Desde o dia que a Netflix confirmou a distribuição internacional de "Atlantique" e liberou o trailer do vencedor do Grande Prêmio do Júri em Cannes 2019, tive a certeza que se tratava de um filme bastante interessante - o que realmente se confirmou, porém, confesso, esperava mais! Antes de mais nada é preciso deixar claro que "Atlantique" é um filme independente com um perfil bem particular que deve agradar aqueles que buscam filmes mais introspectivos e com boa carreira em Festivais pelo mundo. Por se tratar de um tema que atrai o público em geral, muitas pessoas vão criticar o filme, pois, definitivamente, "Atlantique" está anos luz de distância de "Ghost", por exemplo! Depois do naufrágio de um grupo de operários senegaleses que buscavam uma melhor oportunidade na Espanha, a jovem Ada, embora prometida para outro homem, sofre secretamente a perda do seu verdadeiro amor, Souleiman, morto no acidente. Porém na noite do seu casamento, um incêndio acontece e uma das convidadas, e amiga de Ada, afirma ter visto Souleiman pelas redondezas. Com o inicio da investigação, outros acontecimentos chamam a atenção da policia e um clima sobrenatural passa a tomar conta da história. "Atlantique" tem um ritmo muito cadenciado, trabalha bem o drama da protagonista, mas, para mim, perdeu o foco da trama principal ao querer contar histórias demais! Eu gostei do filme, mas achei o roteiro econômico em vários momentos e isso atrapalhou um pouco na compreensão de determinadas situações e até na relação de alguns personagem com as subtramas. Vale o play, mas só faça isso se você gostar de filmes mais poéticos e, digamos, alternativos!
A diretora francesa Mati Diop foi muito inteligente em abordar temas delicados de uma sociedade sofrida e cheia de conflitos sociais mostrando diversos pontos de vista e usando elementos sobrenaturais como pano de fundo. Essa co-produção França / Senegal / Bélgica usa o cenário interessando do que Dakar vem se transformando. Enquanto o abismo social entre empreiteiros e operários ditam as regras na região, a bem construída introdução de uma história de amor dá o tom de "Atlantique" no primeiro ato. O problema é que o segundo e o terceiro atos vão se enfraquecendo com a quantidade de explicações e, depois, conclusões que a história se sente obrigada a fazer. A história de Ada e Souleiman já me parecia ser o suficiente, porém o roteiro trás outras tramas sem tanto desenvolvimento - uma delas é a febre que as mulheres tem após a morte dos maridos citada em todas as sinopses do filme. Sim, ela é vital para o entendimento do que vem a seguir, mas o sua importância não se reflete nas poucas cenas que contam essa passagem. Os reais motivos da fuga para a Espanha também me soaram frágeis, embora entendível; mas não deu a dimensão da perda para as mulheres que ficaram e isso complica ainda mais quando os mortos resolvem voltar para cobrar a dívida incorporando nelas - a idéia é ótima, mas poderia ser mais impactante - fiquei com essa impressão!
O filme é lindamente fotografado pela Claire Mathon, porém alguns planos comandados por Diop são longos demais - repare na cena em que os operários estão voltando para casa no inicio do filme! A trilha sonora e o desenho de som me chamaram muito atenção - achei muito bem construída a ambientação da cidade, enaltecendo o propósito de escancarar a diferença social do país. A trilha tem uma levada bastante emocional, mas, ao mesmo tempo, conta com elementos de suspense que funcionam perfeitamente na história. Os atores também vão bem, mas nada fora da curva - me agradou o trabalho Mame Bineta Sane como Ada e só! A produção não é ruim, mas as duas cenas de incêndio em nada me convenceram - sinceramente, era possível não mostrar e mesmo assim trazer o peso e o drama das situações só com o trabalho dos atores ou com as consequências desses fatos para os personagens (o que aliás foi um grande acerto da diretora quando resolveu não mostrar o naufrágio).
"Atlantique" chegou no catálogo como a aposta da Netflix para a disputa do Oscar de filme estrangeiro. Não acredito na indicação, embora não me surpreenderá caso ela vier. Já vencer, acho muito (mas muito) difícil! O filme pode parecer contemplativo demais para alguns e passar a impressão de artístico demais para outros - é uma pena, pois acredito que vale a pena conhecer o trabalho de Diop na direção e do cinema senegalês como um todo (embora a produção seja basicamente francesa). É o estilo de filme que me atrai, mas preciso dizer que não me marcou como eu imaginava - o trailer me impactou mais que o filme! Vale a indicação apenas se você for um amante de filmes com uma pegada mais lírica!
Desde o dia que a Netflix confirmou a distribuição internacional de "Atlantique" e liberou o trailer do vencedor do Grande Prêmio do Júri em Cannes 2019, tive a certeza que se tratava de um filme bastante interessante - o que realmente se confirmou, porém, confesso, esperava mais! Antes de mais nada é preciso deixar claro que "Atlantique" é um filme independente com um perfil bem particular que deve agradar aqueles que buscam filmes mais introspectivos e com boa carreira em Festivais pelo mundo. Por se tratar de um tema que atrai o público em geral, muitas pessoas vão criticar o filme, pois, definitivamente, "Atlantique" está anos luz de distância de "Ghost", por exemplo! Depois do naufrágio de um grupo de operários senegaleses que buscavam uma melhor oportunidade na Espanha, a jovem Ada, embora prometida para outro homem, sofre secretamente a perda do seu verdadeiro amor, Souleiman, morto no acidente. Porém na noite do seu casamento, um incêndio acontece e uma das convidadas, e amiga de Ada, afirma ter visto Souleiman pelas redondezas. Com o inicio da investigação, outros acontecimentos chamam a atenção da policia e um clima sobrenatural passa a tomar conta da história. "Atlantique" tem um ritmo muito cadenciado, trabalha bem o drama da protagonista, mas, para mim, perdeu o foco da trama principal ao querer contar histórias demais! Eu gostei do filme, mas achei o roteiro econômico em vários momentos e isso atrapalhou um pouco na compreensão de determinadas situações e até na relação de alguns personagem com as subtramas. Vale o play, mas só faça isso se você gostar de filmes mais poéticos e, digamos, alternativos!
A diretora francesa Mati Diop foi muito inteligente em abordar temas delicados de uma sociedade sofrida e cheia de conflitos sociais mostrando diversos pontos de vista e usando elementos sobrenaturais como pano de fundo. Essa co-produção França / Senegal / Bélgica usa o cenário interessando do que Dakar vem se transformando. Enquanto o abismo social entre empreiteiros e operários ditam as regras na região, a bem construída introdução de uma história de amor dá o tom de "Atlantique" no primeiro ato. O problema é que o segundo e o terceiro atos vão se enfraquecendo com a quantidade de explicações e, depois, conclusões que a história se sente obrigada a fazer. A história de Ada e Souleiman já me parecia ser o suficiente, porém o roteiro trás outras tramas sem tanto desenvolvimento - uma delas é a febre que as mulheres tem após a morte dos maridos citada em todas as sinopses do filme. Sim, ela é vital para o entendimento do que vem a seguir, mas o sua importância não se reflete nas poucas cenas que contam essa passagem. Os reais motivos da fuga para a Espanha também me soaram frágeis, embora entendível; mas não deu a dimensão da perda para as mulheres que ficaram e isso complica ainda mais quando os mortos resolvem voltar para cobrar a dívida incorporando nelas - a idéia é ótima, mas poderia ser mais impactante - fiquei com essa impressão!
O filme é lindamente fotografado pela Claire Mathon, porém alguns planos comandados por Diop são longos demais - repare na cena em que os operários estão voltando para casa no inicio do filme! A trilha sonora e o desenho de som me chamaram muito atenção - achei muito bem construída a ambientação da cidade, enaltecendo o propósito de escancarar a diferença social do país. A trilha tem uma levada bastante emocional, mas, ao mesmo tempo, conta com elementos de suspense que funcionam perfeitamente na história. Os atores também vão bem, mas nada fora da curva - me agradou o trabalho Mame Bineta Sane como Ada e só! A produção não é ruim, mas as duas cenas de incêndio em nada me convenceram - sinceramente, era possível não mostrar e mesmo assim trazer o peso e o drama das situações só com o trabalho dos atores ou com as consequências desses fatos para os personagens (o que aliás foi um grande acerto da diretora quando resolveu não mostrar o naufrágio).
"Atlantique" chegou no catálogo como a aposta da Netflix para a disputa do Oscar de filme estrangeiro. Não acredito na indicação, embora não me surpreenderá caso ela vier. Já vencer, acho muito (mas muito) difícil! O filme pode parecer contemplativo demais para alguns e passar a impressão de artístico demais para outros - é uma pena, pois acredito que vale a pena conhecer o trabalho de Diop na direção e do cinema senegalês como um todo (embora a produção seja basicamente francesa). É o estilo de filme que me atrai, mas preciso dizer que não me marcou como eu imaginava - o trailer me impactou mais que o filme! Vale a indicação apenas se você for um amante de filmes com uma pegada mais lírica!
"O que ficou para trás" é um filme cheio de simbolismo e não por isso menos assustador! Bem ao estilo Jordan Peele ("Corra" e "Nós"), essa produção ds Netflix com a BBC será uma agradável surpresa para quem gosta de um suspense psicológico com elementos sobrenaturais. Talvez com uma temática menos convencional, o filme se arrisca muito na concepção narrativa, mas ao mesmo tempo entrega um conceito visual simples e que se ajusta perfeitamente na proposta do diretor, o estreante Remi Weekes.
Na história, um jovem casal, Rial (Wunmi Mosaku) e Bol (Sope Dirisu) consegue escapar da guerra civil no Sudão e, depois de completarem a difícil jornada até o Reino Unido, acabam detidos em um centro de refugiados. A esperança de uma vida digna e segura começa a se tornar realidade quando eles são liberados e se mudam para uma casa indicada pelo governo local. Porém uma série de fenômenos sobrenaturais começa a assombra-los, transformando o inicio de uma nova vida em um verdadeiro pesadelo. O que eles precisam descobrir é se de fato existe algo sinistro escondido nas paredes da casa ou se são seus fantasmas mais íntimos que voltaram para cobrar por suas decisões! Confira o trailer:
Embora os sustos realmente aconteçam enquanto assistimos ao filme, eu diria que toda aquela conhecida e importante gramática cinematográfica que envolve os elementos sobrenaturais de uma casa mal-assombrada serve muito mais como simbolismo para lidar a culpa, com os traumas e, claro, com as perdas de refugiar-se em um outro país, do que de bengala para prender a atenção da audiência! Então fica a primeira dica: enxergue além do que está na tela! As batidas nas paredes são muito mais profundas do que o medo que elas podem causar e isso vai impactar diretamente na sua experiência ao assistir "O que ficou para trás"! Vamos falar mais sobre isso abaixo, mas se você gosta de um suspense inteligente e não muito difícil, essa é uma ótima opção e fique tranquilo: as respostas mais importantes virão!
Para começar, sugiro uma reflexão: reparem como um roteiro bem escrito nos provoca uma sensação de realidade mesmo quando lidamos com elementos completamente fantasiosos. Em "His House" (título original) encontramos o equilíbrio perfeito entre o passado e o presente: a história é contada de maneira econômica e nem por isso deixa de ser auto-explicativa. De cara sabemos o que aconteceu durante a fuga do Sudão, entendemos o peso da dor que Rial e Bol carregam e ainda vemos como suas crenças interferem na esperança de "começar de novo". Apesar de alguns traumas do passado pontuarem a narrativa, o preconceito e a intolerância são os fantasmas do dia a dia - veja, quando eles ganham o direito de sair do abrigo de refugiados para viverem em um novo local, percebemos a força das restrições impostas, o que eleva a tensão a cada ação (ou situação) já que o governo está apenas esperando algum vacilo para justificar uma deportação.
A casa parece ser apenas uma ferramenta para explorar essa tensão e aqui a direção de Weekes merece elogios: ele demonstra total domínio sobre os clichês do gênero, oferecendo muitos sustos ao mesmo tempo que desencadeia a dúvida sobre a sanidade dos personagens - e esse não seria o motivo suficiente que o governo precisa para expulsá-los? Enquanto Bol tenta lidar com a razão, Rial faz questão de cultivar os rituais de sua terra natal e isso faz com que o casal se desconecte! O bacana é que a entrada dos elementos sobrenaturais na história apenas enaltece as discussões sócio-culturais entre o casal e suas experiências fora de casa, acabam ganhando "forma" com a presença sobrenatural que os assombram. Percebam como a complexidade do tema vai além do que vemos na tela!
"O que ficou para trás" é um ótimo exemplo de um filme bem escrito, bem realizado, bem produzido e completamente adaptado ao baixo orçamento, que resolve as limitações técnicas com muita criatividade e competência! O elenco está impecável, tanto Sope Dirisu, quanto Wunmi Mosaku, são verdadeiros talentos! O trabalho de Weekes é seguro, do roteiro à direção, e com muita simplicidade consegue assustar ao mesmo tempo em que levanta discussões relevantes (Jordan Peele fazendo escola).
Mesmo com várias alegorias estéticas, o filme é simples para quem enxerga superficialmente e inteligente para quem busca uma maior profundidade no texto, ou seja, a chance de agradar aos dois públicos será muito grande - se puder, fique com a segunda forma de ver e enxergar a história! Vale muito a pena o seu play!
"O que ficou para trás" é um filme cheio de simbolismo e não por isso menos assustador! Bem ao estilo Jordan Peele ("Corra" e "Nós"), essa produção ds Netflix com a BBC será uma agradável surpresa para quem gosta de um suspense psicológico com elementos sobrenaturais. Talvez com uma temática menos convencional, o filme se arrisca muito na concepção narrativa, mas ao mesmo tempo entrega um conceito visual simples e que se ajusta perfeitamente na proposta do diretor, o estreante Remi Weekes.
Na história, um jovem casal, Rial (Wunmi Mosaku) e Bol (Sope Dirisu) consegue escapar da guerra civil no Sudão e, depois de completarem a difícil jornada até o Reino Unido, acabam detidos em um centro de refugiados. A esperança de uma vida digna e segura começa a se tornar realidade quando eles são liberados e se mudam para uma casa indicada pelo governo local. Porém uma série de fenômenos sobrenaturais começa a assombra-los, transformando o inicio de uma nova vida em um verdadeiro pesadelo. O que eles precisam descobrir é se de fato existe algo sinistro escondido nas paredes da casa ou se são seus fantasmas mais íntimos que voltaram para cobrar por suas decisões! Confira o trailer:
Embora os sustos realmente aconteçam enquanto assistimos ao filme, eu diria que toda aquela conhecida e importante gramática cinematográfica que envolve os elementos sobrenaturais de uma casa mal-assombrada serve muito mais como simbolismo para lidar a culpa, com os traumas e, claro, com as perdas de refugiar-se em um outro país, do que de bengala para prender a atenção da audiência! Então fica a primeira dica: enxergue além do que está na tela! As batidas nas paredes são muito mais profundas do que o medo que elas podem causar e isso vai impactar diretamente na sua experiência ao assistir "O que ficou para trás"! Vamos falar mais sobre isso abaixo, mas se você gosta de um suspense inteligente e não muito difícil, essa é uma ótima opção e fique tranquilo: as respostas mais importantes virão!
Para começar, sugiro uma reflexão: reparem como um roteiro bem escrito nos provoca uma sensação de realidade mesmo quando lidamos com elementos completamente fantasiosos. Em "His House" (título original) encontramos o equilíbrio perfeito entre o passado e o presente: a história é contada de maneira econômica e nem por isso deixa de ser auto-explicativa. De cara sabemos o que aconteceu durante a fuga do Sudão, entendemos o peso da dor que Rial e Bol carregam e ainda vemos como suas crenças interferem na esperança de "começar de novo". Apesar de alguns traumas do passado pontuarem a narrativa, o preconceito e a intolerância são os fantasmas do dia a dia - veja, quando eles ganham o direito de sair do abrigo de refugiados para viverem em um novo local, percebemos a força das restrições impostas, o que eleva a tensão a cada ação (ou situação) já que o governo está apenas esperando algum vacilo para justificar uma deportação.
A casa parece ser apenas uma ferramenta para explorar essa tensão e aqui a direção de Weekes merece elogios: ele demonstra total domínio sobre os clichês do gênero, oferecendo muitos sustos ao mesmo tempo que desencadeia a dúvida sobre a sanidade dos personagens - e esse não seria o motivo suficiente que o governo precisa para expulsá-los? Enquanto Bol tenta lidar com a razão, Rial faz questão de cultivar os rituais de sua terra natal e isso faz com que o casal se desconecte! O bacana é que a entrada dos elementos sobrenaturais na história apenas enaltece as discussões sócio-culturais entre o casal e suas experiências fora de casa, acabam ganhando "forma" com a presença sobrenatural que os assombram. Percebam como a complexidade do tema vai além do que vemos na tela!
"O que ficou para trás" é um ótimo exemplo de um filme bem escrito, bem realizado, bem produzido e completamente adaptado ao baixo orçamento, que resolve as limitações técnicas com muita criatividade e competência! O elenco está impecável, tanto Sope Dirisu, quanto Wunmi Mosaku, são verdadeiros talentos! O trabalho de Weekes é seguro, do roteiro à direção, e com muita simplicidade consegue assustar ao mesmo tempo em que levanta discussões relevantes (Jordan Peele fazendo escola).
Mesmo com várias alegorias estéticas, o filme é simples para quem enxerga superficialmente e inteligente para quem busca uma maior profundidade no texto, ou seja, a chance de agradar aos dois públicos será muito grande - se puder, fique com a segunda forma de ver e enxergar a história! Vale muito a pena o seu play!