Se em 1971, "Encurralado" mostrou para o mercado o potencial do diretor Steven Spielberg; dadas as devidas proporções, "A Viatura" representou a mesma coisa para o jovem diretor de 34 anos, Jon Watts, em 2015 - ano em que esse filme esteve Top Ten Independent Films pela National Board of Review dos EUA. Aliás, foi graças a "Cop Car" (no original), que Watts recebeu o convite para dirigir a nova trilogia do "Homem- Aranha" para a Sony.
Em um ótimo filme de ação com inúmeras referências ao estilo "Vince Gilligan" (de "Breaking Bad") de contar uma história que transita entre a angustia e a tensão (cheia de humor ácido), dois amigos com 10 anos de idade encontram um carro da polícia abandonado e decidem dirigi-lo para se divertir. Porém, ambos não sabem como fazer isso e acabam se afastando do local onde estavam. Acontece que a viatura pertence ao corrupto xerife da cidade que, claro, decide reaver seu carro para não se complicar - é aí que o jogo de gato e rato começa. Confira o trailer (em inglês):
Para entender o caráter independente de "A Viatura", o filme foi destaque no Festival de Sundance em 2015 - o mesmo festival que também catapultou as carreiras de nomes (hoje) consagrados como Kevin Smith, Quentin Tarantino, Bryan Singer, Noah Baumbach, David O. Russell. De fato Watts conseguiu a mesma coisa ao transportar para o filme, em pouco menos de 90 minutos, toda a ingenuidade de dois garotos que só queriam se divertir, mas que tomaram decisões erradas por não entenderem o real perigo que estavam passando - sair dirigindo qualquer carro com dez anos de idade já seria um absurdo, imagina uma viatura de policia no interior dos EUA?
O interessante do roteiro escrito por Watts e Christopher Ford (de "Mundo em Caos") é que é a partir dessa ingenuidade que a tensão vai se construindo. Aquele principio da "bola de neve" que Gilligan usou em "Breaking Bad" é exatamente o mesmo aqui. As similaridades não são apenas narrativas, mas também conceituais, já que Watts está sempre procurando posicionar sua câmera de uma forma criativa para contar a história certa, no momento certo, aproveitando todos os detalhes que a própria ação deixou para trás - reparem nos gravetos deixados pelos garotos e na garrafa quebrada na estrada (pode parecer besteira, mas não, tudo tem uma razão de ser e de estar em cena). O desenho de som é outra forte referência de Gilligan - ele conta a história, mas mais do que isso, também serve para potencializar a tensão que está sendo construída ou que está prestes a estourar. Reparem no som "ensurdecedor" dos moinhos de vento no terceiro ato do filme.
De fato "A Viatura" não é um filme inesquecível, mas é tão bom dentro da sua simplicidade que fica fácil entender porque Watts foi exaltado. Seu trabalho com os jovens atores James Freedson-Jackson e Hays Wellford, foi sensacional. O direcionamento para que Kevin Bacon, mais uma vez, também brilhasse, merece elogios. Sua habilidade em subverter algumas ações simples em algo aterrorizante ditou o ritmo do filme (dois meninos mexendo em armas de fogo com nenhum cuidado, ajuda a definir essa sensação). Tendo em mente que o filme custou menos de um milhão de dólares, posso te garantir que saiu barato pelo entretenimento que ele proporciona!
Vale o play!
Se em 1971, "Encurralado" mostrou para o mercado o potencial do diretor Steven Spielberg; dadas as devidas proporções, "A Viatura" representou a mesma coisa para o jovem diretor de 34 anos, Jon Watts, em 2015 - ano em que esse filme esteve Top Ten Independent Films pela National Board of Review dos EUA. Aliás, foi graças a "Cop Car" (no original), que Watts recebeu o convite para dirigir a nova trilogia do "Homem- Aranha" para a Sony.
Em um ótimo filme de ação com inúmeras referências ao estilo "Vince Gilligan" (de "Breaking Bad") de contar uma história que transita entre a angustia e a tensão (cheia de humor ácido), dois amigos com 10 anos de idade encontram um carro da polícia abandonado e decidem dirigi-lo para se divertir. Porém, ambos não sabem como fazer isso e acabam se afastando do local onde estavam. Acontece que a viatura pertence ao corrupto xerife da cidade que, claro, decide reaver seu carro para não se complicar - é aí que o jogo de gato e rato começa. Confira o trailer (em inglês):
Para entender o caráter independente de "A Viatura", o filme foi destaque no Festival de Sundance em 2015 - o mesmo festival que também catapultou as carreiras de nomes (hoje) consagrados como Kevin Smith, Quentin Tarantino, Bryan Singer, Noah Baumbach, David O. Russell. De fato Watts conseguiu a mesma coisa ao transportar para o filme, em pouco menos de 90 minutos, toda a ingenuidade de dois garotos que só queriam se divertir, mas que tomaram decisões erradas por não entenderem o real perigo que estavam passando - sair dirigindo qualquer carro com dez anos de idade já seria um absurdo, imagina uma viatura de policia no interior dos EUA?
O interessante do roteiro escrito por Watts e Christopher Ford (de "Mundo em Caos") é que é a partir dessa ingenuidade que a tensão vai se construindo. Aquele principio da "bola de neve" que Gilligan usou em "Breaking Bad" é exatamente o mesmo aqui. As similaridades não são apenas narrativas, mas também conceituais, já que Watts está sempre procurando posicionar sua câmera de uma forma criativa para contar a história certa, no momento certo, aproveitando todos os detalhes que a própria ação deixou para trás - reparem nos gravetos deixados pelos garotos e na garrafa quebrada na estrada (pode parecer besteira, mas não, tudo tem uma razão de ser e de estar em cena). O desenho de som é outra forte referência de Gilligan - ele conta a história, mas mais do que isso, também serve para potencializar a tensão que está sendo construída ou que está prestes a estourar. Reparem no som "ensurdecedor" dos moinhos de vento no terceiro ato do filme.
De fato "A Viatura" não é um filme inesquecível, mas é tão bom dentro da sua simplicidade que fica fácil entender porque Watts foi exaltado. Seu trabalho com os jovens atores James Freedson-Jackson e Hays Wellford, foi sensacional. O direcionamento para que Kevin Bacon, mais uma vez, também brilhasse, merece elogios. Sua habilidade em subverter algumas ações simples em algo aterrorizante ditou o ritmo do filme (dois meninos mexendo em armas de fogo com nenhum cuidado, ajuda a definir essa sensação). Tendo em mente que o filme custou menos de um milhão de dólares, posso te garantir que saiu barato pelo entretenimento que ele proporciona!
Vale o play!
É até natural imaginar que todo drama mais, digamos, denso e obscuro com o ator argentino Ricardo Darín nos remeta ao imperdível "O Segredo dos Seus Olhos" ou até ao menos inspirado (mas muito bom) "Tese Sobre um Homicídio". No entanto em "Abutres" a linha narrativa é um pouco diferente, embora em um primeiro olhar possa até nos causar certa identificação com um mistério policial, mas o fato é que o filme do diretor Pablo Trapero (de "Elefante Branco") é muito mais uma jornada íntima de um personagem que vive no caos, mas que busca encontrar um caminho para ser feliz a qualquer preço - algo como vimos em "Jóias Brutas" (aqui um pouco mais cadenciado, sem aquela adrenalina alucinante). Com um olhar crítico e provocador sobre a natureza humana, esse thriller mergulha nas profundezas da moralidade, nos deixando tão intrigado quanto perturbado, com aquela sensação de que "se está ruim, a tendência é piorar ainda mais"!
Sosa (Ricardo Darin) é um advogado que perdeu sua licença, mas que está envolvido em um esquema bastante sombrio e muito lucrativo - ele literalmente caça vítimas de acidentes de trânsito para obter uma parte do seguro, mesmo que para isso seja preciso fraudar todo o processo. Cheio de dividas, as coisas se complicam ainda mais quando ele se depara com a bela Luján (Martina Gusman), uma paramédica que está disposta a transforma-lo em um homem melhor. Confira o trailer:
Talvez o que torna "Abutres" verdadeiramente interessante é a forma como Trapero cria uma atmosfera que equilibra a tensão e o suspense, ao mesmo tempo em que mergulha nas complexidades morais de personagens realmente profundos - mesmo que inicialmente eles soem até estereotipados. Existe um tom de controversa muito bem desenvolvido no roteiro escrito pelo Alejandro Fadel, pelo Martín Mauregui e pelo Santiago Mitre (todos de "Leonera" e o último de "Argentina, 1985"), que aproxima, mas também repele, Sosa e Luján, já que seus trabalhos são completamente opostos: enquanto ela tenta a todo custo salvar a vida de seus pacientes, ele tenta lucrar com a possível morte deles.
É aí que, mais uma vez, Ricardo Darín brilha. O ator nos oferece uma performance memorável, transmitindo com maestria a dualidade moral de seu personagem - que mais uma vez vai te conectar com o trabalho magnifico de Adam Sandler em "Jóias Brutas". Uma camada que fortalece a trama, sem dúvida, reside na tensão palpável entre os personagens de Darín e de Martina Gusmán - cada cena é um duelo construído na base da desconfiança, mas essencialmente suportado pelo afeto imediato entre eles. Outro ponto que nos marca é atmosfera urbana criada pelo diretor e ratificada com uma fotografia gélida assinada pelo Julián Apezteguia (de "O Anjo") - repare como ele captura a decadência e o desespero de uma Buenos Aires pouco acolhedora, refletindo exatamente a batalha íntima e moral do protagonista,
"Abutres" pode ter um começo mais cadenciado, um segundo ato com um desenvolvimento mais emaranhado, mas é no terceiro ato que a história vira de uma forma muito envolvente. O filme usa dos gatilhos que ele prepara durante uma hora e meia, para realmente desafiar as convenções nos minutos finais. Se você está em busca de um filme que o mantenha preso às expectativas que os personagens vão criando em cima de suas próprias falhas morais até que o perigo iminente se concretize, não perca tempo e dê o play - tenho certeza que será uma experiência que vai além do entretenimento superficial com um toque independente de qualidade e bastante autoral.
É até natural imaginar que todo drama mais, digamos, denso e obscuro com o ator argentino Ricardo Darín nos remeta ao imperdível "O Segredo dos Seus Olhos" ou até ao menos inspirado (mas muito bom) "Tese Sobre um Homicídio". No entanto em "Abutres" a linha narrativa é um pouco diferente, embora em um primeiro olhar possa até nos causar certa identificação com um mistério policial, mas o fato é que o filme do diretor Pablo Trapero (de "Elefante Branco") é muito mais uma jornada íntima de um personagem que vive no caos, mas que busca encontrar um caminho para ser feliz a qualquer preço - algo como vimos em "Jóias Brutas" (aqui um pouco mais cadenciado, sem aquela adrenalina alucinante). Com um olhar crítico e provocador sobre a natureza humana, esse thriller mergulha nas profundezas da moralidade, nos deixando tão intrigado quanto perturbado, com aquela sensação de que "se está ruim, a tendência é piorar ainda mais"!
Sosa (Ricardo Darin) é um advogado que perdeu sua licença, mas que está envolvido em um esquema bastante sombrio e muito lucrativo - ele literalmente caça vítimas de acidentes de trânsito para obter uma parte do seguro, mesmo que para isso seja preciso fraudar todo o processo. Cheio de dividas, as coisas se complicam ainda mais quando ele se depara com a bela Luján (Martina Gusman), uma paramédica que está disposta a transforma-lo em um homem melhor. Confira o trailer:
Talvez o que torna "Abutres" verdadeiramente interessante é a forma como Trapero cria uma atmosfera que equilibra a tensão e o suspense, ao mesmo tempo em que mergulha nas complexidades morais de personagens realmente profundos - mesmo que inicialmente eles soem até estereotipados. Existe um tom de controversa muito bem desenvolvido no roteiro escrito pelo Alejandro Fadel, pelo Martín Mauregui e pelo Santiago Mitre (todos de "Leonera" e o último de "Argentina, 1985"), que aproxima, mas também repele, Sosa e Luján, já que seus trabalhos são completamente opostos: enquanto ela tenta a todo custo salvar a vida de seus pacientes, ele tenta lucrar com a possível morte deles.
É aí que, mais uma vez, Ricardo Darín brilha. O ator nos oferece uma performance memorável, transmitindo com maestria a dualidade moral de seu personagem - que mais uma vez vai te conectar com o trabalho magnifico de Adam Sandler em "Jóias Brutas". Uma camada que fortalece a trama, sem dúvida, reside na tensão palpável entre os personagens de Darín e de Martina Gusmán - cada cena é um duelo construído na base da desconfiança, mas essencialmente suportado pelo afeto imediato entre eles. Outro ponto que nos marca é atmosfera urbana criada pelo diretor e ratificada com uma fotografia gélida assinada pelo Julián Apezteguia (de "O Anjo") - repare como ele captura a decadência e o desespero de uma Buenos Aires pouco acolhedora, refletindo exatamente a batalha íntima e moral do protagonista,
"Abutres" pode ter um começo mais cadenciado, um segundo ato com um desenvolvimento mais emaranhado, mas é no terceiro ato que a história vira de uma forma muito envolvente. O filme usa dos gatilhos que ele prepara durante uma hora e meia, para realmente desafiar as convenções nos minutos finais. Se você está em busca de um filme que o mantenha preso às expectativas que os personagens vão criando em cima de suas próprias falhas morais até que o perigo iminente se concretize, não perca tempo e dê o play - tenho certeza que será uma experiência que vai além do entretenimento superficial com um toque independente de qualidade e bastante autoral.
Se você gostou de "Breaking Bad", pode dar o play com a mais absoluta certeza, pois você vai amar "Nobody" (título original de "Anônimo" e que, cá entre nós, faz muito mais sentido que o título nacional). Seguindo a cartilha narrativa (e não visual) do Vince Gilligan, o filme é uma mistura perfeita de gêneros, cirurgicamente equilibrados entre as excelentes sequências de ação (bastante intensas, eu diria), aquele toque de humor quase sádico, além, é claro, de um drama de personagem cheio de camadas que, por incrível que pareça, colocam o filme em outro patamar - aliás aqui, de fato, temos uma experiência cinematográfica completa e que certamente agradará muita gente!
O roteiro, escrito por Derek Kolstad, o mesmo criador de "John Wick", acompanha a história de Hutch Mansell (Bob Odenkirk), um pacato pai e marido que sempre arca com as injustiças da vida, sem revidar. Quando dois ladrões invadem sua casa, Hutch se recusa a defender a si mesmo e sua família na esperança de evitar qualquer violência - o que acaba desapontando seu filho por sua passividade e, para ele, covardia. As consequências do incidente, no entanto, acabam despertando uma raiva latente em Hutch, desencadeando instintos adormecidos e impulsionando-o em um caminho brutal que irá trazer à tona segredos sombrios e habilidades letais de seu passado. Confira o trailer:
Obviamente que as referências de Gilligan vão além do processo de redenção e da transformação de seu personagem em algo muito maior do que a própria sociedade (daquele universo) estaria disposta a reconhecer - o filme traz o rosto conhecido de Odenkirk (o eterno Jimmy McGill) que oferece uma performance impressionante, mostrando uma versatilidade surpreendente. Ele é capaz de transitar habilmente entre os momentos de ação explosiva com as passagens mais introspectivas, que expõem sua vulnerabilidade emocional, adicionando profundidade ao personagem e fazendo com que nos importemos com sua jornada logo de cara. Além de Odenkirk, o elenco de apoio também merece elogios - o destaque, para mim, fica com Christopher Lloyd, o pai de Hutch, um personagem carismático e cheio de camadas que vai te surpreender..
A direção de Ilya Naishuller é outro ponto que merece muitos elogios - e se aqui ele não mostra a mesma capacidade criativa de Gilligan, certamente ele impõe sua identidade com uma tocada ágil e precisa, garantindo que as cenas de ação sejam realizadas de forma magistral. As sequências de luta são coreografadas de uma maneira quase realista, porém muito brutal, ou seja, Naishuller não se apoia em exageros desnecessários, porém nos mantém envolvidos visualmente com aquele toque "filme de herói" das cenas. A fotografia de Pawel Pogorzelski (de "Fresh") e a trilha sonora de David Buckley (de "Destruição Final") merecem sua atenção - reparem como tudo contribui para a construção de uma atmosfera tensa, potencializando nossa imersão de uma forma impressionante..
Veja, embora priorize a ação, "Anônimo" não é apenas um festival de pancadarias. Ele aborda temas mais profundos e sensíveis, como o valor que a identidade pode ter para um ser humano mesmo com as marcas do arrependimento e a necessidade da redenção para encontrar seu lugar de paz. Tudo isso sem soar pretensioso demais para um filme de pouco mais de 90 minutos, onde através da jornada interna de seu protagonista, somos provocados a refletir sobre o real significado da vida e o impacto de nossas escolhas em nós e nos que estão ao nosso redor.
Vale muito o seu play!
Se você gostou de "Breaking Bad", pode dar o play com a mais absoluta certeza, pois você vai amar "Nobody" (título original de "Anônimo" e que, cá entre nós, faz muito mais sentido que o título nacional). Seguindo a cartilha narrativa (e não visual) do Vince Gilligan, o filme é uma mistura perfeita de gêneros, cirurgicamente equilibrados entre as excelentes sequências de ação (bastante intensas, eu diria), aquele toque de humor quase sádico, além, é claro, de um drama de personagem cheio de camadas que, por incrível que pareça, colocam o filme em outro patamar - aliás aqui, de fato, temos uma experiência cinematográfica completa e que certamente agradará muita gente!
O roteiro, escrito por Derek Kolstad, o mesmo criador de "John Wick", acompanha a história de Hutch Mansell (Bob Odenkirk), um pacato pai e marido que sempre arca com as injustiças da vida, sem revidar. Quando dois ladrões invadem sua casa, Hutch se recusa a defender a si mesmo e sua família na esperança de evitar qualquer violência - o que acaba desapontando seu filho por sua passividade e, para ele, covardia. As consequências do incidente, no entanto, acabam despertando uma raiva latente em Hutch, desencadeando instintos adormecidos e impulsionando-o em um caminho brutal que irá trazer à tona segredos sombrios e habilidades letais de seu passado. Confira o trailer:
Obviamente que as referências de Gilligan vão além do processo de redenção e da transformação de seu personagem em algo muito maior do que a própria sociedade (daquele universo) estaria disposta a reconhecer - o filme traz o rosto conhecido de Odenkirk (o eterno Jimmy McGill) que oferece uma performance impressionante, mostrando uma versatilidade surpreendente. Ele é capaz de transitar habilmente entre os momentos de ação explosiva com as passagens mais introspectivas, que expõem sua vulnerabilidade emocional, adicionando profundidade ao personagem e fazendo com que nos importemos com sua jornada logo de cara. Além de Odenkirk, o elenco de apoio também merece elogios - o destaque, para mim, fica com Christopher Lloyd, o pai de Hutch, um personagem carismático e cheio de camadas que vai te surpreender..
A direção de Ilya Naishuller é outro ponto que merece muitos elogios - e se aqui ele não mostra a mesma capacidade criativa de Gilligan, certamente ele impõe sua identidade com uma tocada ágil e precisa, garantindo que as cenas de ação sejam realizadas de forma magistral. As sequências de luta são coreografadas de uma maneira quase realista, porém muito brutal, ou seja, Naishuller não se apoia em exageros desnecessários, porém nos mantém envolvidos visualmente com aquele toque "filme de herói" das cenas. A fotografia de Pawel Pogorzelski (de "Fresh") e a trilha sonora de David Buckley (de "Destruição Final") merecem sua atenção - reparem como tudo contribui para a construção de uma atmosfera tensa, potencializando nossa imersão de uma forma impressionante..
Veja, embora priorize a ação, "Anônimo" não é apenas um festival de pancadarias. Ele aborda temas mais profundos e sensíveis, como o valor que a identidade pode ter para um ser humano mesmo com as marcas do arrependimento e a necessidade da redenção para encontrar seu lugar de paz. Tudo isso sem soar pretensioso demais para um filme de pouco mais de 90 minutos, onde através da jornada interna de seu protagonista, somos provocados a refletir sobre o real significado da vida e o impacto de nossas escolhas em nós e nos que estão ao nosso redor.
Vale muito o seu play!
Se Vince Gilligan (de "Breaking Bad") tivesse dirigido "The Sinner", o resultado fatalmente seria algo como o que encontramos em "Candy" (que no Brasil ganhou o sugestivo, para não dizer expositivo, subtítulo de "Uma História de Paixão e Crime"). Além de ter a mesma protagonista, Jessica Biel, a minissérie do Hulu mistura muitos conceitos (do visual ao narrativo) de Gilligan para contar a história real de uma dona de casa comum que certo dia cometeu um crime terrivelmente bárbaro nada condizente com sua personalidade.
Baseado no livro "Evidence of Love", escrito por Jim Atkinson, "Candy" acompanha Candy Montgomery (Jessica Biel), uma dona de casa do Texas que parecia ter a vida perfeita: um marido amoroso com um bom emprego, filhos lindos e uma casa maravilhosa no subúrbio. Mas então o que a teria levado a matar sua amiga da igreja, Betty Gore (Melanie Lynskey), com um machado? Confira o trailer:
Seguindo uma linha menos dramática, "Candy" talvez fique no exato meio termo entre "The Thing About Pam" (também do Star+) e "The Undoing" (da HBO). O fato da história se passar em uma cidade pacata do Texas, no inicio dos anos 80, naturalmente já cria uma atmosfera bastante estereotipada da sociedade interiorana americana - porém, esse elemento exterior mais colorido esconde uma complexidade bastante interessante sobre os personagens, cheio de camadas, atormentados por aquela vida cotidiana sem expectativas, que certamente nos remete ao monocromático, ao escuro até. Essa dualidade é o ponto alto da minissérie e claramente bebe na mesma fonte de "Breaking Bad" - o desenho de som, os enquadramentos criativos (quase sempre brincado com as distorções tanto nos planos abertos como nos fechados) e o estilo de montagem em retrospectiva, fazem parte da identidade de Gilligan e foram perfeitamente absorvidas pelos quatro diretores que comandam os 5 episódios.
Desde a belíssima abertura (indicada ao Emmy de 2022) já temos a exata noção do emaranhado de situações que vamos precisar desconstruir para entender as motivações de Candy. Se inicialmente tudo parece um pouco fora de propósito, rapidamente o roteiro (e a montagem) trata de ir colocando as peças nos devidos lugares (olha o estilo Gilligan aqui de novo). Em nenhum momento você terá a sensação de estar perdido ou terá dificuldade de entender os personagens envolvidos no crime, não é esse o propósito da série. Nós sabemos quem matou Betty logo de cara, só não sabemos a razão e o que de fato aconteceu. O roteiro trata esse mistério com inteligência, com a direção dando pistas a todo momento (e que lá na frente farão todo o sentido) - ninguém rouba no jogo, então repare em todas as reações dos personagens desde o primeiro episódio.
Jessica Biel, Melanie Lynskey, Pablo Schreiber (como Allan, marido de Betty) e Timothy Simons (como Pat, marido de Candy) estão simplesmente perfeitos - o tom da performance de cada um deles briga sim com o conceito visual da minissérie e isso causa um certo descompasso, um proposital incomodo. Chega a ser surpreendente ninguém do elenco ter sido lembrado no Emmy, especialmente Lynskey. Ao melhor estilo "true crime", "Candy" pode parecer cadenciado demais em sua narrativa, mas essa dinâmica se justifica pela necessidade de apresentação dos personagens e do ambiente em que estão inseridos para que tudo faça mais sentido ao final da história - essa escolha pode cansar alguns, mas eu posso atestar que faz parte da experiência que, na minha opinião, entra naquela lista das melhores de 2022 até aqui.
Vale muito a pena!
PS: A HBO lançará em 2022 sua versão para a mesma história - "Love and Death" também será inspirada no livro "Evidence of Love: A True Story of Passion and Death in the Suburbs", além de contar com os artigos do "Texas Monthly". O elenco também promete: Elizabeth Olsen será Candy Montgomery e para completar teremos Jesse Plemons, Lily Rabe, Patrick Fugit, Keir Gilchrist, Elizabeth Marvel, Tom Pelphrey e Krysten Ritter.
Se Vince Gilligan (de "Breaking Bad") tivesse dirigido "The Sinner", o resultado fatalmente seria algo como o que encontramos em "Candy" (que no Brasil ganhou o sugestivo, para não dizer expositivo, subtítulo de "Uma História de Paixão e Crime"). Além de ter a mesma protagonista, Jessica Biel, a minissérie do Hulu mistura muitos conceitos (do visual ao narrativo) de Gilligan para contar a história real de uma dona de casa comum que certo dia cometeu um crime terrivelmente bárbaro nada condizente com sua personalidade.
Baseado no livro "Evidence of Love", escrito por Jim Atkinson, "Candy" acompanha Candy Montgomery (Jessica Biel), uma dona de casa do Texas que parecia ter a vida perfeita: um marido amoroso com um bom emprego, filhos lindos e uma casa maravilhosa no subúrbio. Mas então o que a teria levado a matar sua amiga da igreja, Betty Gore (Melanie Lynskey), com um machado? Confira o trailer:
Seguindo uma linha menos dramática, "Candy" talvez fique no exato meio termo entre "The Thing About Pam" (também do Star+) e "The Undoing" (da HBO). O fato da história se passar em uma cidade pacata do Texas, no inicio dos anos 80, naturalmente já cria uma atmosfera bastante estereotipada da sociedade interiorana americana - porém, esse elemento exterior mais colorido esconde uma complexidade bastante interessante sobre os personagens, cheio de camadas, atormentados por aquela vida cotidiana sem expectativas, que certamente nos remete ao monocromático, ao escuro até. Essa dualidade é o ponto alto da minissérie e claramente bebe na mesma fonte de "Breaking Bad" - o desenho de som, os enquadramentos criativos (quase sempre brincado com as distorções tanto nos planos abertos como nos fechados) e o estilo de montagem em retrospectiva, fazem parte da identidade de Gilligan e foram perfeitamente absorvidas pelos quatro diretores que comandam os 5 episódios.
Desde a belíssima abertura (indicada ao Emmy de 2022) já temos a exata noção do emaranhado de situações que vamos precisar desconstruir para entender as motivações de Candy. Se inicialmente tudo parece um pouco fora de propósito, rapidamente o roteiro (e a montagem) trata de ir colocando as peças nos devidos lugares (olha o estilo Gilligan aqui de novo). Em nenhum momento você terá a sensação de estar perdido ou terá dificuldade de entender os personagens envolvidos no crime, não é esse o propósito da série. Nós sabemos quem matou Betty logo de cara, só não sabemos a razão e o que de fato aconteceu. O roteiro trata esse mistério com inteligência, com a direção dando pistas a todo momento (e que lá na frente farão todo o sentido) - ninguém rouba no jogo, então repare em todas as reações dos personagens desde o primeiro episódio.
Jessica Biel, Melanie Lynskey, Pablo Schreiber (como Allan, marido de Betty) e Timothy Simons (como Pat, marido de Candy) estão simplesmente perfeitos - o tom da performance de cada um deles briga sim com o conceito visual da minissérie e isso causa um certo descompasso, um proposital incomodo. Chega a ser surpreendente ninguém do elenco ter sido lembrado no Emmy, especialmente Lynskey. Ao melhor estilo "true crime", "Candy" pode parecer cadenciado demais em sua narrativa, mas essa dinâmica se justifica pela necessidade de apresentação dos personagens e do ambiente em que estão inseridos para que tudo faça mais sentido ao final da história - essa escolha pode cansar alguns, mas eu posso atestar que faz parte da experiência que, na minha opinião, entra naquela lista das melhores de 2022 até aqui.
Vale muito a pena!
PS: A HBO lançará em 2022 sua versão para a mesma história - "Love and Death" também será inspirada no livro "Evidence of Love: A True Story of Passion and Death in the Suburbs", além de contar com os artigos do "Texas Monthly". O elenco também promete: Elizabeth Olsen será Candy Montgomery e para completar teremos Jesse Plemons, Lily Rabe, Patrick Fugit, Keir Gilchrist, Elizabeth Marvel, Tom Pelphrey e Krysten Ritter.
Se "Good Girls" foi definida como a versão de "Breaking Bad" com protagonistas femininos, naturalmente vamos relacionar "Como Vender Drogas Online (Rápido)" como a versão adolescente da série de Vince Gilligan. O que poderia soar com uma certa desconfiança, afinal a Netflix vem enchendo seu catálogo de projetos bem duvidosos com temática adolescente desde 2019, tem um elemento que acaba colocando essa série em um outro patamar: "Como Vender Drogas Online (Rápido)" é uma produção alemã! Repare na sinopse: Moritz (Maximilian Mundt) é um nerd que, após terminar um relacionamento de muitos anos e ver sua ex-namorada, Lisa (Lena Klenke), começar a se relacionar com o "traficante", popular e esportista da escola, resolve abrir seu próprio negócio para ganhar muito dinheiro, respeito, poder e assim reconquistá-la - o problema é "como" ele quer conseguir tudo isso, claro! Confira o trailer:
Vender drogas online pela Deep Web foi uma escolha tão natural para dois Nerds com o mindset empreendedor, como produzir metanfetamina de qualidade foi para um químico como Walter White. Se a motivação de White era ganhar a maior quantidade de dinheiro possível para deixar sua família tranquila após descobrir que o câncer no pulmão acabaria com sua vida, a de Moritz soa exatamente igual - mas dentro daquele universo que ele pertence! O que achei interessante em "Como Vender Drogas Online (Rápido)"é que não existe uma banalização do drama do protagonista por ele ser um adolescente cheio de inseguranças - sua dor e preocupação são tão legitimos quanto o câncer de White. Mesmo se apoiando em assuntos que estamos cansados de assistir, a série usa de um conceito narrativo menos denso, o que transforma temas bastante delicados em alegorias de fácil entendimento. O fato da série ser relativamente curta, cada episódio com cerca de 30 minutos e cada temporada com apenas seis episódios, ajuda muito nessa dinâmica e vai proporcionar um ótimo entretenimento sem tomar muito seu tempo, porém, talvez deixe a sensação que os personagens mereceriam um desenvolvimento mais cuidadoso. De cara, eu posso afirmar tranquilamente que vale a pena - sinceramente, acho que essa série pode te surpreender e, muito em breve, se tornar uma das queridinhas dos assinantes da Netflix se for inteligente o suficiente para não cair no óbvio!
Ao lado da Espanha, a Alemanha talvez seja o país europeu que mais ganhou os holofotes recentemente e que vem entregando ótimos conteúdos - deixando, inclusive, França e Reino Unido para trás. Dito isso, é de se esperar que depois de "Dark" e "Nós somos a Onda", o país trouxesse para um universo um pouco mais lúdico, a seriedade com que desenvolve suas histórias. Essa percepção executiva e criativa vem fazendo muita diferença. Um dos pontos que nos provocava em Breaking Bad e que encontramos em "Como Vender Drogas Online (Rápido)" diz respeito a construção de um mito (mesmo que na forma de anti-herói). O interessante é que para contextualizar essa jornada, os criadores Philipp Käßbohrer e Matthias Murmann, a todo momento, fazem paralelos com empreendedores de sucesso da vida real, deixando claro que existe um padrão para alcançar o sucesso e que se repetido, a chance de funcionar aumenta consideravelmente, mesmo com um produto ilegal. Não é raro, aliás, nomes como Steve Jobs, Elon Musk e Jeff Bezos serem citados para validar uma ou outra atitude dos protagonistas - essas referências trazem uma agradável lembrança de "Silicon Valley" da HBO, inclusive!
Peço licença para repetir a mesma premissa que destaquei em "Good Girls": "Como Vender Drogas Online (Rápido)" é daquele tipo de série onde o protagonista bonzinho vai tomando decisões cada vez mais questionáveis ao longo da sua jornada, cada vez mais distante dos seus valores e aspectos morais, mas vai gostando da nova vida, da sensação de poder e de pertencimento viciante até que, de repente, está em uma enorme bola de neve de onde não consegue mais sair!" - Dito isso, é possível afirmar que as tramas e sub-tramas vão soar familiares! Acontece que a série apresenta tantos elementos interessantes para serem desenvolvidos que eu chego a duvidar se a escolha por episódios menores foi realmente a melhor - acho que não!
Comandado pelo diretor Arne Feldhusen, a série tem um conceito estético maravilhoso que nos insere no universo da Geração Z com muita elegância. As inserções gráficas para explicar como a tecnologia faz parte do cotidiano dessa geração e como ela interfere na formação social desses jovens, é simplesmente genial - embora auto-explicativo, ter Moritz como narrador e protagonista só facilita o entendimento, além de render ótimas tiradas. Outro elemento visual muito bacana mostra como a droga impacta a vida de um ser humano normal - em uma sequência de cenas excepcionalmente bem editadas (totalmente clipadas), vemos uma pessoa no seu dia a dia que, rapidamente, sofre uma transformação assim que coloca um comprimido da boca. Usando tanto fashfowards quanto flashbacks, além de visualmente interessante, essas cenas ajudam a explicar os efeitos e consequências das drogas que estão sendo vendidas por Moritz e pelo seu sócio Lenny (Danilo Kamber).
Outro ponto que merece ser destacado antes de finalizarmos o review é justamente a qualidade do elenco: tanto Moritz (Maximilian Mundt) quanto Lenny (Danilo Kamber) fogem completamente do estereótipo que costumamos encontrar em séries adolescentes (e aqui estou sendo bastante taxativo). Com excelentes performances, a dupla de protagonistas convencem, cada um apoiado no seu drama particular, sem soar superficial e isso não é nada fácil!
Agora, é claro que beber na fonte de "Breaking Bad" tem seus prós e contras - são inúmeras referências (quase adaptações): como ter um policial dentro de família ou o corte de cabelo do protagonista, mas que funcionam tão bem que soa até original, embora sabemos que não é! "Como Vender Drogas Online (Rápido)" é uma ótima escolha, pela dinâmica da série e pela forma como a história é contada - ela exige da nossa imaginação e até de uma certa abstração da realidade, ao mesmo tempo em que é extremamente real e paupável dentro daquele cenário! Vale muito a pena pela dicotomia inteligente da narrativa e pela diversão que ela nos proporciona!
Se "Good Girls" foi definida como a versão de "Breaking Bad" com protagonistas femininos, naturalmente vamos relacionar "Como Vender Drogas Online (Rápido)" como a versão adolescente da série de Vince Gilligan. O que poderia soar com uma certa desconfiança, afinal a Netflix vem enchendo seu catálogo de projetos bem duvidosos com temática adolescente desde 2019, tem um elemento que acaba colocando essa série em um outro patamar: "Como Vender Drogas Online (Rápido)" é uma produção alemã! Repare na sinopse: Moritz (Maximilian Mundt) é um nerd que, após terminar um relacionamento de muitos anos e ver sua ex-namorada, Lisa (Lena Klenke), começar a se relacionar com o "traficante", popular e esportista da escola, resolve abrir seu próprio negócio para ganhar muito dinheiro, respeito, poder e assim reconquistá-la - o problema é "como" ele quer conseguir tudo isso, claro! Confira o trailer:
Vender drogas online pela Deep Web foi uma escolha tão natural para dois Nerds com o mindset empreendedor, como produzir metanfetamina de qualidade foi para um químico como Walter White. Se a motivação de White era ganhar a maior quantidade de dinheiro possível para deixar sua família tranquila após descobrir que o câncer no pulmão acabaria com sua vida, a de Moritz soa exatamente igual - mas dentro daquele universo que ele pertence! O que achei interessante em "Como Vender Drogas Online (Rápido)"é que não existe uma banalização do drama do protagonista por ele ser um adolescente cheio de inseguranças - sua dor e preocupação são tão legitimos quanto o câncer de White. Mesmo se apoiando em assuntos que estamos cansados de assistir, a série usa de um conceito narrativo menos denso, o que transforma temas bastante delicados em alegorias de fácil entendimento. O fato da série ser relativamente curta, cada episódio com cerca de 30 minutos e cada temporada com apenas seis episódios, ajuda muito nessa dinâmica e vai proporcionar um ótimo entretenimento sem tomar muito seu tempo, porém, talvez deixe a sensação que os personagens mereceriam um desenvolvimento mais cuidadoso. De cara, eu posso afirmar tranquilamente que vale a pena - sinceramente, acho que essa série pode te surpreender e, muito em breve, se tornar uma das queridinhas dos assinantes da Netflix se for inteligente o suficiente para não cair no óbvio!
Ao lado da Espanha, a Alemanha talvez seja o país europeu que mais ganhou os holofotes recentemente e que vem entregando ótimos conteúdos - deixando, inclusive, França e Reino Unido para trás. Dito isso, é de se esperar que depois de "Dark" e "Nós somos a Onda", o país trouxesse para um universo um pouco mais lúdico, a seriedade com que desenvolve suas histórias. Essa percepção executiva e criativa vem fazendo muita diferença. Um dos pontos que nos provocava em Breaking Bad e que encontramos em "Como Vender Drogas Online (Rápido)" diz respeito a construção de um mito (mesmo que na forma de anti-herói). O interessante é que para contextualizar essa jornada, os criadores Philipp Käßbohrer e Matthias Murmann, a todo momento, fazem paralelos com empreendedores de sucesso da vida real, deixando claro que existe um padrão para alcançar o sucesso e que se repetido, a chance de funcionar aumenta consideravelmente, mesmo com um produto ilegal. Não é raro, aliás, nomes como Steve Jobs, Elon Musk e Jeff Bezos serem citados para validar uma ou outra atitude dos protagonistas - essas referências trazem uma agradável lembrança de "Silicon Valley" da HBO, inclusive!
Peço licença para repetir a mesma premissa que destaquei em "Good Girls": "Como Vender Drogas Online (Rápido)" é daquele tipo de série onde o protagonista bonzinho vai tomando decisões cada vez mais questionáveis ao longo da sua jornada, cada vez mais distante dos seus valores e aspectos morais, mas vai gostando da nova vida, da sensação de poder e de pertencimento viciante até que, de repente, está em uma enorme bola de neve de onde não consegue mais sair!" - Dito isso, é possível afirmar que as tramas e sub-tramas vão soar familiares! Acontece que a série apresenta tantos elementos interessantes para serem desenvolvidos que eu chego a duvidar se a escolha por episódios menores foi realmente a melhor - acho que não!
Comandado pelo diretor Arne Feldhusen, a série tem um conceito estético maravilhoso que nos insere no universo da Geração Z com muita elegância. As inserções gráficas para explicar como a tecnologia faz parte do cotidiano dessa geração e como ela interfere na formação social desses jovens, é simplesmente genial - embora auto-explicativo, ter Moritz como narrador e protagonista só facilita o entendimento, além de render ótimas tiradas. Outro elemento visual muito bacana mostra como a droga impacta a vida de um ser humano normal - em uma sequência de cenas excepcionalmente bem editadas (totalmente clipadas), vemos uma pessoa no seu dia a dia que, rapidamente, sofre uma transformação assim que coloca um comprimido da boca. Usando tanto fashfowards quanto flashbacks, além de visualmente interessante, essas cenas ajudam a explicar os efeitos e consequências das drogas que estão sendo vendidas por Moritz e pelo seu sócio Lenny (Danilo Kamber).
Outro ponto que merece ser destacado antes de finalizarmos o review é justamente a qualidade do elenco: tanto Moritz (Maximilian Mundt) quanto Lenny (Danilo Kamber) fogem completamente do estereótipo que costumamos encontrar em séries adolescentes (e aqui estou sendo bastante taxativo). Com excelentes performances, a dupla de protagonistas convencem, cada um apoiado no seu drama particular, sem soar superficial e isso não é nada fácil!
Agora, é claro que beber na fonte de "Breaking Bad" tem seus prós e contras - são inúmeras referências (quase adaptações): como ter um policial dentro de família ou o corte de cabelo do protagonista, mas que funcionam tão bem que soa até original, embora sabemos que não é! "Como Vender Drogas Online (Rápido)" é uma ótima escolha, pela dinâmica da série e pela forma como a história é contada - ela exige da nossa imaginação e até de uma certa abstração da realidade, ao mesmo tempo em que é extremamente real e paupável dentro daquele cenário! Vale muito a pena pela dicotomia inteligente da narrativa e pela diversão que ela nos proporciona!
Se você não assistiu esse filme, assista! Embora "Conexão Escobar" se apoie na premissa do agente infiltrado correndo muito perigo para desmantelar um cartel de tráfico de drogas como em "Sicario - Terra de Ninguém", aqui o foco não está tanto na ação e sim no drama, na relação dos personagens, no planejamento e, principalmente, na construção de laços que colocam, inclusive, os objetivos da missão em dúvida.
O filme acompanha a história real de Robert Mazur (Bryan Cranston), um agente infiltrado sob o disfarce de Bob Musella que trabalha para acabar com a operação de lavagem de dinheiro do cartel de Pablo Escobar a partir da relação do tráfico com bancos panamenhos. Confira o trailer:
Dirigido pelo ótimo Brad Furman (de "City of Lies") e baseado no livro do próprio Robert Mazur, "Conexão Escobar" é um prato cheio para quem gosta de filmes de ação, com elementos de investigação, que vão além do tiroteiro. A forma como o roteiro da (na época) estreante Ellen Furman vai amarrando as histórias dá a exata proporção do que foi a Operação C-Chase e o que ela representou na luta contra o tráfico de drogas durante os anos 80 - que, inclusive, culminou com a queda do Banco de Crédito e Comércio Internacional (BCCI), o sétimo maior banco privado do mundo.
O maior mérito do filme, sem dúvida, é ter Bryan Cranston como protagonista e o sempre divertido e competente John Leguizamo ("Waco") como coadjuvante (o agente Emir Abreu). Para os fãs de "Breaking Bad" é impossível não comparar a performance do ator com o tom que dá aos seus personagens Mazur e Mr. White, mas, principalmente, com a semelhança que vai além dos diálogos para exaltar a jornada moral de cada um! É impressionante como, embora diferentes, o conceito por trás dos personagens é parecido: ambos possuem um vida comum, em diferentes pontos de satisfação (claro), mas claramente aquém do que seus talentos poderiam oferecer, porém quando eles assumem uma segunda identidade, o flerte com a ilegalidade desperta a ambição - justamente o nó que o filme tenta desatar ou, pelo menos, medir o seu valor (a chegada da agente Kathy Ertz de Diane Kruger, personifica esse conflito interno).
"Conexão Escobar" poderia tranquilamente ser um spin-off da série "Narcos" - o que dá uma ótima noção do que você vai encontrar em 120 minutos de filme. Mesmo que a figura mítica de Pablo Escobar seja apenas um detalhe muito bem pontuado na trama, a atmosfera criada é extremante tensa e angustiante para quem assiste. Se a fotografia do diretor Joshua Reis se aproveita do enorme contraste de tons para retratar a diferença entre a vida “infiltrada” e a “verdadeira” de Robert, é na sensibilidade dos atores e na inteligência do roteiro que o filme decola!
Vale muito a pena!
Se você não assistiu esse filme, assista! Embora "Conexão Escobar" se apoie na premissa do agente infiltrado correndo muito perigo para desmantelar um cartel de tráfico de drogas como em "Sicario - Terra de Ninguém", aqui o foco não está tanto na ação e sim no drama, na relação dos personagens, no planejamento e, principalmente, na construção de laços que colocam, inclusive, os objetivos da missão em dúvida.
O filme acompanha a história real de Robert Mazur (Bryan Cranston), um agente infiltrado sob o disfarce de Bob Musella que trabalha para acabar com a operação de lavagem de dinheiro do cartel de Pablo Escobar a partir da relação do tráfico com bancos panamenhos. Confira o trailer:
Dirigido pelo ótimo Brad Furman (de "City of Lies") e baseado no livro do próprio Robert Mazur, "Conexão Escobar" é um prato cheio para quem gosta de filmes de ação, com elementos de investigação, que vão além do tiroteiro. A forma como o roteiro da (na época) estreante Ellen Furman vai amarrando as histórias dá a exata proporção do que foi a Operação C-Chase e o que ela representou na luta contra o tráfico de drogas durante os anos 80 - que, inclusive, culminou com a queda do Banco de Crédito e Comércio Internacional (BCCI), o sétimo maior banco privado do mundo.
O maior mérito do filme, sem dúvida, é ter Bryan Cranston como protagonista e o sempre divertido e competente John Leguizamo ("Waco") como coadjuvante (o agente Emir Abreu). Para os fãs de "Breaking Bad" é impossível não comparar a performance do ator com o tom que dá aos seus personagens Mazur e Mr. White, mas, principalmente, com a semelhança que vai além dos diálogos para exaltar a jornada moral de cada um! É impressionante como, embora diferentes, o conceito por trás dos personagens é parecido: ambos possuem um vida comum, em diferentes pontos de satisfação (claro), mas claramente aquém do que seus talentos poderiam oferecer, porém quando eles assumem uma segunda identidade, o flerte com a ilegalidade desperta a ambição - justamente o nó que o filme tenta desatar ou, pelo menos, medir o seu valor (a chegada da agente Kathy Ertz de Diane Kruger, personifica esse conflito interno).
"Conexão Escobar" poderia tranquilamente ser um spin-off da série "Narcos" - o que dá uma ótima noção do que você vai encontrar em 120 minutos de filme. Mesmo que a figura mítica de Pablo Escobar seja apenas um detalhe muito bem pontuado na trama, a atmosfera criada é extremante tensa e angustiante para quem assiste. Se a fotografia do diretor Joshua Reis se aproveita do enorme contraste de tons para retratar a diferença entre a vida “infiltrada” e a “verdadeira” de Robert, é na sensibilidade dos atores e na inteligência do roteiro que o filme decola!
Vale muito a pena!
"Drive" é um excelente filme de ação carregado de drama, filmado pela lente poética de um grande diretor que em nenhum momento teve a preocupação de se apoiar em elementos narrativos que colocariam a história no lugar comum. "Drive" sem Nicolas Winding Refn ("Demônio de Neon") seria como "Breaking Bad" sem Vince Gilligan!
Na trama, Ryan Gosling é um habilidoso motorista que trabalha como dublê de Hollywood, mas que costuma usar seu talento no volante, pontualmente, dirigindo em fugas de assaltos. Quando ele se vê envolvido emocionalmente com sua vizinha Irene (Carey Mulligan) e com o filho, Benício (Kaden Leos), esse motorista (que propositalmente não tem um nome) tenta salvar a pele do marido dela, Standard (Oscar Isaac), que acaba de sair da prisão, para que eles possam viver em paz e em família, mas, claro, as coisas não saem exatamente como planejado. Confira o trailer (em inglês):
Em inglês,drive não significa apenas dirigir, pilotar, mas também tem uma outra conotação: algo como impulso ou motivação. O personagem de Gosling é justamente um homem movido pela ação nessa dupla interpretação do título original do filme - o interessante é que essa dualidade também brinca com a cadência da história e de como o protagonista se posiciona perante seus desafios - sua introspecção e o silêncio se opõem a velocidade (olha que sensacional) das suas ações de uma forma infinitamente mais lenta que sua principal habilidade exige. Mérito dessa leitura quase poética é do dinamarquês Nicolas Winding Refn, que ganhou o prêmio de Melhor Diretor no Festival de Cannes de 2012 e levou esse filme até a disputa da Palma de Ouro - mesmo com a Academia supreendentemente tendo ignorado "Drive" para o Oscar daquele ano, o indicando apenas em "Edição de Som".
É importante pontuar que o roteiro de "Drive", escrito por Hossein Amini (de "McMafia") a partir da adaptação do livro homônimo de James Sallis, busca expor uma personalidade pacata do protagonista como gatilho para nos conectarmos com sua jornada - é na tentativa de ajudar alguém que nunca esteve ao seu lado, que faz o personagem se transformar pelo meio em que se inseriu ou pelas próprias circunstâncias - e aqui é impossível não lembrar de Gilligan novamente e do seu Walter White. A forma como Winding Refn nos faz experienciar a jornada desse motorista é muito potente - por mais que tenhamos poucas informações sobre ele, estamos sempre ao seu lado, como testemunhas de suas ações e transformações.
A fotografia do talentoso Newton Thomas Sigel (de "Os Suspeitos") traz uma sensação de solidão impressionante, mesmo o filme se passando em Los Angeles. Mais uma vez o diretor brinca com essa dualidade narrativa e é por isso que coloco "Drive" como uma obra de arte, muito mais profundo que a maioria dos filmes de ação, mas sem perder a emoção e a tensão do gênero.
"Drive" merece ser apreciado, no seu tempo, mesmo que ele seja completamente diferente do que se espera de um filme de ação, mas não se engane: ele é muito violento e impactante visualmente - como se fosse um "Tarantino", com aquele esmero artístico e conceitual. Lindo de ver!
Vale muito a pena!
"Drive" é um excelente filme de ação carregado de drama, filmado pela lente poética de um grande diretor que em nenhum momento teve a preocupação de se apoiar em elementos narrativos que colocariam a história no lugar comum. "Drive" sem Nicolas Winding Refn ("Demônio de Neon") seria como "Breaking Bad" sem Vince Gilligan!
Na trama, Ryan Gosling é um habilidoso motorista que trabalha como dublê de Hollywood, mas que costuma usar seu talento no volante, pontualmente, dirigindo em fugas de assaltos. Quando ele se vê envolvido emocionalmente com sua vizinha Irene (Carey Mulligan) e com o filho, Benício (Kaden Leos), esse motorista (que propositalmente não tem um nome) tenta salvar a pele do marido dela, Standard (Oscar Isaac), que acaba de sair da prisão, para que eles possam viver em paz e em família, mas, claro, as coisas não saem exatamente como planejado. Confira o trailer (em inglês):
Em inglês,drive não significa apenas dirigir, pilotar, mas também tem uma outra conotação: algo como impulso ou motivação. O personagem de Gosling é justamente um homem movido pela ação nessa dupla interpretação do título original do filme - o interessante é que essa dualidade também brinca com a cadência da história e de como o protagonista se posiciona perante seus desafios - sua introspecção e o silêncio se opõem a velocidade (olha que sensacional) das suas ações de uma forma infinitamente mais lenta que sua principal habilidade exige. Mérito dessa leitura quase poética é do dinamarquês Nicolas Winding Refn, que ganhou o prêmio de Melhor Diretor no Festival de Cannes de 2012 e levou esse filme até a disputa da Palma de Ouro - mesmo com a Academia supreendentemente tendo ignorado "Drive" para o Oscar daquele ano, o indicando apenas em "Edição de Som".
É importante pontuar que o roteiro de "Drive", escrito por Hossein Amini (de "McMafia") a partir da adaptação do livro homônimo de James Sallis, busca expor uma personalidade pacata do protagonista como gatilho para nos conectarmos com sua jornada - é na tentativa de ajudar alguém que nunca esteve ao seu lado, que faz o personagem se transformar pelo meio em que se inseriu ou pelas próprias circunstâncias - e aqui é impossível não lembrar de Gilligan novamente e do seu Walter White. A forma como Winding Refn nos faz experienciar a jornada desse motorista é muito potente - por mais que tenhamos poucas informações sobre ele, estamos sempre ao seu lado, como testemunhas de suas ações e transformações.
A fotografia do talentoso Newton Thomas Sigel (de "Os Suspeitos") traz uma sensação de solidão impressionante, mesmo o filme se passando em Los Angeles. Mais uma vez o diretor brinca com essa dualidade narrativa e é por isso que coloco "Drive" como uma obra de arte, muito mais profundo que a maioria dos filmes de ação, mas sem perder a emoção e a tensão do gênero.
"Drive" merece ser apreciado, no seu tempo, mesmo que ele seja completamente diferente do que se espera de um filme de ação, mas não se engane: ele é muito violento e impactante visualmente - como se fosse um "Tarantino", com aquele esmero artístico e conceitual. Lindo de ver!
Vale muito a pena!
"El Camino" não é um grande filme! Mas antes que as pessoas me destruam por aqui, deixe-me explicar: os 120 minutos de "El Camino" são, na verdade, um Epílogo de "Breaking Bad", um episódio de final de temporada, daqueles de 2 horas, que nos fazem torcer para que nunca acabe de tão contagiante que a história é! Se você não assistiu toda temporada de "Breaking Bad", a chance de você achar "El Camino" apenas "OK" é grande, mas nós que esperamos anos por um pouco mais do que consideramos uma das melhores séries de todos os tempos, aproveitamos cada frame dessa maravilhosa experiência que o Vince Gilligan nos entregou.
Como o Teaser e o Trailer já anunciavam, o filme gira em torno de um Jesse Pinkman (Aaron Paul) atordoado, logo após fugir do cativeiro (fato que acontece justamente no último episódio da série), tentando reencontrar um caminho para sua vida e deixar todo esse passado para trás! O que me surpreendeu é a jornada de transformação que, mais uma vez, Gilligan foi capaz de construir - mas para entender exatamente o que estou falando será preciso ler nossa análise completa. Para você, que precisa apenas da nossa sugestão temos duas opções: 1- Se assistiu a série inteira, assista o filme agora e agradeça a Netflix por ter nos proporcionado mais duas horas de êxtase. 2- Se não se interessou pela série, mas quer ver mesmo assim, se prepare para duas horas de diversão, mas não espere um filme transformador ou inesquecível!
Se arriscar na construção de um novo capítulo depois de alcançar o "Céu" com um final como o de Breaking Bad, 6 anos depois, é algo que poucos fariam! Vince Gilligan fez; e mesmo depois de 4 temporadas de "Better Call Saul", uma ponta parecia solta: o que teria acontecido com Jesse Pinkman? "El Camino" não só responde essa pergunta, como prova, mais uma vez, que além de louco, Gilligan tem total controle sobre suas idéias e sobre todo um universo que ele construiu! "El Camino" não pode ser visto como uma obra isolada, ele é parte de uma estrutura que nos transporta mais uma vez para o Novo Mexico, mas com uma Albuquerque diferente, menos contrastada, quente; agora ela é mais fria, melancólica, angustiante! Em um mês onde "Coringa" bagunçou a mente de quem assistiu, pela sua profundidade psicológica, Jessie Pinkman assume o mesmo papel em "El Camino" - e aqui vai mais um dica: assistam o resumo antes de começar o filme ou, melhor, assistam os 5 últimos episódios de "Breaking Bad" para ter uma imersão 100% segura!
A trama é simples ao mesmo tempo que complexa: Jesse está escapando em um carro El Camino (ah, Vince Gilligan por favor não pare por aqui!!!) após ter sido libertado por Walter White (Bryan Cranston) do cativeiro onde foi forçado a cozinhar metanfetamina por meses - esse momento é imediatamente depois de tudo que vimos em "Felina", episódio final de "Breaking Bad". Com a polícia atrás, já que ele foi reconhecido como cúmplice de Heisenberg encontrado morto no local da chacina, Pinkman é obrigado a procurar alguns personagens marcantes da série para conseguir algum dinheiro ou ter uma oportunidade de um recomeço - aqui é preciso dizer que alguns flashbacks funcionam melhores que outros, pois em alguns momentos Gilligan parece "roubar no jogo" para explicar uma ação do personagem, mas em outros momentos, mesmo ele "roubando no jogo", temos a impressão que tudo aquilo já tinha sido construído anteriormente de tão orgânico que ficou. Pois bem, toda essa jornada é pontuada com uma fotografia típica de Marshall Adams, parceiro conceitual de Gilligan. Grandes angulares, time-lapses, planos inventivos e inesperados, tudo está ali - como deveria ser!
O roteiro é enxuto, direto e cheio de detalhes como Breaking Bad adorava nos presentear. Agora, Aaron Paul, ou melhor, Jesse Pinkman, se transformando em tudo que ele mais odiava no Walter White e comprovando que o discurso transformador de Heisenberg era, no mínimo, coerente - meu Deus, isso foi genial! O ponto alto do filme! Outro detalhe bacana que merece ser observado é a importância que personagens satélites ganharam - pode até soar como Fan Service, mas não dá para negar que foi mais uma jogada inteligente de Gilligan: Old Joe, Skinny Pete (agora o Teaser faz ainda mais sentido), Badger, Neil e até o Ed - olha, que criatividade a favor da história como um todo! Muito legal!
"El Camino" não pode ser o ponto final. Muito do que você vai encontrar deve aparecer em algum flashfoward de "Better Call Saul" ainda e, quem sabe, em algum outro "filme" ou "série", pois o material, ou melhor, as histórias paralelas parecem ter um força impensável - Pinkman é um exemplo, já que seu personagem não passaria da 1ª temporada de "Breaking Bad". Só torço para que essas surpresas em torno das idéias do Vince Gilligan nunca acabem!!!
Por favor, dê o play e divirta-se com aquela sensação deliciosa de nostalgia temperada com uma espécie de inspiração criativa do mais alto nível!
"El Camino" não é um grande filme! Mas antes que as pessoas me destruam por aqui, deixe-me explicar: os 120 minutos de "El Camino" são, na verdade, um Epílogo de "Breaking Bad", um episódio de final de temporada, daqueles de 2 horas, que nos fazem torcer para que nunca acabe de tão contagiante que a história é! Se você não assistiu toda temporada de "Breaking Bad", a chance de você achar "El Camino" apenas "OK" é grande, mas nós que esperamos anos por um pouco mais do que consideramos uma das melhores séries de todos os tempos, aproveitamos cada frame dessa maravilhosa experiência que o Vince Gilligan nos entregou.
Como o Teaser e o Trailer já anunciavam, o filme gira em torno de um Jesse Pinkman (Aaron Paul) atordoado, logo após fugir do cativeiro (fato que acontece justamente no último episódio da série), tentando reencontrar um caminho para sua vida e deixar todo esse passado para trás! O que me surpreendeu é a jornada de transformação que, mais uma vez, Gilligan foi capaz de construir - mas para entender exatamente o que estou falando será preciso ler nossa análise completa. Para você, que precisa apenas da nossa sugestão temos duas opções: 1- Se assistiu a série inteira, assista o filme agora e agradeça a Netflix por ter nos proporcionado mais duas horas de êxtase. 2- Se não se interessou pela série, mas quer ver mesmo assim, se prepare para duas horas de diversão, mas não espere um filme transformador ou inesquecível!
Se arriscar na construção de um novo capítulo depois de alcançar o "Céu" com um final como o de Breaking Bad, 6 anos depois, é algo que poucos fariam! Vince Gilligan fez; e mesmo depois de 4 temporadas de "Better Call Saul", uma ponta parecia solta: o que teria acontecido com Jesse Pinkman? "El Camino" não só responde essa pergunta, como prova, mais uma vez, que além de louco, Gilligan tem total controle sobre suas idéias e sobre todo um universo que ele construiu! "El Camino" não pode ser visto como uma obra isolada, ele é parte de uma estrutura que nos transporta mais uma vez para o Novo Mexico, mas com uma Albuquerque diferente, menos contrastada, quente; agora ela é mais fria, melancólica, angustiante! Em um mês onde "Coringa" bagunçou a mente de quem assistiu, pela sua profundidade psicológica, Jessie Pinkman assume o mesmo papel em "El Camino" - e aqui vai mais um dica: assistam o resumo antes de começar o filme ou, melhor, assistam os 5 últimos episódios de "Breaking Bad" para ter uma imersão 100% segura!
A trama é simples ao mesmo tempo que complexa: Jesse está escapando em um carro El Camino (ah, Vince Gilligan por favor não pare por aqui!!!) após ter sido libertado por Walter White (Bryan Cranston) do cativeiro onde foi forçado a cozinhar metanfetamina por meses - esse momento é imediatamente depois de tudo que vimos em "Felina", episódio final de "Breaking Bad". Com a polícia atrás, já que ele foi reconhecido como cúmplice de Heisenberg encontrado morto no local da chacina, Pinkman é obrigado a procurar alguns personagens marcantes da série para conseguir algum dinheiro ou ter uma oportunidade de um recomeço - aqui é preciso dizer que alguns flashbacks funcionam melhores que outros, pois em alguns momentos Gilligan parece "roubar no jogo" para explicar uma ação do personagem, mas em outros momentos, mesmo ele "roubando no jogo", temos a impressão que tudo aquilo já tinha sido construído anteriormente de tão orgânico que ficou. Pois bem, toda essa jornada é pontuada com uma fotografia típica de Marshall Adams, parceiro conceitual de Gilligan. Grandes angulares, time-lapses, planos inventivos e inesperados, tudo está ali - como deveria ser!
O roteiro é enxuto, direto e cheio de detalhes como Breaking Bad adorava nos presentear. Agora, Aaron Paul, ou melhor, Jesse Pinkman, se transformando em tudo que ele mais odiava no Walter White e comprovando que o discurso transformador de Heisenberg era, no mínimo, coerente - meu Deus, isso foi genial! O ponto alto do filme! Outro detalhe bacana que merece ser observado é a importância que personagens satélites ganharam - pode até soar como Fan Service, mas não dá para negar que foi mais uma jogada inteligente de Gilligan: Old Joe, Skinny Pete (agora o Teaser faz ainda mais sentido), Badger, Neil e até o Ed - olha, que criatividade a favor da história como um todo! Muito legal!
"El Camino" não pode ser o ponto final. Muito do que você vai encontrar deve aparecer em algum flashfoward de "Better Call Saul" ainda e, quem sabe, em algum outro "filme" ou "série", pois o material, ou melhor, as histórias paralelas parecem ter um força impensável - Pinkman é um exemplo, já que seu personagem não passaria da 1ª temporada de "Breaking Bad". Só torço para que essas surpresas em torno das idéias do Vince Gilligan nunca acabem!!!
Por favor, dê o play e divirta-se com aquela sensação deliciosa de nostalgia temperada com uma espécie de inspiração criativa do mais alto nível!
Uma das coisas mais bacanas que o Vince Gilligan nos ensinou a partir de "Breaking Bad" e "Better Call Saul" é que sempre vão existir bandidos mais bandidos que os bandidos! Embora possa parecer redundante essa afirmação, é esse elemento narrativo (quase tragicômico) que subverte a relação "mocinho e bandido" e nos faz torcer deliberadamente para um personagem com um caráter (e meios), digamos, duvidosos - mesmo que haja uma forte justificativa para algumas de suas atitudes mais extremas e que nos fazem considerar que o errado nem sempre é tão errado se observarmos por um outro ponto de vista! Dito isso, posso afirmar tranquilamente que "Eu me importo" não tem a genialidade (muito menos a profundidade) dos projetos de Gilligan, mas não vai te decepcionar se você gosta do estilo: o filme é muito divertido, bem desenvolvido e com um potencial enorme de virar série - entretenimento puro!
Na história, Marla Grayson (Rosamund Pike) é uma advogada que criou um esquema interessante e completamente antiético: ela escolhe pessoas idosas, arranja um laudo afirmando que tal pessoa é incapaz de cuidar de si ou que está sofrendo de alguma enfermidade grave e então se torna sua guardiã. O golpe ainda contempla a internação do idoso em alguma instituição, privando-o de qualquer tipo de comunicação ou contato com o mundo externo, enquanto negocia todos os bens da curatela para pagar seus honorários. Acontece que uma das suas vitimas, Jennifer Peterson (Dianne Wiest), também está envolvida com o crime organizado e a partir daí a vida de Marla acaba se complicando muito e todo o seu esquema passa a ser apenas um detalhe quando é a sua vida que corre o maior perigo! Confira o trailer:
"I Care a Lot" (título original) já chega com o status da indicação de Rosamund Pike para Melhor Atriz de Comédia no Globo de Ouro 2021 - e aqui já cabe a primeira observação: o filme não é uma comédia, no máximo pode ser classificado como uma Dramédia! De fato alguns elementos são trabalhados sem o peso do realismo, o que nos remete para uma situação quase non-sense, mas crível - o próprio tom estereotipado de Peter Dinklage (o Roman) colabora com isso, mas não ofende nossa inteligência. Digamos que "Ozark"está para as "As Golpistas" da mesma forma que "Breaking Bad" ou "Good Girls" está para "Eu me importo".
O trabalho do jovem diretor J Blakeson (A 5ª Onda) é muito consistente, mesmo sem maiores inovações conceituais, porém seu trabalho com os atores, elevando o tom da interpretação para suavizar o tema discutido e não criar uma espécie de repulsa, é perfeito. A dinâmica narrativa do seu roteiro (sim, ele também escreveu o filme) entrega um bom ritmo e nos dá a sensação de que sempre tem alguma coisa interessante e importante acontecendo. Já o diretor de fotografia Doug Emmett sabe exatamente o que está fazendo, até pela sua experiencia em Togetherness da HBO - ele filma tudo como se fosse um comercial de margarina, bem iluminado, aproveitando as texturas do cenário e do figurino, com cores fortes; o que acaba ressaltando a podridão do ser humano em um mundo aparentemente perfeito (e justo).
"Eu me importo" é quase uma Sessão da Tarde, mas no que ela tem de melhor: entretenimento, ação e até algumas surpresas. O ótimo trabalho de Pike ajuda muito na união de todos esses fatores e justamente por isso, nossa recomendação será infalível se você estiver disposto a se divertir sem ter que pensar muito!
Uma das coisas mais bacanas que o Vince Gilligan nos ensinou a partir de "Breaking Bad" e "Better Call Saul" é que sempre vão existir bandidos mais bandidos que os bandidos! Embora possa parecer redundante essa afirmação, é esse elemento narrativo (quase tragicômico) que subverte a relação "mocinho e bandido" e nos faz torcer deliberadamente para um personagem com um caráter (e meios), digamos, duvidosos - mesmo que haja uma forte justificativa para algumas de suas atitudes mais extremas e que nos fazem considerar que o errado nem sempre é tão errado se observarmos por um outro ponto de vista! Dito isso, posso afirmar tranquilamente que "Eu me importo" não tem a genialidade (muito menos a profundidade) dos projetos de Gilligan, mas não vai te decepcionar se você gosta do estilo: o filme é muito divertido, bem desenvolvido e com um potencial enorme de virar série - entretenimento puro!
Na história, Marla Grayson (Rosamund Pike) é uma advogada que criou um esquema interessante e completamente antiético: ela escolhe pessoas idosas, arranja um laudo afirmando que tal pessoa é incapaz de cuidar de si ou que está sofrendo de alguma enfermidade grave e então se torna sua guardiã. O golpe ainda contempla a internação do idoso em alguma instituição, privando-o de qualquer tipo de comunicação ou contato com o mundo externo, enquanto negocia todos os bens da curatela para pagar seus honorários. Acontece que uma das suas vitimas, Jennifer Peterson (Dianne Wiest), também está envolvida com o crime organizado e a partir daí a vida de Marla acaba se complicando muito e todo o seu esquema passa a ser apenas um detalhe quando é a sua vida que corre o maior perigo! Confira o trailer:
"I Care a Lot" (título original) já chega com o status da indicação de Rosamund Pike para Melhor Atriz de Comédia no Globo de Ouro 2021 - e aqui já cabe a primeira observação: o filme não é uma comédia, no máximo pode ser classificado como uma Dramédia! De fato alguns elementos são trabalhados sem o peso do realismo, o que nos remete para uma situação quase non-sense, mas crível - o próprio tom estereotipado de Peter Dinklage (o Roman) colabora com isso, mas não ofende nossa inteligência. Digamos que "Ozark"está para as "As Golpistas" da mesma forma que "Breaking Bad" ou "Good Girls" está para "Eu me importo".
O trabalho do jovem diretor J Blakeson (A 5ª Onda) é muito consistente, mesmo sem maiores inovações conceituais, porém seu trabalho com os atores, elevando o tom da interpretação para suavizar o tema discutido e não criar uma espécie de repulsa, é perfeito. A dinâmica narrativa do seu roteiro (sim, ele também escreveu o filme) entrega um bom ritmo e nos dá a sensação de que sempre tem alguma coisa interessante e importante acontecendo. Já o diretor de fotografia Doug Emmett sabe exatamente o que está fazendo, até pela sua experiencia em Togetherness da HBO - ele filma tudo como se fosse um comercial de margarina, bem iluminado, aproveitando as texturas do cenário e do figurino, com cores fortes; o que acaba ressaltando a podridão do ser humano em um mundo aparentemente perfeito (e justo).
"Eu me importo" é quase uma Sessão da Tarde, mas no que ela tem de melhor: entretenimento, ação e até algumas surpresas. O ótimo trabalho de Pike ajuda muito na união de todos esses fatores e justamente por isso, nossa recomendação será infalível se você estiver disposto a se divertir sem ter que pensar muito!
Embora a revista Vogue tenha definido "Good Girls" como uma mistura de "Big Little Lies" e "Breaking Bad", eu diria que está mais para "Desperate Housewives" com "Rainhas do Crime" - e isso, por favor, não entendam como demérito, até porque a série de sucesso da NBC, distribuída pela Netflix, é muito (mas muito) divertida! Ela é daquele tipo de série onde o protagonista bonzinho (no caso três protagonistas) vai tomando decisões cada vez mais questionáveis ao longo da sua jornada, cada vez mais distante dos seus valores e aspectos morais, vai gostando da nova vida, da sensação de poder e de pertencimento viciante até que, de repente, está em uma enorme bola de neve de onde não consegue mais sair! Ao adicionar uma passagem importante da sua sinopse: "três mães decidem que o crime é a única opção para salvar suas famílias"; fica impossível não relacionar com Breaking Bad - e faz até sentido, mas, infelizmente, não dá para cobrar mais do que um ou outro elemento narrativo similar!
"Good Girls" acompanha a jornada de três mães de família em um momento onde precisam lidar com questões difíceis em suas vidas. Beth (Christina Hendricks) descobre que está sendo traída pelo marido depois de 20 anos de casada e, para piorar, ele contraiu uma dívida enorme de hipoteca; Ruby (Retta) e o marido Stan (Reno Wilson) não tem condições de bancar o tratamento médico da filha que precisa urgentemente de um transplante de rim; e Annie (Mae Whitman) precisa se resolver com o ex-marido, que luta pela guarda da filha de 11 anos, Sadie (Izzy Stannard).O fato é que as três precisam de muito dinheiro e por isso resolvem assaltar um supermercado local, o problema é que as consequências desta escolha colocam o trio frente a frente com um dos criminosos mais procurados de Detroit. Confira o trailer:
Já pelo trailer é possível reconhecer muito do tom de "Desperate Housewives" na narrativa, e isso não acontece por acaso: Jenna Bans foi roteirista da série. Embora ela entregue com muita competência uma história que desafia o conceito da vida pacata de uma “boa mãe, esposa e dona de casa” ao mesmo tempo em que se constrói uma (ou três) persona completamente estereotipada do empoderamento "custe o que custar" em meio a traições, crimes e vinganças; é explicita a falta que faz a genialidade de um Vince Gilligan no comando - tanto do roteiro, quanto da direção! Eu devorei os 10 primeiros episódios da primeira temporada e tenho certeza que o fã de Breaking Bad vai curtir também, mas não espere a profundidade no desenvolvimento dos personagens (o que é uma pena) e muito menos uma identidade narrativa e visual marcantes - mas disso falaremos mais a frente! Por enquanto é fácil afirmar: "Good Girls" vale muito pela diversão, pelo entretenimento e pela sensação de sentir algumas das angustias que para esse estilo de série é fundamental!
A primeira temporada de "Good Girls" realmente parece uma brincadeira - no melhor sentido da palavra. Embora traga elementos sérios como um assalto a mão armada, ameaças de morte, sequestros, extorsões e até uma tentativa de estupro, o tom escolhido ameniza a tensão visual e nos provoca muito mais por empatia do que por identificação às personagens. Ao se auto-definir como o "Breaking Bad de mulheres", trazemos a referência de um projeto muito bem construído em sua narrativa, principalmente na transformação dos personagens ao longo das temporadas. É claro que ainda é muito cedo para afirmar que "Good Girls" foge desse objetivo, mas quando vemos em um episódio Beth sofrendo como a esposa traída, mãe de quatro filhos e ainda falida, e no outro ela já se comporta como uma rainha do crime, perdemos completamente aquela experiência de julgamento moral que nos convidava à discussão após os episódios de Breaking Bad. Embora Christina Hendricks esteja dando um show, sua personagem sofre com a superficialidade de suas próprias dores. Quando falamos de Retta e Mae Whitman isso fica ainda mais evidente, porém é de se elogiar a química entre as três atrizes e a forma como a história vai unindo suas personagens e seus respectivos dramas.
Michael Weaver, o principal diretor da série, usa da sua experiencia como diretor de fotografia de Pushing Daisies para trazer um pouco de identidade para "Good Girls" - e aqui é preciso admitir: por se tratar de uma série da TV aberta dos EUA, fica muito complicado pesar a mão e assustar a audiência. O próprio "Breaking Bad", que era da TV fechada, foi construindo a sua durante as temporadas e só se tornou uma relevante, lá pela segunda temporada quando sua trama já estava estabelecida e aí o conceito visual passou a fazer parte da história quase como um protagonista! "Good Girls" é muito bem produzida, mas não arrisca!
Para mim, a série foi uma grande surpresa - me diverti muito. Em alguns momentos senti que faltou coragem para colocar a história em outro nível - como, por exemplo, assumir a tensão sexual entre Rio e Beth. Sacrificar um personagem-chave para mover a história em outra direção também seria interessante - imagina se a filha de Ruby morre por não aceitarem o cheque que pagaria o transplante! Não sei se devemos esperar por essa dramaticidade, mesmo que fantasiada de comédia - não acredito que "Good Girls" possa ir por esse caminho, mas achei tão bacana o que assisti até aqui, que vou pagar para ver e acho que você deveria fazer o mesmo. A segunda temporada já está disponível e uma terceira deve ser lançada ainda em 2020.
Vale muito o seu play! Diversão garantida!
Embora a revista Vogue tenha definido "Good Girls" como uma mistura de "Big Little Lies" e "Breaking Bad", eu diria que está mais para "Desperate Housewives" com "Rainhas do Crime" - e isso, por favor, não entendam como demérito, até porque a série de sucesso da NBC, distribuída pela Netflix, é muito (mas muito) divertida! Ela é daquele tipo de série onde o protagonista bonzinho (no caso três protagonistas) vai tomando decisões cada vez mais questionáveis ao longo da sua jornada, cada vez mais distante dos seus valores e aspectos morais, vai gostando da nova vida, da sensação de poder e de pertencimento viciante até que, de repente, está em uma enorme bola de neve de onde não consegue mais sair! Ao adicionar uma passagem importante da sua sinopse: "três mães decidem que o crime é a única opção para salvar suas famílias"; fica impossível não relacionar com Breaking Bad - e faz até sentido, mas, infelizmente, não dá para cobrar mais do que um ou outro elemento narrativo similar!
"Good Girls" acompanha a jornada de três mães de família em um momento onde precisam lidar com questões difíceis em suas vidas. Beth (Christina Hendricks) descobre que está sendo traída pelo marido depois de 20 anos de casada e, para piorar, ele contraiu uma dívida enorme de hipoteca; Ruby (Retta) e o marido Stan (Reno Wilson) não tem condições de bancar o tratamento médico da filha que precisa urgentemente de um transplante de rim; e Annie (Mae Whitman) precisa se resolver com o ex-marido, que luta pela guarda da filha de 11 anos, Sadie (Izzy Stannard).O fato é que as três precisam de muito dinheiro e por isso resolvem assaltar um supermercado local, o problema é que as consequências desta escolha colocam o trio frente a frente com um dos criminosos mais procurados de Detroit. Confira o trailer:
Já pelo trailer é possível reconhecer muito do tom de "Desperate Housewives" na narrativa, e isso não acontece por acaso: Jenna Bans foi roteirista da série. Embora ela entregue com muita competência uma história que desafia o conceito da vida pacata de uma “boa mãe, esposa e dona de casa” ao mesmo tempo em que se constrói uma (ou três) persona completamente estereotipada do empoderamento "custe o que custar" em meio a traições, crimes e vinganças; é explicita a falta que faz a genialidade de um Vince Gilligan no comando - tanto do roteiro, quanto da direção! Eu devorei os 10 primeiros episódios da primeira temporada e tenho certeza que o fã de Breaking Bad vai curtir também, mas não espere a profundidade no desenvolvimento dos personagens (o que é uma pena) e muito menos uma identidade narrativa e visual marcantes - mas disso falaremos mais a frente! Por enquanto é fácil afirmar: "Good Girls" vale muito pela diversão, pelo entretenimento e pela sensação de sentir algumas das angustias que para esse estilo de série é fundamental!
A primeira temporada de "Good Girls" realmente parece uma brincadeira - no melhor sentido da palavra. Embora traga elementos sérios como um assalto a mão armada, ameaças de morte, sequestros, extorsões e até uma tentativa de estupro, o tom escolhido ameniza a tensão visual e nos provoca muito mais por empatia do que por identificação às personagens. Ao se auto-definir como o "Breaking Bad de mulheres", trazemos a referência de um projeto muito bem construído em sua narrativa, principalmente na transformação dos personagens ao longo das temporadas. É claro que ainda é muito cedo para afirmar que "Good Girls" foge desse objetivo, mas quando vemos em um episódio Beth sofrendo como a esposa traída, mãe de quatro filhos e ainda falida, e no outro ela já se comporta como uma rainha do crime, perdemos completamente aquela experiência de julgamento moral que nos convidava à discussão após os episódios de Breaking Bad. Embora Christina Hendricks esteja dando um show, sua personagem sofre com a superficialidade de suas próprias dores. Quando falamos de Retta e Mae Whitman isso fica ainda mais evidente, porém é de se elogiar a química entre as três atrizes e a forma como a história vai unindo suas personagens e seus respectivos dramas.
Michael Weaver, o principal diretor da série, usa da sua experiencia como diretor de fotografia de Pushing Daisies para trazer um pouco de identidade para "Good Girls" - e aqui é preciso admitir: por se tratar de uma série da TV aberta dos EUA, fica muito complicado pesar a mão e assustar a audiência. O próprio "Breaking Bad", que era da TV fechada, foi construindo a sua durante as temporadas e só se tornou uma relevante, lá pela segunda temporada quando sua trama já estava estabelecida e aí o conceito visual passou a fazer parte da história quase como um protagonista! "Good Girls" é muito bem produzida, mas não arrisca!
Para mim, a série foi uma grande surpresa - me diverti muito. Em alguns momentos senti que faltou coragem para colocar a história em outro nível - como, por exemplo, assumir a tensão sexual entre Rio e Beth. Sacrificar um personagem-chave para mover a história em outra direção também seria interessante - imagina se a filha de Ruby morre por não aceitarem o cheque que pagaria o transplante! Não sei se devemos esperar por essa dramaticidade, mesmo que fantasiada de comédia - não acredito que "Good Girls" possa ir por esse caminho, mas achei tão bacana o que assisti até aqui, que vou pagar para ver e acho que você deveria fazer o mesmo. A segunda temporada já está disponível e uma terceira deve ser lançada ainda em 2020.
Vale muito o seu play! Diversão garantida!
Se você está em busca de um bom entretenimento sobre assaltos espetaculares em uma mistura de ação com algum drama, "Ida Red - O Preço da Liberdade" pode ser uma boa pedida - mas te adianto: não se trata de um filme inesquecível, pelo contrário, ele é despretensioso ao ponto de abdicar de pelo menos 30 minutos de história, onde as tramas, subtramas e soluções narrativas certamente seriam melhores desenvolvidas, para ganhar em dinâmica e alguma emoção. Isso faz do filme escrito e dirigido por John Swab (do mediano "One Day as a Lion") honesto em sua proposta, tanto que chegou a ser indicado ao Locarno em 2021, mas é inegável que deixa um gostinho de que poderia ser melhor do que realmente é!
"Ida Red - O Preço da Liberdade", basicamente, acompanha a carreira da criminosa Ida ‘Red’ Walker (Melissa Leo), que luta contra uma doença terminal enquanto cumpre uma pena de 25 anos de prisão em Oklahoma. Sob a tutela de Ida, seu filho, Wyatt Walker (Josh Hartnett) sustenta os negócios da família ao lado de seu tio, Dallas Walker (Frank Grillo), até que um assalto dá errado e o detetive local e cunhado de Wyatt, Bodie Collier (George Carroll), se junta ao agente do FBI Lawrence Twilley (William Forsythe) para tentar rastrear os responsáveis pelo crime - e como é de se imaginar, eles já têm seus suspeitos. Confira o trailer:
Embora o filme se apresente como uma montanha-russa emocional que mergulha nas complexidades das relações familiares e do dilema moral para definir o que é certo, o que é errado e em qual circunstâncias isso pode se misturar, "Ida Red" é mesmo um filme de ação. Certo disso, percebemos que durante os 120 minutos de história, assistimos Swab nos negar alguns eventos importantes da trama e isso faz com que todos aqueles conflitos soem mais superficiais do que eles poderiam ser. Ao recortar o grande arco dramático de uma família amplamente envolvida com o mundo do crime e nos apresentar apenas uma parte desse todo, o diretor assume o risco de que sua audiência não se importe realmente com aqueles personagens - isso me pareceu acontecer, por outro lado não impacta no que ele prioriza como fio condutor.
A direção de John Swab respeita suas próprias escolhas conceituais e sua abordagem habilidosa dessa gramática de gênero ao criar uma atmosfera mais sombria do que tensa, especialmente no prólogo e no final do terceiro ato, onde a ação propriamente dita, nos conduz entre os dramas mais existenciais dos personagens. Essa proposta acaba deixando para o elenco todo ônus da falta de tempo de tela - Melissa Leo talvez seja o maior exemplo disso. Ela oferece uma atuação de tirar o fôlego quando é demandada, incorporando uma Ida Red com presença magnética, mas pouco aproveitada. Josh Hartnett e Frank Grillo, esses sim oferecem performances convincentes sem tanta pressa - a química entre eles é palpável, o que adiciona uma camada extra de autenticidade à história, mas infelizmente, mesmo assim, falta aquela conexão.
A fotografia do Matt Clegg (de "What Doesn't Float") é primorosa ao equilibrar o drama mais íntimo com seus planos fechados e quase sempre estáticos, com a ação mais dinâmica das lentes mais abertas e uma câmera mais nervosa. A escolha de locações e a trilha sonora se combinam com essa dualidade da fotografia para criar um ambiente mais imersivo que faz com que a audiência se sinta parte daquele submundo - uma pena que essas sensações sejam tão esporádicas devido aos gaps do roteiro. Em resumo, "Ida Red - O Preço da Liberdade" diverte mais do que nos impacta, mesmo quando escolhe questionar o real valor da família como instituição inabalável em meio aquele cenário imoral de crimes e redenção. Uma pena que não tenha tido o tempo necessário para unificar esses dois elementos dramáticos, que estão lá, mas que acabaram funcionando mais sozinhos do que juntos.
Se você está em busca de um bom entretenimento sobre assaltos espetaculares em uma mistura de ação com algum drama, "Ida Red - O Preço da Liberdade" pode ser uma boa pedida - mas te adianto: não se trata de um filme inesquecível, pelo contrário, ele é despretensioso ao ponto de abdicar de pelo menos 30 minutos de história, onde as tramas, subtramas e soluções narrativas certamente seriam melhores desenvolvidas, para ganhar em dinâmica e alguma emoção. Isso faz do filme escrito e dirigido por John Swab (do mediano "One Day as a Lion") honesto em sua proposta, tanto que chegou a ser indicado ao Locarno em 2021, mas é inegável que deixa um gostinho de que poderia ser melhor do que realmente é!
"Ida Red - O Preço da Liberdade", basicamente, acompanha a carreira da criminosa Ida ‘Red’ Walker (Melissa Leo), que luta contra uma doença terminal enquanto cumpre uma pena de 25 anos de prisão em Oklahoma. Sob a tutela de Ida, seu filho, Wyatt Walker (Josh Hartnett) sustenta os negócios da família ao lado de seu tio, Dallas Walker (Frank Grillo), até que um assalto dá errado e o detetive local e cunhado de Wyatt, Bodie Collier (George Carroll), se junta ao agente do FBI Lawrence Twilley (William Forsythe) para tentar rastrear os responsáveis pelo crime - e como é de se imaginar, eles já têm seus suspeitos. Confira o trailer:
Embora o filme se apresente como uma montanha-russa emocional que mergulha nas complexidades das relações familiares e do dilema moral para definir o que é certo, o que é errado e em qual circunstâncias isso pode se misturar, "Ida Red" é mesmo um filme de ação. Certo disso, percebemos que durante os 120 minutos de história, assistimos Swab nos negar alguns eventos importantes da trama e isso faz com que todos aqueles conflitos soem mais superficiais do que eles poderiam ser. Ao recortar o grande arco dramático de uma família amplamente envolvida com o mundo do crime e nos apresentar apenas uma parte desse todo, o diretor assume o risco de que sua audiência não se importe realmente com aqueles personagens - isso me pareceu acontecer, por outro lado não impacta no que ele prioriza como fio condutor.
A direção de John Swab respeita suas próprias escolhas conceituais e sua abordagem habilidosa dessa gramática de gênero ao criar uma atmosfera mais sombria do que tensa, especialmente no prólogo e no final do terceiro ato, onde a ação propriamente dita, nos conduz entre os dramas mais existenciais dos personagens. Essa proposta acaba deixando para o elenco todo ônus da falta de tempo de tela - Melissa Leo talvez seja o maior exemplo disso. Ela oferece uma atuação de tirar o fôlego quando é demandada, incorporando uma Ida Red com presença magnética, mas pouco aproveitada. Josh Hartnett e Frank Grillo, esses sim oferecem performances convincentes sem tanta pressa - a química entre eles é palpável, o que adiciona uma camada extra de autenticidade à história, mas infelizmente, mesmo assim, falta aquela conexão.
A fotografia do Matt Clegg (de "What Doesn't Float") é primorosa ao equilibrar o drama mais íntimo com seus planos fechados e quase sempre estáticos, com a ação mais dinâmica das lentes mais abertas e uma câmera mais nervosa. A escolha de locações e a trilha sonora se combinam com essa dualidade da fotografia para criar um ambiente mais imersivo que faz com que a audiência se sinta parte daquele submundo - uma pena que essas sensações sejam tão esporádicas devido aos gaps do roteiro. Em resumo, "Ida Red - O Preço da Liberdade" diverte mais do que nos impacta, mesmo quando escolhe questionar o real valor da família como instituição inabalável em meio aquele cenário imoral de crimes e redenção. Uma pena que não tenha tido o tempo necessário para unificar esses dois elementos dramáticos, que estão lá, mas que acabaram funcionando mais sozinhos do que juntos.
"Jóias Brutas" é sobre o caos que pode se tornar a vida de um ser-humano que está sempre preocupado em ganhar mais dinheiro, no sentido ganancioso da palavra! Aliás, é angustiante como a direção, o roteiro e a montagem trabalham alinhados para provocar essa sensação de caos, de desordem, de desespero! Simplesmente incrível!
O filme acompanha a jornada do joalheiro (e judeu) Howard Ratner (Adam Sandler). Viciado em apostas, e não necessariamente apenas com dinheiro, Ratner está sempre colocando sua própria vida jogo. Assim que consegue uma pedra de opala de mineradores da Etiópia, ele inicia uma série de negociações paralelas com o objetivo de valorizar o artefacto que vai entrar em um leilão em breve. Acontece que Ratner acaba se enrolando e agora precisa quitar algumas dívidas anteriores, para isso, sua única saída são as apostas, cada vez mais arriscadas, envolvendo jogos de basquete e um dos seus principais clientes, o astro do Boston Celtics, Kevin Garnett. Confira o trailer:
Esse é o segundo filme que assisto dos irmãos Benny e Josh Safdie - o primeiro, o excelente, Amor, Drogas e Nova York, uma espécie de "Eu, Christiane F." com um olhar extremamente visceral sobre o relacionamento humano e como o ambiente impacta nesse processo de auto-destruição. O interessante é que "Jóias Brutas" segue esse mesmo conceito narrativo e visual, e fortalece a identidade dos irmãos Safdie como poucas vezes vi na história recente do cinema autoral. Eu já adianto: prestem muita atenção no trabalho desses caras!
Se existiu toda a polêmica pela não indicação do Adam Sandler por "Jóias Brutas", já que essa parecia ser a chance da sua vida como comentamos no blog, é preciso dizer que o filme vai muito além do seu incrível trabalho. Da concepção estética ao roteiro redondinho, passando por uma direção de elenco simplesmente fabulosa - esse filme é daqueles que mexem com nossas sensações e que entrega um final impecável!
Existem alguns elementos nesse filme dos irmão Safdie que podem passar despercebidos para os menos atentos, mas que ajudam a construir todas as sensações que temos enquanto acompanhamos a história. Muito do que sentimos é reflexo de como a ambientação de uma ação nos provoca a refletir, veja: existe um conceito visual frenético, mérito de um trabalho sensacional do fotógrafo Darius Khondji - um daqueles profissionais notáveis que ainda não ganhou um Oscar, mas carrega no currículo obras-primas como "Seven", "Evita", "Okja", "Amor", "Meia-noite em Paris" e por aí vai! Pois bem, alinhado a isso temos um desenho de som fantástico - reparem em como a cidade pulsa (NY é aquilo) e em detalhes simples como o som da botão que abre a porta de segurança da loja, nos causam uma enorme sensação de angústia! Tudo isso com personagens falando todos ao mesmo tempo onde, mais importante do que entende-los, é experimentar aquela desorientação momentânea que a cena propõe!
Seguindo essa linha, a trilha sonora mais tecno traz para "Jóias Brutas" um ar hipnótico, moderno, inovador, tão presente na vida do nova-iorquino! Reparem no desenho da luz negra e no brilho das roupas na cena da boate onde, em determinado momento, tudo desaparece para dar protagonismo ao personagem que interessa na construção do próximo caos: no caso, Demany (LaKeith Stanfield), o responsável por levar clientes ilustres para a joalheria de Ratner. Nessa mesma sequência, sentimos na pele a dor de nunca ser o centro das atenções ou de ter o respeito por ser o que é, e sim por já ter tido algo, quando Howard Ratner se depara com sua "amante gostosa" (Julia Fox) ao lado de alguém supostamente mais em evidência naquele momento! É intenso, real e cruel!
O resumo técnico de "Jóias Brutas" comprova uma das maiores injustiças que a Academia cometeu em 2020 (ao lado de "A Despedida"). Como "Closer", onde o subtexto e as sensações são mais profundos do que exatamente o que vemos na tela, talvez esse filme não se estabeleça como uma unanimidade! Para mim, um dos melhores do ano sem a menor sombra de dúvidas e um convite ao "cinema de gênero com alma". Não se trata de um suspense policial como a Netflix erradamente divulgou, "Jóias Brutas" é sim um drama profundo, auto-destrutivo e caótico, capaz de relativizar a importância da família, da vida e do caráter pela busca de um sonho material e ostensivo que só existe onde pouco se constrói com propósito!
Play, para não se arrepender!
"Jóias Brutas" é sobre o caos que pode se tornar a vida de um ser-humano que está sempre preocupado em ganhar mais dinheiro, no sentido ganancioso da palavra! Aliás, é angustiante como a direção, o roteiro e a montagem trabalham alinhados para provocar essa sensação de caos, de desordem, de desespero! Simplesmente incrível!
O filme acompanha a jornada do joalheiro (e judeu) Howard Ratner (Adam Sandler). Viciado em apostas, e não necessariamente apenas com dinheiro, Ratner está sempre colocando sua própria vida jogo. Assim que consegue uma pedra de opala de mineradores da Etiópia, ele inicia uma série de negociações paralelas com o objetivo de valorizar o artefacto que vai entrar em um leilão em breve. Acontece que Ratner acaba se enrolando e agora precisa quitar algumas dívidas anteriores, para isso, sua única saída são as apostas, cada vez mais arriscadas, envolvendo jogos de basquete e um dos seus principais clientes, o astro do Boston Celtics, Kevin Garnett. Confira o trailer:
Esse é o segundo filme que assisto dos irmãos Benny e Josh Safdie - o primeiro, o excelente, Amor, Drogas e Nova York, uma espécie de "Eu, Christiane F." com um olhar extremamente visceral sobre o relacionamento humano e como o ambiente impacta nesse processo de auto-destruição. O interessante é que "Jóias Brutas" segue esse mesmo conceito narrativo e visual, e fortalece a identidade dos irmãos Safdie como poucas vezes vi na história recente do cinema autoral. Eu já adianto: prestem muita atenção no trabalho desses caras!
Se existiu toda a polêmica pela não indicação do Adam Sandler por "Jóias Brutas", já que essa parecia ser a chance da sua vida como comentamos no blog, é preciso dizer que o filme vai muito além do seu incrível trabalho. Da concepção estética ao roteiro redondinho, passando por uma direção de elenco simplesmente fabulosa - esse filme é daqueles que mexem com nossas sensações e que entrega um final impecável!
Existem alguns elementos nesse filme dos irmão Safdie que podem passar despercebidos para os menos atentos, mas que ajudam a construir todas as sensações que temos enquanto acompanhamos a história. Muito do que sentimos é reflexo de como a ambientação de uma ação nos provoca a refletir, veja: existe um conceito visual frenético, mérito de um trabalho sensacional do fotógrafo Darius Khondji - um daqueles profissionais notáveis que ainda não ganhou um Oscar, mas carrega no currículo obras-primas como "Seven", "Evita", "Okja", "Amor", "Meia-noite em Paris" e por aí vai! Pois bem, alinhado a isso temos um desenho de som fantástico - reparem em como a cidade pulsa (NY é aquilo) e em detalhes simples como o som da botão que abre a porta de segurança da loja, nos causam uma enorme sensação de angústia! Tudo isso com personagens falando todos ao mesmo tempo onde, mais importante do que entende-los, é experimentar aquela desorientação momentânea que a cena propõe!
Seguindo essa linha, a trilha sonora mais tecno traz para "Jóias Brutas" um ar hipnótico, moderno, inovador, tão presente na vida do nova-iorquino! Reparem no desenho da luz negra e no brilho das roupas na cena da boate onde, em determinado momento, tudo desaparece para dar protagonismo ao personagem que interessa na construção do próximo caos: no caso, Demany (LaKeith Stanfield), o responsável por levar clientes ilustres para a joalheria de Ratner. Nessa mesma sequência, sentimos na pele a dor de nunca ser o centro das atenções ou de ter o respeito por ser o que é, e sim por já ter tido algo, quando Howard Ratner se depara com sua "amante gostosa" (Julia Fox) ao lado de alguém supostamente mais em evidência naquele momento! É intenso, real e cruel!
O resumo técnico de "Jóias Brutas" comprova uma das maiores injustiças que a Academia cometeu em 2020 (ao lado de "A Despedida"). Como "Closer", onde o subtexto e as sensações são mais profundos do que exatamente o que vemos na tela, talvez esse filme não se estabeleça como uma unanimidade! Para mim, um dos melhores do ano sem a menor sombra de dúvidas e um convite ao "cinema de gênero com alma". Não se trata de um suspense policial como a Netflix erradamente divulgou, "Jóias Brutas" é sim um drama profundo, auto-destrutivo e caótico, capaz de relativizar a importância da família, da vida e do caráter pela busca de um sonho material e ostensivo que só existe onde pouco se constrói com propósito!
Play, para não se arrepender!
"Mayor of Kingstown" é excelente e te falo: ela tem uma vibe meio "Ozark" que é muito envolvente! Criada pelo novato Hugh Dillon e pelo "Rock Star" Taylor Sheridan (de "Yellowstone" e "Tulsa King"), "Mayor of Kingstown" é um drama criminal que mergulha profundamente nas entranhas do sistema penitenciário dos Estados Unidos pelo viés de quem está do lado de fora, mas (in)diretamente envolvido com o sistema. Lançada em 2021 pela Paramount+, a série explora temas como poder, corrupção e traição com o enfoque de quem luta pela sobrevivência em uma cidade onde as prisões são o principal ativo financeiro da região. Com uma narrativa realmente sombria e intensa, performances que vão chamar sua atenção e uma direção muito competente, "Mayor of Kingstown" se destaca como um dos melhores entretenimentos do gênero nos últimos tempos. Com uma mistura equilibrada de "Oz" com "The Wire", aqui temos uma visão igualmente implacável e perturbadora da realidade carcerária que vai fazer valer seu play!
A trama acompanha a família McLusky, que há gerações controla a cidade de Kingstown, no Michigan. Liderada por Mike McLusky (Jeremy Renner), a família atua como intermediária entre os presos, as autoridades e as várias facções que operam dentro e fora das prisões. Mike, que assume o papel de "prefeito" informal da cidade após a morte de seu irmão Mitch (Kyle Chandler), tenta manter uma frágil paz em um ambiente onde a violência e a corrupção são onipresentes. Confira o trailer:
Taylor Sheridan e Hugh Dillon (que também estrela na série como Ian), trazem uma abordagem crua e realista à narrativa que faz muita diferença na nossa experiência como audiência. Com um roteiro denso e cheio de camadas interessantes, a série é muito feliz ao explorar as complexas relações de poder e a moralidade, digamos, ambígua dos personagens construindo um entretenimento de altíssima qualidade - mesmo que algumas situações soem absurdas, o contexto mais realista é muito provocador. O time de roteiristas foi capaz de criar uma dinâmica bastante afiada, com diálogos potentes e um enredo que nos mantém engajados através de reviravoltas inesperadas e momentos de alta tensão. Mesmo que inicialmente demore para entendermos a conexão entre histórias e personagens, a série ainda assim se destaca por trazer para os holofotes temas como a injustiça social e a brutalidade policial, além de discutir a natureza cíclica da violência, oferecendo uma crítica incisiva do sistema penitenciário americano.
A direção de um time talentoso de profissionais com passagens por obras relevantes para o gênero como a já citada "The Wire", além de "O Justiceiro", "Mare of Easttown" e "SWAT", é meticulosa, capaz de capturar a brutalidade e a desesperança do sistema prisional com a atmosfera realmente depressiva e caótica das ruas. A série tem uma identidade visual forte, com uma paleta de cores desbotada e uma iluminação que enfatiza a opressão e a deterioração da cidade, criando uma sensação constante de angústia e perigo iminente. Jeremy Renner também entrega uma performance impressionante para compor essa pintura - ele tem uma intensidade e um carisma que sustentam a narrativa. Seu personagem é complexo, um homem endurecido pelas circunstâncias que, apesar de suas ações moralmente questionáveis, luta por um senso de ordem e justiça em um ambiente caótico. Kyle Chandler, embora sua presença na série seja breve, deixa uma marca indelével como Mitch, o irmão mais velho e ex-líder da família. O elenco de apoio, incluindo Dianne Wiest como a matriarca Mariam McLusky e Hugh Dillon como Ian, contribui significativamente para a riqueza da narrativa, oferecendo atuações que são ao mesmo tempo cheia de nuances e impactantes.
"Mayor of Kingstown" segue a abordagem conceitual mais sombria e muitas vezes excessivamente brutal, que para muitos pode soar deprimente ou difícil de assistir, de "Ozark". Além disso, a complexidade da trama e a densidade dos personagens podem ser um desafio para aqueles que preferem narrativas mais diretas e simples, no entanto, para quem está disposto a enfrentar a jornada dos McLusky proposta por Taylor Sheridan e Hugh Dillon, eu garanto: você não vai se arrepender e muito menos conseguir parar de assistir a série!
Vale muito o seu play!
"Mayor of Kingstown" é excelente e te falo: ela tem uma vibe meio "Ozark" que é muito envolvente! Criada pelo novato Hugh Dillon e pelo "Rock Star" Taylor Sheridan (de "Yellowstone" e "Tulsa King"), "Mayor of Kingstown" é um drama criminal que mergulha profundamente nas entranhas do sistema penitenciário dos Estados Unidos pelo viés de quem está do lado de fora, mas (in)diretamente envolvido com o sistema. Lançada em 2021 pela Paramount+, a série explora temas como poder, corrupção e traição com o enfoque de quem luta pela sobrevivência em uma cidade onde as prisões são o principal ativo financeiro da região. Com uma narrativa realmente sombria e intensa, performances que vão chamar sua atenção e uma direção muito competente, "Mayor of Kingstown" se destaca como um dos melhores entretenimentos do gênero nos últimos tempos. Com uma mistura equilibrada de "Oz" com "The Wire", aqui temos uma visão igualmente implacável e perturbadora da realidade carcerária que vai fazer valer seu play!
A trama acompanha a família McLusky, que há gerações controla a cidade de Kingstown, no Michigan. Liderada por Mike McLusky (Jeremy Renner), a família atua como intermediária entre os presos, as autoridades e as várias facções que operam dentro e fora das prisões. Mike, que assume o papel de "prefeito" informal da cidade após a morte de seu irmão Mitch (Kyle Chandler), tenta manter uma frágil paz em um ambiente onde a violência e a corrupção são onipresentes. Confira o trailer:
Taylor Sheridan e Hugh Dillon (que também estrela na série como Ian), trazem uma abordagem crua e realista à narrativa que faz muita diferença na nossa experiência como audiência. Com um roteiro denso e cheio de camadas interessantes, a série é muito feliz ao explorar as complexas relações de poder e a moralidade, digamos, ambígua dos personagens construindo um entretenimento de altíssima qualidade - mesmo que algumas situações soem absurdas, o contexto mais realista é muito provocador. O time de roteiristas foi capaz de criar uma dinâmica bastante afiada, com diálogos potentes e um enredo que nos mantém engajados através de reviravoltas inesperadas e momentos de alta tensão. Mesmo que inicialmente demore para entendermos a conexão entre histórias e personagens, a série ainda assim se destaca por trazer para os holofotes temas como a injustiça social e a brutalidade policial, além de discutir a natureza cíclica da violência, oferecendo uma crítica incisiva do sistema penitenciário americano.
A direção de um time talentoso de profissionais com passagens por obras relevantes para o gênero como a já citada "The Wire", além de "O Justiceiro", "Mare of Easttown" e "SWAT", é meticulosa, capaz de capturar a brutalidade e a desesperança do sistema prisional com a atmosfera realmente depressiva e caótica das ruas. A série tem uma identidade visual forte, com uma paleta de cores desbotada e uma iluminação que enfatiza a opressão e a deterioração da cidade, criando uma sensação constante de angústia e perigo iminente. Jeremy Renner também entrega uma performance impressionante para compor essa pintura - ele tem uma intensidade e um carisma que sustentam a narrativa. Seu personagem é complexo, um homem endurecido pelas circunstâncias que, apesar de suas ações moralmente questionáveis, luta por um senso de ordem e justiça em um ambiente caótico. Kyle Chandler, embora sua presença na série seja breve, deixa uma marca indelével como Mitch, o irmão mais velho e ex-líder da família. O elenco de apoio, incluindo Dianne Wiest como a matriarca Mariam McLusky e Hugh Dillon como Ian, contribui significativamente para a riqueza da narrativa, oferecendo atuações que são ao mesmo tempo cheia de nuances e impactantes.
"Mayor of Kingstown" segue a abordagem conceitual mais sombria e muitas vezes excessivamente brutal, que para muitos pode soar deprimente ou difícil de assistir, de "Ozark". Além disso, a complexidade da trama e a densidade dos personagens podem ser um desafio para aqueles que preferem narrativas mais diretas e simples, no entanto, para quem está disposto a enfrentar a jornada dos McLusky proposta por Taylor Sheridan e Hugh Dillon, eu garanto: você não vai se arrepender e muito menos conseguir parar de assistir a série!
Vale muito o seu play!
Tenho a impressão que se o Vince Gilligan (Breaking Bad) tivesse escrito a série, nossa percepção seria completamente diferente, mas isso eu vou explicar um pouco mais a frente. "Mytho" é uma série francesa, distribuída pela Netflix, que traz para a discussão uma psicopatologia chamada Mitomania. Essa doença é definida como o hábito de mentir ou fantasiar desenfreadamente ou a tendência a narrar extraordinárias aventuras imaginárias como sendo verdadeiras - e é com essa informação que "Mytho" começa a fazer sentido.
Elvira (Marina Hands de "Lady Chatterley") é uma mãe e esposa dedicada, porém vem se sentindo cada dia mais invisível para sua família. Depois de um exame de mamografia ela "resolve" mentir que está com câncer em troca do amor dos três filhos e da atenção do marido ausente que tanto deseja. O problema é que uma mentira nunca vem sozinha e a necessidade de mentir outras vezes para poder sustentar a história original vai criando uma verdadeira bola de neve que influencia não só sua relação familiar, mas também a forma como os outros enxergam sua vida. Não dá para negar que a idéia é boa e, na verdade, a série também não é ruim - embora eu ache que os 6 episódios da primeira temporada sejam bem inconstantes, quase sem identidade!
Eu assisti em uma sentada e não me decepcionei, mas deu para sacar que nem todo mundo vai curtir. "Mytho" tem uma levada quase non-sense e as dinâmicas narrativas lembram muito o texto do Vince Gilligan, mas sem sua genialidade (claro!) e aquela capacidade de amarrar todas as pontas com uma enorme criatividade - e é isso que faz a série derrapar em vários momentos. Olha, eu acho que vale a tentativa, mas se você não gosta de "Better Call Saul" (para não cair no erro de comparar explicitamente com Breaking Bad), não dê o play! Agora, se você se diverte com aquele tipo de texto e está disposto a se aprofundar ou reinterpretar o que assistir, vá sem receio que você pode se surpreender!
Usando "Breaking Bad" como referência, "Mytho" foca na jornada, ou melhor, no processo de transformação da protagonista. Se para Walter White a doença era a contagem regressiva para mudar de vida e deixar sua família tranquila após a sua morte, para Elvira mentir sobre uma grave doença é a única alternativa para, também, melhorar sua vida, só que ela não vai morrer - mas é preciso ter em mente que ela está doente sim, e enxergar suas atitudes com base nessa afirmação muda toda experiência ao assistir a série. Marina Hands entrega uma personagem difícil, que começa frágil, mas que se transforma e ganha força, mesmo sem ter a consciência exata disso. A grande questão é que na série de Gilligan tudo estava muito mais amarrado e a dinâmica narrativa foi construindo um personagem muito mais complexo e sem pressa de entregar seu ápice. Em "Mytho" o roteiro se atropela - é perceptível a necessidade de se mostrar inventivo, mas erra na sua própria pretenção!
O texto é bom, as discussões interessantes, as sub-tramas são excelentes, mas o todo é confuso e sem um conceito narrativo muito definido - em um episódio tem uma sequência musical e em outro um travelling com a protagonista andando em primeiro plano enquanto tudo à sua volta está de frente para trás. Esse tipo de artificio narrativo não faz o menor sentido se não existir uma coerência com o conceito da série - a própria morte da vizinha ainda não foi explicada ou pelo menos como esse fato interfere na história (?). Com isso, os episódios vão passando e vamos ficando inseguros sobre o final que se aproxima, nos dá a sensação de que todos estão perdidos e não é verdade (pelo menos não 100%), porque a história até que caminha bem, tem alguns elementos bem discretos e interessantes (como a forma que Elvira compara sua família com os vizinhos toda manhã), tem um propósito interessante (a dor da transformação das relações - com o tempo e com o cotidiano) e ganha força quando caí a ficha que o problema da protagonista vai muito além "daquela" mentira pontual (afinal, existe uma psicopatologia ali) - eu confesso que cheguei até a achar que a história não se sustentaria, mas ela foi indo até que a entrega do final da temporada funciona bem.
Criada pelo Fabrice Gobert, o mesmo do grande sucesso "Les Revenants", a série é inteligente embora pareça bobinha em vários momentos. O drama do filho gay é bom, do marido adúltero também, da filha rebelde menos e da caçula blogueirinha tem um certo potencial, mas não foi tão bem aproveitado na primeira temporada. Agora, todo elenco merece parabéns; estão todos ótimos e no tom correto em seus conflitos pessoais - gostei! A produção também é muito boa, a fotografia também (uma mistura de "Breaking Bad" com "Desperates Housewives"). O trilha sonora merece destaque; é ela que ajuda a pontuar o momentos mais dramáticos com os momentos mais leves - alguns quase pastelão!
O fato é que só tempo dirá se "Mytho" é uma série que vai deixar saudade. Se as pontas abertas da primeira temporada fizerem algum sentido mais para frente e a jornada de cada um dos personagens se justificar de verdade, é bem possível que a série tenha algum sucesso; pessoalmente dou o benefício da dúvida depois de assistir essa primeira temporada, que vacila, que erra, mas que também traz bons elementos para nos entreter até seu final.
Não é, e imagino que nem será, uma unanimidade, então assista por conta e risco!
Tenho a impressão que se o Vince Gilligan (Breaking Bad) tivesse escrito a série, nossa percepção seria completamente diferente, mas isso eu vou explicar um pouco mais a frente. "Mytho" é uma série francesa, distribuída pela Netflix, que traz para a discussão uma psicopatologia chamada Mitomania. Essa doença é definida como o hábito de mentir ou fantasiar desenfreadamente ou a tendência a narrar extraordinárias aventuras imaginárias como sendo verdadeiras - e é com essa informação que "Mytho" começa a fazer sentido.
Elvira (Marina Hands de "Lady Chatterley") é uma mãe e esposa dedicada, porém vem se sentindo cada dia mais invisível para sua família. Depois de um exame de mamografia ela "resolve" mentir que está com câncer em troca do amor dos três filhos e da atenção do marido ausente que tanto deseja. O problema é que uma mentira nunca vem sozinha e a necessidade de mentir outras vezes para poder sustentar a história original vai criando uma verdadeira bola de neve que influencia não só sua relação familiar, mas também a forma como os outros enxergam sua vida. Não dá para negar que a idéia é boa e, na verdade, a série também não é ruim - embora eu ache que os 6 episódios da primeira temporada sejam bem inconstantes, quase sem identidade!
Eu assisti em uma sentada e não me decepcionei, mas deu para sacar que nem todo mundo vai curtir. "Mytho" tem uma levada quase non-sense e as dinâmicas narrativas lembram muito o texto do Vince Gilligan, mas sem sua genialidade (claro!) e aquela capacidade de amarrar todas as pontas com uma enorme criatividade - e é isso que faz a série derrapar em vários momentos. Olha, eu acho que vale a tentativa, mas se você não gosta de "Better Call Saul" (para não cair no erro de comparar explicitamente com Breaking Bad), não dê o play! Agora, se você se diverte com aquele tipo de texto e está disposto a se aprofundar ou reinterpretar o que assistir, vá sem receio que você pode se surpreender!
Usando "Breaking Bad" como referência, "Mytho" foca na jornada, ou melhor, no processo de transformação da protagonista. Se para Walter White a doença era a contagem regressiva para mudar de vida e deixar sua família tranquila após a sua morte, para Elvira mentir sobre uma grave doença é a única alternativa para, também, melhorar sua vida, só que ela não vai morrer - mas é preciso ter em mente que ela está doente sim, e enxergar suas atitudes com base nessa afirmação muda toda experiência ao assistir a série. Marina Hands entrega uma personagem difícil, que começa frágil, mas que se transforma e ganha força, mesmo sem ter a consciência exata disso. A grande questão é que na série de Gilligan tudo estava muito mais amarrado e a dinâmica narrativa foi construindo um personagem muito mais complexo e sem pressa de entregar seu ápice. Em "Mytho" o roteiro se atropela - é perceptível a necessidade de se mostrar inventivo, mas erra na sua própria pretenção!
O texto é bom, as discussões interessantes, as sub-tramas são excelentes, mas o todo é confuso e sem um conceito narrativo muito definido - em um episódio tem uma sequência musical e em outro um travelling com a protagonista andando em primeiro plano enquanto tudo à sua volta está de frente para trás. Esse tipo de artificio narrativo não faz o menor sentido se não existir uma coerência com o conceito da série - a própria morte da vizinha ainda não foi explicada ou pelo menos como esse fato interfere na história (?). Com isso, os episódios vão passando e vamos ficando inseguros sobre o final que se aproxima, nos dá a sensação de que todos estão perdidos e não é verdade (pelo menos não 100%), porque a história até que caminha bem, tem alguns elementos bem discretos e interessantes (como a forma que Elvira compara sua família com os vizinhos toda manhã), tem um propósito interessante (a dor da transformação das relações - com o tempo e com o cotidiano) e ganha força quando caí a ficha que o problema da protagonista vai muito além "daquela" mentira pontual (afinal, existe uma psicopatologia ali) - eu confesso que cheguei até a achar que a história não se sustentaria, mas ela foi indo até que a entrega do final da temporada funciona bem.
Criada pelo Fabrice Gobert, o mesmo do grande sucesso "Les Revenants", a série é inteligente embora pareça bobinha em vários momentos. O drama do filho gay é bom, do marido adúltero também, da filha rebelde menos e da caçula blogueirinha tem um certo potencial, mas não foi tão bem aproveitado na primeira temporada. Agora, todo elenco merece parabéns; estão todos ótimos e no tom correto em seus conflitos pessoais - gostei! A produção também é muito boa, a fotografia também (uma mistura de "Breaking Bad" com "Desperates Housewives"). O trilha sonora merece destaque; é ela que ajuda a pontuar o momentos mais dramáticos com os momentos mais leves - alguns quase pastelão!
O fato é que só tempo dirá se "Mytho" é uma série que vai deixar saudade. Se as pontas abertas da primeira temporada fizerem algum sentido mais para frente e a jornada de cada um dos personagens se justificar de verdade, é bem possível que a série tenha algum sucesso; pessoalmente dou o benefício da dúvida depois de assistir essa primeira temporada, que vacila, que erra, mas que também traz bons elementos para nos entreter até seu final.
Não é, e imagino que nem será, uma unanimidade, então assista por conta e risco!
Na linha de "Como Vender Drogas Online (Rápido)" e "Clark", para citar só dois exemplos de produções divertidas sobre "até onde a ganância pode nos levar", "O Cheiro do Ouro" chega com seu humor ácido, personagens cativantes e uma trama envolvente que te prende do início ao fim - eu diria que estamos diante de um ótimo entretenimento e só. Dirigido pelo estreante Jérémie Rozan e diferente das referências citadas, o filme não é baseado em uma história real, embora aborde com muita ironia questões relevantes sobre riqueza geracional e desigualdade social, especialmente em cidades pequenas onde o "sobrenome" vale mais do que tudo. A empresa fictícia Breuil & Sons é apresentada como um símbolo universalmente reconhecível de riqueza e poder, independentemente da sua origem ou das dificuldades que seu fundador passou (não é essa a pauta), justamente por isso que a relação entre "mocinho" e "bandido", "certo" ou "errado", movimenta a trama e inevitavelmente nos conecta com o personagem transgressor - ao ponto de torcermos pelo seu sucesso "custe o que custar".
Daniel Sauveur (Raphaël Quenard) é um rapaz comum que trabalha em uma empresa de logística de perfumes de luxo, cercado por aromas inebriantes e preços exorbitantes. Cansado de sua vida medíocre e da exploração dos "Breuil", seus patrões, ele bola um plano audacioso: desviar perfumes caros para vender no mercado negro bem mais barato. Confira o trailer (em francês):
Mesmo fantasiada de um entretenimento despretensioso e divertido, "O Cheiro do Ouro" realmente constrói um universo bastante particular que nos remete muito ao estilo que Vince Gilligan adora imprimir em seus projetos: personagens cheios de camadas, diálogos afiados e aquela critica desconfortável sobre moralidade, narrado por quem tem os seus motivos para agir daquela forma. A direção de Rozan mostra que sabe bem disso e se apoia nessa premissa para, com uma tocada precisa e criativa, transformar uma história simples em algo dinâmico e apaixonante. Veja, ao levantar discussões sobre o papel dos negócios familiares em uma economia local sem outras oportunidades, o diretor mais uma vez brinca com a percepção (quase sempre fantasiosa) de que uma administração familiar só cria uma geração de “ricos preguiçosos” que dependem apenas da herança e de quem trabalha duro para eles para ganhar ainda mais dinheiro.
Dito isso, não espere uma trama que vai te arrancar gargalhadas, mas com certeza ela irá te fazer pensar sobre a razão daquilo tudo não ser uma série que justificaria explorar mais a fundo cada um daqueles personagens - seria incrível e com muito potencial. Ao nos convidar a refletir sobre temas como desigualdade social, ganância e o sonho de uma vida melhor, a jornada de Daniel nos leva a questionar os valores da sociedade moderna e como a busca por meios, digamos, "alternativos", nem parece tão ruim assim. Raphaël Quenard entrega uma performance interessante, imprimindo aquele carisma do jovem cheio de sonhos e disposto a tudo para ter uma vida mais digna - sim, o protagonista tem aquela sagacidade que adoramos acompanhar, mas sem esquecer do toque de melancolia de quem vive na linha tênue entre o sucesso e o fracasso. Essa ganância angustiante está lá e dita o ritmo da trama.
"O Cheiro do Ouro" é um filme que diverte pela sua simplicidade - nada soa rebuscado e é essa a proposta de Rozan que também escreveu o roteiro - sim, esse é mais um exemplo do "jeito Breaking Bad" de subverter os padrões morais da narrativa em pró do bom entretenimento. Funciona!
Vale o seu play!
Na linha de "Como Vender Drogas Online (Rápido)" e "Clark", para citar só dois exemplos de produções divertidas sobre "até onde a ganância pode nos levar", "O Cheiro do Ouro" chega com seu humor ácido, personagens cativantes e uma trama envolvente que te prende do início ao fim - eu diria que estamos diante de um ótimo entretenimento e só. Dirigido pelo estreante Jérémie Rozan e diferente das referências citadas, o filme não é baseado em uma história real, embora aborde com muita ironia questões relevantes sobre riqueza geracional e desigualdade social, especialmente em cidades pequenas onde o "sobrenome" vale mais do que tudo. A empresa fictícia Breuil & Sons é apresentada como um símbolo universalmente reconhecível de riqueza e poder, independentemente da sua origem ou das dificuldades que seu fundador passou (não é essa a pauta), justamente por isso que a relação entre "mocinho" e "bandido", "certo" ou "errado", movimenta a trama e inevitavelmente nos conecta com o personagem transgressor - ao ponto de torcermos pelo seu sucesso "custe o que custar".
Daniel Sauveur (Raphaël Quenard) é um rapaz comum que trabalha em uma empresa de logística de perfumes de luxo, cercado por aromas inebriantes e preços exorbitantes. Cansado de sua vida medíocre e da exploração dos "Breuil", seus patrões, ele bola um plano audacioso: desviar perfumes caros para vender no mercado negro bem mais barato. Confira o trailer (em francês):
Mesmo fantasiada de um entretenimento despretensioso e divertido, "O Cheiro do Ouro" realmente constrói um universo bastante particular que nos remete muito ao estilo que Vince Gilligan adora imprimir em seus projetos: personagens cheios de camadas, diálogos afiados e aquela critica desconfortável sobre moralidade, narrado por quem tem os seus motivos para agir daquela forma. A direção de Rozan mostra que sabe bem disso e se apoia nessa premissa para, com uma tocada precisa e criativa, transformar uma história simples em algo dinâmico e apaixonante. Veja, ao levantar discussões sobre o papel dos negócios familiares em uma economia local sem outras oportunidades, o diretor mais uma vez brinca com a percepção (quase sempre fantasiosa) de que uma administração familiar só cria uma geração de “ricos preguiçosos” que dependem apenas da herança e de quem trabalha duro para eles para ganhar ainda mais dinheiro.
Dito isso, não espere uma trama que vai te arrancar gargalhadas, mas com certeza ela irá te fazer pensar sobre a razão daquilo tudo não ser uma série que justificaria explorar mais a fundo cada um daqueles personagens - seria incrível e com muito potencial. Ao nos convidar a refletir sobre temas como desigualdade social, ganância e o sonho de uma vida melhor, a jornada de Daniel nos leva a questionar os valores da sociedade moderna e como a busca por meios, digamos, "alternativos", nem parece tão ruim assim. Raphaël Quenard entrega uma performance interessante, imprimindo aquele carisma do jovem cheio de sonhos e disposto a tudo para ter uma vida mais digna - sim, o protagonista tem aquela sagacidade que adoramos acompanhar, mas sem esquecer do toque de melancolia de quem vive na linha tênue entre o sucesso e o fracasso. Essa ganância angustiante está lá e dita o ritmo da trama.
"O Cheiro do Ouro" é um filme que diverte pela sua simplicidade - nada soa rebuscado e é essa a proposta de Rozan que também escreveu o roteiro - sim, esse é mais um exemplo do "jeito Breaking Bad" de subverter os padrões morais da narrativa em pró do bom entretenimento. Funciona!
Vale o seu play!
Quando "Ozark" estreou em 2017, rapidamente ela foi definida como o "Breaking Bad da Netflix" ou até mesmo o "Novo Breaking Bad". Claro que as duas séries tem alguns elementos em comum, pontos que convergem narrativamente inclusive, mas o fato é que são séries completamente diferentes e talvez por isso, muita gente não deu o valor que "Ozark" merecia! Se como fã de "Breaking Bad" eu assisto os primeiros episódios de "Ozark", minha expectativa certamente sai abalada, pois esperar que a série da Netflix traga o mood e a cadência que Vince Gilligan imprimiu com maestria, é um erro! "Ozark" não tem elementos visuais (sequer) parecidos, o tom é completamente diferente e a velocidade como a trama é contada é quase oposta - por isso tenho a impressão que essa estratégia de marketing jogou mais contra do que a favor!
Dito isso, eu posso te afirmar sem receio algum: "Ozark" é tão espetacular quanto "Breaking Bad" e o tempo está ajudando a provar essa tese - mas olha, são séries diferentes, repito! Marty Byrde (Jason Bateman), um consultor financeiro honesto e cheio de princípios, acaba se envolvendo em um grande esquema de lavagem de dinheiro depois de descobrir um rombo nas contas de um potencial cliente que a principio dizia vender cerâmicas. A "pedido" desse mesmo cliente, mas já sabendo onde estava se metendo, Marty transforma sua empresa na fachada ideal para realizar os serviços que o narcotraficante Del (Esai Morales) precisava para manter seu dinheiro girando. Porém, o sócio de firma e melhor amigo, Bruce Liddell (Josh Randall), tenta roubar Del, mas acaba sendo descoberto e é cruelmente executado. Marty, mesmo muito abalado, consegue salvar a própria vida, prometendo para Del pagar a dívida do amigo e ainda dizendo que será capaz de lavar muito mais dinheiro se puder mudar com a família para o lago de Ozark, lugar que atrai diversos turistas no verão. Ao lado da esposa Wendy (Laura Linney) e dos filhos Charlotte (Sofia Hublitz) e Jonah (Skylar Gaertner), Marty chega em Ozark e não demora para perceber que, naquele lugar, sua missão não será tão fácil como imaginava. Confira o trailer:
Eu achei a primeira temporada quase perfeita e digo "quase" porque em dois momentos-chaves, "Ozark" não teve a coragem de bancar um caminho menos óbvio que ela mesmo estava insinuando ser o correto e que, tranquilamente, nos apunhalaria o coração sem dó, mas também nos tiraria completamente da zona de conforto e colocaria "Ozark" num patamar que poucas séries alcançaram - são cenas angustiantes, isso de fato não se perdeu, mas por alguns segundos foi possível imaginar que poderíamos estar diante de algo tão improvável como "Game of Thrones", por exemplo! Pois bem, fora essas duas escolhas duvidosas e uma ou outra distração (principalmente envolvendo a filha adolescente do casal), a série entrega um excelente entretenimento, focado em personagens incríveis e com roteiros primorosos (mas sobre isso comentarei mais abaixo). O fato é que "Ozark" é, sim, imperdível e se você, como eu, deixou para depois, largue tudo, pois a jornada de Marty Byrde é tão tensa quanto a de Walter White, porém com menos alegorias visuais e muito mais sombria, próxima de uma realidade (mesmo que absurda) como na primeira temporada de "Bloodline"!
Saber que o protagonista é um homem bom, mas que acaba comprometido em situações cada vez mais complicadas envolvendo drogas, poder e dinheiro, parece ser a receita ideal para que uma série nos prenda durante 10 episódios de uma hora por temporada - e "Ozark" terá apenas 4, informação já confirmada pela própria Netflix. Estamos diante de um estudo sobre a índole humana em diversos níveis - sem dúvida essa é uma ótima definição para a série. Esse impacto do "meio" em que os personagens estão inseridos e como isso reflete em suas ações, nos passa a impressão que estamos sempre por um fio de presenciar uma verdadeira catástrofe e os criadores de "Ozark", Bill Dubuque e Mark Williams, parecem se divertir com isso.
A questão é que não só Marty Byrde parece estar cada vez mais enrolado, como todos que o rodeiam também estão. Ruth Langmore (a premiada Julia Garner) é um ótimo exemplo: mesmo focada em se dar bem na vida, ela é uma personagem completamente perdida, sem base alguma para se apoiar ou buscar orientações, e isso é tão bem escrito e interpretado que a todo momento duvidamos do que ela seria capaz de fazer, não pela falta de caráter, mas pela necessidade de esconder sua fragilidade e ter que provar para o pai (que está preso) que é tão forte quanto ele. As cenas em que ela se relaciona com a família de Byrde é de cortar o coração - reparem como esse contraponto mexe com todos!
Aquela dinâmica social de Florida Keys que vimos em "Bloodline" é praticamente a mesma em "Ozark", mas com o agravante "caipira" da região - e quando esse agravante é confrontado, os resultados são surpreendentes (lembrem disso no último episódio da primeira temporada). Os personagens Jacob Snell (Peter Mullan) e, principalmente, sua mulher Darlene Snell (Lisa Emery) são muito bem construídos, mas representam um lado quase macabro da impulsividade! Buddy Dieker (Harris Yulin) e Russ Langmore (Marc Menchaca) são outros dois grandes personagens que merecem destaque - o primeiro, inclusive, deve ter ainda mais força na segunda temporada!
Olha, "Ozark" tem um roteiro excelente, uma direção bastante competente e um elenco acima da média! É violenta, nos provoca em cada episódio uma certa discussão sobre moralidade sem nos influenciar ou deixar claro o que é certo e o que é errado - e isso é viciante! Sério, não deixem de assistir a série, vale muito a pena mesmo!!!
Ah, reparem nos símbolos que aparecem dentro do "O" (de Ozark) no início de cada episódio - são representações gráficas dos rumos que a história vai tomar a partir dali! Instiga logo de cara e de uma maneira muito inteligente!
Quando "Ozark" estreou em 2017, rapidamente ela foi definida como o "Breaking Bad da Netflix" ou até mesmo o "Novo Breaking Bad". Claro que as duas séries tem alguns elementos em comum, pontos que convergem narrativamente inclusive, mas o fato é que são séries completamente diferentes e talvez por isso, muita gente não deu o valor que "Ozark" merecia! Se como fã de "Breaking Bad" eu assisto os primeiros episódios de "Ozark", minha expectativa certamente sai abalada, pois esperar que a série da Netflix traga o mood e a cadência que Vince Gilligan imprimiu com maestria, é um erro! "Ozark" não tem elementos visuais (sequer) parecidos, o tom é completamente diferente e a velocidade como a trama é contada é quase oposta - por isso tenho a impressão que essa estratégia de marketing jogou mais contra do que a favor!
Dito isso, eu posso te afirmar sem receio algum: "Ozark" é tão espetacular quanto "Breaking Bad" e o tempo está ajudando a provar essa tese - mas olha, são séries diferentes, repito! Marty Byrde (Jason Bateman), um consultor financeiro honesto e cheio de princípios, acaba se envolvendo em um grande esquema de lavagem de dinheiro depois de descobrir um rombo nas contas de um potencial cliente que a principio dizia vender cerâmicas. A "pedido" desse mesmo cliente, mas já sabendo onde estava se metendo, Marty transforma sua empresa na fachada ideal para realizar os serviços que o narcotraficante Del (Esai Morales) precisava para manter seu dinheiro girando. Porém, o sócio de firma e melhor amigo, Bruce Liddell (Josh Randall), tenta roubar Del, mas acaba sendo descoberto e é cruelmente executado. Marty, mesmo muito abalado, consegue salvar a própria vida, prometendo para Del pagar a dívida do amigo e ainda dizendo que será capaz de lavar muito mais dinheiro se puder mudar com a família para o lago de Ozark, lugar que atrai diversos turistas no verão. Ao lado da esposa Wendy (Laura Linney) e dos filhos Charlotte (Sofia Hublitz) e Jonah (Skylar Gaertner), Marty chega em Ozark e não demora para perceber que, naquele lugar, sua missão não será tão fácil como imaginava. Confira o trailer:
Eu achei a primeira temporada quase perfeita e digo "quase" porque em dois momentos-chaves, "Ozark" não teve a coragem de bancar um caminho menos óbvio que ela mesmo estava insinuando ser o correto e que, tranquilamente, nos apunhalaria o coração sem dó, mas também nos tiraria completamente da zona de conforto e colocaria "Ozark" num patamar que poucas séries alcançaram - são cenas angustiantes, isso de fato não se perdeu, mas por alguns segundos foi possível imaginar que poderíamos estar diante de algo tão improvável como "Game of Thrones", por exemplo! Pois bem, fora essas duas escolhas duvidosas e uma ou outra distração (principalmente envolvendo a filha adolescente do casal), a série entrega um excelente entretenimento, focado em personagens incríveis e com roteiros primorosos (mas sobre isso comentarei mais abaixo). O fato é que "Ozark" é, sim, imperdível e se você, como eu, deixou para depois, largue tudo, pois a jornada de Marty Byrde é tão tensa quanto a de Walter White, porém com menos alegorias visuais e muito mais sombria, próxima de uma realidade (mesmo que absurda) como na primeira temporada de "Bloodline"!
Saber que o protagonista é um homem bom, mas que acaba comprometido em situações cada vez mais complicadas envolvendo drogas, poder e dinheiro, parece ser a receita ideal para que uma série nos prenda durante 10 episódios de uma hora por temporada - e "Ozark" terá apenas 4, informação já confirmada pela própria Netflix. Estamos diante de um estudo sobre a índole humana em diversos níveis - sem dúvida essa é uma ótima definição para a série. Esse impacto do "meio" em que os personagens estão inseridos e como isso reflete em suas ações, nos passa a impressão que estamos sempre por um fio de presenciar uma verdadeira catástrofe e os criadores de "Ozark", Bill Dubuque e Mark Williams, parecem se divertir com isso.
A questão é que não só Marty Byrde parece estar cada vez mais enrolado, como todos que o rodeiam também estão. Ruth Langmore (a premiada Julia Garner) é um ótimo exemplo: mesmo focada em se dar bem na vida, ela é uma personagem completamente perdida, sem base alguma para se apoiar ou buscar orientações, e isso é tão bem escrito e interpretado que a todo momento duvidamos do que ela seria capaz de fazer, não pela falta de caráter, mas pela necessidade de esconder sua fragilidade e ter que provar para o pai (que está preso) que é tão forte quanto ele. As cenas em que ela se relaciona com a família de Byrde é de cortar o coração - reparem como esse contraponto mexe com todos!
Aquela dinâmica social de Florida Keys que vimos em "Bloodline" é praticamente a mesma em "Ozark", mas com o agravante "caipira" da região - e quando esse agravante é confrontado, os resultados são surpreendentes (lembrem disso no último episódio da primeira temporada). Os personagens Jacob Snell (Peter Mullan) e, principalmente, sua mulher Darlene Snell (Lisa Emery) são muito bem construídos, mas representam um lado quase macabro da impulsividade! Buddy Dieker (Harris Yulin) e Russ Langmore (Marc Menchaca) são outros dois grandes personagens que merecem destaque - o primeiro, inclusive, deve ter ainda mais força na segunda temporada!
Olha, "Ozark" tem um roteiro excelente, uma direção bastante competente e um elenco acima da média! É violenta, nos provoca em cada episódio uma certa discussão sobre moralidade sem nos influenciar ou deixar claro o que é certo e o que é errado - e isso é viciante! Sério, não deixem de assistir a série, vale muito a pena mesmo!!!
Ah, reparem nos símbolos que aparecem dentro do "O" (de Ozark) no início de cada episódio - são representações gráficas dos rumos que a história vai tomar a partir dali! Instiga logo de cara e de uma maneira muito inteligente!
"Physical", série de 10 episódios da AppleTV+, é surpreendente desde o primeiro episódio, mas te garanto: assim que você entender o conceito narrativo e a forma como a história foi desenvolvida (e como os personagens se relacionam com ela), fica ainda mais claro que se trata de um produto com um requinte raro, inteligente ao mesmo tempo que é "desagradável" - como foi "Breaking Bad", por exemplo. Meu conselho então, é para que você não se guie apenas pelo primeiro episódio, pois não vai dar tempo de entender a dinâmica da série e assim se preparar para um drama extremamente profundo que será apresentado nos demais episódios que, aliás, vai tocar em assuntos bem desconfortáveis, duros e incômodos; mas que ao mesmo tempo vai chegar embrulhado em uma atmosfera nostálgica, colorida e, principalmente, irônica - e é isso que faz de "Physical" genial!
A série acompanha Sheila Rubin (Rose Byrne), uma típica dona de casa atormentada por suas escolhas, em uma San Diego cruel dos anos 80. Uma mulher que luta diariamente contra seus demônios pessoais - inclusive exteriorizado por um distúrbio alimentar gravíssimo, enquanto seu marido, Danny Rubin (Rory Scovel), um professor desempregado, ativista e muitas vezes machista, tenta se dar bem na carreira politica. Sheila busca se reencontrar como mulher e as coisas começam a mudar drasticamente quando ela descobre a aeróbica, mergulhando assim em uma jornada de empoderamento e de sucesso profissional. Confira o trailer:
Além de um conceito visual muito interessante, como comentei, "Physical" traz no seu DNA "elementos de transformação de personagem" que foram muito explorados em "Breaking Bad" por anos e que depois acabou virando uma marca registrada do Vince Gilligan, sendo transportada (em diferentes níveis, claro) para o universo feminino em outras duas séries que tem no subtexto irônico e corajoso, sua maior força (e que também merecem nossa atenção): "Good Girls" e "Mytho".
Veja, "Physical" tinha tudo para ser mais uma versão nostálgica dos anos 80 - dessa vez apoiada na febre das fitas VHS contendo exercícios aeróbicos ao melhor estilo "Jane Fonda". Ela também poderia ser um retrato romântico da jornada do herói (ou da heroína, como preferir) na busca pela independência e pelo sucesso muito além da sombra de um marido machista (mesmo fracassado). Tudo isso ainda inserido em um cenário praiano da Costa Oeste americana ao som do pós-disco da era Reagan. Pois bem, "Physical" até tem tudo isso, mas não "só" isso - o que a criadora e showrunner da série, Annie Weisman (Desperate Housewives), nos entrega é um mergulho muito mais profundo em uma história complicada, angustiante e bastante triste, onde as imperfeições do ser humano (maravilhosamente transformadas em uma sinceridade brutal pela "voz" do pensamento da protagonista) simplesmente explodem na tela.
Se Sheila Rubin diz ou age de uma forma, saiba que você nunca será surpreendido por sua motivação real já que essa "voz do pensamento" expõe exatamente todas as suas vontades - e aqui um ponto de originalidade que nos afasta da mesma empatia imediata que tivemos por Walter White, já que Sheila não foi criada para que a audiência torça por ela. Sheila, de fato, tem mais defeitos do que qualidades, mas com o passar do tempo pelo menos, vamos entendendo e até aceitando suas imperfeições. E aqui cabe um rápido, mas pertinente elogio: Rose Byrne está simplesmente fantástica e será nome certo nas premiações a partir de agora!
"Physical" vale por tudo isso e muito mais! A série não se apega a uma narrativa convencional, muito menos chega com o compromisso de ser engraçada (mesmo sendo) - se o trailer te passou isso, fique atento no que não é mostrado e interprete cada diálogo da maneira mais obscura que você conseguir, pois a série vai te provocar a ter essa atitude em todos os episódios da primeira temporada.
Vale muito a pena!
"Physical", série de 10 episódios da AppleTV+, é surpreendente desde o primeiro episódio, mas te garanto: assim que você entender o conceito narrativo e a forma como a história foi desenvolvida (e como os personagens se relacionam com ela), fica ainda mais claro que se trata de um produto com um requinte raro, inteligente ao mesmo tempo que é "desagradável" - como foi "Breaking Bad", por exemplo. Meu conselho então, é para que você não se guie apenas pelo primeiro episódio, pois não vai dar tempo de entender a dinâmica da série e assim se preparar para um drama extremamente profundo que será apresentado nos demais episódios que, aliás, vai tocar em assuntos bem desconfortáveis, duros e incômodos; mas que ao mesmo tempo vai chegar embrulhado em uma atmosfera nostálgica, colorida e, principalmente, irônica - e é isso que faz de "Physical" genial!
A série acompanha Sheila Rubin (Rose Byrne), uma típica dona de casa atormentada por suas escolhas, em uma San Diego cruel dos anos 80. Uma mulher que luta diariamente contra seus demônios pessoais - inclusive exteriorizado por um distúrbio alimentar gravíssimo, enquanto seu marido, Danny Rubin (Rory Scovel), um professor desempregado, ativista e muitas vezes machista, tenta se dar bem na carreira politica. Sheila busca se reencontrar como mulher e as coisas começam a mudar drasticamente quando ela descobre a aeróbica, mergulhando assim em uma jornada de empoderamento e de sucesso profissional. Confira o trailer:
Além de um conceito visual muito interessante, como comentei, "Physical" traz no seu DNA "elementos de transformação de personagem" que foram muito explorados em "Breaking Bad" por anos e que depois acabou virando uma marca registrada do Vince Gilligan, sendo transportada (em diferentes níveis, claro) para o universo feminino em outras duas séries que tem no subtexto irônico e corajoso, sua maior força (e que também merecem nossa atenção): "Good Girls" e "Mytho".
Veja, "Physical" tinha tudo para ser mais uma versão nostálgica dos anos 80 - dessa vez apoiada na febre das fitas VHS contendo exercícios aeróbicos ao melhor estilo "Jane Fonda". Ela também poderia ser um retrato romântico da jornada do herói (ou da heroína, como preferir) na busca pela independência e pelo sucesso muito além da sombra de um marido machista (mesmo fracassado). Tudo isso ainda inserido em um cenário praiano da Costa Oeste americana ao som do pós-disco da era Reagan. Pois bem, "Physical" até tem tudo isso, mas não "só" isso - o que a criadora e showrunner da série, Annie Weisman (Desperate Housewives), nos entrega é um mergulho muito mais profundo em uma história complicada, angustiante e bastante triste, onde as imperfeições do ser humano (maravilhosamente transformadas em uma sinceridade brutal pela "voz" do pensamento da protagonista) simplesmente explodem na tela.
Se Sheila Rubin diz ou age de uma forma, saiba que você nunca será surpreendido por sua motivação real já que essa "voz do pensamento" expõe exatamente todas as suas vontades - e aqui um ponto de originalidade que nos afasta da mesma empatia imediata que tivemos por Walter White, já que Sheila não foi criada para que a audiência torça por ela. Sheila, de fato, tem mais defeitos do que qualidades, mas com o passar do tempo pelo menos, vamos entendendo e até aceitando suas imperfeições. E aqui cabe um rápido, mas pertinente elogio: Rose Byrne está simplesmente fantástica e será nome certo nas premiações a partir de agora!
"Physical" vale por tudo isso e muito mais! A série não se apega a uma narrativa convencional, muito menos chega com o compromisso de ser engraçada (mesmo sendo) - se o trailer te passou isso, fique atento no que não é mostrado e interprete cada diálogo da maneira mais obscura que você conseguir, pois a série vai te provocar a ter essa atitude em todos os episódios da primeira temporada.
Vale muito a pena!
Antes de mais nada é preciso dizer: a série, embora traga muito do humor negro do seu criador Garth Ennis, não é uma adaptação fiel dos quadrinhos, mas nem por isso deve ser renegada ou subestimada. "The Boys" é, sem dúvida, uma das séries mais originais lançadas em 2019 - um prato cheio para a Prime Vídeo mostrar o seu cartão de visita e definitivamente entrar na briga pela aquisição de assinantes em um mercado que está se transformando em uma verdadeira batalha.
"The Boys" narra alguns eventos ocorridos entre 2006 e 2008, em uma Nova York ficcional, onde super-heróis existem, mas que, em sua grande maioria, tiveram seus valores morais corrompidos pela fama, sucesso e exposição. Ao se comportar de forma irresponsável, muitos desses heróis mascaram sua verdadeira personalidade se escondendo atrás do controle (e do marketing) de uma grande Corporação - o que representa uma crítica direta ao mundo das celebridades de hoje, diga-se de passagem. Continuando: após ver sua noiva ser morta por um desses heróis, Hughie Campbell (Jack Quaid) percebe que existe uma verdadeira indústria de influência para encobrir as falhas de caráter desses poderosos agentes de mídia. É preciso dar um fim nessa situação, então Hughie se une ao misterioso Billy Butcher (Karl Urban) e inicia sua bizarra jornada para desmascarar essa enorme mentira.
Uma das coisas mais interessantes que percebi nessa primeira temporada, foram alguns elementos narrativos muito parecidos com aqueles que encontrávamos em Breaking Bad. Está certo que são elementos pontuais, mas que foram essenciais para que a série de Vince Gilligan se tornasse um grande sucesso, pela inovação narrativa e inventividade visual. O primeiro deles é a jornada de transformação de um personagem pacato em um potencial assassino - e se inicio vemos muito de Walter White em Hughie, com o passar dos episódios temos a impressão que seu personagem é muito mais próximo do Jessie, afinal ele está sempre se questionando e sua aproximação com a Annie January (Erin Moriarty), a Starlight, só aumenta sua dúvida sobre estar no caminho certo e es caminho deve ser percorrido com um ressentido Billy Butcher! Outro elemento bastante perceptível está na quebra das barreiras que separavamm os heróis dos bandidos, o certo do errado e até os motivos que justificavam (para quem assiste) algumas ações extremas - é preciso lembrar que em Breaking Bad torcíamos para os bandidos, nos identificávamos com suas motivações e parecia tudo "normal". Mas em "The Boys", quem são os bandidos? E por fim, e não menos importante, é o tom que série trás para seus episódios, é aquele mood quase escrachado, mas que serve para mascarar todos os dramas mais íntimos e pesados de personagens muito bem desenvolvidos, toda a ação (e reação) entre eles e, principalmente, que diminui a importância daqueles momentos mais sanguinários e impactantes da trama (ao melhor estilo Tarantino), quase como uma pintura que choca, mas que já será esquecida ou digerida ao se trocar o foco. Olha, que fique claro que não é uma comparação (é até muito cedo para isso), mas todos esses elementos tiram "The Boys" do lugar comum, basta reparar!
Resumindo: com um roteiro inteligente (cheio de detalhes e referências), uma direção muito competente, uma fotografia bem interessante e um tratamento de cor de muita personalidade - que já criou uma identidade muito particular, um look único e lindo para a série - "The Boys" mostra, para quem assiste, que nada está na tela por acaso e que se mantiver esse mesmo nível em algumas temporadas, pode realmente fazer muito barulho! Com o final da primeira temporada é fácil afirmar que a série está irrepreensível! Vale muito a pena!!!!
Antes de mais nada é preciso dizer: a série, embora traga muito do humor negro do seu criador Garth Ennis, não é uma adaptação fiel dos quadrinhos, mas nem por isso deve ser renegada ou subestimada. "The Boys" é, sem dúvida, uma das séries mais originais lançadas em 2019 - um prato cheio para a Prime Vídeo mostrar o seu cartão de visita e definitivamente entrar na briga pela aquisição de assinantes em um mercado que está se transformando em uma verdadeira batalha.
"The Boys" narra alguns eventos ocorridos entre 2006 e 2008, em uma Nova York ficcional, onde super-heróis existem, mas que, em sua grande maioria, tiveram seus valores morais corrompidos pela fama, sucesso e exposição. Ao se comportar de forma irresponsável, muitos desses heróis mascaram sua verdadeira personalidade se escondendo atrás do controle (e do marketing) de uma grande Corporação - o que representa uma crítica direta ao mundo das celebridades de hoje, diga-se de passagem. Continuando: após ver sua noiva ser morta por um desses heróis, Hughie Campbell (Jack Quaid) percebe que existe uma verdadeira indústria de influência para encobrir as falhas de caráter desses poderosos agentes de mídia. É preciso dar um fim nessa situação, então Hughie se une ao misterioso Billy Butcher (Karl Urban) e inicia sua bizarra jornada para desmascarar essa enorme mentira.
Uma das coisas mais interessantes que percebi nessa primeira temporada, foram alguns elementos narrativos muito parecidos com aqueles que encontrávamos em Breaking Bad. Está certo que são elementos pontuais, mas que foram essenciais para que a série de Vince Gilligan se tornasse um grande sucesso, pela inovação narrativa e inventividade visual. O primeiro deles é a jornada de transformação de um personagem pacato em um potencial assassino - e se inicio vemos muito de Walter White em Hughie, com o passar dos episódios temos a impressão que seu personagem é muito mais próximo do Jessie, afinal ele está sempre se questionando e sua aproximação com a Annie January (Erin Moriarty), a Starlight, só aumenta sua dúvida sobre estar no caminho certo e es caminho deve ser percorrido com um ressentido Billy Butcher! Outro elemento bastante perceptível está na quebra das barreiras que separavamm os heróis dos bandidos, o certo do errado e até os motivos que justificavam (para quem assiste) algumas ações extremas - é preciso lembrar que em Breaking Bad torcíamos para os bandidos, nos identificávamos com suas motivações e parecia tudo "normal". Mas em "The Boys", quem são os bandidos? E por fim, e não menos importante, é o tom que série trás para seus episódios, é aquele mood quase escrachado, mas que serve para mascarar todos os dramas mais íntimos e pesados de personagens muito bem desenvolvidos, toda a ação (e reação) entre eles e, principalmente, que diminui a importância daqueles momentos mais sanguinários e impactantes da trama (ao melhor estilo Tarantino), quase como uma pintura que choca, mas que já será esquecida ou digerida ao se trocar o foco. Olha, que fique claro que não é uma comparação (é até muito cedo para isso), mas todos esses elementos tiram "The Boys" do lugar comum, basta reparar!
Resumindo: com um roteiro inteligente (cheio de detalhes e referências), uma direção muito competente, uma fotografia bem interessante e um tratamento de cor de muita personalidade - que já criou uma identidade muito particular, um look único e lindo para a série - "The Boys" mostra, para quem assiste, que nada está na tela por acaso e que se mantiver esse mesmo nível em algumas temporadas, pode realmente fazer muito barulho! Com o final da primeira temporada é fácil afirmar que a série está irrepreensível! Vale muito a pena!!!!
"The White Lotus" é sensacional! Certamente uma das melhores séries do ano, porém não vai agradar a todos pelas suas escolhas conceituais e narrativas bem particulares - e aqui cabe uma rápida comparação: se você não gostou de "Breaking Bad", é bem possível que você também não goste dessa produção da HBO, pois embora sejam completamente diferentes, alguns elementos muito marcantes na série de Vince Gilligan e que dividiu a opinião da audiência, praticamente explodem na tela em "The White Lotus" como o refinado humor negro inserido em diálogos cheios de profundidade dramática, uma pontuação de moodquase "insuportável" de boa (que em Breaking Bad era visual e aqui é sonoro) e para finalizar, o time entre uma ação e sua consequência que implica em sensações muito incomodas. Mas calma, vou aprofundar melhor isso mais abaixo.
A narrativa, centrada em umresort de luxo no Havaí, acompanha o cotidiano de alguns hóspedes e membros do quadro de funcionários e, à medida que seus problemas se misturam, as tramas se afunilam em um emaranhado de mentiras, ressentimentos e discussões que colocam toda a atmosfera paradisíaca e relaxante em xeque. Nessa primeira temporada temos uma mulher emocionalmente afetada que precisa cumprir o ritual de jogar as cinzas da sua mãe no mar, uma família típica americana completamente desestruturada e um casal em Lua de Mel absolutamente desconectados entre si - o que eles tem em comum: todos são ricos, brancos e estão em posições privilegiadas na sociedade graças a essas características. Confira o trailer:
Primeiro vamos falar do roteiro - genial, mas longe de ser perfeito. Imagino que por algum tipo de estratégia (desnecessária), a série começa já no final de uma semana de férias onde descobrimos que alguém que estava noresort,morreu.Embora isso não impacte em absolutamente nada na experiência de assistir "The White Lotus", acaba até irritando quando nos deparamos com a solução desse "impasse"! Por outro lado, toda jornada se sobressai a partir de um texto muito inspirado que soube equilibrar três elementos essenciais para a construção de uma narrativa tão imersiva: o elenco, a trilha sonora e uma excepcional montagem.
A trilha sonora eclética composta por Cristobal Tapia de Veer (de "Electric Dreams") dita o ritmo sa série e nos traz sensações que uma montagem bem sagaz do Heather Persons ("The Flight Attendant") só amplifica. No meio disso tudo, um elenco sensacional. Destaque para Jennifer Coolidge como a solitária, insegura e cheia de problemas Tanya McQuoid; Steve Zahn, como Markum pai de família liberal e submisso marido de uma alta executiva paranóica e, finalmente, Murray Bartlett como Armond, o gerente do hotel, que enfrentou vícios e que há cinco anos luta para se manter sóbrio.
"The White Lotus" é um excelente entretenimento que mergulha nas diversas camadas dos personagens e que ritmadas por uma condução competente do diretor Mike White ("O Estado das Coisas") faz da crítica social apenas o ponto de partida para discutir uma série de outros assuntos que se fossem enxergados de outra forma, certamente, seriam classificados como "tabu". Eu diria que a série toca fundo no egocentrismo, no conformismo, na falta de noção e percepção de mundo, além é claro, do pessimismo perante uma conturbada essência humana.
Vale muito a pena! Mesmo!
"The White Lotus" é sensacional! Certamente uma das melhores séries do ano, porém não vai agradar a todos pelas suas escolhas conceituais e narrativas bem particulares - e aqui cabe uma rápida comparação: se você não gostou de "Breaking Bad", é bem possível que você também não goste dessa produção da HBO, pois embora sejam completamente diferentes, alguns elementos muito marcantes na série de Vince Gilligan e que dividiu a opinião da audiência, praticamente explodem na tela em "The White Lotus" como o refinado humor negro inserido em diálogos cheios de profundidade dramática, uma pontuação de moodquase "insuportável" de boa (que em Breaking Bad era visual e aqui é sonoro) e para finalizar, o time entre uma ação e sua consequência que implica em sensações muito incomodas. Mas calma, vou aprofundar melhor isso mais abaixo.
A narrativa, centrada em umresort de luxo no Havaí, acompanha o cotidiano de alguns hóspedes e membros do quadro de funcionários e, à medida que seus problemas se misturam, as tramas se afunilam em um emaranhado de mentiras, ressentimentos e discussões que colocam toda a atmosfera paradisíaca e relaxante em xeque. Nessa primeira temporada temos uma mulher emocionalmente afetada que precisa cumprir o ritual de jogar as cinzas da sua mãe no mar, uma família típica americana completamente desestruturada e um casal em Lua de Mel absolutamente desconectados entre si - o que eles tem em comum: todos são ricos, brancos e estão em posições privilegiadas na sociedade graças a essas características. Confira o trailer:
Primeiro vamos falar do roteiro - genial, mas longe de ser perfeito. Imagino que por algum tipo de estratégia (desnecessária), a série começa já no final de uma semana de férias onde descobrimos que alguém que estava noresort,morreu.Embora isso não impacte em absolutamente nada na experiência de assistir "The White Lotus", acaba até irritando quando nos deparamos com a solução desse "impasse"! Por outro lado, toda jornada se sobressai a partir de um texto muito inspirado que soube equilibrar três elementos essenciais para a construção de uma narrativa tão imersiva: o elenco, a trilha sonora e uma excepcional montagem.
A trilha sonora eclética composta por Cristobal Tapia de Veer (de "Electric Dreams") dita o ritmo sa série e nos traz sensações que uma montagem bem sagaz do Heather Persons ("The Flight Attendant") só amplifica. No meio disso tudo, um elenco sensacional. Destaque para Jennifer Coolidge como a solitária, insegura e cheia de problemas Tanya McQuoid; Steve Zahn, como Markum pai de família liberal e submisso marido de uma alta executiva paranóica e, finalmente, Murray Bartlett como Armond, o gerente do hotel, que enfrentou vícios e que há cinco anos luta para se manter sóbrio.
"The White Lotus" é um excelente entretenimento que mergulha nas diversas camadas dos personagens e que ritmadas por uma condução competente do diretor Mike White ("O Estado das Coisas") faz da crítica social apenas o ponto de partida para discutir uma série de outros assuntos que se fossem enxergados de outra forma, certamente, seriam classificados como "tabu". Eu diria que a série toca fundo no egocentrismo, no conformismo, na falta de noção e percepção de mundo, além é claro, do pessimismo perante uma conturbada essência humana.
Vale muito a pena! Mesmo!
Filmaço! Bem na linha do genial "White Lotus", o surpreendente, e indicado ao Oscar 2023, "Triângulo da Tristeza" é uma verdadeira coleção de criticas sociais, políticas e até, com uma certa pitada proposital de hipocrisia, ideológicas. Com uma narrativa muito bem construída, se apoiando em uma sátira fundamentada, o filme que venceu a Palma de Ouro em Cannes em 2022 coloca em uma mesma prateleira as nuances (mesmo que estereotipadas) de uma luta de classes constante com os notáveis prazeres e desprazeres do capitalismo - na mesma linha de "Parasita", mas talvez aqui melhor posicionado quanto sua predileção.
Carl (Harris Dickinson) e Yaya (Charlbi Dean) são dois jovens modelos que acabam sendo convidados para um cruzeiro em um iate de luxo, repleto de milionários que esbanjam auto-confiança e desprezo pelos menos favorecidos. Porém, após uma noite de tormenta e um ataque de piratas, o barco acaba naufragando, deixando os sobreviventes presos numa ilha deserta. É nesse contexto que hierarquia social se inverte, afinal, ali, o dinheiro pouco importa e uma pessoa que sabe como sobreviver nesse local inóspito vira rei. Confira o trailer:
Dirigido e escrito pelo multi-talentoso sueco Ruben Östlund (de "The Square"), "Triângulo da Tristeza" expõe com muita inteligência a fragilidade de uma nova classe de privilegiados que nada se diferencia daquela usualmente criticada por eles mesmos através de suas inúmeras "#", os influencers! A partir de diálogos inteligentes, profundos e irônicos, os personagens vão se contradizendo a cada nova situação que aquele universo proporciona, normalmente de forma bem bem-humorada, mas nem por isso menos impactante - a cena da senhora rica tentando convencer a jovem que trabalha no iate a entrar e relaxar na piscina é tão desconcertante quanto genial e dá o exato tom do filme.
Como nas duas referências citadas, além do roteiro ácido na medida certa, o elenco também se sobressai - na verdade, os personagens são tão bem construídos que os diálogos acabam fluindo de uma maneira muito orgânica, dando a exata sensação que nada ali é por acaso. Veja, se Carl é inseguro, sua namorada, Yaya, é uma modelo famosa que quer mais ser influencer (ou troféu de marido, como ela mesmo diz) mesmo que seu conteúdo consista apenas em selfies mentirosas. O filme ainda apresenta um simpático casal de idosos britânicos cuja fortuna foi conquistada com a venda de armas (e que sobreviveu, vejam só, a taxação de 25% sobre as minas terrestres, campeã de vendas da empresa) e um magnata russo, Dimitry (Zlatko Buric), que cresceu às custas da exploração do Leste Europeu pós-União Soviética, vendendo adubo, e que está aproveitando o cruzeiro junto com sua antiga esposa e sua atual (e claro, mais jovem) namorada.
"Triângulo da Tristeza" tem o mérito de transitar por todas as camadas desse abismo social com a sensibilidade de quem consegue enxergar além do luxo e do dinheiro. O roteiro visivelmente critica uma elite tão cega e presa na sua própria bolha, que nem no choque de realidade é capaz de trazer um pouco de bom senso para o seu modo de se relacionar com o mundo. Mas não se enganem, esse é o tipo do filme onde é necessário um olhar atento aos detalhes, pois é na forma como um hóspede rejeita uma bebida ou como a tripulação se prepara para o cruzeiro pensando exclusivamente na gordas gorjetas, que entendemos perfeitamente como é a "ocasião que faz o ladrão".
Vale muito o seu play!
Ah, em tempo, "Triângulo da Tristeza" foi indicado em 3 categorias: "Melhor Roteiro Original", "Melhor Direção" e "Melhor Filme"!
Filmaço! Bem na linha do genial "White Lotus", o surpreendente, e indicado ao Oscar 2023, "Triângulo da Tristeza" é uma verdadeira coleção de criticas sociais, políticas e até, com uma certa pitada proposital de hipocrisia, ideológicas. Com uma narrativa muito bem construída, se apoiando em uma sátira fundamentada, o filme que venceu a Palma de Ouro em Cannes em 2022 coloca em uma mesma prateleira as nuances (mesmo que estereotipadas) de uma luta de classes constante com os notáveis prazeres e desprazeres do capitalismo - na mesma linha de "Parasita", mas talvez aqui melhor posicionado quanto sua predileção.
Carl (Harris Dickinson) e Yaya (Charlbi Dean) são dois jovens modelos que acabam sendo convidados para um cruzeiro em um iate de luxo, repleto de milionários que esbanjam auto-confiança e desprezo pelos menos favorecidos. Porém, após uma noite de tormenta e um ataque de piratas, o barco acaba naufragando, deixando os sobreviventes presos numa ilha deserta. É nesse contexto que hierarquia social se inverte, afinal, ali, o dinheiro pouco importa e uma pessoa que sabe como sobreviver nesse local inóspito vira rei. Confira o trailer:
Dirigido e escrito pelo multi-talentoso sueco Ruben Östlund (de "The Square"), "Triângulo da Tristeza" expõe com muita inteligência a fragilidade de uma nova classe de privilegiados que nada se diferencia daquela usualmente criticada por eles mesmos através de suas inúmeras "#", os influencers! A partir de diálogos inteligentes, profundos e irônicos, os personagens vão se contradizendo a cada nova situação que aquele universo proporciona, normalmente de forma bem bem-humorada, mas nem por isso menos impactante - a cena da senhora rica tentando convencer a jovem que trabalha no iate a entrar e relaxar na piscina é tão desconcertante quanto genial e dá o exato tom do filme.
Como nas duas referências citadas, além do roteiro ácido na medida certa, o elenco também se sobressai - na verdade, os personagens são tão bem construídos que os diálogos acabam fluindo de uma maneira muito orgânica, dando a exata sensação que nada ali é por acaso. Veja, se Carl é inseguro, sua namorada, Yaya, é uma modelo famosa que quer mais ser influencer (ou troféu de marido, como ela mesmo diz) mesmo que seu conteúdo consista apenas em selfies mentirosas. O filme ainda apresenta um simpático casal de idosos britânicos cuja fortuna foi conquistada com a venda de armas (e que sobreviveu, vejam só, a taxação de 25% sobre as minas terrestres, campeã de vendas da empresa) e um magnata russo, Dimitry (Zlatko Buric), que cresceu às custas da exploração do Leste Europeu pós-União Soviética, vendendo adubo, e que está aproveitando o cruzeiro junto com sua antiga esposa e sua atual (e claro, mais jovem) namorada.
"Triângulo da Tristeza" tem o mérito de transitar por todas as camadas desse abismo social com a sensibilidade de quem consegue enxergar além do luxo e do dinheiro. O roteiro visivelmente critica uma elite tão cega e presa na sua própria bolha, que nem no choque de realidade é capaz de trazer um pouco de bom senso para o seu modo de se relacionar com o mundo. Mas não se enganem, esse é o tipo do filme onde é necessário um olhar atento aos detalhes, pois é na forma como um hóspede rejeita uma bebida ou como a tripulação se prepara para o cruzeiro pensando exclusivamente na gordas gorjetas, que entendemos perfeitamente como é a "ocasião que faz o ladrão".
Vale muito o seu play!
Ah, em tempo, "Triângulo da Tristeza" foi indicado em 3 categorias: "Melhor Roteiro Original", "Melhor Direção" e "Melhor Filme"!