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The Con

Antes de mais nada é preciso alinhar as expectativas: "The Con" não é uma série documental - pelo menos não como estamos acostumados a encontrar nas plataformas de streaming. "The Con" é um programa de TV que está disponível em um streaming. Dito isso, a série antológica da ABC americana se apoia em um conteúdo que vem fazendo muito sucesso ultimamente: contar histórias de falcatruas pela ótica de quem sofreu a fraude e te garanto: embora cruel, é muito divertido!

Whoopi Goldberg narra esta série que explora histórias perturbadoras de pessoas enganadas por promessas que provaram serem boas demais para, de fato, serem verdadeiras. Confira o trailer do episódio de estreia (em inglês):

Veja, por se tratar de uma série para a TV, você não vai encontrar uma profundidade na narrativa -  a proposta é, propositalmente, contar uma história absurda, mas sem se preocupar em conectar todos os pontos ou criar um perfil mais aprofundado dos criminosos. Muito pelo contrário, a ideia de "The Con" é entreter e para isso ele usa um formato bem estabelecido em outros gêneros (como em realities de gastronomia, transformações ou de empreendedorismo) para criar uma atmosfera de suspense e ser a base de toda uma temporada, não importando a história que está sendo contada no episódio. Do tom da narração à trilha sonora escolhida, tudo tem um certo, digamos, sensacionalismo, mas isso não quer dizer que não tenha qualidade, é só o estilo - até porquê o diretor, Star Price, vem chancelado com 10 indicações ao Emmy no currículo.

Em 8 episódios vemos desde uma fraude de identidade em um romance mentiroso até o escândalo de admissão em faculdades nos EUA, passando pelo inesquecível "Fyre Festival". A dinâmica da narrativa se propõe a revelar como as vítimas foram enganadas e mostrar o custo dessa falsa confiança – seja ela emocional ou financeira. Apresentando entrevistas com as principais pessoas envolvidas nos golpes, incluindo vítimas e testemunhas oculares e, em alguns casos, policiais e os próprios golpistas, "The Con" é aquele típico programa para relaxar, se indignar e, eventualmente, dar até umas boas risadas com nossa terrível mania de sempre julgar os fatos (e as vítimas).

Se você gostou de documentários como "Não confie em ninguém: a caça ao rei das criptomoedas", "O Golpista do Tinder", "Fyre Festval" e "Educação Americana - Fraude e Privilégio" (os dois últimos, inclusive com episódios inteiramente dedicados aos fatos), ou até de séries como "Inventando Anna""Dirty John – O Golpe do Amor", "O Paraíso e a Serpente" e "Má Educação", pode dar o play tranquilamente que sua diversão está garantida. Aliás, reparem na história Anthony Gignac, que apesar de ter nascido no estado de Michigan, usava uma identidade falsa para forjar uma origem saudita e mais do que isso: ele se declarava membro da família real; ou mesmo no caso de Marianne Smyth, uma jovem que alegou ser uma herdeira irlandesa cuja família estava tentando roubar sua enorme herança, mas que no fundo queria mesmo é ganhar muito dinheiro nas custas dos amigos (bem no estilo de Anna Delvey).

Olha, vale muito a pena como aquele entretenimento despretensioso.

Assista Agora

Antes de mais nada é preciso alinhar as expectativas: "The Con" não é uma série documental - pelo menos não como estamos acostumados a encontrar nas plataformas de streaming. "The Con" é um programa de TV que está disponível em um streaming. Dito isso, a série antológica da ABC americana se apoia em um conteúdo que vem fazendo muito sucesso ultimamente: contar histórias de falcatruas pela ótica de quem sofreu a fraude e te garanto: embora cruel, é muito divertido!

Whoopi Goldberg narra esta série que explora histórias perturbadoras de pessoas enganadas por promessas que provaram serem boas demais para, de fato, serem verdadeiras. Confira o trailer do episódio de estreia (em inglês):

Veja, por se tratar de uma série para a TV, você não vai encontrar uma profundidade na narrativa -  a proposta é, propositalmente, contar uma história absurda, mas sem se preocupar em conectar todos os pontos ou criar um perfil mais aprofundado dos criminosos. Muito pelo contrário, a ideia de "The Con" é entreter e para isso ele usa um formato bem estabelecido em outros gêneros (como em realities de gastronomia, transformações ou de empreendedorismo) para criar uma atmosfera de suspense e ser a base de toda uma temporada, não importando a história que está sendo contada no episódio. Do tom da narração à trilha sonora escolhida, tudo tem um certo, digamos, sensacionalismo, mas isso não quer dizer que não tenha qualidade, é só o estilo - até porquê o diretor, Star Price, vem chancelado com 10 indicações ao Emmy no currículo.

Em 8 episódios vemos desde uma fraude de identidade em um romance mentiroso até o escândalo de admissão em faculdades nos EUA, passando pelo inesquecível "Fyre Festival". A dinâmica da narrativa se propõe a revelar como as vítimas foram enganadas e mostrar o custo dessa falsa confiança – seja ela emocional ou financeira. Apresentando entrevistas com as principais pessoas envolvidas nos golpes, incluindo vítimas e testemunhas oculares e, em alguns casos, policiais e os próprios golpistas, "The Con" é aquele típico programa para relaxar, se indignar e, eventualmente, dar até umas boas risadas com nossa terrível mania de sempre julgar os fatos (e as vítimas).

Se você gostou de documentários como "Não confie em ninguém: a caça ao rei das criptomoedas", "O Golpista do Tinder", "Fyre Festval" e "Educação Americana - Fraude e Privilégio" (os dois últimos, inclusive com episódios inteiramente dedicados aos fatos), ou até de séries como "Inventando Anna""Dirty John – O Golpe do Amor", "O Paraíso e a Serpente" e "Má Educação", pode dar o play tranquilamente que sua diversão está garantida. Aliás, reparem na história Anthony Gignac, que apesar de ter nascido no estado de Michigan, usava uma identidade falsa para forjar uma origem saudita e mais do que isso: ele se declarava membro da família real; ou mesmo no caso de Marianne Smyth, uma jovem que alegou ser uma herdeira irlandesa cuja família estava tentando roubar sua enorme herança, mas que no fundo queria mesmo é ganhar muito dinheiro nas custas dos amigos (bem no estilo de Anna Delvey).

Olha, vale muito a pena como aquele entretenimento despretensioso.

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The Dropout

Antes de assistir "The Dropout" eu sugiro que você conheça a história da Theranos, especificamente de sua fundadora Elizabeth Holmes. Não que a minissérie do Hulu (aqui no Brasil distribuída pelo Disney+) baseada no podcast homônimo apresentado por Rebecca Jarvis e produzido pela ABC News, não seja suficiente o bastante para nos mostrar um recorte bem relevante do que foi a jornada dessa staturp que transformou seu valuation  de 10 bilhões em zero "da noite para o dia", mas te garanto: se você assistir o documentário da HBO, "A Inventora: À Procura de Sangue no Vale do Silício", sua experiência será outra - muito mais completa (e curiosa)! 

Elizabeth Holmes (Amanda Seyfried) é uma jovem empresária que afirmou ter criado uma forma revolucionária de analisar exames de sangue, utilizando apenas uma pequena gota tirada do dedo ela seria capaz de identificar 200 doenças com um custo de apenas dez dólares. Rapidamente, Holmes conquistou o desejo de investidores e se tornou uma das pessoas mais ricas e influentes do Vale do Silício, se apoiando na promessa de "disruptar" o mercado valioso de biotecnologia. A grande questão é que tudo ficou na promessa e mesmo com um propósito real, Elizabeth Holmes se tornou uma pária quando o mundo descobriu que tudo não passou de uma grande fraude. Confira o trailer (em inglês):

Antes de sucessos como "Inventando Anna" ou "Fyre Festival", era  difícil acreditar que uma jovem de 19 anos sem o que chamamos de track record (uma espécie de histórico de sucesso) no universo empreendedor, seria capaz de fazer com que investidores, cientistas e até políticos comprassem uma ideia que sequer havia sido testada e, pior, comprovada. Mas é exatamente o que Elizabeth Holmes, uma ex-aluna de Stanford, fez após largar a faculdade (por isso o nome "dropout" do título) em 2003.

Embora o roteiro da minissérie sofra para retratar todos os anos entre o desejo, a ideia, a construção e a derrocada da Theranos, deixando alguns personagens importantes completamente fora de contexto (e de continuidade) dentro da narrativa, é de se elogiar a forma como a linha temporal é construída. Divida em capítulos, respeitando a minutagem de cada episódio, "The Dropout" não se preocupa com os saltos temporais, nem com a consistência da história para criar um drama envolvente e cercado de muitas curiosidades. Ao estabelecer a relação entre Holmes e o co-CEO Sunny Balwani (Naveen Andrews), embarcamos na intimidade da personagem e como suas conquistas ajudaram a transformar sua personalidade perante todos que a rodeavam. A frase clássica já no último episódio define exatamente essa profundidade e complexidade que Amanda Seyfried conseguiu entregar - ela pergunta para a mãe: “Se você escolhe esquecer de algumas coisas, isso é o mesmo que mentir?”

O tom da minissérie deixa a veracidade das situações um pouco em segundo plano para priorizar conflitos encenados e carregar no drama - o trio de diretores, Michael Showalter (de "Os Olhos de Tammy Faye"), Francesa Gregorini (de "Killing Eve") e Erica Watson (de "Snowpiercer") são muito competentes em encontrar o cerne de tensão de cada cena, de cada interação da protagonista com seus investidores, colaboradores e familiares, sem carregar no didatismo. Com isso  "The Dropout" acaba equilibrando o elemento documental da história com o entretenimento dinâmico da proposta narrativa, impondo uma experiência das mais agradáveis, até para aqueles pouco envolvidos no universo de startups que anda tão em alta.

Vale muito o seu play!

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Antes de assistir "The Dropout" eu sugiro que você conheça a história da Theranos, especificamente de sua fundadora Elizabeth Holmes. Não que a minissérie do Hulu (aqui no Brasil distribuída pelo Disney+) baseada no podcast homônimo apresentado por Rebecca Jarvis e produzido pela ABC News, não seja suficiente o bastante para nos mostrar um recorte bem relevante do que foi a jornada dessa staturp que transformou seu valuation  de 10 bilhões em zero "da noite para o dia", mas te garanto: se você assistir o documentário da HBO, "A Inventora: À Procura de Sangue no Vale do Silício", sua experiência será outra - muito mais completa (e curiosa)! 

Elizabeth Holmes (Amanda Seyfried) é uma jovem empresária que afirmou ter criado uma forma revolucionária de analisar exames de sangue, utilizando apenas uma pequena gota tirada do dedo ela seria capaz de identificar 200 doenças com um custo de apenas dez dólares. Rapidamente, Holmes conquistou o desejo de investidores e se tornou uma das pessoas mais ricas e influentes do Vale do Silício, se apoiando na promessa de "disruptar" o mercado valioso de biotecnologia. A grande questão é que tudo ficou na promessa e mesmo com um propósito real, Elizabeth Holmes se tornou uma pária quando o mundo descobriu que tudo não passou de uma grande fraude. Confira o trailer (em inglês):

Antes de sucessos como "Inventando Anna" ou "Fyre Festival", era  difícil acreditar que uma jovem de 19 anos sem o que chamamos de track record (uma espécie de histórico de sucesso) no universo empreendedor, seria capaz de fazer com que investidores, cientistas e até políticos comprassem uma ideia que sequer havia sido testada e, pior, comprovada. Mas é exatamente o que Elizabeth Holmes, uma ex-aluna de Stanford, fez após largar a faculdade (por isso o nome "dropout" do título) em 2003.

Embora o roteiro da minissérie sofra para retratar todos os anos entre o desejo, a ideia, a construção e a derrocada da Theranos, deixando alguns personagens importantes completamente fora de contexto (e de continuidade) dentro da narrativa, é de se elogiar a forma como a linha temporal é construída. Divida em capítulos, respeitando a minutagem de cada episódio, "The Dropout" não se preocupa com os saltos temporais, nem com a consistência da história para criar um drama envolvente e cercado de muitas curiosidades. Ao estabelecer a relação entre Holmes e o co-CEO Sunny Balwani (Naveen Andrews), embarcamos na intimidade da personagem e como suas conquistas ajudaram a transformar sua personalidade perante todos que a rodeavam. A frase clássica já no último episódio define exatamente essa profundidade e complexidade que Amanda Seyfried conseguiu entregar - ela pergunta para a mãe: “Se você escolhe esquecer de algumas coisas, isso é o mesmo que mentir?”

O tom da minissérie deixa a veracidade das situações um pouco em segundo plano para priorizar conflitos encenados e carregar no drama - o trio de diretores, Michael Showalter (de "Os Olhos de Tammy Faye"), Francesa Gregorini (de "Killing Eve") e Erica Watson (de "Snowpiercer") são muito competentes em encontrar o cerne de tensão de cada cena, de cada interação da protagonista com seus investidores, colaboradores e familiares, sem carregar no didatismo. Com isso  "The Dropout" acaba equilibrando o elemento documental da história com o entretenimento dinâmico da proposta narrativa, impondo uma experiência das mais agradáveis, até para aqueles pouco envolvidos no universo de startups que anda tão em alta.

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The Righteous Gemstones

Tente imaginar um sátira de "Succession", com a mesma configuração de família disfuncional, que se passa no universo da indústria da fé e com aquele leve toque de ironia ao melhor estilo Vince Gilligan - pois é isso que você vai encontrar na incrível "The Righteous Gemstones". Criada e protagonizada por Danny McBride, essa produção da HBO é uma sátira brilhante, ácida e incrivelmente divertida sobre o controverso mundo dos televangelistas norte-americanos dos anos 80. Comparável em estilo ao humor corrosivo e provocativo de produções como "Better Call Saul", mas com uma identidade própria carregada pela irreverência típica de McBride, a série explora as contradições e a hipocrisia de uma família que administra um verdadeiro império religioso, tentando se equilibrar entre o divino e o absolutamente profano.

A trama acompanha a rica e extravagante família Gemstone, liderada pelo patriarca Eli Gemstone (John Goodman), fundador de um império de televangelismo que atrai milhares de seguidores e movimenta milhões de dólares anualmente. Seus filhos, Jesse (Danny McBride), Kelvin (Adam Devine) e Judy (Edi Patterson), vivem em meio a um luxo quase obsceno, mas enfrentam constantemente escândalos, disputas internas, e contradições entre o que pregam e como realmente vivem. Com misto de humor e crítica, a série expõe as engrenagens por trás dos espetáculos religiosos midiáticos e das personalidades que enriquecem vendendo milagres e salvação. Confira o trailer (em inglês):

Danny McBride, além de criar e protagonizar, ainda lidera o roteiro de "The Righteous Gemstones" com extrema competência. Ele estabelece uma narrativa que flui com dinamismo entre o humor escrachado e o drama absurdo, sem nunca perder de vista o equilíbrio entre a sátira social e a crítica à religião como negócio. Como em "Succession", os diálogos são rápidos e inteligentes, apenas o tom é diferente: aqui muitas vezes os conflitos são mais hilários, sempre temperados com um cinismo que funciona perfeitamente dentro do universo cômico criado pela série. Mas não se engane: as semelhanças entre as duas produções da HBO funcionam justamente por suas diferenças – especialmente na rara habilidade de criar personagens deliberadamente antipáticos e complexos, que, paradoxalmente, conquistam o público por meio de suas imperfeições e vulnerabilidades.

Visualmente impecável, a estética colorida e extravagante evidencia o luxo e a ostentação dos Gemstones enraizados nos anos 80 - incluindo cenários grandiosos que vão de megatemplos até mansões exageradamente decoradas. Repare como o excelente trabalho de fotografia e da direção de arte complementam perfeitamente o conceito narrativo da série, destacando o vazio moral que reside por trás de tanto brilho e riqueza. McBride mostra domínio absoluto de sua proposta narrativa também como ator - ele  entrega um Jesse Gemstone que oscila entre arrogância desmedida e uma insegurança quase infantil. Já John Goodman oferece uma performance forte e consistente, garantindo o peso dramático ao melhor estilo Logan Roy - Eli Gemstone tem uma seriedade que contrasta demais com o caos ao seu redor. Adam Devine, por outro lado, explora bem o lado mais ingênuo de Kelvin, enquanto Edi Patterson, como Judy, rouba a cena com uma performance cheia de nuances, personificando o humor caricato de uma mulher buscando aprovação diante de um universo machista que faz da série tão cativante quanto provocadora.

Se há alguma ressalva a fazer em "The Righteous Gemstones" talvez seja o tipo de humor de seu roteiro que, embora brilhante, pode afastar parte da audiência menos confortável com sátiras religiosas ou que prefiram comédias mais suaves - aqui, de fato, nada é suave! "The Righteous Gemstones" é realmente uma dramédia excepcional, que não hesita em expor e criticar com inteligente as contradições da indústria da fé - com um humor politicamente incorreto de aplaudir de pé. Se você gostava da essência de "Succession" e da irreverência non-sense de "Better Call Saul" pode dar o play sem medo de errar - são três temporadas do mais alto nível e a quarta acabou de sair!

Entretenimento inteligente para quem aprecia uma crítica contundente à sociedade contemporânea!

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Tente imaginar um sátira de "Succession", com a mesma configuração de família disfuncional, que se passa no universo da indústria da fé e com aquele leve toque de ironia ao melhor estilo Vince Gilligan - pois é isso que você vai encontrar na incrível "The Righteous Gemstones". Criada e protagonizada por Danny McBride, essa produção da HBO é uma sátira brilhante, ácida e incrivelmente divertida sobre o controverso mundo dos televangelistas norte-americanos dos anos 80. Comparável em estilo ao humor corrosivo e provocativo de produções como "Better Call Saul", mas com uma identidade própria carregada pela irreverência típica de McBride, a série explora as contradições e a hipocrisia de uma família que administra um verdadeiro império religioso, tentando se equilibrar entre o divino e o absolutamente profano.

A trama acompanha a rica e extravagante família Gemstone, liderada pelo patriarca Eli Gemstone (John Goodman), fundador de um império de televangelismo que atrai milhares de seguidores e movimenta milhões de dólares anualmente. Seus filhos, Jesse (Danny McBride), Kelvin (Adam Devine) e Judy (Edi Patterson), vivem em meio a um luxo quase obsceno, mas enfrentam constantemente escândalos, disputas internas, e contradições entre o que pregam e como realmente vivem. Com misto de humor e crítica, a série expõe as engrenagens por trás dos espetáculos religiosos midiáticos e das personalidades que enriquecem vendendo milagres e salvação. Confira o trailer (em inglês):

Danny McBride, além de criar e protagonizar, ainda lidera o roteiro de "The Righteous Gemstones" com extrema competência. Ele estabelece uma narrativa que flui com dinamismo entre o humor escrachado e o drama absurdo, sem nunca perder de vista o equilíbrio entre a sátira social e a crítica à religião como negócio. Como em "Succession", os diálogos são rápidos e inteligentes, apenas o tom é diferente: aqui muitas vezes os conflitos são mais hilários, sempre temperados com um cinismo que funciona perfeitamente dentro do universo cômico criado pela série. Mas não se engane: as semelhanças entre as duas produções da HBO funcionam justamente por suas diferenças – especialmente na rara habilidade de criar personagens deliberadamente antipáticos e complexos, que, paradoxalmente, conquistam o público por meio de suas imperfeições e vulnerabilidades.

Visualmente impecável, a estética colorida e extravagante evidencia o luxo e a ostentação dos Gemstones enraizados nos anos 80 - incluindo cenários grandiosos que vão de megatemplos até mansões exageradamente decoradas. Repare como o excelente trabalho de fotografia e da direção de arte complementam perfeitamente o conceito narrativo da série, destacando o vazio moral que reside por trás de tanto brilho e riqueza. McBride mostra domínio absoluto de sua proposta narrativa também como ator - ele  entrega um Jesse Gemstone que oscila entre arrogância desmedida e uma insegurança quase infantil. Já John Goodman oferece uma performance forte e consistente, garantindo o peso dramático ao melhor estilo Logan Roy - Eli Gemstone tem uma seriedade que contrasta demais com o caos ao seu redor. Adam Devine, por outro lado, explora bem o lado mais ingênuo de Kelvin, enquanto Edi Patterson, como Judy, rouba a cena com uma performance cheia de nuances, personificando o humor caricato de uma mulher buscando aprovação diante de um universo machista que faz da série tão cativante quanto provocadora.

Se há alguma ressalva a fazer em "The Righteous Gemstones" talvez seja o tipo de humor de seu roteiro que, embora brilhante, pode afastar parte da audiência menos confortável com sátiras religiosas ou que prefiram comédias mais suaves - aqui, de fato, nada é suave! "The Righteous Gemstones" é realmente uma dramédia excepcional, que não hesita em expor e criticar com inteligente as contradições da indústria da fé - com um humor politicamente incorreto de aplaudir de pé. Se você gostava da essência de "Succession" e da irreverência non-sense de "Better Call Saul" pode dar o play sem medo de errar - são três temporadas do mais alto nível e a quarta acabou de sair!

Entretenimento inteligente para quem aprecia uma crítica contundente à sociedade contemporânea!

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The Vow

Se você assistiu algum dos dois (razoavelmente) recentes documentários, "A Inventora: À Procura de Sangue no Vale do Silício" (HBO) e "Fyre" (Netflix), você já entendeu como a força de uma comunicação e do poder do convencimento podem influenciar uma pessoa (ou muitas), independente da capacidade de realização que o interlocutor possa ter. Em diferentes níveis, foi isso que Elizabeth Holmes da Theranos fez com seus investidores e Billy McFarland fez com todos que estavam envolvidos em seu Festival megalomaníaco! Pois bem, em "The Vow" surge um personagem raro, que consegue unir, com a mesma competência, a capacidade de comunicação com a de realização e ainda chancelado por um QI de 240 pontos: esse é o fundador da NXIVM, Keith Raniere.

"The Vow", documentário divido em 9 partes de 50 minutos, conta mais do que a história de Keith Raniere, criador de uma empresa de marketing multi-nível, que cresceu absurdamente nos Estados Unidos até ser fechada por sérios problemas trabalhistas. Aproveitando do seu comprovado discurso de convencimento, Keith criou a ESP (Executive Success Programs) um Programa de Sucesso Executivo focado no desenvolvimento pessoal. Seguindo o mesmo conceito de pirâmide, ele foi, pouco a pouco, transformando seus professores em aliciadores e seus alunos em uma espécie de seguidores de uma seita com atuações bastante questionáveis e que, posteriormente, acabou se transformando no principal motivo para uma dura jornada pessoal de ex-membros da organização para desmascarar seu fundador, que se auto-denominava "Vanguarda", e suas reais intenções com tudo isso! Confira o trailer:

A história por trás de "The Vow" chamou atenção da mídia internacional pelo fato da atriz Allison Mack, a Chloe Sullivan em "Smallville", ser uma das aliciadoras mais próxima de Keith Raniere, porém o comentário é muito feliz em dissecar a instituição pelos olhos de quem esteve lá, mas saiu por vontade própria ao perceber que algo estava muito errado. A jornada de três personagens bastante importantes na desconstrução dessa organização criminosa que se tornou a NXIVM, é o ponto de partida para uma história realmente impressionante. Sarah Edmonson, Bonnie Piesse e Mark Vicente, e um pouco mais a frente, Catherine Oxenberg, são acompanhados pela produção durante todos os episódios, contando suas histórias e tentando reverter uma situação que eles mesmos ajudaram a provocar, cada um em seu nível. Ao mesmo tempo vemos inúmeras imagens de arquivos, depoimentos, cenas do treinamento, entrevistas do próprio Keith e sua equipe, e até um encontro bastante impactante com o Dalai-lama.

O que mais me chamou a atenção foram os discursos de Keith: completamente coerentes, bem estruturados e de uma capacidade intelectual e de manipulação que em muitos momentos me fizeram questionar se, em algum momento da vida, eu também não seria uma potencial vítima - tenho certeza que você fará esse mesmo questionamento e talvez por isso, esse sentimento gere tanta vergonha e arrependimento nos protagonistas.

Dê o play sem o menor receio!

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Se você assistiu algum dos dois (razoavelmente) recentes documentários, "A Inventora: À Procura de Sangue no Vale do Silício" (HBO) e "Fyre" (Netflix), você já entendeu como a força de uma comunicação e do poder do convencimento podem influenciar uma pessoa (ou muitas), independente da capacidade de realização que o interlocutor possa ter. Em diferentes níveis, foi isso que Elizabeth Holmes da Theranos fez com seus investidores e Billy McFarland fez com todos que estavam envolvidos em seu Festival megalomaníaco! Pois bem, em "The Vow" surge um personagem raro, que consegue unir, com a mesma competência, a capacidade de comunicação com a de realização e ainda chancelado por um QI de 240 pontos: esse é o fundador da NXIVM, Keith Raniere.

"The Vow", documentário divido em 9 partes de 50 minutos, conta mais do que a história de Keith Raniere, criador de uma empresa de marketing multi-nível, que cresceu absurdamente nos Estados Unidos até ser fechada por sérios problemas trabalhistas. Aproveitando do seu comprovado discurso de convencimento, Keith criou a ESP (Executive Success Programs) um Programa de Sucesso Executivo focado no desenvolvimento pessoal. Seguindo o mesmo conceito de pirâmide, ele foi, pouco a pouco, transformando seus professores em aliciadores e seus alunos em uma espécie de seguidores de uma seita com atuações bastante questionáveis e que, posteriormente, acabou se transformando no principal motivo para uma dura jornada pessoal de ex-membros da organização para desmascarar seu fundador, que se auto-denominava "Vanguarda", e suas reais intenções com tudo isso! Confira o trailer:

A história por trás de "The Vow" chamou atenção da mídia internacional pelo fato da atriz Allison Mack, a Chloe Sullivan em "Smallville", ser uma das aliciadoras mais próxima de Keith Raniere, porém o comentário é muito feliz em dissecar a instituição pelos olhos de quem esteve lá, mas saiu por vontade própria ao perceber que algo estava muito errado. A jornada de três personagens bastante importantes na desconstrução dessa organização criminosa que se tornou a NXIVM, é o ponto de partida para uma história realmente impressionante. Sarah Edmonson, Bonnie Piesse e Mark Vicente, e um pouco mais a frente, Catherine Oxenberg, são acompanhados pela produção durante todos os episódios, contando suas histórias e tentando reverter uma situação que eles mesmos ajudaram a provocar, cada um em seu nível. Ao mesmo tempo vemos inúmeras imagens de arquivos, depoimentos, cenas do treinamento, entrevistas do próprio Keith e sua equipe, e até um encontro bastante impactante com o Dalai-lama.

O que mais me chamou a atenção foram os discursos de Keith: completamente coerentes, bem estruturados e de uma capacidade intelectual e de manipulação que em muitos momentos me fizeram questionar se, em algum momento da vida, eu também não seria uma potencial vítima - tenho certeza que você fará esse mesmo questionamento e talvez por isso, esse sentimento gere tanta vergonha e arrependimento nos protagonistas.

Dê o play sem o menor receio!

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Trabalho Interno

Trabalho Interno

"Trabalho Interno" é daqueles documentários que faz você perder completamente a fé no ser humano. Pode até parecer que o filme tem o objetivo de explicar como um sistema complexo foi desmoronando até encontrar o seu ápice em 2008, mas não, ele vai além: o que vemos na tela é um conjunto de ganância, hipocrisia e total falta de empatia do tamanho do bônus anual de cada um dos executivos dos bancos de investimentos envolvido na crise. Triste, mas real!

Em 2008, uma crise econômica de proporções globais fez com que milhões de pessoas perdessem suas casas e empregos. Ao todo, foram gastos mais de US$ 20 trilhões para combater a situação. Através de uma extensa pesquisa e entrevistas com pessoas ligadas ao mundo financeiro, políticos e jornalistas, é desvendado o relacionamento corrosivo que envolveu representantes da política, da justiça e do mundo acadêmico. Confira o trailer:

"Trabalho Interno" foi o grande vencedor do Oscar de melhor Documentário em 2011 e sua importância justifica o prêmio. Com o roteiro escrito pelos estreantes Chad Beck e Adam Bolt, e dirigido por Charles Ferguson (de "No End in Sight" que fazia uma abordagem critica do governo de George W. Bush e a intervenção americana no Iraque), o documentário surpreende pela clareza com que discute o assunto - é fácil perceber a organicidade do roteiro, nos dando a falsa impressão de que o tema é imensamente mais fácil e que tudo que aconteceu é muito pior do que imaginávamos. A montagem usa de uma narrativa bastante dinâmica, equilibrando perfeitamente entrevistas com animações praticamente auto-explicativas, e ainda uma narração perfeita que une todos os pontos no tom exato e sem rodeios (mérito de Matt Damon).

O bacana é que "Trabalho Interno" não se limita em explicar como a bolha econômica foi sendo construída. Ao melhor estilo "Michael Moore", há uma claro, e positivo, interesse de apontar os culpados e de denunciar, ponto a ponto, como alguns executivos enriqueceram com a crise. A desregulamentação iniciada pelo governo Reagan se estende até a administração de Barack Obama, passando, obviamente, por George W. Bush - Ferguson não passa pano em ninguém e isso qualifica sua posição como cineasta.  O problema é que as denuncias não param por aí, não se salvam professores de universidades como Havard e Columbia, lobistas, diretores de grandes bancos, bancos de investimento e até de equipes econômicas dos presidentes americanos citados. Olha, é de embrulhar o estômago!

A divisão em capítulos ajuda muito a dinâmica do documentário, mas em nenhum momento ele se apoia em performances individuais para nos conquistar. Mesmo quando as perguntas vazam pelo microfone, o foco é muito mais na reação do entrevistado (e são tantas incríveis) do que na espetacularização na situação - e é aqui que o filme se distancia de Moore. "Inside the Job" (título original) é o filme que temos que assistir antes de "Margin Call" ou "A Grande Aposta", afinal ele nos dá a base intelectual para colhermos o que tem de melhor das outras produções. 

Um grande e dolorido documentário! Vale muito seu play!

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"Trabalho Interno" é daqueles documentários que faz você perder completamente a fé no ser humano. Pode até parecer que o filme tem o objetivo de explicar como um sistema complexo foi desmoronando até encontrar o seu ápice em 2008, mas não, ele vai além: o que vemos na tela é um conjunto de ganância, hipocrisia e total falta de empatia do tamanho do bônus anual de cada um dos executivos dos bancos de investimentos envolvido na crise. Triste, mas real!

Em 2008, uma crise econômica de proporções globais fez com que milhões de pessoas perdessem suas casas e empregos. Ao todo, foram gastos mais de US$ 20 trilhões para combater a situação. Através de uma extensa pesquisa e entrevistas com pessoas ligadas ao mundo financeiro, políticos e jornalistas, é desvendado o relacionamento corrosivo que envolveu representantes da política, da justiça e do mundo acadêmico. Confira o trailer:

"Trabalho Interno" foi o grande vencedor do Oscar de melhor Documentário em 2011 e sua importância justifica o prêmio. Com o roteiro escrito pelos estreantes Chad Beck e Adam Bolt, e dirigido por Charles Ferguson (de "No End in Sight" que fazia uma abordagem critica do governo de George W. Bush e a intervenção americana no Iraque), o documentário surpreende pela clareza com que discute o assunto - é fácil perceber a organicidade do roteiro, nos dando a falsa impressão de que o tema é imensamente mais fácil e que tudo que aconteceu é muito pior do que imaginávamos. A montagem usa de uma narrativa bastante dinâmica, equilibrando perfeitamente entrevistas com animações praticamente auto-explicativas, e ainda uma narração perfeita que une todos os pontos no tom exato e sem rodeios (mérito de Matt Damon).

O bacana é que "Trabalho Interno" não se limita em explicar como a bolha econômica foi sendo construída. Ao melhor estilo "Michael Moore", há uma claro, e positivo, interesse de apontar os culpados e de denunciar, ponto a ponto, como alguns executivos enriqueceram com a crise. A desregulamentação iniciada pelo governo Reagan se estende até a administração de Barack Obama, passando, obviamente, por George W. Bush - Ferguson não passa pano em ninguém e isso qualifica sua posição como cineasta.  O problema é que as denuncias não param por aí, não se salvam professores de universidades como Havard e Columbia, lobistas, diretores de grandes bancos, bancos de investimento e até de equipes econômicas dos presidentes americanos citados. Olha, é de embrulhar o estômago!

A divisão em capítulos ajuda muito a dinâmica do documentário, mas em nenhum momento ele se apoia em performances individuais para nos conquistar. Mesmo quando as perguntas vazam pelo microfone, o foco é muito mais na reação do entrevistado (e são tantas incríveis) do que na espetacularização na situação - e é aqui que o filme se distancia de Moore. "Inside the Job" (título original) é o filme que temos que assistir antes de "Margin Call" ou "A Grande Aposta", afinal ele nos dá a base intelectual para colhermos o que tem de melhor das outras produções. 

Um grande e dolorido documentário! Vale muito seu play!

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Trapaça

Esse é mais um título que me fez perguntar: "Onde eu estava que não assisti esse filme antes?". "Trapaça" é uma produção de 2013 que foi indicada, pasmem, em dez categorias no Oscar - e com muito mérito, eu completo. Em uma época onde streaming era uma palavra que nem no dicionário estava, o filme simplesmente passou batido por mim e tenho a impressão de que por muita gente - o que é um pecado, pois ele é excelente, com uma narrativa dinâmica, muito bem dirigido e com performances de cair o queixo de um elenco que conta "só" com Christian Bale, Amy Adams, Bradley Cooper e Jennifer Lawrence (todos indicados ao Oscar, inclusive).

Incrivelmente baseado em um fato real, o filme conta a história de Irving Rosenfeld (Bale), um grande trapaceiro que tem como sócia e amante Sydney Prosser (Adams). Depois de serem surpreendidos e pegos por uma ação do FBI, os dois são forçados a colaborar com o agente Richie DiMaso (Cooper), que infiltra Rosenfeld no mundo da máfia ao mesmo tempo em que tenta conseguir provas do envolvimento político do mais alto escalão do país, em corrupção através do candidato Carmine Polito (Jeremy Renner). Os planos parecem dar certo, até a esposa de Irving, Rosalyn (Lawrence), aparecer e mudar completamente as regras do jogo. Confira o trailer:

Dirigido pelo sempre competente e muito talentoso (cinco vezes indicado ao Oscar), David Owen Russell de "Joy", "Trapaça" é meio que uma mistura de Guy Ritchie com Adam McKay, não visualmente (marca registrada dos dois diretores), mas na dinâmica narrativa, na escolha do tom e na ironia que cada linha de diálogo representa para a história que, a todo momento, soa tão absurda que parece mentira. Russell e seus montadores (Jay Cassidy, Crispin Struthers, Alan Baumgarten) constroem uma linha temporal muito interessante, narrada por diversos pontos de vista, com diferentes personagens, mas sempre mantendo a uma coerência cinematográfica que impressiona pela didática sem ser expositiva. Veja, quando vemos um verdadeiro "Zé Ninguém", careca, barrigudo, brega e, aparentemente, pacato, se transformar em Irving Rosenfeld; temos a certeza que a história vai nos levar para um lugar que nem podemos imaginar.

Escrito pelo próprio Russell ao lado de Eric Warren Singer (de "Top Gun: Maverick"), o filme vai nos surpreendendo a cada movimento dos personagens - como a trapaça está no centro da discussão, é impossível cravar o que de fato é sincero durante toda a jornada. O interessante é que todos os personagens parecem saber disso, e mesmo apoiados em alguns esteriótipos (propositais) e ações normalmente exageradas, toda essa desconfiança funciona como motivação e quando menos esperamos, algo quebra essa cadeia e somos surpreendidos. Talvez a personagem de Lawrence, a Rosalyn Rosenfeld, seja a personificação desse mood  (ela está incrível) ou até mesmo as maravilhosas conversas entre os personagens de Cooper e Louis C.K. (o Stoddard Thorsen) nos escritórios do FBI dos anos 70 sintetizem bem esse conceito um pouco "over" de ser.

"Trapaça" tem a sagacidade de enganar a audiência ao se apresentar como algo mais complexo do que realmente é. Russell foi muito feliz em "sugerir" muito mais do que "mostrar", nos provocando o julgamento a cada novo movimento - mas tudo isso de uma forma tão orgânica e fácil, que nem nos damos conta quando o filme termina. A história não precisa empolgar, não é esse o objetivo, são os personagens e como eles se relacionam que realmente importa - é na profundidade de algo aparentemente superficial que a magia realmente acontece. Uma aula!

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Esse é mais um título que me fez perguntar: "Onde eu estava que não assisti esse filme antes?". "Trapaça" é uma produção de 2013 que foi indicada, pasmem, em dez categorias no Oscar - e com muito mérito, eu completo. Em uma época onde streaming era uma palavra que nem no dicionário estava, o filme simplesmente passou batido por mim e tenho a impressão de que por muita gente - o que é um pecado, pois ele é excelente, com uma narrativa dinâmica, muito bem dirigido e com performances de cair o queixo de um elenco que conta "só" com Christian Bale, Amy Adams, Bradley Cooper e Jennifer Lawrence (todos indicados ao Oscar, inclusive).

Incrivelmente baseado em um fato real, o filme conta a história de Irving Rosenfeld (Bale), um grande trapaceiro que tem como sócia e amante Sydney Prosser (Adams). Depois de serem surpreendidos e pegos por uma ação do FBI, os dois são forçados a colaborar com o agente Richie DiMaso (Cooper), que infiltra Rosenfeld no mundo da máfia ao mesmo tempo em que tenta conseguir provas do envolvimento político do mais alto escalão do país, em corrupção através do candidato Carmine Polito (Jeremy Renner). Os planos parecem dar certo, até a esposa de Irving, Rosalyn (Lawrence), aparecer e mudar completamente as regras do jogo. Confira o trailer:

Dirigido pelo sempre competente e muito talentoso (cinco vezes indicado ao Oscar), David Owen Russell de "Joy", "Trapaça" é meio que uma mistura de Guy Ritchie com Adam McKay, não visualmente (marca registrada dos dois diretores), mas na dinâmica narrativa, na escolha do tom e na ironia que cada linha de diálogo representa para a história que, a todo momento, soa tão absurda que parece mentira. Russell e seus montadores (Jay Cassidy, Crispin Struthers, Alan Baumgarten) constroem uma linha temporal muito interessante, narrada por diversos pontos de vista, com diferentes personagens, mas sempre mantendo a uma coerência cinematográfica que impressiona pela didática sem ser expositiva. Veja, quando vemos um verdadeiro "Zé Ninguém", careca, barrigudo, brega e, aparentemente, pacato, se transformar em Irving Rosenfeld; temos a certeza que a história vai nos levar para um lugar que nem podemos imaginar.

Escrito pelo próprio Russell ao lado de Eric Warren Singer (de "Top Gun: Maverick"), o filme vai nos surpreendendo a cada movimento dos personagens - como a trapaça está no centro da discussão, é impossível cravar o que de fato é sincero durante toda a jornada. O interessante é que todos os personagens parecem saber disso, e mesmo apoiados em alguns esteriótipos (propositais) e ações normalmente exageradas, toda essa desconfiança funciona como motivação e quando menos esperamos, algo quebra essa cadeia e somos surpreendidos. Talvez a personagem de Lawrence, a Rosalyn Rosenfeld, seja a personificação desse mood  (ela está incrível) ou até mesmo as maravilhosas conversas entre os personagens de Cooper e Louis C.K. (o Stoddard Thorsen) nos escritórios do FBI dos anos 70 sintetizem bem esse conceito um pouco "over" de ser.

"Trapaça" tem a sagacidade de enganar a audiência ao se apresentar como algo mais complexo do que realmente é. Russell foi muito feliz em "sugerir" muito mais do que "mostrar", nos provocando o julgamento a cada novo movimento - mas tudo isso de uma forma tão orgânica e fácil, que nem nos damos conta quando o filme termina. A história não precisa empolgar, não é esse o objetivo, são os personagens e como eles se relacionam que realmente importa - é na profundidade de algo aparentemente superficial que a magia realmente acontece. Uma aula!

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Vinagre de Maçã

Como "The Dropout" e "Inventando Anna", "Vinagre de Maçã" mergulha na ascensão e queda de uma personagem carismática e manipuladora, explorando até que ponto a busca por sucesso e reconhecimento pode levar para uma completa destruição - e sim, Belle Gibson é mesmo uma mistura explosiva de Elizabeth Holmes com Anna Delvey. Inspirada na obra "The Woman Who Fooled the World", de Beau Donelly e Nick Toscano, "Apple Cider Vinegar" (no original) chega à Netflix como um dos lançamentos mais aguardados de 2025 e com a promessa de explorar o mundo das influencers digitais de "bem-estar" e os riscos da tão cultuada pseudociência de Instagram, a partir de uma história (assombrosamente) real.

Criada por Samantha Strauss (de "Nove Desconhecidos"), a minissérie de 6 episódios gira em torno de Belle Gibson (Kaitlyn Dever), uma jovem sem grandes perspectivas que constrói um império de mentiras ao alegar que curou um câncer terminal através de uma alimentação natural e de um estilo de vida alternativo. Seu discurso viraliza, transformando-a em uma referência no mercado do bem-estar, garantindo contratos milionários, um livro best-seller e um aplicativo de saúde que foi sucesso por muitos anos. Mas conforme jornalistas começam a investigar sua trajetória, as contradições vêm à tona e toda essa farsa ameaça desmoronar. Paralelamente, acompanhamos Milla Blake (Alycia Debnam-Carey), uma jovem diagnosticada com câncer que rejeita tratamentos médicos convencionais para seguir métodos mais alternativos - foi essa jornada que serviu como um espelho para as consequências reais da desinformação propagada por figuras como Belle. Confira o trailer (em inglês):

"Vinagre de Maçã" é realmente envolvente, especialmente por não se limitar a contar a história de uma fraude individual, mas sim por ampliar a discussão para um fenômeno infinitamente maior: a cultura da influência e a crescente credulidade em curas milagrosas exponenciadas na era digital. Strauss e sua equipe estruturam a narrativa de uma forma não linear, alternando entre diferentes períodos de tempo e muitas vezes utilizando quebras da quarta parede para reforçar o cinismo e a manipulação envolvidas no discurso da protagonista. Essa abordagem, aliás, confere um dinamismo impressionante para a narrativa, nos aproximando da trama, tornando a experiência do play muito mais imersiva e naturalmente crítica. Visualmente, "Vinagre de Maçã" também merece destaque - a minissérie dirigida pelo Jeffrey Walker (de "O Casamento de Ali") aposta em uma estética vibrante e cuidadosamente estilizada, refletindo o universo das redes sociais e do marketing digital com inúmeras intervenções gráficas. A paleta de cores mais saturada, uma fotografia impecável e uma montagem dinâmica reforçam o contraste entre a imagem vendida por Belle e a dura realidade por trás de sua farsa - eu diria até que "Vinagre de Maçã" é uma aula de marketing de percepção.

Kaitlyn Dever entrega uma performance digna de prêmios (talvez a melhor de sua respeitável carreira), transitando com maestria entre a vulnerabilidade de uma garota problemática e a frieza calculada de uma empreendedora voraz. Dever constrói sua personagem de maneira ambígua, ao mesmo tempo fascinante e repulsiva, que de fato lembra o magnetismo de Julia Garner em "Inventando Anna". Alycia Debnam-Carey também se destaca - ela traz profundidade para sua personagem, evidenciando o impacto destrutivo da pseudociência pautada na esperança de ter uma segunda chance. Em muitas passagens, sua luta é de cortar o coração. O elenco de apoio, que inclui Aisha Dee, Tilda Cobham-Hervey, Mark Coles Smith e Ashley Zukerman, contribui para dar o peso emocional que narrativa pede, adicionando camadas doloridas para a história e tornando os conflitos de vários núcleos ainda mais realista.

Obviamente que apesar de sua abordagem criativa, "Vinagre de Maçã" não está isenta de alguns deslizes estruturais. Em alguns momentos, a narrativa se perde em convencionalismos do gênero biográfico e algumas subtramas poderiam ser melhor desenvolvidas, no entanto, esses pontos não comprometem em nada, pois a trama consegue transitar com inteligência entre o drama e a crítica social sem parecer chapa-branca demais. Embalados por uma trilha sonora maravilhosa, com faixas inspiradoras contrastando com o tom irônico da minissérie, o que de certa forma reforça a proposta da narrativa, "Vinagre de Maçã" samba na nossa cara ao fazer um retrato honesto de uma influencer golpista e assim expor os perigos da desinformação e do culto às celebridades digitais.

Vale muito o seu play!

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Como "The Dropout" e "Inventando Anna", "Vinagre de Maçã" mergulha na ascensão e queda de uma personagem carismática e manipuladora, explorando até que ponto a busca por sucesso e reconhecimento pode levar para uma completa destruição - e sim, Belle Gibson é mesmo uma mistura explosiva de Elizabeth Holmes com Anna Delvey. Inspirada na obra "The Woman Who Fooled the World", de Beau Donelly e Nick Toscano, "Apple Cider Vinegar" (no original) chega à Netflix como um dos lançamentos mais aguardados de 2025 e com a promessa de explorar o mundo das influencers digitais de "bem-estar" e os riscos da tão cultuada pseudociência de Instagram, a partir de uma história (assombrosamente) real.

Criada por Samantha Strauss (de "Nove Desconhecidos"), a minissérie de 6 episódios gira em torno de Belle Gibson (Kaitlyn Dever), uma jovem sem grandes perspectivas que constrói um império de mentiras ao alegar que curou um câncer terminal através de uma alimentação natural e de um estilo de vida alternativo. Seu discurso viraliza, transformando-a em uma referência no mercado do bem-estar, garantindo contratos milionários, um livro best-seller e um aplicativo de saúde que foi sucesso por muitos anos. Mas conforme jornalistas começam a investigar sua trajetória, as contradições vêm à tona e toda essa farsa ameaça desmoronar. Paralelamente, acompanhamos Milla Blake (Alycia Debnam-Carey), uma jovem diagnosticada com câncer que rejeita tratamentos médicos convencionais para seguir métodos mais alternativos - foi essa jornada que serviu como um espelho para as consequências reais da desinformação propagada por figuras como Belle. Confira o trailer (em inglês):

"Vinagre de Maçã" é realmente envolvente, especialmente por não se limitar a contar a história de uma fraude individual, mas sim por ampliar a discussão para um fenômeno infinitamente maior: a cultura da influência e a crescente credulidade em curas milagrosas exponenciadas na era digital. Strauss e sua equipe estruturam a narrativa de uma forma não linear, alternando entre diferentes períodos de tempo e muitas vezes utilizando quebras da quarta parede para reforçar o cinismo e a manipulação envolvidas no discurso da protagonista. Essa abordagem, aliás, confere um dinamismo impressionante para a narrativa, nos aproximando da trama, tornando a experiência do play muito mais imersiva e naturalmente crítica. Visualmente, "Vinagre de Maçã" também merece destaque - a minissérie dirigida pelo Jeffrey Walker (de "O Casamento de Ali") aposta em uma estética vibrante e cuidadosamente estilizada, refletindo o universo das redes sociais e do marketing digital com inúmeras intervenções gráficas. A paleta de cores mais saturada, uma fotografia impecável e uma montagem dinâmica reforçam o contraste entre a imagem vendida por Belle e a dura realidade por trás de sua farsa - eu diria até que "Vinagre de Maçã" é uma aula de marketing de percepção.

Kaitlyn Dever entrega uma performance digna de prêmios (talvez a melhor de sua respeitável carreira), transitando com maestria entre a vulnerabilidade de uma garota problemática e a frieza calculada de uma empreendedora voraz. Dever constrói sua personagem de maneira ambígua, ao mesmo tempo fascinante e repulsiva, que de fato lembra o magnetismo de Julia Garner em "Inventando Anna". Alycia Debnam-Carey também se destaca - ela traz profundidade para sua personagem, evidenciando o impacto destrutivo da pseudociência pautada na esperança de ter uma segunda chance. Em muitas passagens, sua luta é de cortar o coração. O elenco de apoio, que inclui Aisha Dee, Tilda Cobham-Hervey, Mark Coles Smith e Ashley Zukerman, contribui para dar o peso emocional que narrativa pede, adicionando camadas doloridas para a história e tornando os conflitos de vários núcleos ainda mais realista.

Obviamente que apesar de sua abordagem criativa, "Vinagre de Maçã" não está isenta de alguns deslizes estruturais. Em alguns momentos, a narrativa se perde em convencionalismos do gênero biográfico e algumas subtramas poderiam ser melhor desenvolvidas, no entanto, esses pontos não comprometem em nada, pois a trama consegue transitar com inteligência entre o drama e a crítica social sem parecer chapa-branca demais. Embalados por uma trilha sonora maravilhosa, com faixas inspiradoras contrastando com o tom irônico da minissérie, o que de certa forma reforça a proposta da narrativa, "Vinagre de Maçã" samba na nossa cara ao fazer um retrato honesto de uma influencer golpista e assim expor os perigos da desinformação e do culto às celebridades digitais.

Vale muito o seu play!

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