclaimer: mesmo sendo muito cuidadoso para não apagar (ou manchar) a aura de "salvador da pátria" de Navalny, Roher não se esconde ao trazer para discussão algumas passagens polêmicas do politico como quando ele participou de um evento nacionalista com inspirações neonazistas ou quando ele discute com sua RP sobre a forma com que está transmitindo suas mensagens no documentário (aqui sem saber que câmera estava ligada e gravando a conversa). Veja, ninguém é santo, muito menos políticos (e estamos cansados de saber disso), porém o foco aqui vai além dos fatos em si, já que o plot se apoia em como hoje em dia é possível criar e capilarizar um discurso capaz de incomodar até aqueles que se acham intocáveis - reparem como Navalny e sua equipe lidam com as informações usando todos os canais de comunicação eletrônica, e seus respectivos públicos, com muita inteligência e, principalmente, coerência.
Como em "Icarus", alguns momentos são incrivelmente marcantes (para não dizer históricos) - é o caso da ligação entre o protagonista e um cientista, aliado de Putin, que trabalhou na missão de envenená-lo. O fato é que "Navalny" consegue trazer para os holofotes um assunto relevante para o futuro da geopolítica mundial e que mais uma vez expõe o modus operandi de um ser-humano que foi agente da KGB, chefe dos serviços secretos soviético e que hoje comanda um país tão forte como a Rússia. Se o documentário será um instrumento de mudança, é difícil saber, mas que ele, de alguma forma, vai provocar muita reflexão, isso é inegável!
Daqueles imperdíveis! Vale muito o seu play!
Up-date: "Navalny" foi o grande vencedor do Oscar 2023 na categoria "Melhor Documentário"!
"Night Stalker" talvez seja a minissérie estilo "true crime" que mais tenha me impressionado. Não sei se pela história em si, mas pelo fato de se tratar de um assassino em série que (aparentemente) não seguia um padrão para escolher suas vitimas, mas que tinha métodos cruéis, muitas vezes sádicos e que, justamente por isso, acabou ganhando o status de ser a representação mais próxima do mal na figura de um ser humano.
Essa minissérie documental da Netflix foi dividida em quatro episódios de cerca de 45 minutos e conta os detalhes da investigação e da incansável busca por um serial killer que ganhou o apelido de "Night Stalker". Na década de 80, em Los Angeles, na Califórnia, a população passou anos amedrontada por existir um assassino que perseguia carros, invadia casas durante a noite e matava mulheres, homens, idosos, jovens, além de molestar e abusar de crianças. Ele usava facas, armas de fogo, algemas de dedos e inúmeros outros objetos para cometer os crimes. Foram mais de 40 vítimas, entre os homicídios e as que sobreviveram, o que fez com que os investigadores Gil Carrillo e Frank Salerno iniciassem uma verdadeira caçada para prender o criminoso. Confira o trailer (em inglês):
Os diretores Tiller Russell e James Carroll escolheram o "docudrama" como conceito narrativo, o que, de fato, nos coloca dentro daquele tenebroso universo como se estivéssemos assistindo um filme de ficção - e isso é muito bacana. Ao misturar cenas de arquivo com representações extremamente dramáticas, muitas vezes angustiantes até, a edição cria uma dinâmica bastante interessante que ajuda a nos prender do começo ao fim. O fato do roteiro apresentar os principais investigadores do caso, Gil Carrillo, que estava em seu primeiro trabalho no departamento de homicídios, e o famoso investigador da época, Frank Salermo, a quem todos respeitavam, como narradores, faz a história ter uma personalidade, uma cara - são tantos flashbacks, histórias pessoais, comentários sinceros e emocionantes, que fica fácil criar um vínculo afetivo com esses personagens.
Ao entrar no arco narrativo principal, as coisas ficam bem mais pesadas: existe muita crueldade nos crimes. A história choca, é brutal e o fato do documentário intercalar depoimentos de familiares das vitimas com sobreviventes e com os investigadores, tudo ganha uma carga emotiva muito grande. Agora, é preciso ressaltar que mesmo sendo um caso muito complexo, os diretores nos conduzem com muita facilidade por vários detalhes da investigação sem precisar maiores explicações - fica tudo muito claro. Dito isso, a recomendação vem acompanhada de um rápido aviso: vale a pena para quem gosta de minisséries de crimes reais, mas ao mesmo tempo esteja preparado para encarar uma jornada pesada, com muitas fotos e detalhes dos crimes que podem impressionar (começando pela fisionomia do próprio assassino, reparem)!
"Night Stalker" talvez seja a minissérie estilo "true crime" que mais tenha me impressionado. Não sei se pela história em si, mas pelo fato de se tratar de um assassino em série que (aparentemente) não seguia um padrão para escolher suas vitimas, mas que tinha métodos cruéis, muitas vezes sádicos e que, justamente por isso, acabou ganhando o status de ser a representação mais próxima do mal na figura de um ser humano.
Essa minissérie documental da Netflix foi dividida em quatro episódios de cerca de 45 minutos e conta os detalhes da investigação e da incansável busca por um serial killer que ganhou o apelido de "Night Stalker". Na década de 80, em Los Angeles, na Califórnia, a população passou anos amedrontada por existir um assassino que perseguia carros, invadia casas durante a noite e matava mulheres, homens, idosos, jovens, além de molestar e abusar de crianças. Ele usava facas, armas de fogo, algemas de dedos e inúmeros outros objetos para cometer os crimes. Foram mais de 40 vítimas, entre os homicídios e as que sobreviveram, o que fez com que os investigadores Gil Carrillo e Frank Salerno iniciassem uma verdadeira caçada para prender o criminoso. Confira o trailer (em inglês):
Os diretores Tiller Russell e James Carroll escolheram o "docudrama" como conceito narrativo, o que, de fato, nos coloca dentro daquele tenebroso universo como se estivéssemos assistindo um filme de ficção - e isso é muito bacana. Ao misturar cenas de arquivo com representações extremamente dramáticas, muitas vezes angustiantes até, a edição cria uma dinâmica bastante interessante que ajuda a nos prender do começo ao fim. O fato do roteiro apresentar os principais investigadores do caso, Gil Carrillo, que estava em seu primeiro trabalho no departamento de homicídios, e o famoso investigador da época, Frank Salermo, a quem todos respeitavam, como narradores, faz a história ter uma personalidade, uma cara - são tantos flashbacks, histórias pessoais, comentários sinceros e emocionantes, que fica fácil criar um vínculo afetivo com esses personagens.
Ao entrar no arco narrativo principal, as coisas ficam bem mais pesadas: existe muita crueldade nos crimes. A história choca, é brutal e o fato do documentário intercalar depoimentos de familiares das vitimas com sobreviventes e com os investigadores, tudo ganha uma carga emotiva muito grande. Agora, é preciso ressaltar que mesmo sendo um caso muito complexo, os diretores nos conduzem com muita facilidade por vários detalhes da investigação sem precisar maiores explicações - fica tudo muito claro. Dito isso, a recomendação vem acompanhada de um rápido aviso: vale a pena para quem gosta de minisséries de crimes reais, mas ao mesmo tempo esteja preparado para encarar uma jornada pesada, com muitas fotos e detalhes dos crimes que podem impressionar (começando pela fisionomia do próprio assassino, reparem)!
Uma série divertida, inteligente, gostosa de assistir! "Ninguém Quer" poderia facilmente cair nos clichês clássicos da comédia romântica moderna, mas evita atalhos ao construir uma jornada deliciosa onde dois protagonistas, com visões de mundo radicalmente diferentes, fazem o básico para que qualquer relação dê certo: conversam sobre seus sentimentos sem medo de expor suas inseguranças, e conforme vão se conhecendo, vão se apaixonando ainda mais - consequentemente, a audiência também! "Nobody Wants This" (no original), criada por Erin Foster para a Netflix, é sim uma comédia romântica, mas que sabe fazer do drama um gatilho para suas intervenções mais sarcásticas e com isso navegar pelas complexidades dos relacionamentos com uma abordagem mais espirituosa e provocadora, sem nunca pesar na mão.
A trama segue o encontro inesperado entre Noah Roklov (Adam Brody) e Joanne (Kristen Bell), que rapidamente se transforma em um relacionamento tão cheio de desafios quanto de descobertas. Noah é um rabino progressista que tenta conciliar sua vida espiritual com as demandas da comunidade que lidera, enquanto Joanne é uma personalidade extravagante cuja visão cínica sobre o amor e a religião colide constantemente com as crenças de Noah. A dinâmica entre eles, embora improvável, gera momentos cômicos de um lado e profundamente tocantes do outro, e a medida que ambos enfrentam seus próprios preconceitos e fantasmas do passado, tudo ganha ainda mais graça. Confira o trailer:
Ao apresentar uma inusitada conexão entre um rabino, líder espiritual introspectivo e idealista, e uma mulher irreverente, barulhenta e agnóstica, conhecida por um podcast de sucesso que fala abertamente sobre sexo e relacionamentos, a série nem precisa se esforçar para se beneficiar de uma combinação certeira de humor ácido, diálogos afiados e reflexões sobre fé, amor e identidade. Erin Foster, de fato, cria um roteiro que equilibra habilmente esse tipo de humor com uma certa reflexão sem ser maçante. Os diálogos são rápidos e repletos de sarcasmo, mas também há espaço para momentos mais suaves com um toque emocional que nos atingem sem dó - repare como os personagens analisam suas escolhas e questionam o que realmente desejam na vida, da mesma forma como em algum momento já fizemos algo parecido.
Kristen Bell brilha como Joanne, trazendo uma energia vibrante e caótica que contrasta perfeitamente com o personagem meticuloso e ponderado de Adam Brody. Bell entrega uma performance que mistura irreverência com uma vulnerabilidade surpreendente, revelando as camadas emocionais por trás de uma fachada auto-suficiente. Brody, por sua vez, captura a complexidade de Noah, equilibrando seu idealismo e respeito pelas tradições familiares com dúvidas e inseguranças que tornam o personagem profundamente humano. E a química entre os dois, olha, é surpreendente - essa relação cheia de atrito e humor é o coração pulsante da série. Ah, Justine Lupe, a Morgan, irmã de Joanne, também brilha - ela é um ótimo contraponto para as dúvidas e surtos da irmã, eu diria até que ela é aquele tipo de conselheira que fala as verdades necessárias mesmo quando a gente não quer ouvir. Sabe?
"Ninguém Quer" enfatiza a intimidade e as nuances de um relacionamento que reflete mundos opostos de forma leve. Obviamente que aquele retrato é muito mais idealizado do que a vida como ela é, no entanto esse tom talvez seja a razão que vai fazer com que aqueles fãs de um bom romance não desgrudem da tela ou percam aquele sorrisinho no rosto. Importante, com o fim da primeira temporada daria pra encerrar a história e todo mundo ficaria feliz, mas, considerando o seu sucesso em poucos dias após a estreia, a Netflix já encomendou mais histórias de Joanne e Noah, só espero que a qualidade não diminua!
Vale muito o seu play!
Uma série divertida, inteligente, gostosa de assistir! "Ninguém Quer" poderia facilmente cair nos clichês clássicos da comédia romântica moderna, mas evita atalhos ao construir uma jornada deliciosa onde dois protagonistas, com visões de mundo radicalmente diferentes, fazem o básico para que qualquer relação dê certo: conversam sobre seus sentimentos sem medo de expor suas inseguranças, e conforme vão se conhecendo, vão se apaixonando ainda mais - consequentemente, a audiência também! "Nobody Wants This" (no original), criada por Erin Foster para a Netflix, é sim uma comédia romântica, mas que sabe fazer do drama um gatilho para suas intervenções mais sarcásticas e com isso navegar pelas complexidades dos relacionamentos com uma abordagem mais espirituosa e provocadora, sem nunca pesar na mão.
A trama segue o encontro inesperado entre Noah Roklov (Adam Brody) e Joanne (Kristen Bell), que rapidamente se transforma em um relacionamento tão cheio de desafios quanto de descobertas. Noah é um rabino progressista que tenta conciliar sua vida espiritual com as demandas da comunidade que lidera, enquanto Joanne é uma personalidade extravagante cuja visão cínica sobre o amor e a religião colide constantemente com as crenças de Noah. A dinâmica entre eles, embora improvável, gera momentos cômicos de um lado e profundamente tocantes do outro, e a medida que ambos enfrentam seus próprios preconceitos e fantasmas do passado, tudo ganha ainda mais graça. Confira o trailer:
Ao apresentar uma inusitada conexão entre um rabino, líder espiritual introspectivo e idealista, e uma mulher irreverente, barulhenta e agnóstica, conhecida por um podcast de sucesso que fala abertamente sobre sexo e relacionamentos, a série nem precisa se esforçar para se beneficiar de uma combinação certeira de humor ácido, diálogos afiados e reflexões sobre fé, amor e identidade. Erin Foster, de fato, cria um roteiro que equilibra habilmente esse tipo de humor com uma certa reflexão sem ser maçante. Os diálogos são rápidos e repletos de sarcasmo, mas também há espaço para momentos mais suaves com um toque emocional que nos atingem sem dó - repare como os personagens analisam suas escolhas e questionam o que realmente desejam na vida, da mesma forma como em algum momento já fizemos algo parecido.
Kristen Bell brilha como Joanne, trazendo uma energia vibrante e caótica que contrasta perfeitamente com o personagem meticuloso e ponderado de Adam Brody. Bell entrega uma performance que mistura irreverência com uma vulnerabilidade surpreendente, revelando as camadas emocionais por trás de uma fachada auto-suficiente. Brody, por sua vez, captura a complexidade de Noah, equilibrando seu idealismo e respeito pelas tradições familiares com dúvidas e inseguranças que tornam o personagem profundamente humano. E a química entre os dois, olha, é surpreendente - essa relação cheia de atrito e humor é o coração pulsante da série. Ah, Justine Lupe, a Morgan, irmã de Joanne, também brilha - ela é um ótimo contraponto para as dúvidas e surtos da irmã, eu diria até que ela é aquele tipo de conselheira que fala as verdades necessárias mesmo quando a gente não quer ouvir. Sabe?
"Ninguém Quer" enfatiza a intimidade e as nuances de um relacionamento que reflete mundos opostos de forma leve. Obviamente que aquele retrato é muito mais idealizado do que a vida como ela é, no entanto esse tom talvez seja a razão que vai fazer com que aqueles fãs de um bom romance não desgrudem da tela ou percam aquele sorrisinho no rosto. Importante, com o fim da primeira temporada daria pra encerrar a história e todo mundo ficaria feliz, mas, considerando o seu sucesso em poucos dias após a estreia, a Netflix já encomendou mais histórias de Joanne e Noah, só espero que a qualidade não diminua!
Vale muito o seu play!
Antes de mais nada é preciso dizer: "No Limite - A História de Ernie Davis" é excelente! Para quem gosta de um filme que vai além do "pano de fundo" que nesse caso, mais uma vez, é o futebol americano, é imperdível. Ele é uma mistura de "Rudy" com "Como um domingo qualquer" - e se você sabe do que eu estou falando, não demore para dar o play; mas se você não sabe, você vai encontrar uma linda e emocionante jornada de perseverança, ética, disciplina, foco e, principalmente, honra!
"The Express" (no original) conta a história real de superação e talento de Ernie Davis (vivido quando criança por Justin Martin e quando adulto por Rob Brown), um jogador de futebol americano que quebrou barreiras raciais nos anos 60. Ele foi o primeiro atleta negro a receber o Troféu Heisman, concedido aos melhores jogadores universitários. Sua luta pela igualdade e respeito mudou a essência do esporte norte-americano; e até hoje a vida deste jovem continua inspirando novas gerações. Criado em meio à pobreza, Ernie teve de superar obstáculos econômicos e sociais para se tornar um dos melhores “running backs” (posição de corredor) da história do futebol americano universitário. Guiado pelo lendário técnico Ben Schwartzwalder (Dennis Quaid), homem de personalidade forte e dono de um instinto de campeão, Davis aprimora suas habilidades e dá início a uma escalada dentro do esporte. Só que, no meio do percurso, o vencedor se depara com um golpe do destino que poderá impedi-lo de continuar a carreira de jogador e, até mesmo, de viver. Confira o trailer (em inglês):
Com a duplamente complicada missão de adaptar um livro (de Robert Gallagher, publicado originalmente em 1983) e escrever uma cinebiografia, o roteiro deCharles Leavitt é muito inteligente em equilibrar perfeitamente a discriminação racial nos EUA durante a vigência das leis segregacionistas de Jim Crow com a ascensão esportiva de Ernie como símbolo de sua época para as crianças e jovens negros - e aqui cabe uma observação importante: o roteiro, mesmo apegado a uma fórmula já conhecida de histórias de superação e embate social por direitos iguais, corta um enorme caminho ao estabelecer a enorme capacidade esportiva de Ernie desde o início, não perdendo tempo com treinamentos ou momentos de superação física. Essa escolha permite mais tempo de tela para que o filme trabalhe o tema do preconceito a todo momento.
As sequências de futebol americano, são muito bem realizadas pelo diretor Gary Fleder - o mais próximo que encontrei até aqui do excelente "Como um domingo qualquer" do Oliver Stone. Quanto ao elenco, algumas observações: Dennis Quais está ótimo mais uma vez - ele funciona muito bem para pontuar um tipo de racismo que sequer percebemos como racismo. Rob Brown, entrega um Ernie Davis humano, equilibrado na performance, sem estereotipar o personagem e profundo na construção de um mito com muita sensibilidade. E ainda temos Chadwick Boseman em seu primeiro papel deno cinema com uma relevante participação, embora com falas de poucos minutos somente no final do filme.
"No Limite - A História de Ernie Davis" é emocionante ao mesmo tempo em que não se envergonha de usar o texto para passar de forma bem clara sua mensagem, deixando, inclusive, o futebol americano de lado para alcançar esse objetivo - certamente com mais propriedade que produções como "Talento e Fé" e até "Coach Carter". Eu diria, inclusive, que o filme poderia tranquilamente ser um episódio de "Small Axe" pela qualidade técnica e artística, e pela mensagem direta e coerente!
Vale muito a pena!
Antes de mais nada é preciso dizer: "No Limite - A História de Ernie Davis" é excelente! Para quem gosta de um filme que vai além do "pano de fundo" que nesse caso, mais uma vez, é o futebol americano, é imperdível. Ele é uma mistura de "Rudy" com "Como um domingo qualquer" - e se você sabe do que eu estou falando, não demore para dar o play; mas se você não sabe, você vai encontrar uma linda e emocionante jornada de perseverança, ética, disciplina, foco e, principalmente, honra!
"The Express" (no original) conta a história real de superação e talento de Ernie Davis (vivido quando criança por Justin Martin e quando adulto por Rob Brown), um jogador de futebol americano que quebrou barreiras raciais nos anos 60. Ele foi o primeiro atleta negro a receber o Troféu Heisman, concedido aos melhores jogadores universitários. Sua luta pela igualdade e respeito mudou a essência do esporte norte-americano; e até hoje a vida deste jovem continua inspirando novas gerações. Criado em meio à pobreza, Ernie teve de superar obstáculos econômicos e sociais para se tornar um dos melhores “running backs” (posição de corredor) da história do futebol americano universitário. Guiado pelo lendário técnico Ben Schwartzwalder (Dennis Quaid), homem de personalidade forte e dono de um instinto de campeão, Davis aprimora suas habilidades e dá início a uma escalada dentro do esporte. Só que, no meio do percurso, o vencedor se depara com um golpe do destino que poderá impedi-lo de continuar a carreira de jogador e, até mesmo, de viver. Confira o trailer (em inglês):
Com a duplamente complicada missão de adaptar um livro (de Robert Gallagher, publicado originalmente em 1983) e escrever uma cinebiografia, o roteiro deCharles Leavitt é muito inteligente em equilibrar perfeitamente a discriminação racial nos EUA durante a vigência das leis segregacionistas de Jim Crow com a ascensão esportiva de Ernie como símbolo de sua época para as crianças e jovens negros - e aqui cabe uma observação importante: o roteiro, mesmo apegado a uma fórmula já conhecida de histórias de superação e embate social por direitos iguais, corta um enorme caminho ao estabelecer a enorme capacidade esportiva de Ernie desde o início, não perdendo tempo com treinamentos ou momentos de superação física. Essa escolha permite mais tempo de tela para que o filme trabalhe o tema do preconceito a todo momento.
As sequências de futebol americano, são muito bem realizadas pelo diretor Gary Fleder - o mais próximo que encontrei até aqui do excelente "Como um domingo qualquer" do Oliver Stone. Quanto ao elenco, algumas observações: Dennis Quais está ótimo mais uma vez - ele funciona muito bem para pontuar um tipo de racismo que sequer percebemos como racismo. Rob Brown, entrega um Ernie Davis humano, equilibrado na performance, sem estereotipar o personagem e profundo na construção de um mito com muita sensibilidade. E ainda temos Chadwick Boseman em seu primeiro papel deno cinema com uma relevante participação, embora com falas de poucos minutos somente no final do filme.
"No Limite - A História de Ernie Davis" é emocionante ao mesmo tempo em que não se envergonha de usar o texto para passar de forma bem clara sua mensagem, deixando, inclusive, o futebol americano de lado para alcançar esse objetivo - certamente com mais propriedade que produções como "Talento e Fé" e até "Coach Carter". Eu diria, inclusive, que o filme poderia tranquilamente ser um episódio de "Small Axe" pela qualidade técnica e artística, e pela mensagem direta e coerente!
Vale muito a pena!
"Nocaute" é um excelente exemplo daquele tipo de filme que bastam algumas cenas para você já saber exatamente tudo que vai acontecer durante os 120 minutos de jornada do protagonista! Mas isso faz do filme uma experiência ruim? Não vejo dessa forma, até porquê estamos falando de um estilo de filme bem específico, mas é inegável que a enorme quantidade de clichês narrativos nos dá a sensação de que já assistimos aquela história, com aqueles tipos de personagens e ainda assim nos divertimos com tudo isso. O que eu quero dizer é que a história é do lutador Billy Hope, mas poderia ser de Adonis "Creed" Johnson ou até de Rocky Balboa. Pegou?
Billy "The Great" Hope (Jake Gyllenhaal), é um fenômeno do boxe. Um lutador com 43 vitórias e nenhuma derrota que trilhou o seu caminho rumo ao título de campeão mundial enquanto enfrentava diversas tragédias em sua vida pessoal. Após um evento traumático, Hope perde tudo, inclusive o respeito como atleta; é quando ele é forçado a voltar a lutar para tentar reconquistar a guarda e o amor de sua filha, em uma verdadeira cruzada na busca pela redenção. Confira o trailer:
Dirigido pelo inconstante Antoine Fuqua (de "Dia da Treinamento"), "Southpaw" (no original) é um verdadeiro "filme de ator" - e nesse ponto é visível o esforço de Gyllenhaal para transformar um roteiro mediano (por tudo que comentei acima) em um projeto 100% pessoal. Fico imaginando Gyllenhaal lendo o roteiro e pensando: esse é o meu "Touro Indomável", basta eu me transformar fisicamente como Robert De Niro, trabalhar minha enorme capacidade de atuação, equilibrando momentos de introspecção com algumas explosões emocionais (e físicas), para não exagerar no overacting,que meu Oscar está garantido! Acontece que mesmo com o bom trabalho do ator e com Fuqua impondo um bom ritmo narrativo e lutando (sem trocadilho) para encontrar uma identidade cinematográfica mais requintada, trazendo o "charme" daquela atmosfera novaiorquina do submundo do boxe; a história não se sustenta - ou melhor, não inova e não surpreende.
Essa desconexão entre a qualidade técnica dos realizadores e falta de originalidade da trama que foi desenvolvida pelo Kurt Sutter (de "Sons of Anarchy") certamente distanciou Gyllenhaal do seu objetivo maior, mas pode se dizer que não diminuiu o propósito do filme - o de entreter um público médio. A montagem mais frenética do competente John Refoua (indicado ao Oscar por "Avatar"), a trilha sonora empolgante do saudoso James Horner, repleta de hip-hop e notas de tensão (aquelas que descaradamente pontuam as emoções dos personagens), e a câmera mais nervosa do diretor de fotografia Mauro Fiore (esse sim vencedor do Oscar por "Avatar"), compõem esse cenário envolvente, em muitos momentos, vibrante, e em alguns poucos, emocionante (aliás, para quem é pai de menina, isso fará ainda mais sentido).
“Nocaute” segue a cartilha dos filmes de superação com louvor - quem gosta, gosta muito, e provavelmente vai gostar desse também! Embora não encontre forças suficientes para ser reconhecido como um filme inesquecível, algo como "Creed" (para citar o primo mais novo), podemos dizer que ele cumpre muito bem o seu papel.
"Nocaute" é um excelente exemplo daquele tipo de filme que bastam algumas cenas para você já saber exatamente tudo que vai acontecer durante os 120 minutos de jornada do protagonista! Mas isso faz do filme uma experiência ruim? Não vejo dessa forma, até porquê estamos falando de um estilo de filme bem específico, mas é inegável que a enorme quantidade de clichês narrativos nos dá a sensação de que já assistimos aquela história, com aqueles tipos de personagens e ainda assim nos divertimos com tudo isso. O que eu quero dizer é que a história é do lutador Billy Hope, mas poderia ser de Adonis "Creed" Johnson ou até de Rocky Balboa. Pegou?
Billy "The Great" Hope (Jake Gyllenhaal), é um fenômeno do boxe. Um lutador com 43 vitórias e nenhuma derrota que trilhou o seu caminho rumo ao título de campeão mundial enquanto enfrentava diversas tragédias em sua vida pessoal. Após um evento traumático, Hope perde tudo, inclusive o respeito como atleta; é quando ele é forçado a voltar a lutar para tentar reconquistar a guarda e o amor de sua filha, em uma verdadeira cruzada na busca pela redenção. Confira o trailer:
Dirigido pelo inconstante Antoine Fuqua (de "Dia da Treinamento"), "Southpaw" (no original) é um verdadeiro "filme de ator" - e nesse ponto é visível o esforço de Gyllenhaal para transformar um roteiro mediano (por tudo que comentei acima) em um projeto 100% pessoal. Fico imaginando Gyllenhaal lendo o roteiro e pensando: esse é o meu "Touro Indomável", basta eu me transformar fisicamente como Robert De Niro, trabalhar minha enorme capacidade de atuação, equilibrando momentos de introspecção com algumas explosões emocionais (e físicas), para não exagerar no overacting,que meu Oscar está garantido! Acontece que mesmo com o bom trabalho do ator e com Fuqua impondo um bom ritmo narrativo e lutando (sem trocadilho) para encontrar uma identidade cinematográfica mais requintada, trazendo o "charme" daquela atmosfera novaiorquina do submundo do boxe; a história não se sustenta - ou melhor, não inova e não surpreende.
Essa desconexão entre a qualidade técnica dos realizadores e falta de originalidade da trama que foi desenvolvida pelo Kurt Sutter (de "Sons of Anarchy") certamente distanciou Gyllenhaal do seu objetivo maior, mas pode se dizer que não diminuiu o propósito do filme - o de entreter um público médio. A montagem mais frenética do competente John Refoua (indicado ao Oscar por "Avatar"), a trilha sonora empolgante do saudoso James Horner, repleta de hip-hop e notas de tensão (aquelas que descaradamente pontuam as emoções dos personagens), e a câmera mais nervosa do diretor de fotografia Mauro Fiore (esse sim vencedor do Oscar por "Avatar"), compõem esse cenário envolvente, em muitos momentos, vibrante, e em alguns poucos, emocionante (aliás, para quem é pai de menina, isso fará ainda mais sentido).
“Nocaute” segue a cartilha dos filmes de superação com louvor - quem gosta, gosta muito, e provavelmente vai gostar desse também! Embora não encontre forças suficientes para ser reconhecido como um filme inesquecível, algo como "Creed" (para citar o primo mais novo), podemos dizer que ele cumpre muito bem o seu papel.
"Nomadland" é um filme sobre a solidão - então saiba que aquele aperto no peito quase insuportável vai te acompanhar por quase duas horas!
Ok, mas existe beleza na solidão? A diretora Chloé Zhao, ao lado do jovem fotógrafo Joshua James Richards, tenta mostrar que sim - mesmo apoiada em um drama extremamente denso e introspectivo que além de nos provocar inúmeras reflexões sobre as nossas escolhas ao longo da vida, ainda nos conduz para discussões pertinentes sobre o luto, sobre a saudade e, principalmente, sobre a fragilidade dos relacionamentos (seja entre casais ou com a família) em uma sociedade americana extremamente capitalista que nos inunda de expectativas.
Após o colapso econômico de uma cidade na zona rural de Nevada, nos Estados Unidos, em 2011, Fern (Frances McDormand), uma mulher de 60 anos, entra em sua van e parte para a estrada, vivendo uma vida fora da sociedade convencional como uma nômade moderna. Confira o trailer:
A experiência de assistir "Nomadland" é incrivelmente sensorial. A capacidade de Zhao em construir uma narrativa tão profunda, se aproveitando do silêncio, da natureza e da incrível performance de Frances McDormand para conectar visualmente as dores da personagem em passagens muito bem pontuadas com uma trilha sonora maravilhosa, olha, é de tirar o chapéu! Veja, não se trata um filme sobre uma jornada de auto-conhecimento ou superação, se trata de um recorte bastante realista sobre o dia a dia de uma pessoa que "escolheu" estar/ficar sozinha, uma pessoa que perdeu a vontade de se relacionar intimamente e que, para mim, abriu mão da felicidade.
O roteiro da própria Zhao, baseado no livro "Nomadland: Sobrevivendo aos Estados Unidos no século XXI" da autora Jessica Bruder, traz muito do que experienciamos em "Na Natureza Selvagem" (2007) com o mérito de adicionar uma certa dualidade para a discussão. A montagem, também de Zhao (sim, ela fez quase tudo pelo filme e por isso seu Oscar é muito mais do que merecido) sugere uma quebra de linearidade tão orgânica que estabelecer tempo e espaço fica praticamente impossível. O interessante que esse conceito de "simplesmente ver o tempo passar" é justamente o gatilho para refletirmos sobre as escolhas da personagem - o que seria melhor: viver livre e viver mal, entre o trabalho braçal e o ócio criativo, entre o tédio da rotina e o maravilhamento com a natureza, ou simplesmente seguir a cartilha que a sociedade nos impõe mesmo que isso nos sufoque? - o comentário sobre o "barco no quintal" é cirúrgico para fomentar essa discussão. Reparem.
"Nomadland" é duro, difícil e pode parecer muito cadenciado para a maior parte da audiência - mas é viceral! Sua narrativa foi arriscada, com um toque autoral e independente que normalmente gera alguma repulsa no circuito comercial - mas não foi o caso aqui já que o filme custou certa de 5 milhões de dólares e faturou próximo de 8 vezes esse valor. Felizmente, o "singelo" que vemos na tela é tão profundo que nos toca a alma - a sensibilidade de Zhao em nenhum momento ignora a frieza da realidade, mas ao mesmo tempo também se esforça para nos mostrar a magia da escolha de Fern e, de alguma forma, cumpre muito bem esse papel.
Vale muito o seu play.
Up-date: "Nomadland" ganhou em três categorias no Oscar 2021 das seis indicações que recebeu, inclusive como Melhor Filme, Melhor Direção e Melhor Atriz! Aliás, o filme de Zhao ganhou mais de 250 prêmios e recebeu mais de 150 indicações nos mais renomados festivais do mundo.
"Nomadland" é um filme sobre a solidão - então saiba que aquele aperto no peito quase insuportável vai te acompanhar por quase duas horas!
Ok, mas existe beleza na solidão? A diretora Chloé Zhao, ao lado do jovem fotógrafo Joshua James Richards, tenta mostrar que sim - mesmo apoiada em um drama extremamente denso e introspectivo que além de nos provocar inúmeras reflexões sobre as nossas escolhas ao longo da vida, ainda nos conduz para discussões pertinentes sobre o luto, sobre a saudade e, principalmente, sobre a fragilidade dos relacionamentos (seja entre casais ou com a família) em uma sociedade americana extremamente capitalista que nos inunda de expectativas.
Após o colapso econômico de uma cidade na zona rural de Nevada, nos Estados Unidos, em 2011, Fern (Frances McDormand), uma mulher de 60 anos, entra em sua van e parte para a estrada, vivendo uma vida fora da sociedade convencional como uma nômade moderna. Confira o trailer:
A experiência de assistir "Nomadland" é incrivelmente sensorial. A capacidade de Zhao em construir uma narrativa tão profunda, se aproveitando do silêncio, da natureza e da incrível performance de Frances McDormand para conectar visualmente as dores da personagem em passagens muito bem pontuadas com uma trilha sonora maravilhosa, olha, é de tirar o chapéu! Veja, não se trata um filme sobre uma jornada de auto-conhecimento ou superação, se trata de um recorte bastante realista sobre o dia a dia de uma pessoa que "escolheu" estar/ficar sozinha, uma pessoa que perdeu a vontade de se relacionar intimamente e que, para mim, abriu mão da felicidade.
O roteiro da própria Zhao, baseado no livro "Nomadland: Sobrevivendo aos Estados Unidos no século XXI" da autora Jessica Bruder, traz muito do que experienciamos em "Na Natureza Selvagem" (2007) com o mérito de adicionar uma certa dualidade para a discussão. A montagem, também de Zhao (sim, ela fez quase tudo pelo filme e por isso seu Oscar é muito mais do que merecido) sugere uma quebra de linearidade tão orgânica que estabelecer tempo e espaço fica praticamente impossível. O interessante que esse conceito de "simplesmente ver o tempo passar" é justamente o gatilho para refletirmos sobre as escolhas da personagem - o que seria melhor: viver livre e viver mal, entre o trabalho braçal e o ócio criativo, entre o tédio da rotina e o maravilhamento com a natureza, ou simplesmente seguir a cartilha que a sociedade nos impõe mesmo que isso nos sufoque? - o comentário sobre o "barco no quintal" é cirúrgico para fomentar essa discussão. Reparem.
"Nomadland" é duro, difícil e pode parecer muito cadenciado para a maior parte da audiência - mas é viceral! Sua narrativa foi arriscada, com um toque autoral e independente que normalmente gera alguma repulsa no circuito comercial - mas não foi o caso aqui já que o filme custou certa de 5 milhões de dólares e faturou próximo de 8 vezes esse valor. Felizmente, o "singelo" que vemos na tela é tão profundo que nos toca a alma - a sensibilidade de Zhao em nenhum momento ignora a frieza da realidade, mas ao mesmo tempo também se esforça para nos mostrar a magia da escolha de Fern e, de alguma forma, cumpre muito bem esse papel.
Vale muito o seu play.
Up-date: "Nomadland" ganhou em três categorias no Oscar 2021 das seis indicações que recebeu, inclusive como Melhor Filme, Melhor Direção e Melhor Atriz! Aliás, o filme de Zhao ganhou mais de 250 prêmios e recebeu mais de 150 indicações nos mais renomados festivais do mundo.
Que história fantástica! Se você tem mais de 40 anos e é um apaixonado por basquete, esse documentário da HBO Sports, disponível na Max, vai te fazer dar boas gargalhadas. Quando se fala no Dream Team dos Estados Unidos, a lembrança é de um time que esmagou seus adversários nas Olimpíadas de Barcelona em 1992. Liderado por Michael Jordan, Magic Johnson e Larry Bird, o primeiro time olímpico formado por jogadores da NBA se tornou um dos maiores ícones do esporte coletivo mundial. Mas há um detalhe pouco mencionado nessa trajetória: antes de dominar as quadras na Espanha, o Dream Team perdeu um jogo-treino contra um grupo de universitários conhecido como "Select Team". E é justamente essa história que "Nós Derrotamos o Dream Team", busca resgatar.
Dirigido por Michael Tolajian (produtor de "The Last Dance"), o documentário se apoia em imagens de arquivo e depoimentos de quem esteve lá e foi testemunha ocular desse acontecimento esportivo. "Nós Derrotamos o Dream Team" explora como oito jovens talentos do basquete universitário dos EUA conseguiram vencer, ainda que em um jogo treino, o time que mudaria a história do basquete mundial. Entre os entrevistados está Grant Hill, que se tornou um dos maiores jogadores da NBA e que serve como uma espécie de narrador dos eventos, detalhando o impacto desse jogo para todos os envolvidos e para a continuidade do projeto americano de retomar a hegemonia no basquete. Confira o trailer (em inglês):
O contexto histórico é essencial para entender a importância desse episódio. Até 1988, os Estados Unidos enviavam apenas equipes universitárias para torneios internacionais, mas a derrota para a União Soviética na semifinal olímpica daquele ano escancarou a necessidade de mudança. O acordo com a FIBA permitiu que os atletas da NBA representassem seu país nos Jogos, e assim nasceu o Dream Team, uma equipe montada para vencer o que disputar e com larga vantagem. Sabendo que as regras internacionais eram diferentes daquelas praticadas na NBA, o técnico Chuck Daly (ex-Detroit Pistons) resolveu testar seus jogadores em um ambiente controlado. Para isso, reuniu um grupo de universitários de elite, que incluía nomes como Chris Webber, Penny Hardaway e Allan Houston, para enfrentar os astros da NBA em um jogo-treino fechado ao público. O que deveria ser apenas um teste se transformou em um alerta para o Dream Team - acreditem: os jovens venceram a partida.
A grande sacada do documentário é justamente reconstruir a tensão desse momento. Os depoimentos dos jogadores universitários revelam a empolgação de quem sabia que estava vivendo um evento histórico. Já os relatos dos atletas do Dream Team mostram a surpresa e a frustração diante daquela derrota. A narrativa se intensifica ainda mais quando um dos assistentes técnicos de Daly, o emblemático Coach K, sugere que o treinador pode ter planejado algum tipo de situação adversa para acordar seus jogadores. Essa revelação, aliás, adiciona uma camada intrigante ao documentário, levantando questões sobre motivação e estratégia.
Visualmente, "Nós Derrotamos o Dream Team" é bem construído, combinando imagens restauradas da época com entrevistas recentes e algumas intervenções gráficas bem pertinentes. A montagem é outro ponto a se elogiar - ela mantém um ritmo dinâmico, alternando momentos de nostalgia com algumas análises mais técnicas do jogo, mas sempre preservando o bom humor. Além disso, a produção acerta demais ao contextualizar a evolução do basquete internacional, mostrando como esse episódio foi um prenúncio do crescimento do esporte fora dos Estados Unidos. No fim, o documentário não tenta diminuir o impacto do Dream Team, mas sim enriquecer sua história. O jogo contra os universitários foi um momento de vulnerabilidade para um time que parecia invencível, e a forma como reagiram a ele só reforça a grandeza do que conquistaram em Barcelona.
Para os fãs de basquete e de histórias esportivas, "Nós Derrotamos o Dream Team" é um relato fascinante, que mostra que até os gigantes podem tropeçar - e que às vezes, perder faz parte do processo e acaba se tornando essencial para alcançar a glória!
Vale demais o seu play!
Que história fantástica! Se você tem mais de 40 anos e é um apaixonado por basquete, esse documentário da HBO Sports, disponível na Max, vai te fazer dar boas gargalhadas. Quando se fala no Dream Team dos Estados Unidos, a lembrança é de um time que esmagou seus adversários nas Olimpíadas de Barcelona em 1992. Liderado por Michael Jordan, Magic Johnson e Larry Bird, o primeiro time olímpico formado por jogadores da NBA se tornou um dos maiores ícones do esporte coletivo mundial. Mas há um detalhe pouco mencionado nessa trajetória: antes de dominar as quadras na Espanha, o Dream Team perdeu um jogo-treino contra um grupo de universitários conhecido como "Select Team". E é justamente essa história que "Nós Derrotamos o Dream Team", busca resgatar.
Dirigido por Michael Tolajian (produtor de "The Last Dance"), o documentário se apoia em imagens de arquivo e depoimentos de quem esteve lá e foi testemunha ocular desse acontecimento esportivo. "Nós Derrotamos o Dream Team" explora como oito jovens talentos do basquete universitário dos EUA conseguiram vencer, ainda que em um jogo treino, o time que mudaria a história do basquete mundial. Entre os entrevistados está Grant Hill, que se tornou um dos maiores jogadores da NBA e que serve como uma espécie de narrador dos eventos, detalhando o impacto desse jogo para todos os envolvidos e para a continuidade do projeto americano de retomar a hegemonia no basquete. Confira o trailer (em inglês):
O contexto histórico é essencial para entender a importância desse episódio. Até 1988, os Estados Unidos enviavam apenas equipes universitárias para torneios internacionais, mas a derrota para a União Soviética na semifinal olímpica daquele ano escancarou a necessidade de mudança. O acordo com a FIBA permitiu que os atletas da NBA representassem seu país nos Jogos, e assim nasceu o Dream Team, uma equipe montada para vencer o que disputar e com larga vantagem. Sabendo que as regras internacionais eram diferentes daquelas praticadas na NBA, o técnico Chuck Daly (ex-Detroit Pistons) resolveu testar seus jogadores em um ambiente controlado. Para isso, reuniu um grupo de universitários de elite, que incluía nomes como Chris Webber, Penny Hardaway e Allan Houston, para enfrentar os astros da NBA em um jogo-treino fechado ao público. O que deveria ser apenas um teste se transformou em um alerta para o Dream Team - acreditem: os jovens venceram a partida.
A grande sacada do documentário é justamente reconstruir a tensão desse momento. Os depoimentos dos jogadores universitários revelam a empolgação de quem sabia que estava vivendo um evento histórico. Já os relatos dos atletas do Dream Team mostram a surpresa e a frustração diante daquela derrota. A narrativa se intensifica ainda mais quando um dos assistentes técnicos de Daly, o emblemático Coach K, sugere que o treinador pode ter planejado algum tipo de situação adversa para acordar seus jogadores. Essa revelação, aliás, adiciona uma camada intrigante ao documentário, levantando questões sobre motivação e estratégia.
Visualmente, "Nós Derrotamos o Dream Team" é bem construído, combinando imagens restauradas da época com entrevistas recentes e algumas intervenções gráficas bem pertinentes. A montagem é outro ponto a se elogiar - ela mantém um ritmo dinâmico, alternando momentos de nostalgia com algumas análises mais técnicas do jogo, mas sempre preservando o bom humor. Além disso, a produção acerta demais ao contextualizar a evolução do basquete internacional, mostrando como esse episódio foi um prenúncio do crescimento do esporte fora dos Estados Unidos. No fim, o documentário não tenta diminuir o impacto do Dream Team, mas sim enriquecer sua história. O jogo contra os universitários foi um momento de vulnerabilidade para um time que parecia invencível, e a forma como reagiram a ele só reforça a grandeza do que conquistaram em Barcelona.
Para os fãs de basquete e de histórias esportivas, "Nós Derrotamos o Dream Team" é um relato fascinante, que mostra que até os gigantes podem tropeçar - e que às vezes, perder faz parte do processo e acaba se tornando essencial para alcançar a glória!
Vale demais o seu play!
Para muitos esse é o melhor filme brasileiro de 2023! Não sei se iria por essa linha, no entanto posso te garantir: esse é um filme que carrega em sua modesta produção algo que dificilmente encontramos em cinebiografias, especialmente nas realizadas por aqui - "alma"! "Nosso Sonho", dirigido pelo Eduardo Albergaria, pode ter certeza, é uma das biografias musicais brasileiras mais cativantes dos últimos anos. Ao trazer para as telas a história da icônica dupla Claudinho e Buchecha, o filme se encaixa perfeitamente na tendência de produções nacionais que revisitam trajetórias reais, como "Simonal", "Tim Maia" e "Elis", porém com uma sensibilidade ainda maior ao explorar não apenas a trajetória artística, mas a profundidade emocional de uma amizade que definiu uma geração e que deveria servir de exemplo pela sua essência tão especial.
A trama acompanha a vida de Claudinho (Lucas Penteado) e Buchecha (Juan Paiva), dois amigos inseparáveis da periferia fluminense que sonhavam juntos em sair do anonimato através da música. Desde a infância humilde em São Gonçalo até a explosão do sucesso nos anos 90, o filme captura com fidelidade a ascensão meteórica da dupla, que conquistou o país com hits inesquecíveis. Confira o trailer:
Um dos grandes méritos de "Nosso Sonho" está justamente na sua proposta narrativa que não se limita apenas em retratar uma suposta jornada do herói "da pobreza até o sucesso musical" - o filme sabe usar, com muita inteligência, as dificuldades sociais, familiares e emocionais que marcaram a trajetória dos dois artistas apenas para criar um contexto sólido que justifique a forte mensagem por trás da forma como a dupla Claudinho e Buchecha encararam o sucesso. A habilidade do roteiro, assinado por Albergaria e por Mauricio Lissovsky (de "Nise: O Coração da Loucura"), está em equilibrar com precisão momentos leves e divertidos com sequências de forte impacto emocional - especialmente aquelas que antecederam a tragédia da morte precoce de Claudinho. Essa abordagem, muito mais que um recorte superficial, humaniza profundamente os personagens, permitindo que a audiência crie uma conexão verdadeira e intensa com a história da dupla, que vai além do apelo nostálgico para alcançar uma relação de empatia impressionante.
A direção de Albergaria é inteligente e criativa, utilizando técnicas visuais eficazes para recriar o ambiente dos anos 90 com autenticidade. O diretor opta por uma cinematografia vibrante, destacando as cores fortes e o estilo característico da época, se esforçando muito para não cair em excessos caricatos - e aqui cabe um comentário: esse é o tipo do filme que mereceria um orçamento maior. Mesmo que a estética imposta por Albergaria ajude a evocar o clima nostálgico e festivo dos bailes funks em ebulição no Rio de Janeiro, fica claro que o dinheiro não permitiu alcançar outro patamar de produção - uma pena! Ao mesmo tempo, é preciso elogiar, o diretor sabe manipular nossas emoções ao sugerir passagens que ele não teria condições de mostrar com sua câmera - essa escolha conceitual potencializa momentos mais dramáticos, onde o uso de sombras, de planos fechados, de tons mais frios, de silêncio e até de ausência de imagens, ampliam a intensidade emocional.
Outro ponto que merece destaque: Lucas Penteado e Juan Paiva - eles estão excepcionais em seus papéis, com destaque absoluto para a química autêntica entre eles. Penteado brilha ao transmitir a energia magnética de Claudinho, enquanto Paiva traz uma performance igualmente sólida, representando um Buchecha mais introspectivo e emocionalmente complexo. Ambos conseguem capturar com sutileza a essência das personalidades reais, indo muito além de meras imitações. Com uma trilha sonora, que não se limita apenas a reproduzir os grandes hits da dupla, mas que é inteligentemente inserida para impulsionar a narrativa, trazendo um novo significado às letras já conhecidas do público, "Nosso Sonho" pode ser definido como mais do que uma cinebiografia musical padrão, e sim como um filme sobre amizade, perda, superação e, acima de tudo, sobre sonhos compartilhados que tenho certeza, vai te emocionar!
Vale demais o seu play!
Para muitos esse é o melhor filme brasileiro de 2023! Não sei se iria por essa linha, no entanto posso te garantir: esse é um filme que carrega em sua modesta produção algo que dificilmente encontramos em cinebiografias, especialmente nas realizadas por aqui - "alma"! "Nosso Sonho", dirigido pelo Eduardo Albergaria, pode ter certeza, é uma das biografias musicais brasileiras mais cativantes dos últimos anos. Ao trazer para as telas a história da icônica dupla Claudinho e Buchecha, o filme se encaixa perfeitamente na tendência de produções nacionais que revisitam trajetórias reais, como "Simonal", "Tim Maia" e "Elis", porém com uma sensibilidade ainda maior ao explorar não apenas a trajetória artística, mas a profundidade emocional de uma amizade que definiu uma geração e que deveria servir de exemplo pela sua essência tão especial.
A trama acompanha a vida de Claudinho (Lucas Penteado) e Buchecha (Juan Paiva), dois amigos inseparáveis da periferia fluminense que sonhavam juntos em sair do anonimato através da música. Desde a infância humilde em São Gonçalo até a explosão do sucesso nos anos 90, o filme captura com fidelidade a ascensão meteórica da dupla, que conquistou o país com hits inesquecíveis. Confira o trailer:
Um dos grandes méritos de "Nosso Sonho" está justamente na sua proposta narrativa que não se limita apenas em retratar uma suposta jornada do herói "da pobreza até o sucesso musical" - o filme sabe usar, com muita inteligência, as dificuldades sociais, familiares e emocionais que marcaram a trajetória dos dois artistas apenas para criar um contexto sólido que justifique a forte mensagem por trás da forma como a dupla Claudinho e Buchecha encararam o sucesso. A habilidade do roteiro, assinado por Albergaria e por Mauricio Lissovsky (de "Nise: O Coração da Loucura"), está em equilibrar com precisão momentos leves e divertidos com sequências de forte impacto emocional - especialmente aquelas que antecederam a tragédia da morte precoce de Claudinho. Essa abordagem, muito mais que um recorte superficial, humaniza profundamente os personagens, permitindo que a audiência crie uma conexão verdadeira e intensa com a história da dupla, que vai além do apelo nostálgico para alcançar uma relação de empatia impressionante.
A direção de Albergaria é inteligente e criativa, utilizando técnicas visuais eficazes para recriar o ambiente dos anos 90 com autenticidade. O diretor opta por uma cinematografia vibrante, destacando as cores fortes e o estilo característico da época, se esforçando muito para não cair em excessos caricatos - e aqui cabe um comentário: esse é o tipo do filme que mereceria um orçamento maior. Mesmo que a estética imposta por Albergaria ajude a evocar o clima nostálgico e festivo dos bailes funks em ebulição no Rio de Janeiro, fica claro que o dinheiro não permitiu alcançar outro patamar de produção - uma pena! Ao mesmo tempo, é preciso elogiar, o diretor sabe manipular nossas emoções ao sugerir passagens que ele não teria condições de mostrar com sua câmera - essa escolha conceitual potencializa momentos mais dramáticos, onde o uso de sombras, de planos fechados, de tons mais frios, de silêncio e até de ausência de imagens, ampliam a intensidade emocional.
Outro ponto que merece destaque: Lucas Penteado e Juan Paiva - eles estão excepcionais em seus papéis, com destaque absoluto para a química autêntica entre eles. Penteado brilha ao transmitir a energia magnética de Claudinho, enquanto Paiva traz uma performance igualmente sólida, representando um Buchecha mais introspectivo e emocionalmente complexo. Ambos conseguem capturar com sutileza a essência das personalidades reais, indo muito além de meras imitações. Com uma trilha sonora, que não se limita apenas a reproduzir os grandes hits da dupla, mas que é inteligentemente inserida para impulsionar a narrativa, trazendo um novo significado às letras já conhecidas do público, "Nosso Sonho" pode ser definido como mais do que uma cinebiografia musical padrão, e sim como um filme sobre amizade, perda, superação e, acima de tudo, sobre sonhos compartilhados que tenho certeza, vai te emocionar!
Vale demais o seu play!
"Nudes" vai te surpreender! Essa série antológica norueguesa que está disponível na Globoplay, é tão importante quanto impactante. Diferente de "Depois de Lucia" onde os reflexos das fotos (ou vídeos) vazados na internet se concentravam no ambiente em que a personagem estava inserida, tendo o bullying como principal elemento narrativo, aqui o mergulho é um pouco menos cruel, mas nem por isso fácil de digerir - as histórias giram em torno das consequências mais intimas de quem, de alguma forma, sofreu com o mesmo problema. Nessa primeira temporada, são 3 histórias contadas em 3 (ou 4) episódios sequenciais, que trazem um recorte de algumas situações em que a intimidade e a privacidade não foram respeitadas em uma era nada empática de redes sociais.
Ada (Anna Storeng Frøseth), Sofia (Lena Reinhardtsen) e Viktor (Tord Kinge) são três jovens de 14, 16 e 18 anos respectivamente, que moram em diferentes partes da Noruega, mas que acabam vivendo o mesmo drama: suas vidas se transformaram em um inferno graças a uma foto ou um vídeo íntimo que viralizou nas redes sociais. Confira o trailer (com legendas em inglês):
Todas as três histórias trazem um estilo visual muito parecido com as séries inglesas da BBC e um roteiro, se não tão profundo, honesto (no sentido verdadeiro da palavra) e muito pautado na realidade de uma geração: Sofia, de 16 anos, faz sexo com um jovem em uma festa, até que uma pessoa qualquer grava tudo escondido e depois espalha o vídeo para toda escola assistir - o conflito aqui é descobrir quem foi o responsável. Já Ada, de 14, conhece um garoto no Tinder e para apimentar a relação, troca nudes com ele, porém, pouco depois, uma outra pessoa entra em contato com ela dizendo que suas fotos foram compartilhadas em vários fóruns de pornografia. Ele pode ajuda-la, mas Ida terá que pagar por isso - a chantagem move a história nesse track. E finalmente Viktor, um rapaz de 18 anos, que é acusado de pornografia infantil por um vídeo que postou no Snapchat onde uma amiga de 17 anos fazia sexo com seu parceiro. Em uma tentativa de retirar as graves acusações, Viktor precisa entender que suas ações terão enormes consequências - nessa saga, a ideia é mostrar o outro lado, de quem fez a maldade, mesmo sem pensar na gravidade do problema.
Veja, "Nudes" não tem o propósito de exaltar a morbidez da juventude, mas sim de mostrar algumas formas de lidar com essa terrível exposição - mesmo que a duras penas, e com marcas profundas na vida de cada um dos protagonistas. Não existe nada de romantismo e muito menos uma jornada do herói - a série é dura, conectada com a realidade e muito direta em sua mensagem. O fato de cada episódio ter cerca de vinte minutos, gera uma fluidez na narrativa, mas não permite maiores discussões ou desenvolvimentos dos personagens. O elenco é ótimo e isso traz grande verossimilhança para as situações - destaque para Anna Storeng Frøseth como Ada.
É impossível não pensar que cada uma das histórias que assistimos pode estar acontecendo no exato momento e com milhares de adolescentes. A ideia de posicionar a audiência respeitando uma estrutura onde em um episódio temos a apresentação, em outro o drama que os personagens vivem e no último como aquilo foi resolvido; nos dá tempo para reflexões importantes - nos colocamos no lugar de cada uma das vitimas (e em um deles, no lugar de quem cometeu o crime). Sim, o julgamento é imediato, mas a série foi muito feliz em mostrar a imaturidade dos jovens, a inconsequência, a inocência... isso deixa tudo muito palpável e machuca.
Vale a pena para os pais com seus filhos adolescentes. Essa série tem muito a ensinar!
"Nudes" vai te surpreender! Essa série antológica norueguesa que está disponível na Globoplay, é tão importante quanto impactante. Diferente de "Depois de Lucia" onde os reflexos das fotos (ou vídeos) vazados na internet se concentravam no ambiente em que a personagem estava inserida, tendo o bullying como principal elemento narrativo, aqui o mergulho é um pouco menos cruel, mas nem por isso fácil de digerir - as histórias giram em torno das consequências mais intimas de quem, de alguma forma, sofreu com o mesmo problema. Nessa primeira temporada, são 3 histórias contadas em 3 (ou 4) episódios sequenciais, que trazem um recorte de algumas situações em que a intimidade e a privacidade não foram respeitadas em uma era nada empática de redes sociais.
Ada (Anna Storeng Frøseth), Sofia (Lena Reinhardtsen) e Viktor (Tord Kinge) são três jovens de 14, 16 e 18 anos respectivamente, que moram em diferentes partes da Noruega, mas que acabam vivendo o mesmo drama: suas vidas se transformaram em um inferno graças a uma foto ou um vídeo íntimo que viralizou nas redes sociais. Confira o trailer (com legendas em inglês):
Todas as três histórias trazem um estilo visual muito parecido com as séries inglesas da BBC e um roteiro, se não tão profundo, honesto (no sentido verdadeiro da palavra) e muito pautado na realidade de uma geração: Sofia, de 16 anos, faz sexo com um jovem em uma festa, até que uma pessoa qualquer grava tudo escondido e depois espalha o vídeo para toda escola assistir - o conflito aqui é descobrir quem foi o responsável. Já Ada, de 14, conhece um garoto no Tinder e para apimentar a relação, troca nudes com ele, porém, pouco depois, uma outra pessoa entra em contato com ela dizendo que suas fotos foram compartilhadas em vários fóruns de pornografia. Ele pode ajuda-la, mas Ida terá que pagar por isso - a chantagem move a história nesse track. E finalmente Viktor, um rapaz de 18 anos, que é acusado de pornografia infantil por um vídeo que postou no Snapchat onde uma amiga de 17 anos fazia sexo com seu parceiro. Em uma tentativa de retirar as graves acusações, Viktor precisa entender que suas ações terão enormes consequências - nessa saga, a ideia é mostrar o outro lado, de quem fez a maldade, mesmo sem pensar na gravidade do problema.
Veja, "Nudes" não tem o propósito de exaltar a morbidez da juventude, mas sim de mostrar algumas formas de lidar com essa terrível exposição - mesmo que a duras penas, e com marcas profundas na vida de cada um dos protagonistas. Não existe nada de romantismo e muito menos uma jornada do herói - a série é dura, conectada com a realidade e muito direta em sua mensagem. O fato de cada episódio ter cerca de vinte minutos, gera uma fluidez na narrativa, mas não permite maiores discussões ou desenvolvimentos dos personagens. O elenco é ótimo e isso traz grande verossimilhança para as situações - destaque para Anna Storeng Frøseth como Ada.
É impossível não pensar que cada uma das histórias que assistimos pode estar acontecendo no exato momento e com milhares de adolescentes. A ideia de posicionar a audiência respeitando uma estrutura onde em um episódio temos a apresentação, em outro o drama que os personagens vivem e no último como aquilo foi resolvido; nos dá tempo para reflexões importantes - nos colocamos no lugar de cada uma das vitimas (e em um deles, no lugar de quem cometeu o crime). Sim, o julgamento é imediato, mas a série foi muito feliz em mostrar a imaturidade dos jovens, a inconsequência, a inocência... isso deixa tudo muito palpável e machuca.
Vale a pena para os pais com seus filhos adolescentes. Essa série tem muito a ensinar!
Essa é uma daquelas histórias que demora até acreditarmos que algo parecido seria possível - e essa dúvida vai te acompanhar enquanto sobem os créditos, provavelmente com seus olhos marejados e com o coração apertado. "Nyad" pode não ser uma superprodução com um roteiro impecável, mas a jornada em si vale cada segundo! O filme é muito mais do que apenas um relato impressionante dos incríveis desafios que a lendária nadadora de longa distância Diana Nyad precisou superar; na verdade eu diria que o filme é uma celebração da resiliência e da determinação de um ser humana que nunca deixou de acreditar na sua capacidade como atleta, mesmo depois dos 60 e isso, por si só, já merece nosso respeito!
"Nyad", basicamente, narra a extraordinária saga de Diana Nyad (Annette Bening) e de sua treinadora e amiga fiel, Bonnie Stoll (Jodie Foster), que durante anos tentou completar uma jornada épica: cruzar a nado os perigosos 170 km do Estreito da Flórida, entre Cuba e Key West. Ao enfrentar desafios inimagináveis e ultrapassando seus próprios limites físico e etário, "Nyad" acompanha os bastidores de um desafio que para muitos era classificado como mais impossível do que possível! Confira o trailer (em inglês):
Adaptado da biografia "Find a Way", escrito pela própria Diana, o filme dirigido pela dupla Jimmy Chin e Elizabeth Chai Vasarhelyi (ambos vencedores do Oscar por "Free Solo" e responsáveis pelo ótimo "De Volta ao Espaço") é, de fato, uma conquista cinematográfica notável em todos os aspectos técnicos ao unir elementos documentais em uma narrativa ficcional das mais interessantes e dinâmicas. Mesmo que notavelmente siga uma fórmula para muitos "batida" (o que não é o meu caso, que fique claro), "Nyad" compensa pela humanização de sua história e pela emoção que ela provoca. A capacidade de Chin e Vasarhelyi em nos colocar ao lado da atleta, no meio do oceano, enfrentando o desconhecido, nos remete ao estilo conceitual angustiante de "Mar Aberto", ou seja, pode se preparar para uma experiência realmente sensorial, embora maquiada como um clássico drama de superação.
A fotografia do chileno Claudio Miranda é um espetáculo! Miranda, que já ganhou um Oscar com a "As Aventuras de Pi", constrói uma atmosfera de tirar o fôlego, capturando a solidão das vastas e muito desafiadoras paisagens do oceano com a mesma maestria com que desnuda a intimidade de Diana em momentos que teria tudo para se tornar piegas. E aqui talvez caiba uma única e pontual critica ao filme: os flashbacks ajudam a contextualizar os fantasmas da protagonista, mas a forma como essas passagens foram retratadas me soa "um caminho confortável demais". Tanto Bening como Foster se esforçam para entregar performances emocionalmente poderosas, compartilhando suas experiências com uma autenticidade que toca o coração, mas essas quebras narrativas até o passado, realmente, não surgem com a mesma potência.
"Nyad" tem um tom inspirador na sua proposta. Por se tratar de uma jornada de superação, determinação e força de vontade, fica fácil nos conectarmos, mesmo com algumas "frases de caminhão" perdidas no roteiro, algo como: "O diamante é apenas um pedaço de carvão que não desistiu". Isso prejudica o filme? Não, desde que você esteja disposto a mergulhar (sem trocadilhos) nesse tipo de subgênero. Para muitos, essa experiência vai significar algo muito além do que um simples entretenimento; será um lembrete poderoso de que os limites só existem para serem ultrapassados e blá, blá, blá. Para outros, serão 120 minutos de uma trama equilibrada, que emociona e que deixa o coração mais quentinho. Independente de onde você se encaixar, uma coisa eu posso te garantir: essa história merecia ser contada e Diana merece ser ainda mais conhecida!
Vale seu play!
Essa é uma daquelas histórias que demora até acreditarmos que algo parecido seria possível - e essa dúvida vai te acompanhar enquanto sobem os créditos, provavelmente com seus olhos marejados e com o coração apertado. "Nyad" pode não ser uma superprodução com um roteiro impecável, mas a jornada em si vale cada segundo! O filme é muito mais do que apenas um relato impressionante dos incríveis desafios que a lendária nadadora de longa distância Diana Nyad precisou superar; na verdade eu diria que o filme é uma celebração da resiliência e da determinação de um ser humana que nunca deixou de acreditar na sua capacidade como atleta, mesmo depois dos 60 e isso, por si só, já merece nosso respeito!
"Nyad", basicamente, narra a extraordinária saga de Diana Nyad (Annette Bening) e de sua treinadora e amiga fiel, Bonnie Stoll (Jodie Foster), que durante anos tentou completar uma jornada épica: cruzar a nado os perigosos 170 km do Estreito da Flórida, entre Cuba e Key West. Ao enfrentar desafios inimagináveis e ultrapassando seus próprios limites físico e etário, "Nyad" acompanha os bastidores de um desafio que para muitos era classificado como mais impossível do que possível! Confira o trailer (em inglês):
Adaptado da biografia "Find a Way", escrito pela própria Diana, o filme dirigido pela dupla Jimmy Chin e Elizabeth Chai Vasarhelyi (ambos vencedores do Oscar por "Free Solo" e responsáveis pelo ótimo "De Volta ao Espaço") é, de fato, uma conquista cinematográfica notável em todos os aspectos técnicos ao unir elementos documentais em uma narrativa ficcional das mais interessantes e dinâmicas. Mesmo que notavelmente siga uma fórmula para muitos "batida" (o que não é o meu caso, que fique claro), "Nyad" compensa pela humanização de sua história e pela emoção que ela provoca. A capacidade de Chin e Vasarhelyi em nos colocar ao lado da atleta, no meio do oceano, enfrentando o desconhecido, nos remete ao estilo conceitual angustiante de "Mar Aberto", ou seja, pode se preparar para uma experiência realmente sensorial, embora maquiada como um clássico drama de superação.
A fotografia do chileno Claudio Miranda é um espetáculo! Miranda, que já ganhou um Oscar com a "As Aventuras de Pi", constrói uma atmosfera de tirar o fôlego, capturando a solidão das vastas e muito desafiadoras paisagens do oceano com a mesma maestria com que desnuda a intimidade de Diana em momentos que teria tudo para se tornar piegas. E aqui talvez caiba uma única e pontual critica ao filme: os flashbacks ajudam a contextualizar os fantasmas da protagonista, mas a forma como essas passagens foram retratadas me soa "um caminho confortável demais". Tanto Bening como Foster se esforçam para entregar performances emocionalmente poderosas, compartilhando suas experiências com uma autenticidade que toca o coração, mas essas quebras narrativas até o passado, realmente, não surgem com a mesma potência.
"Nyad" tem um tom inspirador na sua proposta. Por se tratar de uma jornada de superação, determinação e força de vontade, fica fácil nos conectarmos, mesmo com algumas "frases de caminhão" perdidas no roteiro, algo como: "O diamante é apenas um pedaço de carvão que não desistiu". Isso prejudica o filme? Não, desde que você esteja disposto a mergulhar (sem trocadilhos) nesse tipo de subgênero. Para muitos, essa experiência vai significar algo muito além do que um simples entretenimento; será um lembrete poderoso de que os limites só existem para serem ultrapassados e blá, blá, blá. Para outros, serão 120 minutos de uma trama equilibrada, que emociona e que deixa o coração mais quentinho. Independente de onde você se encaixar, uma coisa eu posso te garantir: essa história merecia ser contada e Diana merece ser ainda mais conhecida!
Vale seu play!
"O Abraço da Serpente" é um filme muito complicado de assistir, que foge dos padrões estéticos e narrativos que estamos acostumados, e mesmo chancelado por mais de 40 prêmios em Festivais Internacionais (que incluem Cannes e Sundance), além de uma indicação de "Melhor Filme Internacional" no Oscar 2016, eu diria que apenas um público muito pequeno e selecionado vai se conectar com a história e se permitir às profundas reflexões que o diretor colombiano Ciro Guerra propõe.
Com a ajuda do xamã Karamakate (Nilbio Torres), Theodor Koch-Grunberg (Jan Bijvoet), um famoso explorador europeu, percorreu centenas de quilómetros do rio Amazonas quando, gravemente doente, buscava uma flor que poderia ser o objeto de sua cura. Anos depois, Richard Evans Schultes (Brionne Davis), considerado o pai da etnobotânica moderna, que tendo as publicações de Grunberg em mãos, tenta refazer os passos do pesquisador ao lado do mesmo Karamakate (aqui Antonio Bolívar) para encontrar a tal planta lendária. Confira o trailer:
O "preto e branco" da fotografia de David Gallego (de "Sal") é um contraponto potente com a diversidade de cores que representa o cenário por onde a história do filme se desenrola, mas ao mesmo tempo foi a forma como Guerra estabeleceu a frieza daqueles dois recortes temporais - quando acompanhamos Théo, estamos nos primeiros anos da década de 1900; quando somos apresentados para Evans, já estamos no meio do século; porém nada mudou, ou melhor, se transformou em algo muito pior! A missão religiosa (e o que isso se tornou) nos causa um forte (forte mesmo) impacto emocional - é incrível como o filme se apropria de uma linguagem quase documental para explorar de forma antropológica como a cultura indígena foi destruída (ou ceifada) pela catequização. A passagem que mostra o Messias louco no meio do "nada" é tão atual quanto a assustadora relação do um missionário colombiano com crianças indígenas - tudo em nome de Deus.
Grande parte de "O Abraço da Serpente" nos entrega a natureza como parte de uma jornada espiritual. Há muito simbolismo e até metáforas já que a percepção de mundo de um xamã é completamente diferente de um ocidental, no entanto, é muito interessante como o roteiro conecta esses dois mundos e propõe uma discussão inteligente sobre ação e consequência - mesmo que em alguns momentos soe como ato de boa-fé (a passagem da bússola é um bom exemplo, reparem). Tanto Bijvoet quanto Davis estão impecáveis na pele dos exploradores, mas, sem dúvida, é Nilbio Torres que se destaca - é impressionante como é possível sentir sua dor sem ao menos precisar entender uma palavra do seu dialeto.
"O Abraço da Serpente" retrata tantas nuances da colonização cultural na América que chega a embrulhar o estômago. Poucas vezes vi a ficção ser tão dura (e realista) sem precisar exaltar o indígena como individuo intocável. Esse realismo visceral só nos ajuda a entender como a preservação antropológica de uma cultura é importante e como ela continua praticamente esquecida até hoje. O filme é sim uma forte crítica a todas questões pertinentes que envolveram a colonização, como a extração irregular das riquezas naturais (para produzir borracha), ou o braço pesado do homem branco sobre o povo indígena como elemento de imposição e, claro, o total esgotamento (contínuo) de um povo cheio de sabedoria que já não existe mais.
Não espere uma jornada fácil - o que você vai encontrar é uma jornada cadenciada, profunda e de difícil absorção; mas que vale muito a pena!
"O Abraço da Serpente" é um filme muito complicado de assistir, que foge dos padrões estéticos e narrativos que estamos acostumados, e mesmo chancelado por mais de 40 prêmios em Festivais Internacionais (que incluem Cannes e Sundance), além de uma indicação de "Melhor Filme Internacional" no Oscar 2016, eu diria que apenas um público muito pequeno e selecionado vai se conectar com a história e se permitir às profundas reflexões que o diretor colombiano Ciro Guerra propõe.
Com a ajuda do xamã Karamakate (Nilbio Torres), Theodor Koch-Grunberg (Jan Bijvoet), um famoso explorador europeu, percorreu centenas de quilómetros do rio Amazonas quando, gravemente doente, buscava uma flor que poderia ser o objeto de sua cura. Anos depois, Richard Evans Schultes (Brionne Davis), considerado o pai da etnobotânica moderna, que tendo as publicações de Grunberg em mãos, tenta refazer os passos do pesquisador ao lado do mesmo Karamakate (aqui Antonio Bolívar) para encontrar a tal planta lendária. Confira o trailer:
O "preto e branco" da fotografia de David Gallego (de "Sal") é um contraponto potente com a diversidade de cores que representa o cenário por onde a história do filme se desenrola, mas ao mesmo tempo foi a forma como Guerra estabeleceu a frieza daqueles dois recortes temporais - quando acompanhamos Théo, estamos nos primeiros anos da década de 1900; quando somos apresentados para Evans, já estamos no meio do século; porém nada mudou, ou melhor, se transformou em algo muito pior! A missão religiosa (e o que isso se tornou) nos causa um forte (forte mesmo) impacto emocional - é incrível como o filme se apropria de uma linguagem quase documental para explorar de forma antropológica como a cultura indígena foi destruída (ou ceifada) pela catequização. A passagem que mostra o Messias louco no meio do "nada" é tão atual quanto a assustadora relação do um missionário colombiano com crianças indígenas - tudo em nome de Deus.
Grande parte de "O Abraço da Serpente" nos entrega a natureza como parte de uma jornada espiritual. Há muito simbolismo e até metáforas já que a percepção de mundo de um xamã é completamente diferente de um ocidental, no entanto, é muito interessante como o roteiro conecta esses dois mundos e propõe uma discussão inteligente sobre ação e consequência - mesmo que em alguns momentos soe como ato de boa-fé (a passagem da bússola é um bom exemplo, reparem). Tanto Bijvoet quanto Davis estão impecáveis na pele dos exploradores, mas, sem dúvida, é Nilbio Torres que se destaca - é impressionante como é possível sentir sua dor sem ao menos precisar entender uma palavra do seu dialeto.
"O Abraço da Serpente" retrata tantas nuances da colonização cultural na América que chega a embrulhar o estômago. Poucas vezes vi a ficção ser tão dura (e realista) sem precisar exaltar o indígena como individuo intocável. Esse realismo visceral só nos ajuda a entender como a preservação antropológica de uma cultura é importante e como ela continua praticamente esquecida até hoje. O filme é sim uma forte crítica a todas questões pertinentes que envolveram a colonização, como a extração irregular das riquezas naturais (para produzir borracha), ou o braço pesado do homem branco sobre o povo indígena como elemento de imposição e, claro, o total esgotamento (contínuo) de um povo cheio de sabedoria que já não existe mais.
Não espere uma jornada fácil - o que você vai encontrar é uma jornada cadenciada, profunda e de difícil absorção; mas que vale muito a pena!
Impossível começar esse review sem dizer que, em “O Abutre”, Jake Gyllenhaal tem o melhor desempenho de toda sua carreira e é impressionante, impressionante não, melhor: é injusto que ele não tenha sido indicado ao Oscar de 2015 por esse papel. Alias, "Nightcrawler" (no original) só foi indicado em uma categoria: Melhor Roteiro Original.
Na trama, o jovem Louis Bloom (Jake Gyllenhaal) enfrenta dificuldades para conseguir um emprego formal. Depois de testemunhar um trágico acidente, ele decide entrar no agitado submundo do jornalismo criminal independente de Los Angeles. A fórmula é simples: correr atrás de crimes e acidentes chocantes, registrar tudo e vender a história para veículos sensacionalistas que se interessarem. Confira o trailer:
A mudança de Jake Gyllenhaal é nítida, ele perdeu 14 quilos para dar vida ao obscuro e misterioso Louis Bloom. Mas não se trata de uma mudança corporal apenas, seus olhos mudaram, sua feição é outra, e em muitos momentos chega ser assustador o que ele conseguiu fazer com o seu personagem. Se você gostou da atuação de Joaquin Phoenix em “Coringa”, certamente vai apreciar esse trabalho de Gyllenhaal.
Mas “O Abutre” não se trata apenas de Jake Gyllenhaal, embora se destaque mais que outros acertos do filme, o elenco ainda conta com Rene Russo e Riz Ahmed que também estão ótimos em seus papéis. O diretor de fotografia Robert Elswit é o mesmo de “Sangue Negro” (outro filme espetacular), cria aquela atmosfera caótica de uma noite urbana com primor, fazendo referências visuais através do uso cores que nos remetem aos clássicos como “Taxi Driver”, por exemplo. A trilha sonora é do James Newton Howard, e ajuda na composição de toda a estranheza necessária para o desenrolar dessa trama envolvente - inclusive, esse é um thriller que vai causar incômodo propositalmente.
O filme de Dan Gilroy, estreante como diretor, mergulha fundo na crítica sobre o que a mídia vende e o que as pessoas consomem, além de retratar assuntos delicados como ética moral e social, com isso, “O Abutre” também expõe o pior lado do ser humano e o que algumas pessoas são capazes de fazer para obter êxito profissional - mesmo que isso custe a vida de outras pessoas.
Vale muito a pena, mas não será uma jornada tranquila!
Apenas para chancelar a recomendação, “O Abutre” foi o grande vencedor do "Film Independent Spirit Awards" de 2015 em duas categorias: "Melhor Filme de um Diretor Estreante" e "Melhor Diretor".
Escrito por Mark Hewes - uma parceria @indiqueipraver
Impossível começar esse review sem dizer que, em “O Abutre”, Jake Gyllenhaal tem o melhor desempenho de toda sua carreira e é impressionante, impressionante não, melhor: é injusto que ele não tenha sido indicado ao Oscar de 2015 por esse papel. Alias, "Nightcrawler" (no original) só foi indicado em uma categoria: Melhor Roteiro Original.
Na trama, o jovem Louis Bloom (Jake Gyllenhaal) enfrenta dificuldades para conseguir um emprego formal. Depois de testemunhar um trágico acidente, ele decide entrar no agitado submundo do jornalismo criminal independente de Los Angeles. A fórmula é simples: correr atrás de crimes e acidentes chocantes, registrar tudo e vender a história para veículos sensacionalistas que se interessarem. Confira o trailer:
A mudança de Jake Gyllenhaal é nítida, ele perdeu 14 quilos para dar vida ao obscuro e misterioso Louis Bloom. Mas não se trata de uma mudança corporal apenas, seus olhos mudaram, sua feição é outra, e em muitos momentos chega ser assustador o que ele conseguiu fazer com o seu personagem. Se você gostou da atuação de Joaquin Phoenix em “Coringa”, certamente vai apreciar esse trabalho de Gyllenhaal.
Mas “O Abutre” não se trata apenas de Jake Gyllenhaal, embora se destaque mais que outros acertos do filme, o elenco ainda conta com Rene Russo e Riz Ahmed que também estão ótimos em seus papéis. O diretor de fotografia Robert Elswit é o mesmo de “Sangue Negro” (outro filme espetacular), cria aquela atmosfera caótica de uma noite urbana com primor, fazendo referências visuais através do uso cores que nos remetem aos clássicos como “Taxi Driver”, por exemplo. A trilha sonora é do James Newton Howard, e ajuda na composição de toda a estranheza necessária para o desenrolar dessa trama envolvente - inclusive, esse é um thriller que vai causar incômodo propositalmente.
O filme de Dan Gilroy, estreante como diretor, mergulha fundo na crítica sobre o que a mídia vende e o que as pessoas consomem, além de retratar assuntos delicados como ética moral e social, com isso, “O Abutre” também expõe o pior lado do ser humano e o que algumas pessoas são capazes de fazer para obter êxito profissional - mesmo que isso custe a vida de outras pessoas.
Vale muito a pena, mas não será uma jornada tranquila!
Apenas para chancelar a recomendação, “O Abutre” foi o grande vencedor do "Film Independent Spirit Awards" de 2015 em duas categorias: "Melhor Filme de um Diretor Estreante" e "Melhor Diretor".
Escrito por Mark Hewes - uma parceria @indiqueipraver
"O Acontecimento" é um drama pesadíssimo, visceral eu diria! A jornada que começa amena, quase juvenil, vai ganhando força e brutalidade até alcançar o seu ápice no terceiro ato. Sim, durante os mais de 90 minutos de filme, em vários momentos você sentirá a dor da protagonista - e aqui eu não falo apenas da dor física, embora ela exista e seja brilhantemente retratada pela diretora Audrey Diwan (de "À Beira da Loucura "); eu falo daquela dor na alma que nos tira do eixo, que nos faz refletir sobre o outro - algo como vimos recentemente em “Pieces of a Woman”, por exemplo.
O filme conta a história de Anne (Anamaria Vartolomei), uma jovem garota que engravida e que simplesmente não quer e não pode ter aquela criança, já que seu futuro brilhante seria comprometido. No entanto, na França dos anos 1960, o direito ao aborto ainda não existia. Pelo contrário: qualquer um que praticasse o aborto, tanto a mulher quanto o médico, seria preso. Anne então precisa correr contra o tempo para encontrar uma solução antes de colocar sua própria vida em risco. Confira o trailer:
Essa produção francesa chega ao streaming chancelada pelo "Golden Lion" e pelo "FIPRESCI Prize" no Festival de Veneza em 2021. Além de uma carreira internacional de respeito, "O Acontecimento" ainda rendeu muitos elogios da crítica especializada e do público, o que coloca o filme naquela disputada prateleira de grandes surpresas do ano. E não é para menos, de fato "L'événement" (no original) impressiona ao se aprofundar de uma maneira muito cruel no realismo de uma situação tão atual que nem nos damos conta que o filme se passa na década de 60.
Graças ao aspecto 4:3 (aquele mais quadrado das TVs de tubo de antigamente) em que foi filmado, a diretora é capaz de provocar sensações das mais desagradáveis para audiência - essa escolha conceitual incomoda muito, gera uma certa percepção de angústia, de opressão, de limite. Curiosamente, a história da protagonista, ou seja, o "conteúdo" do filme, está completamente alinhado à "forma" com que presenciamos o seu sofrimento. A jornada de Anne é dura, solitária demais - chega a ser impressionante como a atriz Anamaria Vartolomei encontra o tom certo, introspectivo, para lidar com suas decisões e consequências. A cena em Anne tenta fazer o aborto por si só, por exemplo, é simplesmente desesperadora, além de impactante.
Baseado no aclamado livro de Annie Ernaux, o que vemos na tela é um adaptação extremamente autoral e de altíssima qualidade cinematográfica. "O Acontecimento" é cadenciado, sem nenhuma ação aparente, até repetitivo em alguns momentos, mas com o tempo se apropria de uma verdadeira experiência sensorial para entregar um mergulho no íntimo da mulher e na forma como ela é julgada pela sociedade. Não é uma jornada confortável da mesma forma em que se mostra necessária a discussão sobre um tema polêmico e muito importante nos dias de hoje (mesmo 60 anos depois).
Vale muito o seu play!
"O Acontecimento" é um drama pesadíssimo, visceral eu diria! A jornada que começa amena, quase juvenil, vai ganhando força e brutalidade até alcançar o seu ápice no terceiro ato. Sim, durante os mais de 90 minutos de filme, em vários momentos você sentirá a dor da protagonista - e aqui eu não falo apenas da dor física, embora ela exista e seja brilhantemente retratada pela diretora Audrey Diwan (de "À Beira da Loucura "); eu falo daquela dor na alma que nos tira do eixo, que nos faz refletir sobre o outro - algo como vimos recentemente em “Pieces of a Woman”, por exemplo.
O filme conta a história de Anne (Anamaria Vartolomei), uma jovem garota que engravida e que simplesmente não quer e não pode ter aquela criança, já que seu futuro brilhante seria comprometido. No entanto, na França dos anos 1960, o direito ao aborto ainda não existia. Pelo contrário: qualquer um que praticasse o aborto, tanto a mulher quanto o médico, seria preso. Anne então precisa correr contra o tempo para encontrar uma solução antes de colocar sua própria vida em risco. Confira o trailer:
Essa produção francesa chega ao streaming chancelada pelo "Golden Lion" e pelo "FIPRESCI Prize" no Festival de Veneza em 2021. Além de uma carreira internacional de respeito, "O Acontecimento" ainda rendeu muitos elogios da crítica especializada e do público, o que coloca o filme naquela disputada prateleira de grandes surpresas do ano. E não é para menos, de fato "L'événement" (no original) impressiona ao se aprofundar de uma maneira muito cruel no realismo de uma situação tão atual que nem nos damos conta que o filme se passa na década de 60.
Graças ao aspecto 4:3 (aquele mais quadrado das TVs de tubo de antigamente) em que foi filmado, a diretora é capaz de provocar sensações das mais desagradáveis para audiência - essa escolha conceitual incomoda muito, gera uma certa percepção de angústia, de opressão, de limite. Curiosamente, a história da protagonista, ou seja, o "conteúdo" do filme, está completamente alinhado à "forma" com que presenciamos o seu sofrimento. A jornada de Anne é dura, solitária demais - chega a ser impressionante como a atriz Anamaria Vartolomei encontra o tom certo, introspectivo, para lidar com suas decisões e consequências. A cena em Anne tenta fazer o aborto por si só, por exemplo, é simplesmente desesperadora, além de impactante.
Baseado no aclamado livro de Annie Ernaux, o que vemos na tela é um adaptação extremamente autoral e de altíssima qualidade cinematográfica. "O Acontecimento" é cadenciado, sem nenhuma ação aparente, até repetitivo em alguns momentos, mas com o tempo se apropria de uma verdadeira experiência sensorial para entregar um mergulho no íntimo da mulher e na forma como ela é julgada pela sociedade. Não é uma jornada confortável da mesma forma em que se mostra necessária a discussão sobre um tema polêmico e muito importante nos dias de hoje (mesmo 60 anos depois).
Vale muito o seu play!
Noventa minutos de muita tensão e angústia, é isso que você vai encontrar no ótimo "O Acusado". Na linha tênue entre "Zona de Confronto", "O Homem nas Trevas" e "Bata Antes de Entrar", o novo filme do talentoso diretor inglês Philip Barantini (o mesmo do sucesso, "O Chef") surpreende tanto pela dinâmica claustrofóbica de sua narrativa quanto pela critica extremamente atual contra uma geração "rede social" que se coloca em uma posição de superioridade ao achar que sua opinião é de fato uma verdade universal sem pensar nas consequências que ela pode representar para o ser humano, ainda mais se esse se encaixar no estereótipo de quem sofre algum tipo de discriminação. Disseminar "incertezas" pode ser muito mais perigoso em tempos de "justiça digital".
Aqui acompanhamos a história de terror vivida por Harri Bhavsar (Chaneil Kular), um jovem paquistanês que precisa lidar com uma injustiça brutal: ele é apontado como o responsável por uma atentado a bomba no metrô de Londres, simplesmente por parecer com um possível suspeito - sim, eu disse "possível" suspeito. De uma hora para a outra o jovem passa a ser perseguido e ameaçado pela internet até que justiceiros começam a caça-lo-lo em busca de vingança. Confira o trailer (em inglês):
É de se elogiar a capacidade que o roteiro, escrito pela dupla de novatos Barnaby Boulton e James Cummings, tem de retratar o lado ruim das relações digitais, principalmente quando pautadas por "fake news". Reparem como antes mesmo da chegada de um clímax simplesmente aterrorizante no segundo ato, o diretor já parece antecipar o real poder de sua trama sem deixar de provocar uma reflexão audiência: o que acontece com Harri Bhavsar poderia acontecer com qualquer um (dada, obviamente, toda a suspensão de uma realidade muito particular da história) e isso, basicamente, eleva nossa ansiedade para o que vem pela frente. Se apropriando dessa angustia crescente, o filme vai apresentando camadas emocionais de seu protagonista ao mesmo tempo em que assistimos de camarote (leia-se pelos olhos dele) todo aquele circo que vai se construindo com o único e claro objetivo de "caça às bruxas" - algo, aliás, bem comum na internet.
Barantini sabe que essa situação especifica pode se transformar na pior experiência da vida de um jovem e ao alinhar o tema com uma gramática cinematográfica mais próxima do suspense do que do drama em si, vivenciamos em "O Acusado" exatamente aquilo que mais tememos. O tribunal virtual, que efetivamente analisa, julga e condena sem chance de um mero desconhecido se defender, é o mesmo que dá o direito para pessoas completamente sem noção resolver os problemas com as próprias mãos. Quando o fotógrafo Matthew Lewis (também de "O Chef") limita seus enquadramentos respeitando a geografia daquele cenário, seja com um jogo de luz e sombra ou com as trocas de perspectiva pelo movimento óptico do foco, temos a exata noção do que é estar preso onde, teoricamente, deveríamos estar seguros e como o ser humano poder sim ser doentio - e aqui cabem mais dois elogios: o filme é muito bem montado, com cortes precisos que ajudam a criar todo esse mood de tensão constante e o desenho de som, delicado, orgânico e muito pontual, coloca um elemento de realismo que é impressionante.
"O Acusado" mesmo curto, parece interminável - graças a capacidade de Barantini (e de seu time) em adequar o tempo de cada cena, da forma mais meticulosa possível, com a ação essencial que o talentoso Chaneil Kular precisa experienciar para mexer com nossas sensações - aliás, me lembrou muito o trabalho de Riz Ahmed em "The Night Of". Enfim, mesmo que tímido em sua campanha de marketing dentro da Netflix, esse é o tipo do filme que merece muita atenção pelo que assistimos na tela e pelo que deve ser discutido assim que os créditos sobem!
Um filme que vai te surpreender de verdade e que faz valer muito a pena o seu play!
Noventa minutos de muita tensão e angústia, é isso que você vai encontrar no ótimo "O Acusado". Na linha tênue entre "Zona de Confronto", "O Homem nas Trevas" e "Bata Antes de Entrar", o novo filme do talentoso diretor inglês Philip Barantini (o mesmo do sucesso, "O Chef") surpreende tanto pela dinâmica claustrofóbica de sua narrativa quanto pela critica extremamente atual contra uma geração "rede social" que se coloca em uma posição de superioridade ao achar que sua opinião é de fato uma verdade universal sem pensar nas consequências que ela pode representar para o ser humano, ainda mais se esse se encaixar no estereótipo de quem sofre algum tipo de discriminação. Disseminar "incertezas" pode ser muito mais perigoso em tempos de "justiça digital".
Aqui acompanhamos a história de terror vivida por Harri Bhavsar (Chaneil Kular), um jovem paquistanês que precisa lidar com uma injustiça brutal: ele é apontado como o responsável por uma atentado a bomba no metrô de Londres, simplesmente por parecer com um possível suspeito - sim, eu disse "possível" suspeito. De uma hora para a outra o jovem passa a ser perseguido e ameaçado pela internet até que justiceiros começam a caça-lo-lo em busca de vingança. Confira o trailer (em inglês):
É de se elogiar a capacidade que o roteiro, escrito pela dupla de novatos Barnaby Boulton e James Cummings, tem de retratar o lado ruim das relações digitais, principalmente quando pautadas por "fake news". Reparem como antes mesmo da chegada de um clímax simplesmente aterrorizante no segundo ato, o diretor já parece antecipar o real poder de sua trama sem deixar de provocar uma reflexão audiência: o que acontece com Harri Bhavsar poderia acontecer com qualquer um (dada, obviamente, toda a suspensão de uma realidade muito particular da história) e isso, basicamente, eleva nossa ansiedade para o que vem pela frente. Se apropriando dessa angustia crescente, o filme vai apresentando camadas emocionais de seu protagonista ao mesmo tempo em que assistimos de camarote (leia-se pelos olhos dele) todo aquele circo que vai se construindo com o único e claro objetivo de "caça às bruxas" - algo, aliás, bem comum na internet.
Barantini sabe que essa situação especifica pode se transformar na pior experiência da vida de um jovem e ao alinhar o tema com uma gramática cinematográfica mais próxima do suspense do que do drama em si, vivenciamos em "O Acusado" exatamente aquilo que mais tememos. O tribunal virtual, que efetivamente analisa, julga e condena sem chance de um mero desconhecido se defender, é o mesmo que dá o direito para pessoas completamente sem noção resolver os problemas com as próprias mãos. Quando o fotógrafo Matthew Lewis (também de "O Chef") limita seus enquadramentos respeitando a geografia daquele cenário, seja com um jogo de luz e sombra ou com as trocas de perspectiva pelo movimento óptico do foco, temos a exata noção do que é estar preso onde, teoricamente, deveríamos estar seguros e como o ser humano poder sim ser doentio - e aqui cabem mais dois elogios: o filme é muito bem montado, com cortes precisos que ajudam a criar todo esse mood de tensão constante e o desenho de som, delicado, orgânico e muito pontual, coloca um elemento de realismo que é impressionante.
"O Acusado" mesmo curto, parece interminável - graças a capacidade de Barantini (e de seu time) em adequar o tempo de cada cena, da forma mais meticulosa possível, com a ação essencial que o talentoso Chaneil Kular precisa experienciar para mexer com nossas sensações - aliás, me lembrou muito o trabalho de Riz Ahmed em "The Night Of". Enfim, mesmo que tímido em sua campanha de marketing dentro da Netflix, esse é o tipo do filme que merece muita atenção pelo que assistimos na tela e pelo que deve ser discutido assim que os créditos sobem!
Um filme que vai te surpreender de verdade e que faz valer muito a pena o seu play!
É muito difícil olhar para "O Aprendiz" simplesmente pelo viés cinematográfico. Independente do posicionamento político, é praticamente impossível desassociar a figura pública de Donald Trump de um ser-humano com uma dificuldade enorme de lidar com o poder - graças as suas incontáveis inseguranças que aliás, o filme pontua com perfeição. Ao olhar pela perspectiva do empreendedor, certamente você vai encontrar em seu íntimo, traços megalomaníacos de um Adam Neumann com uma boa dose de fraqueza de Mark Zuckerberg - e aqui estou levando muito em consideração o que assistimos em "WeCrashed" e em "A Rede Social" (nada mais). Pois bem, "O Aprendiz" não é apenas um filme biográfico convencional, mas um estudo de personagem que examina as engrenagens do poder e a construção de uma persona pública. Dirigido por Ali Abbasi (de "Holy Spider") e roteirizado por Gabriel Sherman (de "A Voz Mais Forte"), temos aqui um recorte capaz de nos levar pelos bastidores da ascensão de Trump nos anos 1970 e 1980, explorando sua relação com o polêmico advogado e estrategista Roy Cohn. Longe de um retrato panfletário, o filme se apresenta como um drama psicológico dos mais eficientes, especialmente por discutir as nuances da ambição, da corrupção e da formação de um dos personagens mais polarizadores da história recente. A abordagem de Abbasi nos remete a obras como "O Lobo de Wall Street" e "Vice" com um toque nostálgico de "Succession", onde a ascensão ao poder é tratada com um misto de fascínio e, principalmente, de repulsa.
No início de sua carreira, Donald Trump (Sebastian Stan) buscou orientação de Roy Cohn (Jeremy Strong), advogado de extrema direita conhecido por sua influência pouco ortodoxa nos bastidores da política e dos negócios. Cohn se tornou uma figura determinante para a consolidação do ambicioso jovem empresário no mercado imobiliário, especialmente nos círculos de poder de Nova York. Ao longo dos anos, essa relação moldou não apenas sua trajetória profissional, mas sua visão de mundo e sua estratégia política. Confira o trailer:
Ali Abbasi constrói sua narrativa sem apelar para caricaturas ou julgamentos óbvios. Em vez disso, ele nos apresenta um jovem Trump ainda em processo de formação, absorvendo a crueldade e o pragmatismo de Cohn. A relação entre os dois é o coração do filme, funcionando como uma espécie de pacto faustiano, onde Trump, inicialmente ingênuo e ambicioso, aprende a manipular e dobrar as regras do jogo para alcançar seus objetivos - e aqui é preciso elogiar de pé, Jeremy Strong. Ele entrega uma performance que canaliza toda a arrogância, astúcia e frieza de Cohn, um personagem que se torna quase um mentor malévolo para Trump. Enquanto Sebastian Stan constrói um Trump diferente do que estamos acostumados a ver na mídia. Não é a figura bombástica dos anos 2010, mas um jovem empresário tentando consolidar seu nome em Nova York. Sua atuação foge da imitação barata na busca por nuances: há momentos de insegurança, hesitação e até mesmo vulnerabilidade, mas sempre permeados por uma crescente absorção da filosofia implacável de Cohn. A transformação ao longo da jornada é sutil, mas perceptível – e é aí que Abbasi acerta em cheio. Ele nos faz testemunhar a mutação do protagonista, em vez de simplesmente retratar a história por si só.
A direção de Abbasi aposta em um realismo seco, evitando os maneirismos estilísticos comuns em cinebiografias políticas. A fotografia do dinamarquês Kasper Tuxen (de "Loucos por Justiça") é primorosa - ele cria uma ambientação com tons frios e pastéis, sempre muito granulado, em enquadramentos que projetam os contrastes entre os luxuosos escritórios e os ambientes mais sombrios onde as negociações de bastidores aconteciam - é difícil não se perguntar a razão pela qual Tuxen não foi indicado ao Oscar 2025. O desenho de produção é outro espetáculo - limitado pelo aspecto 4:3 da tela, ele recria com precisão a Nova York dos anos 70 e 80, trazendo detalhes que vão desde dos trajes impecáveis de Cohn até os primeiros edifícios que levariam o nome Trump na fachada. Outro ponto que favorece demais nossa imersão é a trilha sonora - ela transita entre o minimalismo que intensifica a tensão e o jogo de poder entre os personagens com as referências culturais da época, marcada por bandas como Pet Shop Boys, por exemplo!
O roteiro de Gabriel Sherman se baseia em pesquisas detalhadas e depoimentos sobre essa fase inicial da vida de Trump, mas evita cair em uma abordagem documental. Em vez disso, a estrutura de "O Aprendiz" se assemelha ao drama mais psicológico, onde cada decisão tomada pelo protagonista tem consequências que reverberam até hoje. O diálogo é afiado, refletindo a retórica agressiva de Cohn e o aprendizado gradual de Trump em dominar o discurso e a manipulação da mídia. Mesmo que o filme não tente oferecer respostas definitivas sobre o impacto da relação entre Trump e Cohn, ele deixa claro como esse período foi determinante para o que viria depois - a transformação do jovem empresário em um jogador implacável da política e dos negócios não é tratada como um evento isolado, mas como um processo meticulosamente arquitetado.
Veja, "O Aprendiz" não é um filme que busca escândalos ou grandes revelações, mas sim uma imersão na mentalidade de poder e influência que moldou um dos personagens mais controversos do EUA, ou seja, para aqueles interessados em histórias de ascensão e corrupção, este é um drama que vale a pena ser visto e, claro, debatido.
Up Date: Tanto Sebastian Stan quanto Jeremy Strong foram indicados ao Oscar 2025 - o trabalho dos dois é uma aula!
É muito difícil olhar para "O Aprendiz" simplesmente pelo viés cinematográfico. Independente do posicionamento político, é praticamente impossível desassociar a figura pública de Donald Trump de um ser-humano com uma dificuldade enorme de lidar com o poder - graças as suas incontáveis inseguranças que aliás, o filme pontua com perfeição. Ao olhar pela perspectiva do empreendedor, certamente você vai encontrar em seu íntimo, traços megalomaníacos de um Adam Neumann com uma boa dose de fraqueza de Mark Zuckerberg - e aqui estou levando muito em consideração o que assistimos em "WeCrashed" e em "A Rede Social" (nada mais). Pois bem, "O Aprendiz" não é apenas um filme biográfico convencional, mas um estudo de personagem que examina as engrenagens do poder e a construção de uma persona pública. Dirigido por Ali Abbasi (de "Holy Spider") e roteirizado por Gabriel Sherman (de "A Voz Mais Forte"), temos aqui um recorte capaz de nos levar pelos bastidores da ascensão de Trump nos anos 1970 e 1980, explorando sua relação com o polêmico advogado e estrategista Roy Cohn. Longe de um retrato panfletário, o filme se apresenta como um drama psicológico dos mais eficientes, especialmente por discutir as nuances da ambição, da corrupção e da formação de um dos personagens mais polarizadores da história recente. A abordagem de Abbasi nos remete a obras como "O Lobo de Wall Street" e "Vice" com um toque nostálgico de "Succession", onde a ascensão ao poder é tratada com um misto de fascínio e, principalmente, de repulsa.
No início de sua carreira, Donald Trump (Sebastian Stan) buscou orientação de Roy Cohn (Jeremy Strong), advogado de extrema direita conhecido por sua influência pouco ortodoxa nos bastidores da política e dos negócios. Cohn se tornou uma figura determinante para a consolidação do ambicioso jovem empresário no mercado imobiliário, especialmente nos círculos de poder de Nova York. Ao longo dos anos, essa relação moldou não apenas sua trajetória profissional, mas sua visão de mundo e sua estratégia política. Confira o trailer:
Ali Abbasi constrói sua narrativa sem apelar para caricaturas ou julgamentos óbvios. Em vez disso, ele nos apresenta um jovem Trump ainda em processo de formação, absorvendo a crueldade e o pragmatismo de Cohn. A relação entre os dois é o coração do filme, funcionando como uma espécie de pacto faustiano, onde Trump, inicialmente ingênuo e ambicioso, aprende a manipular e dobrar as regras do jogo para alcançar seus objetivos - e aqui é preciso elogiar de pé, Jeremy Strong. Ele entrega uma performance que canaliza toda a arrogância, astúcia e frieza de Cohn, um personagem que se torna quase um mentor malévolo para Trump. Enquanto Sebastian Stan constrói um Trump diferente do que estamos acostumados a ver na mídia. Não é a figura bombástica dos anos 2010, mas um jovem empresário tentando consolidar seu nome em Nova York. Sua atuação foge da imitação barata na busca por nuances: há momentos de insegurança, hesitação e até mesmo vulnerabilidade, mas sempre permeados por uma crescente absorção da filosofia implacável de Cohn. A transformação ao longo da jornada é sutil, mas perceptível – e é aí que Abbasi acerta em cheio. Ele nos faz testemunhar a mutação do protagonista, em vez de simplesmente retratar a história por si só.
A direção de Abbasi aposta em um realismo seco, evitando os maneirismos estilísticos comuns em cinebiografias políticas. A fotografia do dinamarquês Kasper Tuxen (de "Loucos por Justiça") é primorosa - ele cria uma ambientação com tons frios e pastéis, sempre muito granulado, em enquadramentos que projetam os contrastes entre os luxuosos escritórios e os ambientes mais sombrios onde as negociações de bastidores aconteciam - é difícil não se perguntar a razão pela qual Tuxen não foi indicado ao Oscar 2025. O desenho de produção é outro espetáculo - limitado pelo aspecto 4:3 da tela, ele recria com precisão a Nova York dos anos 70 e 80, trazendo detalhes que vão desde dos trajes impecáveis de Cohn até os primeiros edifícios que levariam o nome Trump na fachada. Outro ponto que favorece demais nossa imersão é a trilha sonora - ela transita entre o minimalismo que intensifica a tensão e o jogo de poder entre os personagens com as referências culturais da época, marcada por bandas como Pet Shop Boys, por exemplo!
O roteiro de Gabriel Sherman se baseia em pesquisas detalhadas e depoimentos sobre essa fase inicial da vida de Trump, mas evita cair em uma abordagem documental. Em vez disso, a estrutura de "O Aprendiz" se assemelha ao drama mais psicológico, onde cada decisão tomada pelo protagonista tem consequências que reverberam até hoje. O diálogo é afiado, refletindo a retórica agressiva de Cohn e o aprendizado gradual de Trump em dominar o discurso e a manipulação da mídia. Mesmo que o filme não tente oferecer respostas definitivas sobre o impacto da relação entre Trump e Cohn, ele deixa claro como esse período foi determinante para o que viria depois - a transformação do jovem empresário em um jogador implacável da política e dos negócios não é tratada como um evento isolado, mas como um processo meticulosamente arquitetado.
Veja, "O Aprendiz" não é um filme que busca escândalos ou grandes revelações, mas sim uma imersão na mentalidade de poder e influência que moldou um dos personagens mais controversos do EUA, ou seja, para aqueles interessados em histórias de ascensão e corrupção, este é um drama que vale a pena ser visto e, claro, debatido.
Up Date: Tanto Sebastian Stan quanto Jeremy Strong foram indicados ao Oscar 2025 - o trabalho dos dois é uma aula!
"Neymar - O Caos Perfeito" talvez seja um dos reviews mais complicados que já escrevi até hoje e explico a razão: existe um abismo enorme entre uma obra audiovisual de extrema qualidade e a sua necessidade de encontrar uma história que agrade uma grande audiência - e aqui o documentário do diretor David Charles Rodrigues, na minha opinião, não assumiu nenhum dos lados.
Então a minissérie é ruim? Não, mas poderia ser muito melhor!
Desde o lançamento primeiro teaser, a obra prometia resgatar parte da história do jogador e ainda acompanhar sua ascensão à fama desde a época em que jogava no Santos, seus dias de glória no Barcelona e ainda toda montanha-russa que já viveu com a Seleção Brasileira e com o Paris Saint Germain. "Neymar: O Caos Perfeito" também queria revelar um lado profissional pouco explorado pela mídia, mas muito usada pelos seus críticos: a máquina de marketing por trás do jogador, comandada por seu pai, Neymar da Silva Santos, mais conhecido como Neymar Pai. Veja o trailer, antes de seguirmos com a discussão:
Embora seja um viciado em esporte e um fã declarado do Neymar, minha função aqui é analisar a minissérie da Netflix, não as razões pela qual muitos dizem que o jogador nunca será o melhor do mundo ou que não levará nossa Seleção ao título de uma Copa - afirmações, aliás, que discordo completamente. Pois bem, ao assistir os três episódios de "Neymar - O Caos Perfeito" tive a nítida impressão que a Netflix jogou fora uma oportunidade única de reconstruir a trajetória de Neymar com um aprofundamento e um cuidado que o personagem merecia. A questão que mais me incomodou foi a superficialidade como roteiro trata sobre alguns assuntos tão sensíveis como a contusão que tirou o jogador da Copa de 2014, a forma como ele quis sair do PSG antes de finalizar seu contrato ou até a acusação de estupro que o jogador sofreu em 2019.
Fazendo um comparativo, a série do Star+, "Man in the Arena" (que traz um recorte bastante interessante da vida e da carreira de Tom Brady em nove episódios) está anos luz na frente "O Caos Perfeito". Não existe a menor comparação entre as obras e muitos dirão que entre os personagens também - eu, mais uma vez, discordo. Se pegarmos a minissérie que contou a história da dupla "Sandy & Jr", para saírmos um pouco do ambiente esportivo e nos aproximarmos de uma produção 100% nacional com personagens realmente relevantes, vemos que as possibilidades seriam enormes na mão de um diretor como o Douglas Aguilar. É claro que as condições de produção devem ser levadas em consideração e que qualquer tipo de interferência não deve existir - que, pelo que vi na própria minissérie, deve ter sido enorme.
O fato é que "Neymar - O Caos Perfeito" tem tudo que sua sinopse vende, mas na verdade é muito mais um retrato superficial de várias passagens da vida e da carreira do jogador, do que um exercício em buscar algumas repostas que muitas pessoas gostariam de encontrar sobre cada uma dessas passagens. Veja, essas respostas existem e em alguns lampejos do documentário vemos isso: a relação entre o atleta e seu pai talvez seja a prova dessa tese e que não por acaso, foi o grande destaque da minissérie. Independente de julgamentos ou opniões pessoais, é claro que o tamanho do Neymar mereceria um cuidado maior da produção. Se artisticamente a minissérie é bem construída, tecnicamente deixa um pouco a desejar, principalmente no roteiro - mas o que falta mesmo é "alma" e, sinceramente, torço para que essa história ainda seja muito longa (e vitoriosa) para termos uma outra chance de mostrar um olhar mais humano sobre Neymar.
"Neymar - O Caos Perfeito" vale seu play, mas vai funcionar mais como curiosidade do que como uma obra definitiva sobre um dos maiores jogadores de todos os tempos - gostem ou não dessa afirmação!
"Neymar - O Caos Perfeito" talvez seja um dos reviews mais complicados que já escrevi até hoje e explico a razão: existe um abismo enorme entre uma obra audiovisual de extrema qualidade e a sua necessidade de encontrar uma história que agrade uma grande audiência - e aqui o documentário do diretor David Charles Rodrigues, na minha opinião, não assumiu nenhum dos lados.
Então a minissérie é ruim? Não, mas poderia ser muito melhor!
Desde o lançamento primeiro teaser, a obra prometia resgatar parte da história do jogador e ainda acompanhar sua ascensão à fama desde a época em que jogava no Santos, seus dias de glória no Barcelona e ainda toda montanha-russa que já viveu com a Seleção Brasileira e com o Paris Saint Germain. "Neymar: O Caos Perfeito" também queria revelar um lado profissional pouco explorado pela mídia, mas muito usada pelos seus críticos: a máquina de marketing por trás do jogador, comandada por seu pai, Neymar da Silva Santos, mais conhecido como Neymar Pai. Veja o trailer, antes de seguirmos com a discussão:
Embora seja um viciado em esporte e um fã declarado do Neymar, minha função aqui é analisar a minissérie da Netflix, não as razões pela qual muitos dizem que o jogador nunca será o melhor do mundo ou que não levará nossa Seleção ao título de uma Copa - afirmações, aliás, que discordo completamente. Pois bem, ao assistir os três episódios de "Neymar - O Caos Perfeito" tive a nítida impressão que a Netflix jogou fora uma oportunidade única de reconstruir a trajetória de Neymar com um aprofundamento e um cuidado que o personagem merecia. A questão que mais me incomodou foi a superficialidade como roteiro trata sobre alguns assuntos tão sensíveis como a contusão que tirou o jogador da Copa de 2014, a forma como ele quis sair do PSG antes de finalizar seu contrato ou até a acusação de estupro que o jogador sofreu em 2019.
Fazendo um comparativo, a série do Star+, "Man in the Arena" (que traz um recorte bastante interessante da vida e da carreira de Tom Brady em nove episódios) está anos luz na frente "O Caos Perfeito". Não existe a menor comparação entre as obras e muitos dirão que entre os personagens também - eu, mais uma vez, discordo. Se pegarmos a minissérie que contou a história da dupla "Sandy & Jr", para saírmos um pouco do ambiente esportivo e nos aproximarmos de uma produção 100% nacional com personagens realmente relevantes, vemos que as possibilidades seriam enormes na mão de um diretor como o Douglas Aguilar. É claro que as condições de produção devem ser levadas em consideração e que qualquer tipo de interferência não deve existir - que, pelo que vi na própria minissérie, deve ter sido enorme.
O fato é que "Neymar - O Caos Perfeito" tem tudo que sua sinopse vende, mas na verdade é muito mais um retrato superficial de várias passagens da vida e da carreira do jogador, do que um exercício em buscar algumas repostas que muitas pessoas gostariam de encontrar sobre cada uma dessas passagens. Veja, essas respostas existem e em alguns lampejos do documentário vemos isso: a relação entre o atleta e seu pai talvez seja a prova dessa tese e que não por acaso, foi o grande destaque da minissérie. Independente de julgamentos ou opniões pessoais, é claro que o tamanho do Neymar mereceria um cuidado maior da produção. Se artisticamente a minissérie é bem construída, tecnicamente deixa um pouco a desejar, principalmente no roteiro - mas o que falta mesmo é "alma" e, sinceramente, torço para que essa história ainda seja muito longa (e vitoriosa) para termos uma outra chance de mostrar um olhar mais humano sobre Neymar.
"Neymar - O Caos Perfeito" vale seu play, mas vai funcionar mais como curiosidade do que como uma obra definitiva sobre um dos maiores jogadores de todos os tempos - gostem ou não dessa afirmação!
É impossível não pensar nessa minissérie com aquele "selo HBO". Não que a produção da Netflix seja ruim, mas definitivamente não está na mesma prateleira. Dito isso, e alinhada as expectativas, posso adiantar que "O Caso Asunta" vai te surpreendente mais pela história real bizarra do que por qualquer outra coisa. "El Caso Asunta" (no original), criada por Ramón Campos e Gema R. Neira (do ótimo "Fariña") ao lado de e David Orea e Jon de la Cuesta, é um mergulho nos detalhes mais sórdidos de um crime real que chocou a Espanha em 2013. A minissérie retrata o caso da jovem Asunta Basterra Porto, uma menina de 12 anos encontrada morta em circunstâncias misteriosas, e o subsequente julgamento de seus pais adotivos, Rosario Porto e Alfonso Basterra, acusados de seu assassinato. Com uma narrativa intensa, sempre pontuada por uma abordagem quase documental, "O Caso Asunta" oferece uma visão interessante, minuciosa e inquietante de um dos casos mais perturbadores dos últimos tempos na Europa.
O casal Rosario (Candela Peña) e Alfonso Basterra (Tristán Ulloa) denuncia o desaparecimento de sua filha adotiva, Asunta, em uma delegacia de Santiago, na Espanha. No entanto, uma série de contradições, rapidamente, fazem com que as investigações apontem que os próprios pais sejam indiciados pelo crime. Como é possível imaginar, essa linha de investigação liderada pelo egocêntrico Juez Malvar (Javier Gutiérrez) transforma o caso em uma jornada de grande repercussão na mídia espanhola em 2013, e que acaba deixando muitas marcas. Confira o trailer (em espanhol):
Se você for um grande apreciador do gênero, facilmente você perceberá como a minissérie é estruturada para nos remeter ao estilo "true crime" de conduzir uma narrativa. Combinando imagens reais do caso com reconstituições dramatizadas dos bastidores da investigação, focando especialmente nos acusados, "O Caso Asunta" constrói um retrato abrangente dos eventos que levaram à morte de Asunta. A produção se esforça para ser fiel aos fatos conhecidos do caso, ao mesmo tempo em que explora as complexidades emocionais e psicológicas dos envolvidos, com um conceito visual que, de fato, cria uma experiência imersiva que nos prende e nos faz questionar as motivações e o comportamento dos personagens centrais a todo momento.
Carlos Sedes e Jacobo Martínez (ambos de "Fariña") fazem um bom trabalho na direção ao equilibrar a narrativa mais factual com o drama humano. Mesmo com um orçamento limitado, é perceptível ao longo dos episódios, que os diretores se esforçam para entregar um ritmo meticuloso, guiando a audiência pelos eventos que precederam e seguiram a tragédia. O uso de cortes reais e uma câmera "mais nervosa" confere certa autenticidade à narrativa, certamente potencializa a gravidade do caso e o impacto que teve na sociedade espanhola. Reparem como os tons frios e a iluminação das cenas sublinham a atmosfera inquietante da história de forma a maximizar o impacto emocional, com planos mais fechados que refletem a angústia e a confusão em torno da investigação e do julgamento pela perspectiva de quem mais sofreu com tudo isso.
Ao evitar um enfoque unilateral, "O Caso Asunta" permite que audiência considere múltiplas teorias e interpretações, mostrando a complexidade da investigação e toda incerteza que muitas vezes acompanham casos de grande notoriedade pública. Essa proposta aumenta o lado entretenimento da história e acaba cobrando um pouco mais do seu elenco. Tanto Peña quanto Ulloa trazem uma intensidade e ambiguidade que justificam a perplexidade do público e da mídia em relação à sua culpabilidade ou inocência dos pais de Asunta, mas olha, é na figura de Juez Malvar do premiado Javier Gutiérrez que a minissérie mexe mesmo com nossas sensações mais particulares - especialmente quando percebemos que o crime funciona muito mais como um fenômeno cultural e um reflexo das ansiedades sociais contemporâneas, do que como uma missão pela justiça e pelo respeito à vitima.
"O Caso Asunta" vale o seu play!
É impossível não pensar nessa minissérie com aquele "selo HBO". Não que a produção da Netflix seja ruim, mas definitivamente não está na mesma prateleira. Dito isso, e alinhada as expectativas, posso adiantar que "O Caso Asunta" vai te surpreendente mais pela história real bizarra do que por qualquer outra coisa. "El Caso Asunta" (no original), criada por Ramón Campos e Gema R. Neira (do ótimo "Fariña") ao lado de e David Orea e Jon de la Cuesta, é um mergulho nos detalhes mais sórdidos de um crime real que chocou a Espanha em 2013. A minissérie retrata o caso da jovem Asunta Basterra Porto, uma menina de 12 anos encontrada morta em circunstâncias misteriosas, e o subsequente julgamento de seus pais adotivos, Rosario Porto e Alfonso Basterra, acusados de seu assassinato. Com uma narrativa intensa, sempre pontuada por uma abordagem quase documental, "O Caso Asunta" oferece uma visão interessante, minuciosa e inquietante de um dos casos mais perturbadores dos últimos tempos na Europa.
O casal Rosario (Candela Peña) e Alfonso Basterra (Tristán Ulloa) denuncia o desaparecimento de sua filha adotiva, Asunta, em uma delegacia de Santiago, na Espanha. No entanto, uma série de contradições, rapidamente, fazem com que as investigações apontem que os próprios pais sejam indiciados pelo crime. Como é possível imaginar, essa linha de investigação liderada pelo egocêntrico Juez Malvar (Javier Gutiérrez) transforma o caso em uma jornada de grande repercussão na mídia espanhola em 2013, e que acaba deixando muitas marcas. Confira o trailer (em espanhol):
Se você for um grande apreciador do gênero, facilmente você perceberá como a minissérie é estruturada para nos remeter ao estilo "true crime" de conduzir uma narrativa. Combinando imagens reais do caso com reconstituições dramatizadas dos bastidores da investigação, focando especialmente nos acusados, "O Caso Asunta" constrói um retrato abrangente dos eventos que levaram à morte de Asunta. A produção se esforça para ser fiel aos fatos conhecidos do caso, ao mesmo tempo em que explora as complexidades emocionais e psicológicas dos envolvidos, com um conceito visual que, de fato, cria uma experiência imersiva que nos prende e nos faz questionar as motivações e o comportamento dos personagens centrais a todo momento.
Carlos Sedes e Jacobo Martínez (ambos de "Fariña") fazem um bom trabalho na direção ao equilibrar a narrativa mais factual com o drama humano. Mesmo com um orçamento limitado, é perceptível ao longo dos episódios, que os diretores se esforçam para entregar um ritmo meticuloso, guiando a audiência pelos eventos que precederam e seguiram a tragédia. O uso de cortes reais e uma câmera "mais nervosa" confere certa autenticidade à narrativa, certamente potencializa a gravidade do caso e o impacto que teve na sociedade espanhola. Reparem como os tons frios e a iluminação das cenas sublinham a atmosfera inquietante da história de forma a maximizar o impacto emocional, com planos mais fechados que refletem a angústia e a confusão em torno da investigação e do julgamento pela perspectiva de quem mais sofreu com tudo isso.
Ao evitar um enfoque unilateral, "O Caso Asunta" permite que audiência considere múltiplas teorias e interpretações, mostrando a complexidade da investigação e toda incerteza que muitas vezes acompanham casos de grande notoriedade pública. Essa proposta aumenta o lado entretenimento da história e acaba cobrando um pouco mais do seu elenco. Tanto Peña quanto Ulloa trazem uma intensidade e ambiguidade que justificam a perplexidade do público e da mídia em relação à sua culpabilidade ou inocência dos pais de Asunta, mas olha, é na figura de Juez Malvar do premiado Javier Gutiérrez que a minissérie mexe mesmo com nossas sensações mais particulares - especialmente quando percebemos que o crime funciona muito mais como um fenômeno cultural e um reflexo das ansiedades sociais contemporâneas, do que como uma missão pela justiça e pelo respeito à vitima.
"O Caso Asunta" vale o seu play!