Esse é o tipo do filme que você até suspeita o que vai acontecer e mesmo assim, quando acontece, você se emociona e tem aquela gostosa sensação do "coração quentinho". Mas "100 Metros" é um grande filme? Não na sua "forma", mas certamente em seu "conteúdo", sim! Essa produção espanhola dirigida pelo Marcel Barrena (de "Món Petit") conquistou corações ao redor do mundo com sua história tocante de inspiração e superação. Mesmo que a produção não seja um primor e que o roteiro muitas vezes encontre atalhos para provocar determinadas emoções, eu posso te garantir que se trata de um ótimo entretenimento que vale a pena ser assistido - essencialmente por sua história impressionante, bem na linha de "O Escafandro e a Borboleta" e "Intocáveis"!
Baseado em uma história real, "100 Metros" nos apresenta Ramón, um publicitário de 35 anos que vê sua vida virar de cabeça para baixo ao ser diagnosticado com esclerose múltipla. Inconformado com sua condição, Ramón se propõe a terminar uma competição "Ironman", apesar de lhe terem dito que não conseguia fazer ao menos uma corrida de 100 metros. Confira o trailer (em espanhol):
Existe uma certa sensibilidade do roteiro, também escrito por Barrena, em acompanhar a jornada de Ramón sem apelar para o "coitadismo" - algo como vimos no documentário, esse sim mais impactante e igualmente imperdível, "Gleason". Veja, não se trata de uma narrativa focada numa condição repleta de desafios e obstáculos, isso está subentendido, o que importa mesmo é como o protagonista busca a aceitação do diagnostico e encontra um objetivo que o motiva a continuar vivendo. A forma como o enredo mergulha nas complexidades físicas e emocionais de Ramón é notável, proporcionando uma conexão genuína com quem assiste - e talvez aí, esteja o maior mérito do filme e a razão pela qual nem nos importamos com algumas inconsistências do roteiro. Reparem como a narrativa não se limita em destacar o sofrimento, mas também celebra os triunfos e a capacidade humana de enfrentar adversidades aparentemente insuperáveis e mesmo que soe "auto-ajuda", faz todo sentido na nossa percepção e, olha, nos faz refletir!
O elenco de "100 Metros" merece aplausos por suas performances. Dani Rovira, o Ramón, entrega uma atuação poderosa e cheia de nuances - ele nos faz rir e chorar com a mesma facilidade com que nos faz torcer por sua jornada. A química com seus companheiros de cena, Karra Elejalde (seu sogro, Manolo) e Alexandra Jiménez (sua esposa, Inma), é impressionante - a dinâmica familiar e de amizade entre eles, confere uma profundidade à história que certamente a coloca em outro patamar. As atuações são genuínas, elas amplificam a mensagem do filme, transmitindo a importância do apoio mútuo diante de problemas que facilmente nos derrubaria. A fotografia do Xavi Giménez (o mesmo de "Durante a Tormenta") é cativante, afinal o que dizer das belas locações de Calella e Barcelona, na Espanha. Já a trilha sonora (bastante premiada), essa é impecável - emotiva, ela trabalha em perfeita harmonia com o texto para intensificar nossas sensações, nos transportando diretamente para a experiência de estar ao lado de Ramón.
"100 Metros" naturalmente transcende suas próprias fronteiras com uma narrativa profundamente comovente e com performances das mais honestas - especialmente Jiménez. Esse é o tipo do filme que nos cativa desde o primeiro momento com sua mensagem de determinação e de superação que ressoa intensamente, nos convidando a refletir sobre nossas próprias vidas - uma jornada compartilhada de emoções e inspiração que continuará a ecoar muito além dos créditos finais, acreditem!
PS: a montagem que intercala cenas da ficção com os arquivos pessoais de Ramón é sensacional e muito, muito, forte!
Vale seu play!
Esse é o tipo do filme que você até suspeita o que vai acontecer e mesmo assim, quando acontece, você se emociona e tem aquela gostosa sensação do "coração quentinho". Mas "100 Metros" é um grande filme? Não na sua "forma", mas certamente em seu "conteúdo", sim! Essa produção espanhola dirigida pelo Marcel Barrena (de "Món Petit") conquistou corações ao redor do mundo com sua história tocante de inspiração e superação. Mesmo que a produção não seja um primor e que o roteiro muitas vezes encontre atalhos para provocar determinadas emoções, eu posso te garantir que se trata de um ótimo entretenimento que vale a pena ser assistido - essencialmente por sua história impressionante, bem na linha de "O Escafandro e a Borboleta" e "Intocáveis"!
Baseado em uma história real, "100 Metros" nos apresenta Ramón, um publicitário de 35 anos que vê sua vida virar de cabeça para baixo ao ser diagnosticado com esclerose múltipla. Inconformado com sua condição, Ramón se propõe a terminar uma competição "Ironman", apesar de lhe terem dito que não conseguia fazer ao menos uma corrida de 100 metros. Confira o trailer (em espanhol):
Existe uma certa sensibilidade do roteiro, também escrito por Barrena, em acompanhar a jornada de Ramón sem apelar para o "coitadismo" - algo como vimos no documentário, esse sim mais impactante e igualmente imperdível, "Gleason". Veja, não se trata de uma narrativa focada numa condição repleta de desafios e obstáculos, isso está subentendido, o que importa mesmo é como o protagonista busca a aceitação do diagnostico e encontra um objetivo que o motiva a continuar vivendo. A forma como o enredo mergulha nas complexidades físicas e emocionais de Ramón é notável, proporcionando uma conexão genuína com quem assiste - e talvez aí, esteja o maior mérito do filme e a razão pela qual nem nos importamos com algumas inconsistências do roteiro. Reparem como a narrativa não se limita em destacar o sofrimento, mas também celebra os triunfos e a capacidade humana de enfrentar adversidades aparentemente insuperáveis e mesmo que soe "auto-ajuda", faz todo sentido na nossa percepção e, olha, nos faz refletir!
O elenco de "100 Metros" merece aplausos por suas performances. Dani Rovira, o Ramón, entrega uma atuação poderosa e cheia de nuances - ele nos faz rir e chorar com a mesma facilidade com que nos faz torcer por sua jornada. A química com seus companheiros de cena, Karra Elejalde (seu sogro, Manolo) e Alexandra Jiménez (sua esposa, Inma), é impressionante - a dinâmica familiar e de amizade entre eles, confere uma profundidade à história que certamente a coloca em outro patamar. As atuações são genuínas, elas amplificam a mensagem do filme, transmitindo a importância do apoio mútuo diante de problemas que facilmente nos derrubaria. A fotografia do Xavi Giménez (o mesmo de "Durante a Tormenta") é cativante, afinal o que dizer das belas locações de Calella e Barcelona, na Espanha. Já a trilha sonora (bastante premiada), essa é impecável - emotiva, ela trabalha em perfeita harmonia com o texto para intensificar nossas sensações, nos transportando diretamente para a experiência de estar ao lado de Ramón.
"100 Metros" naturalmente transcende suas próprias fronteiras com uma narrativa profundamente comovente e com performances das mais honestas - especialmente Jiménez. Esse é o tipo do filme que nos cativa desde o primeiro momento com sua mensagem de determinação e de superação que ressoa intensamente, nos convidando a refletir sobre nossas próprias vidas - uma jornada compartilhada de emoções e inspiração que continuará a ecoar muito além dos créditos finais, acreditem!
PS: a montagem que intercala cenas da ficção com os arquivos pessoais de Ramón é sensacional e muito, muito, forte!
Vale seu play!
Quatro amigos e sócios de uma empresa bem sucedida, discutindo por mais de uma hora, tentando escolher qual deles vai passar 7 anos na cadeia após a Receita Federal descobrir uma transação ilegal que todos estavam cientes. É exatamente isso: 77 minutos em uma mesma locação, com apenas 5 atores e só diálogos! Essa é a história de "7 anos", produção Original da Netflix de 2016. O conceito é o mesmo (ou muito parecido) que vimos nos bem sucedidos "Perfectos Desconocidos" e de "El Bar" - do genial Álex de la Iglesia!
Muito talentoso, premiado em filmes anteriores e diretor de alguns episódios da série "As telefonistas", Roger Gual guia a história de uma forma muito segura. Ele nos coloca no meio de discussões que deixariam qualquer um constrangido, tantas são as camadas que o texto começa a desvendar conforme o tempo (e a paciência dos personagens) vai passando. É impressionante como não nos damos conta que estamos quase sempre no mesmo ambiente, com as mesmas pessoas. O Fato é que "7 anos" tem diálogos inteligentes e atores muito bem dirigidos (destaque para o ótimo Manuel Morón).
Não é um filme tão fácil, nem todos vão vão gostar, mas se você vem assistindo a nova geração de diretores (e filmes) espanhóis e tem se divertido, "7 años" é, digamos, uma versão mais séria desse movimento!
Vale o play!
Quatro amigos e sócios de uma empresa bem sucedida, discutindo por mais de uma hora, tentando escolher qual deles vai passar 7 anos na cadeia após a Receita Federal descobrir uma transação ilegal que todos estavam cientes. É exatamente isso: 77 minutos em uma mesma locação, com apenas 5 atores e só diálogos! Essa é a história de "7 anos", produção Original da Netflix de 2016. O conceito é o mesmo (ou muito parecido) que vimos nos bem sucedidos "Perfectos Desconocidos" e de "El Bar" - do genial Álex de la Iglesia!
Muito talentoso, premiado em filmes anteriores e diretor de alguns episódios da série "As telefonistas", Roger Gual guia a história de uma forma muito segura. Ele nos coloca no meio de discussões que deixariam qualquer um constrangido, tantas são as camadas que o texto começa a desvendar conforme o tempo (e a paciência dos personagens) vai passando. É impressionante como não nos damos conta que estamos quase sempre no mesmo ambiente, com as mesmas pessoas. O Fato é que "7 anos" tem diálogos inteligentes e atores muito bem dirigidos (destaque para o ótimo Manuel Morón).
Não é um filme tão fácil, nem todos vão vão gostar, mas se você vem assistindo a nova geração de diretores (e filmes) espanhóis e tem se divertido, "7 años" é, digamos, uma versão mais séria desse movimento!
Vale o play!
Olha, "900 Dias sem Anabel" é realmente uma obra tensa e profundamente emocional que, sem dúvida, deixa marcas! O documentário da Netflix, dirigido pela Mónica Palomer (de "Malaya: Operación Secreta"), revisita um dos casos de sequestro mais perturbadores da história recente da Espanha. A narrativa, construída a partir de um material inédito e de depoimentos impactantes, oferece uma visão angustiante sobre os 900 dias de investigação e negociação para tentar resgatar Anabel Seguro, uma jovem que desapareceu em circunstâncias misteriosas, que abalaram sua família e comoveram toda opinião pública no inicio dos anos 1990. Assim como "Volta Priscila", o documentário, em três partes, mescla minuciosamente os detalhes investigativos com os aspectos mais humanos dos envolvidos no caso.
Pela primeira vez em muito anos, uma produção apresenta um dos elementos mais marcantes desse caso: as fitas cassete que registraram os contatos entre os sequestradores e o advogado da família Seguro. Esses áudios são o fio condutor da narrativa, oferecendo um mergulho nas negociações, repletas de tensão, desespero e jogos psicológicos. Palomero constrói a história com uma estrutura retrospectiva, utilizando as fitas como base para reconstituir os eventos e intercalar com as entrevistas com os investigadores e com algumas imagens de arquivo. Confira o trailer (em espanhol):
Até onde pode ir a crueldade humana? Talvez seja essa a pergunta que vai te acompanhar durante toda sua jornada com "900 Dias sem Anabel". Então saiba que o documentário não é apenas essa jornada cronológica dos acontecimentos, mas também um estudo sobre o impacto devastador que um crime como esse gera nos seus familiares. Ao entrevistar os investigadores e jornalistas que acompanharam o caso na época, Palomero dá espaço para uma análise mais profundas sobre os erros e os acertos da polícia espanhola ao tentar encontrar Anabel o mais rápido possível. Como as negociações foram comandadas pelo advogado da família, é muito curioso a forma como as múltiplas perspectivas sobre o caso são exploradas. O fato das gravações originais pontuarem cada fase da investigação, adiciona uma profundidade impressionante à narrativa e ainda reforça a complexidade do caso, destacando tanto os desafios das autoridades quanto a resiliência e o sofrimento da família Seguro.
A direção de Mónica Palomero é meticulosa e sensível. Em vez de recorrer a um sensacionalismo fácil, a diretora opta por uma abordagem que respeita a gravidade do caso e a dor dos envolvidos. Enquanto as entrevistas captura as emoções cruas dos depoentes, os momentos de silêncio e as pausas nas fitas gravadas intensificam a sensação de desespero e impotência de todos ali. As reconstituições são precisas e muito bem produzidas, colocando a audiência ao lado dos investigadores em cada nova tentativa de libertar Anabel. A sonorização das fitas cassete, com os ruídos de fundo e as vozes tensas dos sequestradores, cria uma atmosfera de inquietação constante - as imagens que servem para ilustrar os momentos de contato telefônico com os sequestradores reforçam o tom melancólico - os recortes sombrios da fotografia, por exemplo, refletem o peso emocional do caso. Já as reconstituições, ainda bem, são discretas e estilizadas, servindo como suporte ideal para a narrativa, sem precisar desviar o foco do que interessa em nenhum momento.
De fato, "900 Dias sem Anabel" é um documentário envolvente e impactante - uma combinação de investigação e reflexão. Com um certo equilíbrio entre a tensão dos eventos e a dor de quem sofreu com ele, o roteiro entrega uma jornada que vai além do crime em si para revelar como os limites da resiliência e o custo emocional da busca por respostas pode mover a humanidade. Surpreendentemente até o seu final, essa minissérie desponta como uma experiência poderosa e essencial para aqueles interessados em histórias reais de crimes bárbaros e investigações bastante complexas.
Vale seu play!
Olha, "900 Dias sem Anabel" é realmente uma obra tensa e profundamente emocional que, sem dúvida, deixa marcas! O documentário da Netflix, dirigido pela Mónica Palomer (de "Malaya: Operación Secreta"), revisita um dos casos de sequestro mais perturbadores da história recente da Espanha. A narrativa, construída a partir de um material inédito e de depoimentos impactantes, oferece uma visão angustiante sobre os 900 dias de investigação e negociação para tentar resgatar Anabel Seguro, uma jovem que desapareceu em circunstâncias misteriosas, que abalaram sua família e comoveram toda opinião pública no inicio dos anos 1990. Assim como "Volta Priscila", o documentário, em três partes, mescla minuciosamente os detalhes investigativos com os aspectos mais humanos dos envolvidos no caso.
Pela primeira vez em muito anos, uma produção apresenta um dos elementos mais marcantes desse caso: as fitas cassete que registraram os contatos entre os sequestradores e o advogado da família Seguro. Esses áudios são o fio condutor da narrativa, oferecendo um mergulho nas negociações, repletas de tensão, desespero e jogos psicológicos. Palomero constrói a história com uma estrutura retrospectiva, utilizando as fitas como base para reconstituir os eventos e intercalar com as entrevistas com os investigadores e com algumas imagens de arquivo. Confira o trailer (em espanhol):
Até onde pode ir a crueldade humana? Talvez seja essa a pergunta que vai te acompanhar durante toda sua jornada com "900 Dias sem Anabel". Então saiba que o documentário não é apenas essa jornada cronológica dos acontecimentos, mas também um estudo sobre o impacto devastador que um crime como esse gera nos seus familiares. Ao entrevistar os investigadores e jornalistas que acompanharam o caso na época, Palomero dá espaço para uma análise mais profundas sobre os erros e os acertos da polícia espanhola ao tentar encontrar Anabel o mais rápido possível. Como as negociações foram comandadas pelo advogado da família, é muito curioso a forma como as múltiplas perspectivas sobre o caso são exploradas. O fato das gravações originais pontuarem cada fase da investigação, adiciona uma profundidade impressionante à narrativa e ainda reforça a complexidade do caso, destacando tanto os desafios das autoridades quanto a resiliência e o sofrimento da família Seguro.
A direção de Mónica Palomero é meticulosa e sensível. Em vez de recorrer a um sensacionalismo fácil, a diretora opta por uma abordagem que respeita a gravidade do caso e a dor dos envolvidos. Enquanto as entrevistas captura as emoções cruas dos depoentes, os momentos de silêncio e as pausas nas fitas gravadas intensificam a sensação de desespero e impotência de todos ali. As reconstituições são precisas e muito bem produzidas, colocando a audiência ao lado dos investigadores em cada nova tentativa de libertar Anabel. A sonorização das fitas cassete, com os ruídos de fundo e as vozes tensas dos sequestradores, cria uma atmosfera de inquietação constante - as imagens que servem para ilustrar os momentos de contato telefônico com os sequestradores reforçam o tom melancólico - os recortes sombrios da fotografia, por exemplo, refletem o peso emocional do caso. Já as reconstituições, ainda bem, são discretas e estilizadas, servindo como suporte ideal para a narrativa, sem precisar desviar o foco do que interessa em nenhum momento.
De fato, "900 Dias sem Anabel" é um documentário envolvente e impactante - uma combinação de investigação e reflexão. Com um certo equilíbrio entre a tensão dos eventos e a dor de quem sofreu com ele, o roteiro entrega uma jornada que vai além do crime em si para revelar como os limites da resiliência e o custo emocional da busca por respostas pode mover a humanidade. Surpreendentemente até o seu final, essa minissérie desponta como uma experiência poderosa e essencial para aqueles interessados em histórias reais de crimes bárbaros e investigações bastante complexas.
Vale seu play!
"A Casa" é mais um suspense psicológico que vem da Espanha e que justifica seu sucesso. Embora tenha lido muita gente reclamando do final (algo que se repetiu no ótimo "O Poço"), posso dizer tranquilamente que o filme entrega o que promete - angústia e mal estar!
Javier Muñoz (Javier Gutierrez) é um publicitário muito conhecido em Barcelona que está desempregado há algum tempo. O temor iminente de uma queda de padrão social só aumenta a cada entrevista de emprego frustada. Marga (Ruth Díaz), sua esposa, sugere a Javier que se mudem para um apartamento mais simples até que as coisas se restabeleçam. Acontece que Javier não se conforma com a situação, sente-se humilhado, inseguro. Quando ele vê o jovem casal que agora mora no seu antigo apartamento e que parece viver uma vida perfeita, ele é tomado pela inveja e a partir daí, começa a arquitetar um plano minucioso para retomar o seu antigo status e a felicidade de viver no topo. Confira o trailer:
O filme é ótimo, mas se você espera um thriller ao melhor estilo americano , esqueça, "A Casa" não é para você! O filme tem um levada psicológica menos intensa na ação - ele funciona muito mais na empatia que sentimos pelo personagem, mesmo sabendo que suas atitudes vão se distanciando cada vez mais dos nosso valores. É quase o sentimento que tínhamos pelo inesquecível Walter White de "Breaking Bad". Isso não é uma comparação, é apenas uma citação para explicar que a "A Casa" é um filme mais cadenciado, mas que é muito competente em nos colocar dentro da trama sem o menor esforço!
Embora a trama do filme nos envolva desde seu inicio, o roteiro tem algumas inconstâncias que prejudicaram na experiência de muita gente. O primeiro e o segundo atos são excelentes - desde a apresentação do protagonista até se estabelecer a sua motivação! O medo estampado no rosto do excelente ator Javier Gutierrez naturalmente vai se transformando em ódio e, principalmente, inveja - é isso: o filme é sobre a inveja no seu nível mais estereotipado (no bom sentido) possível! O acerto das situações que transformam o personagem vai desde a escolha da sua profissão até a forma como ele lida com a necessidade de se reinventar. É claro que o roteiro abusa da suspensão da realidade, mas nem por isso nos afastamos da sua dor e isso ganha muita força quando percebemos que na verdade essa dor é muito mais pela vaidade do que pela situação que ele está vivendo - o que "justifica" sua relação com o jardineiro do seu antigo condomínio - reparem (ali temos um bom exemplo de como essa sub trama poderia ter sido melhor desenvolvida e, principalmente, melhor solucionada)! O maior deslize do roteiro está no terceiro ato, pois temos a sensação de que tudo é resolvido muito rapidamente e, mais uma vez citando Breaking Bad: falta tempo para desenvolver a transformação do protagonista em anti-herói e depois, mais tempo ainda, para colocá-lo como vitima de uma sociedade opressora, preconceituosa e de valores morais duvidosos.
Muito bem dirigido pelos irmãos David Pastor e Àlex Pastor, lindamente fotografado pelo Pau Castejón, "A Casa" é mais um exemplo de uma boa premissa para se discutir o mundo que estamos vivendo hoje, mas que infelizmente sofre com o formato - uma minissérie (ou até uma série) elevaria a qualidade do roteiro em níveis astronômicos! Em tempo, a comparação com "Parasita" é muito simplista - acreditem, não é o caso (nem de longe), mas mesmo assim é preciso dar mérito ao ótimo entretenimento que é o filme. Mais uma vez: não irá agradar a todos e compreendo as críticas sobre a falta de originalidade do assunto, mas independente de qualquer coisa, me diverti muito e indico com essas ressalvas.
"A Casa" é mais um suspense psicológico que vem da Espanha e que justifica seu sucesso. Embora tenha lido muita gente reclamando do final (algo que se repetiu no ótimo "O Poço"), posso dizer tranquilamente que o filme entrega o que promete - angústia e mal estar!
Javier Muñoz (Javier Gutierrez) é um publicitário muito conhecido em Barcelona que está desempregado há algum tempo. O temor iminente de uma queda de padrão social só aumenta a cada entrevista de emprego frustada. Marga (Ruth Díaz), sua esposa, sugere a Javier que se mudem para um apartamento mais simples até que as coisas se restabeleçam. Acontece que Javier não se conforma com a situação, sente-se humilhado, inseguro. Quando ele vê o jovem casal que agora mora no seu antigo apartamento e que parece viver uma vida perfeita, ele é tomado pela inveja e a partir daí, começa a arquitetar um plano minucioso para retomar o seu antigo status e a felicidade de viver no topo. Confira o trailer:
O filme é ótimo, mas se você espera um thriller ao melhor estilo americano , esqueça, "A Casa" não é para você! O filme tem um levada psicológica menos intensa na ação - ele funciona muito mais na empatia que sentimos pelo personagem, mesmo sabendo que suas atitudes vão se distanciando cada vez mais dos nosso valores. É quase o sentimento que tínhamos pelo inesquecível Walter White de "Breaking Bad". Isso não é uma comparação, é apenas uma citação para explicar que a "A Casa" é um filme mais cadenciado, mas que é muito competente em nos colocar dentro da trama sem o menor esforço!
Embora a trama do filme nos envolva desde seu inicio, o roteiro tem algumas inconstâncias que prejudicaram na experiência de muita gente. O primeiro e o segundo atos são excelentes - desde a apresentação do protagonista até se estabelecer a sua motivação! O medo estampado no rosto do excelente ator Javier Gutierrez naturalmente vai se transformando em ódio e, principalmente, inveja - é isso: o filme é sobre a inveja no seu nível mais estereotipado (no bom sentido) possível! O acerto das situações que transformam o personagem vai desde a escolha da sua profissão até a forma como ele lida com a necessidade de se reinventar. É claro que o roteiro abusa da suspensão da realidade, mas nem por isso nos afastamos da sua dor e isso ganha muita força quando percebemos que na verdade essa dor é muito mais pela vaidade do que pela situação que ele está vivendo - o que "justifica" sua relação com o jardineiro do seu antigo condomínio - reparem (ali temos um bom exemplo de como essa sub trama poderia ter sido melhor desenvolvida e, principalmente, melhor solucionada)! O maior deslize do roteiro está no terceiro ato, pois temos a sensação de que tudo é resolvido muito rapidamente e, mais uma vez citando Breaking Bad: falta tempo para desenvolver a transformação do protagonista em anti-herói e depois, mais tempo ainda, para colocá-lo como vitima de uma sociedade opressora, preconceituosa e de valores morais duvidosos.
Muito bem dirigido pelos irmãos David Pastor e Àlex Pastor, lindamente fotografado pelo Pau Castejón, "A Casa" é mais um exemplo de uma boa premissa para se discutir o mundo que estamos vivendo hoje, mas que infelizmente sofre com o formato - uma minissérie (ou até uma série) elevaria a qualidade do roteiro em níveis astronômicos! Em tempo, a comparação com "Parasita" é muito simplista - acreditem, não é o caso (nem de longe), mas mesmo assim é preciso dar mérito ao ótimo entretenimento que é o filme. Mais uma vez: não irá agradar a todos e compreendo as críticas sobre a falta de originalidade do assunto, mas independente de qualquer coisa, me diverti muito e indico com essas ressalvas.
Simplesmente sensacional!
O representante espanhol no Oscar 2024, "A Sociedade da Neve", é incrível em todos os sentidos: visceral, angustiante, emocionante e muito impactante, além de inegavelmente um dos melhores filmes de 2023! Embora a trama foque na busca incansável pela sobrevivência em condições devastadoras, obviamente potencializada por se tratar de uma história real, o filme dirigido pelo Juan Antonio Bayona (de "O Impossível") é muito feliz em trazer para discussão a importância das relações e a força do espírito humano. Eu sei que pode até parecer piegas, mas é impressionante como, mesmo diante das adversidades mais extremas, o ser humano é capaz de encontrar a esperança e a vontade de viver. Para você ter uma ideia, não será preciso mais do que 45 minutos para você ter a exata noção do inferno que aquelas pessoas viveram e quando você achar que já chegou no seu limite, você ainda terá pelo menos mais 90 minutos de história pela frente. Uma verdadeira pancada!
Para quem não sabe, "A Sociedade da Neve" nos apresenta em detalhes a história do voo 571 da Força Aérea Uruguaia, fretado para levar uma equipe de rugby ao Chile, que caiu em uma geleira no coração dos Andes em 1972. Apenas 29 de seus 45 passageiros sobrevivem ao acidente. Presos em um dos ambientes mais inacessíveis e hostis no planeta, esses sobreviventes são obrigados a recorrer a medidas das mais extremas para se manterem vivos enquanto esperam o resgate. Confira o trailer:
Baseada no livro homônimo de Pablo Vierci, o filme chama muito nossa atenção pela riqueza de detalhes na recriação daquele contexto tão desesperador. Bayona consegue construir uma dinâmica narrativa que é ao mesmo tempo emocionante e perturbadora, tensa e comovente. Visualmente deslumbrante, tanto a sequência do acidente aéreo quando as cenas que se seguiram nos Andes, tudo é de tirar o fôlego. O trabalho do fotógrafo uruguaio Pedro Luque (de "O Homem nas Trevas 2") é fundamental para a desconfortável sensação de imersão que somos "obrigados" a lidar ao assistir o filme - realmente impecável, Luque captura a beleza e a brutalidade da natureza como poucos.
Outro ponto que merece muito destaque, sem dúvida, é o elenco. Agustín Pardella é particularmente impressionante como Nando Parrado, um dos líderes dos sobreviventes e responsável por um dos momentos mais emocionantes do filme. Reparem como Pardella transmite com perfeição toda a determinação e a força de vontade de Parrado - uma das figuras mais inspiradoras da história e talvez o maior elo de conexão entre a audiência e todo aquele drama. Enzo Vogrincic como Numa Turcatti também merece muitos elogios - sua performance como narrador é sensível, profunda, comovente e filosófica. A trilha sonora composta pelo Michael Giacchino (vencedor do Oscar por "Up: Altas Aventuras") e o desenho de som do Marc Bech (de "O Home Duplicado") são dois outros elementos dignos de muitos prêmios e que ajudam a compor esse clima de suspense e tensão que Bayona se propôs a reproduzir.
Sem cair na glamourização hollywoodiana, "A Sociedade da Neve" tem um requinte (para não dizer "perfeição") técnico e artístico que justifica as 13 indicações ao prêmio Goya de 2024, mas é na sua escolha conceitual que o filme muda mesmo de patamar. Bayona é inteligente ao evitar a exploração gratuita do aspecto mais gráfico ou visual quando temas como o canibalismo, por exemplo, vem à tona. Ao seguir por um caminho mais inteligente, focando no estado psicológico daqueles que são forçados a tomar uma drástica decisão em troca da sobrevivência, o diretor usa do dilema moral para nos provocar uma reflexão dura sobre os limites intransponíveis que perdem o sentido de acordo com a situação que estamos passando - e machuca!
Olha, um golaço da Netflix com cheirinho de Oscar!
Simplesmente sensacional!
O representante espanhol no Oscar 2024, "A Sociedade da Neve", é incrível em todos os sentidos: visceral, angustiante, emocionante e muito impactante, além de inegavelmente um dos melhores filmes de 2023! Embora a trama foque na busca incansável pela sobrevivência em condições devastadoras, obviamente potencializada por se tratar de uma história real, o filme dirigido pelo Juan Antonio Bayona (de "O Impossível") é muito feliz em trazer para discussão a importância das relações e a força do espírito humano. Eu sei que pode até parecer piegas, mas é impressionante como, mesmo diante das adversidades mais extremas, o ser humano é capaz de encontrar a esperança e a vontade de viver. Para você ter uma ideia, não será preciso mais do que 45 minutos para você ter a exata noção do inferno que aquelas pessoas viveram e quando você achar que já chegou no seu limite, você ainda terá pelo menos mais 90 minutos de história pela frente. Uma verdadeira pancada!
Para quem não sabe, "A Sociedade da Neve" nos apresenta em detalhes a história do voo 571 da Força Aérea Uruguaia, fretado para levar uma equipe de rugby ao Chile, que caiu em uma geleira no coração dos Andes em 1972. Apenas 29 de seus 45 passageiros sobrevivem ao acidente. Presos em um dos ambientes mais inacessíveis e hostis no planeta, esses sobreviventes são obrigados a recorrer a medidas das mais extremas para se manterem vivos enquanto esperam o resgate. Confira o trailer:
Baseada no livro homônimo de Pablo Vierci, o filme chama muito nossa atenção pela riqueza de detalhes na recriação daquele contexto tão desesperador. Bayona consegue construir uma dinâmica narrativa que é ao mesmo tempo emocionante e perturbadora, tensa e comovente. Visualmente deslumbrante, tanto a sequência do acidente aéreo quando as cenas que se seguiram nos Andes, tudo é de tirar o fôlego. O trabalho do fotógrafo uruguaio Pedro Luque (de "O Homem nas Trevas 2") é fundamental para a desconfortável sensação de imersão que somos "obrigados" a lidar ao assistir o filme - realmente impecável, Luque captura a beleza e a brutalidade da natureza como poucos.
Outro ponto que merece muito destaque, sem dúvida, é o elenco. Agustín Pardella é particularmente impressionante como Nando Parrado, um dos líderes dos sobreviventes e responsável por um dos momentos mais emocionantes do filme. Reparem como Pardella transmite com perfeição toda a determinação e a força de vontade de Parrado - uma das figuras mais inspiradoras da história e talvez o maior elo de conexão entre a audiência e todo aquele drama. Enzo Vogrincic como Numa Turcatti também merece muitos elogios - sua performance como narrador é sensível, profunda, comovente e filosófica. A trilha sonora composta pelo Michael Giacchino (vencedor do Oscar por "Up: Altas Aventuras") e o desenho de som do Marc Bech (de "O Home Duplicado") são dois outros elementos dignos de muitos prêmios e que ajudam a compor esse clima de suspense e tensão que Bayona se propôs a reproduzir.
Sem cair na glamourização hollywoodiana, "A Sociedade da Neve" tem um requinte (para não dizer "perfeição") técnico e artístico que justifica as 13 indicações ao prêmio Goya de 2024, mas é na sua escolha conceitual que o filme muda mesmo de patamar. Bayona é inteligente ao evitar a exploração gratuita do aspecto mais gráfico ou visual quando temas como o canibalismo, por exemplo, vem à tona. Ao seguir por um caminho mais inteligente, focando no estado psicológico daqueles que são forçados a tomar uma drástica decisão em troca da sobrevivência, o diretor usa do dilema moral para nos provocar uma reflexão dura sobre os limites intransponíveis que perdem o sentido de acordo com a situação que estamos passando - e machuca!
Olha, um golaço da Netflix com cheirinho de Oscar!
Esse é um filme pouco diferente do cinema espanhol que conhecemos, mas que também não deixa de ser uma ótima surpresa - embora tenha um conceito mais poético, profundo eu diria.
"Amar", basicamente, acompanha a história de amor que Laura (María Pedraza) e Carlos (Pol Monen) vivenciam: desde sua intensidade até a natural fragilidade do primeiro amor e como eles enxergam a realidade quando se sentem abalados pelas dificuldades naturais de uma relação e sentem que todo romantismo que idealizaram não passou de uma fase! Confira o trailer (em espanhol):
Antes de mais nada é preciso dizer que "Amar" é muito bem dirigido pelo Esteban Crespo, embora seja apenas seu primeiro longa-metragem. O filme dialoga com alguns dramas adolescentes como sexualidade, descobertas, inseguranças, sonhos e decepções; mas sem se fazer piegas - de fato existe um cuidado em retratar com certo realismo a relação entre os protagonistas. Veja, não estamos diante de um grande roteiro, mas é preciso elogiar a forma como Crespo construiu a narrativa, provocando os atores, trabalhando com as lentes mais fechadas nos momentos mais introspectivos, mas enquadrando a cidade ora em segundo plano como um pano de fundo completamente desfocado e colorido, ora como um personagem, aqui com uso das grandes angulares, para estabelecer todo aquele universo underground europeu.
Como um resultado desse apuro estético. Amar", para mim, é um bastante maduro e merecedor de todos os elogios que recebeu desde seu lançamento - além de uma indicação para o Prêmio Goya (o "Oscar Espanhol") para a incrível performance de Pol Monen. Saiba que você está diante de um filme de relações adolescentes muito bem realizado e que não se apega a esteriótipos para conseguir tocar no alma - e acredite: ele vai tocar.
Vale muito o seu play - como entretenimento, mas com uma pegada de cinema independente!
Esse é um filme pouco diferente do cinema espanhol que conhecemos, mas que também não deixa de ser uma ótima surpresa - embora tenha um conceito mais poético, profundo eu diria.
"Amar", basicamente, acompanha a história de amor que Laura (María Pedraza) e Carlos (Pol Monen) vivenciam: desde sua intensidade até a natural fragilidade do primeiro amor e como eles enxergam a realidade quando se sentem abalados pelas dificuldades naturais de uma relação e sentem que todo romantismo que idealizaram não passou de uma fase! Confira o trailer (em espanhol):
Antes de mais nada é preciso dizer que "Amar" é muito bem dirigido pelo Esteban Crespo, embora seja apenas seu primeiro longa-metragem. O filme dialoga com alguns dramas adolescentes como sexualidade, descobertas, inseguranças, sonhos e decepções; mas sem se fazer piegas - de fato existe um cuidado em retratar com certo realismo a relação entre os protagonistas. Veja, não estamos diante de um grande roteiro, mas é preciso elogiar a forma como Crespo construiu a narrativa, provocando os atores, trabalhando com as lentes mais fechadas nos momentos mais introspectivos, mas enquadrando a cidade ora em segundo plano como um pano de fundo completamente desfocado e colorido, ora como um personagem, aqui com uso das grandes angulares, para estabelecer todo aquele universo underground europeu.
Como um resultado desse apuro estético. Amar", para mim, é um bastante maduro e merecedor de todos os elogios que recebeu desde seu lançamento - além de uma indicação para o Prêmio Goya (o "Oscar Espanhol") para a incrível performance de Pol Monen. Saiba que você está diante de um filme de relações adolescentes muito bem realizado e que não se apega a esteriótipos para conseguir tocar no alma - e acredite: ele vai tocar.
Vale muito o seu play - como entretenimento, mas com uma pegada de cinema independente!
"As Leis da Termodinâmica", filme espanhol distribuído pela Netflix (por isso o selo de Original), é muito bacana. Na verdade ele começa um pouco lento, fiquei até na dúvida se o filme era um documentário ou uma ficção e isso até me gerou um certo desconforto. O fato é que o filme é um híbrido dos dois gêneros e assim que se entende a dinâmica narrativa, o filme flui muito tranquilo porque tem um roteiro inteligente e é muito bem dirigido pelo Mateo Gil - um dos roteiristas de "Mar Adentro" do chileno Alejandro Amenábar e vencedor do Oscar estrangeiro de 2005.
"Las leyes de la termodinámica" (no original), conta a história (improvável) de amor entre um assistente de professor universitário e cientista com uma modelo famosa - uma pegada meio "Nothing Hill". O grande trunfo do filme, é a forma como essa história é contada, pois é feito um paralelo entre as fases de um relacionamento com as Leis da Termodinâmica - pode parecer chato e até um formato repetitivo, mas é muito inteligente e extremamente bem explorada pelo diretor (que também assina o roteiro). Fica impossível não se identificar com uma ou outra situação! O filme é categorizado como uma comédia romântica, mas é inteligente e vai além do óbvio, surpreende pela qualidade.
Tecnicamente é excelente também: tem uma montagem dinâmica, intervenções gráficas interessantes (e que ajudam contar a história sem chamar muito a atenção) e os atores estão ótimos (Vito Sanz, especialmente). Vale muito a pena. Entretenimento leve e inteligente!
\Vale o play. Vale a indicação!!! Assistam no clima que a surpresa será boa!!!
"As Leis da Termodinâmica", filme espanhol distribuído pela Netflix (por isso o selo de Original), é muito bacana. Na verdade ele começa um pouco lento, fiquei até na dúvida se o filme era um documentário ou uma ficção e isso até me gerou um certo desconforto. O fato é que o filme é um híbrido dos dois gêneros e assim que se entende a dinâmica narrativa, o filme flui muito tranquilo porque tem um roteiro inteligente e é muito bem dirigido pelo Mateo Gil - um dos roteiristas de "Mar Adentro" do chileno Alejandro Amenábar e vencedor do Oscar estrangeiro de 2005.
"Las leyes de la termodinámica" (no original), conta a história (improvável) de amor entre um assistente de professor universitário e cientista com uma modelo famosa - uma pegada meio "Nothing Hill". O grande trunfo do filme, é a forma como essa história é contada, pois é feito um paralelo entre as fases de um relacionamento com as Leis da Termodinâmica - pode parecer chato e até um formato repetitivo, mas é muito inteligente e extremamente bem explorada pelo diretor (que também assina o roteiro). Fica impossível não se identificar com uma ou outra situação! O filme é categorizado como uma comédia romântica, mas é inteligente e vai além do óbvio, surpreende pela qualidade.
Tecnicamente é excelente também: tem uma montagem dinâmica, intervenções gráficas interessantes (e que ajudam contar a história sem chamar muito a atenção) e os atores estão ótimos (Vito Sanz, especialmente). Vale muito a pena. Entretenimento leve e inteligente!
\Vale o play. Vale a indicação!!! Assistam no clima que a surpresa será boa!!!
"Cela 211" é um grande filme, mas não é uma grande produção - o que eu quero dizer é que o roteiro de Jorge Guerricaechevarría (El Bar) e do diretor Daniel Monzón (O Segredo de Kovak) merecia um orçamento de super-produção (tipo "Prison Break") - o que inviabilizaria o projeto; então será preciso fechar os olhos para a falta de cuidado no que acontece em segundo plano, mesmo tendo no foco da narrativa um grande ator como Luis Tosar (de "Quem com ferro fere"). É preciso dizer também que eram outros tempos, quando do lançamento de "Cela 211", uma era pré-streaming, portanto é natural essa dificuldade na produção, mas eu adianto: essas limitações pouco vão interferir na experiência imersiva que é assistir o filme!
Juan Oliver (Alberto Ammann) é um funcionário novato de uma prisão espanhola, que acaba sofrendo um acidente no seu primeiro dia de trabalho. Acontece que logo depois explode um motim justamente na área onde Oliver está sendo cuidado e que acaba sendo tomada pelos presos mais temidos e perigosos, encabeçado por Mala Madre (Luis Tosar). Para salvar suas vidas, os companheiros de Oliver fogem deixando ele desmaiado na cela 211 - a única vazia do pavilhão. Ao acordar, Oliver compreende o perigo da situação e resolve se passar por um presidiário perante os amotinados. A partir desse momento, o protagonista tem que sobreviver a base de mentiras até que tudo muda de uma hora para outra. Confira o trailer original, com legendas em inglês:
Vencedor de 8 prêmios Goya em 2010 (o Oscar Espanhol), entre eles o de Melhor Filme, superando, inclusive, o sensacional "O Segredo dos seus Olhos", "Cela 211" se estabelece como uma crítica pesada às condições precárias a que os presos são submetidos e ao funcionamento do sistema carcerário espanhol. Porém esse é só o pano fundo para discutir algo muito mais profundo: a capacidade que o "meio" tem de corromper até aqueles de caráter (aparentemente) inabalável - e o pior de tudo é que damos razão a essa transformação do personagem porque o sistema é realmente falho e muitas vezes até desleal.
Sem dúvida que o ponto alto do filme é a bem estruturada construção da personalidade complexa do protagonista, que vai de um extremo ao outro durante as quase duas horas de filme, sempre motivado por situações onde as próprias relações com os presos e com os funcionários do presídio, vão sendo propostas - essa transformação me lembrou muito uma imperdível minissérie da HBO chamada "The Night Of". Como Riz Ahmed lá, Ammann se apoia em pequenas expressões, sem apelar para o exagero, trazendo uma realidade brutal para seu personagem que chega a ser impressionante, enquanto Luis Tosar nos entrega um antagonista, líder entre os presidiários, Malamadre, controlado e assustador - ambas performances, inclusive, foram vencedoras no Goya.
"Cela 211" é mais um belo trabalho do cinema espanhol, com uma narrativa ágil e muito bem construída,que chega ao ápice no final do segundo ato com uma reviravolta surpreendente e, na minha opinião, extremamente corajosa. Aliás, o filme do talentoso Daniel Monzón, em nenhum momento cai na covardia de encontrar o caminho mais fácil, mesmo nas passagens mais previsíveis, ele encontra camadas que geram, no mínimo, certa angústia em quem assiste. Com um tom independente, "Cela 211" deve agradar a todos que buscam um bom drama com ótimos elementos de ação.
Vale a pena!
"Cela 211" é um grande filme, mas não é uma grande produção - o que eu quero dizer é que o roteiro de Jorge Guerricaechevarría (El Bar) e do diretor Daniel Monzón (O Segredo de Kovak) merecia um orçamento de super-produção (tipo "Prison Break") - o que inviabilizaria o projeto; então será preciso fechar os olhos para a falta de cuidado no que acontece em segundo plano, mesmo tendo no foco da narrativa um grande ator como Luis Tosar (de "Quem com ferro fere"). É preciso dizer também que eram outros tempos, quando do lançamento de "Cela 211", uma era pré-streaming, portanto é natural essa dificuldade na produção, mas eu adianto: essas limitações pouco vão interferir na experiência imersiva que é assistir o filme!
Juan Oliver (Alberto Ammann) é um funcionário novato de uma prisão espanhola, que acaba sofrendo um acidente no seu primeiro dia de trabalho. Acontece que logo depois explode um motim justamente na área onde Oliver está sendo cuidado e que acaba sendo tomada pelos presos mais temidos e perigosos, encabeçado por Mala Madre (Luis Tosar). Para salvar suas vidas, os companheiros de Oliver fogem deixando ele desmaiado na cela 211 - a única vazia do pavilhão. Ao acordar, Oliver compreende o perigo da situação e resolve se passar por um presidiário perante os amotinados. A partir desse momento, o protagonista tem que sobreviver a base de mentiras até que tudo muda de uma hora para outra. Confira o trailer original, com legendas em inglês:
Vencedor de 8 prêmios Goya em 2010 (o Oscar Espanhol), entre eles o de Melhor Filme, superando, inclusive, o sensacional "O Segredo dos seus Olhos", "Cela 211" se estabelece como uma crítica pesada às condições precárias a que os presos são submetidos e ao funcionamento do sistema carcerário espanhol. Porém esse é só o pano fundo para discutir algo muito mais profundo: a capacidade que o "meio" tem de corromper até aqueles de caráter (aparentemente) inabalável - e o pior de tudo é que damos razão a essa transformação do personagem porque o sistema é realmente falho e muitas vezes até desleal.
Sem dúvida que o ponto alto do filme é a bem estruturada construção da personalidade complexa do protagonista, que vai de um extremo ao outro durante as quase duas horas de filme, sempre motivado por situações onde as próprias relações com os presos e com os funcionários do presídio, vão sendo propostas - essa transformação me lembrou muito uma imperdível minissérie da HBO chamada "The Night Of". Como Riz Ahmed lá, Ammann se apoia em pequenas expressões, sem apelar para o exagero, trazendo uma realidade brutal para seu personagem que chega a ser impressionante, enquanto Luis Tosar nos entrega um antagonista, líder entre os presidiários, Malamadre, controlado e assustador - ambas performances, inclusive, foram vencedoras no Goya.
"Cela 211" é mais um belo trabalho do cinema espanhol, com uma narrativa ágil e muito bem construída,que chega ao ápice no final do segundo ato com uma reviravolta surpreendente e, na minha opinião, extremamente corajosa. Aliás, o filme do talentoso Daniel Monzón, em nenhum momento cai na covardia de encontrar o caminho mais fácil, mesmo nas passagens mais previsíveis, ele encontra camadas que geram, no mínimo, certa angústia em quem assiste. Com um tom independente, "Cela 211" deve agradar a todos que buscam um bom drama com ótimos elementos de ação.
Vale a pena!
Mariano Cohn e Gastón Duprat é dupla responsável por "O Cidadão Ilustre" e por "Minha Obra-Prima" - não por acaso você vai encontrar o mesmo humor ácido, inteligente, irônico e as vezes até estereotipado em "Concorrência Oficial". Dito isso, eu sugiro que você conheça o trabalho da dupla de diretores antes do play, pois dos três filmes, certamente esse é o mais autoral na sua essência - mas nem por isso menos divertido.
Aqui, conhecemos Humberto Suárez (José Luis Gómez) um bilionário de 80 anos que, com medo de perder sua significância, decide fazer um filme para deixar sua marca. Ele contrata os melhores para a missão: Lola Cuevas (Penélope Cruz) é uma cineasta famosa, premiada, mas excêntrica em seu método de trabalho. Para protagonistas, dois atores incrivelmente talentosos, mas com egos enormes, Félix Rivero (Antonio Banderas) e Iván Torres (Oscar Martínez). Um é famoso em Hollywood e o outro, um ator radical com fortes bases teatrais. Durante o processo de ensaio, eles não só terão que se aturar enquanto contracenam, mas também terão que decidir qual legado querem deixar depois do último "corta". Confira o trailer:
"Concorrência Oficial" é muito divertido, mas claramente vai dialogar com aquela audiência que já esteve envolvida com os bastidores da Arte, seja no cinema ou no teatro - existe uma forte crítica sobre um olhar elitizado a respeito da própria cultura, como se a teoria suplantasse a prática ou o aprofundamento técnico à inspiração e o talento. Essa dissociação não é saudável, provoca a polarização radical de ideias sobre um mesmo assunto e o roteiro (que conta com a mão certeira do irmão de Gastón, Andrés Duprat) aproveita demais os gatilhos dessa discussão (sem fim). Isso cria uma dinâmica narrativa muito agradável, leve e engraçada, onde os atores (na maioria das cenas apenas três) dão um verdadeiro show.
Para aqueles que buscam o bom entretenimento de uma comédia divertida, essa co-produção Argentiona/Espanha pode parecer nichada demais, incompreensiva até, já que muito que está na tela tem uma gramática particular do teatro, dos métodos de interpretação e de criação, onde mesmo com a intenção de fazer graça, pode parecer o contrário. Veja, "Concorrência Oficial" não tem o humor escrachado de "O Peso do Talento", muito menos o drama profundo de "Dor e Glória", mas tem um equilíbrio, cheio de camadas e ótimas sacadas dos dois. Alias, são tantas referências ao Almodóvar que Penélope Cruz praticamente se declara para o diretor espanhol (e amigo) - a cena em que sua personagem discute com a diretora de arte sobre o cenário que será a casa de um dos protagonistas parece ter sido tirada, justamente, de algum causo contado por Cruz.
Dois pontos que precisam ser comentados: "Concorrência Oficial" parece ser uma resposta mais íntima ao polêmico "The Square" do sueco Ruben Östlund - embora, para mim, ambos convergem nas suas intenções de formas diferentes, um mais leve e irônico, enquanto o outro de uma forma mais incômoda e provocativa. O segundo detalhe que merece sua atenção é o excelente trabalho de design de som do Aitor Berenguer (profissional indicado ao Emmy em 2016 por "The Night Manager") - é incrível como a construção usando esse elemento cria uma sensação de instabilidade nas relações entre os personagens (a cena do beijo, com os microfones ligados e o som saindo apenas nos fones de ouvido, é genial!).
"Competencia Oficial" (no original) se apropria do talento dos envolvidos, com uma projeção artística e técnica elogiável, um texto inteligente e performances dignas de prêmios. Não por acaso o filme esteve em festivais renomados como San Sebastián e Veneza, o que justifica seu caráter autoral, mas sem perder a elegância tão particular da cinematografia de Mariano Cohn e Gastón Duprat.
Vale muito a pena!
Mariano Cohn e Gastón Duprat é dupla responsável por "O Cidadão Ilustre" e por "Minha Obra-Prima" - não por acaso você vai encontrar o mesmo humor ácido, inteligente, irônico e as vezes até estereotipado em "Concorrência Oficial". Dito isso, eu sugiro que você conheça o trabalho da dupla de diretores antes do play, pois dos três filmes, certamente esse é o mais autoral na sua essência - mas nem por isso menos divertido.
Aqui, conhecemos Humberto Suárez (José Luis Gómez) um bilionário de 80 anos que, com medo de perder sua significância, decide fazer um filme para deixar sua marca. Ele contrata os melhores para a missão: Lola Cuevas (Penélope Cruz) é uma cineasta famosa, premiada, mas excêntrica em seu método de trabalho. Para protagonistas, dois atores incrivelmente talentosos, mas com egos enormes, Félix Rivero (Antonio Banderas) e Iván Torres (Oscar Martínez). Um é famoso em Hollywood e o outro, um ator radical com fortes bases teatrais. Durante o processo de ensaio, eles não só terão que se aturar enquanto contracenam, mas também terão que decidir qual legado querem deixar depois do último "corta". Confira o trailer:
"Concorrência Oficial" é muito divertido, mas claramente vai dialogar com aquela audiência que já esteve envolvida com os bastidores da Arte, seja no cinema ou no teatro - existe uma forte crítica sobre um olhar elitizado a respeito da própria cultura, como se a teoria suplantasse a prática ou o aprofundamento técnico à inspiração e o talento. Essa dissociação não é saudável, provoca a polarização radical de ideias sobre um mesmo assunto e o roteiro (que conta com a mão certeira do irmão de Gastón, Andrés Duprat) aproveita demais os gatilhos dessa discussão (sem fim). Isso cria uma dinâmica narrativa muito agradável, leve e engraçada, onde os atores (na maioria das cenas apenas três) dão um verdadeiro show.
Para aqueles que buscam o bom entretenimento de uma comédia divertida, essa co-produção Argentiona/Espanha pode parecer nichada demais, incompreensiva até, já que muito que está na tela tem uma gramática particular do teatro, dos métodos de interpretação e de criação, onde mesmo com a intenção de fazer graça, pode parecer o contrário. Veja, "Concorrência Oficial" não tem o humor escrachado de "O Peso do Talento", muito menos o drama profundo de "Dor e Glória", mas tem um equilíbrio, cheio de camadas e ótimas sacadas dos dois. Alias, são tantas referências ao Almodóvar que Penélope Cruz praticamente se declara para o diretor espanhol (e amigo) - a cena em que sua personagem discute com a diretora de arte sobre o cenário que será a casa de um dos protagonistas parece ter sido tirada, justamente, de algum causo contado por Cruz.
Dois pontos que precisam ser comentados: "Concorrência Oficial" parece ser uma resposta mais íntima ao polêmico "The Square" do sueco Ruben Östlund - embora, para mim, ambos convergem nas suas intenções de formas diferentes, um mais leve e irônico, enquanto o outro de uma forma mais incômoda e provocativa. O segundo detalhe que merece sua atenção é o excelente trabalho de design de som do Aitor Berenguer (profissional indicado ao Emmy em 2016 por "The Night Manager") - é incrível como a construção usando esse elemento cria uma sensação de instabilidade nas relações entre os personagens (a cena do beijo, com os microfones ligados e o som saindo apenas nos fones de ouvido, é genial!).
"Competencia Oficial" (no original) se apropria do talento dos envolvidos, com uma projeção artística e técnica elogiável, um texto inteligente e performances dignas de prêmios. Não por acaso o filme esteve em festivais renomados como San Sebastián e Veneza, o que justifica seu caráter autoral, mas sem perder a elegância tão particular da cinematografia de Mariano Cohn e Gastón Duprat.
Vale muito a pena!
Antes de mais nada é preciso deixar claro que "Dor e Glória" é um filme do Almodóvar na sua forma e no seu conteúdo!
Primeiro vamos falar do conteúdo: o filme conta a história do diretor de cinema Salvador Mallo (Antonio Banderas) que vive mergulhado em uma amarga melancolia graças à fortes dores no seu corpo, principalmente nas costas, impossibilitando-o, inclusive, de amarrar seu tênis. Essa condição acaba impedindo Salvador de trabalhar normalmente, já que ele mesmo defende que a dinâmica de um set de filmagem requer muita energia, dedicação e saúde - elementos que ele não encontra mais em si! Conformado com sua nova condição, o cineasta é provocado a passar por um dolorido processo de auto-análise, se obrigando a revisitar o passado na busca de um único objetivo: encontrar o caminho para continuar sua vida, em paz!
Sim, "Dor e Glória" é um filme de enorme reflexão, saudosista e até egocêntrico (no melhor sentido da palavra), já que Salvador Mallo é o alter-ego do próprio Pedro Almodóvar, mas a forma (e é claro que vamos falar mais dela logo abaixo) como ele conduz sua história mexe com a gente, pois é impossível não pensar na nossa própria vida. Essa dinâmica é tão inteligente que projetamos um filme a cada assunto (ou momento) em que ele precisa enfrentar seus "demônios" e a entrega que ele faz no final é só mais um belíssimo detalhe para um fechamento com chave de ouro!
Olha, vale muito a pena se você estiver disposto a enfrentar um filme mais cadenciado, sem uma dinâmica narrativa que possa empolgar, mas que tem no texto e, principalmente, no subtexto, uma espécie de imersão emocional muito genuína e reflexiva! É preciso gostar de Almodóvar para não se decepcionar!
Quando partimos do princípio que Salvador já teve seus momentos de glória e que agora ele só consegue enxergar (ou sentir) a dor, física e emocional, facilmente nos conectamos com o belíssimo trabalho do Antonio Banderas - indicado ao Oscar por esse trabalho. Ele está impecável como Salvador Mallo e é preciso dar muito mérito ao Almodóvar por isso - ele é um exímio diretor de atores e foi capaz de tirar o melhor de um Banderas completamente mergulhado na psiquê do seu mentor e amigo. É muito interessante o contraste que o ator conseguiu imprimir no seu personagem: se por um lado ele está rodeado de cores vivas, arte e conforto, por outro lado ele está sozinho e é incapaz de se conectar com a forma com que ele via (e vivia) a vida - o fato do apartamento de Salvador ser do próprio Almodóvar, só fortalece essa sensação de conflito interno! Um detalhe interessante do roteiro (e que nos faz pensar em várias passagens do filme) é como a vida não nos permite "jogar a sujeira para baixo do tapete"; em algum momento ela vai trabalhar para que a gente possa, finalmente, resolver essas pendências. É muito inteligente como os "nós" vão sendo desatados sem precisar forçar a barra e quando achamos que existe um certo exagero (o que até seria perdoável pelo estilo do diretor) ele nos explica com um único movimento de câmera, exatamente na última cena - e tudo faz mais sentido! Genial! O roteiro toca em pontos delicados como a percepção sobre o homossexualismo logo na infância, a relação com a religião, com as drogas, com a mãe, com os parceiros de trabalho e de vida; enfim, tudo está lá e muito bem amarrado - eu não teria ficado surpreso se fosse indicado para o Oscar de melhor roteiro original!
A fotografia do seu parceiro de longa data (mais um), Jose Luis Alcaine, segue sua gramática visual: das cores vivas, do contraste, dos planos abertos e da câmera fixa em 90% do filme - enquadramentos que parecem uma pintura estão lá também! Outro elemento que precisa ser destacado é o elenco que, além de Bandeiras, conta com um Asier Etxeandia (Por siempre Jamón e Velvet) como o ator Alberto Crespo que ficou 30 anos brigado com Salvador por desentendimentos criativos (e de comportamento) e pela participação cirúrgica de Penélope Cruz (Volver) eJulieta Serrano (Cuando vuelvas a mi lado) como a mãe de Salvador, Jacinta: a primeira na juventude e a segunda pouco antes de sua morte - aliás o diálogo entre Jacinta e Salvador no final do filme é algo digno de muitos prêmios, de roteiro e de atuação!
"Dor e Glória" é um filme que teria mais chances no Oscar não fosse o fenômeno "Parasita". Sua história é profunda, baseada em um roteiro inteligente e em um personagem muito bem construído pelo Antonio Banderas. A direção do Pedro Almodóvar é tecnicamente perfeita e cheia de detalhes quase imperceptíveis, mas que fazem a diferença. Reparem como ele trabalha o silêncio dos atores e mesmo assim somos capazes de sentir exatamente o drama que eles estão passando - a cena onde Salvador se despede de Frederico na porta do seu apartamento é um ótimo exemplo de como o subtexto do filme é importante: ele diz uma coisa, mas seu olhar diz outra! É demais! Vale muito o seu play e se o estilo Almodóvar te agradar, você vai se divertir muito!
Antes de mais nada é preciso deixar claro que "Dor e Glória" é um filme do Almodóvar na sua forma e no seu conteúdo!
Primeiro vamos falar do conteúdo: o filme conta a história do diretor de cinema Salvador Mallo (Antonio Banderas) que vive mergulhado em uma amarga melancolia graças à fortes dores no seu corpo, principalmente nas costas, impossibilitando-o, inclusive, de amarrar seu tênis. Essa condição acaba impedindo Salvador de trabalhar normalmente, já que ele mesmo defende que a dinâmica de um set de filmagem requer muita energia, dedicação e saúde - elementos que ele não encontra mais em si! Conformado com sua nova condição, o cineasta é provocado a passar por um dolorido processo de auto-análise, se obrigando a revisitar o passado na busca de um único objetivo: encontrar o caminho para continuar sua vida, em paz!
Sim, "Dor e Glória" é um filme de enorme reflexão, saudosista e até egocêntrico (no melhor sentido da palavra), já que Salvador Mallo é o alter-ego do próprio Pedro Almodóvar, mas a forma (e é claro que vamos falar mais dela logo abaixo) como ele conduz sua história mexe com a gente, pois é impossível não pensar na nossa própria vida. Essa dinâmica é tão inteligente que projetamos um filme a cada assunto (ou momento) em que ele precisa enfrentar seus "demônios" e a entrega que ele faz no final é só mais um belíssimo detalhe para um fechamento com chave de ouro!
Olha, vale muito a pena se você estiver disposto a enfrentar um filme mais cadenciado, sem uma dinâmica narrativa que possa empolgar, mas que tem no texto e, principalmente, no subtexto, uma espécie de imersão emocional muito genuína e reflexiva! É preciso gostar de Almodóvar para não se decepcionar!
Quando partimos do princípio que Salvador já teve seus momentos de glória e que agora ele só consegue enxergar (ou sentir) a dor, física e emocional, facilmente nos conectamos com o belíssimo trabalho do Antonio Banderas - indicado ao Oscar por esse trabalho. Ele está impecável como Salvador Mallo e é preciso dar muito mérito ao Almodóvar por isso - ele é um exímio diretor de atores e foi capaz de tirar o melhor de um Banderas completamente mergulhado na psiquê do seu mentor e amigo. É muito interessante o contraste que o ator conseguiu imprimir no seu personagem: se por um lado ele está rodeado de cores vivas, arte e conforto, por outro lado ele está sozinho e é incapaz de se conectar com a forma com que ele via (e vivia) a vida - o fato do apartamento de Salvador ser do próprio Almodóvar, só fortalece essa sensação de conflito interno! Um detalhe interessante do roteiro (e que nos faz pensar em várias passagens do filme) é como a vida não nos permite "jogar a sujeira para baixo do tapete"; em algum momento ela vai trabalhar para que a gente possa, finalmente, resolver essas pendências. É muito inteligente como os "nós" vão sendo desatados sem precisar forçar a barra e quando achamos que existe um certo exagero (o que até seria perdoável pelo estilo do diretor) ele nos explica com um único movimento de câmera, exatamente na última cena - e tudo faz mais sentido! Genial! O roteiro toca em pontos delicados como a percepção sobre o homossexualismo logo na infância, a relação com a religião, com as drogas, com a mãe, com os parceiros de trabalho e de vida; enfim, tudo está lá e muito bem amarrado - eu não teria ficado surpreso se fosse indicado para o Oscar de melhor roteiro original!
A fotografia do seu parceiro de longa data (mais um), Jose Luis Alcaine, segue sua gramática visual: das cores vivas, do contraste, dos planos abertos e da câmera fixa em 90% do filme - enquadramentos que parecem uma pintura estão lá também! Outro elemento que precisa ser destacado é o elenco que, além de Bandeiras, conta com um Asier Etxeandia (Por siempre Jamón e Velvet) como o ator Alberto Crespo que ficou 30 anos brigado com Salvador por desentendimentos criativos (e de comportamento) e pela participação cirúrgica de Penélope Cruz (Volver) eJulieta Serrano (Cuando vuelvas a mi lado) como a mãe de Salvador, Jacinta: a primeira na juventude e a segunda pouco antes de sua morte - aliás o diálogo entre Jacinta e Salvador no final do filme é algo digno de muitos prêmios, de roteiro e de atuação!
"Dor e Glória" é um filme que teria mais chances no Oscar não fosse o fenômeno "Parasita". Sua história é profunda, baseada em um roteiro inteligente e em um personagem muito bem construído pelo Antonio Banderas. A direção do Pedro Almodóvar é tecnicamente perfeita e cheia de detalhes quase imperceptíveis, mas que fazem a diferença. Reparem como ele trabalha o silêncio dos atores e mesmo assim somos capazes de sentir exatamente o drama que eles estão passando - a cena onde Salvador se despede de Frederico na porta do seu apartamento é um ótimo exemplo de como o subtexto do filme é importante: ele diz uma coisa, mas seu olhar diz outra! É demais! Vale muito o seu play e se o estilo Almodóvar te agradar, você vai se divertir muito!
"Durante a Tormenta" é mais um daqueles filmes escondidos no catálogo da Netflix que nos perguntamos: "Por que não assisti antes?"
Esse filme espanhol de 2018 é do mesmo roteirista e diretor do excelente "Um Contratempo" - o que de cara já nos gera algum interesse. Mas, claro, os pré-requisitos para um bom filme não param por aí: ao dar o play, já percebemos que, além de muito bem produzido, muito bem dirigido; a história é muito envolvente (e surpreendente) desde o inicio, e ainda trás elementos narrativos que nos remetem à "Dark", uma das melhores séries da história da Netflix!
Ao encontrar algumas fitas VHS velhas em sua nova casa, Vera (Adriana Ugarte) conhece Nico (Julio Bohigas), um garoto que morava com sua mãe na mesma residência há 25 anos atrás. Curiosa, ela faz uma pesquisa na internet sobre o jovem e descobre que ele morreu em um acidente, em uma noite repleta de acontecimentos misteriosos na região. Por conta de um raro evento que quebra a relação "espaço/tempo", os dois conseguem se comunicar rapidamente por meio de uma filmadora ligada na televisão. Sabendo sobre o acidente, Vera aproveita para avisar Nico e assim evitar a sua morte. Acontece que, ao fazer isso, Vera altera vários acontecimentos a partir dali e agora precisa lidar com sua nova realidade enquanto busca uma forma de colocar a história no caminho que, para ela, parecia ser o correto. Confira o trailer:
Antes de mais nada temos que deixar uma coisa bem claro: trata-se de uma ficção cientifica e por isso, embarcar na história vai te exigir uma certa suspensão da realidade! Por mais que algumas soluções narrativas possam parecer frágeis, eu te garanto: trata-se de um roteiro muito bem construído, daquele tipo que não podemos tirar o olho da tela para não se perder nada da história - e isso é entretenimento de primeira!
Oriol Paulo é um diretor talentoso e que já comprovou isso em todos os trabalhos que realizou até aqui - ele domina a gramática cinematográfica do mistério e sabe perfeitamente onde nos levar em suas histórias. Em "Durante a Tormenta" não é diferente, ele joga as peças do quebra-cabeça e nos provoca a montar junto com ele, com isso somos fisgados pela história e a sensação de estarmos diante de algo inteligente e surpreendente é incrível!
Pode dar o play sem receio, sua diversão estará garantida!
"Durante a Tormenta" é mais um daqueles filmes escondidos no catálogo da Netflix que nos perguntamos: "Por que não assisti antes?"
Esse filme espanhol de 2018 é do mesmo roteirista e diretor do excelente "Um Contratempo" - o que de cara já nos gera algum interesse. Mas, claro, os pré-requisitos para um bom filme não param por aí: ao dar o play, já percebemos que, além de muito bem produzido, muito bem dirigido; a história é muito envolvente (e surpreendente) desde o inicio, e ainda trás elementos narrativos que nos remetem à "Dark", uma das melhores séries da história da Netflix!
Ao encontrar algumas fitas VHS velhas em sua nova casa, Vera (Adriana Ugarte) conhece Nico (Julio Bohigas), um garoto que morava com sua mãe na mesma residência há 25 anos atrás. Curiosa, ela faz uma pesquisa na internet sobre o jovem e descobre que ele morreu em um acidente, em uma noite repleta de acontecimentos misteriosos na região. Por conta de um raro evento que quebra a relação "espaço/tempo", os dois conseguem se comunicar rapidamente por meio de uma filmadora ligada na televisão. Sabendo sobre o acidente, Vera aproveita para avisar Nico e assim evitar a sua morte. Acontece que, ao fazer isso, Vera altera vários acontecimentos a partir dali e agora precisa lidar com sua nova realidade enquanto busca uma forma de colocar a história no caminho que, para ela, parecia ser o correto. Confira o trailer:
Antes de mais nada temos que deixar uma coisa bem claro: trata-se de uma ficção cientifica e por isso, embarcar na história vai te exigir uma certa suspensão da realidade! Por mais que algumas soluções narrativas possam parecer frágeis, eu te garanto: trata-se de um roteiro muito bem construído, daquele tipo que não podemos tirar o olho da tela para não se perder nada da história - e isso é entretenimento de primeira!
Oriol Paulo é um diretor talentoso e que já comprovou isso em todos os trabalhos que realizou até aqui - ele domina a gramática cinematográfica do mistério e sabe perfeitamente onde nos levar em suas histórias. Em "Durante a Tormenta" não é diferente, ele joga as peças do quebra-cabeça e nos provoca a montar junto com ele, com isso somos fisgados pela história e a sensação de estarmos diante de algo inteligente e surpreendente é incrível!
Pode dar o play sem receio, sua diversão estará garantida!
Para quem estava com saudades daquele filme de suspense espanhol com fortes elementos dramáticos que colocaram o país entre os queridinhos dos assinantes de streaming, eu adianto: "Jaula" é imperdível! Produzido pelo talentoso Álex de La Iglesia (de "O Bar"), o filme resgata uma história real absurda para servir de base (apenas de base) para um roteiro muito bem amarrado e que entrega uma trama que transita perfeitamente entre a "tensão" e a "dúvida" a cada cena - sim, a trama é mesmo consistente o suficiente para que você não tire os olhos da tela até o seu final!
Paula (Elena Anaya) e seu marido Simón (Pablo Molinero) estão voltando para casa quando, de repente, encontram uma criança de seis anos vagando sozinha pela estrada. Ao se certificar que ninguém foi atrás dela, o casal decide leva-la para casa temporariamente. O que poderia ser uma alegria para eles, logo se transforma em caos, já que menina é incapaz de sair de um quadrado de giz pintado no chão e misteriosas situações passam acontecer com todos a sua volta. Dado o forte vínculo criado entre a Paula e ela, Paula decide investigar o passado enigmático da garota e sua descoberta acaba colocando ambas em muito perigo. Confira o trailer (em espanhol):
Dirigido pelo Ignacio Tatay (em seu primeiro longa-metragem), "Jaula", de fato, entrega um mistério dos mais intrigantes - é muito interessante como o roteiro do próprio Tatay ao lado da premiada escritora Isabel Peña (do ótimo "Stockholm") brinca com vários gatilhos narrativos que vão do sobrenatural ao psicológico em apenas uma linha de diálogo ou uma troca de enquadramento. Essa dinâmica, aliás, em nada facilita para audiência na resolução do mistério e mesmo que esse mistério não se sustente até o final, ele nos surpreende e acaba nos movendo para uma visão completa de tudo que foi se construindo até ali, sem roubar no jogo - existe um uma troca de perspectiva no terceiro ato que é muito bem encaixada e criativa, e que funciona lindamente no filme.
Na busca por um equilíbrio cirúrgico entre o fantasioso de "O Telefone Preto"e o realismo brutal de "3096 Dias", o filme mais acerta do que erra, mesmo que em alguns momentos os diálogos e os dramas paralelos pereçam não te levar para lugar algum. É verdade que a construção de camadas que supostamente dariam uma profundidade maior para Paula e Simón é pouco aproveitada, por outro lado essa "deficiência" acaba favorecendo o entretenimento, deixando a trama menos "cabeça". Mas não se engane, a história tem uma série de detalhes, principalmente na investigação de Paula, que merecem e precisam muito da sua atenção!
"Jaula" vem na linha de "A Casa" ou "Quem com ferro fere", que chega no streaming sem muito barulho, mas que acaba conquistando uma audiência relevante e fiel às novas propostas do cinema espanhol. A experiência de assistir o filme é ótima, a história é inteligente e envolvente, o mistério é bem arquitetado e a resolução bem satisfatória, mas saiba que muito será apenas sugerido, então não espere tantas explicações - juntar as peças para uma conclusão mais, digamos, completa, será sua função e isso, na minha opinião, é o mais divertido quando nos deparamos com um bom filme do gênero como esse.
Vale muito seu play!
Para quem estava com saudades daquele filme de suspense espanhol com fortes elementos dramáticos que colocaram o país entre os queridinhos dos assinantes de streaming, eu adianto: "Jaula" é imperdível! Produzido pelo talentoso Álex de La Iglesia (de "O Bar"), o filme resgata uma história real absurda para servir de base (apenas de base) para um roteiro muito bem amarrado e que entrega uma trama que transita perfeitamente entre a "tensão" e a "dúvida" a cada cena - sim, a trama é mesmo consistente o suficiente para que você não tire os olhos da tela até o seu final!
Paula (Elena Anaya) e seu marido Simón (Pablo Molinero) estão voltando para casa quando, de repente, encontram uma criança de seis anos vagando sozinha pela estrada. Ao se certificar que ninguém foi atrás dela, o casal decide leva-la para casa temporariamente. O que poderia ser uma alegria para eles, logo se transforma em caos, já que menina é incapaz de sair de um quadrado de giz pintado no chão e misteriosas situações passam acontecer com todos a sua volta. Dado o forte vínculo criado entre a Paula e ela, Paula decide investigar o passado enigmático da garota e sua descoberta acaba colocando ambas em muito perigo. Confira o trailer (em espanhol):
Dirigido pelo Ignacio Tatay (em seu primeiro longa-metragem), "Jaula", de fato, entrega um mistério dos mais intrigantes - é muito interessante como o roteiro do próprio Tatay ao lado da premiada escritora Isabel Peña (do ótimo "Stockholm") brinca com vários gatilhos narrativos que vão do sobrenatural ao psicológico em apenas uma linha de diálogo ou uma troca de enquadramento. Essa dinâmica, aliás, em nada facilita para audiência na resolução do mistério e mesmo que esse mistério não se sustente até o final, ele nos surpreende e acaba nos movendo para uma visão completa de tudo que foi se construindo até ali, sem roubar no jogo - existe um uma troca de perspectiva no terceiro ato que é muito bem encaixada e criativa, e que funciona lindamente no filme.
Na busca por um equilíbrio cirúrgico entre o fantasioso de "O Telefone Preto"e o realismo brutal de "3096 Dias", o filme mais acerta do que erra, mesmo que em alguns momentos os diálogos e os dramas paralelos pereçam não te levar para lugar algum. É verdade que a construção de camadas que supostamente dariam uma profundidade maior para Paula e Simón é pouco aproveitada, por outro lado essa "deficiência" acaba favorecendo o entretenimento, deixando a trama menos "cabeça". Mas não se engane, a história tem uma série de detalhes, principalmente na investigação de Paula, que merecem e precisam muito da sua atenção!
"Jaula" vem na linha de "A Casa" ou "Quem com ferro fere", que chega no streaming sem muito barulho, mas que acaba conquistando uma audiência relevante e fiel às novas propostas do cinema espanhol. A experiência de assistir o filme é ótima, a história é inteligente e envolvente, o mistério é bem arquitetado e a resolução bem satisfatória, mas saiba que muito será apenas sugerido, então não espere tantas explicações - juntar as peças para uma conclusão mais, digamos, completa, será sua função e isso, na minha opinião, é o mais divertido quando nos deparamos com um bom filme do gênero como esse.
Vale muito seu play!
"Julieta" é um filme de Pedro Almodóvar e isso, por si só, já nos prepara pelo que vem pela frente. Porém, Almodóvar vem surpreendendo - se não pela forma, pelo conteúdo. É impressionante como sua identidade como diretor está em cada frame, mas cada vez mais com um certo tom inventivo, agora carregando no drama e na densidade, saindo completamente da sua zona de conforto como roteirista - e vem funcionando.
A premissa é incrivelmente simples, já que o filme acompanha Julieta (Adriana Ugarte e depois Emma Suárez) que, ao longo de três décadas, tenta descobrir por que Antía (Priscilla Delgado e depois Blanca Parés), sua única filha, se afastou dela inesperadamente. Quando Julieta estava prestes a se mudar de Madrid para Portugal, um encontro inesperado a fez mudar de ideia e reviver sua relação como mãe. Ainda na Espanha, ela então começa a escrever uma carta para Antía, contando sua história e como se deu o relacionamento com os homens de sua vida. Confira o trailer:
Baseado em três contos do livro "Fugitiva", da vencedora do Prêmio Nobel Alice Munro, Almodóvar entrega seu talento na construção de uma personagem complexa, cheia de camadas e brilhantemente interpretado pela Emma Suárez - trabalho que lhe garantiu o prêmio Goya (o Oscar Espanhol em 2017). O interessante da performance de Suárez é que sua essência vai muito de encontro ao trabalho que Antônio Banderas teve em "Dor e Glória", onde ambosdesconstroem o personagem para encontrar no passado um sentido para lidar com o presente. Esse mergulho nostálgico, mas doloroso, está em cada detalhe - inclusive na escolha narrativa e na transição lírica que o diretor faz, aproximando o amargo da vida e suas profundas marcas de expressão já nascendo em um rosto jovem e se apoderando da sua versão mais madura.
O roteiro é, de fato, muito inteligente ao juntar as pontas soltas de uma história de vida com uma elegância impressionante. A quebra da linha temporal cria uma dinâmica interessante, conceitualmente pontuada por uma trilha sonora sombria (até over) - quase que antecipando os acontecimentos, mas adicionando sensações e sentimentos que vão da angústia até a culpa, do mistério ao óbvio, mesmo antes de entendermos exatamente o que está acontecendo e para onde a história vai nos guiar - é incrível como Almodóvar tem a capacidade de entregar as situações sem aquela pressa usual e ao mesmo tempo nos provocar curiosidade sem que percamos a paciência.
"Julieta" é na sua essência um filme de relações familiares. Um recorte de sentimentos (bons e ruins) que precisam ser revisitados para que a vida siga seu caminho natural. É um processo de amadurecimento do diretor que troca a ousadia de antes por uma serenidade profunda - sem perder o elemento provocativo das composições visuais e de suas mensagens mais poéticas e abstratas. É um "Almodóvar" - do tipo que o filme poderia ser uma pintura, mas que nos toca profundamente e que encontra na genialidade do diretor uma razão coerente para sua filmografia cada vez mais interiorizada, seja na figura de Julieta, da sua filha ou até do seu pai que repete justamente o mesmo ciclo que ela viveu.
Vale a pena para quem acompanha a carreira do diretor e para quem gosta da profundidade das relações e de como elas nos impactam.
"Julieta" é um filme de Pedro Almodóvar e isso, por si só, já nos prepara pelo que vem pela frente. Porém, Almodóvar vem surpreendendo - se não pela forma, pelo conteúdo. É impressionante como sua identidade como diretor está em cada frame, mas cada vez mais com um certo tom inventivo, agora carregando no drama e na densidade, saindo completamente da sua zona de conforto como roteirista - e vem funcionando.
A premissa é incrivelmente simples, já que o filme acompanha Julieta (Adriana Ugarte e depois Emma Suárez) que, ao longo de três décadas, tenta descobrir por que Antía (Priscilla Delgado e depois Blanca Parés), sua única filha, se afastou dela inesperadamente. Quando Julieta estava prestes a se mudar de Madrid para Portugal, um encontro inesperado a fez mudar de ideia e reviver sua relação como mãe. Ainda na Espanha, ela então começa a escrever uma carta para Antía, contando sua história e como se deu o relacionamento com os homens de sua vida. Confira o trailer:
Baseado em três contos do livro "Fugitiva", da vencedora do Prêmio Nobel Alice Munro, Almodóvar entrega seu talento na construção de uma personagem complexa, cheia de camadas e brilhantemente interpretado pela Emma Suárez - trabalho que lhe garantiu o prêmio Goya (o Oscar Espanhol em 2017). O interessante da performance de Suárez é que sua essência vai muito de encontro ao trabalho que Antônio Banderas teve em "Dor e Glória", onde ambosdesconstroem o personagem para encontrar no passado um sentido para lidar com o presente. Esse mergulho nostálgico, mas doloroso, está em cada detalhe - inclusive na escolha narrativa e na transição lírica que o diretor faz, aproximando o amargo da vida e suas profundas marcas de expressão já nascendo em um rosto jovem e se apoderando da sua versão mais madura.
O roteiro é, de fato, muito inteligente ao juntar as pontas soltas de uma história de vida com uma elegância impressionante. A quebra da linha temporal cria uma dinâmica interessante, conceitualmente pontuada por uma trilha sonora sombria (até over) - quase que antecipando os acontecimentos, mas adicionando sensações e sentimentos que vão da angústia até a culpa, do mistério ao óbvio, mesmo antes de entendermos exatamente o que está acontecendo e para onde a história vai nos guiar - é incrível como Almodóvar tem a capacidade de entregar as situações sem aquela pressa usual e ao mesmo tempo nos provocar curiosidade sem que percamos a paciência.
"Julieta" é na sua essência um filme de relações familiares. Um recorte de sentimentos (bons e ruins) que precisam ser revisitados para que a vida siga seu caminho natural. É um processo de amadurecimento do diretor que troca a ousadia de antes por uma serenidade profunda - sem perder o elemento provocativo das composições visuais e de suas mensagens mais poéticas e abstratas. É um "Almodóvar" - do tipo que o filme poderia ser uma pintura, mas que nos toca profundamente e que encontra na genialidade do diretor uma razão coerente para sua filmografia cada vez mais interiorizada, seja na figura de Julieta, da sua filha ou até do seu pai que repete justamente o mesmo ciclo que ela viveu.
Vale a pena para quem acompanha a carreira do diretor e para quem gosta da profundidade das relações e de como elas nos impactam.
"Kiki: Os Segredos do Desejo" acompanha cinco história de amor e sexo que se desenrolam ao longo de uma temporada de verão em Madrid, quando os personagens descobrem fontes de prazer bem estranhas e extremamente incomuns com nomes impronunciáveis como: Dacrifilia, Hifefilia, Somnofilia, Harpaxofilia… vemos tabus sendo quebrados, um a um, conforme esses casais se envolvem em uma emocionante libertação onde nenhum prazer é negado, seja qual for a sua forma.
Antes de mais nada é preciso dizer que para se divertir assistindo "Kiki: Os Segredos do Desejo" é preciso estar acostumado com o humor "ácido" do cinema espanhol. Seu roteiro é um ótimo exemplo do equilíbrio entre comédia e drama que uma nova geração de diretores espanhóis vem produzindo - nesse caso temos um filme sobre relações, sobre sexo, sobre traços do comportamento humano que nem imaginaríamos que pudesse ser real ou verdadeiro. Embora muito bem feito, muito bem dirigido pelo também ator Paco León e com um roteiro excelente (embora constrangedor no melhor e engraçado sentido da palavra, se isso é possível), "Kiki" ganha ainda mais força com o elenco - é uma interpretação melhor que a outra!
Olha, dessa nova linha de filmes espanhóis que já analisamos, "El bar" ainda é melhor, mas "Kiki: Os Segredos do Desejo" também é divertidíssimo e se você tiver afim de ser provocado, com uma narrativa menos convencional, eu indico tranquilamente!
"Kiki: Os Segredos do Desejo" acompanha cinco história de amor e sexo que se desenrolam ao longo de uma temporada de verão em Madrid, quando os personagens descobrem fontes de prazer bem estranhas e extremamente incomuns com nomes impronunciáveis como: Dacrifilia, Hifefilia, Somnofilia, Harpaxofilia… vemos tabus sendo quebrados, um a um, conforme esses casais se envolvem em uma emocionante libertação onde nenhum prazer é negado, seja qual for a sua forma.
Antes de mais nada é preciso dizer que para se divertir assistindo "Kiki: Os Segredos do Desejo" é preciso estar acostumado com o humor "ácido" do cinema espanhol. Seu roteiro é um ótimo exemplo do equilíbrio entre comédia e drama que uma nova geração de diretores espanhóis vem produzindo - nesse caso temos um filme sobre relações, sobre sexo, sobre traços do comportamento humano que nem imaginaríamos que pudesse ser real ou verdadeiro. Embora muito bem feito, muito bem dirigido pelo também ator Paco León e com um roteiro excelente (embora constrangedor no melhor e engraçado sentido da palavra, se isso é possível), "Kiki" ganha ainda mais força com o elenco - é uma interpretação melhor que a outra!
Olha, dessa nova linha de filmes espanhóis que já analisamos, "El bar" ainda é melhor, mas "Kiki: Os Segredos do Desejo" também é divertidíssimo e se você tiver afim de ser provocado, com uma narrativa menos convencional, eu indico tranquilamente!
Certamente um dos maiores acertos da Netflix esse ano. "Klaus" é sua primeira animação original em parceria com o The SPA Studios - e olha, não deixa nada a desejar para nenhum outro Estúdio. Mesmo a animação sendo em 2D, com um conceito visual muito usado pela Disney, o filme soube equilibrar muito bem a arte dos traços com um roteiro redondinho. "Klaus" mostra a jornada de Jesper que, por ser um filho muito mimado e que não valoriza o trabalho, é transferido para cuidar de um negócio da família: um Correio na distante Smeerensburg, uma pequena cidade no Círculo Polar Ártico que vive em pé de guerra - baseado em uma tradição histórica de rivalidade entre os Krum (cabelos pretos) e os Ellingboe (cabelos ruivos). Sabendo que só poderia retornar ao conforto do lar após entregar 6.000 cartas, Jesper precisa usar a criatividade (e a ajuda do velho lenhador Klaus) para cumprir sua missão como carteiro e como ser humano - é aí que a Animação vai ganhando força, pois o roteiro usa de situações inusitadas dos dois personagens para contar como cada signo do natal foi criado. É muito interessante e criativo! Além de uma mensagem belíssima, o filme é dinâmico, bonito, inteligente e muito gostoso de assistir! Filme para a família, sem a menor dúvida! Imperdível!
Atual ao discutir a polarização que toma conta do mundo, "Klaus" chega para desconstruir uma expectativa pessimista em relação ao mundo e ao ser humano, através do olhar mais sincero que pode existir: o da criança. Cheio de alegorias, ao melhor estilo "Divertidamente", a animação da Netflix usa da criatividade para construir a jornada de auto-conhecimento de Jesper, mesmo que fantasiada de punição. É bacana que cada detalhe do filme nos faz refletir sobre a forma como encaramos a vida, usando de normas pré-estabelecidas que, na verdade, podem perder o seu significado a partir do momento em que mudamos a maneira como encaramos esses fatos, ou como vamos tomando consciência da necessidade de transformação para vivermos melhor (e em paz)! É claro que o "espírito de natal" cai como uma luva nesse cenário e o diretor Sergio Pablos, que já havia criado a história do "Meu Malvado Favorito", explora perfeitamente cada signo, cada mensagem, cada ideal do natal; como entretenimento de primeira! Sensacional!
"Klaus" deixa de lado a tecnologia 3D de "Toy Story" e abusa das texturas e da iluminação, usando uma técnica muito particular para construir os traços de personagens caricatos mas com muita alma! A transformação do cenário, as cores, o tom, tudo surge como uma pintura - é clara a referência do "O Estranho Mundo de Jack". Mesmo não sendo um musical, é impossível não sorrir (ou se emocionar) ao escutar a música Invisibleda sueca Zara Larsson. Eu diria que "Klaus" é um pacote completo, uma animação digna de indicação ao Oscar e, sem dúvida, uma das melhores produções do gênero no ano! Vale muito o seu play!
Certamente um dos maiores acertos da Netflix esse ano. "Klaus" é sua primeira animação original em parceria com o The SPA Studios - e olha, não deixa nada a desejar para nenhum outro Estúdio. Mesmo a animação sendo em 2D, com um conceito visual muito usado pela Disney, o filme soube equilibrar muito bem a arte dos traços com um roteiro redondinho. "Klaus" mostra a jornada de Jesper que, por ser um filho muito mimado e que não valoriza o trabalho, é transferido para cuidar de um negócio da família: um Correio na distante Smeerensburg, uma pequena cidade no Círculo Polar Ártico que vive em pé de guerra - baseado em uma tradição histórica de rivalidade entre os Krum (cabelos pretos) e os Ellingboe (cabelos ruivos). Sabendo que só poderia retornar ao conforto do lar após entregar 6.000 cartas, Jesper precisa usar a criatividade (e a ajuda do velho lenhador Klaus) para cumprir sua missão como carteiro e como ser humano - é aí que a Animação vai ganhando força, pois o roteiro usa de situações inusitadas dos dois personagens para contar como cada signo do natal foi criado. É muito interessante e criativo! Além de uma mensagem belíssima, o filme é dinâmico, bonito, inteligente e muito gostoso de assistir! Filme para a família, sem a menor dúvida! Imperdível!
Atual ao discutir a polarização que toma conta do mundo, "Klaus" chega para desconstruir uma expectativa pessimista em relação ao mundo e ao ser humano, através do olhar mais sincero que pode existir: o da criança. Cheio de alegorias, ao melhor estilo "Divertidamente", a animação da Netflix usa da criatividade para construir a jornada de auto-conhecimento de Jesper, mesmo que fantasiada de punição. É bacana que cada detalhe do filme nos faz refletir sobre a forma como encaramos a vida, usando de normas pré-estabelecidas que, na verdade, podem perder o seu significado a partir do momento em que mudamos a maneira como encaramos esses fatos, ou como vamos tomando consciência da necessidade de transformação para vivermos melhor (e em paz)! É claro que o "espírito de natal" cai como uma luva nesse cenário e o diretor Sergio Pablos, que já havia criado a história do "Meu Malvado Favorito", explora perfeitamente cada signo, cada mensagem, cada ideal do natal; como entretenimento de primeira! Sensacional!
"Klaus" deixa de lado a tecnologia 3D de "Toy Story" e abusa das texturas e da iluminação, usando uma técnica muito particular para construir os traços de personagens caricatos mas com muita alma! A transformação do cenário, as cores, o tom, tudo surge como uma pintura - é clara a referência do "O Estranho Mundo de Jack". Mesmo não sendo um musical, é impossível não sorrir (ou se emocionar) ao escutar a música Invisibleda sueca Zara Larsson. Eu diria que "Klaus" é um pacote completo, uma animação digna de indicação ao Oscar e, sem dúvida, uma das melhores produções do gênero no ano! Vale muito o seu play!
Não foram poucas as criticas que "Mães Paralelas" recebeu, principalmente do público - muitas, inclusive, classificando o filme como o mais fraco da história recente de Pedro Almodóvar. Eu discordo, embora entenda algumas delas. A conexão entre o drama da protagonista e sua filha e a questão politica que o diretor levanta é definida através de um único elemento: o "tempo"! Não importa nossa percepção de que a vida passa rápido (e o filme faz questão de explorar esses saltos temporais) e que isso ajuda a curar nossas dores, o que o roteiro deixa claro é que as nossas marcas profundas (mesmo que geracionais) não se apagam, apenas aprendemos a lidar com elas.
Duas mulheres, Janis (Penélope Cruz) e Ana (Milena Smit), dividem o quarto de hospital onde vão dar à luz. As duas são solteiras e ficaram grávidas acidentalmente. Janis, de meia-idade, não se arrepende, enquanto Ana, uma adolescente, está assustada, arrependida e traumatizada. Janis tenta animá-la enquanto passeiam pelo corredor do hospital. As poucas palavras que trocam nessas horas criam um vínculo muito profundo entre as duas, porém o destino se encarrega de desenvolver e complicar de forma tão retumbante a vida de ambas para sempre. Confira o trailer:
Antes de mais nada é preciso entender que em um filme do Almodóvar nada está em cena por acaso. Cada linha escrita no roteiro está completamente alinhada com aquele universo que o diretor constrói visualmente - gostem ou não do seu estilo, suas personagens (preferencialmente femininas) possuem tantas camadas que, muitas vezes, até nos perdemos dentro de sua própria profundidade. Em "Mães Paralelas" não é diferente - começando pelo título que vai promover um debate interessante: o foco está em Janis e Ana, ou em todas as mães que perderam seus filhos durante o período da revolução facista na Espanha?
A magia da filmografia de Almodóvar está no detalhe e aqui vou citar um para você reparar e ampliar seu entendimento sobre a história. É um detalhe, mas faz toda a diferença: um dos momentos mais importantes da relação entre Janis e Ana acontece diante de uma parede completamente decorada com fotos de todas as mulheres da família de Janis, mulheres que escolheram ou foram obrigadas a criar outras mulheres sozinhas - o interessante é que em um determinado momento, Janis sugere como o passado sempre será carregado para o futuro. O exemplo dos ciclos familiares de Janis ganha ainda mais força quando ela percebe que dificilmente conseguirá quebra-lo e o homem que impede isso é justamente quem poderia liberta-la - entende a conceito de "paralelo" do filme?
Ao lado do Diretor de Fotografia José Luis Alcaine e do diretor de arte Antxón Gómez, seus parceiros de longa data, Almodóvar não se preocupa em teatralizar seus planos e muito menos em limitar a performance de suas atrizes. Penélope sabe disso e aproveita dessa liberdade para brilhar (mesmo que a indicação ao Oscar tenha parecido exagerada). Smit é mais contida, e acaba sofrendo um pouco com a necessidade de exposição do diretor e aqui cabe outro comentário pertinente: expor o óbvio pode ser um tiro no pé, mas nesse caso faz parte de uma dinâmica narrativa que usa dessas obviedades como gatilhos de aceitação e transformação dos personagens (principalmente no segundo ato).
Por mais que esteja escondido em uma trama que soa novelesca, “Mães Paralelas” é na verdade um filme político e suas marcas - e de como isso pode ser decodificado em outras gerações (a cena em que Janis cobra essa consciência histórica de Ana é genial). Poderia haver mais elementos que remetessem à critica política, para dialogar com sua premissa de uma forma tão expositiva quanto em sua subtrama sobre maternidade? Sim, acho que sim e é onde entendo algumas críticas - mas se isso acontecesse, não seria um "Almodóvar", certo?
Vale muito seu play!
Não foram poucas as criticas que "Mães Paralelas" recebeu, principalmente do público - muitas, inclusive, classificando o filme como o mais fraco da história recente de Pedro Almodóvar. Eu discordo, embora entenda algumas delas. A conexão entre o drama da protagonista e sua filha e a questão politica que o diretor levanta é definida através de um único elemento: o "tempo"! Não importa nossa percepção de que a vida passa rápido (e o filme faz questão de explorar esses saltos temporais) e que isso ajuda a curar nossas dores, o que o roteiro deixa claro é que as nossas marcas profundas (mesmo que geracionais) não se apagam, apenas aprendemos a lidar com elas.
Duas mulheres, Janis (Penélope Cruz) e Ana (Milena Smit), dividem o quarto de hospital onde vão dar à luz. As duas são solteiras e ficaram grávidas acidentalmente. Janis, de meia-idade, não se arrepende, enquanto Ana, uma adolescente, está assustada, arrependida e traumatizada. Janis tenta animá-la enquanto passeiam pelo corredor do hospital. As poucas palavras que trocam nessas horas criam um vínculo muito profundo entre as duas, porém o destino se encarrega de desenvolver e complicar de forma tão retumbante a vida de ambas para sempre. Confira o trailer:
Antes de mais nada é preciso entender que em um filme do Almodóvar nada está em cena por acaso. Cada linha escrita no roteiro está completamente alinhada com aquele universo que o diretor constrói visualmente - gostem ou não do seu estilo, suas personagens (preferencialmente femininas) possuem tantas camadas que, muitas vezes, até nos perdemos dentro de sua própria profundidade. Em "Mães Paralelas" não é diferente - começando pelo título que vai promover um debate interessante: o foco está em Janis e Ana, ou em todas as mães que perderam seus filhos durante o período da revolução facista na Espanha?
A magia da filmografia de Almodóvar está no detalhe e aqui vou citar um para você reparar e ampliar seu entendimento sobre a história. É um detalhe, mas faz toda a diferença: um dos momentos mais importantes da relação entre Janis e Ana acontece diante de uma parede completamente decorada com fotos de todas as mulheres da família de Janis, mulheres que escolheram ou foram obrigadas a criar outras mulheres sozinhas - o interessante é que em um determinado momento, Janis sugere como o passado sempre será carregado para o futuro. O exemplo dos ciclos familiares de Janis ganha ainda mais força quando ela percebe que dificilmente conseguirá quebra-lo e o homem que impede isso é justamente quem poderia liberta-la - entende a conceito de "paralelo" do filme?
Ao lado do Diretor de Fotografia José Luis Alcaine e do diretor de arte Antxón Gómez, seus parceiros de longa data, Almodóvar não se preocupa em teatralizar seus planos e muito menos em limitar a performance de suas atrizes. Penélope sabe disso e aproveita dessa liberdade para brilhar (mesmo que a indicação ao Oscar tenha parecido exagerada). Smit é mais contida, e acaba sofrendo um pouco com a necessidade de exposição do diretor e aqui cabe outro comentário pertinente: expor o óbvio pode ser um tiro no pé, mas nesse caso faz parte de uma dinâmica narrativa que usa dessas obviedades como gatilhos de aceitação e transformação dos personagens (principalmente no segundo ato).
Por mais que esteja escondido em uma trama que soa novelesca, “Mães Paralelas” é na verdade um filme político e suas marcas - e de como isso pode ser decodificado em outras gerações (a cena em que Janis cobra essa consciência histórica de Ana é genial). Poderia haver mais elementos que remetessem à critica política, para dialogar com sua premissa de uma forma tão expositiva quanto em sua subtrama sobre maternidade? Sim, acho que sim e é onde entendo algumas críticas - mas se isso acontecesse, não seria um "Almodóvar", certo?
Vale muito seu play!
“No Matarás” é mais um suspense psicológico espanhol (e isso já diz muito dado o sucesso das recentes produções do país como "Remédio Amargo", "Quem com ferro fere" e "A Casa") que vai te deixar preso do início ao fim. Isso porque logo após um evento traumático envolvendo o protagonista, as coisas começam ir de mal a pior.
Na trama, Dani (Mario Casas) é um bom rapaz que durante os últimos anos se dedicou exclusivamente a cuidar do seu pai doente até a sua morte. Justamente quando ele decide retomar a sua vida e fazer uma longa viagem, Dani conhece Mila (Milena Smit), uma mulher tão perturbadora e sensual como instável, quei transforma sua noite em um verdadeiro pesadelo. Confira o trailer (em espanhol):
Embora a história se mantenha eletrizante por mais de uma hora, na sequência final algumas revelações e acontecimentos beiram o exagero, mais ou menos como o que já vimos em outros filmes espanhóis, mas nada que comprometa o bom entretenimento que essa noite alucinante proporciona. A direção de David Victori (de "Sky Rojo") contribui para criação dessa atmosfera: ela é energética, seja pelos cortes frequentes, pela trilha sonora ou pelo fato do tempo inteiro acompanharmos uma movimentação de câmera que caminha junto com os personagens - uma técnica que funciona muito bem nessa narrativa que explora a sensação de urgência e todos os anseios e desespero do protagonista.
A direção de fotografia de Elías M. Félix ("O Pacto ") também é eficiente e faz um bom uso da iluminação, do brilho do neon e das cores vibrantes da noite agitada, caótica e trágica. No elenco, Mario Casas (“Um Contratempo” e "Remédio Amargo") tem se mostrado o ator perfeito para viver esses papeis que o colocam em situações desesperadoras, já que o ator transita muito bem suas emoções. A atriz Milena Smit (“Mães Paralelas”) também entrega um trabalho sensacional - é impossível você não sentir raiva da personagem que o tempo todo testará sua paciência.
“No Matarás” é envolvente e consegue prender sua atenção o tempo inteiro, além das surpresas que os desdobramentos da história proporciona, ainda que dê uma derrapada na reta final, tenho certeza que sua experiência durante uma hora e meia será no mínimo proveitosa.
Se você procura um bom entretenimento, só dar o play!
Escrito por Mark Hewes - uma parceria @indiqueipraver
“No Matarás” é mais um suspense psicológico espanhol (e isso já diz muito dado o sucesso das recentes produções do país como "Remédio Amargo", "Quem com ferro fere" e "A Casa") que vai te deixar preso do início ao fim. Isso porque logo após um evento traumático envolvendo o protagonista, as coisas começam ir de mal a pior.
Na trama, Dani (Mario Casas) é um bom rapaz que durante os últimos anos se dedicou exclusivamente a cuidar do seu pai doente até a sua morte. Justamente quando ele decide retomar a sua vida e fazer uma longa viagem, Dani conhece Mila (Milena Smit), uma mulher tão perturbadora e sensual como instável, quei transforma sua noite em um verdadeiro pesadelo. Confira o trailer (em espanhol):
Embora a história se mantenha eletrizante por mais de uma hora, na sequência final algumas revelações e acontecimentos beiram o exagero, mais ou menos como o que já vimos em outros filmes espanhóis, mas nada que comprometa o bom entretenimento que essa noite alucinante proporciona. A direção de David Victori (de "Sky Rojo") contribui para criação dessa atmosfera: ela é energética, seja pelos cortes frequentes, pela trilha sonora ou pelo fato do tempo inteiro acompanharmos uma movimentação de câmera que caminha junto com os personagens - uma técnica que funciona muito bem nessa narrativa que explora a sensação de urgência e todos os anseios e desespero do protagonista.
A direção de fotografia de Elías M. Félix ("O Pacto ") também é eficiente e faz um bom uso da iluminação, do brilho do neon e das cores vibrantes da noite agitada, caótica e trágica. No elenco, Mario Casas (“Um Contratempo” e "Remédio Amargo") tem se mostrado o ator perfeito para viver esses papeis que o colocam em situações desesperadoras, já que o ator transita muito bem suas emoções. A atriz Milena Smit (“Mães Paralelas”) também entrega um trabalho sensacional - é impossível você não sentir raiva da personagem que o tempo todo testará sua paciência.
“No Matarás” é envolvente e consegue prender sua atenção o tempo inteiro, além das surpresas que os desdobramentos da história proporciona, ainda que dê uma derrapada na reta final, tenho certeza que sua experiência durante uma hora e meia será no mínimo proveitosa.
Se você procura um bom entretenimento, só dar o play!
Escrito por Mark Hewes - uma parceria @indiqueipraver
"O Aviso" é mais um daqueles suspenses psicológicos intrigantes, muito bem realizado e com um roteiro interessante, mas por conta de uma pequena solução narrativa, certamente, vai dividir opiniões. Esse filme espanhol, produzido pela Netflix se baseia no livro de Paul Pen e conta a história de Jon (Raúl Arévalo) que ao ver seu melhor amigo, David (Sergio Mur), ser baleado enquanto estavam em um posto de gasolina, começa investigar o crime até que percebe um estranho padrão matemático entre vários incidentes que ocorreram no mesmo local durante anos. Ao mesmo tempo, mas dez anos a frente, acompanhamos Nico (Hugo Arbúes), uma criança de nove anos que certo dia recebe um bilhete dizendo que sua vida pode estar em risco se ele for nesse posto de gasolina no dia do seu aniversário. É, eu sei que pode parecer confuso, mas o filme contorna muito bem essa premissa com inteligência. Confira o trailer, dublado:
"O Aviso", na minha opinião, tem mais acertos do que erros - principalmente se você assistir sem muita expectativa e mergulhar na paranóia do protagonista na busca alucinada para entender os padrões que construíram todos os crimes que ocorreram naquele local. Não espere explicações lógicas, por mais controversa que possa parecer a frase já que os números "não mentem" - o fato é que a trama vai fazer algum sentido se você não se preocupar com as respostas e sim com as suposições que o roteiro vai inserindo na história pouco a pouco... e isso é muito divertido!
O diretor Daniel Calparsoro (de "Tormenta" e o "O Silêncio da Cidade Branca") acertou ao brincar com a temporalidade do roteiro sem a necessidade de parecer didático com quem assiste. No início pode causar algum estranhamento, mas lentamente fica fácil entender exatamente quando cada linha narrativa acontece e, claro, nos provoca a imaginar como elas se encontrarão - apenas algumas cenas com um filtro sépia para invocar um passado distante, incomoda um pouco e embora a escolha visual seja justificável, faltou coragem para manter aquele conceito visual mais neutro! A partir do segundo ato, essa conjunção temporal vai ficando cada vez mais óbvia, mas o valor do roteiro de Chris Sparling ("Mercy") e Jorge Guerricaechevarría ("Quem com ferro fere") está em, justamente, não deixar o óbvio atrapalhar a experiência - eles vão nos apresentando outros elementos (inclusive sobrenaturais) com o objetivo de criar mais dúvidas do que repostas - da mesma forma como o grande M. Night Shyamalan nos presenteava em um passado distante.
O elenco merece destaque também: Raúl Arévalo entrega um personagem (Jon) bastante honesto - por sofrer de esquizofrenia e da culpa pelo acidente do amigo, a tendência óbvia era fugir do tom e super valorizar o drama ou o estereótipo; não foi o caso - nem mesmo as aplicações de insetos em um CG bem mequetrefe, atrapalharam seu trabalho! Aura Garrido, a Laura, mãe de Nico, também não cede a tentação do overacting e funciona bem ao equilibrar o fato de ser super protetora com a necessidade de preparar seu filho para enfrentar o mundo! Hugo Arbúes, o Nico, traduz exatamente o que representa uma infância insegura e ameaçada pelo bullying que pode viver um menino mais introvertido nos dias de hoje.
No geral, "O Aviso" funciona muito bem como um ótimo entretenimento que mistura mistério, investigação e suspense (com uma pitada de sobrenatural), que nos deixam intrigados e imersos em uma infinidade de possibilidades que nos movem até o final do filme. Talvez esse final possa decepcionar um pouco (foi o que aconteceu comigo), porém a jornada foi tão divertida que nem dei muita bola para esse vacilo do roteiro. Eu indico, mais pela diversão do que por ser um filme inesquecível!
"O Aviso" é mais um daqueles suspenses psicológicos intrigantes, muito bem realizado e com um roteiro interessante, mas por conta de uma pequena solução narrativa, certamente, vai dividir opiniões. Esse filme espanhol, produzido pela Netflix se baseia no livro de Paul Pen e conta a história de Jon (Raúl Arévalo) que ao ver seu melhor amigo, David (Sergio Mur), ser baleado enquanto estavam em um posto de gasolina, começa investigar o crime até que percebe um estranho padrão matemático entre vários incidentes que ocorreram no mesmo local durante anos. Ao mesmo tempo, mas dez anos a frente, acompanhamos Nico (Hugo Arbúes), uma criança de nove anos que certo dia recebe um bilhete dizendo que sua vida pode estar em risco se ele for nesse posto de gasolina no dia do seu aniversário. É, eu sei que pode parecer confuso, mas o filme contorna muito bem essa premissa com inteligência. Confira o trailer, dublado:
"O Aviso", na minha opinião, tem mais acertos do que erros - principalmente se você assistir sem muita expectativa e mergulhar na paranóia do protagonista na busca alucinada para entender os padrões que construíram todos os crimes que ocorreram naquele local. Não espere explicações lógicas, por mais controversa que possa parecer a frase já que os números "não mentem" - o fato é que a trama vai fazer algum sentido se você não se preocupar com as respostas e sim com as suposições que o roteiro vai inserindo na história pouco a pouco... e isso é muito divertido!
O diretor Daniel Calparsoro (de "Tormenta" e o "O Silêncio da Cidade Branca") acertou ao brincar com a temporalidade do roteiro sem a necessidade de parecer didático com quem assiste. No início pode causar algum estranhamento, mas lentamente fica fácil entender exatamente quando cada linha narrativa acontece e, claro, nos provoca a imaginar como elas se encontrarão - apenas algumas cenas com um filtro sépia para invocar um passado distante, incomoda um pouco e embora a escolha visual seja justificável, faltou coragem para manter aquele conceito visual mais neutro! A partir do segundo ato, essa conjunção temporal vai ficando cada vez mais óbvia, mas o valor do roteiro de Chris Sparling ("Mercy") e Jorge Guerricaechevarría ("Quem com ferro fere") está em, justamente, não deixar o óbvio atrapalhar a experiência - eles vão nos apresentando outros elementos (inclusive sobrenaturais) com o objetivo de criar mais dúvidas do que repostas - da mesma forma como o grande M. Night Shyamalan nos presenteava em um passado distante.
O elenco merece destaque também: Raúl Arévalo entrega um personagem (Jon) bastante honesto - por sofrer de esquizofrenia e da culpa pelo acidente do amigo, a tendência óbvia era fugir do tom e super valorizar o drama ou o estereótipo; não foi o caso - nem mesmo as aplicações de insetos em um CG bem mequetrefe, atrapalharam seu trabalho! Aura Garrido, a Laura, mãe de Nico, também não cede a tentação do overacting e funciona bem ao equilibrar o fato de ser super protetora com a necessidade de preparar seu filho para enfrentar o mundo! Hugo Arbúes, o Nico, traduz exatamente o que representa uma infância insegura e ameaçada pelo bullying que pode viver um menino mais introvertido nos dias de hoje.
No geral, "O Aviso" funciona muito bem como um ótimo entretenimento que mistura mistério, investigação e suspense (com uma pitada de sobrenatural), que nos deixam intrigados e imersos em uma infinidade de possibilidades que nos movem até o final do filme. Talvez esse final possa decepcionar um pouco (foi o que aconteceu comigo), porém a jornada foi tão divertida que nem dei muita bola para esse vacilo do roteiro. Eu indico, mais pela diversão do que por ser um filme inesquecível!
É impossível não pensar nessa minissérie com aquele "selo HBO". Não que a produção da Netflix seja ruim, mas definitivamente não está na mesma prateleira. Dito isso, e alinhada as expectativas, posso adiantar que "O Caso Asunta" vai te surpreendente mais pela história real bizarra do que por qualquer outra coisa. "El Caso Asunta" (no original), criada por Ramón Campos e Gema R. Neira (do ótimo "Fariña") ao lado de e David Orea e Jon de la Cuesta, é um mergulho nos detalhes mais sórdidos de um crime real que chocou a Espanha em 2013. A minissérie retrata o caso da jovem Asunta Basterra Porto, uma menina de 12 anos encontrada morta em circunstâncias misteriosas, e o subsequente julgamento de seus pais adotivos, Rosario Porto e Alfonso Basterra, acusados de seu assassinato. Com uma narrativa intensa, sempre pontuada por uma abordagem quase documental, "O Caso Asunta" oferece uma visão interessante, minuciosa e inquietante de um dos casos mais perturbadores dos últimos tempos na Europa.
O casal Rosario (Candela Peña) e Alfonso Basterra (Tristán Ulloa) denuncia o desaparecimento de sua filha adotiva, Asunta, em uma delegacia de Santiago, na Espanha. No entanto, uma série de contradições, rapidamente, fazem com que as investigações apontem que os próprios pais sejam indiciados pelo crime. Como é possível imaginar, essa linha de investigação liderada pelo egocêntrico Juez Malvar (Javier Gutiérrez) transforma o caso em uma jornada de grande repercussão na mídia espanhola em 2013, e que acaba deixando muitas marcas. Confira o trailer (em espanhol):
Se você for um grande apreciador do gênero, facilmente você perceberá como a minissérie é estruturada para nos remeter ao estilo "true crime" de conduzir uma narrativa. Combinando imagens reais do caso com reconstituições dramatizadas dos bastidores da investigação, focando especialmente nos acusados, "O Caso Asunta" constrói um retrato abrangente dos eventos que levaram à morte de Asunta. A produção se esforça para ser fiel aos fatos conhecidos do caso, ao mesmo tempo em que explora as complexidades emocionais e psicológicas dos envolvidos, com um conceito visual que, de fato, cria uma experiência imersiva que nos prende e nos faz questionar as motivações e o comportamento dos personagens centrais a todo momento.
Carlos Sedes e Jacobo Martínez (ambos de "Fariña") fazem um bom trabalho na direção ao equilibrar a narrativa mais factual com o drama humano. Mesmo com um orçamento limitado, é perceptível ao longo dos episódios, que os diretores se esforçam para entregar um ritmo meticuloso, guiando a audiência pelos eventos que precederam e seguiram a tragédia. O uso de cortes reais e uma câmera "mais nervosa" confere certa autenticidade à narrativa, certamente potencializa a gravidade do caso e o impacto que teve na sociedade espanhola. Reparem como os tons frios e a iluminação das cenas sublinham a atmosfera inquietante da história de forma a maximizar o impacto emocional, com planos mais fechados que refletem a angústia e a confusão em torno da investigação e do julgamento pela perspectiva de quem mais sofreu com tudo isso.
Ao evitar um enfoque unilateral, "O Caso Asunta" permite que audiência considere múltiplas teorias e interpretações, mostrando a complexidade da investigação e toda incerteza que muitas vezes acompanham casos de grande notoriedade pública. Essa proposta aumenta o lado entretenimento da história e acaba cobrando um pouco mais do seu elenco. Tanto Peña quanto Ulloa trazem uma intensidade e ambiguidade que justificam a perplexidade do público e da mídia em relação à sua culpabilidade ou inocência dos pais de Asunta, mas olha, é na figura de Juez Malvar do premiado Javier Gutiérrez que a minissérie mexe mesmo com nossas sensações mais particulares - especialmente quando percebemos que o crime funciona muito mais como um fenômeno cultural e um reflexo das ansiedades sociais contemporâneas, do que como uma missão pela justiça e pelo respeito à vitima.
"O Caso Asunta" vale o seu play!
É impossível não pensar nessa minissérie com aquele "selo HBO". Não que a produção da Netflix seja ruim, mas definitivamente não está na mesma prateleira. Dito isso, e alinhada as expectativas, posso adiantar que "O Caso Asunta" vai te surpreendente mais pela história real bizarra do que por qualquer outra coisa. "El Caso Asunta" (no original), criada por Ramón Campos e Gema R. Neira (do ótimo "Fariña") ao lado de e David Orea e Jon de la Cuesta, é um mergulho nos detalhes mais sórdidos de um crime real que chocou a Espanha em 2013. A minissérie retrata o caso da jovem Asunta Basterra Porto, uma menina de 12 anos encontrada morta em circunstâncias misteriosas, e o subsequente julgamento de seus pais adotivos, Rosario Porto e Alfonso Basterra, acusados de seu assassinato. Com uma narrativa intensa, sempre pontuada por uma abordagem quase documental, "O Caso Asunta" oferece uma visão interessante, minuciosa e inquietante de um dos casos mais perturbadores dos últimos tempos na Europa.
O casal Rosario (Candela Peña) e Alfonso Basterra (Tristán Ulloa) denuncia o desaparecimento de sua filha adotiva, Asunta, em uma delegacia de Santiago, na Espanha. No entanto, uma série de contradições, rapidamente, fazem com que as investigações apontem que os próprios pais sejam indiciados pelo crime. Como é possível imaginar, essa linha de investigação liderada pelo egocêntrico Juez Malvar (Javier Gutiérrez) transforma o caso em uma jornada de grande repercussão na mídia espanhola em 2013, e que acaba deixando muitas marcas. Confira o trailer (em espanhol):
Se você for um grande apreciador do gênero, facilmente você perceberá como a minissérie é estruturada para nos remeter ao estilo "true crime" de conduzir uma narrativa. Combinando imagens reais do caso com reconstituições dramatizadas dos bastidores da investigação, focando especialmente nos acusados, "O Caso Asunta" constrói um retrato abrangente dos eventos que levaram à morte de Asunta. A produção se esforça para ser fiel aos fatos conhecidos do caso, ao mesmo tempo em que explora as complexidades emocionais e psicológicas dos envolvidos, com um conceito visual que, de fato, cria uma experiência imersiva que nos prende e nos faz questionar as motivações e o comportamento dos personagens centrais a todo momento.
Carlos Sedes e Jacobo Martínez (ambos de "Fariña") fazem um bom trabalho na direção ao equilibrar a narrativa mais factual com o drama humano. Mesmo com um orçamento limitado, é perceptível ao longo dos episódios, que os diretores se esforçam para entregar um ritmo meticuloso, guiando a audiência pelos eventos que precederam e seguiram a tragédia. O uso de cortes reais e uma câmera "mais nervosa" confere certa autenticidade à narrativa, certamente potencializa a gravidade do caso e o impacto que teve na sociedade espanhola. Reparem como os tons frios e a iluminação das cenas sublinham a atmosfera inquietante da história de forma a maximizar o impacto emocional, com planos mais fechados que refletem a angústia e a confusão em torno da investigação e do julgamento pela perspectiva de quem mais sofreu com tudo isso.
Ao evitar um enfoque unilateral, "O Caso Asunta" permite que audiência considere múltiplas teorias e interpretações, mostrando a complexidade da investigação e toda incerteza que muitas vezes acompanham casos de grande notoriedade pública. Essa proposta aumenta o lado entretenimento da história e acaba cobrando um pouco mais do seu elenco. Tanto Peña quanto Ulloa trazem uma intensidade e ambiguidade que justificam a perplexidade do público e da mídia em relação à sua culpabilidade ou inocência dos pais de Asunta, mas olha, é na figura de Juez Malvar do premiado Javier Gutiérrez que a minissérie mexe mesmo com nossas sensações mais particulares - especialmente quando percebemos que o crime funciona muito mais como um fenômeno cultural e um reflexo das ansiedades sociais contemporâneas, do que como uma missão pela justiça e pelo respeito à vitima.
"O Caso Asunta" vale o seu play!
"O Inocente" é uma minissérie muito bacana, que se você se permitir um pouco de abstração da realidade, vai se divertir muito! Para os mais atentos, foi exatamente assim que eu comecei o review de "Um Contratempo", filme espanhol de 2016 e um dos maiores sucessos da história da Netflix. Não por acaso, o diretor de "Um Contratempo" é o mesmo Oriol Paulo de "O Inocente" e seu protagonista, Mario Casas, também. Ou seja, se você gostou de um, certamente vai gostar do outro!
Essa é mais uma adaptação de Harlan Corben para a Netflix. Depois de "Safe" e "Não Fale com Estranhos", "O Inocente" acompanha a história Mateo (Mario Casas), um jovem estudante de direito que, numa noitada, foi arrastado para uma briga e acabou empurrando um de seus agressores contra a calçada, causando sua morte. Após seu julgamento, ele é mandado para prisão para cumprir uma pena de quatro anos. Ao retomar a sua vida, ele monta um escritório de advocacia com seu irmão e acaba reencontrando Olivia Costa (Aura Garrido), uma linda jovem com quem passou a noite anos antes. Apaixonados, eles resolvem começar uma vida juntos até que Mat percebe que algumas histórias não resolvidas começam a vir à tona e, pior, Olivia, a pessoa em quem ele mais confia, parece esconder segredos obscuros que podem ter relação com o seu passado. Confira o trailer:
Mesmo com um roteiro com algumas soluções preguiçosas, "O Inocente" é entretenimento puro - e de qualidade, eu diria! Sem dúvida que a dinâmica narrativa tem um valor muito maior do que a originalidade da trama e esse é um grande trunfo de Oriol Paulo - ele realmente sabe criar uma atmosfera de tensão e mistério, mesmo não contando com um elenco excepcional, Paulo é inteligente ao resgatar muito do que funcionou em "Um Contratempo" para entregar uma minissérie que nos surpreende a cada episódio! Escrita pelo próprio diretor os episódios são bem construidos e o conceito narrativo de focar em como o passado de um personagem impacta na história que está sendo contada no presente, funciona perfeitamente. Reparem como a disparidade entre o 1º e 2º episódio é tão grande que, por um momento, chegamos a acreditar que estamos assistindo outra série.
Em cada episódio, vamos reconhecendo na trajetória dos personagens uma série de conexões com o arco principal da trama: a morte acidental que levou Matteo para prisão. Característico da literatura de Corben, a história vai abrindo muitas questões e inevitavelmente é preciso voltar a cada plot para recontar uma determinada passagem e assim deixar claro que tudo foi muito bem pensado. Isso não é ruim, mas traz um certo didatismo para o roteiro que vai incomodar os mais críticos. Por outro lado, é de se elogiar a forma como as pontas vão sendo amarradas - a sensação de que nada é por acaso, mesmo que inicialmente muita coisa soe ser, é reflexo de uma boa condução e de um trabalho minucioso do diretor.
É um fato que "O Inocente" possui um número exagerado de reviravoltas e isso vai dividir opiniões, mas que fique claro que não deve atrapalhar a experiência. A busca insaciável para surpreender a todo instante e assim manter o ritmo instigante do começo é falha em alguns momentos, mas em muitos outros, funciona bem.
Olha, não é uma minissérie inesquecível, mas vale demais pela pela diversão. Pode pegar a pipoca e apertar o play sem receio!
"O Inocente" é uma minissérie muito bacana, que se você se permitir um pouco de abstração da realidade, vai se divertir muito! Para os mais atentos, foi exatamente assim que eu comecei o review de "Um Contratempo", filme espanhol de 2016 e um dos maiores sucessos da história da Netflix. Não por acaso, o diretor de "Um Contratempo" é o mesmo Oriol Paulo de "O Inocente" e seu protagonista, Mario Casas, também. Ou seja, se você gostou de um, certamente vai gostar do outro!
Essa é mais uma adaptação de Harlan Corben para a Netflix. Depois de "Safe" e "Não Fale com Estranhos", "O Inocente" acompanha a história Mateo (Mario Casas), um jovem estudante de direito que, numa noitada, foi arrastado para uma briga e acabou empurrando um de seus agressores contra a calçada, causando sua morte. Após seu julgamento, ele é mandado para prisão para cumprir uma pena de quatro anos. Ao retomar a sua vida, ele monta um escritório de advocacia com seu irmão e acaba reencontrando Olivia Costa (Aura Garrido), uma linda jovem com quem passou a noite anos antes. Apaixonados, eles resolvem começar uma vida juntos até que Mat percebe que algumas histórias não resolvidas começam a vir à tona e, pior, Olivia, a pessoa em quem ele mais confia, parece esconder segredos obscuros que podem ter relação com o seu passado. Confira o trailer:
Mesmo com um roteiro com algumas soluções preguiçosas, "O Inocente" é entretenimento puro - e de qualidade, eu diria! Sem dúvida que a dinâmica narrativa tem um valor muito maior do que a originalidade da trama e esse é um grande trunfo de Oriol Paulo - ele realmente sabe criar uma atmosfera de tensão e mistério, mesmo não contando com um elenco excepcional, Paulo é inteligente ao resgatar muito do que funcionou em "Um Contratempo" para entregar uma minissérie que nos surpreende a cada episódio! Escrita pelo próprio diretor os episódios são bem construidos e o conceito narrativo de focar em como o passado de um personagem impacta na história que está sendo contada no presente, funciona perfeitamente. Reparem como a disparidade entre o 1º e 2º episódio é tão grande que, por um momento, chegamos a acreditar que estamos assistindo outra série.
Em cada episódio, vamos reconhecendo na trajetória dos personagens uma série de conexões com o arco principal da trama: a morte acidental que levou Matteo para prisão. Característico da literatura de Corben, a história vai abrindo muitas questões e inevitavelmente é preciso voltar a cada plot para recontar uma determinada passagem e assim deixar claro que tudo foi muito bem pensado. Isso não é ruim, mas traz um certo didatismo para o roteiro que vai incomodar os mais críticos. Por outro lado, é de se elogiar a forma como as pontas vão sendo amarradas - a sensação de que nada é por acaso, mesmo que inicialmente muita coisa soe ser, é reflexo de uma boa condução e de um trabalho minucioso do diretor.
É um fato que "O Inocente" possui um número exagerado de reviravoltas e isso vai dividir opiniões, mas que fique claro que não deve atrapalhar a experiência. A busca insaciável para surpreender a todo instante e assim manter o ritmo instigante do começo é falha em alguns momentos, mas em muitos outros, funciona bem.
Olha, não é uma minissérie inesquecível, mas vale demais pela pela diversão. Pode pegar a pipoca e apertar o play sem receio!