Só assista "Rio, eu te amo" se você já conhecer a dinâmica narrativa da série de filmes que fazem parte do projeto "Cities of Love" dos ótimos "Paris Je T’Aime" e "New York, I Love You". Primeiro por ter uma identidade muito particular e segundo por se tratar de um projeto extremamente autoral e, em muitos momentos, bastante experimental. Pessoalmente, acho a série de filmes incrível, porém reconheço que existe uma oscilação entre uma história e outra que acaba englobando vários estilos e gêneros e isso afasta boa parte da audiência que está acostumada com uma narrativa mais conservadora e linear - e aqui não se trata de uma crítica, já que "gosto é gosto", mas é preciso alinhar as expectativas para você não se decepcionar com a proposta do filme.
Como os seus antecessores, "Rio, Eu Te Amo" reúne dez curtas de diretores brasileiros e internacionais que contam histórias que se passam em diferentes pontos do Rio de Janeiro, revelando as características da cidade e tendo um elemento em comum: o amor (ou a falta dele). Confira o trailer:
Produzida pelo francês Emmanuel Benbihy, "Rio, eu te amo" tem mais acertos do que falhas e um dos elementos que mais me atrai na proposta experimental do filme é a forma como a montagem vai encaixando as histórias que, diga-se de passagem, não tem a menor necessidade de conversarem entre si. Veja, como toda metrópole o Rio de Janeiro também tem as suas histórias e seus personagens muito particulares, além de um visual incrível (lindamente trabalhada na fotografia), com isso a passagem de bastão entre um curta-metragem e outro é muito fluida quando a interação entre os protagonistas acontecem. Claro que existem alguns desalinhamentos, mas a conexão cria, de fato, uma sensação de unidade, mesmo com conduções tão fragmentadas.
Reparem que nada indica quando uma história termina e outra começa, por isso conhecer o conceito ajuda a se relacionar melhor com o filme, mas é notório que algumas das propostas funcionam melhor do que outras quando observadas de perto. De cara vale destacar "O Milagre" de Nadine Labaki ("E Agora, Aonde Vamos"). Durante uma filmagem no Rio, um casal de atores famosos conhecem um menino que acredita receber telefonemas de Jesus. No início, eles o encaram com desconfiança, mas logo percebem que esse "Jesus" não é quem o menino está pensando e resolvem "ajudar" o simpático carioquinha - o jovem Cauã Antunes é uma pérola. Outro segmento que me chamou atenção foi "Texas" de Guillermo Arriaga (roteirista de "Babel"). Após um acidente de carro, Texas, um ex-lutador de boxe, perde um braço e sua esposa não consegue mais andar. Para conseguir pagar uma cirurgia que pode curar a esposa, ele acaba se envolvendo em uma rede lutas clandestinas que coloca o seu relacionamento em jogo. E para finalizar, "Pas de Deux" de Carlos Saldanha. Aqui temos uma curiosidade: esse foi o primeiro filme em live-action dirigido pelo animador brasileiro. Ele se passa no interior do belíssimo Teatro Municipal e retrata a relação de um casal de bailarinos que entra em crise por causa da carreira, que pode separá-los, momentos antes de iniciarem uma importante apresentação.
Claro que "Rio, eu te amo" é um recorte do Brasil, que está naquela mesma prateleira que vimos em New York e Paris - ou seja, o filme que se apropria da paisagem e das particularidades locais com aquela pitada de conto literal para "inglês ver". O filme tem o pretexto de misturar talento (e são muitos: Andrucha Waddington, José Padilha, Fernando Meirelles, Paolo Sorrentino, etc) com liberdade criativa, para fazer publicidade com um toque de homenagem, crítica social e até um certo ufanismo. Eu te digo que é uma experiência interessante, divertida, mas que não será uma unanimidade na sua totalidade. Como mérito, talvez essa versão brasileira do projeto "Cities of Love" seja a mais sincera e honesta até aqui.
Vale o play!
Só assista "Rio, eu te amo" se você já conhecer a dinâmica narrativa da série de filmes que fazem parte do projeto "Cities of Love" dos ótimos "Paris Je T’Aime" e "New York, I Love You". Primeiro por ter uma identidade muito particular e segundo por se tratar de um projeto extremamente autoral e, em muitos momentos, bastante experimental. Pessoalmente, acho a série de filmes incrível, porém reconheço que existe uma oscilação entre uma história e outra que acaba englobando vários estilos e gêneros e isso afasta boa parte da audiência que está acostumada com uma narrativa mais conservadora e linear - e aqui não se trata de uma crítica, já que "gosto é gosto", mas é preciso alinhar as expectativas para você não se decepcionar com a proposta do filme.
Como os seus antecessores, "Rio, Eu Te Amo" reúne dez curtas de diretores brasileiros e internacionais que contam histórias que se passam em diferentes pontos do Rio de Janeiro, revelando as características da cidade e tendo um elemento em comum: o amor (ou a falta dele). Confira o trailer:
Produzida pelo francês Emmanuel Benbihy, "Rio, eu te amo" tem mais acertos do que falhas e um dos elementos que mais me atrai na proposta experimental do filme é a forma como a montagem vai encaixando as histórias que, diga-se de passagem, não tem a menor necessidade de conversarem entre si. Veja, como toda metrópole o Rio de Janeiro também tem as suas histórias e seus personagens muito particulares, além de um visual incrível (lindamente trabalhada na fotografia), com isso a passagem de bastão entre um curta-metragem e outro é muito fluida quando a interação entre os protagonistas acontecem. Claro que existem alguns desalinhamentos, mas a conexão cria, de fato, uma sensação de unidade, mesmo com conduções tão fragmentadas.
Reparem que nada indica quando uma história termina e outra começa, por isso conhecer o conceito ajuda a se relacionar melhor com o filme, mas é notório que algumas das propostas funcionam melhor do que outras quando observadas de perto. De cara vale destacar "O Milagre" de Nadine Labaki ("E Agora, Aonde Vamos"). Durante uma filmagem no Rio, um casal de atores famosos conhecem um menino que acredita receber telefonemas de Jesus. No início, eles o encaram com desconfiança, mas logo percebem que esse "Jesus" não é quem o menino está pensando e resolvem "ajudar" o simpático carioquinha - o jovem Cauã Antunes é uma pérola. Outro segmento que me chamou atenção foi "Texas" de Guillermo Arriaga (roteirista de "Babel"). Após um acidente de carro, Texas, um ex-lutador de boxe, perde um braço e sua esposa não consegue mais andar. Para conseguir pagar uma cirurgia que pode curar a esposa, ele acaba se envolvendo em uma rede lutas clandestinas que coloca o seu relacionamento em jogo. E para finalizar, "Pas de Deux" de Carlos Saldanha. Aqui temos uma curiosidade: esse foi o primeiro filme em live-action dirigido pelo animador brasileiro. Ele se passa no interior do belíssimo Teatro Municipal e retrata a relação de um casal de bailarinos que entra em crise por causa da carreira, que pode separá-los, momentos antes de iniciarem uma importante apresentação.
Claro que "Rio, eu te amo" é um recorte do Brasil, que está naquela mesma prateleira que vimos em New York e Paris - ou seja, o filme que se apropria da paisagem e das particularidades locais com aquela pitada de conto literal para "inglês ver". O filme tem o pretexto de misturar talento (e são muitos: Andrucha Waddington, José Padilha, Fernando Meirelles, Paolo Sorrentino, etc) com liberdade criativa, para fazer publicidade com um toque de homenagem, crítica social e até um certo ufanismo. Eu te digo que é uma experiência interessante, divertida, mas que não será uma unanimidade na sua totalidade. Como mérito, talvez essa versão brasileira do projeto "Cities of Love" seja a mais sincera e honesta até aqui.
Vale o play!
"Rivais" poderia ter cinco minutos a menos, mas ainda assim é muito bom - agora é preciso que se diga: o filme é uma versão de "Closer", mais adolescente e no universo do tênis profissional. É isso, "Challengers" (no original) é um drama que se destaca pelo paralelo que constrói entre uma relação de casal e o intrigante mundo do tênis, obviamente, indo além do esporte para explorar questões como a ambição e os reflexos de um complexo triângulo emocional entre seus personagens principais. Lançado em 2024, o filme dirigido por Luca Guadagnino combina sua estética visual única com um enredo que mescla romance, tensão e angústia.
A história segue Tashi Duncan (Zendaya), uma ex-jogadora de tênis prodígio que, após uma grave lesão que a impede de continuar jogando, se torna treinadora de seu marido, Art (Mike Faist), um atleta em crise de confiança. O relacionamento deles começa a desmoronar quando Art é forçado a competir contra Patrick (Josh O'Connor), seu ex-melhor amigo e também ex-namorado de Tashi. À medida que o torneio avança, as tensões entre o trio aumentam, misturando ressentimentos passados, ciúmes e rivalidades pessoais onde a necessidade de vitória vai muito além do esporte. Confira o trailer:
Um fato: o filme não é sobre tênis, mas sobre as relações interpessoais e os conflitos que surgem no meio de uma pressão imensa. Guadagnino usa do esporte apenas como um pano de fundo para explorar cuidadosamente os altos e baixos dos relacionamentos, principalmente na dinâmica, através dos anos, entre Tashi, Art e Patrick. O tênis, nesse caso, é mais uma metáfora para a competitividade que permeia todas as esferas da vida - seja no campo profissional, amoroso ou pessoal. A direção de Guadagnino, para muitos, vai soar elegante e visualmente cativante. Ele utiliza a câmera para capturar não apenas a intensidade física das partidas de tênis (aqui pouco inspirado), mas também a intimidade emocional dos personagens (já aqui o que ele sabe fazer de melhor). As cenas dos jogos de tênis são coreografadas de maneira até vibrante, transmitindo a energia e a tensão da competição, mas são nos momentos mais silenciosos e introspectivos que Guadagnino realmente brilha - a forma como ele dirige seu elenco é genial. Repare na maneira como ele constrói o suspense emocional entre os personagens - é muito Mike Nichols (diretor de "Closer").
Zendaya mais uma vez se destaca, retratando uma personagem forte, ambiciosa e, ao mesmo tempo, emocionalmente vulnerável e de caráter duvidoso. Sua atuação é complexa, já que Tashi é uma mulher que manipula os dois homens ao longo de sua vida para alcançar seus próprios objetivos, mas também é alguém que carrega o peso de suas próprias inseguranças e arrependimentos. A relação de Tashi com Art e Patrick é marcada por uma mistura de paixão, traição e desejo, e Zendaya consegue equilibrar perfeitamente esses elementos de forma convincente, tornando sua personagem fascinante de acompanhar - uma mistura de Alice (Natalie Portman) com Anna (Julia Roberts) para ficar só em "Closer".
Embora o roteiro possa parecer um tanto previsível em alguns momentos, especialmente nas reviravoltas emocionais que envolvem o triângulo amoroso, os diálogos são muito bem escritos e as motivações dos personagens soam compreensíveis - a sacada do simbolismo da raquete no final do terceiro ato é uma golaço de Justin Kuritzkes (em seu primeiro texto para o cinema). O enredo segue uma trajetória que pode ser antecipada pela audiência, especialmente para aqueles familiarizados com dramas de relações que envolvem rivalidades amorosas, ainda assim, "Rivais" consegue se sustentar por mais de 120 minutos - em grande parte devido às atuações poderosas e à habilidade de Guadagnino de criar uma atmosfera emocional das mais intensas.
Vale muito o seu play!
"Rivais" poderia ter cinco minutos a menos, mas ainda assim é muito bom - agora é preciso que se diga: o filme é uma versão de "Closer", mais adolescente e no universo do tênis profissional. É isso, "Challengers" (no original) é um drama que se destaca pelo paralelo que constrói entre uma relação de casal e o intrigante mundo do tênis, obviamente, indo além do esporte para explorar questões como a ambição e os reflexos de um complexo triângulo emocional entre seus personagens principais. Lançado em 2024, o filme dirigido por Luca Guadagnino combina sua estética visual única com um enredo que mescla romance, tensão e angústia.
A história segue Tashi Duncan (Zendaya), uma ex-jogadora de tênis prodígio que, após uma grave lesão que a impede de continuar jogando, se torna treinadora de seu marido, Art (Mike Faist), um atleta em crise de confiança. O relacionamento deles começa a desmoronar quando Art é forçado a competir contra Patrick (Josh O'Connor), seu ex-melhor amigo e também ex-namorado de Tashi. À medida que o torneio avança, as tensões entre o trio aumentam, misturando ressentimentos passados, ciúmes e rivalidades pessoais onde a necessidade de vitória vai muito além do esporte. Confira o trailer:
Um fato: o filme não é sobre tênis, mas sobre as relações interpessoais e os conflitos que surgem no meio de uma pressão imensa. Guadagnino usa do esporte apenas como um pano de fundo para explorar cuidadosamente os altos e baixos dos relacionamentos, principalmente na dinâmica, através dos anos, entre Tashi, Art e Patrick. O tênis, nesse caso, é mais uma metáfora para a competitividade que permeia todas as esferas da vida - seja no campo profissional, amoroso ou pessoal. A direção de Guadagnino, para muitos, vai soar elegante e visualmente cativante. Ele utiliza a câmera para capturar não apenas a intensidade física das partidas de tênis (aqui pouco inspirado), mas também a intimidade emocional dos personagens (já aqui o que ele sabe fazer de melhor). As cenas dos jogos de tênis são coreografadas de maneira até vibrante, transmitindo a energia e a tensão da competição, mas são nos momentos mais silenciosos e introspectivos que Guadagnino realmente brilha - a forma como ele dirige seu elenco é genial. Repare na maneira como ele constrói o suspense emocional entre os personagens - é muito Mike Nichols (diretor de "Closer").
Zendaya mais uma vez se destaca, retratando uma personagem forte, ambiciosa e, ao mesmo tempo, emocionalmente vulnerável e de caráter duvidoso. Sua atuação é complexa, já que Tashi é uma mulher que manipula os dois homens ao longo de sua vida para alcançar seus próprios objetivos, mas também é alguém que carrega o peso de suas próprias inseguranças e arrependimentos. A relação de Tashi com Art e Patrick é marcada por uma mistura de paixão, traição e desejo, e Zendaya consegue equilibrar perfeitamente esses elementos de forma convincente, tornando sua personagem fascinante de acompanhar - uma mistura de Alice (Natalie Portman) com Anna (Julia Roberts) para ficar só em "Closer".
Embora o roteiro possa parecer um tanto previsível em alguns momentos, especialmente nas reviravoltas emocionais que envolvem o triângulo amoroso, os diálogos são muito bem escritos e as motivações dos personagens soam compreensíveis - a sacada do simbolismo da raquete no final do terceiro ato é uma golaço de Justin Kuritzkes (em seu primeiro texto para o cinema). O enredo segue uma trajetória que pode ser antecipada pela audiência, especialmente para aqueles familiarizados com dramas de relações que envolvem rivalidades amorosas, ainda assim, "Rivais" consegue se sustentar por mais de 120 minutos - em grande parte devido às atuações poderosas e à habilidade de Guadagnino de criar uma atmosfera emocional das mais intensas.
Vale muito o seu play!
Costumo dizer que antes de qualquer julgamento, precisamos escutar os dois lados da história. É mais ou menos o que o diretor Todd Haynes (indicado ao Oscar por "Longe do Paraíso" em 2003) faz em "Segredos de um Escândalo" ao revisitar a história real de Mary Kay Letourneau, uma professora de 34 anos que se envolveu com um aluno de 13, engravidou durante o relacionamento, foi presa e depois se casou com o jovem. Com uma narrativa repleta de simbolismos e algumas adaptações, Haynes mergulha no íntimo dos personagens (aqui fictícios) para discutir as consequências devastadoras de algumas escolhas complexas do passado e como o julgamento social, de fato, impacta para sempre nas relações mais íntimas de todos os envolvidos. O diretor constrói uma jornada cheia de nuances que explora os dilemas da paixão, mas que não entrega todas as respostas, ou seja, se você está esperando algo usual em dramas desse estilo, provavelmente você não vai se conectar com o filme - aqui nos afastamos do sensacionalismo barato para percorrer a via da autoconsciência e da reflexão.
Vinte anos anos após um escândalo que abalou a comunidade local, Gracie (Julianne Moore) e Joe (Charles Melton), um casal com 23 anos de diferença, tentam ter uma vida normal, até que a atriz Elizabeth (Natalie Portman) se aproxima de Grace com o objetivo de se preparar para o seu próximo filme em que ela interpretará a própria Gracie. O problema é que essa jornada de pesquisa e estudos não só traz de volta vários fantasmas do passado como mexe com toda dinâmica de uma comunidade que nunca esteve disposta a esquecer o ocorrido. Confira o trailer:
Embora "Segredos de um Escândalo" tenha uma premissa que sugira um drama cheio de embates e julgamentos, eu diria que a originalidade do roteiro indicado ao Oscar, da novata Samy Burch, está justamente na quebra dessas expectativas. Cadenciada, mas sempre no tom certo, a narrativa funciona muito mais como uma espécie de mosaico de tonalidades emocionais do que como uma investigação profunda sobre mocinhos e bandidos de um caso realmente marcante. Com uma proposta muito mais honesta, o roteiro nos leva para um olhar além do escândalo em si, entregando um drama mais humano e levantando questionamentos sobre a moralidade, sobre o amor real, sobre o desejo, mas principalmente sobre as consequências de escolhas impensáveis. Veja, a narrativa não oferece respostas fáceis, mas tenha certeza que você vai se sentir provocado a refletir sobre as diversas faces da natureza humana.
A direção de Haynes é tecnicamente perfeita. Embora ele não arrisque na sua "forma", ele se aproveita do "conteúdo" para justamente desconstruir uma história complexa e ofertar para a audiência uma perspectiva menos superficial - Elizabeth é a personificação dessa estratégia que, simbolizada pela arte de atuar, lida com o desconforto daquela atmosfera de hipocrisia para entender as motivações todos os lados. Obviamente que a performance de Portman e de Moore dão tom desse jogo de verdades e aparências - as duas estão excepcionais, embora nenhuma tenha sido lembrada pela Academia e indicada ao Oscar. Uma pena, porque Portman entrega um trabalho realmente visceral, capturando toda a vulnerabilidade e a complexidade de Elizabeth enquanto ela navega pelos segredos mais obscuros de Gracie sem ao menos entender se está indo pelo caminho certo Enquanto Moore brilha com sua intensidade, transmitindo a dor, o arrependimento, a insegurança e a resiliência de uma mulher que enfrentou (e enfrenta) o julgamento da sociedade.
"Segredos de um Escândalo" dividiu opiniões pelos caminhos escolhidos por Haynes - natural quando se troca o certo pelo diferente. Na minha humilde opinião estamos diante de um filme imperdível, especialmente se você aprecia dramas psicológicos mais intensos e reflexivos. Não será uma jornada tranquila, especialmente por sabermos como Hollywood e a indústria jornalística se apropriam de histórias repletas de sofrimento para entregar entretenimento barato sem ao menos olhar para seus protagonistas com alguma empatia. Aqui, mais do que empatia, existe respeito.
Vale seu play!
Costumo dizer que antes de qualquer julgamento, precisamos escutar os dois lados da história. É mais ou menos o que o diretor Todd Haynes (indicado ao Oscar por "Longe do Paraíso" em 2003) faz em "Segredos de um Escândalo" ao revisitar a história real de Mary Kay Letourneau, uma professora de 34 anos que se envolveu com um aluno de 13, engravidou durante o relacionamento, foi presa e depois se casou com o jovem. Com uma narrativa repleta de simbolismos e algumas adaptações, Haynes mergulha no íntimo dos personagens (aqui fictícios) para discutir as consequências devastadoras de algumas escolhas complexas do passado e como o julgamento social, de fato, impacta para sempre nas relações mais íntimas de todos os envolvidos. O diretor constrói uma jornada cheia de nuances que explora os dilemas da paixão, mas que não entrega todas as respostas, ou seja, se você está esperando algo usual em dramas desse estilo, provavelmente você não vai se conectar com o filme - aqui nos afastamos do sensacionalismo barato para percorrer a via da autoconsciência e da reflexão.
Vinte anos anos após um escândalo que abalou a comunidade local, Gracie (Julianne Moore) e Joe (Charles Melton), um casal com 23 anos de diferença, tentam ter uma vida normal, até que a atriz Elizabeth (Natalie Portman) se aproxima de Grace com o objetivo de se preparar para o seu próximo filme em que ela interpretará a própria Gracie. O problema é que essa jornada de pesquisa e estudos não só traz de volta vários fantasmas do passado como mexe com toda dinâmica de uma comunidade que nunca esteve disposta a esquecer o ocorrido. Confira o trailer:
Embora "Segredos de um Escândalo" tenha uma premissa que sugira um drama cheio de embates e julgamentos, eu diria que a originalidade do roteiro indicado ao Oscar, da novata Samy Burch, está justamente na quebra dessas expectativas. Cadenciada, mas sempre no tom certo, a narrativa funciona muito mais como uma espécie de mosaico de tonalidades emocionais do que como uma investigação profunda sobre mocinhos e bandidos de um caso realmente marcante. Com uma proposta muito mais honesta, o roteiro nos leva para um olhar além do escândalo em si, entregando um drama mais humano e levantando questionamentos sobre a moralidade, sobre o amor real, sobre o desejo, mas principalmente sobre as consequências de escolhas impensáveis. Veja, a narrativa não oferece respostas fáceis, mas tenha certeza que você vai se sentir provocado a refletir sobre as diversas faces da natureza humana.
A direção de Haynes é tecnicamente perfeita. Embora ele não arrisque na sua "forma", ele se aproveita do "conteúdo" para justamente desconstruir uma história complexa e ofertar para a audiência uma perspectiva menos superficial - Elizabeth é a personificação dessa estratégia que, simbolizada pela arte de atuar, lida com o desconforto daquela atmosfera de hipocrisia para entender as motivações todos os lados. Obviamente que a performance de Portman e de Moore dão tom desse jogo de verdades e aparências - as duas estão excepcionais, embora nenhuma tenha sido lembrada pela Academia e indicada ao Oscar. Uma pena, porque Portman entrega um trabalho realmente visceral, capturando toda a vulnerabilidade e a complexidade de Elizabeth enquanto ela navega pelos segredos mais obscuros de Gracie sem ao menos entender se está indo pelo caminho certo Enquanto Moore brilha com sua intensidade, transmitindo a dor, o arrependimento, a insegurança e a resiliência de uma mulher que enfrentou (e enfrenta) o julgamento da sociedade.
"Segredos de um Escândalo" dividiu opiniões pelos caminhos escolhidos por Haynes - natural quando se troca o certo pelo diferente. Na minha humilde opinião estamos diante de um filme imperdível, especialmente se você aprecia dramas psicológicos mais intensos e reflexivos. Não será uma jornada tranquila, especialmente por sabermos como Hollywood e a indústria jornalística se apropriam de histórias repletas de sofrimento para entregar entretenimento barato sem ao menos olhar para seus protagonistas com alguma empatia. Aqui, mais do que empatia, existe respeito.
Vale seu play!
Um grande filme, visceral eu diria, mas já adianto: não será uma jornada fácil, pois a história é tão potente que vai mexer com suas mais particulares emoções e deixar uma marca incrivelmente profunda! "Segunda Chance" da talentosa (e premiada) diretora dinamarquesa Susanne Bier (de "The Night Manager") é simplesmente imperdível. Uma obra-prima do cinema nórdico (com toda aquela qualidade técnica e artística) que nos leva por uma montanha-russa de sentimentos, explorando temas dolorosos como depressão, maternidade, redenção, amor e, principalmente, escolhas que moldam nossas vidas para sempre. Não é à toa que o filme conquistou diversos prêmios ao redor do planeta e é frequentemente comparado com produções igualmente impactantes, como "Incêndios" ou até com “Pieces of a Woman”, então prepare-se para uma experiência, de fato, marcante!
O filme conta a história de Andreas (Nikolaj Coster-Waldau, o inesquecível Jaime Lannister de GoT), um dedicado policial que, junto com seu parceiro Simon (Ulrich Thomsen), se vêem envolvidos em um drama de partir o coração quando encontram um bebê de poucos meses em condições deploráveis dentro de um armário durante uma intervenção de briga doméstica entre um casal de viciados. Esse evento chocante desencadeia uma série de atitudes impensáveis que levam seus personagens a confrontar os próprios demônios e enfrentar consequências realmente marcantes em suas vidas. Confira o trailer:
Esse é um filme que tem alma, que conta com uma direção precisa de Bier, especialmente de seu elenco, e que alcança um outro patamar através da fotografia sensível de Michael Snyman (parceiro da diretora em "The Night Manager"). Snyman cria uma atmosfera intensa com seus close-ups que ecoam o turbilhão emocional dos personagens. Sabendo disso, Bier se aproveita desses enquadramentos de forma habilidosa, potencializando os momentos de alta tensão para capturar as expressões dos atores carregadas de emoção com um silêncio ensurdecedor - mesmo que em muitos momentos a trilha sonora, composta por Johan Söderqvist (de "Anatomia de um Escândalo"), complemente perfeitamente o mood do filme, ampliando o impacto das cenas de uma maneira bastante poética, mas não menos dolorosa.
O elenco realmente entrega performances brilhantes. Waldau mergulha profundamente nessa dor silenciosa de Andreas, mostrando toda transformação de um policial até certo modo bruto em um homem que enfrenta dilemas morais angustiantes - o elemento que desencadeia essa humanidade, a empatia, vai te fazer criar inúmeros julgamentos durante o filme e é isso que nos envolve tanto com suas escolhas. A química entre os atores é palpável, tornando cada interação entre eles ainda mais real - e aqui é impossível não citar o trabalho cheio de nuances de Maria Bonnevie como Anna, a esposa de Andreas.
"Segunda Chance" tem um senso de urgência e desconforto que permeia toda a narrativa - a sensação de angústia é mesmo muito presente. O roteiro de Bier ao lado de Anders Thomas Jensen (vencedor do Oscar pelo curta-metragem "Election Night", depois de improváveis três indicações seguidas ao mesmo prêmio) nos provoca, a todo momento, refletir sobre as consequências de nossas escolhas, mesmo as mais difíceis, e como elas podem moldar nosso destino de maneiras tão inesperadas - isso toca nosso coração de verdade. Então, sem muita enrolação, não deixa de assistir esse filme, você não vai se arrepender!
Um grande filme, visceral eu diria, mas já adianto: não será uma jornada fácil, pois a história é tão potente que vai mexer com suas mais particulares emoções e deixar uma marca incrivelmente profunda! "Segunda Chance" da talentosa (e premiada) diretora dinamarquesa Susanne Bier (de "The Night Manager") é simplesmente imperdível. Uma obra-prima do cinema nórdico (com toda aquela qualidade técnica e artística) que nos leva por uma montanha-russa de sentimentos, explorando temas dolorosos como depressão, maternidade, redenção, amor e, principalmente, escolhas que moldam nossas vidas para sempre. Não é à toa que o filme conquistou diversos prêmios ao redor do planeta e é frequentemente comparado com produções igualmente impactantes, como "Incêndios" ou até com “Pieces of a Woman”, então prepare-se para uma experiência, de fato, marcante!
O filme conta a história de Andreas (Nikolaj Coster-Waldau, o inesquecível Jaime Lannister de GoT), um dedicado policial que, junto com seu parceiro Simon (Ulrich Thomsen), se vêem envolvidos em um drama de partir o coração quando encontram um bebê de poucos meses em condições deploráveis dentro de um armário durante uma intervenção de briga doméstica entre um casal de viciados. Esse evento chocante desencadeia uma série de atitudes impensáveis que levam seus personagens a confrontar os próprios demônios e enfrentar consequências realmente marcantes em suas vidas. Confira o trailer:
Esse é um filme que tem alma, que conta com uma direção precisa de Bier, especialmente de seu elenco, e que alcança um outro patamar através da fotografia sensível de Michael Snyman (parceiro da diretora em "The Night Manager"). Snyman cria uma atmosfera intensa com seus close-ups que ecoam o turbilhão emocional dos personagens. Sabendo disso, Bier se aproveita desses enquadramentos de forma habilidosa, potencializando os momentos de alta tensão para capturar as expressões dos atores carregadas de emoção com um silêncio ensurdecedor - mesmo que em muitos momentos a trilha sonora, composta por Johan Söderqvist (de "Anatomia de um Escândalo"), complemente perfeitamente o mood do filme, ampliando o impacto das cenas de uma maneira bastante poética, mas não menos dolorosa.
O elenco realmente entrega performances brilhantes. Waldau mergulha profundamente nessa dor silenciosa de Andreas, mostrando toda transformação de um policial até certo modo bruto em um homem que enfrenta dilemas morais angustiantes - o elemento que desencadeia essa humanidade, a empatia, vai te fazer criar inúmeros julgamentos durante o filme e é isso que nos envolve tanto com suas escolhas. A química entre os atores é palpável, tornando cada interação entre eles ainda mais real - e aqui é impossível não citar o trabalho cheio de nuances de Maria Bonnevie como Anna, a esposa de Andreas.
"Segunda Chance" tem um senso de urgência e desconforto que permeia toda a narrativa - a sensação de angústia é mesmo muito presente. O roteiro de Bier ao lado de Anders Thomas Jensen (vencedor do Oscar pelo curta-metragem "Election Night", depois de improváveis três indicações seguidas ao mesmo prêmio) nos provoca, a todo momento, refletir sobre as consequências de nossas escolhas, mesmo as mais difíceis, e como elas podem moldar nosso destino de maneiras tão inesperadas - isso toca nosso coração de verdade. Então, sem muita enrolação, não deixa de assistir esse filme, você não vai se arrepender!
"Loveless" (titulo original) foi o representante da Russia indicadopara o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro em 2018. Olha, é um filmão!!!
Zhenya (Maryana Spivak) e Boris (Aleksey Rozin) estão no meio de um processo de divórcio litigioso, cheio de ressentimento, frustração e acusações. Ambos estão tentando iniciar novos ciclos, cada um com um novo parceiro. Ele estão impacientes para começar essa nova vida e virar a página desse tortuoso casamento - mesmo que isso implique na ameaça de abandonar o filho de 12 anos, Alyosha (Matvey Novikov). Depois de testemunhar uma das várias discussões dos pais, Alyosha simplesmente desaparece e a vida de Zhenya e Boris entram em parafuso! Confira o trailer:
Muito bem dirigido pelo Andrei Zvyagintsev, o mesmo de "Leviathan", que também disputou o Oscar em 2015. O cara é uma espécie de Asghar Farhadi da Rússia. Normalmente ele destrincha a relação humana até as últimas consequências sem o menor pudor de mostrar as imperfeições mais comuns do ser humano, porém ele emoldura esses dramas com uma fotografia sensacional - eu diria, inclusive, que a foto de "Loveless" é uma das mais bonitas do ano. Trabalho do seu parceiro Mikhail Krichman.
Além dessa atmosférica única (e fria), os movimentos de câmera são precisos, até quando ela não se movimenta, por mais paradoxal que possa parecer. Zvyagintsev e Krichman já tinham feito exatamente isso em "Leviathan" e repetiu muito bem agora. O diretor cria sensações durante o filme inteiro e você embarca na maneira como ele narra os fatos de uma forma muito particular, pois você nunca sabe quem está certo, quem está errado, quem é o mocinho, quem é o bandido! É muito desafiador conhecer os personagens dos filmes dele, pois essas imperfeições estão sempre lá, mas ele entrega numa medida certa!!! Em "Sem amor", por exemplo, você não sabe se o drama está na mãe, no pai, na criança, na relação entre eles (ou parte deles), no momento de vida de cada um, etc. É muito bacana!
Para quem gosta de filmes estrangeiros, independentes, com potencial de Oscar, essa é uma grande oportunidade de conhecer o cinema Russo. Vale muito a pena!
"Loveless" (titulo original) foi o representante da Russia indicadopara o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro em 2018. Olha, é um filmão!!!
Zhenya (Maryana Spivak) e Boris (Aleksey Rozin) estão no meio de um processo de divórcio litigioso, cheio de ressentimento, frustração e acusações. Ambos estão tentando iniciar novos ciclos, cada um com um novo parceiro. Ele estão impacientes para começar essa nova vida e virar a página desse tortuoso casamento - mesmo que isso implique na ameaça de abandonar o filho de 12 anos, Alyosha (Matvey Novikov). Depois de testemunhar uma das várias discussões dos pais, Alyosha simplesmente desaparece e a vida de Zhenya e Boris entram em parafuso! Confira o trailer:
Muito bem dirigido pelo Andrei Zvyagintsev, o mesmo de "Leviathan", que também disputou o Oscar em 2015. O cara é uma espécie de Asghar Farhadi da Rússia. Normalmente ele destrincha a relação humana até as últimas consequências sem o menor pudor de mostrar as imperfeições mais comuns do ser humano, porém ele emoldura esses dramas com uma fotografia sensacional - eu diria, inclusive, que a foto de "Loveless" é uma das mais bonitas do ano. Trabalho do seu parceiro Mikhail Krichman.
Além dessa atmosférica única (e fria), os movimentos de câmera são precisos, até quando ela não se movimenta, por mais paradoxal que possa parecer. Zvyagintsev e Krichman já tinham feito exatamente isso em "Leviathan" e repetiu muito bem agora. O diretor cria sensações durante o filme inteiro e você embarca na maneira como ele narra os fatos de uma forma muito particular, pois você nunca sabe quem está certo, quem está errado, quem é o mocinho, quem é o bandido! É muito desafiador conhecer os personagens dos filmes dele, pois essas imperfeições estão sempre lá, mas ele entrega numa medida certa!!! Em "Sem amor", por exemplo, você não sabe se o drama está na mãe, no pai, na criança, na relação entre eles (ou parte deles), no momento de vida de cada um, etc. É muito bacana!
Para quem gosta de filmes estrangeiros, independentes, com potencial de Oscar, essa é uma grande oportunidade de conhecer o cinema Russo. Vale muito a pena!
"Sentimental" vai te surpreender pela qualidade do texto, pela capacidade do elenco e, principalmente, pela forma inteligente como as relações entre casais são discutidas com um leve toque de ironia, mas nem por isso menos verdadeira. Esse filme do excelente diretor catalão Cesc Gay (o mesmo dos também excelentes "O que os homens falam" e "Truman") é mais um presente do cinema espanhol que transita perfeitamente entre a comédia e o drama para expor, sem receio algum de parecer invasivo, a complexidade das relações humanas - com suas similaridades e particularidades.
Há 15 anos juntos, o casamento de Julio (Javier Cámara) e Ana (Griselda Siciliani) já não é mais o mesmo. Apesar de se gostarem, eles estão constantemente em embates, sempre dispostos em implicar um com o outro - sem falar, é claro, que em termos de relações sexuais, há muito já não existe. As coisas se complicam ainda mais quando os vizinhos de cima, Laura (Belén Cuesta) e Salva (Alberto San Juan), são convidados por Ana para um vinho em seu apartamento. O choque de realidades entre um casal aparentemente feliz e de bem com a vida e outro em plena crise, é imediato, e quando um assunto delicado vem à tona... Confira o trailer:
Com apenas 82 minutos e um time perfeito, "Sentimental" é muito competente em apresentar um cenário inusitado de forma espirituosa e inteligente - bem ao estilo de "Perfeitos Desconhecidos", eu diria. Inegavelmente referenciado pelos áureos tempos de Woody Allen, Cesc Gay equilibra o sarcasmo com uma franqueza quase ofensiva para tocar em pontos extremamente realistas e por si só bastante delicados. Ao usar discussões ou abordagens não convencionais sobre sexo, o diretor se aprofunda mesmo é no tédio que afeta as relações ao longo do tempo - com isso ele acaba criando um embate natural e introspectivo do que representa, de fato, estar com alguém (sem saber exatamente se é isso que ambos querem).
Por se tratar de dois casais de classe-média, algumas propostas estabelecidas pelo roteiro nos impactam de imediato - as convenções sociais que muitas vezes nos orientam, independente dos nossos planejamentos como indivíduos, são brilhantemente retratadas por um Javier Cámara no melhor da sua forma e por uma Griselda Siciliani que entrega uma personagem muito mais profunda e cheia de camadas do que possa parecer - ambos foram indicados para o Goya Awards em 2021. Mas quem ganhou mesmo foi o "bombeiro" Salva, Alberto San Juan - ele está simplesmente impecável (é impressionante como seus pensamentos, quase todos eróticos, são facilmente decodificados pelo seu olhar e pelo seu sorriso).
Como uma imperdível peça de teatro e com um elenco dos mais afiados, "Sentimental" vai te fazer sorrir, refletir e até te emocionar, dentro de uma simplicidade narrativa, sem se apegar em estereótipos ou atalhos cômicos, para contar uma história inusitada, mas tão palpável e realista que, mesmo com cenas mais longas e basicamente apoiadas nos diálogos, se justificam pelo simples fato de estar mostrando a vida exatamente como ela é!
Vale muito o seu play!
"Sentimental" vai te surpreender pela qualidade do texto, pela capacidade do elenco e, principalmente, pela forma inteligente como as relações entre casais são discutidas com um leve toque de ironia, mas nem por isso menos verdadeira. Esse filme do excelente diretor catalão Cesc Gay (o mesmo dos também excelentes "O que os homens falam" e "Truman") é mais um presente do cinema espanhol que transita perfeitamente entre a comédia e o drama para expor, sem receio algum de parecer invasivo, a complexidade das relações humanas - com suas similaridades e particularidades.
Há 15 anos juntos, o casamento de Julio (Javier Cámara) e Ana (Griselda Siciliani) já não é mais o mesmo. Apesar de se gostarem, eles estão constantemente em embates, sempre dispostos em implicar um com o outro - sem falar, é claro, que em termos de relações sexuais, há muito já não existe. As coisas se complicam ainda mais quando os vizinhos de cima, Laura (Belén Cuesta) e Salva (Alberto San Juan), são convidados por Ana para um vinho em seu apartamento. O choque de realidades entre um casal aparentemente feliz e de bem com a vida e outro em plena crise, é imediato, e quando um assunto delicado vem à tona... Confira o trailer:
Com apenas 82 minutos e um time perfeito, "Sentimental" é muito competente em apresentar um cenário inusitado de forma espirituosa e inteligente - bem ao estilo de "Perfeitos Desconhecidos", eu diria. Inegavelmente referenciado pelos áureos tempos de Woody Allen, Cesc Gay equilibra o sarcasmo com uma franqueza quase ofensiva para tocar em pontos extremamente realistas e por si só bastante delicados. Ao usar discussões ou abordagens não convencionais sobre sexo, o diretor se aprofunda mesmo é no tédio que afeta as relações ao longo do tempo - com isso ele acaba criando um embate natural e introspectivo do que representa, de fato, estar com alguém (sem saber exatamente se é isso que ambos querem).
Por se tratar de dois casais de classe-média, algumas propostas estabelecidas pelo roteiro nos impactam de imediato - as convenções sociais que muitas vezes nos orientam, independente dos nossos planejamentos como indivíduos, são brilhantemente retratadas por um Javier Cámara no melhor da sua forma e por uma Griselda Siciliani que entrega uma personagem muito mais profunda e cheia de camadas do que possa parecer - ambos foram indicados para o Goya Awards em 2021. Mas quem ganhou mesmo foi o "bombeiro" Salva, Alberto San Juan - ele está simplesmente impecável (é impressionante como seus pensamentos, quase todos eróticos, são facilmente decodificados pelo seu olhar e pelo seu sorriso).
Como uma imperdível peça de teatro e com um elenco dos mais afiados, "Sentimental" vai te fazer sorrir, refletir e até te emocionar, dentro de uma simplicidade narrativa, sem se apegar em estereótipos ou atalhos cômicos, para contar uma história inusitada, mas tão palpável e realista que, mesmo com cenas mais longas e basicamente apoiadas nos diálogos, se justificam pelo simples fato de estar mostrando a vida exatamente como ela é!
Vale muito o seu play!
"Servant", série da Apple TV+, já havia me chamado a atenção desde os primeiros teasers até seu trailer final. Primeiro por ser um suspense psicológico - gênero que eu gosto muito - e depois por ter M. Night Shyamalan como produtor executivo. Claro que a sinopse misteriosa ajudou a criar uma certa expectativa pelo seu lançamento e conforme as informações sobre a história foram surgindo, mais dúvidas do que certezas rodearam o projeto.
Pois bem, "Servant" conta o drama de Dorothy e Sean Turner que vivem o drama da perda repentina do filho de treze semanas, Jericho. Com um intuito terapêutico, Dorothy passa a se relacionar com um boneco, um bebê ultra realista, como se fosse seu filho real - e o bizarro não para por aí: para valorizar ainda mais o tratamento, o casal é orientado a contratar um babá para tornar o dia a dia bem próximo da realidade, acontece que a nova contratada começa a agir de uma forma tão estranha quanto Dorothy, o que acaba incomodando Sean e interferindo perigosamente na relação do casal. O que eu disser a partir daqui pode soar como spolier, então vou sugerir que você assista a série se gostar de um suspense bem montado e muito instigante. Vale ressaltar que os episódios são de 30 minutos, o que nos convida a sempre assistir o próximo episódio, pois a trama vai envolvendo e a curiosidade só aumenta conforme algumas respostas vão sendo colocadas pelo roteiro. Ah, sobre a dúvida que o projeto está gerando? Simples, é muito difícil que a série seja capaz de manter esse clima dos primeiros episódios durante as 6 temporadas prometidas por Shyamalan. Parece não ter fôlego para isso, mas é preciso esperar; enquanto isso a diversão está garantida!
Embora eu não tenha conseguido parar de assistir, algumas coisas me incomodaram em "Servant". A primeira é o fato do M. Night Shyamalan só ter dirigido o primeiro episódio - eu sei que é inviável um diretor como ele se comprometer com a direção do projeto inteiro, mas a diferença na gramática cinematográfica do primeiro episódio para os demais é enorme! Shyamalan é um dos diretores mais criativos que acompanho. Já comentei aquio quanto admiro sua capacidade de contar uma história sem a necessidade de ficar trocando a câmera de lugar em todo momento - ele tem um estilo muito claro e isso me fascina! Nos demais episódios, toda essa inventividade some e o "arroz com feijão" (muito bem feito, ok) impera! Não sei, faltou uma unidade conceitual - vou dar um exemplo: existe uma cena no episódio 1 onde o casal está conversando na cozinha. A câmera fica fixa na ponta da mesa e o atores entram e saem de quadro a todo momento, nem vemos o rosto deles direito, mas o diálogo não para e isso nos gera uma sensação ruim (bem alinhado com o mood da série). Outro detalhe, Shyamalan brinca muito com os planos fechados (close) durante alguns diálogos e isso dá uma certa sensação de claustrofobia - mais uma vez extremamente alinhado ao conceito narrativo na série que se passa 90% dentro do mesmo lugar: uma casa escura, elegante, porém decadente. A fotografia de Mike Gioulakis está espetacular - ele brinca com a sombra como ninguém (basta lembrar de "Nós"), mas isso é a única coisa que fica, o resto simplesmente desaparece nos demais episódios - uma pena!
A outra coisa que me incomoda é que a história que a série se propõe contar, termina logo depois do primeiro episódio e a partir daí o problema continua, mas o elemento mais aterrorizante some - ok, acho até que o roteiro soube trabalhar com isso, mas se você viu o teaser e depois o trailer, a entrega perde o sentido. O suspense psicológico está ali, elementos sobrenaturais são parcialmente descartados (pelo menos até agora) e o bizarro se transforma em paranóia. Em contraponto, o clima envolvente merece ser elogiado, percebemos nos episódios uma certa sensação de ameaça constante, sem saber exatamente quem é o inimigo (ou onde ele está), aproveitando uma atmosfera que provoca a nossa imaginação - é impossível ter certeza sobre o que, exatamente, está acontecendo ali!
Os atores estão ótimos: Dorothy (Lauren Ambrose de Arquivo X) está sensacional como uma "mãe" que não entende o que a maternidade representa, pelo simples fato do seu filho não existir - ela sabe, mas não aceita ou ignora! É interessante como ela se apoia no trabalho como repórter para se colocar acima do marido Sean (Toby Kebbell de Black Mirror) um inseguro crítico e consultor gastronômico - reparem nas reportagens de Dorothy: é possível perceber um desequilíbrio que só justifica suas ações dentro de casa. E em Sean, como ele se relaciona com suas criações - o sorvete de lagosta é um ótimo exemplo. A Trilha Sonora é quase um personagem, mérito de Trevor Gureckis (de Bloodline) - muito presente, ela pontua cada momento da história!
"Servant" é o tipo da série que adoramos assistir, discutir, tentar adivinhar o que tudo aquilo representa, mas é também uma incógnita - daquelas que normalmente nos frustramos com o final. Vamos aguardar e acompanhar tudo com muita atenção! O que eu posso garantir, hoje, é que "Servant" é um excelente entretenimento e nos envolve com sua trama logo de cara. Vale a pena!
"Servant", série da Apple TV+, já havia me chamado a atenção desde os primeiros teasers até seu trailer final. Primeiro por ser um suspense psicológico - gênero que eu gosto muito - e depois por ter M. Night Shyamalan como produtor executivo. Claro que a sinopse misteriosa ajudou a criar uma certa expectativa pelo seu lançamento e conforme as informações sobre a história foram surgindo, mais dúvidas do que certezas rodearam o projeto.
Pois bem, "Servant" conta o drama de Dorothy e Sean Turner que vivem o drama da perda repentina do filho de treze semanas, Jericho. Com um intuito terapêutico, Dorothy passa a se relacionar com um boneco, um bebê ultra realista, como se fosse seu filho real - e o bizarro não para por aí: para valorizar ainda mais o tratamento, o casal é orientado a contratar um babá para tornar o dia a dia bem próximo da realidade, acontece que a nova contratada começa a agir de uma forma tão estranha quanto Dorothy, o que acaba incomodando Sean e interferindo perigosamente na relação do casal. O que eu disser a partir daqui pode soar como spolier, então vou sugerir que você assista a série se gostar de um suspense bem montado e muito instigante. Vale ressaltar que os episódios são de 30 minutos, o que nos convida a sempre assistir o próximo episódio, pois a trama vai envolvendo e a curiosidade só aumenta conforme algumas respostas vão sendo colocadas pelo roteiro. Ah, sobre a dúvida que o projeto está gerando? Simples, é muito difícil que a série seja capaz de manter esse clima dos primeiros episódios durante as 6 temporadas prometidas por Shyamalan. Parece não ter fôlego para isso, mas é preciso esperar; enquanto isso a diversão está garantida!
Embora eu não tenha conseguido parar de assistir, algumas coisas me incomodaram em "Servant". A primeira é o fato do M. Night Shyamalan só ter dirigido o primeiro episódio - eu sei que é inviável um diretor como ele se comprometer com a direção do projeto inteiro, mas a diferença na gramática cinematográfica do primeiro episódio para os demais é enorme! Shyamalan é um dos diretores mais criativos que acompanho. Já comentei aquio quanto admiro sua capacidade de contar uma história sem a necessidade de ficar trocando a câmera de lugar em todo momento - ele tem um estilo muito claro e isso me fascina! Nos demais episódios, toda essa inventividade some e o "arroz com feijão" (muito bem feito, ok) impera! Não sei, faltou uma unidade conceitual - vou dar um exemplo: existe uma cena no episódio 1 onde o casal está conversando na cozinha. A câmera fica fixa na ponta da mesa e o atores entram e saem de quadro a todo momento, nem vemos o rosto deles direito, mas o diálogo não para e isso nos gera uma sensação ruim (bem alinhado com o mood da série). Outro detalhe, Shyamalan brinca muito com os planos fechados (close) durante alguns diálogos e isso dá uma certa sensação de claustrofobia - mais uma vez extremamente alinhado ao conceito narrativo na série que se passa 90% dentro do mesmo lugar: uma casa escura, elegante, porém decadente. A fotografia de Mike Gioulakis está espetacular - ele brinca com a sombra como ninguém (basta lembrar de "Nós"), mas isso é a única coisa que fica, o resto simplesmente desaparece nos demais episódios - uma pena!
A outra coisa que me incomoda é que a história que a série se propõe contar, termina logo depois do primeiro episódio e a partir daí o problema continua, mas o elemento mais aterrorizante some - ok, acho até que o roteiro soube trabalhar com isso, mas se você viu o teaser e depois o trailer, a entrega perde o sentido. O suspense psicológico está ali, elementos sobrenaturais são parcialmente descartados (pelo menos até agora) e o bizarro se transforma em paranóia. Em contraponto, o clima envolvente merece ser elogiado, percebemos nos episódios uma certa sensação de ameaça constante, sem saber exatamente quem é o inimigo (ou onde ele está), aproveitando uma atmosfera que provoca a nossa imaginação - é impossível ter certeza sobre o que, exatamente, está acontecendo ali!
Os atores estão ótimos: Dorothy (Lauren Ambrose de Arquivo X) está sensacional como uma "mãe" que não entende o que a maternidade representa, pelo simples fato do seu filho não existir - ela sabe, mas não aceita ou ignora! É interessante como ela se apoia no trabalho como repórter para se colocar acima do marido Sean (Toby Kebbell de Black Mirror) um inseguro crítico e consultor gastronômico - reparem nas reportagens de Dorothy: é possível perceber um desequilíbrio que só justifica suas ações dentro de casa. E em Sean, como ele se relaciona com suas criações - o sorvete de lagosta é um ótimo exemplo. A Trilha Sonora é quase um personagem, mérito de Trevor Gureckis (de Bloodline) - muito presente, ela pontua cada momento da história!
"Servant" é o tipo da série que adoramos assistir, discutir, tentar adivinhar o que tudo aquilo representa, mas é também uma incógnita - daquelas que normalmente nos frustramos com o final. Vamos aguardar e acompanhar tudo com muita atenção! O que eu posso garantir, hoje, é que "Servant" é um excelente entretenimento e nos envolve com sua trama logo de cara. Vale a pena!
"Shirley" é um filme difícil, com uma narrativa truncada e um ar independente conceitualmente - aliás, é isso que vai fazer com que as pessoas amem ou odeiem essa cinebiografia produzida por Martin Scorsese e dirigia pela talentosa Josephine Decker. Apenas contextualizando, Shirley Jackson foi a escritora responsável pela obra "A Assombração da Casa da Colina", escrito em 1959 e que em 2018 ganhou uma adaptação pela mãos de Mike Flanagan para a Netflix com o título de "A Maldição da Residência Hill" - vale dizer que até hoje essa é considerada uma das maiores obras de terror do século XX.
Em "Shirley" temos um recorte da mente perturbada da escritora (Elisabeth Moss), que se apoia no gênero de terror para enfrentar seus mais profundos fantasmas em uma realidade completamente machista personificada pelo seu marido Stanley Hyman (Michael Stuhlbarg), um professor universitário cínico e prepotente em relação à ela, mas extremamente querido pela comunidade acadêmica local. Ambos abrigam um jovem casal e é a partir da aproximação com Rose (Odessa Young) que a escritora encontra uma real inspiração para o seu novo projeto, o romance "Hangsaman". Confira o trailer (em inglês):
Embora "Shirley" seja uma biografia (muito perturbadora), a diretora Josephine Decker trabalha muito bem os elementos dramáticos com uma pitada de suspense psicológico que o roteiro de Sarah Gubbins, que é baseado no livro de Susan Scarf Merrell, propõe. Veja, o filme basicamente se passa dentro da casa de "Shirley" onde muito das cenas são filmadas com lentes bem fechadas, ou seja, existe uma sensação de claustrofobia na mesma medida que a própria narrativa vai nos provocando uma sensação de angustia avassaladora.
Se algumas escolhas Decker privilegiam o conceito narrativo mais denso, pode ter certeza que a veracidade de algumas situações estarão sempre em dúvida, por outro lado, essas mesmas situações vão estabelecer um ar mais autoral ao filme sem perder a essência, mesmo que antecipando alguns gatilhos. Eu explico: Shirley Jackson sofria de agorafobia, o que justifica todas as passagens do roteiro sobre o seu medo de sair de casa e até de priorizar a reclusão; porém essa condição foi desenvolvida mais para os anos 60, bem depois dos acontecimentos que assistimos no filme.
O fato é que todas as licenças que o filme se apropria estão completamente alinhas com a condução de Decker e isso merece muitos elogios - desde a montagem fragmentada de David Barker (de "Birds of Paradise") até a fotografia do genial Sturla Brandth Grøvlen (de "Victoria" e "Drunk") que é pautada nos incômodos planos detalhes das situações. Sobre o elenco, obviamente que Elisabeth Moss dá mais um show, mas fica impossível não citar o trabalho de Michael Stuhlbarg - perfeito!
A vida de Shirley Jackson, que se tornou leitura obrigatória em escolas americanas, soa tão perturbadora quanto suas histórias e o recorte que assistimos em "Shirley" nos traz uma boa noção dessa jornada criativa que influenciou nomes como Stephen King e Neil Gaiman. Agora esteja atento, pois o filme é muito desconfortável porque exibe, sem cortes, como o machismo pode afetar a vida de mulheres fantásticas, expondo os traumas e as marcas deixadas durante anos de opressão.
Vale a pena e embora não seja genial, certamente a conexão com as mulheres refletirá em uma experiência mais impactante.
Obs: "Shirley" foi muito elogiado no Festival de Sundance em 2020, chegando a conquistar o "U.S. Dramatic Special Jury Award".
"Shirley" é um filme difícil, com uma narrativa truncada e um ar independente conceitualmente - aliás, é isso que vai fazer com que as pessoas amem ou odeiem essa cinebiografia produzida por Martin Scorsese e dirigia pela talentosa Josephine Decker. Apenas contextualizando, Shirley Jackson foi a escritora responsável pela obra "A Assombração da Casa da Colina", escrito em 1959 e que em 2018 ganhou uma adaptação pela mãos de Mike Flanagan para a Netflix com o título de "A Maldição da Residência Hill" - vale dizer que até hoje essa é considerada uma das maiores obras de terror do século XX.
Em "Shirley" temos um recorte da mente perturbada da escritora (Elisabeth Moss), que se apoia no gênero de terror para enfrentar seus mais profundos fantasmas em uma realidade completamente machista personificada pelo seu marido Stanley Hyman (Michael Stuhlbarg), um professor universitário cínico e prepotente em relação à ela, mas extremamente querido pela comunidade acadêmica local. Ambos abrigam um jovem casal e é a partir da aproximação com Rose (Odessa Young) que a escritora encontra uma real inspiração para o seu novo projeto, o romance "Hangsaman". Confira o trailer (em inglês):
Embora "Shirley" seja uma biografia (muito perturbadora), a diretora Josephine Decker trabalha muito bem os elementos dramáticos com uma pitada de suspense psicológico que o roteiro de Sarah Gubbins, que é baseado no livro de Susan Scarf Merrell, propõe. Veja, o filme basicamente se passa dentro da casa de "Shirley" onde muito das cenas são filmadas com lentes bem fechadas, ou seja, existe uma sensação de claustrofobia na mesma medida que a própria narrativa vai nos provocando uma sensação de angustia avassaladora.
Se algumas escolhas Decker privilegiam o conceito narrativo mais denso, pode ter certeza que a veracidade de algumas situações estarão sempre em dúvida, por outro lado, essas mesmas situações vão estabelecer um ar mais autoral ao filme sem perder a essência, mesmo que antecipando alguns gatilhos. Eu explico: Shirley Jackson sofria de agorafobia, o que justifica todas as passagens do roteiro sobre o seu medo de sair de casa e até de priorizar a reclusão; porém essa condição foi desenvolvida mais para os anos 60, bem depois dos acontecimentos que assistimos no filme.
O fato é que todas as licenças que o filme se apropria estão completamente alinhas com a condução de Decker e isso merece muitos elogios - desde a montagem fragmentada de David Barker (de "Birds of Paradise") até a fotografia do genial Sturla Brandth Grøvlen (de "Victoria" e "Drunk") que é pautada nos incômodos planos detalhes das situações. Sobre o elenco, obviamente que Elisabeth Moss dá mais um show, mas fica impossível não citar o trabalho de Michael Stuhlbarg - perfeito!
A vida de Shirley Jackson, que se tornou leitura obrigatória em escolas americanas, soa tão perturbadora quanto suas histórias e o recorte que assistimos em "Shirley" nos traz uma boa noção dessa jornada criativa que influenciou nomes como Stephen King e Neil Gaiman. Agora esteja atento, pois o filme é muito desconfortável porque exibe, sem cortes, como o machismo pode afetar a vida de mulheres fantásticas, expondo os traumas e as marcas deixadas durante anos de opressão.
Vale a pena e embora não seja genial, certamente a conexão com as mulheres refletirá em uma experiência mais impactante.
Obs: "Shirley" foi muito elogiado no Festival de Sundance em 2020, chegando a conquistar o "U.S. Dramatic Special Jury Award".
Minha primeira observação: não assista se estiver com sono. "Sob a Pele do Lobo" quase não tem diálogos, então tem que estar muito disposto, porque é realmente um filme difícil, reflexivo, profundo - e é justamente por isso é o tipo de filme que não vai agradar a todos!
Martinón (Mario Casas) é o último habitante de Auzal, uma vila nas montanhas onde vive completamente isolado, sem comunicação, apenas com a natureza. Ele só desce aos vales habitados duas vezes por ano para negociar e comprar algumas provisões. Porém, certo dia, ele se convence que precisa se casar - uma decisão que visa suavizar sua alma insensível, se afastar da solidão, mas que de certa forma vai transformar a sua vida para sempre!
Esse filme espanhol produzido pela Netflix, não é ruim, muito pelo contrário, é bom (eu diria até, muito bom); mas é lento! Seus planos são longos, repetitivos, quase sempre o mesmo movimento de câmera, a fotografia é fria, a locação é gelada (o que cria uma sensação incômoda), perde o ritmo em todo momento e com isso vai minando nossa empolgação como audiência. O forte da narrativa, sem a menor dúvida, está na interpretação dos atores, na imersão das emoções silenciosas de cada um deles - e nesse ponto tudo é bastante intenso! Eu assumo que tive dificuldades como os primeiros 30 minutos, mas depois que você se acostuma com o conceito proposto pelo diretor Samu Fuentes (de "Los últimos pastores"), o filme flui melhor.
Aqui, aliás, é o primeiro trabalho de Fuentes e isso é muito perceptivo nas suas escolhas e na tentativa de mostrar que sabe muito bem o que está fazendo - talvez aí esteja a grande fragilidade narrativa do filme: como o ritmo varia muito, a história em si não equilibra com esses deslizes, mesmo com a belíssima fotografia do Aitor Mantxola.
Resumindo: gostei muito da fotografia, da direção dos atores e da interpretação do (sempre muito bom) Mario Casas e da (irreconhecível) Irene Escolar, de resto é preciso estar disposto a enfrentar uma experiência diferente, mas não por isso ruim!
Indico, mas por sua conta e risco...
Minha primeira observação: não assista se estiver com sono. "Sob a Pele do Lobo" quase não tem diálogos, então tem que estar muito disposto, porque é realmente um filme difícil, reflexivo, profundo - e é justamente por isso é o tipo de filme que não vai agradar a todos!
Martinón (Mario Casas) é o último habitante de Auzal, uma vila nas montanhas onde vive completamente isolado, sem comunicação, apenas com a natureza. Ele só desce aos vales habitados duas vezes por ano para negociar e comprar algumas provisões. Porém, certo dia, ele se convence que precisa se casar - uma decisão que visa suavizar sua alma insensível, se afastar da solidão, mas que de certa forma vai transformar a sua vida para sempre!
Esse filme espanhol produzido pela Netflix, não é ruim, muito pelo contrário, é bom (eu diria até, muito bom); mas é lento! Seus planos são longos, repetitivos, quase sempre o mesmo movimento de câmera, a fotografia é fria, a locação é gelada (o que cria uma sensação incômoda), perde o ritmo em todo momento e com isso vai minando nossa empolgação como audiência. O forte da narrativa, sem a menor dúvida, está na interpretação dos atores, na imersão das emoções silenciosas de cada um deles - e nesse ponto tudo é bastante intenso! Eu assumo que tive dificuldades como os primeiros 30 minutos, mas depois que você se acostuma com o conceito proposto pelo diretor Samu Fuentes (de "Los últimos pastores"), o filme flui melhor.
Aqui, aliás, é o primeiro trabalho de Fuentes e isso é muito perceptivo nas suas escolhas e na tentativa de mostrar que sabe muito bem o que está fazendo - talvez aí esteja a grande fragilidade narrativa do filme: como o ritmo varia muito, a história em si não equilibra com esses deslizes, mesmo com a belíssima fotografia do Aitor Mantxola.
Resumindo: gostei muito da fotografia, da direção dos atores e da interpretação do (sempre muito bom) Mario Casas e da (irreconhecível) Irene Escolar, de resto é preciso estar disposto a enfrentar uma experiência diferente, mas não por isso ruim!
Indico, mas por sua conta e risco...
É para um domingo chuvoso! "A Ghost Story" (título original), já completo, é muito, muito bom! Com uma pegada mais experimental, o filme conta a história de um homem que acabou de morrer (Casey Affleck), mas retorna como fantasma para sua casa no subúrbio com a intenção de consolar sua esposa (Rooney Mara). Em sua nova forma espiritual, invisível para os mortais, ele percebe que não é afetado pelo tempo, sendo condenado a ser um mero espectador da vida que antes lhe pertencia, ao lado da mulher que amava. O fantasma inicia uma jornada pelas memórias e histórias, enfrentando perguntas eternas sobre a vida e a sua existência. Confira o trailer:
"Sombras da Vida" é muito bem construído, foge do óbvio e trabalha muito bem com as nossas sensações desde a primeira cena - até os planos longos demais (se prepare) do início, nos incomodam propositalmente - o filme foi a menina dos olhos dos críticos em 2017, custou cerca de $100.000 e faturou quase 20 vezes mais!
Muito bem dirigido pelo David Lowery - considerado um dos diretores mais promissores da sua geração! Com planos extremamente bem planejados, uma fotografia belíssima (rodado todo em uma janela 1.33) pelo diretor Andrew Droz Palermo, o filme é muito feliz ao nos remeter a uma espécie de sensação atemporal, incômoda, angustiante, reflexiva - o que vemos na tela é a expressão artística (quase poética) completamente alinhada ao roteiro proposto pelo próprio Lowery. Agora é preciso que se diga: esse é o tipo de filme que não agradará todos graças, justamente, a esse estilo mais cheio de identidade - será preciso uma dose de sensibilidade e até de boa vontade para compreender a dinâmica do narrativa e assim mergulhar em uma história que fala tão bem sobre solidão e sobre nossas perdas. Veja,"Sombras da Vida" é um filme que ganha uma força absurda através do silêncio e isso você vai encontrar de sobra!
Daqueles filmes que se esperava ir além dos Festivais Independentes e foi aí que o sabor amargou um pouco, pois mesmo cercado de muitos elogios (já que o filme foi muito bem com a crítica e com o público) não alcançou uma esperada indicação ao Oscar 2018 - e olha que ele foi considerado um dos 10 melhores filmes daquela temporada no Festival de Boston!
'Sombras da Vida" é para quem gosta de um pouco mais de reflexão!
É para um domingo chuvoso! "A Ghost Story" (título original), já completo, é muito, muito bom! Com uma pegada mais experimental, o filme conta a história de um homem que acabou de morrer (Casey Affleck), mas retorna como fantasma para sua casa no subúrbio com a intenção de consolar sua esposa (Rooney Mara). Em sua nova forma espiritual, invisível para os mortais, ele percebe que não é afetado pelo tempo, sendo condenado a ser um mero espectador da vida que antes lhe pertencia, ao lado da mulher que amava. O fantasma inicia uma jornada pelas memórias e histórias, enfrentando perguntas eternas sobre a vida e a sua existência. Confira o trailer:
"Sombras da Vida" é muito bem construído, foge do óbvio e trabalha muito bem com as nossas sensações desde a primeira cena - até os planos longos demais (se prepare) do início, nos incomodam propositalmente - o filme foi a menina dos olhos dos críticos em 2017, custou cerca de $100.000 e faturou quase 20 vezes mais!
Muito bem dirigido pelo David Lowery - considerado um dos diretores mais promissores da sua geração! Com planos extremamente bem planejados, uma fotografia belíssima (rodado todo em uma janela 1.33) pelo diretor Andrew Droz Palermo, o filme é muito feliz ao nos remeter a uma espécie de sensação atemporal, incômoda, angustiante, reflexiva - o que vemos na tela é a expressão artística (quase poética) completamente alinhada ao roteiro proposto pelo próprio Lowery. Agora é preciso que se diga: esse é o tipo de filme que não agradará todos graças, justamente, a esse estilo mais cheio de identidade - será preciso uma dose de sensibilidade e até de boa vontade para compreender a dinâmica do narrativa e assim mergulhar em uma história que fala tão bem sobre solidão e sobre nossas perdas. Veja,"Sombras da Vida" é um filme que ganha uma força absurda através do silêncio e isso você vai encontrar de sobra!
Daqueles filmes que se esperava ir além dos Festivais Independentes e foi aí que o sabor amargou um pouco, pois mesmo cercado de muitos elogios (já que o filme foi muito bem com a crítica e com o público) não alcançou uma esperada indicação ao Oscar 2018 - e olha que ele foi considerado um dos 10 melhores filmes daquela temporada no Festival de Boston!
'Sombras da Vida" é para quem gosta de um pouco mais de reflexão!
“Spencer” é um ótimo drama baseado em uma história real. Com roteiro de Steven Knight (também roteirista da série “Peaky Blinders”).
O filme mostra o que aconteceu nos últimos dias do casamento da princesa Diana (Kristen Stewart) com o príncipe Charles (Jack Farthing), que andava frio já fazia um bom tempo. E embora houvesse muitos rumores de casos e até de um possível divórcio, a paz foi ordenada para as festividades de Natal, na casa de campo da Família Real. Diana, mesmo estando em um ambiente de luxo, poder e fama, conhecia as regras do jogo de aparências e cada vez mais se via infeliz e totalmente deslocada nesse ambiente. Confira o trailer:
A direção feita com maestria por Pablo Larrain (do excelente "O Clube"), transmite toda a sensação de desconforto da personagem. É claustrofóbico, angustiante e desesperador. Kristen Stewart está no melhor papel de sua carreira, que inclusive rendeu uma indicação ao Oscar 2022 - eu vi algumas cenas reais da princesa Diana, e com isso só tive mais certeza do talento dessa atriz que já foi muito subestimada anteriormente por ter iniciado sua carreira em “Crepúsculo”. A trilha sonora é do ótimo Jonny Greenwood, que recentemente trabalhou em “Ataque de Cães” - pesquise por esse nome e veja para quantos filmes ele já compôs, tenho certeza de que não restarão dúvidas que sua colaboração nesse drama também foi outro grande acerto de sua carreira.
“Spencer” é mais um filme que não deve agradar o público geral, mas para quem conhece um pouco da história real ou aprecia os trabalhos da atriz Kristen Stewart ou até do diretor Pablo Larrain (como “Jackie” ou "Neruda", só para citar as biografias), certamente vai ter uma experiência surpreendente.
Vale muito a pena!
Escrito por Mark Hewes - uma parceria @indiqueipraver
“Spencer” é um ótimo drama baseado em uma história real. Com roteiro de Steven Knight (também roteirista da série “Peaky Blinders”).
O filme mostra o que aconteceu nos últimos dias do casamento da princesa Diana (Kristen Stewart) com o príncipe Charles (Jack Farthing), que andava frio já fazia um bom tempo. E embora houvesse muitos rumores de casos e até de um possível divórcio, a paz foi ordenada para as festividades de Natal, na casa de campo da Família Real. Diana, mesmo estando em um ambiente de luxo, poder e fama, conhecia as regras do jogo de aparências e cada vez mais se via infeliz e totalmente deslocada nesse ambiente. Confira o trailer:
A direção feita com maestria por Pablo Larrain (do excelente "O Clube"), transmite toda a sensação de desconforto da personagem. É claustrofóbico, angustiante e desesperador. Kristen Stewart está no melhor papel de sua carreira, que inclusive rendeu uma indicação ao Oscar 2022 - eu vi algumas cenas reais da princesa Diana, e com isso só tive mais certeza do talento dessa atriz que já foi muito subestimada anteriormente por ter iniciado sua carreira em “Crepúsculo”. A trilha sonora é do ótimo Jonny Greenwood, que recentemente trabalhou em “Ataque de Cães” - pesquise por esse nome e veja para quantos filmes ele já compôs, tenho certeza de que não restarão dúvidas que sua colaboração nesse drama também foi outro grande acerto de sua carreira.
“Spencer” é mais um filme que não deve agradar o público geral, mas para quem conhece um pouco da história real ou aprecia os trabalhos da atriz Kristen Stewart ou até do diretor Pablo Larrain (como “Jackie” ou "Neruda", só para citar as biografias), certamente vai ter uma experiência surpreendente.
Vale muito a pena!
Escrito por Mark Hewes - uma parceria @indiqueipraver
"Ted Bundy: A Irresistível Face do Mal" é um filme muito interessante! Embora seja um história já conhecida, essa adaptação do livro "The Phantom Prince: My Life with Ted Bundy", surpreende pela originalidade. "A Irresistível Face do Mal" não é um filme sobre serial-killer ou um thriller policial como poderia se imaginar.. É um drama, e é aí que o filme ganha muitos pontos. Ao mostrar a visão de quem convivia com Ted Bundy, um charmoso e inteligente estudante de direito, o roteiro nos guia por um caminho cheio de incertezas: nos provocando, nos instigando e, principalmente, brincando com nossos julgamentos - aliás, esse tipo de ferramenta narrativa foi muito bem utilizada em projetos mais documentais como "Making a Murderer", por exemplo. O fato é que embarcamos nessa proposta e realmente ficamos em dúvida sobre sua inocência, mesmo sabendo de toda história... mas calma, será que a história que conhecemos é a verdadeira?
Ted Bundy foi considerado um dos serial killers mais perigosos dos anos 70 nos EUA - é o que dizia a mídia da época! Além de ser um assassino, era sequestrador, estuprador, ladrão e até necrófilo. Sua namorada, Elizabeth Kloepfer, tornou-se uma de suas defensoras mais leais, pois era difícil acreditar que seu companheiro, tão amoroso e dedicado, pudesse realmente ser o autor de crimes tão cruéis. Sabe-se que Ted foi acusado pelo assassinato de mais de 30 mulheres, mas especula-se que esse número seja bem maior.
Após a estreia mundial no Festival de Sundance desse ano, o filme passou a ser muito comentado por três fatores: o primeiro já descrevemos acima, sua originalidade narrativa (acompanhar a história pelos olhos de Elizabeth é muito interessante... de verdade!). O segundo, pelo excelente trabalho do diretor Joe Berlinger (indicado ao Oscar de Melhor Documentário em 2011 por Paradise Lost 3: Purgatory) - ele inclusive ganhou o prêmio de melhor diretor no último Festival de Cinema de Atlanta. O terceiro fator, para mim o menos relevante, é a atuação de Zac Efron como Ted Bundy. Sem dúvida seu trabalho é infinitamente melhor do que o do Eric Bana em Dirty John, mas mesmo assim, minha impressão é que Efron foi encontrando o personagem apenas durante o filme - primeira cena dele é de uma canastrice absurda... já a última, impressiona pela verdade sem dizer uma única palavra!
É um filme que merece ser assistido em algum momento. Tecnicamente muito bem realizado - mesmo sendo gravado com equipamento digital, a pós inseriu um grão que deu todo um charme para o filme - parece película inclusive. O roteiro é inteligente e as atuações também não comprometem. Eu diria que para um dia chuvoso, sem muita pretenção, é uma ótima sugestão. Vale a pena, mas se dormir, ok!
"Ted Bundy: A Irresistível Face do Mal" é um filme muito interessante! Embora seja um história já conhecida, essa adaptação do livro "The Phantom Prince: My Life with Ted Bundy", surpreende pela originalidade. "A Irresistível Face do Mal" não é um filme sobre serial-killer ou um thriller policial como poderia se imaginar.. É um drama, e é aí que o filme ganha muitos pontos. Ao mostrar a visão de quem convivia com Ted Bundy, um charmoso e inteligente estudante de direito, o roteiro nos guia por um caminho cheio de incertezas: nos provocando, nos instigando e, principalmente, brincando com nossos julgamentos - aliás, esse tipo de ferramenta narrativa foi muito bem utilizada em projetos mais documentais como "Making a Murderer", por exemplo. O fato é que embarcamos nessa proposta e realmente ficamos em dúvida sobre sua inocência, mesmo sabendo de toda história... mas calma, será que a história que conhecemos é a verdadeira?
Ted Bundy foi considerado um dos serial killers mais perigosos dos anos 70 nos EUA - é o que dizia a mídia da época! Além de ser um assassino, era sequestrador, estuprador, ladrão e até necrófilo. Sua namorada, Elizabeth Kloepfer, tornou-se uma de suas defensoras mais leais, pois era difícil acreditar que seu companheiro, tão amoroso e dedicado, pudesse realmente ser o autor de crimes tão cruéis. Sabe-se que Ted foi acusado pelo assassinato de mais de 30 mulheres, mas especula-se que esse número seja bem maior.
Após a estreia mundial no Festival de Sundance desse ano, o filme passou a ser muito comentado por três fatores: o primeiro já descrevemos acima, sua originalidade narrativa (acompanhar a história pelos olhos de Elizabeth é muito interessante... de verdade!). O segundo, pelo excelente trabalho do diretor Joe Berlinger (indicado ao Oscar de Melhor Documentário em 2011 por Paradise Lost 3: Purgatory) - ele inclusive ganhou o prêmio de melhor diretor no último Festival de Cinema de Atlanta. O terceiro fator, para mim o menos relevante, é a atuação de Zac Efron como Ted Bundy. Sem dúvida seu trabalho é infinitamente melhor do que o do Eric Bana em Dirty John, mas mesmo assim, minha impressão é que Efron foi encontrando o personagem apenas durante o filme - primeira cena dele é de uma canastrice absurda... já a última, impressiona pela verdade sem dizer uma única palavra!
É um filme que merece ser assistido em algum momento. Tecnicamente muito bem realizado - mesmo sendo gravado com equipamento digital, a pós inseriu um grão que deu todo um charme para o filme - parece película inclusive. O roteiro é inteligente e as atuações também não comprometem. Eu diria que para um dia chuvoso, sem muita pretenção, é uma ótima sugestão. Vale a pena, mas se dormir, ok!
"The Handmaid's Tale" (ou "O Conto da Aia") é o tipo da série que nos faz assinar um serviço de streaming só para poder assistir todas as temporadas - mais ou menos como foi "House of Cards" nos primórdios da Netflix. Impecável na forma, sensacional no conteúdo - não existe outra forma de definir a série da Hulu que aqui no Brasil está na Globoplay!
Baseado no livro homônimo escrito pela canadense Margaret Atwood, a série conta a história da queda do governo democrático dos EUA e consequentemente a ascensão de uma nova forma de autoridade, a República de Gilead, uma espécie de administração cristã fundamentalista totalitária na qual o respeito às leis sagradas deve ser seguido acima de tudo e onde a mulher passa a ser massacrada como indivíduo, sendo obrigada a servir aos Comandantes para, simplesmente, parir seus filhos - tudo isso pelos olhos de June/Offred (Elisabeth Moss). Confira o trailer:
Impactante visualmente e narrativamente, "The Handmaid's Tale" é uma pérola - mas nem por isso será uma jornada das mais tranquilas. Muito dessa qualidade se dá pelo fato de que a própria autora do livro tenha trabalhado ao lado de Bruce Miller (de "The 4400") na adaptação para a tela desse futuro não tão distópico que toca em elementos muito presentes em nossa sociedade atual que vai do feminismo radical ao fundamentalismo religioso. E não é só isso, a dualidade das questões também impressiona, veja: com a queda abrupta da taxa de natalidade, segundo os fundamentalistas causado pelos elevados níveis de poluição e pelo comportamento permissivo da comunidade que vivia em um universo de drogas e de desrespeito aos valores tradicionais, o sexo feminino se torna um bem valioso ao mesmo tempo em que é necessário o uso da força para conquista-lo.
Entende como as "boas intenções" escondem camadas muito mais profundas e perigosas?
O roteiro foi muito feliz em dividir a trama em duas linhas temporais que se misturam sem muito aviso, mas que ao perceber essa dinâmica da montagem, nos trazem uma enorme sensação de insegurança e de angústia. As peças são apresentadas aos poucos, mas a potência com que isso acontece é muito marcante. De um lado temos o dia-a-dia das aias, as poucas mulheres férteis que ainda restaram nos Estados Unidos que foram capturadas, torturadas, mutiladas e tendo passado por uma verdadeira lavagem cerebral, coação e castigos físicos, para que os Comandantes as estuprem como se fosse a coisa mais normal do mundo - esse é o status atual das mulheres neste Universo. Já do outro lado, conhecemos o passado, extremamente fragmentado e sem respeitar uma linearidade, onde os personagens são construídos e as situações são explicadas ponto a ponto - é aqui que entendemos o valor da complexa performance de Elisabeth Moss que lhe rendeu um Emmy em 2017.
Com um elenco muito bom, uma direção de arte de se aplaudir de pé e uma fotografia belíssima, "The Handmaid's Tale" justifica o prêmio de melhor série dramática de 2017. Uma série que nos mostra o que uma sociedade pode se tornar quando uma camada extremista assume o controle e passa a dizer o que deve ou o que não deve ser feito. Em um cenário com muitas interferências, um ódio gratuito contra a sexualidade do outro, inúmeras tentativas de suprimir os direitos individuais, fica impossível não refletir sobre nossa realidade (e as redes sociais estão estão aí para provar como isso tudo é perigoso). Com inteligência e aproveitando o poder do entretenimento, eu diria que "The Handmaid's Tale" é uma série tão necessária quanto imperdível!
E que vale muito o seu play!
"The Handmaid's Tale" (ou "O Conto da Aia") é o tipo da série que nos faz assinar um serviço de streaming só para poder assistir todas as temporadas - mais ou menos como foi "House of Cards" nos primórdios da Netflix. Impecável na forma, sensacional no conteúdo - não existe outra forma de definir a série da Hulu que aqui no Brasil está na Globoplay!
Baseado no livro homônimo escrito pela canadense Margaret Atwood, a série conta a história da queda do governo democrático dos EUA e consequentemente a ascensão de uma nova forma de autoridade, a República de Gilead, uma espécie de administração cristã fundamentalista totalitária na qual o respeito às leis sagradas deve ser seguido acima de tudo e onde a mulher passa a ser massacrada como indivíduo, sendo obrigada a servir aos Comandantes para, simplesmente, parir seus filhos - tudo isso pelos olhos de June/Offred (Elisabeth Moss). Confira o trailer:
Impactante visualmente e narrativamente, "The Handmaid's Tale" é uma pérola - mas nem por isso será uma jornada das mais tranquilas. Muito dessa qualidade se dá pelo fato de que a própria autora do livro tenha trabalhado ao lado de Bruce Miller (de "The 4400") na adaptação para a tela desse futuro não tão distópico que toca em elementos muito presentes em nossa sociedade atual que vai do feminismo radical ao fundamentalismo religioso. E não é só isso, a dualidade das questões também impressiona, veja: com a queda abrupta da taxa de natalidade, segundo os fundamentalistas causado pelos elevados níveis de poluição e pelo comportamento permissivo da comunidade que vivia em um universo de drogas e de desrespeito aos valores tradicionais, o sexo feminino se torna um bem valioso ao mesmo tempo em que é necessário o uso da força para conquista-lo.
Entende como as "boas intenções" escondem camadas muito mais profundas e perigosas?
O roteiro foi muito feliz em dividir a trama em duas linhas temporais que se misturam sem muito aviso, mas que ao perceber essa dinâmica da montagem, nos trazem uma enorme sensação de insegurança e de angústia. As peças são apresentadas aos poucos, mas a potência com que isso acontece é muito marcante. De um lado temos o dia-a-dia das aias, as poucas mulheres férteis que ainda restaram nos Estados Unidos que foram capturadas, torturadas, mutiladas e tendo passado por uma verdadeira lavagem cerebral, coação e castigos físicos, para que os Comandantes as estuprem como se fosse a coisa mais normal do mundo - esse é o status atual das mulheres neste Universo. Já do outro lado, conhecemos o passado, extremamente fragmentado e sem respeitar uma linearidade, onde os personagens são construídos e as situações são explicadas ponto a ponto - é aqui que entendemos o valor da complexa performance de Elisabeth Moss que lhe rendeu um Emmy em 2017.
Com um elenco muito bom, uma direção de arte de se aplaudir de pé e uma fotografia belíssima, "The Handmaid's Tale" justifica o prêmio de melhor série dramática de 2017. Uma série que nos mostra o que uma sociedade pode se tornar quando uma camada extremista assume o controle e passa a dizer o que deve ou o que não deve ser feito. Em um cenário com muitas interferências, um ódio gratuito contra a sexualidade do outro, inúmeras tentativas de suprimir os direitos individuais, fica impossível não refletir sobre nossa realidade (e as redes sociais estão estão aí para provar como isso tudo é perigoso). Com inteligência e aproveitando o poder do entretenimento, eu diria que "The Handmaid's Tale" é uma série tão necessária quanto imperdível!
E que vale muito o seu play!
"Tio Frank" fala sobre aceitar o diferente, mesmo que pelo ponto de vista do caos familiar, de uma educação rígida, tradicional do interior dos EUA, e sem perspectiva alguma de conhecer as inúmeras possibilidades que a vida pode oferecer para quem não tem a oportunidade de sair de daquele universo tão limitado. O filme, embora discuta assuntos complexos, traz uma delicadeza impressionante nos seus diálogos, nos proporcionando uma jornada de reflexão, muito mais pelo que é falado do que pelo que é mostrado, e isso é um enorme mérito do roteiro e da direção de Alan Ball (vencedor do Oscar de Roteiro Original em 2000 por "Beleza Americana").
No filme acompanhamos a adolescente Beth Bledsoe (Sophia Lillis) que deixa sua cidade natal na zona rural do sul dos Estados Unidos para estudar na Universidade de Nova York, onde seu amado tio Frank (Paul Bettany) é um respeitado professor de literatura. Porém, ela acaba descobrindo que seu tio é gay e que mora com seu parceiro, Wally (Peter Macdissi), escondendo esse fato de toda a sua família há muitos anos. Após a morte repentina do seu pai, Frank é forçado a voltar para casa de sua infância, com relutância, para o funeral, e finalmente enfrentar um trauma pelo qual ele passou toda a sua vida adulta fugindo. Confira o trailer:
Essa é uma história de auto-conhecimento e de aceitação - e é construída com muita elegância estética e narrativa. Os diálogos são carregados de emoção, mas sem se tornar piegas; as pitadas de humor são tão inteligentes e bem colocadas que a experiência de assistir o filme acaba ficando muito leve - mais ou menos como encontramos em "Minhas Mães e Meu Pai". Outro ponto que merece ser destacado é o incrível trabalho do designer de produção Darcy Scanlin e do diretor de fotografia, com uma longa e respeitada carreira na publicidade, Khalid Mohtaseb - a concepção visual que os dois entregam para Ball cria uma sensação nostálgica dos anos 70, natural, cheia de cores e nada esteriotipada, tanto em NY quanto em Creekville, uma pequena cidade do interior da Carolina do Sul.
O trabalho do elenco também é dos melhores: além de uma dinâmica muito especial entre tio (Paul Bettany) e sobrinha (Sophia Lillis), é de se elogiar o relacionamento construído entre Frank e Wally - Macdissi é o tipo do ator que tem uma capacidade quase surreal de transitar entre o drama e a comédia com a mesma competência, tornando seu personagem muito agradável, simpático, alegre, esperançoso ao mesmo tempo que é complexo e cheio de cicatrizes emocionais. Wally, vale dizer, é um imigrante que veio da Arábia Saudita, que também mente para os pais sobre seus relacionamentos e que se mudou para os EUA com medo de ser morto pelo fato de ser homossexual - e o paralelo com a vida adolescente de Frank, que supostamente mora em um país livre, mas sofre das mesmas dores, é sensacional. Reparem nas cenas de flashback e como ela ganha ainda mais força depois de ouvir a história que Wally conta para Beth sobre como funciona o preconceito no seu país.
"Tio Frank", de fato, não parece ser uma história contada para enfatizar os problemas do preconceito e da ignorância, muito pelo contrário, o texto de Ball está muito mais preocupado em tentar corrigir a intolerância - o que deixa essa jornada mais fluida, empática e esperançosa. Mesmo nas cenas mais tensas, não existe o objetivo de chocar, apenas de mostrar o outro lado. Emocionante, leve e importante, "Tio Frank" merecia um maior reconhecimento na temporada de premiações - além de ser mais uma aula de roteiro de Ball, o elenco é simplesmente especial!
Vale muito o play! "Tio Frank" é daqueles filmes que terminamos sorrindo!
"Tio Frank" fala sobre aceitar o diferente, mesmo que pelo ponto de vista do caos familiar, de uma educação rígida, tradicional do interior dos EUA, e sem perspectiva alguma de conhecer as inúmeras possibilidades que a vida pode oferecer para quem não tem a oportunidade de sair de daquele universo tão limitado. O filme, embora discuta assuntos complexos, traz uma delicadeza impressionante nos seus diálogos, nos proporcionando uma jornada de reflexão, muito mais pelo que é falado do que pelo que é mostrado, e isso é um enorme mérito do roteiro e da direção de Alan Ball (vencedor do Oscar de Roteiro Original em 2000 por "Beleza Americana").
No filme acompanhamos a adolescente Beth Bledsoe (Sophia Lillis) que deixa sua cidade natal na zona rural do sul dos Estados Unidos para estudar na Universidade de Nova York, onde seu amado tio Frank (Paul Bettany) é um respeitado professor de literatura. Porém, ela acaba descobrindo que seu tio é gay e que mora com seu parceiro, Wally (Peter Macdissi), escondendo esse fato de toda a sua família há muitos anos. Após a morte repentina do seu pai, Frank é forçado a voltar para casa de sua infância, com relutância, para o funeral, e finalmente enfrentar um trauma pelo qual ele passou toda a sua vida adulta fugindo. Confira o trailer:
Essa é uma história de auto-conhecimento e de aceitação - e é construída com muita elegância estética e narrativa. Os diálogos são carregados de emoção, mas sem se tornar piegas; as pitadas de humor são tão inteligentes e bem colocadas que a experiência de assistir o filme acaba ficando muito leve - mais ou menos como encontramos em "Minhas Mães e Meu Pai". Outro ponto que merece ser destacado é o incrível trabalho do designer de produção Darcy Scanlin e do diretor de fotografia, com uma longa e respeitada carreira na publicidade, Khalid Mohtaseb - a concepção visual que os dois entregam para Ball cria uma sensação nostálgica dos anos 70, natural, cheia de cores e nada esteriotipada, tanto em NY quanto em Creekville, uma pequena cidade do interior da Carolina do Sul.
O trabalho do elenco também é dos melhores: além de uma dinâmica muito especial entre tio (Paul Bettany) e sobrinha (Sophia Lillis), é de se elogiar o relacionamento construído entre Frank e Wally - Macdissi é o tipo do ator que tem uma capacidade quase surreal de transitar entre o drama e a comédia com a mesma competência, tornando seu personagem muito agradável, simpático, alegre, esperançoso ao mesmo tempo que é complexo e cheio de cicatrizes emocionais. Wally, vale dizer, é um imigrante que veio da Arábia Saudita, que também mente para os pais sobre seus relacionamentos e que se mudou para os EUA com medo de ser morto pelo fato de ser homossexual - e o paralelo com a vida adolescente de Frank, que supostamente mora em um país livre, mas sofre das mesmas dores, é sensacional. Reparem nas cenas de flashback e como ela ganha ainda mais força depois de ouvir a história que Wally conta para Beth sobre como funciona o preconceito no seu país.
"Tio Frank", de fato, não parece ser uma história contada para enfatizar os problemas do preconceito e da ignorância, muito pelo contrário, o texto de Ball está muito mais preocupado em tentar corrigir a intolerância - o que deixa essa jornada mais fluida, empática e esperançosa. Mesmo nas cenas mais tensas, não existe o objetivo de chocar, apenas de mostrar o outro lado. Emocionante, leve e importante, "Tio Frank" merecia um maior reconhecimento na temporada de premiações - além de ser mais uma aula de roteiro de Ball, o elenco é simplesmente especial!
Vale muito o play! "Tio Frank" é daqueles filmes que terminamos sorrindo!
"Toda Forma de Amor" (ou "Beginners") do diretor Mike Mills é um excelente filme! Na verdade é o típico filme que fala sobre relações de uma maneira muito delicada, sensível, onde o trabalho de direção se alinha com a história através de planos muito bem estudados, movimentos que acompanham uma narrativa leve, delicada, mesmo abordando assuntos tão pesados.
Aos 75 anos, o pai de Oliver (Ewan McGregor) se assume gay, diz que está com câncer terminal e por isso passou a ter uma vida mais ativa até a sua morte. Meses depois, Oliver conhece a imprevisível e irreverente Anna (Mélanie Laurent), o que faz com que ele se dedique a amá-la, lembrando-se de fatos e ensinamentos de seu saudoso pai, Hal (Christopher Plummer). Confira o trailer:
Mike Mills foi muito inteligente ao subverter o roteiro de "Toda Forma de Amor" iniciando uma jornada de (auto) conhecimento a partir da morte de Hal. Com uma história atemporal, as lembranças do protagonista se encaixam perfeitamente na maneira como ele enxerga a possibilidade de ser feliz ao lado de uma mulher que, olhem só, pode ama-lo de verdade! Essa dinâmica funciona como uma forma de Oliver tentar justificar sua dificuldade em corresponder Anna, o que transforma a história em um drama de relação leve, mas não por isso raso.
Christopher Plummer merece uma menção especial: seu trabalho mostrou exatamente a razão pela qual ganhou quase todos os principais prêmios da temporada, inclusive o Oscar e o Globo de Ouro de "Ator Coadjuvante" em 2012! Ele está irretocável - reparem!
"Toda Forma de Amor" é daqueles filmes que chegam sem muito marketing, mas que nos conquistam, discretamente, e nos fazem ter aquela deliciosa sensação de ter assistido um belíssimo filme! Pode dar o play sem receio!
"Toda Forma de Amor" (ou "Beginners") do diretor Mike Mills é um excelente filme! Na verdade é o típico filme que fala sobre relações de uma maneira muito delicada, sensível, onde o trabalho de direção se alinha com a história através de planos muito bem estudados, movimentos que acompanham uma narrativa leve, delicada, mesmo abordando assuntos tão pesados.
Aos 75 anos, o pai de Oliver (Ewan McGregor) se assume gay, diz que está com câncer terminal e por isso passou a ter uma vida mais ativa até a sua morte. Meses depois, Oliver conhece a imprevisível e irreverente Anna (Mélanie Laurent), o que faz com que ele se dedique a amá-la, lembrando-se de fatos e ensinamentos de seu saudoso pai, Hal (Christopher Plummer). Confira o trailer:
Mike Mills foi muito inteligente ao subverter o roteiro de "Toda Forma de Amor" iniciando uma jornada de (auto) conhecimento a partir da morte de Hal. Com uma história atemporal, as lembranças do protagonista se encaixam perfeitamente na maneira como ele enxerga a possibilidade de ser feliz ao lado de uma mulher que, olhem só, pode ama-lo de verdade! Essa dinâmica funciona como uma forma de Oliver tentar justificar sua dificuldade em corresponder Anna, o que transforma a história em um drama de relação leve, mas não por isso raso.
Christopher Plummer merece uma menção especial: seu trabalho mostrou exatamente a razão pela qual ganhou quase todos os principais prêmios da temporada, inclusive o Oscar e o Globo de Ouro de "Ator Coadjuvante" em 2012! Ele está irretocável - reparem!
"Toda Forma de Amor" é daqueles filmes que chegam sem muito marketing, mas que nos conquistam, discretamente, e nos fazem ter aquela deliciosa sensação de ter assistido um belíssimo filme! Pode dar o play sem receio!
"Todos já sabem" é o primeiro filme do iraniano Asghar Farhadi fora do seu país. O filme é uma co-produção Espanha/França/Italia e nem por isso Farhadi precisou abrir mão do seu estilo e controle criativo em todo o processo. Mais uma vez ele escreve um roteiro com uma história bastante consistente e dirige o filme com a competência técnica e a segurança narrativa quase imperceptível que já virou sua marca. Sério, se você não conhece a filmografia do Asghar Farhadi, saiba que ele já ganhou um Oscar com "O Apartamento" (The Salesman) e outro com "A Separação", além da Palme d'Or (em Cannes) pelo seu "O Passado"!!! Ou seja, seus três últimos filmes ganharam quase todos os prêmios mais cobiçados do cinema mundial... Fraco o cara?
Em "Todos já sabem" ele coloca na tela uma ambientação muito particular, pois o filme se passa em um pequeno vilarejo próximo de Madrid, cidade natal de Laura (Penélope Cruz). Ela retorna, acompanhado dos seus filhos, para o casamento da sua irmã. Porém, durante a festa, sua filha mais velha desaparece em circunstâncias muito parecidas com um outro sequestro que marcou muito a região pelo seu fim trágico. O desaparecimento de Irene e sua investigação trás a tona uma série de segredos (ou não - por isso o nome do filme) e mágoas que só aumentaram com o passar dos anos. O mistério sobre o paradeiro de Irene é muito bem construído e como os personagens vão se envolvendo acaba criando uma sensação de superficialidade daquelas relações - é muito interessante pela particularidade das histórias mal resolvidas. É quase um arquétipo de uma família amargurada que vive apenas de aparências apoiada em um passado que não existe mais!!! Imaginem a força que isso ganha em uma cidade tão pequena onde todos se conhecem... Me lembrou muito o clima que o Walter Salles criou em "Abril Despedaçado" e de como o "ressentimento" foi consumindo aqueles personagens de dentro para fora e tudo em sua volta foi embolorando!
Um dos pontos altos do filme é, sem dúvida, o elenco! É uma interpretação melhor que a outra, com destaque para Bárbara Lennie (Bea) que dá um show pela sua capacidade de externar aqueles sentimentos tão silenciosos e de uma forma tão natural que chega a doer na gente! Obviamente que Ricardo Darín, Penélope Cruz, Javier Bardem e Eduard Fernández também estão voando, mas isso já era de se esperar!!! Um detalhe importante: Asghar Farhadi é um grande diretor de atores, todos os filmes dele estão apoiados em grandes atuações - reparem - o roteiro ajuda, mas os atores sempre estão no tom certo!!!! Bom, a fotografia do filme também merece um comentário: é um lindo trabalho do José Luis Alcaine, o mesmo de "A Pele que Habito" - se atentem para as cenas da festa de casamento e de quando o personagem do Javier Bardem procura pela esposa em casa, já mais para o final do filme!
Eu já escrevi dois reviews de filmes do Farhadi aqui no Viu Review, então gostaria de destacar uma frase que usei para iniciar o texto de The Salesman: "Tem Diretor que te dá a certeza de um grande filme e o iraniano Asghar Farhadi, para mim, é um desses caras". Dito isso, eu te convido a conhecer o trabalho dele, um cineasta extremamente autoral, mas que vai te surpreender com filmes intensos, envolventes e inteligentes, com qualidade técnica e artística incontestáveis!
Dê essa chance que você não vai se arrepender.
"Todos já sabem" é o primeiro filme do iraniano Asghar Farhadi fora do seu país. O filme é uma co-produção Espanha/França/Italia e nem por isso Farhadi precisou abrir mão do seu estilo e controle criativo em todo o processo. Mais uma vez ele escreve um roteiro com uma história bastante consistente e dirige o filme com a competência técnica e a segurança narrativa quase imperceptível que já virou sua marca. Sério, se você não conhece a filmografia do Asghar Farhadi, saiba que ele já ganhou um Oscar com "O Apartamento" (The Salesman) e outro com "A Separação", além da Palme d'Or (em Cannes) pelo seu "O Passado"!!! Ou seja, seus três últimos filmes ganharam quase todos os prêmios mais cobiçados do cinema mundial... Fraco o cara?
Em "Todos já sabem" ele coloca na tela uma ambientação muito particular, pois o filme se passa em um pequeno vilarejo próximo de Madrid, cidade natal de Laura (Penélope Cruz). Ela retorna, acompanhado dos seus filhos, para o casamento da sua irmã. Porém, durante a festa, sua filha mais velha desaparece em circunstâncias muito parecidas com um outro sequestro que marcou muito a região pelo seu fim trágico. O desaparecimento de Irene e sua investigação trás a tona uma série de segredos (ou não - por isso o nome do filme) e mágoas que só aumentaram com o passar dos anos. O mistério sobre o paradeiro de Irene é muito bem construído e como os personagens vão se envolvendo acaba criando uma sensação de superficialidade daquelas relações - é muito interessante pela particularidade das histórias mal resolvidas. É quase um arquétipo de uma família amargurada que vive apenas de aparências apoiada em um passado que não existe mais!!! Imaginem a força que isso ganha em uma cidade tão pequena onde todos se conhecem... Me lembrou muito o clima que o Walter Salles criou em "Abril Despedaçado" e de como o "ressentimento" foi consumindo aqueles personagens de dentro para fora e tudo em sua volta foi embolorando!
Um dos pontos altos do filme é, sem dúvida, o elenco! É uma interpretação melhor que a outra, com destaque para Bárbara Lennie (Bea) que dá um show pela sua capacidade de externar aqueles sentimentos tão silenciosos e de uma forma tão natural que chega a doer na gente! Obviamente que Ricardo Darín, Penélope Cruz, Javier Bardem e Eduard Fernández também estão voando, mas isso já era de se esperar!!! Um detalhe importante: Asghar Farhadi é um grande diretor de atores, todos os filmes dele estão apoiados em grandes atuações - reparem - o roteiro ajuda, mas os atores sempre estão no tom certo!!!! Bom, a fotografia do filme também merece um comentário: é um lindo trabalho do José Luis Alcaine, o mesmo de "A Pele que Habito" - se atentem para as cenas da festa de casamento e de quando o personagem do Javier Bardem procura pela esposa em casa, já mais para o final do filme!
Eu já escrevi dois reviews de filmes do Farhadi aqui no Viu Review, então gostaria de destacar uma frase que usei para iniciar o texto de The Salesman: "Tem Diretor que te dá a certeza de um grande filme e o iraniano Asghar Farhadi, para mim, é um desses caras". Dito isso, eu te convido a conhecer o trabalho dele, um cineasta extremamente autoral, mas que vai te surpreender com filmes intensos, envolventes e inteligentes, com qualidade técnica e artística incontestáveis!
Dê essa chance que você não vai se arrepender.
Essa é uma série despretenciosa que foi lançada sem tanto alarde pela HBO em 2015. e que fechou o seu ciclo com apenas duas temporadas - se você gosta de séries como "Easy"ou "Modern Love", certamente "Togetherness" é para você, mas saiba que o gostinho de "quero mais" pode te consumir no final do 16º episódio. Criada pelos irmãos Duplass (dos geniais "Transparent" e "Room 104") e por Steve Zissis (de "Cruella"), "Togetherness" te fará rir e chorar em uma jornada, de fato, apaixonante. Com um humor até certo ponto ácido e uma sensibilidade bastante aguçada, a narrativa explora com muita inteligência os desafios da vida adulta com um toque de realismo que nos distancia daquelas comédias românticas mais tradicionais - talvez por isso ela tenha agradado mais a critica do que o público em geral, mesmo depois das duas indicações no "Critics Choice Awards" de 2015.
A trama, basicamente, gira em torno de Brett (Mark Duplass) e Michelle (Melanie Lynskey), um casal que enfrenta uma crise no casamento após a chegada dos filhos. Buscando recuperar a chama da paixão, eles decidem convidar o melhor amigo de Brett, Alex (Steve Zissis), e a irmã de Michelle, Tina (Amanda Peet), para morarem com eles. A convivência entre os quatro personagens, com suas próprias frustrações e inseguranças, gera situações hilárias e comoventes, explorando temas como amizade, amor, família e a busca pela felicidade. Confira o trailer a seguir (em inglês):
Me diga se você já viu isso em algum ligar: primeiro um casal na faixa dos seus 35 anos, com família e tudo mais, que se amam, mas que vem sofrendo com o desgaste natural após 10 anos de relacionamento. Segundo, um outro casal de amigos improváveis formado por um ator, quase fracassado, e uma linda mulher que ainda está solteira, mas não se conforma com isso. Pois é, eu sei sua resposta e é justamente isso que torna "Togetherness" imperdível - a forma como os irmãos Duplass e a Nicole Holofcener capturam a essência da vida real, com seus altos e baixos, sem filtros ou romantizações, é impressionante (e dolorido). Reparem como a série até começa apresentando um lado mais cômico da trama e de seus personagens, mas conforme vão passando os episódios é o drama que vai dando o tom da narrativa.
"Togetherness" se destaca pela naturalidade das atuações de seu pequeno elenco - mérito da direção sensível e cirúrgica dos Duplass. Não por acaso, todo aquele contexto de identificação nos leva para uma jornada verdadeiramente emocional, onde nos empatizamos com as dúvidas e angústias dos personagens ao ponto de nos fazer questionar nossas próprias escolhas de vida. Sem dúvida que a série representa um convite a reflexão sobre o que realmente importa na vida.
Ao mesmo tempo que nos diverte com situações e personagens excêntricos cheios de camadas que nos conquistam com sua humanidade, "Togetherness" também sabe ser apaixonante pelas discussões sobre os dilemas da vida adulta. Os irmãos Duplass mais uma vez marcam um golaço com essa comédia dramática que aposta na sabedoria de seu conceito narrativo para falar de sentimentos e trazer sensações muito presentes em algum momento da nossa vida - é o equilíbrio perfeito entre o alivio cômico e o drama mais intenso! Olhando alguns anos em retrospectiva, fica fácil atestar que "Togetherness" merecia uma melhor chance - leia-se uma terceira e definitiva temporada!
Sim, essa é daquelas de sentimos seu cancelamento, mas que ainda assim merece ser descoberta!
Essa é uma série despretenciosa que foi lançada sem tanto alarde pela HBO em 2015. e que fechou o seu ciclo com apenas duas temporadas - se você gosta de séries como "Easy"ou "Modern Love", certamente "Togetherness" é para você, mas saiba que o gostinho de "quero mais" pode te consumir no final do 16º episódio. Criada pelos irmãos Duplass (dos geniais "Transparent" e "Room 104") e por Steve Zissis (de "Cruella"), "Togetherness" te fará rir e chorar em uma jornada, de fato, apaixonante. Com um humor até certo ponto ácido e uma sensibilidade bastante aguçada, a narrativa explora com muita inteligência os desafios da vida adulta com um toque de realismo que nos distancia daquelas comédias românticas mais tradicionais - talvez por isso ela tenha agradado mais a critica do que o público em geral, mesmo depois das duas indicações no "Critics Choice Awards" de 2015.
A trama, basicamente, gira em torno de Brett (Mark Duplass) e Michelle (Melanie Lynskey), um casal que enfrenta uma crise no casamento após a chegada dos filhos. Buscando recuperar a chama da paixão, eles decidem convidar o melhor amigo de Brett, Alex (Steve Zissis), e a irmã de Michelle, Tina (Amanda Peet), para morarem com eles. A convivência entre os quatro personagens, com suas próprias frustrações e inseguranças, gera situações hilárias e comoventes, explorando temas como amizade, amor, família e a busca pela felicidade. Confira o trailer a seguir (em inglês):
Me diga se você já viu isso em algum ligar: primeiro um casal na faixa dos seus 35 anos, com família e tudo mais, que se amam, mas que vem sofrendo com o desgaste natural após 10 anos de relacionamento. Segundo, um outro casal de amigos improváveis formado por um ator, quase fracassado, e uma linda mulher que ainda está solteira, mas não se conforma com isso. Pois é, eu sei sua resposta e é justamente isso que torna "Togetherness" imperdível - a forma como os irmãos Duplass e a Nicole Holofcener capturam a essência da vida real, com seus altos e baixos, sem filtros ou romantizações, é impressionante (e dolorido). Reparem como a série até começa apresentando um lado mais cômico da trama e de seus personagens, mas conforme vão passando os episódios é o drama que vai dando o tom da narrativa.
"Togetherness" se destaca pela naturalidade das atuações de seu pequeno elenco - mérito da direção sensível e cirúrgica dos Duplass. Não por acaso, todo aquele contexto de identificação nos leva para uma jornada verdadeiramente emocional, onde nos empatizamos com as dúvidas e angústias dos personagens ao ponto de nos fazer questionar nossas próprias escolhas de vida. Sem dúvida que a série representa um convite a reflexão sobre o que realmente importa na vida.
Ao mesmo tempo que nos diverte com situações e personagens excêntricos cheios de camadas que nos conquistam com sua humanidade, "Togetherness" também sabe ser apaixonante pelas discussões sobre os dilemas da vida adulta. Os irmãos Duplass mais uma vez marcam um golaço com essa comédia dramática que aposta na sabedoria de seu conceito narrativo para falar de sentimentos e trazer sensações muito presentes em algum momento da nossa vida - é o equilíbrio perfeito entre o alivio cômico e o drama mais intenso! Olhando alguns anos em retrospectiva, fica fácil atestar que "Togetherness" merecia uma melhor chance - leia-se uma terceira e definitiva temporada!
Sim, essa é daquelas de sentimos seu cancelamento, mas que ainda assim merece ser descoberta!
Se você gosta de uma série capaz de te emocionar ao ponto de deixar seus olhos marejados uma cena depois de você ter dado muitas gargalhadas, pois bem, você encontrou uma que vai te fazer perguntar a razão de não ter assistido ela antes! Estou falando da imperdível "Trying", lançada pela AppleTV+ em 2022 e pouquíssimo comentada pelos críticos e pelo público - mesmo tendo uma qualidade excepcional de texto e de produção. Essa série é uma comédia dramática britânica que foge do convencional por explorar de forma honesta, tocante e genuinamente engraçada os desafios da adoção e da vida adulta. Criada por Andy Wolton, a série equilibra humor e emoção com uma leveza rara para o gênero, lembrando produções como "Alguém em Algum Lugar" ou até "Amor Platônico", mas com uma doçura própria e uma abordagem calorosa que conquista a audiência pela alma desde o primeiro (e inesquecível) episódio.
A trama acompanha Nikki (Esther Smith) e Jason (Rafe Spall), um casal de trinta e poucos anos que, após inúmeras tentativas frustradas de ter um filho, decide embarcar na jornada da adoção. No entanto, o caminho não é fácil: além da burocracia e das dificuldades emocionais do processo, eles precisam provar para si mesmos (e para os assistentes sociais) que estão preparados para serem pais. A série se desenrola a partir desse dilema, misturando momentos cômicos e vulneráveis em igual medida, enquanto Nikki e Jason navegam pelas incertezas, expectativas e desventuras da parentalidade. Confira o trailer:
Chega ser impressionante como "Trying" sabe potencializar sua maior força: a química impecável entre Esther Smith e Rafe Spall. O casal protagonista traz uma autenticidade tão especial que se torna muito fácil a conexão com seus dilemas ao ponto de torcermos por eles a cada desafio enfrentado - sério, é como se eles fossem nossos amigos há anos! Smith entrega uma performance realmente encantadora, cheia de entusiasmo e inseguranças; enquanto Spall equilibra a impulsividade de Jason com um carisma todo desajeitado, mas muito divertido. O elenco de apoio, que inclui Imelda Staunton como a assistente social Penny, adiciona ainda mais profundidade à série, garantindo que os momentos dramáticos sejam tão impactantes quanto os cômicos. E aqui está o mérito do roteiro de Andy Wolton - ele evita cair nos clichês melodramáticos e com isso constrói uma narrativa que se mantém realista sem perder o tom otimista. Os diálogos são ótimos, bem-humorados e recheados de reflexões sutis sobre os relacionamentos de um casal, sobre as expectativas sociais e sobre a complexidade de uma paternidade que não chega com manual de instruções. Wolton conseguiu, de fato, encontrar o tom perfeito da série, garantindo que o humor nunca desvalorize os momentos emocionais ao mesmo tempo que o drama nunca se torna pesado demais.
A direção e a estética visual de "Trying", responsabilidade de Jim O'Hanlon (da versão original de "Shameless") também merecem destaque. A série é filmada em Londres, e a cidade ganha um charme todo especial, servindo como pano de fundo para uma vida caótica, mas adorável, do casal. A fotografia usa das cores vibrantes e de uma iluminação mais naturalista para refletir a atmosfera acolhedora do universo da série. A trilha sonora, composta por músicas indie emocionantes, contribui demais para uma imersão importante na história - ela funciona como um complemento perfeito para os altos e baixos da jornada de Nikki e Jason - e não se espante por desejar ter toda ela na sua playlist! Outro diferencial de "Trying" é a forma como ela aborda o tema "adoção" de maneira sensível e sem romantizações exageradas. A série não ignora os desafios reais do processo, desde a burocracia até as dificuldades emocionais e psicológicas que podem surgir para os futuros pais e para as crianças envolvidas. Ainda assim, essa abordagem nunca é pessimista – ao contrário, "Trying" celebra a vida, o crescimento pessoal e a força do amor, mostrando que a família é construída por laços muito mais profundos do que os biológicos. Emocionante!
"Trying" já concluiu sua jornada de produção com as quatro temporadas disponíveis na AppleTV+ e justamente por isso posso afirmar que a série se firma como uma das melhores comédias dramáticas dos últimos tempos - uma joia rara escondida no streaming! "Trying" prova que é possível contar histórias profundas e significativas sem recorrer a exageros emocionais ou tramas excessivamente pesadas. Essa é o tipo de obra que aquece o coração e nos faz rir na mesma medida, tornando-se uma recomendação essencial para quem busca algo leve, inteligente e cheio de sensibilidade.
"Trying" é uma escolha imperdível!
Se você gosta de uma série capaz de te emocionar ao ponto de deixar seus olhos marejados uma cena depois de você ter dado muitas gargalhadas, pois bem, você encontrou uma que vai te fazer perguntar a razão de não ter assistido ela antes! Estou falando da imperdível "Trying", lançada pela AppleTV+ em 2022 e pouquíssimo comentada pelos críticos e pelo público - mesmo tendo uma qualidade excepcional de texto e de produção. Essa série é uma comédia dramática britânica que foge do convencional por explorar de forma honesta, tocante e genuinamente engraçada os desafios da adoção e da vida adulta. Criada por Andy Wolton, a série equilibra humor e emoção com uma leveza rara para o gênero, lembrando produções como "Alguém em Algum Lugar" ou até "Amor Platônico", mas com uma doçura própria e uma abordagem calorosa que conquista a audiência pela alma desde o primeiro (e inesquecível) episódio.
A trama acompanha Nikki (Esther Smith) e Jason (Rafe Spall), um casal de trinta e poucos anos que, após inúmeras tentativas frustradas de ter um filho, decide embarcar na jornada da adoção. No entanto, o caminho não é fácil: além da burocracia e das dificuldades emocionais do processo, eles precisam provar para si mesmos (e para os assistentes sociais) que estão preparados para serem pais. A série se desenrola a partir desse dilema, misturando momentos cômicos e vulneráveis em igual medida, enquanto Nikki e Jason navegam pelas incertezas, expectativas e desventuras da parentalidade. Confira o trailer:
Chega ser impressionante como "Trying" sabe potencializar sua maior força: a química impecável entre Esther Smith e Rafe Spall. O casal protagonista traz uma autenticidade tão especial que se torna muito fácil a conexão com seus dilemas ao ponto de torcermos por eles a cada desafio enfrentado - sério, é como se eles fossem nossos amigos há anos! Smith entrega uma performance realmente encantadora, cheia de entusiasmo e inseguranças; enquanto Spall equilibra a impulsividade de Jason com um carisma todo desajeitado, mas muito divertido. O elenco de apoio, que inclui Imelda Staunton como a assistente social Penny, adiciona ainda mais profundidade à série, garantindo que os momentos dramáticos sejam tão impactantes quanto os cômicos. E aqui está o mérito do roteiro de Andy Wolton - ele evita cair nos clichês melodramáticos e com isso constrói uma narrativa que se mantém realista sem perder o tom otimista. Os diálogos são ótimos, bem-humorados e recheados de reflexões sutis sobre os relacionamentos de um casal, sobre as expectativas sociais e sobre a complexidade de uma paternidade que não chega com manual de instruções. Wolton conseguiu, de fato, encontrar o tom perfeito da série, garantindo que o humor nunca desvalorize os momentos emocionais ao mesmo tempo que o drama nunca se torna pesado demais.
A direção e a estética visual de "Trying", responsabilidade de Jim O'Hanlon (da versão original de "Shameless") também merecem destaque. A série é filmada em Londres, e a cidade ganha um charme todo especial, servindo como pano de fundo para uma vida caótica, mas adorável, do casal. A fotografia usa das cores vibrantes e de uma iluminação mais naturalista para refletir a atmosfera acolhedora do universo da série. A trilha sonora, composta por músicas indie emocionantes, contribui demais para uma imersão importante na história - ela funciona como um complemento perfeito para os altos e baixos da jornada de Nikki e Jason - e não se espante por desejar ter toda ela na sua playlist! Outro diferencial de "Trying" é a forma como ela aborda o tema "adoção" de maneira sensível e sem romantizações exageradas. A série não ignora os desafios reais do processo, desde a burocracia até as dificuldades emocionais e psicológicas que podem surgir para os futuros pais e para as crianças envolvidas. Ainda assim, essa abordagem nunca é pessimista – ao contrário, "Trying" celebra a vida, o crescimento pessoal e a força do amor, mostrando que a família é construída por laços muito mais profundos do que os biológicos. Emocionante!
"Trying" já concluiu sua jornada de produção com as quatro temporadas disponíveis na AppleTV+ e justamente por isso posso afirmar que a série se firma como uma das melhores comédias dramáticas dos últimos tempos - uma joia rara escondida no streaming! "Trying" prova que é possível contar histórias profundas e significativas sem recorrer a exageros emocionais ou tramas excessivamente pesadas. Essa é o tipo de obra que aquece o coração e nos faz rir na mesma medida, tornando-se uma recomendação essencial para quem busca algo leve, inteligente e cheio de sensibilidade.
"Trying" é uma escolha imperdível!
Talvez uma das experiências mais marcantes e sensacionais na vida de uma uma mulher (e de um homem) seja se tornar mãe (e pai) - a grande questão é que essa jornada não tem nada de romântica e é justamente isso que "Tully", com muita sensibilidade e uma boa dose de verdade, discute!
Marlo (Charlize Theron) é uma mãe de três filhos – um deles recém-nascido – que vive uma vida muito atarefada e exaustiva. Certo dia, seu irmão oferece para ela, como presente, a ajuda de uma babá para cuidar das crianças durante o período da noite, Tully (Mackenzie Davis). Mesmo hesitante, ela acaba se surpreendendo com a jovem e criando um laço emocional capaz de mudar sua vida. Confira o trailer:
Se em "Namorados Para Sempre"(“Blue Valentine”), o diretor Derek Cianfrance expõe as incertezas e inseguranças de um jovem casal que passa por uma profunda crise em seu casamento, "Tully" transporta essa dura realidade para a maternidade. Talvez o filme dirigido pelo sempre excelente Jason Reitman em mais uma parceria com a roteirista Diablo Cody (os mesmos de "Juno" e "Jovens Adultos") suavize na "forma", mas sem dúvida alguma continua respeitando a força e o impacto do "conteúdo". Veja, se em "Juno" a dupla discutiu a gravidez na adolescência e as implicações de uma adoção, agora eles retratam os meses seguintes ao nascimento de um terceiro filho e o que isso representa para uma mulher na casa dos 30 anos - sem esconder nenhum detalhe, aliás.
Alguns pontos chamam muito atenção em "Tully": o primeiro é que o filme é muito bem dirigido - ratificando o talento de Reitman no trabalho com os atores. A química entre Charlize Theron e Mackenzie Davis impressiona. O subtexto é tão bem trabalhado que somos capazes de imaginar exatamente o que as personagens estão vivendo internamente e como isso está refletindo na relação entre elas. É isso que nos leva ao segundo destaque: Charlize Theron está fantástica como Marlo - uma atriz belíssima (e aqui falo do seu talento e da sua beleza física) que já provou ser capaz de se desconstruir em pró da composição dramática de suas personagens, mais uma vez dá uma aula com sua performance. E por, fim, não menos importante, é o roteiro Cody: os diálogos são tão afiados, irônicos e incrivelmente sensíveis que é impossível qualquer mulher (mãe) não se conectar com a história - para os homens, pais, que muitas vezes são incapazes de ler com exatidão o que acontece com uma mulher após o nascimento de um filho, também vale o comentário.
"Tully" é um filme com alma, tecnicamente representada por uma edição capaz de potencializar e dar o tom exato de um excelente roteiro e uma direção muito competente. Lembrando que estamos falando das imperfeições da maternidade, que quebram velhas concepções de como uma família deve funcionar e que metaforicamente expõe as dores íntimas das mulheres com muita inteligência, sem a necessidade de uma exposição exagerada e muito menos de entregar todas as respostas - afinal, cada um é cada um!
Val muito o seu play!
Talvez uma das experiências mais marcantes e sensacionais na vida de uma uma mulher (e de um homem) seja se tornar mãe (e pai) - a grande questão é que essa jornada não tem nada de romântica e é justamente isso que "Tully", com muita sensibilidade e uma boa dose de verdade, discute!
Marlo (Charlize Theron) é uma mãe de três filhos – um deles recém-nascido – que vive uma vida muito atarefada e exaustiva. Certo dia, seu irmão oferece para ela, como presente, a ajuda de uma babá para cuidar das crianças durante o período da noite, Tully (Mackenzie Davis). Mesmo hesitante, ela acaba se surpreendendo com a jovem e criando um laço emocional capaz de mudar sua vida. Confira o trailer:
Se em "Namorados Para Sempre"(“Blue Valentine”), o diretor Derek Cianfrance expõe as incertezas e inseguranças de um jovem casal que passa por uma profunda crise em seu casamento, "Tully" transporta essa dura realidade para a maternidade. Talvez o filme dirigido pelo sempre excelente Jason Reitman em mais uma parceria com a roteirista Diablo Cody (os mesmos de "Juno" e "Jovens Adultos") suavize na "forma", mas sem dúvida alguma continua respeitando a força e o impacto do "conteúdo". Veja, se em "Juno" a dupla discutiu a gravidez na adolescência e as implicações de uma adoção, agora eles retratam os meses seguintes ao nascimento de um terceiro filho e o que isso representa para uma mulher na casa dos 30 anos - sem esconder nenhum detalhe, aliás.
Alguns pontos chamam muito atenção em "Tully": o primeiro é que o filme é muito bem dirigido - ratificando o talento de Reitman no trabalho com os atores. A química entre Charlize Theron e Mackenzie Davis impressiona. O subtexto é tão bem trabalhado que somos capazes de imaginar exatamente o que as personagens estão vivendo internamente e como isso está refletindo na relação entre elas. É isso que nos leva ao segundo destaque: Charlize Theron está fantástica como Marlo - uma atriz belíssima (e aqui falo do seu talento e da sua beleza física) que já provou ser capaz de se desconstruir em pró da composição dramática de suas personagens, mais uma vez dá uma aula com sua performance. E por, fim, não menos importante, é o roteiro Cody: os diálogos são tão afiados, irônicos e incrivelmente sensíveis que é impossível qualquer mulher (mãe) não se conectar com a história - para os homens, pais, que muitas vezes são incapazes de ler com exatidão o que acontece com uma mulher após o nascimento de um filho, também vale o comentário.
"Tully" é um filme com alma, tecnicamente representada por uma edição capaz de potencializar e dar o tom exato de um excelente roteiro e uma direção muito competente. Lembrando que estamos falando das imperfeições da maternidade, que quebram velhas concepções de como uma família deve funcionar e que metaforicamente expõe as dores íntimas das mulheres com muita inteligência, sem a necessidade de uma exposição exagerada e muito menos de entregar todas as respostas - afinal, cada um é cada um!
Val muito o seu play!
"Um Brinde ao Sucesso" é muito divertido e uma delícia de assistir! Embora discuta temas como a "inveja", o "rancor", a "insegurança" e a "falsidade", essa produção francesa dirigida pelo ótimo Daniel Cohen (de "Como um Chef") é daquelas que se destaca não apenas pela trama envolvente, mas também pela habilidade única de capturar a essência da vida cotidiana de uma maneira encantadoramente real. O filme, tranquilamente, poderia ser um episódio de "Modern Love" ou algo que Woody Allen adoraria ter feito, no entanto o toque francês contemporâneo que explora as complexidades das relações humanas com uma leve pitada de humor, olha, é incrível e mais uma vez mostra estar bem afiado.
Na trama, a dinâmica entre dois casais de "grandes" amigos é abalada quando a subestimada (e submissa) Léa Monteil (Bérénice Bejo) resolve escrever um livro que rapidamente se transforma em um super best-seller. Seu sucesso inesperado desperta inveja de sua melhor amiga Karine Léger (Florence Foresti) e a insegurança de seu namorado, Marc Seyriey (Vincent Cassel), gerando assim uma profunda crise pessoal em todos ao seu redor. Confira o trailer:
Embora o título nacional "Um Brinde ao Sucesso" seja absolutamente irônico e inteligente (coisa rara hoje em dia), o original em francês "Le bonheur des uns...", algo como “A felicidade de uns...”, transforma essas "reticências" em um gatilho tão alinhado ao roteiro e a forma como Cohen conduz a narrativa que chega ser um pecado não ter sido usado por aqui também. Sim, o filme é cheio de "reticências" que exige da audiência uma interpretação que vai além daquilo que é falado - e aqui fica impossível não citar o extraordinário trabalho do seu elenco.
Bejo, Foresti, Cassel e até o "sem noção" François Damiens (Francis Léger) dão uma aula de conexão. A química entre eles transforma nossa experiência em algo tão próximo que é impossível não nos projetarmos para as situações absurdas que todos vivem - sem falar nos comentários ácidos do casal Léger que certamente vai te fazer lembrar de alguém(s). A atuação magistral do elenco adiciona profundidade aos personagens, tornando a trama mais rica e envolvente, se apoiando na comédia de situação, sem esquecer do drama mais íntimo de cada um deles - essa dicotomia é perfeita para construir uma dinâmica que nos faz achar graça, mas que também nos incomoda (no bom sentido) em muitos momentos.
A trilha sonora de Maxime Desprez e de Michaël Tordjman (ambos de "Homens à Beira de um Ataque de Nervos") é tão sutil quanto eficaz, mas junto com a cinematografia de Stephan Massis (da ótima série francesa, "Engrenages") dão o tom daquela atmosfera moderna de Paris que transforma a vida urbana francesa em sequências e enquadramentos quase poéticos. O que eu quero dizer é que, ao capturar a autenticidade das relações humanas nesse cenário tão particular, especialmente quando confrontadas com as complexidades da ambição e do sucesso, o filme ganha força pela sua realidade quase que cruel. Mas calma, pois a abordagem do diretor pretende explorar muito mais as nuances da amizade e do ego com uma visão única sobre as escolhas que fazemos quando estamos buscando a felicidade que percebemos no outro, do que o embate constrangedor de quem não tem nada para nos acrescentar durante a vida (embora eu, no lugar da protagonista, não sei se teria tanta paciência)!
Acredite, "Um Brinde ao Sucesso" é mais um dos tesouros escondidos nas plataformas de streaming que merece o seu play!
"Um Brinde ao Sucesso" é muito divertido e uma delícia de assistir! Embora discuta temas como a "inveja", o "rancor", a "insegurança" e a "falsidade", essa produção francesa dirigida pelo ótimo Daniel Cohen (de "Como um Chef") é daquelas que se destaca não apenas pela trama envolvente, mas também pela habilidade única de capturar a essência da vida cotidiana de uma maneira encantadoramente real. O filme, tranquilamente, poderia ser um episódio de "Modern Love" ou algo que Woody Allen adoraria ter feito, no entanto o toque francês contemporâneo que explora as complexidades das relações humanas com uma leve pitada de humor, olha, é incrível e mais uma vez mostra estar bem afiado.
Na trama, a dinâmica entre dois casais de "grandes" amigos é abalada quando a subestimada (e submissa) Léa Monteil (Bérénice Bejo) resolve escrever um livro que rapidamente se transforma em um super best-seller. Seu sucesso inesperado desperta inveja de sua melhor amiga Karine Léger (Florence Foresti) e a insegurança de seu namorado, Marc Seyriey (Vincent Cassel), gerando assim uma profunda crise pessoal em todos ao seu redor. Confira o trailer:
Embora o título nacional "Um Brinde ao Sucesso" seja absolutamente irônico e inteligente (coisa rara hoje em dia), o original em francês "Le bonheur des uns...", algo como “A felicidade de uns...”, transforma essas "reticências" em um gatilho tão alinhado ao roteiro e a forma como Cohen conduz a narrativa que chega ser um pecado não ter sido usado por aqui também. Sim, o filme é cheio de "reticências" que exige da audiência uma interpretação que vai além daquilo que é falado - e aqui fica impossível não citar o extraordinário trabalho do seu elenco.
Bejo, Foresti, Cassel e até o "sem noção" François Damiens (Francis Léger) dão uma aula de conexão. A química entre eles transforma nossa experiência em algo tão próximo que é impossível não nos projetarmos para as situações absurdas que todos vivem - sem falar nos comentários ácidos do casal Léger que certamente vai te fazer lembrar de alguém(s). A atuação magistral do elenco adiciona profundidade aos personagens, tornando a trama mais rica e envolvente, se apoiando na comédia de situação, sem esquecer do drama mais íntimo de cada um deles - essa dicotomia é perfeita para construir uma dinâmica que nos faz achar graça, mas que também nos incomoda (no bom sentido) em muitos momentos.
A trilha sonora de Maxime Desprez e de Michaël Tordjman (ambos de "Homens à Beira de um Ataque de Nervos") é tão sutil quanto eficaz, mas junto com a cinematografia de Stephan Massis (da ótima série francesa, "Engrenages") dão o tom daquela atmosfera moderna de Paris que transforma a vida urbana francesa em sequências e enquadramentos quase poéticos. O que eu quero dizer é que, ao capturar a autenticidade das relações humanas nesse cenário tão particular, especialmente quando confrontadas com as complexidades da ambição e do sucesso, o filme ganha força pela sua realidade quase que cruel. Mas calma, pois a abordagem do diretor pretende explorar muito mais as nuances da amizade e do ego com uma visão única sobre as escolhas que fazemos quando estamos buscando a felicidade que percebemos no outro, do que o embate constrangedor de quem não tem nada para nos acrescentar durante a vida (embora eu, no lugar da protagonista, não sei se teria tanta paciência)!
Acredite, "Um Brinde ao Sucesso" é mais um dos tesouros escondidos nas plataformas de streaming que merece o seu play!