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Julieta

"Julieta" é um filme de Pedro Almodóvar e isso, por si só, já nos prepara pelo que vem pela frente. Porém, Almodóvar vem surpreendendo - se não pela forma, pelo conteúdo. É impressionante como sua identidade como diretor está em cada frame, mas cada vez mais com um certo tom inventivo, agora carregando no drama e na densidade, saindo completamente da sua zona de conforto como roteirista - e vem funcionando.

A premissa é incrivelmente simples, já que o filme acompanha Julieta (Adriana Ugarte e depois Emma Suárez) que, ao longo de três décadas, tenta descobrir por que Antía (Priscilla Delgado e depois Blanca Parés), sua única filha, se afastou dela inesperadamente. Quando Julieta estava prestes a se mudar de Madrid para Portugal, um encontro inesperado a fez mudar de ideia e reviver sua relação como mãe. Ainda na Espanha, ela então começa a escrever uma carta para Antía, contando sua história e como se deu o relacionamento com os homens de sua vida. Confira o trailer:

Baseado em três contos do livro "Fugitiva", da vencedora do Prêmio Nobel Alice Munro, Almodóvar entrega seu talento na construção de uma personagem complexa, cheia de camadas e brilhantemente interpretado pela Emma Suárez - trabalho que lhe garantiu o prêmio Goya (o Oscar Espanhol em 2017). O interessante da performance de Suárez é que sua essência vai muito de encontro ao trabalho que Antônio Banderas teve em "Dor e Glória", onde ambosdesconstroem o personagem para encontrar no passado um sentido para lidar com o presente. Esse mergulho nostálgico, mas doloroso, está em cada detalhe - inclusive na escolha narrativa e na transição lírica que o diretor faz, aproximando o amargo da vida e suas profundas marcas de expressão já nascendo em um rosto jovem e se apoderando da sua versão mais madura.

O roteiro é, de fato, muito inteligente ao juntar as pontas soltas de uma história de vida com uma elegância impressionante. A quebra da linha temporal cria uma dinâmica interessante, conceitualmente pontuada por uma trilha sonora sombria (até over) - quase que antecipando os acontecimentos, mas adicionando sensações e sentimentos que vão da angústia até a culpa, do mistério ao óbvio, mesmo antes de entendermos exatamente o que está acontecendo e para onde a história vai nos guiar - é incrível como Almodóvar tem a capacidade de entregar as situações sem aquela pressa usual e ao mesmo tempo nos provocar curiosidade sem que percamos a paciência.

"Julieta" é na sua essência um filme de relações familiares. Um recorte de sentimentos (bons e ruins) que precisam ser revisitados para que a vida siga seu caminho natural. É um processo de amadurecimento do diretor que troca a ousadia de antes por uma serenidade profunda - sem perder o elemento provocativo das composições visuais e de suas mensagens mais poéticas e abstratas. É um "Almodóvar" - do tipo que o filme poderia ser uma pintura, mas que nos toca profundamente e que encontra na genialidade do diretor uma razão coerente para sua filmografia cada vez mais interiorizada, seja na figura de Julieta, da sua filha ou até do seu pai que repete justamente o mesmo ciclo que ela viveu.

Vale a pena para quem acompanha a carreira do diretor e para quem gosta da profundidade das relações e de como elas nos impactam.

Assista Agora

"Julieta" é um filme de Pedro Almodóvar e isso, por si só, já nos prepara pelo que vem pela frente. Porém, Almodóvar vem surpreendendo - se não pela forma, pelo conteúdo. É impressionante como sua identidade como diretor está em cada frame, mas cada vez mais com um certo tom inventivo, agora carregando no drama e na densidade, saindo completamente da sua zona de conforto como roteirista - e vem funcionando.

A premissa é incrivelmente simples, já que o filme acompanha Julieta (Adriana Ugarte e depois Emma Suárez) que, ao longo de três décadas, tenta descobrir por que Antía (Priscilla Delgado e depois Blanca Parés), sua única filha, se afastou dela inesperadamente. Quando Julieta estava prestes a se mudar de Madrid para Portugal, um encontro inesperado a fez mudar de ideia e reviver sua relação como mãe. Ainda na Espanha, ela então começa a escrever uma carta para Antía, contando sua história e como se deu o relacionamento com os homens de sua vida. Confira o trailer:

Baseado em três contos do livro "Fugitiva", da vencedora do Prêmio Nobel Alice Munro, Almodóvar entrega seu talento na construção de uma personagem complexa, cheia de camadas e brilhantemente interpretado pela Emma Suárez - trabalho que lhe garantiu o prêmio Goya (o Oscar Espanhol em 2017). O interessante da performance de Suárez é que sua essência vai muito de encontro ao trabalho que Antônio Banderas teve em "Dor e Glória", onde ambosdesconstroem o personagem para encontrar no passado um sentido para lidar com o presente. Esse mergulho nostálgico, mas doloroso, está em cada detalhe - inclusive na escolha narrativa e na transição lírica que o diretor faz, aproximando o amargo da vida e suas profundas marcas de expressão já nascendo em um rosto jovem e se apoderando da sua versão mais madura.

O roteiro é, de fato, muito inteligente ao juntar as pontas soltas de uma história de vida com uma elegância impressionante. A quebra da linha temporal cria uma dinâmica interessante, conceitualmente pontuada por uma trilha sonora sombria (até over) - quase que antecipando os acontecimentos, mas adicionando sensações e sentimentos que vão da angústia até a culpa, do mistério ao óbvio, mesmo antes de entendermos exatamente o que está acontecendo e para onde a história vai nos guiar - é incrível como Almodóvar tem a capacidade de entregar as situações sem aquela pressa usual e ao mesmo tempo nos provocar curiosidade sem que percamos a paciência.

"Julieta" é na sua essência um filme de relações familiares. Um recorte de sentimentos (bons e ruins) que precisam ser revisitados para que a vida siga seu caminho natural. É um processo de amadurecimento do diretor que troca a ousadia de antes por uma serenidade profunda - sem perder o elemento provocativo das composições visuais e de suas mensagens mais poéticas e abstratas. É um "Almodóvar" - do tipo que o filme poderia ser uma pintura, mas que nos toca profundamente e que encontra na genialidade do diretor uma razão coerente para sua filmografia cada vez mais interiorizada, seja na figura de Julieta, da sua filha ou até do seu pai que repete justamente o mesmo ciclo que ela viveu.

Vale a pena para quem acompanha a carreira do diretor e para quem gosta da profundidade das relações e de como elas nos impactam.

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Lazzaro Felice

"Lazzaro Felice" é um filme bastante peculiar, principalmente se você embarcar nessa jornada sem a menor expectativa do que vai encontrar. Pode parecer contraditório ler um review sobre o filme ao mesmo tempo que sugiro não se aprofundar na história para escolher o título, mas é isso mesmo que eu proponho nesse texto. Saiba que esse filme italiano de 2018 venceu na categoria "Melhor Roteiro" no Festival de Cannes, "Melhor Filme" no Festival de Chicago e em Rotterdam - onde recebeu a seguinte resenha: "Acreditamos que o "Lazzaro" inspirará um futuro público a ser mais humano e refletir sobre suas experiências e interações diárias".

Pelo trailer já dá para se ter uma ideia de que "Lazzaro Felice" trás um conceito narrativo muito baseado na poesia, na alegoria, o que, certamente, agradará mais o público sensível e disposto a reinterpretar aquilo que assiste na tela, porém é preciso que se diga que o filme da (excelente) diretora italiana Alice Rohrwacher trabalha tão bem as sensações que chega a ser impressionante. "Lazzaro Felice" conta a história de um jovem camponês chamado Lazzaro (Adriano Tardiolo), que por ser tão inocente (e bondoso) acaba sendo explorado por todos da comunidade onde vive, no interior da Itália. Pouco mais de 50 pessoas, entre idosos, crianças e adultos, exercem alguma função para manter o local vivo, embora em condições precárias, essas pessoas sobrevivem como escravos sob as ordens da marquesa Alfonsina De Luna (Nicoletta Braschi) - que acredita que todo e qualquer ser humano deve explorar e ser explorado por alguém, em uma pirâmide social abusiva, hierárquica e viciada em padrões estabelecidos pelo conhecimento e a cultura. Acontece que essa dinâmica acaba sendo desfeita quando a polícia chega na comunidade para investigar o falso sequestro do filho da marquesa e é aí que a história se transforma completamente, transitando entre a fantasia e a realidade de uma forma muito sensível e profunda. Confira o trailer:

"Lazzaro Felice" não vai agradar a todos, isso é um fato, mas se você gostou de "Atlantique" (também na Netflix) é bem provável que se identifique com esse belíssimo filme, pois ele mistura com a mesma eficiência, o drama e o sobrenatural graças a um roteiro muito bem escrito, uma direção extremamente competente e uma fotográfica digna de muitos prêmios! Vale muito a pena - filme independente com carreira consistente em festivais!

Embora o conceito de exploração do mais fraco (defendido pela marquesa) seja o fio condutor de "Lazzaro Felice", é muito curioso a forma como a Rohrwacher usa a figura do protagonista para representar um limite que precisa ser respeitado e que vai nos provocar a reflexão. Estar na base da pirâmide não nos deixa saída, afinal não há em quem se apoiar (ou explorar), porém essa realidade não influencia ou define o caráter de uma pessoa - e o filme usa de vários exemplos, muitos deles apenas em diálogos pontuais ou em ações que parecem despretensiosas, para justificar essa tese. Se uma personagem pode enganar uma pessoa que acabou de ajuda-la só para faturar 30 euros, isso não exime da mesma personagem a escolha de abrir mão de algo quando alguém pede sua ajuda - mesmo que esse "alguém" já tenha mal tratado ela no passado! Essa dualidade do roteiro é explorada a todo momento e ganha ainda mais força quando entendemos a alegoria bíblica que a história se propõe a discutir -  existe um Lázaro descrito na Bíblia e como o personagem do filme, ele é alguém que foi ressuscitado por Jesus e que destoa da fragilidade moral do mundo em que vive. Reparem na cena da igreja e vejam como a diretora, em nenhum momento levanta uma bandeira, seja ela politica ou religiosa, sem mostrar o outro lado ou criticar a distorção pela qual o ser humano se apoia!

Filmado 100% em 16 mm, o que dá um aspecto granulado a imagem e sugere uma certa abstração da realidade, e finalizado com uma margem irregular como se estivéssemos assistindo um filme projetado em um pergaminho, "Lazzaro Felice" é um excelente exemplo de como uma identidade narrativa baseada em um conceito fortemente estabelecido com propósito, funciona a favor da história. Nada que acontece na tela é por acaso - da maneira como o protagonista se movimenta, se comunica ou simplesmente observa uma ação, até os planos abertos enquadrando uma geografia rural que vai se desfazer em um cenário urbano caótico e opressor, um pouco mais a frente. É um grande trabalho da fotógrafa Hélène Louvart (de "A vida invisível" do brasileiro Karim Aïnouz). O elenco também está irretocável: Adriano Tardiolo dá uma aula de neutralidade na interpretação, daquelas que o ator fala com os olhos, com a alma, com o sentimento! Tommaso Ragno como o Tancredi adulto também dá um show, mas quem rouba a cena mesmo é a ótima Alba Rohrwacher como Antonia - que trabalho maravilhoso!

"Lazzaro Felice" é um filme autoral de quem conhece a gramática cinematográfica e sabe exatamente onde quer chegar com aquela história. Um show de roteiro que usa da alegoria para tocar em temas delicados e atuais como as consequências do êxodo rural e do desemprego, a violência contra a mulher, a desigualdade social, o capitalismo predatório, etc. Saiba que não será um jornada fácil, a diretora acerta em não nos entregar as informações de mão beijada, nos sugerindo muito mais do que impondo (com excessão da cena posterior a da igreja, onde a música segue os personagens, que destoa das escolhas acertadas até ali). "Lazzaro Felice" pode causar um certo estranhamento inicial, mas que aos poucos vai se encontrando e, claro, nos deixando com mais dúvidas do que certezas e nos tirando de uma zona de conforto como poucas vezes sentimos - a lembrança que me vem a cabeça, respeitando suas peculiaridades de gênero, é a sensação de assistir "Abre los Ojos" do Alejandro Amenábar pela primeira vez!

Não vacile, dê o play!

Assista Agora

"Lazzaro Felice" é um filme bastante peculiar, principalmente se você embarcar nessa jornada sem a menor expectativa do que vai encontrar. Pode parecer contraditório ler um review sobre o filme ao mesmo tempo que sugiro não se aprofundar na história para escolher o título, mas é isso mesmo que eu proponho nesse texto. Saiba que esse filme italiano de 2018 venceu na categoria "Melhor Roteiro" no Festival de Cannes, "Melhor Filme" no Festival de Chicago e em Rotterdam - onde recebeu a seguinte resenha: "Acreditamos que o "Lazzaro" inspirará um futuro público a ser mais humano e refletir sobre suas experiências e interações diárias".

Pelo trailer já dá para se ter uma ideia de que "Lazzaro Felice" trás um conceito narrativo muito baseado na poesia, na alegoria, o que, certamente, agradará mais o público sensível e disposto a reinterpretar aquilo que assiste na tela, porém é preciso que se diga que o filme da (excelente) diretora italiana Alice Rohrwacher trabalha tão bem as sensações que chega a ser impressionante. "Lazzaro Felice" conta a história de um jovem camponês chamado Lazzaro (Adriano Tardiolo), que por ser tão inocente (e bondoso) acaba sendo explorado por todos da comunidade onde vive, no interior da Itália. Pouco mais de 50 pessoas, entre idosos, crianças e adultos, exercem alguma função para manter o local vivo, embora em condições precárias, essas pessoas sobrevivem como escravos sob as ordens da marquesa Alfonsina De Luna (Nicoletta Braschi) - que acredita que todo e qualquer ser humano deve explorar e ser explorado por alguém, em uma pirâmide social abusiva, hierárquica e viciada em padrões estabelecidos pelo conhecimento e a cultura. Acontece que essa dinâmica acaba sendo desfeita quando a polícia chega na comunidade para investigar o falso sequestro do filho da marquesa e é aí que a história se transforma completamente, transitando entre a fantasia e a realidade de uma forma muito sensível e profunda. Confira o trailer:

"Lazzaro Felice" não vai agradar a todos, isso é um fato, mas se você gostou de "Atlantique" (também na Netflix) é bem provável que se identifique com esse belíssimo filme, pois ele mistura com a mesma eficiência, o drama e o sobrenatural graças a um roteiro muito bem escrito, uma direção extremamente competente e uma fotográfica digna de muitos prêmios! Vale muito a pena - filme independente com carreira consistente em festivais!

Embora o conceito de exploração do mais fraco (defendido pela marquesa) seja o fio condutor de "Lazzaro Felice", é muito curioso a forma como a Rohrwacher usa a figura do protagonista para representar um limite que precisa ser respeitado e que vai nos provocar a reflexão. Estar na base da pirâmide não nos deixa saída, afinal não há em quem se apoiar (ou explorar), porém essa realidade não influencia ou define o caráter de uma pessoa - e o filme usa de vários exemplos, muitos deles apenas em diálogos pontuais ou em ações que parecem despretensiosas, para justificar essa tese. Se uma personagem pode enganar uma pessoa que acabou de ajuda-la só para faturar 30 euros, isso não exime da mesma personagem a escolha de abrir mão de algo quando alguém pede sua ajuda - mesmo que esse "alguém" já tenha mal tratado ela no passado! Essa dualidade do roteiro é explorada a todo momento e ganha ainda mais força quando entendemos a alegoria bíblica que a história se propõe a discutir -  existe um Lázaro descrito na Bíblia e como o personagem do filme, ele é alguém que foi ressuscitado por Jesus e que destoa da fragilidade moral do mundo em que vive. Reparem na cena da igreja e vejam como a diretora, em nenhum momento levanta uma bandeira, seja ela politica ou religiosa, sem mostrar o outro lado ou criticar a distorção pela qual o ser humano se apoia!

Filmado 100% em 16 mm, o que dá um aspecto granulado a imagem e sugere uma certa abstração da realidade, e finalizado com uma margem irregular como se estivéssemos assistindo um filme projetado em um pergaminho, "Lazzaro Felice" é um excelente exemplo de como uma identidade narrativa baseada em um conceito fortemente estabelecido com propósito, funciona a favor da história. Nada que acontece na tela é por acaso - da maneira como o protagonista se movimenta, se comunica ou simplesmente observa uma ação, até os planos abertos enquadrando uma geografia rural que vai se desfazer em um cenário urbano caótico e opressor, um pouco mais a frente. É um grande trabalho da fotógrafa Hélène Louvart (de "A vida invisível" do brasileiro Karim Aïnouz). O elenco também está irretocável: Adriano Tardiolo dá uma aula de neutralidade na interpretação, daquelas que o ator fala com os olhos, com a alma, com o sentimento! Tommaso Ragno como o Tancredi adulto também dá um show, mas quem rouba a cena mesmo é a ótima Alba Rohrwacher como Antonia - que trabalho maravilhoso!

"Lazzaro Felice" é um filme autoral de quem conhece a gramática cinematográfica e sabe exatamente onde quer chegar com aquela história. Um show de roteiro que usa da alegoria para tocar em temas delicados e atuais como as consequências do êxodo rural e do desemprego, a violência contra a mulher, a desigualdade social, o capitalismo predatório, etc. Saiba que não será um jornada fácil, a diretora acerta em não nos entregar as informações de mão beijada, nos sugerindo muito mais do que impondo (com excessão da cena posterior a da igreja, onde a música segue os personagens, que destoa das escolhas acertadas até ali). "Lazzaro Felice" pode causar um certo estranhamento inicial, mas que aos poucos vai se encontrando e, claro, nos deixando com mais dúvidas do que certezas e nos tirando de uma zona de conforto como poucas vezes sentimos - a lembrança que me vem a cabeça, respeitando suas peculiaridades de gênero, é a sensação de assistir "Abre los Ojos" do Alejandro Amenábar pela primeira vez!

Não vacile, dê o play!

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Leviathan

Talvez "Leviathan" tenha sofrido pela falta de um marketing mais potente em uma época onde as plataformas de streaming apenas engatinhavam. O fato é que esse filme foi o representante russo na disputa o Oscar de Melhor Filme Internacional de 2015 e que, embora não tenha levado a Palme d'Or em 2014, ganhou como "Melhor Roteiro" em Cannes, o Golden Globe nos EUA e teve mais de 35 vitórias e 52 indicações em festivais importantes ao redor do planeta! Dirigido pelo Andrey Zvyagintsev (de "Sem Amor"), esse é o tipo do filme que não deve ser ignorado por nenhum cinéfilo que tem no cinema independente sua jornada de descobertas. Eu diria, inclusive, que esse drama russo é uma obra-prima que soube combinar como poucos, uma narrativa poderosa com uma crítica social atemporal extremamente contundente e necessária, criando um retrato visceral e devastador da corrupção e da injustiça que assolam a sociedade desde sempre. Aclamado internacionalmente, "Leviathan" foi comparado a obras inesquecíveis como "A Separação" de Asghar Farhadi e "A Caça" de Thomas Vinterberg, pela sua habilidade única em abordar temas universais através de uma lente profundamente pessoal e culturalmente marcante.

Sua trama gira em torno de Kolya (Aleksey Serebryakov) um homem que vive em uma pequena cidade da Península de Kola, no norte da Rússia. Sua vida é virada de cabeça para baixo quando o prefeito corrupto decide tomar posse de sua casa e do terreno onde vive com sua jovem esposa Lilya (Elena Lyadova) e seu filho Romka (Sergey Pokhodaev). Desesperado, Kolya pede ajuda a Dmitriy (Vladimir Vdovichenkov), um velho amigo e advogado de Moscou, para lutar contra essa injustiça. No entanto, a chegada de advogado não traz a salvação esperada, mas sim uma série de tragédias que afundam Kolya e sua família em um abismo de desespero. Confira o trailer (com legendas em inglês):

Todos sabemos como as coisas são resolvidas na Rússia e isso, por si só, já seria o suficiente para nos dilacerar o coração ao nos conectarmos com a luta de Kolya e de sua família pelo que lhe é de direito, no entanto, inserido nesse elemento realmente dramático, existe uma sensação de abandono que é lindamente dissecada no roteiro do próprio Zvyagintsev com seu parceiro Oleg Negin - primeiro na briga com o prefeito, depois com os magistrados, com a polícia, e então, com os amigos. Veja, ao mesmo tempo que temos um filme de caráter extremamente simbólico, estamos diante da história "real" de uma vida "como tantas outras na Rússia" que é destruída em todos os aspectos pela ganância (e poder).

A direção de Zvyagintsev é magistral ao trabalhar esses aspectos de uma forma muito sensorial, utilizando a vastidão gelada da paisagem russa para refletir o vazio e a implacabilidade do sistema corrupto contra o qual Kolya luta, luta e luta - é dolorido demais, machuca de verdade. A fotografia de Mikhail Krichman (também parceiro de longa data do diretor) tem um papel fundamental na construção dessa atmosfera - eu diria até que ela é uma das jóias do filme! Repare como os planos longos e contemplativos capturam a beleza e a desolação da natureza, criando um contraste com o embate moral dos personagens que ocupam essa paisagem. Aqui, a fotografia não só estabelece o tom melancólico do filme, como também reforça a sensação angustiante de isolamento e impotência que permeia a vida de Kolya - a impressão de que algo ruim está para acontecer a cada nova cena, um medo igualmente alimentado pela sombria trilha de Philip Glass, vai te acompanhar por toda essa jornada e vai te tirar do conforto.

Tudo em "Leviathan" é provocador - de seus personagens odiosos ao ritmo deliberadamente lento que nos permite absorver a gravidade das situações enfrentadas pelo protagonista. Sim, estamos diante de um filme difícil, mas ao mesmo tempo poderoso, que combina uma crítica social contundente com uma jornada pessoal profundamente comovente. É uma obra que nos desafia a confrontar as realidades brutais da injustiça e da corrupção, enquanto oferece uma experiência absurdamente envolvente - e aqui cabe um disclaimer: "Leviathan" era minha aposta para o Oscar de 2015, um ano que tivemos "Relatos Selvagens" e a vencedora, "Ida".

Para aqueles que apreciam filmes que exploram a condição humana com uma abordagem artística e introspectiva, "Leviathan" é uma escolha indispensável, contudo já adianto: sua intensidade e crueza podem não ser tão fácil de digerir. Vale muito o seu play!

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Talvez "Leviathan" tenha sofrido pela falta de um marketing mais potente em uma época onde as plataformas de streaming apenas engatinhavam. O fato é que esse filme foi o representante russo na disputa o Oscar de Melhor Filme Internacional de 2015 e que, embora não tenha levado a Palme d'Or em 2014, ganhou como "Melhor Roteiro" em Cannes, o Golden Globe nos EUA e teve mais de 35 vitórias e 52 indicações em festivais importantes ao redor do planeta! Dirigido pelo Andrey Zvyagintsev (de "Sem Amor"), esse é o tipo do filme que não deve ser ignorado por nenhum cinéfilo que tem no cinema independente sua jornada de descobertas. Eu diria, inclusive, que esse drama russo é uma obra-prima que soube combinar como poucos, uma narrativa poderosa com uma crítica social atemporal extremamente contundente e necessária, criando um retrato visceral e devastador da corrupção e da injustiça que assolam a sociedade desde sempre. Aclamado internacionalmente, "Leviathan" foi comparado a obras inesquecíveis como "A Separação" de Asghar Farhadi e "A Caça" de Thomas Vinterberg, pela sua habilidade única em abordar temas universais através de uma lente profundamente pessoal e culturalmente marcante.

Sua trama gira em torno de Kolya (Aleksey Serebryakov) um homem que vive em uma pequena cidade da Península de Kola, no norte da Rússia. Sua vida é virada de cabeça para baixo quando o prefeito corrupto decide tomar posse de sua casa e do terreno onde vive com sua jovem esposa Lilya (Elena Lyadova) e seu filho Romka (Sergey Pokhodaev). Desesperado, Kolya pede ajuda a Dmitriy (Vladimir Vdovichenkov), um velho amigo e advogado de Moscou, para lutar contra essa injustiça. No entanto, a chegada de advogado não traz a salvação esperada, mas sim uma série de tragédias que afundam Kolya e sua família em um abismo de desespero. Confira o trailer (com legendas em inglês):

Todos sabemos como as coisas são resolvidas na Rússia e isso, por si só, já seria o suficiente para nos dilacerar o coração ao nos conectarmos com a luta de Kolya e de sua família pelo que lhe é de direito, no entanto, inserido nesse elemento realmente dramático, existe uma sensação de abandono que é lindamente dissecada no roteiro do próprio Zvyagintsev com seu parceiro Oleg Negin - primeiro na briga com o prefeito, depois com os magistrados, com a polícia, e então, com os amigos. Veja, ao mesmo tempo que temos um filme de caráter extremamente simbólico, estamos diante da história "real" de uma vida "como tantas outras na Rússia" que é destruída em todos os aspectos pela ganância (e poder).

A direção de Zvyagintsev é magistral ao trabalhar esses aspectos de uma forma muito sensorial, utilizando a vastidão gelada da paisagem russa para refletir o vazio e a implacabilidade do sistema corrupto contra o qual Kolya luta, luta e luta - é dolorido demais, machuca de verdade. A fotografia de Mikhail Krichman (também parceiro de longa data do diretor) tem um papel fundamental na construção dessa atmosfera - eu diria até que ela é uma das jóias do filme! Repare como os planos longos e contemplativos capturam a beleza e a desolação da natureza, criando um contraste com o embate moral dos personagens que ocupam essa paisagem. Aqui, a fotografia não só estabelece o tom melancólico do filme, como também reforça a sensação angustiante de isolamento e impotência que permeia a vida de Kolya - a impressão de que algo ruim está para acontecer a cada nova cena, um medo igualmente alimentado pela sombria trilha de Philip Glass, vai te acompanhar por toda essa jornada e vai te tirar do conforto.

Tudo em "Leviathan" é provocador - de seus personagens odiosos ao ritmo deliberadamente lento que nos permite absorver a gravidade das situações enfrentadas pelo protagonista. Sim, estamos diante de um filme difícil, mas ao mesmo tempo poderoso, que combina uma crítica social contundente com uma jornada pessoal profundamente comovente. É uma obra que nos desafia a confrontar as realidades brutais da injustiça e da corrupção, enquanto oferece uma experiência absurdamente envolvente - e aqui cabe um disclaimer: "Leviathan" era minha aposta para o Oscar de 2015, um ano que tivemos "Relatos Selvagens" e a vencedora, "Ida".

Para aqueles que apreciam filmes que exploram a condição humana com uma abordagem artística e introspectiva, "Leviathan" é uma escolha indispensável, contudo já adianto: sua intensidade e crueza podem não ser tão fácil de digerir. Vale muito o seu play!

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Licorice Pizza

Certa vez uma grande amiga me disse que quando nós nossos jovens temos uma série de convicções que ao amadurecemos entendemos que não serviram para nada, porém são essas mesmas convicções que ajudam a moldar nossa personalidade e permitem que tenhamos certas atitudes sem precisarmos sofrer por isso depois. "Licorice Pizza", novo filme do cultuado Paul Thomas Anderson (indicado para 11 Oscars, o último com "Trama Fantasma"), é uma homenagem nostálgica à adolescência em San Fernando Valley e as convicções pessoais do próprio diretor - eu diria que é sua história de amadurecimento!

Gary Valentine (Cooper Hoffman) tem 15 anos, certo sucesso na sua carreira como ator, uma lábia como poucos e um potencial empreendedor impressionante - ele é imparável. Alana Kane (Alana Haim) tem 25 anos, uma vida monótona, praticamente sem propósito, mas uma vontade enorme de dar certo - inclusive no amor. Ambos têm algo em comum: nenhum deles está preparado para essa etapa da vida e eles nem imaginam que isso pode ser um problema. Confira o trailer:

"Licorice Pizza" é na sua essência um filme sobre as descobertas de uma vida promissora e de um sentimento sincero entre dois jovens no inicio dos anos 70. Não é um filme sobre uma jornada impossível ou uma conquista inabalável, "Licorice Pizza" é sobre as imperfeições de ser quem somos, de aceitar o outro para se sentir bem protegido, é sobre esconder o amor, mesmo ele sendo a coisa mais clara que existe; é sobre ser feliz, mesmo que na inocência das nossas inseguranças.

Além de tecnicamente perfeito (por favor reparem nos movimentos de câmera - sensacionais), o filme tem um charme narrativo que poucos teriam a capacidade de expressar em imagens. Esse é o típico filme que nas mãos de outro diretor, teria tudo para passar batido, mas é incrível como Paul Thomas Anderson cria uma atmosfera saudosista fantástica, muitas vezes engraçadíssima, para nos mostrar aquele universo pelos olhos de Valentine e de Kane - que aliás, estão impecáveis juntos! É impossível não torcer por eles, como se o diretor tivesse encontrado o equilíbrio perfeito entre a densidade de um potente drama pessoal e a leveza de uma boa comédia romântica!

"Licorice Pizza" não é nem de longe o melhor trabalho do diretor, mas talvez seja o mais simpático - um sinal de amadurecimento que extrapola a construção dos personagens que ele mesmo criou. O filme conquista por sua sensibilidade e honestidade, é engraçado, é comovente, é atemporal, é pessoal, é sobre como se achar no outro e ainda é sobre acreditar naquilo que nos faz feliz, mesmo que em uma fase onde a intensidade é tão importante quanto a verdade.

Vale muito a pena!

Up-date: "Licorice Pizza" foi indicada em três categorias no Oscar 2022: Melhor Filme, Melhor Diretor e Melhor Roteiro Original! 

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Certa vez uma grande amiga me disse que quando nós nossos jovens temos uma série de convicções que ao amadurecemos entendemos que não serviram para nada, porém são essas mesmas convicções que ajudam a moldar nossa personalidade e permitem que tenhamos certas atitudes sem precisarmos sofrer por isso depois. "Licorice Pizza", novo filme do cultuado Paul Thomas Anderson (indicado para 11 Oscars, o último com "Trama Fantasma"), é uma homenagem nostálgica à adolescência em San Fernando Valley e as convicções pessoais do próprio diretor - eu diria que é sua história de amadurecimento!

Gary Valentine (Cooper Hoffman) tem 15 anos, certo sucesso na sua carreira como ator, uma lábia como poucos e um potencial empreendedor impressionante - ele é imparável. Alana Kane (Alana Haim) tem 25 anos, uma vida monótona, praticamente sem propósito, mas uma vontade enorme de dar certo - inclusive no amor. Ambos têm algo em comum: nenhum deles está preparado para essa etapa da vida e eles nem imaginam que isso pode ser um problema. Confira o trailer:

"Licorice Pizza" é na sua essência um filme sobre as descobertas de uma vida promissora e de um sentimento sincero entre dois jovens no inicio dos anos 70. Não é um filme sobre uma jornada impossível ou uma conquista inabalável, "Licorice Pizza" é sobre as imperfeições de ser quem somos, de aceitar o outro para se sentir bem protegido, é sobre esconder o amor, mesmo ele sendo a coisa mais clara que existe; é sobre ser feliz, mesmo que na inocência das nossas inseguranças.

Além de tecnicamente perfeito (por favor reparem nos movimentos de câmera - sensacionais), o filme tem um charme narrativo que poucos teriam a capacidade de expressar em imagens. Esse é o típico filme que nas mãos de outro diretor, teria tudo para passar batido, mas é incrível como Paul Thomas Anderson cria uma atmosfera saudosista fantástica, muitas vezes engraçadíssima, para nos mostrar aquele universo pelos olhos de Valentine e de Kane - que aliás, estão impecáveis juntos! É impossível não torcer por eles, como se o diretor tivesse encontrado o equilíbrio perfeito entre a densidade de um potente drama pessoal e a leveza de uma boa comédia romântica!

"Licorice Pizza" não é nem de longe o melhor trabalho do diretor, mas talvez seja o mais simpático - um sinal de amadurecimento que extrapola a construção dos personagens que ele mesmo criou. O filme conquista por sua sensibilidade e honestidade, é engraçado, é comovente, é atemporal, é pessoal, é sobre como se achar no outro e ainda é sobre acreditar naquilo que nos faz feliz, mesmo que em uma fase onde a intensidade é tão importante quanto a verdade.

Vale muito a pena!

Up-date: "Licorice Pizza" foi indicada em três categorias no Oscar 2022: Melhor Filme, Melhor Diretor e Melhor Roteiro Original! 

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Mães Paralelas

Mães Paralelas

Não foram poucas as criticas que "Mães Paralelas" recebeu, principalmente do público - muitas, inclusive, classificando o filme como o mais fraco da história recente de Pedro Almodóvar. Eu discordo, embora entenda algumas delas. A conexão entre o drama da protagonista e sua filha e a questão politica que o diretor levanta é definida através de um único elemento: o "tempo"! Não importa nossa percepção de que a vida passa rápido (e o filme faz questão de explorar esses saltos temporais) e que isso ajuda a curar nossas dores, o que o roteiro deixa claro é que as nossas marcas profundas (mesmo que geracionais) não se apagam, apenas aprendemos a lidar com elas.

Duas mulheres, Janis (Penélope Cruz) e Ana (Milena Smit), dividem o quarto de hospital onde vão dar à luz. As duas são solteiras e ficaram grávidas acidentalmente. Janis, de meia-idade, não se arrepende, enquanto Ana, uma adolescente, está assustada, arrependida e traumatizada. Janis tenta animá-la enquanto passeiam pelo corredor do hospital. As poucas palavras que trocam nessas horas criam um vínculo muito profundo entre as duas, porém o destino se encarrega de desenvolver e complicar de forma tão retumbante a vida de ambas para sempre. Confira o trailer:

Antes de mais nada é preciso entender que em um filme do Almodóvar nada está em cena por acaso. Cada linha escrita no roteiro está completamente alinhada com aquele universo que o diretor constrói visualmente - gostem ou não do seu estilo, suas personagens (preferencialmente femininas) possuem tantas camadas que, muitas vezes, até nos perdemos dentro de sua própria profundidade. Em  "Mães Paralelas" não é diferente - começando pelo título que vai promover um debate interessante: o foco está em Janis e Ana, ou em todas as mães que perderam seus filhos durante o período da revolução facista na Espanha?

A magia da filmografia de Almodóvar está no detalhe e aqui vou citar um para você reparar e ampliar seu entendimento sobre a história. É um detalhe, mas faz toda a diferença: um dos momentos mais importantes da relação entre Janis e Ana acontece diante de uma parede completamente decorada com fotos de todas as mulheres da família de Janis, mulheres que escolheram ou foram obrigadas a criar outras mulheres sozinhas - o interessante é que em um determinado momento, Janis sugere como o passado sempre será carregado para o futuro. O exemplo dos ciclos familiares de Janis ganha ainda mais força quando ela percebe que dificilmente conseguirá quebra-lo e o homem que impede isso é justamente quem poderia liberta-la - entende a conceito de "paralelo" do filme?

Ao lado do Diretor de Fotografia José Luis Alcaine e do diretor de arte Antxón Gómez, seus parceiros de longa data, Almodóvar não se preocupa em teatralizar seus planos e muito menos em limitar a performance de suas atrizes. Penélope sabe disso e aproveita dessa liberdade para brilhar (mesmo que a indicação ao Oscar tenha parecido exagerada). Smit é mais contida, e acaba sofrendo um pouco com a necessidade de exposição do diretor e aqui cabe outro comentário pertinente: expor o óbvio pode ser um tiro no pé, mas nesse caso faz parte de uma dinâmica narrativa que usa dessas obviedades como gatilhos de aceitação e transformação dos personagens (principalmente no segundo ato).

Por mais que esteja escondido em uma trama que soa novelesca, “Mães Paralelas” é na verdade um filme político e suas marcas - e de como isso pode ser decodificado em outras gerações (a cena em que Janis cobra essa consciência histórica de Ana é genial). Poderia haver mais elementos que remetessem à critica política, para dialogar com sua premissa de uma forma tão expositiva quanto em sua subtrama sobre maternidade? Sim, acho que sim e é onde entendo algumas críticas - mas se isso acontecesse, não seria um "Almodóvar", certo?

Vale muito seu play!

Assista Agora

Não foram poucas as criticas que "Mães Paralelas" recebeu, principalmente do público - muitas, inclusive, classificando o filme como o mais fraco da história recente de Pedro Almodóvar. Eu discordo, embora entenda algumas delas. A conexão entre o drama da protagonista e sua filha e a questão politica que o diretor levanta é definida através de um único elemento: o "tempo"! Não importa nossa percepção de que a vida passa rápido (e o filme faz questão de explorar esses saltos temporais) e que isso ajuda a curar nossas dores, o que o roteiro deixa claro é que as nossas marcas profundas (mesmo que geracionais) não se apagam, apenas aprendemos a lidar com elas.

Duas mulheres, Janis (Penélope Cruz) e Ana (Milena Smit), dividem o quarto de hospital onde vão dar à luz. As duas são solteiras e ficaram grávidas acidentalmente. Janis, de meia-idade, não se arrepende, enquanto Ana, uma adolescente, está assustada, arrependida e traumatizada. Janis tenta animá-la enquanto passeiam pelo corredor do hospital. As poucas palavras que trocam nessas horas criam um vínculo muito profundo entre as duas, porém o destino se encarrega de desenvolver e complicar de forma tão retumbante a vida de ambas para sempre. Confira o trailer:

Antes de mais nada é preciso entender que em um filme do Almodóvar nada está em cena por acaso. Cada linha escrita no roteiro está completamente alinhada com aquele universo que o diretor constrói visualmente - gostem ou não do seu estilo, suas personagens (preferencialmente femininas) possuem tantas camadas que, muitas vezes, até nos perdemos dentro de sua própria profundidade. Em  "Mães Paralelas" não é diferente - começando pelo título que vai promover um debate interessante: o foco está em Janis e Ana, ou em todas as mães que perderam seus filhos durante o período da revolução facista na Espanha?

A magia da filmografia de Almodóvar está no detalhe e aqui vou citar um para você reparar e ampliar seu entendimento sobre a história. É um detalhe, mas faz toda a diferença: um dos momentos mais importantes da relação entre Janis e Ana acontece diante de uma parede completamente decorada com fotos de todas as mulheres da família de Janis, mulheres que escolheram ou foram obrigadas a criar outras mulheres sozinhas - o interessante é que em um determinado momento, Janis sugere como o passado sempre será carregado para o futuro. O exemplo dos ciclos familiares de Janis ganha ainda mais força quando ela percebe que dificilmente conseguirá quebra-lo e o homem que impede isso é justamente quem poderia liberta-la - entende a conceito de "paralelo" do filme?

Ao lado do Diretor de Fotografia José Luis Alcaine e do diretor de arte Antxón Gómez, seus parceiros de longa data, Almodóvar não se preocupa em teatralizar seus planos e muito menos em limitar a performance de suas atrizes. Penélope sabe disso e aproveita dessa liberdade para brilhar (mesmo que a indicação ao Oscar tenha parecido exagerada). Smit é mais contida, e acaba sofrendo um pouco com a necessidade de exposição do diretor e aqui cabe outro comentário pertinente: expor o óbvio pode ser um tiro no pé, mas nesse caso faz parte de uma dinâmica narrativa que usa dessas obviedades como gatilhos de aceitação e transformação dos personagens (principalmente no segundo ato).

Por mais que esteja escondido em uma trama que soa novelesca, “Mães Paralelas” é na verdade um filme político e suas marcas - e de como isso pode ser decodificado em outras gerações (a cena em que Janis cobra essa consciência histórica de Ana é genial). Poderia haver mais elementos que remetessem à critica política, para dialogar com sua premissa de uma forma tão expositiva quanto em sua subtrama sobre maternidade? Sim, acho que sim e é onde entendo algumas críticas - mas se isso acontecesse, não seria um "Almodóvar", certo?

Vale muito seu play!

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Maestro

"Maestro", produção original da Netflix, é o "Mank" de 2020 ou o "Roma" de 2018, ou seja, se você tem nessas duas referências ótimas experiências como audiência, o seu play é obrigatório, caso contrário, é muito provável que você não se conecte com o filme dirigido pelo Bradley Cooper, que se apropria de uma forma mais cadenciada para explorar as nuances de uma complexa relação entre o protagonista com sua esposa - e não, "Maestro" não tem absolutamente nada a ver com a levada mais popde "Nasce uma Estrela". Aqui, Cooper é muito mais autoral na sua proposta narrativa e eu até completaria: mais maduro como diretor em todos os sentidos. Dito isso é preciso alinhar outra expectativa: não se trata de uma cinebiografia clássica onde o foco é a carreira de um gênio como Leonard Bernstein; o recorte profissional existe, mas é apenas o pano de fundo para discutir sua bissexualidade e como isso impactou em sua família.

Para quem não sabe, Bernstein (Bradley Cooper) é um compositor, músico e pianista responsável por trilhas sonoras de musicais aclamados da Broadway, como "West Side Story", "Peter Pan" e "Candice". Como maestro (daí o nome do filme), foi o principal condutor da Orquestra Filarmônica de Nova York durante 18 anos e se consagrou como um dos músicos mais importantes dos Estados Unidos em sua época. Mas é na relação com a atriz de TV e teatro Felicia Montealegre (Carey Mulligan,), seu grande amor, que suas escolhas passam a ser discutidas em um tumultuado contexto que durou mais de 25 anos. Confira o trailer:

Em um projeto que, curiosamente, primeiro seria dirigida porSteven Spielberg e, depois, porMartin Scorsese, é de se elogiar a performance criativa de Bradley Cooper como diretor. Seu trabalho é impecável - é impressionante como ele consegue capturar a essência de Bernstein, tanto como artista quanto como homem, além de estabelecer uma conexão imediata com Felicia, equilibrando a jornada de ascensão do músico com o drama de relações entre um casal que notavelmente se ama, mas vive pautado pela insegurança. Reparem como Cooper pontua as escolhas do protagonista com signos que remetem para uma busca incansável pelo prazer - Bernstein está sempre com um cigarro ou com um drink na mão (e não raramente, com os dois). Essa construção de camadas reflete na incrível performance do diretor também como ator - digno de prêmios!

Mulligan que inclusive tem o mérito do first billing, ou seja, seu nome aparece antes que o do próprio Cooper na lista do elenco, é a figura marcante do filme. Mesmo mas cenas musicais emocionantes ou nos concertos grandiosos onde Bernstein parece estar iluminado, a presença de Felicia é quase onipresente, dada a força dramática que a atriz conseguiu entregar para sua personagem. Cooper é cirúrgico em reproduzir os maneirismos de Bernstein (aliás que maquiagem mais genial é essa?), mas como Mulligan, não tem como comparar - a cena onde Felicia, já doente, recebe uma visita fora de hora ou quando ela cobra do marido mais discrição para que sua bissexualidade não impacte na vida da filha, olha, é de se aplaudir de pé.

"Maestro" tem uma atmosfera vibrante e emocionante que captura a magia da música, ao mesmo tempo em que explora com muita sensibilidade e respeito as camadas mais íntimas de cada um dos personagens. Essa proposta de Cooper só funciona graças a forma como ele brinca com nossos sentidos através da imagem e do som. Na fotografia do Matthew Libatique (o mesmo de "Cisne Negro") o preto e branco de alto contraste pontua o começo da vida profissional de Bernstein e seu inicio de relacionamento com Felicia; já o granulado das cores vivas fazem o mesmo pelo libertário anos 70, quando os problemas, ainda discretos, começam a aparecer e a incomodar. Na trilha sonora, o que encontramos é um Leonard Bernstein multifacetado, mas igualmente brilhante em sua capacidade de fazer arte com alma. O fato é que "Maestro" é um filme com personalidade, feito para ganhar muitos prêmios, impecável na sua produção e profundo na sua proposta, mas que vai exigir uma certa predileção por filmes mais independentes e isso nem todos vão comprar.

Para nós, imperdível!

Assista Agora

"Maestro", produção original da Netflix, é o "Mank" de 2020 ou o "Roma" de 2018, ou seja, se você tem nessas duas referências ótimas experiências como audiência, o seu play é obrigatório, caso contrário, é muito provável que você não se conecte com o filme dirigido pelo Bradley Cooper, que se apropria de uma forma mais cadenciada para explorar as nuances de uma complexa relação entre o protagonista com sua esposa - e não, "Maestro" não tem absolutamente nada a ver com a levada mais popde "Nasce uma Estrela". Aqui, Cooper é muito mais autoral na sua proposta narrativa e eu até completaria: mais maduro como diretor em todos os sentidos. Dito isso é preciso alinhar outra expectativa: não se trata de uma cinebiografia clássica onde o foco é a carreira de um gênio como Leonard Bernstein; o recorte profissional existe, mas é apenas o pano de fundo para discutir sua bissexualidade e como isso impactou em sua família.

Para quem não sabe, Bernstein (Bradley Cooper) é um compositor, músico e pianista responsável por trilhas sonoras de musicais aclamados da Broadway, como "West Side Story", "Peter Pan" e "Candice". Como maestro (daí o nome do filme), foi o principal condutor da Orquestra Filarmônica de Nova York durante 18 anos e se consagrou como um dos músicos mais importantes dos Estados Unidos em sua época. Mas é na relação com a atriz de TV e teatro Felicia Montealegre (Carey Mulligan,), seu grande amor, que suas escolhas passam a ser discutidas em um tumultuado contexto que durou mais de 25 anos. Confira o trailer:

Em um projeto que, curiosamente, primeiro seria dirigida porSteven Spielberg e, depois, porMartin Scorsese, é de se elogiar a performance criativa de Bradley Cooper como diretor. Seu trabalho é impecável - é impressionante como ele consegue capturar a essência de Bernstein, tanto como artista quanto como homem, além de estabelecer uma conexão imediata com Felicia, equilibrando a jornada de ascensão do músico com o drama de relações entre um casal que notavelmente se ama, mas vive pautado pela insegurança. Reparem como Cooper pontua as escolhas do protagonista com signos que remetem para uma busca incansável pelo prazer - Bernstein está sempre com um cigarro ou com um drink na mão (e não raramente, com os dois). Essa construção de camadas reflete na incrível performance do diretor também como ator - digno de prêmios!

Mulligan que inclusive tem o mérito do first billing, ou seja, seu nome aparece antes que o do próprio Cooper na lista do elenco, é a figura marcante do filme. Mesmo mas cenas musicais emocionantes ou nos concertos grandiosos onde Bernstein parece estar iluminado, a presença de Felicia é quase onipresente, dada a força dramática que a atriz conseguiu entregar para sua personagem. Cooper é cirúrgico em reproduzir os maneirismos de Bernstein (aliás que maquiagem mais genial é essa?), mas como Mulligan, não tem como comparar - a cena onde Felicia, já doente, recebe uma visita fora de hora ou quando ela cobra do marido mais discrição para que sua bissexualidade não impacte na vida da filha, olha, é de se aplaudir de pé.

"Maestro" tem uma atmosfera vibrante e emocionante que captura a magia da música, ao mesmo tempo em que explora com muita sensibilidade e respeito as camadas mais íntimas de cada um dos personagens. Essa proposta de Cooper só funciona graças a forma como ele brinca com nossos sentidos através da imagem e do som. Na fotografia do Matthew Libatique (o mesmo de "Cisne Negro") o preto e branco de alto contraste pontua o começo da vida profissional de Bernstein e seu inicio de relacionamento com Felicia; já o granulado das cores vivas fazem o mesmo pelo libertário anos 70, quando os problemas, ainda discretos, começam a aparecer e a incomodar. Na trilha sonora, o que encontramos é um Leonard Bernstein multifacetado, mas igualmente brilhante em sua capacidade de fazer arte com alma. O fato é que "Maestro" é um filme com personalidade, feito para ganhar muitos prêmios, impecável na sua produção e profundo na sua proposta, mas que vai exigir uma certa predileção por filmes mais independentes e isso nem todos vão comprar.

Para nós, imperdível!

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Maid

Olha, "Maid" é excelente, mas preciso te avisar: não será uma jornada das mais tranquilas! Essa minissérie da Netflix, criada pela Molly Smith Metzler (também responsável por "Shameless") e dirigida pelo incrível John Wells (26 vezes indicado ao Emmy e vencedor por "ER" e "West Wing"), é baseada no livro de memórias "Maid: Hard Work, Low Pay, and a Mother's Will to Survive" de Stephanie Land. Sua trama oferece uma exploração íntima e comovente das dificuldades enfrentadas por uma jovem mãe solteira enquanto luta para construir uma vida digna para ela e para sua filha, em meio a uma realidade dolorosa e a um sistema que muitas vezes parece estar contra quem mais precisa. Com uma narrativa emocionalmente delicada e performances realmente excepcionais, "Maid" merece demais sua atenção - certamente uma das produções mais impactantes de 2021.

A história segue Alex Russel (Margaret Qualley), uma jovem que resolve deixar de lado um relacionamento abusivo com seu namorado Sean (Nick Robinson). Sem nenhum apoio financeiro ou familiar, Alex começa a trabalhar como empregada doméstica para sustentar sua filha Maddy (Rylea Nevaeh Whittet). "Maid" documenta as lutas de Alex para encontrar estabilidade perante todas as complicações de ser mãe solteira, enquanto tenta navegar pelas dificuldades emocionais e psicológicas que surgem ao longo de sua jornada. Confira o trailer (em inglês):

Só pelo trailer é possível ter uma ideia da potência narrativa e visual de "Maid". Molly Smith Metzler, criadora e roteirista da minissérie, demonstra uma habilidade impressionante ao construir essa narrativa que é ao mesmo tempo dolorosamente realista e profundamente humana. Metzler tenta equilibrar com alguma sensibilidade o impacto dos temas que a história de Alex aborda, mas chega ser viceral como as discussões que ela levanta nos provoca. Falar sobre abuso doméstico, sobre as dores da falta de recursos mínimos, sobre saúde mental e, especialmente, sobre as falhas do sistema que deveria dar toda assistência que a mulher precisa, da fato, é indigesto. A partir de uma análise social interessante, Metzler evita o sensacionalismo e se concentra em pontuar as pequenas vitórias e, claro, a resiliência do espírito humano, oferecendo uma representação autêntica e dura das dificuldades enfrentadas por milhões de mulheres na vida real.

A direção de John Wells é fundamental - o tom cinematográfico escolhido por ele é a melhor representação da força dessa minissérie. Wells captura as lutas de Alex com intimidade, em uma direção que é ao mesmo tempo crua e compassiva. A fotografia de Guy Godfree (de "Maudie: Sua Vida e Sua Arte") é igualmente eficaz, utilizando uma paleta de cores que reflete perfeitamente as emoções e o estado mental de Alex - ele usa e abusa dos planos fechados e da câmera "mais nervosa" para assinalar o desespero e os momentos de esperança da protagonista sem fugir da realidade. Repare como as escolhas de enquadramento muitas vezes enfatizam a sensação de isolamento e claustrofobia que Alex sente durante sua luta para escapar de seu passado e assim tentar construir um futuro melhor - essa escolha conceitual reflete demais nas nossas sensações ao ponto de doer na alma!

Margaret Qualley encontra a força e a vulnerabilidade de uma personagem cheia de camadas com uma autenticidade cativante e comovente. Sua performance é o coração pulsante da minissérie, transmitindo a determinação silenciosa de uma jovem mãe que fará qualquer coisa para garantir o melhor para sua filha. Rylea Nevaeh Whittet, como Maddy, traz uma doçura e uma inocência que contrastam com a dureza da vida que Alex enfrenta, reforçando o vínculo profundo entre mãe e filha de uma maneira que fica impossível não se apaixonar por elas. Mas atenção: o ritmo da narrativa, que se concentra intensamente nos detalhes do cotidiano de Alex, pode soar lento em certos momentos. Além disso, a repetição dos desafios enfrentados por ela pode parecer cansativo para alguns, mas é justamente essas características que sublinham a realidade exaustiva, menos favorecida e angustiante de uma luta pela sobrevivência que parece injusta aos olhos da empatia. "Maid" é uma obra poderosa que destaca o poder do espírito humano em meio a adversidades imensas, eu diria até que é um retrato incisivo e comovente das dificuldades enfrentadas por aqueles que estão presos em um ciclo de pobreza e abuso, mas que mesmo assim tenta oferecer uma mensagem de esperança e resiliência.

Vale muito o seu play!

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Olha, "Maid" é excelente, mas preciso te avisar: não será uma jornada das mais tranquilas! Essa minissérie da Netflix, criada pela Molly Smith Metzler (também responsável por "Shameless") e dirigida pelo incrível John Wells (26 vezes indicado ao Emmy e vencedor por "ER" e "West Wing"), é baseada no livro de memórias "Maid: Hard Work, Low Pay, and a Mother's Will to Survive" de Stephanie Land. Sua trama oferece uma exploração íntima e comovente das dificuldades enfrentadas por uma jovem mãe solteira enquanto luta para construir uma vida digna para ela e para sua filha, em meio a uma realidade dolorosa e a um sistema que muitas vezes parece estar contra quem mais precisa. Com uma narrativa emocionalmente delicada e performances realmente excepcionais, "Maid" merece demais sua atenção - certamente uma das produções mais impactantes de 2021.

A história segue Alex Russel (Margaret Qualley), uma jovem que resolve deixar de lado um relacionamento abusivo com seu namorado Sean (Nick Robinson). Sem nenhum apoio financeiro ou familiar, Alex começa a trabalhar como empregada doméstica para sustentar sua filha Maddy (Rylea Nevaeh Whittet). "Maid" documenta as lutas de Alex para encontrar estabilidade perante todas as complicações de ser mãe solteira, enquanto tenta navegar pelas dificuldades emocionais e psicológicas que surgem ao longo de sua jornada. Confira o trailer (em inglês):

Só pelo trailer é possível ter uma ideia da potência narrativa e visual de "Maid". Molly Smith Metzler, criadora e roteirista da minissérie, demonstra uma habilidade impressionante ao construir essa narrativa que é ao mesmo tempo dolorosamente realista e profundamente humana. Metzler tenta equilibrar com alguma sensibilidade o impacto dos temas que a história de Alex aborda, mas chega ser viceral como as discussões que ela levanta nos provoca. Falar sobre abuso doméstico, sobre as dores da falta de recursos mínimos, sobre saúde mental e, especialmente, sobre as falhas do sistema que deveria dar toda assistência que a mulher precisa, da fato, é indigesto. A partir de uma análise social interessante, Metzler evita o sensacionalismo e se concentra em pontuar as pequenas vitórias e, claro, a resiliência do espírito humano, oferecendo uma representação autêntica e dura das dificuldades enfrentadas por milhões de mulheres na vida real.

A direção de John Wells é fundamental - o tom cinematográfico escolhido por ele é a melhor representação da força dessa minissérie. Wells captura as lutas de Alex com intimidade, em uma direção que é ao mesmo tempo crua e compassiva. A fotografia de Guy Godfree (de "Maudie: Sua Vida e Sua Arte") é igualmente eficaz, utilizando uma paleta de cores que reflete perfeitamente as emoções e o estado mental de Alex - ele usa e abusa dos planos fechados e da câmera "mais nervosa" para assinalar o desespero e os momentos de esperança da protagonista sem fugir da realidade. Repare como as escolhas de enquadramento muitas vezes enfatizam a sensação de isolamento e claustrofobia que Alex sente durante sua luta para escapar de seu passado e assim tentar construir um futuro melhor - essa escolha conceitual reflete demais nas nossas sensações ao ponto de doer na alma!

Margaret Qualley encontra a força e a vulnerabilidade de uma personagem cheia de camadas com uma autenticidade cativante e comovente. Sua performance é o coração pulsante da minissérie, transmitindo a determinação silenciosa de uma jovem mãe que fará qualquer coisa para garantir o melhor para sua filha. Rylea Nevaeh Whittet, como Maddy, traz uma doçura e uma inocência que contrastam com a dureza da vida que Alex enfrenta, reforçando o vínculo profundo entre mãe e filha de uma maneira que fica impossível não se apaixonar por elas. Mas atenção: o ritmo da narrativa, que se concentra intensamente nos detalhes do cotidiano de Alex, pode soar lento em certos momentos. Além disso, a repetição dos desafios enfrentados por ela pode parecer cansativo para alguns, mas é justamente essas características que sublinham a realidade exaustiva, menos favorecida e angustiante de uma luta pela sobrevivência que parece injusta aos olhos da empatia. "Maid" é uma obra poderosa que destaca o poder do espírito humano em meio a adversidades imensas, eu diria até que é um retrato incisivo e comovente das dificuldades enfrentadas por aqueles que estão presos em um ciclo de pobreza e abuso, mas que mesmo assim tenta oferecer uma mensagem de esperança e resiliência.

Vale muito o seu play!

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Mank

"Mank" parece ser "O Irlandês"dessa temporada! Embora não exista nenhum ponto em comum entre as narrativas, assuntos ou escolhas conceituais, "Mank" chegou ao serviço de streaming com o mesmo status do filme de Scorsese: favorito ao Oscar, mas que também não será uma unanimidade - eu diria até, que ficará longe disso!

O filme mostra a chamada Era de Ouro de Hollywood sob a visão sagaz, ácida e extremamente crítica do roteirista alcoólatraHerman J. Mankiewicz (Gary Oldman) durante seu processo de criação do roteiro e seu maior sucesso, "Cidadão Kane" - reconhecido como um dos melhores filmes da História do Cinema. "Mank" é menos sobre a famosa discussão dos créditos sobre o roteiro que rendeu o único Oscar ao filme de Orson Welles e mais sobre uma abordagem desglamourizada dos bastidores de Hollywood, onde o poder da mídia, no caso o Cinema, era usada para informação e desinformação com objetivos claramente políticos. Confira o trailer:

"Mank" é um filme muito difícil de assistir, pois é preciso ter algum conhecimento sobre o assunto que ele aborda, além de exigir muita atenção, pois o roteiro explora o time sarcástico nas falas do protagonista em detrimento a cadência narrativa e visual da história. O que eu quero dizer é que se você não souber nada sobre a "Era de Ouro de Hollywood", o momento politico dos EUA e do mundo nos anos 30 e o que "Cidadão Kane" de fato é (ou representa); você vai dormir nos primeiros 30 minutos do filme - e o detalhe dele ser "preto e branco" é o que menos vai te incomodar!

Agora, se você estiver familiarizado com a história do cinema e como ela impacta na cultura americana ou fizer parte daquela audiência exigente, que repara em cada elemento técnico e artístico, aí você vai se divertir e presenciar uma aula de direção do David Fincher - sua capacidade de encontrar a melhor forma de contar a história usando conceitos visuais e narrativos aplicados por Welles em "Cidadão Kane" coloca "Mank" em outro patamar! Outro ponto que vale o play, é, sem dúvida, o trabalho de Gary Oldman - olha, ele já pode comemorar mais uma indicação ao Oscar! A cena em que ele, embriagado, faz um paralelo entre "sua" história e Don Quixote é simplesmente fabulosa, reparem!

Pois bem, sabendo das condições e peculiaridades que citei acima, dê o play por conta e risco, com a certeza que você vai gostar muito ou odiar o filme!

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"Mank" parece ser "O Irlandês"dessa temporada! Embora não exista nenhum ponto em comum entre as narrativas, assuntos ou escolhas conceituais, "Mank" chegou ao serviço de streaming com o mesmo status do filme de Scorsese: favorito ao Oscar, mas que também não será uma unanimidade - eu diria até, que ficará longe disso!

O filme mostra a chamada Era de Ouro de Hollywood sob a visão sagaz, ácida e extremamente crítica do roteirista alcoólatraHerman J. Mankiewicz (Gary Oldman) durante seu processo de criação do roteiro e seu maior sucesso, "Cidadão Kane" - reconhecido como um dos melhores filmes da História do Cinema. "Mank" é menos sobre a famosa discussão dos créditos sobre o roteiro que rendeu o único Oscar ao filme de Orson Welles e mais sobre uma abordagem desglamourizada dos bastidores de Hollywood, onde o poder da mídia, no caso o Cinema, era usada para informação e desinformação com objetivos claramente políticos. Confira o trailer:

"Mank" é um filme muito difícil de assistir, pois é preciso ter algum conhecimento sobre o assunto que ele aborda, além de exigir muita atenção, pois o roteiro explora o time sarcástico nas falas do protagonista em detrimento a cadência narrativa e visual da história. O que eu quero dizer é que se você não souber nada sobre a "Era de Ouro de Hollywood", o momento politico dos EUA e do mundo nos anos 30 e o que "Cidadão Kane" de fato é (ou representa); você vai dormir nos primeiros 30 minutos do filme - e o detalhe dele ser "preto e branco" é o que menos vai te incomodar!

Agora, se você estiver familiarizado com a história do cinema e como ela impacta na cultura americana ou fizer parte daquela audiência exigente, que repara em cada elemento técnico e artístico, aí você vai se divertir e presenciar uma aula de direção do David Fincher - sua capacidade de encontrar a melhor forma de contar a história usando conceitos visuais e narrativos aplicados por Welles em "Cidadão Kane" coloca "Mank" em outro patamar! Outro ponto que vale o play, é, sem dúvida, o trabalho de Gary Oldman - olha, ele já pode comemorar mais uma indicação ao Oscar! A cena em que ele, embriagado, faz um paralelo entre "sua" história e Don Quixote é simplesmente fabulosa, reparem!

Pois bem, sabendo das condições e peculiaridades que citei acima, dê o play por conta e risco, com a certeza que você vai gostar muito ou odiar o filme!

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Me chame pelo seu nome

Foi no verão de 1983, quando Oliver (Armie Hammer), um americano de 24 anos, foi passar o verão na Lombardia, Itália, com a família de Elio (Timothée Chalamet). Interpretado porMichael Stuhlbarg, o pai de Elio é professor e todo ano recebe um aluno para trabalhar como seu assistente de pesquisa. Elio com 17 anos, é imediatamente fisgado pela postura confiante, quase arrogante, de Oliver. Ao se sentir atraído fisicamente, Elio passa por um processo extremamente confuso de descobertas, medos e sentimentos que pareciam completamente distante da sua realidade.

"Call me by your name" (título original), para mim, vale muito pelo final do terceiro ato onde vemos uma cena linda entre um pai e um filho conversando com a mais pura sinceridade e afeto - no tom certo e com um trabalho sensacional do veterano Stuhlbarg com o jovem Chalamet. Penso que a indicação para o Oscar de 2018 como melhor ator é muito reflexo dessa cena! Fora isso, o filme é muito bem realizado, bem dirigido pelo Luca Guadagnino, mas não passa disso! A indicação como Melhor Filme, sem dúvida, já foi seu maior prêmio e talvez, sua maior chance esteja na categoria "Roteiro Adaptado" - seria a minha maior aposta!

Na verdade, acho até que esperava mais, mas entendo que para algumas pessoas o filme deve ter uma conexão mais forte, com isso a recomendação precisa ser relativizada, pois vai ficar claro, nos primeiros minutos, se esse filme é ou não para você!

Up-date: "Me chame pelo seu nome" ganhou em uma categoria no Oscar 2018: Melhor Roteiro Adaptado!

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Foi no verão de 1983, quando Oliver (Armie Hammer), um americano de 24 anos, foi passar o verão na Lombardia, Itália, com a família de Elio (Timothée Chalamet). Interpretado porMichael Stuhlbarg, o pai de Elio é professor e todo ano recebe um aluno para trabalhar como seu assistente de pesquisa. Elio com 17 anos, é imediatamente fisgado pela postura confiante, quase arrogante, de Oliver. Ao se sentir atraído fisicamente, Elio passa por um processo extremamente confuso de descobertas, medos e sentimentos que pareciam completamente distante da sua realidade.

"Call me by your name" (título original), para mim, vale muito pelo final do terceiro ato onde vemos uma cena linda entre um pai e um filho conversando com a mais pura sinceridade e afeto - no tom certo e com um trabalho sensacional do veterano Stuhlbarg com o jovem Chalamet. Penso que a indicação para o Oscar de 2018 como melhor ator é muito reflexo dessa cena! Fora isso, o filme é muito bem realizado, bem dirigido pelo Luca Guadagnino, mas não passa disso! A indicação como Melhor Filme, sem dúvida, já foi seu maior prêmio e talvez, sua maior chance esteja na categoria "Roteiro Adaptado" - seria a minha maior aposta!

Na verdade, acho até que esperava mais, mas entendo que para algumas pessoas o filme deve ter uma conexão mais forte, com isso a recomendação precisa ser relativizada, pois vai ficar claro, nos primeiros minutos, se esse filme é ou não para você!

Up-date: "Me chame pelo seu nome" ganhou em uma categoria no Oscar 2018: Melhor Roteiro Adaptado!

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Mia Madre

"Minha Mãe" (ou "Mia Madre" no original) é um belíssimo e sensível filme italiano sobre aceitação! Se inicialmente temos a impressão que a trama vai girar em torno das inseguranças de uma diretora de cinema durante um set de filmagem enquanto sua mãe está no hospital, muito doente; basta chegarmos no segundo ato para entender que o filme vai muito além - a experiência de ter que lidar com a morte que se aproxima ao mesmo tempo em que é preciso entender que a vida continua e que tudo aquilo faz parte de um ciclo que está se acabando, é simplesmente sensacional! 

Margherita (Margherita Buy) é uma diretora de cinema que está no meio das filmagens do seu mais novo trabalho e que, ao mesmo tempo, testemunha o estado de saúde em declínio da sua mãe, que está internada no hospital. Para complicar ainda mais a sua situação, a chegada do ator americano Barry Huggins (John Turturro), que mal sabe falar italiano e parece ter uma séria dificuldade em decorar suas falas, coloca ainda mais pressão sobre a diretora que já está atrasada em seu cronograma. Enérgica quando algo não sai conforme sua vontade, ela precisa encarar as próprias impotências, que ganham força quando sua mãe adoece e fica internada no hospital. Diante da morte que se aproxima, Margherita vê desafiada sua (falsa) noção de que pode controlar tudo, de que as decisões estão estritamente em suas mãos. Ela vive se defendendo desses demônios particulares, da incapacidade de manter relações baseadas na troca, sendo racional e intransigente. Os boletins médicos desfavoráveis minam sua autoconfiança pouco a pouco, expondo uma vulnerabilidade até então escondida. Confira o trailer: 

Antes de mais nada é preciso dizer que Margherita Buy está simplesmente sensacional como protagonista! Ela fala com os olhos - suas cenas tem um dinâmica muito interessantes: ela sempre está procurando o silêncio no meio do caos que é seu dia a dia. Para quem não sabe o que significa estar em um set de filmagem, assistir "Mia Madre" é um retrato baste realista do "caos" que é ser um diretor - que ao mesmo tempo que está rodeado de profissionais, está sozinho nas decisões pela cena perfeita. O bacana é que o diretor Nanni Moretti, que também faz o personagem Giovanni, irmão de Margherita, traduz com muita sensibilidade o drama e a pressão que é dirigir um filme ao contrastar, justamente, com o drama pessoal da personagem. Entender que a jornada de Margherita é muito mais pessoal do que profissional, transforma a maneira como entendemos o filme - e aqui cabe um questionamento: até que ponto vale abrir mão da vida pessoal em detrimento da profissional? Ou vale a pena trazer para "casa" os problemas que temos no "escritório"? Qual o preço disso tudo? A cena em que Margherita "estaciona" o carro de sua mãe é genial, pois diz muito sobre esses questionamentos - reparem!

O roteiro do próprio Moretti ao lado de Valia Santella, Gaia Manzini e Chiara Valerio foi muito feliz em criar a sensação de desconforto e de urgência entre a linha narrativa que expõe o trabalho de Margherita como cineasta e sua constante preocupação como filha. A quebra de linearidade temporal é constante e muito bem pontuada na história, mas é tratada de uma forma muito orgânica no filme - como se mantivesse o fluxo, servindo apenas para juntar as peças e para entender o que aquela difícil situação representa para a protagonista. Outro mérito do roteiro diz respeito ao perfeito equilíbrio entre os momentos cômicos, muitos deles graças ao talento de John Turturro, com aqueles mais dramáticos - mas sempre com muita sensibilidade e sem pesar na mão (talvez a trilha exagere um pouco, mas nada além do que estamos acostumados).

"Minha Mãe" ganhou o "Prize of the Ecumenical Jury" em Cannes 2015 pela forma elegante com que explora a jornada humana através da perda para entender o valor de um novo começo. A verdade é que se trata de um filme completamente autoral, com um dinâmica narrativa bastante pessoal, independente e criativa; tão bem conduzido que mexe com tantas emoções e sentimentos que chega a nos marcar a alma.

Vale a pena para quem gosta de um filme menos convencional e mais introspectivo, mesmo que fantasiado com a leveza do tom.

Assista Agora

"Minha Mãe" (ou "Mia Madre" no original) é um belíssimo e sensível filme italiano sobre aceitação! Se inicialmente temos a impressão que a trama vai girar em torno das inseguranças de uma diretora de cinema durante um set de filmagem enquanto sua mãe está no hospital, muito doente; basta chegarmos no segundo ato para entender que o filme vai muito além - a experiência de ter que lidar com a morte que se aproxima ao mesmo tempo em que é preciso entender que a vida continua e que tudo aquilo faz parte de um ciclo que está se acabando, é simplesmente sensacional! 

Margherita (Margherita Buy) é uma diretora de cinema que está no meio das filmagens do seu mais novo trabalho e que, ao mesmo tempo, testemunha o estado de saúde em declínio da sua mãe, que está internada no hospital. Para complicar ainda mais a sua situação, a chegada do ator americano Barry Huggins (John Turturro), que mal sabe falar italiano e parece ter uma séria dificuldade em decorar suas falas, coloca ainda mais pressão sobre a diretora que já está atrasada em seu cronograma. Enérgica quando algo não sai conforme sua vontade, ela precisa encarar as próprias impotências, que ganham força quando sua mãe adoece e fica internada no hospital. Diante da morte que se aproxima, Margherita vê desafiada sua (falsa) noção de que pode controlar tudo, de que as decisões estão estritamente em suas mãos. Ela vive se defendendo desses demônios particulares, da incapacidade de manter relações baseadas na troca, sendo racional e intransigente. Os boletins médicos desfavoráveis minam sua autoconfiança pouco a pouco, expondo uma vulnerabilidade até então escondida. Confira o trailer: 

Antes de mais nada é preciso dizer que Margherita Buy está simplesmente sensacional como protagonista! Ela fala com os olhos - suas cenas tem um dinâmica muito interessantes: ela sempre está procurando o silêncio no meio do caos que é seu dia a dia. Para quem não sabe o que significa estar em um set de filmagem, assistir "Mia Madre" é um retrato baste realista do "caos" que é ser um diretor - que ao mesmo tempo que está rodeado de profissionais, está sozinho nas decisões pela cena perfeita. O bacana é que o diretor Nanni Moretti, que também faz o personagem Giovanni, irmão de Margherita, traduz com muita sensibilidade o drama e a pressão que é dirigir um filme ao contrastar, justamente, com o drama pessoal da personagem. Entender que a jornada de Margherita é muito mais pessoal do que profissional, transforma a maneira como entendemos o filme - e aqui cabe um questionamento: até que ponto vale abrir mão da vida pessoal em detrimento da profissional? Ou vale a pena trazer para "casa" os problemas que temos no "escritório"? Qual o preço disso tudo? A cena em que Margherita "estaciona" o carro de sua mãe é genial, pois diz muito sobre esses questionamentos - reparem!

O roteiro do próprio Moretti ao lado de Valia Santella, Gaia Manzini e Chiara Valerio foi muito feliz em criar a sensação de desconforto e de urgência entre a linha narrativa que expõe o trabalho de Margherita como cineasta e sua constante preocupação como filha. A quebra de linearidade temporal é constante e muito bem pontuada na história, mas é tratada de uma forma muito orgânica no filme - como se mantivesse o fluxo, servindo apenas para juntar as peças e para entender o que aquela difícil situação representa para a protagonista. Outro mérito do roteiro diz respeito ao perfeito equilíbrio entre os momentos cômicos, muitos deles graças ao talento de John Turturro, com aqueles mais dramáticos - mas sempre com muita sensibilidade e sem pesar na mão (talvez a trilha exagere um pouco, mas nada além do que estamos acostumados).

"Minha Mãe" ganhou o "Prize of the Ecumenical Jury" em Cannes 2015 pela forma elegante com que explora a jornada humana através da perda para entender o valor de um novo começo. A verdade é que se trata de um filme completamente autoral, com um dinâmica narrativa bastante pessoal, independente e criativa; tão bem conduzido que mexe com tantas emoções e sentimentos que chega a nos marcar a alma.

Vale a pena para quem gosta de um filme menos convencional e mais introspectivo, mesmo que fantasiado com a leveza do tom.

Assista Agora

Minari

"Minari - Em Busca da Felicidade" é sobre a luta de todo dia, do imigrante coreano em terras americanas - e como é de se prever, não é uma luta das mais fáceis. O filme não se propõe a criar um conflito marcante ou, muito menos, mostrar o processo de transformação de um  personagem - simplesmente porque a vida não é assim, digamos, roteirizada. Talvez por isso, tudo pareça meio morno por muito tempo e essa dinâmica completamente cadenciada vai te provocar sensações bem particulares, ou seja, ou você vai amar "Minari" ou vai simplesmente odiar.

O filme acompanha uma família coreana que se muda da Califórnia para uma área rural do Arkansas a fim de recomeçar sua vida e conquistar o sonho americano. O pai, Jacob (Steven Yeun), arrumou uma terra isolada onde deseja cultivar vegetais coreanos e criar sua própria fazenda - um plano que não agrada sua esposa, Monica (Han Ye-Ri), e que é motivo de intermináveis discussões entre o casal. Ao mesmo tempo, conhecemos o pequeno David (Alan Kim), que convive com uma doença séria no coração e que, com a chegada de sua simpática avó, Soonja (Youn Yuh-Jung), precisa se adaptar a uma realidade de novas descobertas e choques culturais. Confira o trailer:

Saiba que o filme é inspirado nas memórias da infância do diretor Lee Isaac Chung - que também assina o roteiro. É claro como ele tem total familiaridade com aquele universo - são passagens do cotidiano que vão dialogar com quem se permitir "sentir" aquela jornada e, quem sabe, projetar na sua própria história. É muito interessante, porém, como Chung se esforça para não criar nenhum tipo de julgamento perante as decisões de seus personagens - a ideia de que cada um tem os seus motivos, dores e expectativas, acompanha o arco narrativo do começo ao fim. Ao mostrar que, muitas vezes, pessoas que se amam podem não se entender e até não aceitar uma determinada situação, dói - só que faz parte da vida e o filme joga isso na nossa cara em todo momento porque respeita o limite de cada um. inclusive das crianças.

Mais uma vez: não estamos falando de um filme onde um personagem sai do ponto A e chega no ponto B depois de superar todas as dificuldades. Em "Minari" tanto o ponto "A" quanto o "B" já são difíceis, criando uma sensação angustiante em quem assiste. A forma como todos os elementos narrativos se conectam com a história chega a impressionar: elenco, fotografia, trilha sonora e direção de arte conversam entre si de uma maneira tão orgânica que se fosse um documentário a experiência seria exatamente a mesma.

A proposta de apresentar as dores de uma família na busca pelo sonho americano, certamente vai te remeter a tês filmes diferentes entre si, mas similares em sua mensagem: "A Despedida", "O Castelo de Vidro"e "Era uma vez um sonho". Se você já assistiu e gostou dessas referências, Minari é para você; caso contrário vá por sua conta e risco, mas tenha em mente que estamos falando de um filme que dialoga com a inocência e a doçura das crianças, a sabedoria dos mais velhos e a luta diária de um casal que acreditava que poderia (e mereceria) uma vida melhor!

Vale a pena!

Obs: "Minari" ganhou mais de 100 (eu disse "100") prêmios internacionais, além de estar presente em mais de 210 festivais de cinema. O filme foi indicado em 6 categorias no Oscar 2021, inclusive de "Melhor Filme", e ganhou em "Melhor Atriz Coadjuvante" com Youn Yuh-Jung.

Assista Agora

"Minari - Em Busca da Felicidade" é sobre a luta de todo dia, do imigrante coreano em terras americanas - e como é de se prever, não é uma luta das mais fáceis. O filme não se propõe a criar um conflito marcante ou, muito menos, mostrar o processo de transformação de um  personagem - simplesmente porque a vida não é assim, digamos, roteirizada. Talvez por isso, tudo pareça meio morno por muito tempo e essa dinâmica completamente cadenciada vai te provocar sensações bem particulares, ou seja, ou você vai amar "Minari" ou vai simplesmente odiar.

O filme acompanha uma família coreana que se muda da Califórnia para uma área rural do Arkansas a fim de recomeçar sua vida e conquistar o sonho americano. O pai, Jacob (Steven Yeun), arrumou uma terra isolada onde deseja cultivar vegetais coreanos e criar sua própria fazenda - um plano que não agrada sua esposa, Monica (Han Ye-Ri), e que é motivo de intermináveis discussões entre o casal. Ao mesmo tempo, conhecemos o pequeno David (Alan Kim), que convive com uma doença séria no coração e que, com a chegada de sua simpática avó, Soonja (Youn Yuh-Jung), precisa se adaptar a uma realidade de novas descobertas e choques culturais. Confira o trailer:

Saiba que o filme é inspirado nas memórias da infância do diretor Lee Isaac Chung - que também assina o roteiro. É claro como ele tem total familiaridade com aquele universo - são passagens do cotidiano que vão dialogar com quem se permitir "sentir" aquela jornada e, quem sabe, projetar na sua própria história. É muito interessante, porém, como Chung se esforça para não criar nenhum tipo de julgamento perante as decisões de seus personagens - a ideia de que cada um tem os seus motivos, dores e expectativas, acompanha o arco narrativo do começo ao fim. Ao mostrar que, muitas vezes, pessoas que se amam podem não se entender e até não aceitar uma determinada situação, dói - só que faz parte da vida e o filme joga isso na nossa cara em todo momento porque respeita o limite de cada um. inclusive das crianças.

Mais uma vez: não estamos falando de um filme onde um personagem sai do ponto A e chega no ponto B depois de superar todas as dificuldades. Em "Minari" tanto o ponto "A" quanto o "B" já são difíceis, criando uma sensação angustiante em quem assiste. A forma como todos os elementos narrativos se conectam com a história chega a impressionar: elenco, fotografia, trilha sonora e direção de arte conversam entre si de uma maneira tão orgânica que se fosse um documentário a experiência seria exatamente a mesma.

A proposta de apresentar as dores de uma família na busca pelo sonho americano, certamente vai te remeter a tês filmes diferentes entre si, mas similares em sua mensagem: "A Despedida", "O Castelo de Vidro"e "Era uma vez um sonho". Se você já assistiu e gostou dessas referências, Minari é para você; caso contrário vá por sua conta e risco, mas tenha em mente que estamos falando de um filme que dialoga com a inocência e a doçura das crianças, a sabedoria dos mais velhos e a luta diária de um casal que acreditava que poderia (e mereceria) uma vida melhor!

Vale a pena!

Obs: "Minari" ganhou mais de 100 (eu disse "100") prêmios internacionais, além de estar presente em mais de 210 festivais de cinema. O filme foi indicado em 6 categorias no Oscar 2021, inclusive de "Melhor Filme", e ganhou em "Melhor Atriz Coadjuvante" com Youn Yuh-Jung.

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Minhas Mães e Meu Pai

A Diretora Lisa Cholodenko dirigiu alguns pilotos de séries americanas de certo sucesso como "Hung" e "Six Feet Under", mas foi escrevendo "The Kids Are All Right" (título original) que ela mostrou seu grande talento - trabalho que, inclusive, lhe rendeu uma indicação no Oscar de melhor Roteiro Original em 2011. O fato é que estamos falando de um belíssimo e sensível roteiro! 

Dois irmãos adolescentes, Joni (Mia Wasikowaska) e Laser (Josh Hutcherson), são filhos do casal, Jules (Julianne Moore) e Nic (Annette Bening), concebidos através da inseminação artificial de um doador anônimo. Contudo, ao completar a maioridade, Joni encoraja o irmão a embarcar numa aventura para encontrar o pai biológico sem que as mães saibam. Quando Paul (Mark Ruffalo) aparece tudo muda, já que logo ele passa a fazer parte do cotidiano da família. Confira o trailer:

"Minhas Mães e Meu Pai" acerta ao tratar um drama bastante denso na sua origem, com uma narrativa extremamente leve e envolvente. Cholodenko que também dirigiu o filme, parte de sua própria experiência para contar uma história que, antes de tudo, fala sobre amor, companheirismo e família. Ela pontua os momentos de confusão (natural pela situação) com inteligência, usando muito bem os alívios cômicos como pontos de equilíbrio. O trabalho excepcional do elenco é inegável - o que resultou em mais duas indicações ao Oscar. É preciso elogiar a sensibilidade como os atores foram dirigidos e a resposta que cada um deu em cena, também reflexo de um texto muito bem escrito - Annette Bening concorreu como "Melhor Atriz" e Mark Ruffalo como "Ator Coadjuvante".

Um orçamento de U$ 4 milhões e um cronograma de filmagem de apenas 23 dias, são outros dois fatores que surpreendem e validam com muito mérito todos os prêmios que o filme ganhou durante sua carreira em festivais com mais de 130 indicações, que vão do Melhor Filme do Ano para a Academia até a vitória no Globo de Ouro de 2011 como "Melhor Filme de Comédia ou Musical", passando por reconhecimentos importantes no BAFTA, em Berlin, no Spirit Awards, etc.

"Minhas Mães e Meu Pai" é um filme que nos enche o coração, que nos faz refletir sobre o real e verdadeiro significado do amor, sobre nossas inseguranças durante um relacionamento, sobre as escolhas de vida que fazemos e até sobre a forma com que olhamos as convenções sociais para determinados assuntos. Com uma trilha escolhida a dedo, que vai de David Bowie à Joni Mitchell, e uma edição (que também merecia uma indicação) fabulosa do Jeffrey M. Werner, esse filme de 2010 é simplesmente imperdível!

Sensível e inteligente!!! Assista!!!

Assista Agora

A Diretora Lisa Cholodenko dirigiu alguns pilotos de séries americanas de certo sucesso como "Hung" e "Six Feet Under", mas foi escrevendo "The Kids Are All Right" (título original) que ela mostrou seu grande talento - trabalho que, inclusive, lhe rendeu uma indicação no Oscar de melhor Roteiro Original em 2011. O fato é que estamos falando de um belíssimo e sensível roteiro! 

Dois irmãos adolescentes, Joni (Mia Wasikowaska) e Laser (Josh Hutcherson), são filhos do casal, Jules (Julianne Moore) e Nic (Annette Bening), concebidos através da inseminação artificial de um doador anônimo. Contudo, ao completar a maioridade, Joni encoraja o irmão a embarcar numa aventura para encontrar o pai biológico sem que as mães saibam. Quando Paul (Mark Ruffalo) aparece tudo muda, já que logo ele passa a fazer parte do cotidiano da família. Confira o trailer:

"Minhas Mães e Meu Pai" acerta ao tratar um drama bastante denso na sua origem, com uma narrativa extremamente leve e envolvente. Cholodenko que também dirigiu o filme, parte de sua própria experiência para contar uma história que, antes de tudo, fala sobre amor, companheirismo e família. Ela pontua os momentos de confusão (natural pela situação) com inteligência, usando muito bem os alívios cômicos como pontos de equilíbrio. O trabalho excepcional do elenco é inegável - o que resultou em mais duas indicações ao Oscar. É preciso elogiar a sensibilidade como os atores foram dirigidos e a resposta que cada um deu em cena, também reflexo de um texto muito bem escrito - Annette Bening concorreu como "Melhor Atriz" e Mark Ruffalo como "Ator Coadjuvante".

Um orçamento de U$ 4 milhões e um cronograma de filmagem de apenas 23 dias, são outros dois fatores que surpreendem e validam com muito mérito todos os prêmios que o filme ganhou durante sua carreira em festivais com mais de 130 indicações, que vão do Melhor Filme do Ano para a Academia até a vitória no Globo de Ouro de 2011 como "Melhor Filme de Comédia ou Musical", passando por reconhecimentos importantes no BAFTA, em Berlin, no Spirit Awards, etc.

"Minhas Mães e Meu Pai" é um filme que nos enche o coração, que nos faz refletir sobre o real e verdadeiro significado do amor, sobre nossas inseguranças durante um relacionamento, sobre as escolhas de vida que fazemos e até sobre a forma com que olhamos as convenções sociais para determinados assuntos. Com uma trilha escolhida a dedo, que vai de David Bowie à Joni Mitchell, e uma edição (que também merecia uma indicação) fabulosa do Jeffrey M. Werner, esse filme de 2010 é simplesmente imperdível!

Sensível e inteligente!!! Assista!!!

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Na Própria Pele

Para mim, um dos grandes diferenciais da Netflix atualmente, são os títulos de filmes premiados em festivais importantes que ela adquire os direitos de distribuição. Normalmente filmes independentes, esse material dificilmente chegaria ao grande público sem a atuação de um grande player como a Netflix. Só lamento que o marketing da empresa não invista na sua divulgação como faz com alguns lançamentos de gosto bem duvidosos, mas enfim, regras da casa, regras do mercado.

O filme conta a história real do que aconteceu com Stefano Cucchi durante a semana que ficou preso após uma corriqueira batida policial no seu bairro. Com elementos narrativos muito parecidos com "Bicho de 7 Cabeças" e "Olhos que Condenam", esse premiado filme italiano é imperdível, mas esteja preparado, pois digerir aqueles fatos que vemos durante pouco mais 100 minutos, não é tarefa fácil.

"Na própria pele: o caso Stefano Cucchi" é uma dessas pérolas escondidas no catálogo que, para quem aprecia um cinema de qualidade, nos faz acreditar na importância  de uma boa história, de uma produção bem realizada e de uma direção autoral bastante competente, mas já adianto: o filme é duro, dolorido, intenso e ao mesmo tempo ótimo.

Stefano Cucchi era um jovem italiano de 31 anos que, em 2009, foi detido em uma abordagem policial enquanto fumava um simples cigarro com um amigo de infância. Embora não estivesse usando drogas no momento de sua prisão, os policiais que o abordaram naquela noite, encontraram dois cigarros de maconha e 2g de cocaína com ele. Após revistar a casa dos seus pais e não encontrar nada, Stefano passaria apenas uma noite na prisão e seria liberado, porém uma série de fatos transformaram a vida do rapaz. Uma atuação desastrosa da policia, uma postura extremamente arrogante das autoridades e com vários dos seus direitos simplesmente ignorados, Stefano Cucchi morreu apenas uma semana depois de ser condenado por, acreditem, tráfico de drogas! É importante ressaltar que trata-se de um caso real que mobilizou a Itália na época e que por isso, o valor do filme não está no resultado trágico dessa história e, sim, em que circunstâncias os fatos foram acontecendo e como se tornou uma enorme bola de neve. É terrível a velocidade como tudo se desenrola e como isso reflete na sua família. É uma realidade que incomoda pela naturalidade de como tudo é mostrado e de como as pessoas se relacionam com um ser humano pré julgado, impotente, assustado e ingênuo - sim, Stefano Cucchi foi muito ingênuo (e talvez aqui caiba a única crítica em relação ao roteiro)!!!

"Na própria pele" chega validado por inúmeros prêmios em festivais pelo mundo, inclusive em Veneza - além de uma importante indicação como melhor filme na Mostra "Novos Horizontes". É um trabalho irretocável do diretor Alessio Cremonini, com uma fotografia linda de Matteo Cocco - reparem como a câmera passeia lentamente pelo ambiente até chegar no protagonista, nos causando uma sensação absurda de ansiedade. Ou como o Diretor escolhe simplesmente travar a câmera e não acompanhar uma determinada ação até o fim, deixando que a imaginação de quem assiste construa parte dessa narrativa - assim foi no que seria a cena mais chocante do filme (o espancamento de Stefano)! Isso é cinema autoral de qualidade e com propósito conceitual que justificam as escolhas! Palmas!!!! 

Com um trabalho sensacional de um irreconhecível Alessandro Borghi (Suburra), fica impossível não se emocionar ou se revoltar com o que assistimos. "Na própria pele: o caso Stefano Cucchi" é daqueles filmes que ficam martelando na nossa cabeça, que nos trazem sensações únicas e que nos faz ficar em silêncio enquanto os créditos sobem - aliás, durante os créditos ouvimos os áudios reais do julgamento de Stefano e isso potencializa a dor que sentimos por aqueles personagens da vida real. O fato é que o filme vale muito a pena, mas esteja preparado para digerir uma história cruel que até hoje não foi totalmente explicada. Indico de olhos fechados!

Assista Agora 

Para mim, um dos grandes diferenciais da Netflix atualmente, são os títulos de filmes premiados em festivais importantes que ela adquire os direitos de distribuição. Normalmente filmes independentes, esse material dificilmente chegaria ao grande público sem a atuação de um grande player como a Netflix. Só lamento que o marketing da empresa não invista na sua divulgação como faz com alguns lançamentos de gosto bem duvidosos, mas enfim, regras da casa, regras do mercado.

O filme conta a história real do que aconteceu com Stefano Cucchi durante a semana que ficou preso após uma corriqueira batida policial no seu bairro. Com elementos narrativos muito parecidos com "Bicho de 7 Cabeças" e "Olhos que Condenam", esse premiado filme italiano é imperdível, mas esteja preparado, pois digerir aqueles fatos que vemos durante pouco mais 100 minutos, não é tarefa fácil.

"Na própria pele: o caso Stefano Cucchi" é uma dessas pérolas escondidas no catálogo que, para quem aprecia um cinema de qualidade, nos faz acreditar na importância  de uma boa história, de uma produção bem realizada e de uma direção autoral bastante competente, mas já adianto: o filme é duro, dolorido, intenso e ao mesmo tempo ótimo.

Stefano Cucchi era um jovem italiano de 31 anos que, em 2009, foi detido em uma abordagem policial enquanto fumava um simples cigarro com um amigo de infância. Embora não estivesse usando drogas no momento de sua prisão, os policiais que o abordaram naquela noite, encontraram dois cigarros de maconha e 2g de cocaína com ele. Após revistar a casa dos seus pais e não encontrar nada, Stefano passaria apenas uma noite na prisão e seria liberado, porém uma série de fatos transformaram a vida do rapaz. Uma atuação desastrosa da policia, uma postura extremamente arrogante das autoridades e com vários dos seus direitos simplesmente ignorados, Stefano Cucchi morreu apenas uma semana depois de ser condenado por, acreditem, tráfico de drogas! É importante ressaltar que trata-se de um caso real que mobilizou a Itália na época e que por isso, o valor do filme não está no resultado trágico dessa história e, sim, em que circunstâncias os fatos foram acontecendo e como se tornou uma enorme bola de neve. É terrível a velocidade como tudo se desenrola e como isso reflete na sua família. É uma realidade que incomoda pela naturalidade de como tudo é mostrado e de como as pessoas se relacionam com um ser humano pré julgado, impotente, assustado e ingênuo - sim, Stefano Cucchi foi muito ingênuo (e talvez aqui caiba a única crítica em relação ao roteiro)!!!

"Na própria pele" chega validado por inúmeros prêmios em festivais pelo mundo, inclusive em Veneza - além de uma importante indicação como melhor filme na Mostra "Novos Horizontes". É um trabalho irretocável do diretor Alessio Cremonini, com uma fotografia linda de Matteo Cocco - reparem como a câmera passeia lentamente pelo ambiente até chegar no protagonista, nos causando uma sensação absurda de ansiedade. Ou como o Diretor escolhe simplesmente travar a câmera e não acompanhar uma determinada ação até o fim, deixando que a imaginação de quem assiste construa parte dessa narrativa - assim foi no que seria a cena mais chocante do filme (o espancamento de Stefano)! Isso é cinema autoral de qualidade e com propósito conceitual que justificam as escolhas! Palmas!!!! 

Com um trabalho sensacional de um irreconhecível Alessandro Borghi (Suburra), fica impossível não se emocionar ou se revoltar com o que assistimos. "Na própria pele: o caso Stefano Cucchi" é daqueles filmes que ficam martelando na nossa cabeça, que nos trazem sensações únicas e que nos faz ficar em silêncio enquanto os créditos sobem - aliás, durante os créditos ouvimos os áudios reais do julgamento de Stefano e isso potencializa a dor que sentimos por aqueles personagens da vida real. O fato é que o filme vale muito a pena, mas esteja preparado para digerir uma história cruel que até hoje não foi totalmente explicada. Indico de olhos fechados!

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Ninguém sabe que estou aqui

"Ninguém sabe que estou aqui" provavelmente vai te surpreender! Embora tenha uma narrativa sem muita dinâmica, com pouquíssimos diálogos e uma história, digamos, previsível, o filme entrega um final onde tudo se encaixa de uma maneira muito correta - o que nos proporciona uma sensação de alivio muito particular e acaba sobrepondo as inúmeras fraquezas do roteiro. De fato, eu diria que "Ninguém sabe que estou aqui" é um filme que se apoia na empatia do protagonista para nos mover por um drama pessoal profundo sobre injustiça e as marcas que ela deixa na vida!

Memo (Jorge Garcia - Hurley de "Lost"), quando criança, foi um candidato a se tornar um fenômeno da música pop, porém os padrões da indústria do entretenimento dos anos 90 exigia um visual diferente - não havia espaço para uma criança como ele, mesmo com seu talento. Por ter uma voz incrível e uma afinação acima da média, os produtores resolveram fabricar uma "estrela" de sucesso internacional, usando a voz de Memo, mas o visual de outra criança. Traumatizado por esses (e outros importantes) acontecimentos do passado, Memo resolveu se isolar do mundo, indo morar com o tio em uma fazenda no interior do Chile, até que uma mulher da região lhe oferece a chance de encontrar a paz que ele procurou por tantos anos. Confira o trailer:

É verdade que no inicio do filme temos a impressão de estarmos assistindo algo mais cadenciado como "Sob a Pele do Lobo" até que ele vai evoluindo, pegando no tranco e nos trazendo alguns elementos bem emocionais que nos provocam a torcer pelo protagonista como em "Nasce uma Estrela" por exemplo! Essa dinâmica exige um pouco de paciência, mas o ótimo trabalho do Jorge Garcia e um direção muito competente do estreante Gaspar Antillo, nos conquista e vai nos entretendo até que finalmente encontramos a paz junto com o protagonista em uma cena ao melhor estilo "Judy"! É isso: se você gostou dessas referências que acabei de citar, sua diversão está garantida, mesmo que de uma forma um pouco menos hollywoodiana e mais autoral, mas que de qualquer modo, vai valer muito a pena!

Assista Agora ou

"Ninguém sabe que estou aqui" provavelmente vai te surpreender! Embora tenha uma narrativa sem muita dinâmica, com pouquíssimos diálogos e uma história, digamos, previsível, o filme entrega um final onde tudo se encaixa de uma maneira muito correta - o que nos proporciona uma sensação de alivio muito particular e acaba sobrepondo as inúmeras fraquezas do roteiro. De fato, eu diria que "Ninguém sabe que estou aqui" é um filme que se apoia na empatia do protagonista para nos mover por um drama pessoal profundo sobre injustiça e as marcas que ela deixa na vida!

Memo (Jorge Garcia - Hurley de "Lost"), quando criança, foi um candidato a se tornar um fenômeno da música pop, porém os padrões da indústria do entretenimento dos anos 90 exigia um visual diferente - não havia espaço para uma criança como ele, mesmo com seu talento. Por ter uma voz incrível e uma afinação acima da média, os produtores resolveram fabricar uma "estrela" de sucesso internacional, usando a voz de Memo, mas o visual de outra criança. Traumatizado por esses (e outros importantes) acontecimentos do passado, Memo resolveu se isolar do mundo, indo morar com o tio em uma fazenda no interior do Chile, até que uma mulher da região lhe oferece a chance de encontrar a paz que ele procurou por tantos anos. Confira o trailer:

É verdade que no inicio do filme temos a impressão de estarmos assistindo algo mais cadenciado como "Sob a Pele do Lobo" até que ele vai evoluindo, pegando no tranco e nos trazendo alguns elementos bem emocionais que nos provocam a torcer pelo protagonista como em "Nasce uma Estrela" por exemplo! Essa dinâmica exige um pouco de paciência, mas o ótimo trabalho do Jorge Garcia e um direção muito competente do estreante Gaspar Antillo, nos conquista e vai nos entretendo até que finalmente encontramos a paz junto com o protagonista em uma cena ao melhor estilo "Judy"! É isso: se você gostou dessas referências que acabei de citar, sua diversão está garantida, mesmo que de uma forma um pouco menos hollywoodiana e mais autoral, mas que de qualquer modo, vai valer muito a pena!

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Nove Dias

Em um primeiro olhar, "Nove Dias" até parece um episódio dos bons tempos de "Black Mirror" ou até com uma trama mais investigativa como "Devs"ou "Vórtex", mas a grande verdade é que, com o desenrolar da história, estamos diante de uma jornada filosófica muito mais próxima de "Fonte da Vida" do que qualquer outra coisa. Esse é o filme de estreia do diretor Edson Oda (amplamente premiado com seu curta-metragem "Malaria") e que não há como negar, se destaca pela originalidade e profundidade com que desenvolve uma abordagem criativa e única sobre a vida, sobre a existência e sobre as escolhas que moldam nosso destino. "Nine Days" (no original) recebeu, merecidamente, muitos elogios da crítica e abocanhou vários prêmios em festivais de cinema, incluindo o Sundance Film Festival; então se você é fã de obras mais autorais, que de fato desafiam e provocam reflexões profundas, você está no lugar certo - pode acreditar!

Na trama, conhecemos Will (Winston Duke) um homem solitário que vive em uma casa isolada no meio do deserto, onde ele conduz uma série de entrevistas e alguns testes curiosos com almas humanas em um período pré-nascimento - é isso mesmo, você não leu errado. Entre os candidatos estão Emma (Zazie Beetz), Kane (Bill Skarsgård) e alguns outros que disputam uma única vaga para a "vida". A escolha de quem terá o privilégio de nascer, obviamente, recai sobre Will, que passa a ser confrontado por dilemas morais profundos ao lidar com suas próprias experiências e de outros escolhidos por ele no passado. Confira o trailer:

Tá, eu sei que pode parecer uma "viagem" e talvez até seja mesmo, mas é impossível deixar de comentar como o roteiro de "Nove Dias" é criativo - muito mais do que apenas um filme, eu diria que essa é uma experiência filosófica que desafia as noções convencionais sobre a existência e o propósito da vida. Escrito pelo próprio Oda, o roteiro é inteligente ao explorar os dilemas de quem tem o poder das escolhas e como cada uma delas moldam o destino das pessoas. Ao desenvolver personagens tão únicos onde cada um representa uma perspectiva sobre a vida, Oda cria uma dinâmica que a todo momento nos leva questionar nossas crenças e valores. Mesmo empacotado com um ar "Black Mirror", o que vemos na tela é justamente o contrário: o que importa são conceitos mais espirituais do livre arbítrio, do destino e até do papel que cada um de nós desempenha no mundo ao ser "um escolhido"!

Na cadeira de direção, Edson Oda é tão competente quanto com "a caneta na mão".  Ele captura com muita competência toda a solidão e a introspecção de Will de uma forma envolvente e com uma certa atmosfera de mistério. A fotografia, assinada pelo Wyatt Garfield (de "The Kitchen") segue a mesma linha conceitual - tudo é meio nebuloso. Reparem como os cenários minimalistas em contraponto com os planos mais abertos, transmitem toda essa sensação de solidão e isolamento de Will. Outro ponto que merece destaque é a montagem - cuidadosa até encontrar o time certo para os diálogos perspicazes, é ela que ajuda revelar as camadas mais profundas de significado, nos dando tempo e incentivando a reflexão, mesmo após os créditos finais subirem.

"Nove Dias" tem um tom mais independente mesmo, que sabe exatamente como a mensagem sobre a importância da vida e das conexões humanas devem ressoar de maneira poderosa para deixar uma impressão indelével. São nas interações de Will com seu parceiro Kyo (Benedict Wong) e com as almas em potencial, que o filme explora as armadilhas da vida pela perspectiva do amor e da alegria ou da dor e do sofrimento. Nada é fácil e estamos cansados de saber disso, mas com muito simbolismo e sensibilidade, esse filme realmente nos convida para uma viagem emocionante e reflexiva que pode mudar nossa maneira de lidar com a vida e com nossas escolhas. 

Vale muito o seu play! Você vai se surpreender!

Assista Agora

Em um primeiro olhar, "Nove Dias" até parece um episódio dos bons tempos de "Black Mirror" ou até com uma trama mais investigativa como "Devs"ou "Vórtex", mas a grande verdade é que, com o desenrolar da história, estamos diante de uma jornada filosófica muito mais próxima de "Fonte da Vida" do que qualquer outra coisa. Esse é o filme de estreia do diretor Edson Oda (amplamente premiado com seu curta-metragem "Malaria") e que não há como negar, se destaca pela originalidade e profundidade com que desenvolve uma abordagem criativa e única sobre a vida, sobre a existência e sobre as escolhas que moldam nosso destino. "Nine Days" (no original) recebeu, merecidamente, muitos elogios da crítica e abocanhou vários prêmios em festivais de cinema, incluindo o Sundance Film Festival; então se você é fã de obras mais autorais, que de fato desafiam e provocam reflexões profundas, você está no lugar certo - pode acreditar!

Na trama, conhecemos Will (Winston Duke) um homem solitário que vive em uma casa isolada no meio do deserto, onde ele conduz uma série de entrevistas e alguns testes curiosos com almas humanas em um período pré-nascimento - é isso mesmo, você não leu errado. Entre os candidatos estão Emma (Zazie Beetz), Kane (Bill Skarsgård) e alguns outros que disputam uma única vaga para a "vida". A escolha de quem terá o privilégio de nascer, obviamente, recai sobre Will, que passa a ser confrontado por dilemas morais profundos ao lidar com suas próprias experiências e de outros escolhidos por ele no passado. Confira o trailer:

Tá, eu sei que pode parecer uma "viagem" e talvez até seja mesmo, mas é impossível deixar de comentar como o roteiro de "Nove Dias" é criativo - muito mais do que apenas um filme, eu diria que essa é uma experiência filosófica que desafia as noções convencionais sobre a existência e o propósito da vida. Escrito pelo próprio Oda, o roteiro é inteligente ao explorar os dilemas de quem tem o poder das escolhas e como cada uma delas moldam o destino das pessoas. Ao desenvolver personagens tão únicos onde cada um representa uma perspectiva sobre a vida, Oda cria uma dinâmica que a todo momento nos leva questionar nossas crenças e valores. Mesmo empacotado com um ar "Black Mirror", o que vemos na tela é justamente o contrário: o que importa são conceitos mais espirituais do livre arbítrio, do destino e até do papel que cada um de nós desempenha no mundo ao ser "um escolhido"!

Na cadeira de direção, Edson Oda é tão competente quanto com "a caneta na mão".  Ele captura com muita competência toda a solidão e a introspecção de Will de uma forma envolvente e com uma certa atmosfera de mistério. A fotografia, assinada pelo Wyatt Garfield (de "The Kitchen") segue a mesma linha conceitual - tudo é meio nebuloso. Reparem como os cenários minimalistas em contraponto com os planos mais abertos, transmitem toda essa sensação de solidão e isolamento de Will. Outro ponto que merece destaque é a montagem - cuidadosa até encontrar o time certo para os diálogos perspicazes, é ela que ajuda revelar as camadas mais profundas de significado, nos dando tempo e incentivando a reflexão, mesmo após os créditos finais subirem.

"Nove Dias" tem um tom mais independente mesmo, que sabe exatamente como a mensagem sobre a importância da vida e das conexões humanas devem ressoar de maneira poderosa para deixar uma impressão indelével. São nas interações de Will com seu parceiro Kyo (Benedict Wong) e com as almas em potencial, que o filme explora as armadilhas da vida pela perspectiva do amor e da alegria ou da dor e do sofrimento. Nada é fácil e estamos cansados de saber disso, mas com muito simbolismo e sensibilidade, esse filme realmente nos convida para uma viagem emocionante e reflexiva que pode mudar nossa maneira de lidar com a vida e com nossas escolhas. 

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O Abraço da Serpente

"O Abraço da Serpente" é um filme muito complicado de assistir, que foge dos padrões estéticos e narrativos que estamos acostumados, e mesmo chancelado por mais de 40 prêmios em Festivais Internacionais (que incluem Cannes e Sundance), além de uma indicação de "Melhor Filme Internacional" no Oscar 2016, eu diria que apenas um público muito pequeno e selecionado vai se conectar com a história e se permitir às profundas reflexões que o diretor colombiano Ciro Guerra propõe. 

Com a ajuda do xamã Karamakate (Nilbio Torres), Theodor Koch-Grunberg (Jan Bijvoet), um famoso explorador europeu, percorreu centenas de quilómetros do rio Amazonas quando, gravemente doente, buscava uma flor que poderia ser o objeto de sua cura. Anos depois, Richard Evans Schultes (Brionne Davis), considerado o pai da etnobotânica moderna, que tendo as publicações de Grunberg em mãos, tenta refazer os passos do pesquisador ao lado do mesmo Karamakate (aqui Antonio Bolívar) para encontrar a tal planta lendária. Confira o trailer:

O "preto e branco" da fotografia de David Gallego (de "Sal") é um contraponto potente com a diversidade de cores que representa o cenário por onde a história do filme se desenrola, mas ao mesmo tempo foi a forma como Guerra estabeleceu a frieza daqueles dois recortes temporais - quando acompanhamos Théo, estamos nos primeiros anos da década de 1900; quando somos apresentados para Evans, já estamos no meio do século; porém nada mudou, ou melhor, se transformou em algo muito pior! A missão religiosa (e o que isso se tornou) nos causa um forte (forte mesmo) impacto emocional - é incrível como o filme se apropria de uma linguagem quase documental para explorar de forma antropológica como a cultura indígena foi destruída (ou ceifada) pela catequização. A passagem que mostra o Messias louco no meio do "nada" é tão atual quanto a assustadora relação do um missionário colombiano com crianças indígenas - tudo em nome de Deus.

Grande parte de "O Abraço da Serpente" nos entrega a natureza como parte de uma jornada espiritual. Há muito simbolismo e até metáforas já que a percepção de mundo de um xamã é completamente diferente de um ocidental, no entanto, é muito interessante como o roteiro conecta esses dois mundos e propõe uma discussão inteligente sobre ação e consequência - mesmo que em alguns momentos soe como ato de boa-fé (a passagem da bússola é um bom exemplo, reparem). Tanto Bijvoet quanto Davis estão impecáveis na pele dos exploradores, mas, sem dúvida, é Nilbio Torres que se destaca - é impressionante como é possível sentir sua dor sem ao menos precisar entender uma palavra do seu dialeto.

"O Abraço da Serpente" retrata tantas nuances da colonização cultural na América que chega a embrulhar o estômago. Poucas vezes vi a ficção ser tão dura (e realista) sem precisar exaltar o indígena como individuo intocável. Esse realismo visceral só nos ajuda a entender como a preservação antropológica de uma cultura é importante e como ela continua praticamente esquecida até hoje. O filme é sim uma forte crítica a todas questões pertinentes que envolveram a colonização, como a extração irregular das riquezas naturais (para produzir borracha), ou o braço pesado do homem branco sobre o povo indígena como elemento de imposição e, claro, o total esgotamento (contínuo) de um povo cheio de sabedoria que já não existe mais.

Não espere uma jornada fácil - o que você vai encontrar é uma jornada cadenciada, profunda e de difícil absorção; mas que vale muito a pena!

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"O Abraço da Serpente" é um filme muito complicado de assistir, que foge dos padrões estéticos e narrativos que estamos acostumados, e mesmo chancelado por mais de 40 prêmios em Festivais Internacionais (que incluem Cannes e Sundance), além de uma indicação de "Melhor Filme Internacional" no Oscar 2016, eu diria que apenas um público muito pequeno e selecionado vai se conectar com a história e se permitir às profundas reflexões que o diretor colombiano Ciro Guerra propõe. 

Com a ajuda do xamã Karamakate (Nilbio Torres), Theodor Koch-Grunberg (Jan Bijvoet), um famoso explorador europeu, percorreu centenas de quilómetros do rio Amazonas quando, gravemente doente, buscava uma flor que poderia ser o objeto de sua cura. Anos depois, Richard Evans Schultes (Brionne Davis), considerado o pai da etnobotânica moderna, que tendo as publicações de Grunberg em mãos, tenta refazer os passos do pesquisador ao lado do mesmo Karamakate (aqui Antonio Bolívar) para encontrar a tal planta lendária. Confira o trailer:

O "preto e branco" da fotografia de David Gallego (de "Sal") é um contraponto potente com a diversidade de cores que representa o cenário por onde a história do filme se desenrola, mas ao mesmo tempo foi a forma como Guerra estabeleceu a frieza daqueles dois recortes temporais - quando acompanhamos Théo, estamos nos primeiros anos da década de 1900; quando somos apresentados para Evans, já estamos no meio do século; porém nada mudou, ou melhor, se transformou em algo muito pior! A missão religiosa (e o que isso se tornou) nos causa um forte (forte mesmo) impacto emocional - é incrível como o filme se apropria de uma linguagem quase documental para explorar de forma antropológica como a cultura indígena foi destruída (ou ceifada) pela catequização. A passagem que mostra o Messias louco no meio do "nada" é tão atual quanto a assustadora relação do um missionário colombiano com crianças indígenas - tudo em nome de Deus.

Grande parte de "O Abraço da Serpente" nos entrega a natureza como parte de uma jornada espiritual. Há muito simbolismo e até metáforas já que a percepção de mundo de um xamã é completamente diferente de um ocidental, no entanto, é muito interessante como o roteiro conecta esses dois mundos e propõe uma discussão inteligente sobre ação e consequência - mesmo que em alguns momentos soe como ato de boa-fé (a passagem da bússola é um bom exemplo, reparem). Tanto Bijvoet quanto Davis estão impecáveis na pele dos exploradores, mas, sem dúvida, é Nilbio Torres que se destaca - é impressionante como é possível sentir sua dor sem ao menos precisar entender uma palavra do seu dialeto.

"O Abraço da Serpente" retrata tantas nuances da colonização cultural na América que chega a embrulhar o estômago. Poucas vezes vi a ficção ser tão dura (e realista) sem precisar exaltar o indígena como individuo intocável. Esse realismo visceral só nos ajuda a entender como a preservação antropológica de uma cultura é importante e como ela continua praticamente esquecida até hoje. O filme é sim uma forte crítica a todas questões pertinentes que envolveram a colonização, como a extração irregular das riquezas naturais (para produzir borracha), ou o braço pesado do homem branco sobre o povo indígena como elemento de imposição e, claro, o total esgotamento (contínuo) de um povo cheio de sabedoria que já não existe mais.

Não espere uma jornada fácil - o que você vai encontrar é uma jornada cadenciada, profunda e de difícil absorção; mas que vale muito a pena!

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O Amor de Sylvie

"O Amor de Sylvie" é basicamente uma linda homenagem aos romances clássicos do cinema dos anos 60 - em sua forma e em seu conteúdo! Um filme delicioso de assistir, leve e bem conduzido, mesmo quando se apoia em fórmulas e soluções completamente previsíveis. O fato é que o filme chega com a chancela de sua indicação ao Emmy 2021 como "Melhor Filme para TV".

Sylvie (Tessa Thompson) é uma moça comprometida e apaixonada por música que trabalha na loja de discos de seu pai, mas sonha em ser uma produtora de TV. Quando conhece Robert (Nnamdi Asomugha) vê que seu amor é personificado pelo talentoso músico em ascensão. A partir daí, Sylvie precisa lidar com suas escolhas antes de decidir entre ficar ao lado do grande amor da sua vida, buscar seus sonhos ou viver o futuro que sua mãe escolheu para ela. Confira o trailer (em inglês):

O filme tem uma ambientação criada em cima dos anos 60 de uma Nova Yorke movida pelo jazz - e é bastante competente nesse quesito. Desenho de Produção, Figurino e a Fotografia do Declan Quinn (o mesmo de "Hamilton" e "A Cabana") estão fielmente alinhadas com o conceito estético mais clássico que o Diretor Eugene Ashe (de "Homecoming") quis imprimir. As cores mais contrastadas são levemente esverdeados em alguns momentos e mais escuras ou amareladas em outros. Até a inserção de uma excelente trilha sonora e letterings de apresentação e encerramento se comunicam com o visual de "O Amor de Sylvie" organicamente - de fato é um excelente trabalho, coerente!

O roteiro em si é simples, mas potente. Os dois primeiros atos focam no romance como barreira social e o terceiro traz mais o lado pessoal para a narrativa. Elementos como racismo e igualdade de gêneros são delicadamente bem pontuados, passando a mensagem, mas sem levantar nenhum tipo de bandeira ou ser institucional demais - o que vale é o sentimento disso tudo, afinal, estamos falando de um romance clássico! Se Nnamdi Asomugha é uma ótima surpresa, é Tessa Thompson que conquista a nossa simpatia imediatamente - sua composição é suave, sem excessos, no tom exato para nos fazer sentir suas aflições ao mesmo tempo que é forte o suficiente para nos deixar claro suas intenções.

"O Amor de Sylvie" tem um gostinho de nostalgia, uma atmosfera encantadora, mas também, como comentei, é bastante previsível. O filme segue exatamente o arco do típico romance "Sessão da Tarde" - o que não significa que o resultado seja ruim, muito pelo contrário, ele é realmente bom. Pode dar o play sem medo, porque a história vai te deixar com o coração leve e com a alma preenchida!

E atenção: o filme não acaba com o "The End", atenção aos letterings finais.

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"O Amor de Sylvie" é basicamente uma linda homenagem aos romances clássicos do cinema dos anos 60 - em sua forma e em seu conteúdo! Um filme delicioso de assistir, leve e bem conduzido, mesmo quando se apoia em fórmulas e soluções completamente previsíveis. O fato é que o filme chega com a chancela de sua indicação ao Emmy 2021 como "Melhor Filme para TV".

Sylvie (Tessa Thompson) é uma moça comprometida e apaixonada por música que trabalha na loja de discos de seu pai, mas sonha em ser uma produtora de TV. Quando conhece Robert (Nnamdi Asomugha) vê que seu amor é personificado pelo talentoso músico em ascensão. A partir daí, Sylvie precisa lidar com suas escolhas antes de decidir entre ficar ao lado do grande amor da sua vida, buscar seus sonhos ou viver o futuro que sua mãe escolheu para ela. Confira o trailer (em inglês):

O filme tem uma ambientação criada em cima dos anos 60 de uma Nova Yorke movida pelo jazz - e é bastante competente nesse quesito. Desenho de Produção, Figurino e a Fotografia do Declan Quinn (o mesmo de "Hamilton" e "A Cabana") estão fielmente alinhadas com o conceito estético mais clássico que o Diretor Eugene Ashe (de "Homecoming") quis imprimir. As cores mais contrastadas são levemente esverdeados em alguns momentos e mais escuras ou amareladas em outros. Até a inserção de uma excelente trilha sonora e letterings de apresentação e encerramento se comunicam com o visual de "O Amor de Sylvie" organicamente - de fato é um excelente trabalho, coerente!

O roteiro em si é simples, mas potente. Os dois primeiros atos focam no romance como barreira social e o terceiro traz mais o lado pessoal para a narrativa. Elementos como racismo e igualdade de gêneros são delicadamente bem pontuados, passando a mensagem, mas sem levantar nenhum tipo de bandeira ou ser institucional demais - o que vale é o sentimento disso tudo, afinal, estamos falando de um romance clássico! Se Nnamdi Asomugha é uma ótima surpresa, é Tessa Thompson que conquista a nossa simpatia imediatamente - sua composição é suave, sem excessos, no tom exato para nos fazer sentir suas aflições ao mesmo tempo que é forte o suficiente para nos deixar claro suas intenções.

"O Amor de Sylvie" tem um gostinho de nostalgia, uma atmosfera encantadora, mas também, como comentei, é bastante previsível. O filme segue exatamente o arco do típico romance "Sessão da Tarde" - o que não significa que o resultado seja ruim, muito pelo contrário, ele é realmente bom. Pode dar o play sem medo, porque a história vai te deixar com o coração leve e com a alma preenchida!

E atenção: o filme não acaba com o "The End", atenção aos letterings finais.

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O Apartamento

Tem Diretor que te dá a certeza de um grande filme e o iraniano Asghar Farhadié um desses caras. Todos os filmes dele são realmente muito bons, acima da média! "O apartamento" não é diferente: ganhou Cannes, Oscar, Globo de Ouro e mais de 80 festivais importantes pelo mundo!

"The Salesman" (em titulo internacional) conta a história de um casal que é obrigado a se mudar para um apto onde a antiga moradora era uma prostituta. Essa particularidade acaba gerando uma situação que marca a relação deles, iniciando um jogo psicológico ao melhor estilo Denis Villeneuve em "Os Suspeitos". Confira o trailer:

A trama de "O Apartamento" apresenta o casal Emad (Shahab Hosseini) e Rana (Taraneh Alidoosti) novos locatários do apartamento de Babak (Babak Karimi), que acabou despejando a antiga moradora, uma prostituta. Certa noite, Rana esquece a porta do apartamento aberta e acaba sendo estuprada por um intruso misterioso que deixa para trás algumas pistas de sua identidade. Revoltado, Emad prefere não avisar a polícia e inicia uma investigação por conta própria na tentativa de descobrir o autor do crime enquanto tenta apoiar sua esposa, manter seu emprego, superar o trauma e continuar sua vida.

Uma das coisas que precisamos elogiar no trabalho sensacional do Asghar Farhadi é sua discrição - ele dirige seus filmes sem querer aparecer mais do que sua obra. Em todos os seus trabalhos, ele coloca a câmera sempre no melhor lugar, mesmo que esse lugar seja o mais óbvio possível para contar aquela parte da história. Ele é muito técnico, seguro e prioriza o trabalho de direção de atores como poucos da sua geração - o que inegavelmente faz toda a diferença. Reparem aqui no trabalho profundo de Hosseini e Alidoosti!

Outra coisa que chama muito a atenção ao acompanhar o trabalho de Farhadi é que ele escreve todos os filmes que dirige - chega ser impressionante como ele consegue manter a qualidade da escrita alinhada com a sua capacidade como diretor. Em "O Apartamento", ele vai construindo uma narrativa densa e multifacetada, explorando as profundezas da psique humana e as complexas relações interpessoais - eu diria que seu principal gatilho está justamente em desvendar os segredos dos personagens e a questionar suas motivações. Isso cria uma atmosfera de angustia onde, a cada cena, a tensão e o suspense só aumentam, mas de uma forma muito palpável.

Asghar Farhadi tem 2 Oscars, e só não ganhou o terceiro com "O Passado" em 2014 porque seria barbada demais - tanto que já tinha levado o Globo de Ouro naquele ano. Agora é preciso que se diga: "O Apartamento" é indigesto ao retratar temas como violência, vingança, culpa e redenção em uma jornada que não oferece respostas fáceis, mas que nos leva por uma jornada profunda de julgamento e de análise moral dos personagens e, claro, de suas ações. Imperdível!

Sim, estamos diante de um cinema iraniano de muita qualidade!

Tem Diretor que te dá a certeza de um grande filme e o iraniano Asghar Farhadié um desses caras. Todos os filmes dele são realmente muito bons, acima da média! "O apartamento" não é diferente: ganhou Cannes, Oscar, Globo de Ouro e mais de 80 festivais importantes pelo mundo!

"The Salesman" (em titulo internacional) conta a história de um casal que é obrigado a se mudar para um apto onde a antiga moradora era uma prostituta. Essa particularidade acaba gerando uma situação que marca a relação deles, iniciando um jogo psicológico ao melhor estilo Denis Villeneuve em "Os Suspeitos". Confira o trailer:

A trama de "O Apartamento" apresenta o casal Emad (Shahab Hosseini) e Rana (Taraneh Alidoosti) novos locatários do apartamento de Babak (Babak Karimi), que acabou despejando a antiga moradora, uma prostituta. Certa noite, Rana esquece a porta do apartamento aberta e acaba sendo estuprada por um intruso misterioso que deixa para trás algumas pistas de sua identidade. Revoltado, Emad prefere não avisar a polícia e inicia uma investigação por conta própria na tentativa de descobrir o autor do crime enquanto tenta apoiar sua esposa, manter seu emprego, superar o trauma e continuar sua vida.

Uma das coisas que precisamos elogiar no trabalho sensacional do Asghar Farhadi é sua discrição - ele dirige seus filmes sem querer aparecer mais do que sua obra. Em todos os seus trabalhos, ele coloca a câmera sempre no melhor lugar, mesmo que esse lugar seja o mais óbvio possível para contar aquela parte da história. Ele é muito técnico, seguro e prioriza o trabalho de direção de atores como poucos da sua geração - o que inegavelmente faz toda a diferença. Reparem aqui no trabalho profundo de Hosseini e Alidoosti!

Outra coisa que chama muito a atenção ao acompanhar o trabalho de Farhadi é que ele escreve todos os filmes que dirige - chega ser impressionante como ele consegue manter a qualidade da escrita alinhada com a sua capacidade como diretor. Em "O Apartamento", ele vai construindo uma narrativa densa e multifacetada, explorando as profundezas da psique humana e as complexas relações interpessoais - eu diria que seu principal gatilho está justamente em desvendar os segredos dos personagens e a questionar suas motivações. Isso cria uma atmosfera de angustia onde, a cada cena, a tensão e o suspense só aumentam, mas de uma forma muito palpável.

Asghar Farhadi tem 2 Oscars, e só não ganhou o terceiro com "O Passado" em 2014 porque seria barbada demais - tanto que já tinha levado o Globo de Ouro naquele ano. Agora é preciso que se diga: "O Apartamento" é indigesto ao retratar temas como violência, vingança, culpa e redenção em uma jornada que não oferece respostas fáceis, mas que nos leva por uma jornada profunda de julgamento e de análise moral dos personagens e, claro, de suas ações. Imperdível!

Sim, estamos diante de um cinema iraniano de muita qualidade!

O Castelo de Vidro

"O Castelo de Vidro" é excelente, mas, admito, achei pesado! 

Baseado no livro autobiográfico da jornalistaJeannette Walls, o filme não foca na sua carreira profissional, e sim na sua vida em família desde a infância. É uma história (real) difícil, mas muito bem resolvida no roteiro, sobre uma jovem menina que atinge a maioridade em uma família nômade completamente desestruturada, com uma mãe excêntrica e um pai alcoólatra, e que tenta despertar a imaginação dos irmãos com a esperança que elas se abstraiam da pobreza em que vivem.

Muito bem filmado pelo Destin Daniel Cretton, outro jovem diretor que, de um curta, fez um outro filme de grande sucesso em festivais - chegando a ganhar Locarno em 2013 com seu "Short Term 12" (Temporário 12). Em "The Glass Castle" (título original), ele repete a parceria com a ótima Brie Larson, mas quem rouba a cena é o Woody Harrelson. Embora possa parecer um pouco fora do tom, apoiado em esteriótipos locais, ele traz a dor de quem vive uma dependência, mas acredita que pode compensar sua fraqueza com uma máscara de inabalável. Impressionante como ele trabalha essa dualidade e influencia nosso julgamento a cada cena. Naomi Watts também se desconstruiu para sua personagem e foi muito bem - ambos mereceram todos os elogios, porém foram completamente esquecidos no Oscar 2018!

"The Glass Castle" é um filme tecnicamente muito bem realizado, muito honesto na sua proposta e com uma história difícil de digerir pela sua complexidade moral. Vale muito a pena!!!

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"O Castelo de Vidro" é excelente, mas, admito, achei pesado! 

Baseado no livro autobiográfico da jornalistaJeannette Walls, o filme não foca na sua carreira profissional, e sim na sua vida em família desde a infância. É uma história (real) difícil, mas muito bem resolvida no roteiro, sobre uma jovem menina que atinge a maioridade em uma família nômade completamente desestruturada, com uma mãe excêntrica e um pai alcoólatra, e que tenta despertar a imaginação dos irmãos com a esperança que elas se abstraiam da pobreza em que vivem.

Muito bem filmado pelo Destin Daniel Cretton, outro jovem diretor que, de um curta, fez um outro filme de grande sucesso em festivais - chegando a ganhar Locarno em 2013 com seu "Short Term 12" (Temporário 12). Em "The Glass Castle" (título original), ele repete a parceria com a ótima Brie Larson, mas quem rouba a cena é o Woody Harrelson. Embora possa parecer um pouco fora do tom, apoiado em esteriótipos locais, ele traz a dor de quem vive uma dependência, mas acredita que pode compensar sua fraqueza com uma máscara de inabalável. Impressionante como ele trabalha essa dualidade e influencia nosso julgamento a cada cena. Naomi Watts também se desconstruiu para sua personagem e foi muito bem - ambos mereceram todos os elogios, porém foram completamente esquecidos no Oscar 2018!

"The Glass Castle" é um filme tecnicamente muito bem realizado, muito honesto na sua proposta e com uma história difícil de digerir pela sua complexidade moral. Vale muito a pena!!!

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O Chef

Curioso para quem gosta do universo cheio de glamour dos grandes chefs e angustiante para aqueles que entendem que o que acontece no palco não necessariamente reflete a vida real que se passa na coxia. "O Chef" é um filme intenso e verdadeiramente imersivo que coloca a audiência no meio do caos de um restaurante de alto nível em uma noite particularmente difícil. Tecnicamente irretocável graças ao seu plano-sequência de 90 minutos, o filme dirigido por Philip Barantini (de "O Acusado") acompanha o chef Andy Jones (Stephen Graham) que enfrenta uma série de crises pessoais e profissionais em seu restaurante. Olha, o fato de ter sido filmado em tempo real e sem cortes, só aumenta a tensão do início ao fim, oferecendo uma experiência que mistura a força emocional de "Whiplash" com o universo de "Pegando Fogo" ou de "O Urso"!

"Boiling Point" (no original) se passa em uma única noite, onde Andy tenta manter o controle enquanto tudo ao seu redor começa a desmoronar. Entre clientes exigentes, tensões entre a equipe e problemas pessoais sérios, o chef precisa lidar com a crescente sensação de um colapso iminente - o uso do plano-sequência amplifica a urgência, fazendo com que a audiência tenha a exata sensação do toda a pressão que um chef pode enfrentar na sua carreira. Confira o trailer (em inglês):

Talvez o grande segredo de "O Chef" seja seu roteiro. Escrito pelo próprio Barantini ao lado de seu parceiro de longa data, James Cummings, o texto vai além de apenas mostrar os bastidores de uma cozinha, já que ele explora as consequências emocionais de trabalhar sob a necessidade constante de excelência. A narrativa revela as fragilidades dos personagens e como o estresse extremo pode afetar suas vidas pessoais e suas performances profissionais. O trabalho de Barantini na direção é notável, especialmente por sua escolha ousada de filmar todo o roteiro sem cortes - a sensação de urgência é terrível, amplificando nossa imersão (o que nos leva a compartilhar o estresse dos personagens de uma maneira visceral). Repare como a câmera se move bem fluída pelos corredores estreitos e agitados do restaurante, seguindo os personagens organicamente e mantendo a atmosfera de tensão em cada momento. Repleto de diálogos rápidos e realistas, que ajudam a criar essa atmosfera autêntica e crua, eu diria que o filme, em sua "forma" e "conteúdo", tem uma pegada bem documental capaz de deixar muitas marcas!

Stephen Graham brilha como protagonista, trazendo uma performance cheia de nuances. Ele transmite a fragilidade de Andy, um homem à beira de um colapso, tentando manter uma fachada de controle enquanto sua vida pessoal e profissional se desfazem por sua culpa. O elenco de apoio, incluindo Vinette Robinson (a impagável, Carly) e a talentosa Lauryn Ajufo (como Andrea) também merecem elogios - são atuações impactantes, que enriquecem o drama principal com muito subtexto. Obviamente que a fotografia do jovem Matthew Lewis também brilha - ele destaca o ambiente claustrofóbico e o frenesi da cozinha como se a câmera fosse um personagem invisível, movendo-se pelos espaços apertados e capturando a tensão crescente entre os funcionários e os clientes. O desenho de som é incrível: o som natural da cozinha, com o barulho constante de pratos, panelas e ordens sendo gritadas, cria uma imersão completa no ambiente caótico que tenta se esconder na trilha sonora sutil e diegética, permitindo que os sons do ambiente, o silêncio e os diálogos ocupem sempre o primeiro plano.

Agora saiba que "O Chef" pode dividir opniões pelas suas escolhas conceituais e por ser um retrato real de uma profissão que precisa fugir dos holofotes para entregar o seu valor. Para aqueles que embarcarem na proposta do diretor, esteja preparado para um filme que se destaca tanto pelas escolhas técnicas quanto pela profundidade emocional de seus personagens - e isso vai te tirar da zona de conforto, pode apostar. Embora pequeno em escala, "O Chef" tem um impacto significativo na nossa experiência como audiência e certamente agradará tanto aos amantes de dramas mais intensos quanto os apaixonados por gastronomia. 

Vale muito o seu play!

Uma curiosidade: o filme gerou uma série produzida pela BBC focada na personagem Carly que vem recebendo muitos elogios.

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Curioso para quem gosta do universo cheio de glamour dos grandes chefs e angustiante para aqueles que entendem que o que acontece no palco não necessariamente reflete a vida real que se passa na coxia. "O Chef" é um filme intenso e verdadeiramente imersivo que coloca a audiência no meio do caos de um restaurante de alto nível em uma noite particularmente difícil. Tecnicamente irretocável graças ao seu plano-sequência de 90 minutos, o filme dirigido por Philip Barantini (de "O Acusado") acompanha o chef Andy Jones (Stephen Graham) que enfrenta uma série de crises pessoais e profissionais em seu restaurante. Olha, o fato de ter sido filmado em tempo real e sem cortes, só aumenta a tensão do início ao fim, oferecendo uma experiência que mistura a força emocional de "Whiplash" com o universo de "Pegando Fogo" ou de "O Urso"!

"Boiling Point" (no original) se passa em uma única noite, onde Andy tenta manter o controle enquanto tudo ao seu redor começa a desmoronar. Entre clientes exigentes, tensões entre a equipe e problemas pessoais sérios, o chef precisa lidar com a crescente sensação de um colapso iminente - o uso do plano-sequência amplifica a urgência, fazendo com que a audiência tenha a exata sensação do toda a pressão que um chef pode enfrentar na sua carreira. Confira o trailer (em inglês):

Talvez o grande segredo de "O Chef" seja seu roteiro. Escrito pelo próprio Barantini ao lado de seu parceiro de longa data, James Cummings, o texto vai além de apenas mostrar os bastidores de uma cozinha, já que ele explora as consequências emocionais de trabalhar sob a necessidade constante de excelência. A narrativa revela as fragilidades dos personagens e como o estresse extremo pode afetar suas vidas pessoais e suas performances profissionais. O trabalho de Barantini na direção é notável, especialmente por sua escolha ousada de filmar todo o roteiro sem cortes - a sensação de urgência é terrível, amplificando nossa imersão (o que nos leva a compartilhar o estresse dos personagens de uma maneira visceral). Repare como a câmera se move bem fluída pelos corredores estreitos e agitados do restaurante, seguindo os personagens organicamente e mantendo a atmosfera de tensão em cada momento. Repleto de diálogos rápidos e realistas, que ajudam a criar essa atmosfera autêntica e crua, eu diria que o filme, em sua "forma" e "conteúdo", tem uma pegada bem documental capaz de deixar muitas marcas!

Stephen Graham brilha como protagonista, trazendo uma performance cheia de nuances. Ele transmite a fragilidade de Andy, um homem à beira de um colapso, tentando manter uma fachada de controle enquanto sua vida pessoal e profissional se desfazem por sua culpa. O elenco de apoio, incluindo Vinette Robinson (a impagável, Carly) e a talentosa Lauryn Ajufo (como Andrea) também merecem elogios - são atuações impactantes, que enriquecem o drama principal com muito subtexto. Obviamente que a fotografia do jovem Matthew Lewis também brilha - ele destaca o ambiente claustrofóbico e o frenesi da cozinha como se a câmera fosse um personagem invisível, movendo-se pelos espaços apertados e capturando a tensão crescente entre os funcionários e os clientes. O desenho de som é incrível: o som natural da cozinha, com o barulho constante de pratos, panelas e ordens sendo gritadas, cria uma imersão completa no ambiente caótico que tenta se esconder na trilha sonora sutil e diegética, permitindo que os sons do ambiente, o silêncio e os diálogos ocupem sempre o primeiro plano.

Agora saiba que "O Chef" pode dividir opniões pelas suas escolhas conceituais e por ser um retrato real de uma profissão que precisa fugir dos holofotes para entregar o seu valor. Para aqueles que embarcarem na proposta do diretor, esteja preparado para um filme que se destaca tanto pelas escolhas técnicas quanto pela profundidade emocional de seus personagens - e isso vai te tirar da zona de conforto, pode apostar. Embora pequeno em escala, "O Chef" tem um impacto significativo na nossa experiência como audiência e certamente agradará tanto aos amantes de dramas mais intensos quanto os apaixonados por gastronomia. 

Vale muito o seu play!

Uma curiosidade: o filme gerou uma série produzida pela BBC focada na personagem Carly que vem recebendo muitos elogios.

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